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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE CURSO DE SERVIÇO SOCIAL ANA JESSICA DA COSTA GONÇALVES DA ESPERANÇA À DECEPÇÃO: OS LIMITES E CONTRADIÇÕES DO PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA NO MUNICÍPIO DE MARACANAÚ FORTALEZA/CE 2012

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ

FACULDADE CEARENSE

CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

ANA JESSICA DA COSTA GONÇALVES

DA ESPERANÇA À DECEPÇÃO: OS LIMITES E CONTRADIÇÕES DO

PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA NO MUNICÍPIO DE

MARACANAÚ

FORTALEZA/CE

2012

ANA JESSICA DA COSTA GONÇALVES

DA ESPERANÇA À DECEPÇÃO: OS LIMITES E CONTRADIÇÕES DO

PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA NO MUNICÍPIO DE

MARACANAÚ

Monografia apresentada ao Curso de

Graduação em Serviço Social a Faculdade

Cearense - FaC, como requisito parcial para

obtenção do grau de Bacharel.

Orientadora: Profª Drª Mônica Duarte

Cavaignac.

FORTALEZA/CE

2012

G635d Gonçalves, Ana Jéssica da Costa.

Da esperança à decepção: os limites e contradições do Programa

Minha Casa, Minha Vida no município de Maracanaú / Ana Jéssica da

Costa Gonçalves. – 2012.

72 f. ; il.

Orientador: Profª. Dra. Mônica Duarte Cavaignac.

Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) – Faculdade

Cearense, Curso de Serviço Social, 2012.

1. Política habitacional. 2. Programa Minha Casa Minha Vida. 3.

Aluguel social. I. Cavaignac, Mônica Duarte. II. Título.

CDU 365.24

CDU 658.153.2

Bibliotecária Maria Albaniza de Oliveira CRB-3/867

ANA JESSICA DA COSTA GONÇALVES

DA ESPERANÇA À DECEPÇÃO: OS LIMITES E CONTRADIÇÕES DO

PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA NO MUNICÍPIO DE

MARACANAÚ

Monografia como pré-requisito para obtenção

do título de Bacharelado em Serviço Social,

outorgado pela Faculdade Cearense – FaC,

tendo sido aprovada pela banca examinadora

composta pelos professores.

Data de aprovação:____/____/____

BANCA EXAMINADORA

Profª Drª Mônica Duarte Cavaignac – UFC

Orientadora

Profª Me. Valney Rocha Maciel – UECE

Profª Drª Maria Esther Barbosa – UECE

A minha mãe, minha irmã e irmão, e meu

namorado pelo apoio e paciência nos dias mais

difíceis. Aos oito entrevistados que com suas

histórias, construíram essa monografia.

AGRADECIMENTOS

A Deus, que nunca duvidou da minha fé.

A minha amada mãe, Ana Zélia por ter me ensinado a ser quem sou; pelo amor a mim

dedicado durante toda a vida.

A minha orientadora, Profª Drª Mônica Duarte Cavaignac, por sua competência, dedicação,

paciência e atenção neste momento.

A meu namorado, Jardel Pontes, que me motivou em momentos difíceis desta caminhada.

A meus irmãos, Jessiane e Junior.

Aos professores da Instituição, pelo acolhimento e disponibilidade sempre generosa.

Zeus, que conduz os mortais pelo caminho até

a compreensão, Zeus, que ordenou que a

sabedoria chegue por meio do sofrimento.

Ésquilo - Agamenon

RESUMO

O estudo objetivou identificar os limites e contradições do Programa Minha Casa, Minha

Vida no município de Maracanaú. Por tanto, realizou-se uma pesquisa com moradores

beneficiados pelo Programa no município. A pesquisa foi feita no condomínio Virgílio

Távora I, II e III, no bairro Cágado próximo a CE 060. Participaram da pesquisa antigos

moradores do aluguel social. Para metodologia, foi feito um levantamento bibliográfico sobre

o tema discutido e entrevistas informais com as famílias pesquisadas. Por fim, a pesquisa

apresenta na ótica dos beneficiários dos condomínios as contradições e os limites existentes

no Programa, e a dicotomia entre, o discurso circulante sobre moradia digna, e as condições

de vida dos moradores beneficiados nos apartamentos do Programa Minha Casa, Minha Vida

em Maracanaú.

Palavras chaves: Política Habitacional; Programa Minha, Casa Minha Vida; Direito à

Moradia.

ABSTRACT

The study aimed to identify the limits and contradictions of the Minha Casa, Minha Vida in

Maracanaú. Therefore, we carried out a survey of residents in the county benefited from the

program. The research was done in the condominium Virgil Távora I, II and III, the

neighborhood near the Tortoise EC 060. Participants were former residents of rent assistance.

For methodology, we made a literature review on the topic discussed and informal interviews

with the families surveyed. Finally, the research presents the viewpoint of the beneficiaries of

condominiums contradictions and limits existing in the program, and the dichotomy between

the current discourse about decent housing and living conditions of the residents in the

apartments benefit from the Minha Casa, Minha Vida in Maracanaú.

Keywords: Housing Policy. My program, Casa Minha Vida. Right to Housing.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ADL Áreas de Desenvolvimento Local

BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento

BNH Banco Nacional de Habitação

CEF Caixa Econômica Federal

COHAB Coordenadoria de Habitação

COHAB-GB Companhia de Habitação Popular

CRAS Centro de Referência de Assistência Social

DI Desenvolvimento Institucional

FAFEG Federação das Associações das Favelas do estado da Guanabara CHISAM

Coordenação de Habitação de Interesse Social da Aérea Metropolitana do Grande Rio

FCP Fundação Casa Popular

FGTS Fundo de Garantia do Tempo de Serviço

HIS Habitação de Interesse Social

IAPs Aposentadoria e Pensões

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IPTU Imposto Predial e Territorial Urbano

PAH Programa de Arrendamento Residencial

PAIH Plano de Ação Imediata para Habitação

PDT Democrático Trabalhista

PIDESC Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e Culturais

PlanHab Plano Nacional de Habitação

PMCMV Programa Minha Casa, Minha Vida

PNH Política Nacional de Habitação

PNHP Programa Nacional de Habitação Rural

PNHU Programa Nacional de Habitação Urbana

PT Partido dos Trabalhadores

RMF Região Metropolitana de Fortaleza

SEINFRA Secretaria de Infraestrurura e Controle Urbano

SERFHA Serviço Especial de Recuperação de Favelas e Habitações Anti-higiênicas

SFH Sistema Financeiro de Habitação

SIMAHAB Sistema de Informação, Avaliação e Monitoramento da Habitação

SNH Sistema Nacional de Habitação

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .....................................................................................................................12

1 CAPÍTULO: A TRAJETÓRIA DA POLÍTICA HABITACIONAL................................16

1.1 OS PRIMÓRDIOS DA POLÍTICA HABITACIONAL BRASILEIRA........ .........................16

1.2 A POLÍTICA HABITACIONAL NA ERA VARGAS: INTERVENÇÃO DO ESTADO

“NOVO”, LEI DO INQUILINATO E PROCESSO DE FAVELIZAÇÃO.............................18

1.3 PRÉ DITADURA MILITAR E A POLÍTICA HABITACIONAL .........................................24

1.4 O REGIME MILITAR E O PROBLEMA HABITACIONAL ...............................................25

1.4.1 O desvelar de uma política habitacional na ditadura militar..........................................26

1.5 O FIM DA DITADURA MILITAR E O NASCIMENTO DE UMA “NOVA

REPÚBLICA”...........................................................................................................................29

2 CAPÍTULO: O PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA (PMCMV) .....................33

2.1 COMO SURGIU O PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA .....................................33

2.2 O DIREITO A MORADIA INSERIDO NO PMCMV ...........................................................34

2.3 ENTENDENDO A DIVISÃO SALÁRIAL DO PROGRAMA MINHA CASA, MINHA

VIDA.........................................................................................................................................36

2.4 AS VERTENTES DO PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA..................................41

2.5 UM BREVE HISTÓRICO DO MUNICÍPIO DE MARACANAÚ.........................................42

2.6 O ALUGUEL SOCIAL NO MUNICÍPIO DE MARACANAÚ..............................................43

3 CAPÍTULO: OS MORADORES DO ALUGUEL SOCIAL E O PMCMV......................49

3.1 CONHECENDO OS BENEFICIÁRIOS DO ALUGUEL SOCIAL ANTES DO PMCMV...49

3.2 OS DESAFIOS DOS MORADORES DO ALUGUEL SOCIAL ATENDIDOS PELO

PMCMV....................................................................................................................................54

3.3 O PMCMV NA ÓTICA DOS BENEFICIADOS.....................................................................58

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................................64

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .....................................................................................66

ANEXOS..................................................................................................................................69

INTRODUÇÃO

Este trabalho faz uma análise do Programa Minha Casa, Minha Vida no município

de Maracanaú-Ce, cidade inserida no contexto urbano da capital do estado, Fortaleza.

Neste sentido, a pesquisa foi um estudo de como se constitui a trajetória da

política habitacional brasileira e como esta política se insere no município de Maracanaú

através do Programa em questão, atendendo, em especial, às famílias do aluguel social1

presentes no município e que foram beneficiadas nos condomínios entregues em 2012,

apresentando seus limites e suas contradições.

Para realizar esta pesquisa alguns autores foram fundamentais, com conceitos e

orientações sobre a questão habitacional e as políticas de habitação no Brasil, tais como: Silva

(1988) e o processo histórico da política habitacional; Braga (1995) quanto ao entendimento

sobre a discussão da política de habitação popular no estado do Ceará; Bonduki (1998) e a

origem de uma política habitacional brasileira de fato, tendo em vista o lado social; Maricato

(2011) com um desabafo sobre suas experiências na da trajetória brasileira na luta por uma

política habitacional, entre outros.

Estes autores, contribuíram na perspectiva de uma avaliação do único programa

habitacional implementado no município em questão atualmente e sobre sua contribuição,

para a melhoria de vida das famílias do Aluguel Social beneficiadas.

As famílias pesquisadas habitavam em bairros diversos da periferia da cidade. A

grande maioria teve suas casas condenadas pela Defesa Civil, sendo quase todos os

entrevistados não originários do município, os quais recorreram à cidade devido à grande

quantidade de indústrias, pois Maracanaú é o maior polo Industrial do Estado e a (falta de

opção em suas cidades natais).

Algumas dificuldades foram bem avaliadas no decorrer da pesquisa tendo como

fonte principal os usuários já contemplados pelo PMCMV. Originários do município ou não,

está população será atendida de forma prioritária, pois são moradores do aluguel social

prioridade no Programa.

Foi observado que grande parte desta população vem de bairros periféricos, onde

o valor do aluguel social pago pela Prefeitura Municipal de Maracanaú ainda é aceito. Este

valor é de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) sem água e luz.

1 O aluguel social constitui manifestação da dimensão positiva do direito à moradia, íntima e

indissociavelmente ligado ao princípio da dignidade da pessoa humana.

Em relação ao local desta pesquisa, o contexto de criação do município está

relacionado à capital, Fortaleza, e a criação do Distrito Industrial, que se configurou como a

“mola-mestra” da ocupação do recém-criado município Maracanaú2. As construções de

enormes conjuntos habitacionais – como o Jereissati I e o II, o Timbó e o Acaracuzinho –

próximos ao Distrito Industrial viabilizaram a ocupação da cidade e a atração de relevante

comércio local.

Os bairros mais bem dotados de infraestrutura, equipamentos sociais e serviços

são justamente os conjuntos habitacionais e o centro da cidade, devido aos investimentos

constantes que esses locais vêm recebendo, em detrimento das áreas mais distantes do centro,

como os bairros nas extremidades do município: Luzardo Viana, Jari, Jardim Bandeirantes,

Cágado, dentre outros que possuem sérios problemas de saneamento, transporte e acesso a

serviços. Outra questão pensada é a da especulação imobiliária.

Em Maracanaú, cidade da região metropolitana de Fortaleza, local onde foi

realizada a pesquisa, a questão habitacional é um sério problema social que aflinge os

moradores do município em especial os de aluguel social.

A história da cidade está diretamente ligada à expansão do setor industrial

cearense, que definiu a ocupação do vazio urbano entre a capital e Maracanaú por meio da

instalação do chamado Distrito Industrial, e a construção dos conjuntos habitacionais da

região pela COHAB (antiga Companhia de Habitação, atual Coordenadoria de Habitação).

Para obter uma aproximação com os sujeitos desta pesquisa, foram selecionados

os condomínios Virgílio Távora I, II e III, situados no bairro Cágado na CE 065 em

Maracanaú-CE. No ano de 2012, mais de 600 (seiscentas) famílias foram beneficiadas com a

entrega de um imóvel pelo Programa Minha Casa, Minha Vida. Deste total foram pesquisadas

oito famílias do Aluguel Social.

O objetivo da pesquisa foi compreender até que ponto o Programa Minha Casa,

Minha Vida atende às reais necessidades dessas famílias, como elas se configuram dentro

deste programa, quais foram suas principais dificuldades, o processo de adaptação e como

estão conseguindo quitar as taxas para a permanência nos condomínios, a fim de contribuir

com uma política municipal direcionada de fato para esta população e compreender como os

usuários entendem o direito à moradia.

O interesse para pesquisar esta temática se originou na experiência como

estagiária de Serviço Social na Coordenadoria de Habitação durante um ano e meio, sendo

2 O município de Maracanaú foi criado em 1983, após aprovação em plebiscito que o desmembrou da cidade de

Maranguape.

possível manter contato com as famílias usuárias do programa habitacional do município

desde sua identificação a parti de encaminhamentos, do Centro de Referência da Assistência

Social – CRAS e da Defesa Civil, até á entrega dos imóveis. Sendo possível compreender a

dinâmica dessas famílias atendida pelo benefício e acompanhar a toda a espera delas até

receberem o apartamento.

Desde então com alguns elementos já recolhidos, iniciamos a pesquisa com o

propósito de analisar as melhorias nas condições de vida dos usuários, avaliando os limites e

as contradições do Programa a partir do recebimento dos apartamentos.

Do ponto de vista metodológico, esta pesquisa inicia-se, visando proporcionar

maior aproximação acadêmica com o tema. Foi feito também, um levantamento bibliográfico

sobre o tema discutido e entrevistas com oito famílias do aluguel social beneficiadas pelo

Programa Minha Casa, Minha Vida.

Assim trata-se de um estudo cujo objetivo é proporcionar maior conhecimento

teórico e empírico sobre o assunto para auxiliar na formulação de problemas mais precisos.

Também visa ajudar novos pesquisadores que tenham uma aproximação com o tema,

principalmente no município de Maracanaú.

A pesquisa se firmou na concepção metodológica da abordagem qualitativa,

avançando por seu caráter exploratório, estimulou o livre pensamento dos entrevistados sobre

os temas, com objetos e conceitos que foram levantados. Mediante instrumentos

metodológicos como entrevistas e conversas informais com as famílias beneficiárias, bem

como observação direta. Sendo possível detectar aspectos objetivos e subjetivos que

emergiram das narrativas dos sujeitos e de suas práticas. A finalidade foi atingida

compreendendo os sujeitos pesquisados em sua totalidade. Desenvolvemos um estudo das

famílias beneficiadas do aluguel social no contexto da política habitacional.

A escolha destas famílias, dentre todas as configurações de famílias que chegam a

Coordenadoria de Habitação – COHAB deu-se em primeiro lugar, pela extrema

vulnerabilidade em que já se encontravam; segundo, pela dificuldade de inserção no Programa

Minha Casa, Minha Vida. E, terceiro, pela perspectiva, depois de beneficiadas em relação a

trabalho e moradia como “melhoria de vida”.

Desta forma, o presente trabalho contribui para uma análise da conjuntura política

do Programa Minha Casa, Minha Vida na contemporaneidade no município de Maracanaú.

Está dividido em três capítulos:

O capítulo 1 apresenta um resgate histórico da política habitacional brasileira,

desde seus primórdios até a criação do PMCMV.

O capítulo 2 apresenta uma análise do Programa Minha Casa, Minha Vida no

âmbito federal, um histórico do Município de Maracanaú e como se configura o aluguel social

neste município.

O capítulo 3 traz as famílias do aluguel social e seus processos históricos levando

em conta suas dificuldades, anseios e conquistas. Aborda os limites e as contradições do

Programa e as mudanças na vida dos usuários, desde a esperança da casa própria à efetivação

desta “conquista”, com as melhorias, os problemas e as insatisfações que ela traz consigo.

CAPÍTULO 1

1 A TRAJETÓRIA DA POLÍTICA HABITACIONAL

A problemática da moradia nas sociedades capitalistas é estudada desde o final do

século XIX. Friedrich Engels (1982) via a precarização da habitação na Alemanha como

sintoma da revolução industrial. Essa precarização agravava-se pelas más condições de vida

dos operários das fábricas em decorrência do grande êxodo rural.

A extensão das grandes cidades supervaloriza os terrenos do centro empurrando

os trabalhadores para as periferias onde se localizavam as residências operárias cada vez

mais escarpas e caras. Essa escassez é percebida por Engels como manifestação da

desigualdade implementada pelo sistema capitalista. Ou seja, essa desigualdade era algo

necessário ao capital para à expansão e exploração da existência de uma classe que não tenha

outra coisa para vender a não ser sua força de trabalho.

De acordo com Engels (1982), a crise da habitação é um produto necessário á

ordem social burguesa, a penúria da habitação manifesta-se um problema quando afeta a

produção e reprodução da força de trabalho. O autor critica a solução apresentada pela

burguesia para essa problemática que supostamente tentaria transformar operários em

proprietários de suas moradias. Porém, a mesma proposta não afeta a exploração que o

trabalhador é submetido, pelo contrário, essa exploração impossibilita que o trabalhador

passe de operário para proprietário devido aos altos custos dessa mercadoria.

Como destaca a autora:

O Estado, enquanto guardião do processo de acumulação capitalista não quer

e não pode resolver o problema habitacional da classe trabalhadora. Isso

porque parte dos recursos arrecadados da própria população é empregado

para criar a infraestrutura necessária ao processo de acumulação, ficando o

consumo e as medidas de produção e reprodução da força de trabalho em

segundo plano devido à abundância da oferta de mão de obra no mercado (SILVA, 1989).

No Brasil esse processo não é diferente, exploração da classe trabalhadora e os

altos aluguéis pagos por esta classe faz com que surjam as primeiras questões voltadas para

uma Política Habitacional.

1.1 OS PRIMÓRDIOS DA POLÍTICA HABITACIONAL BRASILEIRA

De acordo com o autor Silva (1989), o problema habitacional brasileiro está

relacionado a três aspectos fundamentais. O primeiro leva à questão fundiária urbana, com

excessiva valorização dos terrenos, crescimento desordenado que produz um desequilíbrio na

estrutura interna da cidade. Segundo, a habitação é importante reprodutora do capital por ser

do consumo social médio contribuindo para fixação do valor da força de trabalho. O terceiro

aspecto é que o Brasil não destina recursos necessários para o investimento em habitação

popular no país.

A habitação, na sociedade brasileira, caracteriza-se por um processo de

superexploração desenvolvido no capitalismo com a retirada do salário da classe trabalhadora

no valor correspondente para o custeio de sua habitação, que, na maioria das vezes, são

precárias.

A saída para esse problema aparece em forma de favelas, cortiços, casas de

cômodos, palafitas, vilas operárias, vilas populares, parques proletários, conjuntos

habitacionais, moradia autoconstruidas em subúrbios etc.. A precariedade da moradia

apresenta-se em cerca de 70% da população nas cidades. Com isso, faltam serviços essenciais

tais como, luz, água, saneamento básico, coleta de lixo, pavimentação, escolas, postos de

saúde e atividades de lazer.

Segundo a autora:

Longas distâncias geográficas de localizações das periferias para o centro

fragmentam a possível solidariedade que possa ajudar na formação de

consciência de classe dos superexplorados. A partir desse entendimento

percebe-se que as políticas exercidas nas comunidades são historicamente

políticas de controle e de exclusão, hora com um colorido populista, hora

marcada por forte repressão (SILVA, 1989).

Verifica-se que a forma de controle sobre as classes populares a partir de sua

moradia muda com a conjuntura política. Num entanto, o objetivo último tem sido sempre o

desenvolvimento do controle social sobre as massas. “Para isso, as classes populares são

atingidas pela ação do Estado através da tríade: controle, repressão, exclusão (SILVA, 1989)”.

No contexto histórico brasileiro os primeiros cortiços surgiram nas cidades de São

Paulo e Rio de Janeiro. Com a economia cafeeira de São Paulo surgem os centros bancários,

econômicos e industriais. Há uma grande concentração de trabalhadores, porém com o

mercado instável e em crise, a moradia alugada era a grande forma de habitação.

Os trabalhadores mal remunerados naquela época, já eram maioria e os cortiços

mostravam-se uma alternativa viável. Para os trabalhadores mais qualificados com algum

estudo ou para os supervisores das fábricas existiam as vilas, um conjunto de pequenas casas

unifamiliares geminadas.

1.2 A POLÍTICA HABITACIONAL NA ERA VARGAS: INTERVENÇÃO DO ESTADO

“NOVO”, LEI DO INQUILINATO E PROCESSO DE FAVELIZAÇÃO

A ditadura Vargas foi o Estado Novo (1937 – 45) durante a chamada “era

Vargas”, o clima político, cultural e econômico abriu espaço para o tema da habitação no

Brasil de forma jamais vista antes, devido ao fato de as questões econômicas interessarem

tanto ao setor público quanto ao setor privado como estratégia de desenvolvimento nacional, o

problema da moradia afetava diretamente a vida dos trabalhadores, pois absorvia boa parte do

salário que eles ganhavam nas fábricas.

Preocupado com a questão sanitária, Vargas implementou o projeto da habitação

social como um de seus projetos nacional-desenvolvimentistas. Havia na época a ameaça de

mobilização operária e acreditava-se que não havia como aumentar a produtividade nas

fábricas sem uma moradia em condições básicas, considerada fator primordial para a

economia e a industrialização do país.

A habitação também assumia uma dimensão ideológica, política e moral do

trabalhador pois, com ela o operário seria um “novo homem” dono do seu lar e de sua vida.

Tratava-se, todavia, de um “trabalhador modelo” forjado pelo capitalismo como principal

base de sustentação política do sistema.

Houve nesse período um incomodo em relação à Academia pela falta de estudos

relacionados à problemática da habitação. Surgem as primeiras entidades interessadas na

investigação e em debater sobre o tema, como o Instituto de Engenharia, que promoveria em

1931 o I Congresso de Habitação e o Instituto de Organização Racional do Trabalho - Idort,

este responsável por promover em 1941, as Jornadas de Habitação Econômica.

Pela primeira vez a problemática habitacional é debatida e estudada por cientistas.

Avaliava-se a questão não só do ponto de vista político e econômico, mas também sua

relevância social e os impactos causados na população mais vulnerável.

É nesse período que outros profissionais passam a se interessar pela problemática

da habitação operária. E em outras épocas como na República Velha, eram os médicos e

sanitaristas que se preocupavam com este assunto. Depois vieram os engenheiros e com eles,

um leque de outros profissionais.

Deste modo, o tema da moradia tornou-se uma reflexão multidisciplinar. Com a

ampliação do ensino superior e a burocracia estatal na era Vargas, surgem novas propostas de

melhorias nas condições de moradia. São realizados diagnósticos das condições de habitação

com o intuito de proporcionar soluções habitacionais para a população de baixa renda, entre

as quais a casa própria, levando em conta aspectos físicos, institucionais, urbanísticos,

jurídicos, entre outros.

Os cortiços passam a ser considerados uma ameaça à saúde pública, sendo

recomendada pelo Conselho Federal de Saúde do Distrito Federal a remoção dos moradores

dessas unidades habitacionais para os arredores das cidades. Com isso, a habitação proletária

urbana sofre uma verdadeira “limpeza” no Rio de Janeiro, então capital da República. Muitos

cortiços vão abaixo para dar lugar a largas avenidas e a população operária é empurrada para

a margem da sociedade.

As favelas passam a constituir alternativas privilegiadas para os mais pobres, de

modo que, em 1937, o Código de Obras representa uma tentativa de limitar a expansão das

favelas. No artigo 347(do referido código), estabelece a eliminação e substituição das favelas

por “núcleos de habitação do tipo mínimo”, preconizando a construção de habitações

populares ou “habitações proletárias” a serem vendidas para as pessoas reconhecidamente

mais pobres.

A construção de novas casas e a melhorias das existentes estavam proibidas nas

favelas. A favela era reconhecida como uma doença social que precisava ser liquidada.

Em 1937, é criado o Parque Proletário no Rio de Janeiro. Este parque é a primeira

tentativa de uma Política Habitacional na capital, porém não passa de currais eleitorais,

expressando o caráter autoritário e populista do governo, pois tem direito ao Parque quem tem

cartão político.

Observa-se a intervenção do Estado de forma indireta no setor da habitação em

relação aos cortiços, valendo-se de medidas legais de cunho, sanitaristas, que ameaçam o bom

convívio da sociedade burguesa devido à proximidade das casas. O mesmo não pode ser visto

em relação às favelas, que eram tratadas de forma repressiva pelo Estado.

A intervenção direta do Estado no setor habitacional acontece ainda em 1937, com

a criação das carteiras prediais, fato tem a ver com o contexto econômico e político da época,

marcado pelo agravamento das condições habitacionais do meio urbano pelos impactos das

crescentes taxas de urbanização, em decorrência do redirecionamento do setor agrário para a

indústria.

Efetivamente, a criação das carteiras prediais dos Institutos de Aposentadoria e

Pensões - IAPs representou um mecanismo através do qual os imensos recursos que afluíam

aos cofres dos IAPs e que não tem destinação imediata (tais recursos provem do depósito

compulsório de empresas e trabalhadores para o pagamento futuro de aposentadorias e

pensões). Podem financiar a construção civil, não só na habitação social (Planos A e B), mas

também no Plano C, que financia a incorporação imobiliária para os setores médios (FARAH,

1984; MELO, 1987).

O quadro habitacional é agravado com a criação da Lei do Inquilinato,

estabelecendo controle dos valores dos aluguéis e estimulando a venda das casas que não são

acessíveis aos trabalhadores com baixa remuneração, incentivando, assim, a proliferação das

favelas, que para muitos era a única forma de habitação acessível.

No Estado Novo, Vargas intervém na relação entre inquilino e proprietário por

meio de uma sequência de leis dos inquilinatos durante décadas. Neste período, há um

congelamento de preços nos aluguéis o que representa uma intervenção direta do Estado. A

política do Estado Novo incentiva a difusão da propriedade privada para a classe média e

melhor remunerada, deixando de ônus para a população mais carente a solução para sua

moradia, a casa própria é colocada para o trabalhador como a única forma de morar na cidade

e não á margem dos grandes centros.

O congelamento dos aluguéis, é uma das principais causas das transformações nas

formas de provisões habitacionais no Brasil, desestimulando à construção privada e

transferindo para o Estado e para o próprio trabalhador o encargo de produzir sua moradia. Na

década de 1940, ocorre uma das maiores crises habitacionais do país, agravando o surgimento

de formas alternativas de moradia, como as favelas.

A situação piora com os despejos judiciais de locatários de baixa e média renda,

devido às demolições de casas, cortiços e edificações para a construção ou alargamento de

avenidas durante o Estado Novo.

No dia 1º de maio de 1946, é criada a Fundação Casa Popular – FCP, através do

Decreto de Lei 9.218, representando o primeiro órgão em âmbito nacional voltado para

promover habitação à população de baixa renda.

A casa própria, aspiração ideologicamente imposta pelas medidas anteriores, é

explicitamente utilizada, pela primeira vez, como meio de “angariar legitimidade e alcançar

penetração junto aos trabalhadores urbanos” (AZEVEDO, ANDRADE, 1982).

Com a intervenção do estado no setor habitacional na era Vargas, o mais

importante é a aceitação da ideia de que o Estado deveria garantir o mínimo para os

trabalhadores urbanos a custos compatíveis com o salário.

Embora governo jamais tenha alcançando esse objetivo, a partir dos anos 30, é

criado “um certo” consenso nas elites quanto à necessidade da intervenção estatal. Este

consenso tem por pretensão impedir que o custo da moradia subisse a ponto de comprometer

o salário. A questão das más condições de moradia poderia, entretanto, comprometer o lema

político de Getúlio de “pai do trabalhador”.

A intervenção do Estado é fundamental não só como produtor e financiador em

relação aos aluguéis, mas, também como protetor dos locatários de inquilinos

“inescrupulosos” que sabiam que a população não tinha como atender às exigências de

higienização impostas pelo Estado. Desse modo, o governo assegura uma condição mínima de

habitabilidade.

O Estado intervém nos aluguéis através da lei do Inquilinato, considerado por

alguns autores uma medida de maior impacto no setor habitacional pelo Estado no regime

varguista.

Conforme assinala Bonduki:

As diversas versões da lei do inquilinato promulgadas entre 1942 e 1964, toda

restringida a livre negociação dos aluguéis, tiveram consequências tão amplas

que modificaram por completo não só o relacionamento entre proprietários e

inquilinos como a própria produção de moradia para o seguimento de baixa e

media renda. A lei expressa o grande apoio que a tendência intervencionista

do Estado havia conquistado: embora ela limitasse drasticamente o direito de

propriedade, foi defendida pela própria iniciativa privada, como expresso

apoio da Fiesp.3” ( BONDUKI, 1998).

A locação de imóveis é a prática mais comum no Brasil da década de 1940, a tal

ponto que o valor do aluguel é usado como base de cálculo para definir o preço dos imóveis,

o imposto predial e a taxa de esgoto. Quando um prédio é posto á venda leva-se em conta o

seu valor locativo.

Boa parte da população nesta década, residi em moradias alugadas, não obstante

já existam formas alternativas de moradias como os loteamentos de periferias, onde o

trabalhador pode comprar um lote e construir sua casa.

Qualquer cálculo que pretendesse determinar o gasto com habitação ou orçamento

familiar utiliza o aluguel como base. O item para o aumento de preço no padrão de vida dos

3 Federação das Industrias do Estado de São Paulo

operários levaria em conta somente o aumento dos aluguéis referente ao custo da habitação.

Segundo Oliveira:

A lei do inquilinato seria, portanto, mais um instrumento da política

econômica que visava reforçar a inversão de capital nas empresas que

operavam de acordo com a nova base de acumulação. Nesse aspecto, ela se

enquadrava no projeto de substituição dos mecanismos de mercado por

controle administrativo, a fim de permitir o funcionamento não-automático

da economia (OLIVEIRA, 1971).

A permanência do congelamento dos aluguéis dá-se pela via de instrumento de

defesa da economia popular, como estratégia de destruição da classe improdutiva rentistas (a

classe burguesa) e pelas medidas para reduzir o custo de reprodução da força de trabalho e

instrumentos de política econômica, para acelerar o crescimento do setor industrial e assim

legitimar o Estado populista.

De acordo com a Associação Comercial de São Paulo:

A crise da habitação que atingiu os não-proprietários nas principais cidades

brasileiras a partir da década de 1940 foi consequência da profunda mudança

no mercado de provisão habitacional. Embora influenciada pela conjuntura

econômica da Segunda Guerra, essa mudança foi estrutural e era parte dos

novos rumos tomados pela economia e pela sociedade brasileira. A falta de

residências quer em São Paulo, quer no Rio de Janeiro ou em outra cidade

importante do Brasil [...] não foi criada pela guerra, mas apenas agravada por

ela (ASSOCIAÇÃO COMERCIAL, 1944)

De fato, a falta de materiais de construção em decorrência da guerra reduz o ritmo

de construção de moradias, num contexto de escassez generalizada, câmbio negro e

especulação dos bens de consumo populares. “No entanto, a crise é consequência das

modificações estruturais no sistema produtivo e nas formas de provisão de moradia, e

enquadrava-se no inicio do processo de predominância da estrutura produtiva de base urbano-

industrial. (OLIVEIRA, 1971)”

A permanência por mais de vinte anos de uma legislação que supostamente visa

proteger os inquilinos esteve longe de lhes garantir tranquilidade. A Lei do Inquilinato não

impediu que os locadores, buscando melhorar a remuneração, utilizassem mecanismos e

expedientes legais, ilegais, coercitivos, violentos ou amigáveis para se esquivar ao espírito da

lei, “Não respeitam a lei; fraudam-na de maneira mais sórdida e tão fértil foi à colheita do

crime que da proibição legal de se elevarem os aluguéis, encontraram meios de obter lucro e

aumentos compensadores e imediatos que dentro da lei não poderiam auferir (O

OBSERVATÓRIO ECONÔMICO E FINANCEIRO, 1945).”

Neste mesmo contexto o intervencionismo nas favelas não havia sido superado.

Durante o governo Dutra, o Estado passa a realizar acordo com instituições de pesquisas e

intervir de forma direta nas favelas do Distrito Federal, através da Fundação Leão XIII.

A habitação popular é um tema bastante explorado pelos jornais, principalmente

pela impressa comunista que na segunda metade da década de 1940, já chega a oito capitais

do país, publicando sempre reportagem sobre a infraestrutura urbana dos bairros populares e

defendendo a habitação social, com a visão de um grupo político influente e formador de

opinião no período de 1945-1947.

Em 1947, entre um pacto da Igreja e o Estado, a fim de frear a disseminação

comunista que já chega às favelas, a Fundação Leão XIII 1947- 1954 atua em 34 favelas

através da criação de Centros de Ação Social, com ambulatórios e escolas em oitos delas.

Além da ação assistencialista, interfere na urbanização de algumas delas facilitando a

instalação de água, luz e esgoto (NUNES, 1980).

A crise da moradia aguça ainda mais o interesse pelo tema, pois este já não

atinge mais só a população de baixa renda. A crise chega à classe média, formadora de

opinião pública e que nessa época mora predominantemente em casas alugadas.

Nas reportagens e debates da época, é generalizada a crítica ao modelo

produzido pelo mercado rentista, cujo resultado mais visível é a habitação coletiva e precária

construída para o mercado de locação – o cortiço – e a opinião de que é preciso uma

intervenção do Estado, tanto na produção e financiamento como na viabilização do acesso à

casa própria na chamada zona rural (BONDUKI, 1998).

As favelas passam a ser vistas como um problema nacional considerando seu

aspecto social, econômico e legal. Em 1952 cria-se o Serviço de Recuperação das Favelas,

órgão subordinado a Secretaria de Saúde e Assistência deixando de ser subordinado ao

Departamento de Segurança Pública. Tratando-se da política de construção de moradia há

uma diminuição na construção de novos conjuntos habitacionais, devido à falta de recursos,

decorrente da alta inflação e da fixação dos preços das casas.

Nesse mesmo jogo político, há uma intensificação do clientelismo e do

favoritismo, bem como a diminuição do tamanho dos conjuntos residenciais e das próprias

unidades habitacionais. Este modelo utilizado para implementação da política habitacional,

fragmentada e clientelista entra em colapso devido à alta inflação e às taxas fixas das parcelas

das casas.

Nesse período, em termos de intervenção nos assentamentos considerados

subnormais, é criado em 1956 o Serviço Especial de Recuperação de Favelas e Habitações

Anti-higiênicas – SERFHA, que se propõe a ampliar a atuação além das favelas até cortiços,

casas de cômodos, vilas e etc., procurando evitar o paralelismo de esforços e falta de

comunicação, ao se propor a coordenar os vários órgãos municipais. A filosofia a ser adotada

seria “não ofender a dignidade do favelado” (LEEDS & LEEDS, 1978).

Verifica-se ai, que se consolida a mudança de visão no que se refere à favela e

seus moradores, embora na prática e em termos de opinião pública, era vista da seguinte

forma como assinala os autores:

A favela continua a ser “concebidas como problema no pré suposto que sua

população se constitui, num dos extremos do mal de assassinos, ladrões,

assaltantes, maconheiros e viciados em drogas, em outro extremo do mapa,

de comunistas e outros tipos de ameaças em termos políticos e sociais; num

terceiro e mais brando extremo, de pobre ignorante, não educado, mal-

adaptados, imigrantes rurais, caipiras, ou, no melhor dos extremos, de seres

humanos razoáveis, mas tristes e pobres, morando em cabanas, criando

promiscuidade, um câncer social urbanístico na sociedade”(SILVA apud

LEDDS, 1978).

1.3 PRÉ DITADURA MILITAR E A POLÍTICA HABITACIONAL

Entre os anos de 1961 e 1964, há uma conjuntura específica na política nos

governos de Jânio Quadros e João Goulart. No Governo de Jânio há um processo crescente de

favelização e alastramento de cortiços e habitações precárias, sem nenhuma condição de

moradia ou acesso a água, luz e saneamento básico, fortalecendo as autoconstruções (favelas)

e sem registro de maiores índices de urbanização.

Diante dessa situação, Jânio cria duas medidas. A primeira é a criação do Plano de

Assistência Habitacional que deveria fortalecer FCP com a ressalva de introduzir um reajuste

nas taxas de valores fixos de acordo com o salário mínimo do trabalhador. Nesse mesmo

período foi criado o Instituto Brasileiro de Habitação o antecessor do Banco Nacional de

Habitação – BNH, a fim de ocupar os vazios da política habitacional.

A segunda medida adotada volta-se para a ampliação do fundo de recursos que é

de 1% da folha de pagamento do trabalhador a cargo do empregador, adicionando 50% do

imposto sobre o fósforo e 40% sobre a bebida, além de uma taxa de habitação cobrada através

de um selo referente a contrato do imóvel, bem como reajuste compulsório.

Nesse contexto é possível observar a política excludente definida por Jânio

Quadros que coloca como critérios de acesso à casa própria, o tempo de residência na cidade,

a estabilidade no emprego e a capacidade do trabalho. Por outro lado, o Instituto Brasileiro de

Habitação amplia as fontes de recursos e prevê a correção monetária, medidas que

posteriormente são adotadas pelo BNH.

Jânio renuncia em 25 de agosto de 1961, assumindo o cargo João Goulart. Em

1962 o país vive uma crise: amplia-se o movimento grevista e as lutas salariais; os

movimentos de massa expandem-se para o meio rural; a criadas as ligas camponesas, e nesse

mesmo período, levantam a bandeira os sindicatos rurais de apoio às reformas de base.

Conforme assinala Vieira:

Nessa conjuntura de efervescência política e de declínio econômico a

questão habitacional para o governo de João Goulart, foi contemplada quase

tão-somente pelo planejamento governamental que considerou a necessidade

de coordenação de recursos e atividades desenvolvidas pelos órgãos

encarregados da habitação: Carteira Imobiliária dos Institutos e Caixas de

Aposentadorias e Pensões e FPC; incremento à iniciativa privada; apoio à

construção civil; estudo e pesquisa sobre residências e criação do Conselho

Federal de Habitação, como órgão executor do planejamento governamental

(VIEIRA, 1983).

Em 1963 o déficit habitacional do país gira em torno de 5 milhões de unidades e o

problema da moradia também já atinge, em grande escala a classe média. No inicio da década

a SERFHA foi transformada na Coordenadoria de Serviços Sociais do Estado, com maior

abertura para o diálogo entre a comunidade e os representantes governamentais.

O controle e a repressão voltam às favelas, com o fechamento da Coordenadoria

de Serviços Sociais do Estado e a criação da Companhia de Habitação Popular - COHAB-GB.

Em 1963, as comunidades criam a Federação das Associações das Favelas do estado da

Guanabara – FAFEG e a partir de 1964, passam a sofrer uma forte repressão do Estado por

serem consideradas comunistas.

1.4 O REGIME MILITAR E O PROBLEMA HABITACIONAL

Ao assumir o poder, o governo militar se defrontou com uma problemática

social com dois eixos fundamentais: no primeiro, a situação crítica vivenciada pelas massas

urbanas com o crescimento do exército industrial de reserva e com o poder aquisitivo

deteriorado pela elevada inflação; no segundo, a questão rural acenada pelo governo anterior,

com a promessa de reforma agrária. Conforme afirma Azevedo e Silva (1989), “para enfrentar

esse problema, o governo cria o BNH e o IBRA como propostas de soluções para a cidade e

para o campo, tendo em vista ocupar os vazios deixados com o fechamento político, pois o

governo da Revolução interessava ganhar legitimidade junto aos setores populares.”

1.4.1 O desvelar de uma política habitacional na Ditadura Militar

Castello Branco, general militar, foi o primeiro presidente da República na

Ditadura Militar em 15 de abril de 1964. Ele tem em seu governo o plano habitacional, como

sua primeira grande proposta, porém esse plano tem como função comprometer o trabalhador

com a propriedade e com o regime, criando uma ideologia de pertinência (obediência e

gratidão) e transformação a fim da manutenção do equilíbrio social. Castelo Branco cria um

programa casas-embrião nas áreas mais afastadas do Rio de Janeiro a fim de acomodar a

população favelada.

Com a criação da Coordenação de Habitação de Interesse Social da Área

Metropolitana do Grande Rio – CHISAM, foi apresentada a opção de saírem das áreas de

favelas e passarem as ser “proprietárias” de uma habitação digna, em locais satisfatórios e em

condições que elas pudessem pagar. Nesse contexto a favela é tratada como um déficit de

moradia que se agrava em função da crise habitacional e da urbanização acelerada além, da

subversão perigosa ao regime militar, acredita-se que na favela existe um reduto comunista.

A super exploração do solo de urbanização as más condições de vida e de trabalho

e a da falta de acesso aos grandes centros não são levados em conta no processo de não

“recuperação” desta população vista pelo governo como mera mão de obra barata.

Desse modo, as favelas não acabam e nem são contidas de modo que após algum

tempo de permanência em conjuntos habitacionais, grande parte dos favelados removidos

abandona os conjuntos habitacionais, colocando em questão a “solução habitacional” que o

governo lhe havia oferecido. Os moradores do conjunto são substituídos por quem apresenta

melhores condições financeiras e o programa de remoção gera efeitos imprevistos pelos

planos governamentais, ao realimentar o aumento da favela, gerar distorções do sistema

habitacional e permitir a mobilidade geográfica da população atingida que não consegue se

fixar na nova habitação, alterando a clientela dos conjuntos habitacionais (VALLADARES,

1980).

Esse processo tem como causas: a grande distância que separa os conjuntos

construídos do mercado de trabalho dos ex-favelados; inadequação do programa aos estratos

populacionais de baixa renda, pelo valor da prestação e custos adicionais com transporte,

condomínio, imposto predial, taxa de lixo, água, luz e esgoto; tamanho e qualidade da

construção das casas oferecidas; e a natureza compulsória do programa (VALLADARES,

1980).

A partir da década de 70 os conjuntos habitacionais, afirma-se como a única

solução para o problema habitacional do País. O BNH transforma-se, em 1971, em banco de

segunda linha, tendo como justificativa a necessidade de se eximir das constantes críticas

recebidas em decorrência das falhas dos primeiros programas habitacionais e da necessidade

de maior flexibilidade. Com isso, o BNH, cria uma complexa rede de intermediários e de

executores dos programas habitacionais representados: pelos agentes promotores, que

desempenham a função de organizar, promover e acompanhar o desenvolvimento dos

programas, de acordo com as normas vigentes; pelos agentes financeiros com a função de

aplicar e recuperar os recursos emprestados, agindo como seu mutuário e como mutante dos

benefícios finais; agentes depositários que recebem e mantém, em depósito, recursos em

nome do SFH; pelos agentes especiais definidos em lei ou ato próprio do então BNH, com

atribuições especificas; e pelos agentes para atividades complementares, que colaboram com

o SFH ou agem em seu nome no desenvolvimento de atividades complementares, em especial

as de natureza técnica (BNH, DOCUMENTA, 1974).

Em dezembro de 1971, a Lei 5.762 define o BNH como empresa pública, porém

este é colocado em uma posição de segunda linha, ou seja, não opera diretamente com a

clientela. Atua em diversos setores por intermédio de centenas de agentes espalhados por

todo o Brasil, e o esquema adotado passa a basear-se num sistema financeiro de comando

centralizado e execução descentralizada.

Em 1973, apenas uma parte dos recursos é repassada para o BNH para os

empréstimos habitacionais; o restante do dinheiro está livre para transações mais lucrativas,

de acordo com os interesses dos agentes.

Essa realidade faz crer que o SFH não é instituído para financiar a habitação de

interesse social, embora seus idealizadores tenham clareza de que representa as camadas

populares organizadas, mas para financiar a construção cível e grandes programas que

garantissem lucratividade.

Isto pode ser ilustrado com o seguinte trecho da carta de Sandra Cavalcante4 ao

Presidente Castelo Branco, encaminhando a proposta de criação do BNH: “Por último, mas

não menos importante, é preciso não abandonar a população da favela. Na realidade, ela é

4 Ex- secretaria de Serviço Social do Estado do Rio de Janeiro em 1960 e Presidente no BNH durante um

período do governo de Castelo Branco (1964 -1967).

muito maior do que se vê nas favelas, pois elas se somam às casas de cômodos, às águas-

furtadas, aos porões etc. Essa gente tem o poder aquisitivo mínimo, mas é gente. Para eles

deverá ser mantido esse Fundo de Assistência Social, previsto no texto de forma ampla, para

ser posteriormente estudado e regulamentado. Se essa faixa da população não for atendida,

Plano ficará falho. Poderá ajudar a construção civil a se recuperar; poderá atuar

brilhantemente na abertura de frente de trabalho; poderá melhorar as empresas médias e

pequenas de produção de material de construção; e poderá dar destino melhor a capacidade de

poupança dos mais bem aquinhoados. Mas, se atender à faixa proletária (salário mínimo) terá

fracassado no seu objetivo social. Os recursos do Plano serão fatalmente desviados apenas

para os que suportam os ônus da compensação inflacionária a ser instaurada” (BNH

DOCUMENTA 1974).

Pode-se observar, com a citação acima, que a denominada função social do BNH

é sufocada pela obstinação da lucratividade, mesmo quando tenta sustentar programas de

grande alcance, voltados para população de 0 a 03 salários mínimos, incluindo a população de

rendimentos instáveis como no caso PROMORAR.

Por outro lado fica claro que a política social não constitui nenhum ato espontâneo

e nenhum ato isolado do Estado, mas sim se situa num processo social onde o contexto

representado pela estrutura social é indispensável para compreensão e explicação da política

em consideração, ou seja, as políticas sociais são partes de um processo social que é

basicamente histórico, se leva em conta os sujeitos sociais que se articulam em torno de seus

interesses.

Em 1975 o BNH adota as seguintes medidas: financiamento aos estados e

municípios de 100% dos investimentos em infraestrutura; permissão para utilização do FGTS

na aquisição da casa própria para amortização ou parcial do débito, ou com poupança na

aquisição de uma habitação.

Tais medidas, só poderiam ser possíveis devido à seleção feita pela COHAB

priorizando os clientes como maior poder aquisitivo entre três e cinco salários mínimos. Em

1979, no governo Dutra nasce, novas propostas de políticas habitacionais populares, com a

criação do Programa de Erradicação da Submoradia – PROMORA.

Em 1983, o BNH entra em sua pior crise divido a inadimplência generalizada. A

redução drástica da captação de recursos como também imóveis sem comercialização, devido

à política de austeridade. No ano seguinte, o banco da à última cartada para tentar salvar o

Sistema Financeiro de Habitação – SFH da crise financeira, a fim de ter alguma credibilidade

em meio a uma revolta populacional. Para essa mudança de imagem, o BNH se coloca como

um banco de bem-estar social e baixos custos da habitação popular, institucionalizando os

mutirões e criando Projeto João-Barro.

Com este esquema operacional os sistemas financeiros que mais se beneficiam

são os agentes estaduais devido às altas taxas de juros recebidos pelos financiamentos e pelos

repasses do BNH a fim de captar recursos para o SFH.

1.5 O FIM DA DITADURA MILITAR E O NASCIMENTO DE UMA “NOVA

REPÚBLICA”

A repressão social que o vive o país nos anos de 1960, contribui para o resgate da

vida social e para a irradiação do movimento social popular a partir da década de 1970, que

submergem dos porões da clandestinidade. A mesma dívida social inspira a Campanha das

Diretas Já e força compromissos do bloco político, que propõe assumir uma “transição

democrática” no país, dando margem a implantação do que se auto proclamou de uma nova

República. “Com a ‘Nova’ República, brota, também, o compromisso da estruturação de uma

“nova” política habitacional, como uma das promessas de resgate da divida social. (SILVA,

1989)”.

O Brasil vem passando por uma nova conjuntura política que começou a ser

construída em 1977, com a reorganização da sociedade civil. Nesse processo há o surgimento

de um sindicalismo combativo, com a resistência política e a criação do Partido dos

Trabalhadores - PT. Também ocorre a conquista de vários governos estaduais pelo Partido do

Movimento Democrático Brasileiro - PMDB e pelo Partido Democrático Trabalhista - PDT o

que acaba culminando com o enfraquecimento do regime militar, dando voz ao movimento

por eleições diretas para presidente da república que toma conta do país a partir de 1983 e

unem forças populares e partidos de oposição.

No que se refere à política habitacional herdada pela “Nova” República, esta é

profundamente remendada por meio de ajustes diante da crise econômica, que atinge o SFH,

cuja preocupação continua sendo o fortalecimento do modelo empresarial utilizado pelo

BNH.

Já em 1985 com Sarney na presidência há uma reforma no setor público no que se

refere á política habitacional no âmbito urbano. Admiti-se, enfim que o processo de

urbanização exige uma solução global, devendo ser evitadas a soluções tópicas e setoriais,

separando a política urbana de uma política rural.

Há uma preconização para o atendimento das carências urbanas, principalmente

nas grandes periferias onde está concentrada boa parte da população de baixa renda. Essa

prioridade vem em forma de incentivos e investimentos sociais na aérea de habitação popular,

saneamento básico, transporte, educação, saúde, nutrição e segurança, a cargo das prefeituras

ou entidades metropolitanas, como estratégias que maximizem a geração de empregos.

Sendo assim, a pobreza e a desigualdade social são assumidas no discurso da

“Nova” República, não como marginais, mas como estruturais, e, para fazer face a elas, o

governo define o que denomina “prioridades sociais”, cuja atenção se diz voltar

especificamente para o combate à fome, à miséria e ao desemprego, expresso concretamente

por um elenco de programas (SILVA, 1989).

Os programas que compõe as “prioridades sociais” da “Nova” República são os

seguintes: na aérea de alimentação popular o Programa de Alimentação Popular, o Programa

de Suplementação Alimentar, o Reforço Alimentar ao Programa de Creches, o Programa

Nacional do Leite Para Crianças Carentes; no Atendimento das Necessidades Básicas: Saúde,

Educação Básica. Habitação e Melhoria Urbana, Saneamento Básico, Justiça-Multirão Contra

Violência e Assistência Social; Reorganização e Reforma Agrária; Projeto Nordeste; Irrigação

e Transporte Urbano de Massa (SILVA, 1989).

Na trajetória da Política Habitacional Brasileira, percebe-se que ela tem sido

pautada pela insuficiência, precariedade, exclusão e autoritarismo, pelo emprego, explícito ou

velado, da repressão ou do controle. O modelo clientelístico e empresarial adotado tem-se

revelado insuficiente e inadequado, ao transformar a habitação e a infraestrutura urbana em

uma dívida conquistada pelo favor.

Mesmo com todo discurso em torno dos movimentos sociais a política

habitacional brasileira ainda não tem passado de um artifício, acionado nos momentos de crise

econômica, principalmente quando se fala nas populações de baixa renda. Esta prática tem

sido apresentada por medidas insignificantes face a dimensão do problema, além de mostrar

um caráter autoritário ou omisso.

Entre a crise do SFH e a extinção do BNH em 1986, cria-se um hiato em relação à

política habitacional no país, com desarticulações, fragmentações institucionais, perda de

capacidade decisória, além da grande redução dos recursos disponibilizados para

investimentos na área.

Com a transição do regime autoritário para o democrático e a centralização da

política habitacional na Caixa Econômica Federal, é possível ver a falta de compromisso do

Estado com o setor habitacional, sendo assim negligenciados os problemas herdados do BNH.

A principal finalidade BNH é incorporada na Caixa Econômica Federal, apenas

como um setor, segundo Bonduki (2008:75) “ao invés de uma transformação, ocorreu um

esvaziamento e pode-se dizer que deixou propriamente de existir uma política nacional de

habitação.”

A partir do governo Sarney (1985-1990) e o governo Collor (1990 – 1992), uma

das principais características dos financiamentos da Caixa Econômica Federal, é a elitização

dos beneficiamentos das casas populares, além de um peculiar clientelismo na distribuição de

verbas.

Com Itamar Franco (1992- 1994), não há mudanças devido ao rombo, estimado

em 20 bilhões de dólares do SFH. Já no Governo, Fernando Henrique Cardoso (1995- 1998) e

(1999 – 2002), começa um novo pensamento sobre a política habitacional, neste governo é

criado dois programas o Habita-Brasil e o Morar- Melhor, visando concluir obras iniciadas no

governo anterior, porém, não há uma parte significativa de recursos que possibilitem o

financiamento de programas focados principalmente, na população de baixa renda.

Em 2003, o Governo Lula criou o Ministério das Cidades como órgão

coordenador, gestor e formulador da Política de Desenvolvimento Urbano, dividido

internamente entre secretarias e departamentos.

Com a aprovação do Estatuto das Cidades, ainda no Governo FHC, pela Lei

10.257/01, estabelece diretrizes gerais da política urbana. Este dispositivo tramitou por doze

anos no Congresso e criou uma série de instrumentos visando desenvolvimento urbano.

A despeito de tais conquistas, Bonduki (2008) ressalta a limitação do Ministério

das Cidades frente à gestão dos recursos para a habitação, pois as operações financeiras

de recursos do FGTS e na atualidade do expressivo Programa “Minha casa, minha

vida” são centralizadas na Caixa Econômica Federal, por sua vez subordinada ao

Ministério da Fazenda. Assim, tem-se que o poder de decisão quanto aos financiamentos

e gestão de projetos fica na prática a critério da Caixa.

Em 2004, a Política Nacional de Habitação – PNH, passa a contar com um

conjunto de instrumentos que serão criados para sua implementação são eles: o Sistema

Nacional de Habitação – SNH, o Desenvolvimento Institucional – DI, o Sistema de

Informação, Avaliação e Monitoramento da Habitação – SIMAHAB, e o Plano Nacional de

Habitação – PlanHab. Através do esquema abaixo se pode visualizar a organização da PNH,

com destaque para a Habitação de Interesse Social – HIS, foco deste estudo.

O Ministério das Cidades (2004) apresenta os seguintes objetivos da Política

Nacional de Habitação:

a) Universalizar o acesso à moradia digna em um prazo a ser definido

no Plano Nacional de Habitação, levando-se em conta a disponibilidade

de recursos existentes no sistema, a capacidade operacional do setor

produtivo da construção, e dos agentes envolvidos na implementação da

PNH; b) promover a urbanização, regularização e inserção dos

assentamentos precários à cidade; c) fortalecer o papel do Estado na

gestão da Política e na regulação dos agentes privados; d) tornar a

questão habitacional uma prioridade nacional, integrando, articulando e

mobilizando os diferentes níveis de governo e fontes, objetivando

potencializar a capacidade de investimentos com vistas a viabilizar

recursos para sustentabilidade da PNH; e)democratizar o acesso à terra

urbanizada e ao mercado secundário de imóveis; f) ampliar a

produtividade e melhorar a qualidade na produção habitacional; g)

Incentivar a geração de empregos e renda dinamizando a economia,

apoiando-se na capacidade que a indústria da construção apresenta

em mobilizar mão-de-obra, utilizar insumos nacionais sem a

necessidade de importação de materiais e equipamentos e contribuir

com parcela significativa do Produto Interno Bruto (PIB) (Ministério das

Cidades 2004).

A partir desses objetivos, o Programa Minha Casa Minha Vida, de zero a três

salários mínimos foi elaborado para atender as famílias de baixa renda.

CAPÍTULO 2

2 O PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA (PMCMV)

O Programa Minha Casa, Minha Vida foi lançando em 25 de março de 2009,

destinando-se a impulsionar a construção de moradia como forma de reagir à crise mundial

que eclodiu em outubro de 2008. Com o objetivo de implementar a Política Nacional de

Habitação pela construção de 1 milhão de moradias, ou seja, 14% do déficit atual, conforme

Demanda Habitacional da Caixa Econômica Federal 2012, ampliado para três milhões a partir

de 2011, num prazo definido, que dependerá da capacidade de execução do programa, mas

com expectativa de que se complete até o ano de 20125. Desse modo, busca aumentar o

acesso das famílias de baixa renda à casa própria, além de gerar emprego e renda por meio do

aumento do investimento na construção civil, com recursos da União e do FGTS.

2.1 COMO SURGIU O PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA

Desde a extinção do Banco Nacional de Habitação – BNH em 1986, pouco se ouviu

falar em programas e projetos habitacionais oriundos do Governo Federal. No Governo

Collor, foi criado o Plano de Ação Imediata para Habitação – PAIH; logo em seguida foi

criado o Pró-Moradia e o Habitar-Brasil, além do Programa de Arrendamento Residencial –

PAR, no Governo de Fernando Henrique Cardoso.

Durante um longo período de quase 20 anos, a habitação popular não teve nenhum

programa habitacional efetivo e com recursos suficientes para suprir o déficit habitacional

brasileiro.

Em meio a este vácuo em 2009, durante a crise financeira internacional chamada a

época de “Crise do subprime”, tendo como estopim a falência do banco de investimentos

estadunidense Lehman Brothers – o governo brasileiro necessita dar uma resposta ao

mercado, com o objetivo de não entrar em uma onda internacional de recessão econômica.

A pressão sobre o Estado para apostar em um pacote econômico para desenvolver

programa habitacional vem desde a discussão da Proposta de Emenda Constitucional– PEC da

Moradia Digna – PEC 285/2008, bem como da Câmara Brasileira de Indústria e Construção.

5 Esta projeção é feita levando-se em consideração a ampliação do programa atual, prevista pelo governo, com a

criação do Programa Minha Casa Minha Vida 2 (PMCMV2). Conforme Demanda Habitacional da Caixa

Econômica Federal 2012.

Tal aposta visa ao crescimento do mercado interno ao aumento da geração de emprego em

longa escala, mediante a contratação de mão-de-obra com pouca qualificação, alcançando

uma classe pouco explorada no mercado interno para o rol de consumidores e interferindo

diretamente na mobilidade social. Como afirma Mascias:

É neste contexto, e em meio à grande crise dos mercados mundiais, que

ainda em 2008 o Governo Federal passa a discutir mais intensamente como

os grandes empresários da construção civil um plano que complementa a

produção habitacional em escala, ao mesmo tempo em que configura em

medida anticíclica de enfrentamento da crise econômica e diminuição do

emprego formal (2011, p 5).

Depois de décadas com poucos investimentos em programas e políticas

habitacionais, o País vê nascer o Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV. Este tem

como marco legal a Lei nº 11.977 de 2009, que regulamenta o Programa e traz inovações em

relação à regularização fundiária urbana. O PMCMV, de fato, surpreende por ter colocado em

pauta nacional debates esquecidos, bem como pelas inovações no campo da habitação.

Era possível prever que o PMCMV teria impacto urbanístico semelhante ao

vivido no período do BNH, conforme assinala Rolnik e Nakano:

Já vimos esse filme no passado recente e conhecemos suas consequências

funestas. A boa notícia é que hoje é possível e viável lançar não um pacote

imobiliário, mas um pacote de desenvolvimento urbano estruturado sobre

uma verdadeira política habitacional. Do ponto de vista legal, o Estatuto da

Cidade, a Lei 11.124/2004, que institui o Sistema Nacional de Habitação de

Interesse Social (SNHIS) e o Fundo Nacional de Habitação de Interesse

Social (FNHIS), e a recente Lei da Assistência Técnica permitem avançar

significativamente em outras direções (2009, p. 15).

Já em 2011, com dois anos de atuação pode-se realizar um balanço da

operacionalização do PMCMV, buscando apontar avaliações e possíveis consequências após

suas intenções. Como os dados sobre a implementação do Programa são dispersos e de difícil

sistematização e atualização a pesquisadora tomou como campo de estudo a implementação

do PMCMV no município de Maracanaú/Ce, precisamente seus limites e contradições a partir

do ponto de vista das famílias com renda de 0 a 3 salários mínimos que já foram usuárias do

Aluguel Social. Programa de Bolsa Locação Social, concedido pela Prefeitura de Maracanaú

desde 2009 a famílias que sofreram com desastres naturais no município e em decorrência

disso perderam suas moradias.

O Artigo 1º da lei nº 11.977/2009 que regulamenta o PMCMV aponta duas linhas de

atuação: o Programa Nacional de Habitação Urbana – PNHU e o Programa Nacional de

Habitação Rural – PNHP.

Durante o seu lançamento o Programa esteve mais voltado para a habitação urbana,

abrangendo duas modalidades: Minha Casa, Minha Vida para Municípios com população de

até 50.000 (cinquenta mil) habitantes chamado de MCMV – SUB 50, e o Minha Casa Minha

Vida para Municípios com população maior do que 50.000 (cinquenta mil) habitantes,

MCMV – denominado Over 50, ou simplesmente MCMV – Over.

2.2 O DIREITO A MORADIA INSERIDO NO PMCMV

Para uma compreensão melhor do programa é necessário um histórico de reivindicação

do Direito a Moradia, assim compreendendo que o debate esta pautado no direito a cidade.

Direito este que na maioria das entrevistas não é conhecido pelos beneficiados pelo Programa

como relata a usuária.

Eu não entendo nada. Eu acho que isso aqui, todos era pra eles dá de graça

pra gente morar, o governo mandar de graça pra gente, mas não tirar a gente

dum barraco que a gente tem, aí bota a gente num negocio desse aqui, ainda

tem que pagar num sei quantos anos; isso eu acho errado. Na casa que eu

morava eu só pagava água e luz, não pagava condomínio, sei nem o que é

isso. A gente paga porque tem que pagar, e eu nem pagar tô pagando que eu

não tenho condições de pagar, eu tô vendo a hora eles me botar fora daqui

como o pessoal diz. Se a gente passar cinco mês sem pagar a Caixa vem e

toma se eles tomar eu vou morar onde? (I.P, moradora do Aluguel social

beneficiada pelo PMCMV, quando questionada sobre o que entende sobre o

direito a moradia).

Fica claro que em nenhum momento os moradores que serão beneficiados são

preparados para este beneficio ou são esclarecidos de seus Direitos.

Para uma compreensão melhor do Programa é necessário fazer um breve histórico

da reivindicação do direito a moradia, compreendendo que este debate está pautado no direito

à cidade.

O direito a moradia no Brasil não surgiu nem se institucionalizou como

consequência singular e natural do recente processo de democratização que o País vem

sofrendo desde a última década do século XX, até os dias de hoje.

O conturbado processo de urbanização desencadeado na segunda metade do

século passado, com o desenvolvimento industrial, fez eclodir em maior escala as grandes

cidades e ocupações informais, devido ao déficit habitacional junto ao mercado formal,

culminado, assim, no processo de favelização como foi visto no Capitulo 1.

O conceito de “moradia adequada” foi regulamentado pelo Comentário Geral nº 4

que interpreta o Artigo 11, § 1º, do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e

Culturais – PIDESC, elencando os seguintes aspectos:

a) uma condição de ocupação estável, ou seja, morar em um local sem o

medo de remoção ou de ameaças indevidas ou inesperadas; b) acesso a

serviços, bens públicos e infraestrutura, como energia elétrica, sistema de

esgoto e coleta de lixo; c) acesso a bens ambientais, como terra e água, e a

um meio ambiente equilibrado; d) moradia a um valor acessível ou com

subsídios ou financiamentos que garantam custos compatíveis com os níveis

de renda; e) boas condições de habitação, respeitado um tamanho mínimo,

com proteção contra frio, calor, chuva, vento ou outras ameaças à saúde,

riscos estruturais e suscetibilidade a doenças; f) acesso prioritário à moradia

para grupos em situação de vulnerabilidade ou desvantagem; g) localização

adequada, com acesso a médicos e hospitais, escolas, creches e transporte,

em áreas urbanas ou rurais; h) adequação cultural, construída com materiais,

estruturas e disposição espacial que viabilizem a expressão da identidade

cultural e a diversidade dos vários indivíduos e grupos que a habitam (Pacto

Internacional de Direitos Econômicos Sociais e Culturais – PIDESC).

O direito à cidade surge numa contradição interdisciplinar de estudos urbanos.

Este estudo está vinculado à obra de Henri Lefebvre (2001), onde o autor afirma que a cidade,

nos seus vários aspectos, é, antes de tudo, uma obra, e que esta obra é construção de vários

autores ao longo da história, logo, um direito daqueles que a construíram e que a constroem,

que a habitam, que a fazem existir enquanto obra.

Para Lefebvre habitar na cidade é mais do que ter uma moradia inserida no

contexto urbano é poder dispor desta obra de construção coletiva. Segundo o autor:

O tecido urbano pode ser descrito utilizando o conceito de ecossistema,

unidade coerente constituída ao redor de uma ou de várias cidades, antigas

ou recentes. Semelhante descrição corre o risco de deixar escapar o

essencial. Com efeito, o interesse do “tecido urbano” não se limita a sua

ST3: Urbanismo e Regulação morfologia. Ele é o Suporte de um “modo de

viver” mais ou menos intenso ou degradado: a sociedade urbana. Na base

econômica do tecido urbano aparecem fenômenos de outra ordem, num

outro nível o da vida social e “cultural” (LEFEBVRE, 1991, p. 19).

De acordo com Lefebvre o entendimento de cidade é completamente distante do

que hoje é produzido pelo PMCMV. Para ele, a cidade é um lugar de suprir “necessidades

sociais antropologicamente elaboradas” (1991, p. 19). Como exemplo, é possível perceber

esse processo quando o autor descreve a produção estatal na França no século XIX:

A construção a cargo do Estado não transforma as orientações e concepções

adotadas pela economia de mercado. Como Engels previra, a questão da

moradia, ainda que agravada, politicamente desempenha um papel menor.

Os grupos e partidos de esquerda contentam-se com reclamar mais “casas”.

Por outro lado, não é um pensamento urbanístico que dirige as iniciativas

dos organismos públicos e semipúblicos, é simplesmente o projeto de

fornecer moradias o mais rápido possível pelo menor custo possível

(LEFEBVRE, 1991, p. 26)

Desse modo, o que é visto hoje nos condomínios entregues pelo PMCMV no

município de Maracanaú, e que é reproduzido em outras cidades, é a falta de planejamento

urbanístico para atender às reais necessidades das famílias contempladas pelo Programa.

No caso dos condomínios juntos, os quais, esta pesquisa foi realizada os usuários

assinalam uma grande necessidade de escolas, postos de saúde, supermercados, bem como de

garantir o acesso a outras áreas do município, como o centro, que fica mais afastado, devido à

localização do empreendimento.

Além do descontentamento com o prédio em si e a falta de familiaridade com a

estrutura física do condomínio, também existe a dificuldade de adaptação às regras de

convivência nos empreendimentos e ao pagamento das taxas condominais exigidas pela CEF.

Tais taxas são a principal preocupação na vida dos entrevistados como será visto no capítulo

3.

2.3 ENTENDENDO A DIVISÃO SALÁRIAL DO PROGRAMA MINHA CASA, MINHA

VIDA

O PMCMV beneficia famílias com renda de até dez salários mínimos, sendo que

as famílias com até três salários mínimos têm subsídio total, com inserção do seguro

habitacional. Famílias com renda de três a seis, salários mínimos tem aumento do subsídio

parcial em financiamentos com redução de custos de seguro e acesso ao Fundo Garantidor6.

Famílias com renda entre seis e dez salários mínimos têm o estímulo da compra com redução

6 Constitui-se numa associação civil sem fins lucrativos, com personalidade jurídica de direito privado

do Brasil, que administra um mecanismo de proteção aos correntistas, poupadores e investidores, que

permite recuperar os depósitos ou créditos mantidos em instituição financeira, em caso de falência ou

de sua liquidação. Fonte:www.bcb.gov.br pesquisado em 01.10.1012

dos custos do acesso ao Fundo Garantidor. De acordo com a cotação atual do valor do salário

mínimo, que é de R$622,00 (seiscentos e vinte dois reias) estas famílias devem possuir renda

de até R$6.220,00 (seis mil, duzentos e vinte dois reais).

O grande diferencial do PMCPMV em relação aos outros programas do

Ministério das Cidades é o volume de recursos, (34 bilhões de reais), e a previsão do impacto

dos investimentos na redução de 14% do déficit habitacional total e sua distribuição por faixa

de renda.

Porém, a distribuição das construções a serem executadas tem uma determinada

proporção. Deste um milhão de imóveis, 400 mil devem atender as famílias que recebam

entre zero e três salários mínimos; 400 mil as famílias detentoras de renda mensal até seis

salários mínimos; e os 200 mil restantes atenderão as famílias que possuam entre seis e dez

salários mínimos de renda mensal. A distribuição por unidades da federação segue a

composição do déficit habitacional, ou seja, as unidades federativas que possuem maiores

déficits habitacionais serão beneficiadas com uma maior destinação de recursos.

O governo federal destinou como recursos a serem investidos no Programa o

montante de R$ 34 bilhões, através da Caixa Econômica Federal – CEF, agente gestor deste,

distribuídos conforme a renda e a região do país. Deste total, R$ 16 bilhões estão sendo

destinados ao subsídio de construção de moradias para famílias que possuam renda de até três

salários mínimos. Esta faixa de renda concentra a maior parte do déficit habitacional, cerca de

91%. Além deste subsídio, o custo do seguro habitacional e o custo com emissão de

documentos cartorários para estas famílias será zero. Os juros também serão subsidiados. A

CEF é a responsável pela análise técnica e seleção dos projetos, definindo prioridades de

atendimento e contratação.

Mesmo com as taxas dos documentos cartorários a custo zero, as primeiras

famílias beneficiadas pelo PMCMV, em Maracanaú/Ce, pagaram uma taxa no cartório no

valor de R$ 417,35 (quatrocentos e dezessete reais e trinta e cinco centavos), entre março e

abril de 2011. Em mais dois condomínios entregue a taxa não foi cobrada, gerando uma

revolta na população beneficiada que pagou essa taxa.

Durante o processo de assinatura de contrato esse valor de 417,35 (quatrocentos e

dezessete reais e trinta e cinco centavos), para custos com o cartório foi informado aos

beneficiários uma semana antes das assinaturas, como muitos usuários não tinham esse

dinheiro tão próximo a assinatura do contrato, essa taxa foi responsável por 25% de

desistência entre as famílias beneficiadas segundo levantamento da Coordenadoria de

Maracanaú.

Até os dias em que a pesquisa foi realizada a CEF, não se posicionou sobre essa

questão da taxa do cartório, nem deu qualquer esclarecimento oficial aos usuários; apenas

manifestou-se através da Prefeitura Municipal de Maracanaú através de um comunicado

informando que tinham conversado com o dono do cartório onde houve os pagamentos, mas

que ainda não tinha nenhuma posição.

O PMCM, possui linhas de financiamento diferentes para famílias com faixas de

renda distintas. A seguir, serão descritas as principais características de cada tipo de

financiamento, dadas as faixas de renda familiar.

Para famílias com renda familiar de até três salários mínimos, que compõem o

grupo 17, o qual concentra a maior parte do déficit (91%), – é oferecido pelo Programa um

subsídio integral. O governo subsidia a construção dos imóveis e estipula um teto para o valor

que as construtoras devem construí-los. Por sua vez, os compradores não podem comprometer

mais de 5% de sua renda familiar mensal com o pagamento das prestações do financiamento,

sendo que o piso do valor destas prestações é de R$ 25,00 (vinte e cinco reais).

Para o grupo 2, constituído por famílias com renda de três a seis salários mínimos,

o Programa funciona de maneira mais efetiva, com o lançamento, por parte das construtoras,

de residências para este segmento nas periferias das grandes cidades.

Conclui-se, assim, que, para as famílias pobres, das classes D e E, o Programa

funciona de maneira eficiente no interior do estado, porém não nos grandes centros urbanos.

Nestas regiões, os grandes beneficiados são as famílias de classe média ou C, que possuem

renda de até seis salários mínimos.

Isto acontece devido à valorização dos terrenos das regiões metropolitanas. Com

a grande disponibilidade de crédito existente no mercado e com o avanço da produção

habitacional, o preço dos imóveis e dos terrenos nestas localidades tende a disparar, devido ao

aumento da demanda. Todo o crédito excedente desloca-se para o preço dos terrenos, o que

acaba por dificultar a produção de unidades habitacionais entre R$ 50.000,00 e R$ 60.000,00

(cinquenta e sessenta mil reias), valores estes fixados para a faixa de renda mais baixa, de até

três salários mínimos. Com as famílias que recebem de seis a dez salários mínimos, que

compõem o grupo 3, as condições não tem muita diferença do grupo 2. As exigências para

7 Até outubro de 2010, foram contratadas 113.289 unidades pertencentes a este grupo. Entretanto, o problema

reside nas localidades onde estas unidades foram contratadas. Isto ocorre, pois as construtoras encontram muitas

dificuldades em produzir imóveis para o Minha Casa, Minha Vida nos grandes centros urbanos, capitais e

regiões metropolitanas, devido aos preços dos terrenos, que são muito altos. Estas regiões concentram os maiores

problemas de déficit habitacional, e também a maior parte da população detentora de renda mensal pertencente

ao Grupo 1.

cada grupo podem ser resumidas da seguinte forma, a partir de informações contidas em cada

grupo.

No grupo 1 o valor mínimo das parcelas para a construção ou compra de casas

novas ou usadas e de R$25,00 (vinte cinco reais). Cada parcela não poderá comprometer mais

de 5% da renda familiar, por dez anos. O comprador é isento do pagamento de seguro

habitacional, o que acaba por desonerar o valor das parcelas. Os usuários são isentos dos

custos com cartórios para registro do imóvel e a compra pode ser feita sem pagamento de uma

entrada. Em caso de pagamento com entrada, podem ser utilizados os recursos do Fundo

Garantidor por de Serviço (FGTS), bem como para amortização do saldo devedor. A análise

dos projetos é de responsabilidade direta da CEF. Caso o imóvel seja registrado em nome da

mulher, a liberação do financiamento habitacional dá-se com maior agilidade.

No grupo 2, os usuários podem dispor dos recursos do FGTS, em maior

quantidade para a compra do imóvel residencial próprio, com valor até R$ 130.000,00 (cento

e trinta mil reias). As taxas de juros são reduzidas a 5% ao ano para famílias que recebem até

cinco salários mínimos, e 6% ao ano para famílias que recebem entre cinco e seis salários

mínimos. Existe um fundo garantidor para abertura de eventuais problemas no pagamento das

parcelas do financiamento habitacional, como perda do emprego por parte do titular, por até

36 meses. Há redução do valor do seguro do financiamento e corte de 90% dos custos

cartorários referentes ao registro de imóvel. Cada parcela não poderá comprometer mais de

20% do orçamento familiar mensal. Existe subsidio do governo no pagamento da entrada do

financiamento, que pode chegar a até R$ 17.000,00 (dezessete mil reias).

No grupo 3 a redução dos custos cartorários para registro do imóvel é de 80%. As

famílias têm direito ao mesmo fundo garantidor disponível para famílias com renda mensal

até seis salários mínimos, para cobertura de eventuais problemas no pagamento das parcelas.

Entretanto, o período de inadimplência, neste caso, só pode compreender entre 12

e 24 meses. Também é permitido o uso dos recursos do FGTS para pagamento da entrada do

financiamento habitacional e o preço do seguro habitacional pode ser barateado.

Os entrevistados pertencem ao grupo 1. O interesse com esse grupo, que é o único

grupo atendido na Coordenadoria de Habitação de Maracanaú, surgiu no acompanhamento

dessas famílias, através do estágio realizado na COHAB durante um ano e meio. Nesse

período, acompanhando essas famílias, que no caso da pesquisa são famílias que moram no

aluguel social, ficou a dúvida de como essas famílias conseguiriam custear as taxa do

PMCMV. Despertando a curiosidade da pesquisadora para o estudo com essas famílias.

2.4 AS VERTENTES DO PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA

O Programa Minha Casa Minha Vida atua de maneira diferenciada para cada

padrão de renda familiar, utilizando recursos distintos e proporcionando benefícios

segmentados como foi visto na descrição de cada Grupo que pertence ao Programa. A seguir,

serão descritos os subprogramas que fazem parte do contexto mais amplo do PMCMV.

O Programa Nacional de Habitação Urbana – PNHU é uma vertente que atende

as famílias que possuem uma renda bruta de até R$ 6.220 mensais. Entretanto, para famílias

com renda bruta de até R$ 3.732,00, a União subsidia a compra, e o beneficiado pelo

Programa podendo fazer valer o uso do seu FGTS.

Por sua vez, o Programa com Recursos do FAR (Fundo de Arrendamento

Residencial), destina-se, à construção de empreendimentos, com a participação da

construtora, nos quais as unidades habitacionais são destinadas à alienação para famílias com

renda de até três salários mínimos. Estas famílias devem ser indicadas pelos órgãos

competentes do município ou governo do estado ou Distrito Federal. O aporte de recursos

oferecido pela União é da ordem de R$ 14 bilhões. A abrangência deste segmento do

PMCMV dá-se entre as capitais estaduais e respectivas regiões metropolitanas, municípios

com população igual ou superior a 50 mil habitantes, região metropolitana de Campinas,

Baixada Santista e Distrito Federal. Para a aquisição nesta modalidade de financiamento, o

proponente não pode ter sido beneficiado por nenhum subsídio direto ou indireto com

recursos da União. Além disso, não são analisadas restrições cadastrais, ou seja, estas não são

impeditivas na contratação do financiamento.

O Programa Nacional de Habitação Rural – PNHR tem como beneficiários os

agricultores com renda anual de até R$ 10.000,00. O benefício se dá na aquisição de material

de construção para a produção de unidade habitacional.

Já o Programa Habitacional Popular – Entidades, visa à concessão de

financiamento habitacional às famílias com renda bruta de até três salários mínimos,

organizadas por meio de uma Entidade Organizadora, para a produção de unidade

habitacional ou requalificação em área urbana.

Finalmente o Programa de Infraestrutura para Habitação Popular, oferece uma

linha de crédito corporativo às construtoras, incorporadoras ou Sociedades de Propósitos

Específicos, com recursos do BNDES, para financiamento de infraestrutura interna e/ou

externa para produção de empreendimentos de habitação popular, financiados pela CEF, para

aplicação no PMCMV.

O programa que atende as famílias pesquisadas é o Programa com Recursos do

FAR (Fundo de Arrendamento Residencial), onde estas famílias arcarão com todos os custos

dos imóveis no período de dez anos.

2.5 UM BREVE HISTORICO DO MUNICÍPIO DE MARACANÁU

No contexto nacional o município de Maracanaú tem sua história contada no

modo como se ocupa o espaço urbano nos espaços socialmente estabelecidos para cada

segmento populacional, levando em consideração os estigmas decorrentes e suas diversidades

culturais.

Maracanaú se configura como região metropolitana de Fortaleza – RMF a qual é

tomada por mais nove municípios: Aquiraz, Caucaia, Eusébio, Guaiúba, Horizonte, Itaitinga,

Maranguape, Pacajus e Pacatuba.

A aérea territorial do município é de 111,334 km². Segundo dados do IBGE

(Censo 2010) a população é de 209.057 habitantes. A maior parte da população se concentra

na área urbana. Em relação a outros municípios da RMF, a cidade se encontra a 22 km da

capital sendo considerada uma distância privilegiada. O município tem seu limite delineado a

norte por Fortaleza e Caucaia; ao Sul e Leste, por Pacatuba; e, ao Oeste, por Maranguape.

O município divide-se internamente em dois distritos: o de Maracanaú, também

chamado de distrito sede, abrangendo grande parte do território e o distrito de Pajuçara.

Existem também as áreas agregadas, totalizando seis territórios: ADL8 1 (Santo Antonio do

Pitaguary, Horto, Olho D’água, Escola de Menores, Bela Vista, Boa Vista, Alto da

Mangueira, Picada, Centro, Coqueiral, Piratininga, Conjunto Novo Maracanaú, Jenipapeiro);

ADL 2 (Conjunto Jereissati I, II, Conjunto Timbó); ADL 3 (Distrito Industrial, Jardim

Bandeirante, Menino Jesus de Praga, Parque Progresso, Alto da Bononza, Jardim Paraíso,

Boa Esperança e Pajuçara); ADL 4 (Distrito Industrial III, Novo Mondubim, Planalto Cidade

Nova, Esplanada do Mondubim, Novo Mondubim II, Conjunto Industrial, Alto Alegre II);

ADL 5 (Alto Alegre I, Vila Buriti, Novo Oriente, Acaracuzinho, Santo Sátiro e Jardim

Maravilha); ADL 6 (Jatobá, Parque São José, Siqueira II, Jarí, Santa Maria, Parque Nazeré,

Jaçanaú, Mucunã, Parque Tijuca, Cágado, Parque Luzardo Viana e Pau Serrado).

8 Áreas de Desenvolvimento Local – Baseada na Lei 557/97 – Lei de Diretrizes Orçamentárias

O Nome da cidade é de origem indígena, população que ainda existe no município

de Maracanaú. Segundo Silva (1998), os índios Pitagauri teriam escolhido a região por esta

possuir muitas lagoas e terras férteis em caça.

As araras maracanãs faziam parte da abundante fauna local e sua espécie era

considerada típica da região, devido a sua localização privilegiada, situada no vale das serras

de Maranguape e Aratanha, com recursos naturais e condições socioambientais ainda

favoráveis.

O crescimento do povoado inicia-se através da ocupação espontânea as margens

dos rios e lagos de Maracanaú. Ate o final do século XIX e meados do século XX a dinâmica

da cidade não era diferente das de outras cidades do interior do Ceará, a economia era voltada

para agricultura de subsistência, uma pecuária rudimentar e pequenos comércios.

A vida social de Maracanaú concentrava-se, então, nas imediações do atual centro

histórico: Igreja de São José (1874), Escola de Maracanaú e Cartório (1873); passando à

condição de Vila, em 1882, e Distrito de Maranguape, em 1906 (ALMEIDA, 2005).

Algumas imagens contribuíram e contribuem até hoje na criação de estigmas que

assolam a população ali existente, muito embora alguns acontecimentos tenham sido

fundamentais para o processo de evolução do município de Maracanaú, tais como a

inauguração da estação rodoviária em 1875, ligando Fortaleza, Maranguape e Baturité, tida

como um símbolo de prosperidade por representar desenvolvimento da região e possibilitar o

deslocamento de seus moradores para capital.

Houve também as instalações hospitalares com destaque para: Hospital de

Dermatologia Sanitária Antonio Justa (1942), conhecido até hoje como Colônia e pouco

habitado por ter sido local para o tratamento de ranseníase; o Hospital de Maracanaú (1952)

especializado na época, em tratamento de tuberculose a conhecida Escola para Menores

Abandonados de Santo Antonio do Pitaguari. Devido à implementação dessas instituições

houve um estigma e um preconceito imenso para com os seus moradores, pois a ranseníase e a

tuberculose eram tidas como doenças incuráveis. A cidade passou a ser vista como depósito

de doentes excluídos do convívio social.

Nesse mesmo sentido, a Escola para Menores Abandonados, que depois seria

Escola para Menores Infratores, com a função de disciplinar e corrigir as crianças e

adolescentes das camadas populares, sobretudo aqueles que eram vistos como desviantes e

situado à margem da sociedade. Assim contribuía ainda mais negativamente para a imagem

do local e dos moradores que ali habitavam.

Mesmo Maracanaú tendo alcançado o status de maior pólo industrial do estado a

maior parte da população não desfruta dessa riqueza. A renda per capita do município

corresponde apenas R$ 129,78 (LEPOP/US, 2000). Além do alto índice de desemprego. Boa

parte da população reside nos conjuntos habitacionais construídos no final dos anos de 1970 e

início da década de 1980. Conforme afirma Mourão (2003) “A cidade parece, então,

confirmar sua ‘vocação’ de receptora de população segregada – não mais os tuberculosos ou

leprosos, mas os imigrantes, os trabalhadores de baixa renda e os favelados de Fortaleza”.

A implementação desses conjuntos habitacionais é vista como uma estratégia do

estado para atingir dois objetivos: “limpar” e livrar o espaço urbano de Fortaleza da presença

incômoda dos imigrantes e favorecer o Distrito Industrial recém-implementado.

Esta população, que até então morava nas favelas e ocupações clandestinas da

capital, foi “convidada” a se retirar das suas casas, com a promessa de um lugar com maior

infraestrutura e oportunidade de emprego, próximo de suas novas casas, atendendo

necessidade de mão de obra barata no recém-criado Distrito Industrial.

Mesmo que as instalações do Distrito Industrial de Maracanaú só tenham sido

construído na década de 1980, quando o município já era emancipado, deixando de ser um

Distrito de Maranguape em 1983, o Decreto-lei que desapropriou uma área de 1.013 hectares

para construção do Distrito Industrial de Fortaleza DIF I9, é de 1964.

Este local deveria ser de implementação do Estado, porém situado no município

de Maranguape, especificamente na Pajuçara. Somente em 1979, quando o Governo Federal

destinou para o estado o III Pólo Industrial do Nordeste é que este ganhou impulso.

Com isso, surgem os problemas habitacionais relacionados ao congestionamento

por falta de moradia em Fortaleza, devido à constatação do crescimento populacional em

relação ao número de domicílios. Também surge a necessidade de ampliação de empregos

para a crescente população que é aproveitada como mão-de-obra para a indústria, associando,

assim, Distrito Industrial com conjuntos habitacionais de forma promissora.

Para entender a lógica da construção dos conjuntos habitacionais de Maracanaú, é

necessário entender o processo de industrialização e expansão urbana da cidade de Fortaleza.

Ou seja, a implementação do Distrito Industrial de Maracanaú não está diretamente

relacionada com o local onde se instalou, mas com o processo de implementação de seus

conjuntos habitacionais. A inauguração do Distrito Industrial de Fortaleza em 1878 (atual

9 Posteriormente, tem-se a implementação do Distrito Industrial I e III, localizados na via Maracanaú/Eusébio,

com 20 indústrias em funcionamento, estando atualmente em fase de consolidação e do Distrito Industrial 2000 (

DI 2000), de iniciativa municipal, com 6 indústrias já instaladas, localizadas no bairro Jenipapeiro e no Conjunto

Novo Oriente. ( MOURÃO, 2003).

Distrito Industrial de Maracanaú) ocorreu junto a inauguração do primeiro conjunto

habitacional da localidade, chamado de Conjunto Industrial.

Já em tempos atuais, a situação mudou com a implementação do PMCMV, no que

se refere ao acesso à moradia, mas ainda hoje a situação da localização dos condomínios

dificulta a vida dos beneficiados, seja pela falta de infraestrutura urbana, seja pela falta de

planejamento urbano.

Os condomínios chamam-se Virgílio Távora I, II e III, situados no bairro Cágado,

próximo a CE O 60 (o Virgílio Távora I tem seu portão de entrada virado para CE).

Todos os apartamentos têm o mesmo padrão: 45m², 2 quartos, sala, cozinha

americana e um banheiro. Não tem área de serviço nem quintal: todo o terreno é murado com

80 vagas rotatórias de carros, 25 de moto também rotatórias e um salão de festas.

A entrada dos condomínios Virgílio Távora II e III localiza-se a uma rua lateral da

CE 060, e em frente aos condomínios havia um terreno de mata fechada que foi comprado

recentemente e agora está sendo desmatado para a construção de um supermercado de acordo

com informações dos moradores locais.

2.6 O ALUGUEL SOCIAL NO MUNICÍPIO DE MARACANAÚ

A Lei nº1.387 a implementação do Programa de Locação Social no Município de

Maracanaú e dá outras providências, foi sancionada em 30 de março de 2009 em Maracanáu

e dispões sobre a Bolsa Locação Social, no valor de R$ 150,00(cento e cinquenta reais),

concedido a famílias com renda familiar mensal de até 01 (um) salário mínimo.

O ano de 2009, foi o ano em que mais choveu em Maracanaú nos últimos vintes

anos, com isso há uma explosão de demandas por abrigamento imediato. O município não

dispunha de equipamentos sociais para abrigar pessoas que sofreram com desastres naturais.

Houve uma articulação para a criação do aluguel social. Essa articulação é feita junto á

Procuradoria Geral do Município e alguns membros da Coordenadoria de Habitação de

Maracanaú.

O aluguel é tomado como um programa de bolsa, chamado Bolsa Locação Social

com base nos aluguéis de outros municípios. Antes normalmente no município a prática da

locação de casas para famílias necessitadas era realizada por políticos. Com o aluguel social,

houve uma diminuição dessa prática. Com isso, as famílias moradoras do aluguel social

passaram a ser acompanhadas pelo Serviço Social da COHAB e pelo Centro de Referência de

Assistência Social – CRAS.

Após o abrigamento, as famílias passam a ser prioridade nos programas

habitacionais do município, porém, a criação da lei aconteceu no mesmo período em que o

cadastramento para o PMCMV, portanto, essas famílias teriam que esperar a construção dos

empreendimentos para passar pelo processo burocrático e depois serem beneficiadas.

Algumas famílias passaram até três anos no aluguel social, á espera de uma casa.

A locação social no município de Maracanaú cabe às famílias que tiveram suas

casas condenadas pela Defesa Civil ou sofreram com desastres naturais, entre os quais,

inundações, desabamentos, enchentes, famílias que vivem em habitações sub-humanas, que

tenham seus filhos matriculados em escolas ou cursos educacionais regulares, ser mulher ou

idoso arrimo de família, ser idoso em situação de abandono. Não se adequando para despejo e

pessoas em situação de rua.

A locação das casas fica sobe responsabilidade do usuário, assim ele tem

autonomia de escolher onde quer morar nesse período, respeitando os vínculos com o bairro,

acesso às escolas e postos de saúde próximos. É necessário estar dentro do valor

disponibilizado pela prefeitura. O proprietário do imóvel vai a COHAB e lá é orientado em

relação a pagamentos e ao processo do aluguel social, sua finalidade e a Lei 1.387. Outras

taxas, como água e luz, ficam a cargo do usuário.

O período de inclusão das famílias ou dos usuários no Programa é de seis meses,

podendo ser prorrogado por igual período, desde que comprovada à necessidade através do

estudo social, será previsto em regulamento.

Porém, a real situação de algumas famílias, á espera de algum programa

habitacional no município se arrasta por anos. As famílias do aluguel social cadastradas na

COHAB de Maracanaú, durante o processo de implementação do PMCMV, era um número de

treze ao total, incluindo mulheres chefes de famílias ( famílias monoparentais), um homem

idoso que vive sozinho, um casal de idosos, e famílias nucleares.

Destas, famílias, treze foram beneficiadas pelo PMCMV. A pesquisa foi realizada

com oito famílias. Dessas treze famílias, duas, até a realização da pesquisa, ainda não tinham

se mudado e só uma delas compareceu a COHAB para esclarecimento e para o recebimento

das contas condominais.

Quase todas as famílias chegaram à COHAB encaminhadas pelo Centro de

Referencia de Assistência Social – CRAS e pela Defesa Civil. É necessária uma avaliação

social e uma avaliação técnica. Somente com essas duas avaliações a família pode ser

encaminhada para o aluguel social, pois além de estar em situação de vulnerabilidade ela

precisa ter a sua moradia condenada pela Defesa Civil por está em condições inabitáveis.

Boa parte dessas famílias viviam em casa de taipa ou sofreu desmoronamento,

tendo seus terrenos condenados por não ser uma habitação segura e sendo necessário, o Bolsa

Locação Social, conhecido como aluguel social. Três das famílias entrevistadas viviam nessa

situação.

Outros programas de habitação de interesse social no município de Maracanaú

foram efetivados antes da implementação do PMCMV, porém muitas famílias não poderam

ser beneficiadas por falta de documentação ou por não pertencerem à área de implementação

do Programa.

Houve casos de famílias que foram beneficiadas nesses programas, mas que

venderam suas casas, retornaram ao cadastro da prefeitura e ficaram na lista de espera para o

PMCMV.

O grande problema do PMCMV, para algumas famílias são as taxas. Em alguns

casos, a renda das famílias é oriunda do Bolsa família. No gráfico abaixo é possível fazer um

comparativo em relação às famílias assalariadas e as famílias cuja única fonte de renda é o

beneficio assistencial. Dos quais 9% é aposentada; 9% das famílias não tem fonte de renda;

9% trabalham informalmente; 18% trabalham com carteira assinada e 55% recebem o Bolsa

família.

Gráfico 1:

Fonte do gráfico: Direta, 2012.

Outra questão relevante diz respeito às famílias que não sofreram com desastres

naturais, mas cujos imóveis são alvo de intervenção pública. No caso de Maracanaú, houve

uma abertura na lei para isso, e duas das famílias entrevistas passaram por essa situação.

No caso dessas famílias, há uma indenização pela benfeitoria em relação às

construções no terreno, mas dentro do cálculo existe um valor de depreciação, que é o tempo

de moradia, o valor pago por essa indenização é irrisório.

Houve uma solicitação de ratificação da Lei 1.387, devido a alguns casos que não

se enquadram no perfil do aluguel social, ou seja, mesmo constando na Lei pessoas com,

55% 18%

9%

9% 9%

Fonte de Renda dos Beneficiários Bolsa Família Carteira Assinada Trabalho informal Aposentado Sem fonte de renda

filhos matriculados em escolas no município e idoso em situação de abandono, não poderão

entrar no aluguel social, ficando como perfil do programa somente a primeira clausula da lei,

pessoas que sofreram com desastres naturais.

Na Lei 1.387, o aluguel social deve ser pago pelo Fundo de Moradia Popular do

município, que deveria ser fiscalizado pelo Conselho de Habitação de Maracanaú, porém isso

não estava acontecendo desde a criação da lei, tendo os aluguéis pagos pela própria Secretária

de Infraestrutura e Controle Urbano – SEINFRA.

Depois da entrega dos condomínios Virgílio Távora no ano de 2012, é que os

usuários do aluguel social foram beneficiados. Não há mais nenhuma família morando no

aluguel social, devido à irregularidade dos pagamentos. A partir do ano de 2013, o valor do

aluguel social passa a ser R$ 300,00 regularizando a situação e atendendo a novas famílias

que do aluguel social necessitarem.

CAPÍTULO 3

3. OS MORADORES DO ALUGUEL SOCIAL E O PMCMV

No decorrer deste trabalho o que esteve em mais evidência foi o funcionamento

do Programa Minha Casa, Minha Vida no município de Maracanaú, onde a pesquisa foi

realizada. Contudo, há um leque de desafios para os moradores beneficiados pelo Programa

que vai desde a vaga em escolas para seus filhos ao deslocamento dentro do município devido

à localização distante dos condomínios. Neste último capítulo o que está em foco são os

desafios dos usuários do aluguel social beneficiados pelo Programa em questão.

Para isso, foi necessária uma pesquisa de três meses entre agosto e outubro,

acompanhando as famílias depois de receberem os apartamentos, descobrindo os limites e

contradições e os novos desafios que viriam pela frente.

3.1 CONHECENDO OS BENEFICIADOS DO ALUGUEL SOCIAL ANTES DO PMVMC

O interesse por pesquisar esta temática veio com a experiência de estágio da

pesquisadora durante um ano e meio na Coordenadoria de Habitação de Maracanaú –

COHAB. Nesse período foi possível acompanhar as famílias moradoras do aluguel social, que

eram prioridades nos programas habitacionais desenvolvidos pela COHAB, mas nessa mesma

época o único programa em questão era o PMCMV. Isso despertou o interesse pela pesquisa,

pois se indagava: como famílias que já tinham suas despesas com moradias pagas pela

SEINFRA, pois eram famílias do aluguel social, e em muitos casos a única fonte de renda era

o Bolsa família, iriam custear as taxas exigidas pelo PMCMV?

Muitas dessas famílias, por muito tempo, não tiveram contas como água e luz, não

contavam com essa obrigação todos os meses, o que em muitos casos representa um peso

financeiro quando vêm, junto com a prestação da casa mais a taxa de condomínio.

Um primeiro dado da pesquisa constatado é que, das oito famílias pesquisadas,

apenas duas eram originárias de Maracanaú; seis delas migraram para o município em busca

de emprego. A grande atração por Maracanaú vem com a grande quantidade de indústrias que

tem no município considerado o maior pólo industrial do estado do Ceará.

Atraídas com a chance de um emprego eminente essas famílias migravam de suas

terras natais para Maracanaú, porém ao chegar à cidade a realidade era bem diferente, altos

aluguéis, custo de vida mais caro, e grande concorrência paras as vagas de trabalho, além dos

baixos salários. Não encontrado o que buscavam e sem ter como voltar a suas cidades começa

assim as histórias dos nossos beneficiados. Muitas mulheres foram trabalhar como

domésticas. Três das entrevistadas vieram para Maracanaú ainda adolescente, para ajudar suas

mães que, trabalhavam em casas de famílias.

Como não tinham condições de comprar uma casa, elas invadiram terrenos da

prefeitura e ali moraram durante anos. Nesses casos, a energia e a água chegavam às casas de

forma irregular mediante os chamados “gatos”. Elas permaneceram ali até procurarem a

COHAB ou a prefeitura precisar do terreno.

Foi assim que quase todos os entrevistados chegaram até a Coordenadoria de

Habitação. Outros casos ocorreram por meio da Defesa Civil. Em Maracanaú ainda existem

famílias que moram em casas de taipas. Algumas dessas famílias têm terrenos próprios, mas

não têm condições de construir casas de alvenaria, tendo como solução as casas de taipa.

Por algum tempo, essas casas resistem às chuvas fracas devido às grandes lonas

que os proprietários utilizam, para protegê-las, mas quando chove mais forte, elas não

resistem e desmoronam. Desse modo é acionada a Defesa Civil. Três famílias entrevistadas

viviam nessas casas de taipa antes de irem para o aluguel social. Uma das famílias já tinha

sido beneficiada em outro programa de interesse social, chamado Riacho Salgadinho, que

atendia à população que morava em casas de taipas, às margens do rio Salgadinho. Mas no

caso dessa família, houve agravante de violência doméstica, uso de psicoativos por parte do

conjugue e a casa foi vendida indevidamente, pois no caso de habitações de interesse social o

beneficiário não pode se desfazer do imóvel.

Essa mulher voltou a procurar a COHAB, e foi novamente para o aluguel social,

pois ela não podia voltar para casa, e mesmo havendo uma Medida Judicial contra o seu

marido ele não foi preso – ele sempre fugia pelo fundo da casa, o que era um risco para a

usuária titular da casa e seus três filhos pequenos. Como solução, ela aguardou mais um ano

morando no aluguel social e foi inserida no PMCMV.

Os outros dois casos são mais delicados. O primeiro é de um senhor idoso que

vivia sozinho. O terreno onde a sua casa foi construída pertence à CAGECE. Em seu quintal

abriu-se um buraco imenso onde jorrava água o tempo todo; a casa desse senhor estava

localizada onde seria realizada uma obra pública e precisava ser demolida. O preço de

indenização é referente ao preço de depreciação, como já foi explicado no segundo capítulo,

ou seja, ele não achou justo o valor a ser pago pela CAGECE, não aceitando a indenização e

continuou morando na casa, porém o buraco em seu quintal continuava crescendo e ameaçava

derrubar a casa. A Defesa Civil acionou a COHAB e o morador foi inserido no aluguel social,

onde permaneceu por dois anos e meio. Até a realização da pesquisa, ele não recebeu

nenhuma indenização da CAGECE. O Bairro de origem desse idoso chama-se Timbó

localizado do lado leste da cidade. Hoje ele mora no Virgilio Távora III que fica no bairro

Cágado, lado oeste da cidade. A mudança de bairro significou um peso na decisão desse idoso

que teve toda sua vida construída no Timbó e agora teria que ir morar no Cágado, sozinho

longe de sua família e de seus amigos.

Finalmente, o último caso foi à compra indevida de um terreno da prefeitura por

parte dessa família, ou seja, a mesma foi vitima de estelionato. A família migrou de outra

cidade em busca de melhores oportunidades de trabalho em Maracanaú, lá venderam a casa

que tinham e compraram um terreno no município por cinco mil reais. Começaram a levantar

a casa quando a obra foi embargada pela prefeitura. Eles passaram um tempo morando no

único cômodo que não tinha sido demolido pela prefeitura, até a Defesa Civil encaminhá-los

para a COHAB e eles serem inseridos no aluguel social, onde passaram dois anos.

Dentre os entrevistados, sete eram mulheres, entre vinte e trinta e nove anos, e um

era homem com sessenta e dois anos, aposentado por invalidez, devido a um acidente na

época que trabalhava como pedreiro. Todos os filhos das entrevistadas estavam estudando em

escolas próximas ao bairro e alguns em escolas dos antigos bairros.

Algumas famílias esperaram até três anos morando no aluguel social para receber

um imóvel; outras passaram apenas dois meses. Nesse período, muitas dividiram as mesmas

angústias, preocupações e sofrimentos, seja pela falta de condições, da casa onde moravam,

devido ao baixo valor do aluguel de R$ 150,00, em uma cidade de especulação imobiliária

cada vez mais cara – Maracanaú – seja pela angústia de achar que não iriam receber uma casa,

pela quantidade de vezes que foram chamados à COHAB com irregularidade na

documentação, seja pelo excesso de burocracia que aumentava os seus sofrimentos e suas

dúvidas, conforme revela a fala a seguir:

Eu achava que eu não ia receber, assim tinha hora que dizia que aqui (a

usuárias refere-se aos apartamentos do PMCMV) ia ser da gente, outra hora

dizia que não ia ser que isso aqui ia ser coisa tipo vender igual ao Alto da

Mangueira (Bairro de Maracanaú), né? Não ia ser coisa assim pra gente que

não tivesse condições. (M.F, moradora do aluguel social questionada sobre

seus sentimentos enquanto esperava a casa).

Essa angústia é compartilhada por quase todos os entrevistados. Para alguns, a tão

sonhada casa era a chance de um começo de uma nova vida; outros não queriam, de forma

alguma, mudar de bairro e ir morar em um apartamento, com a falta do espaço a que estavam

acostumados com os quintais por exemplo, outros só descobriram que receberiam

apartamentos e não casas, já bem perto de assinarem o contrato, depois de anos de espera.

Outro fato é o processo de adaptação ao condomínio e suas regras. Alguns

usuários passaram por um processo de adaptação difícil e doloroso. Uma das entrevistadas

teve início de depressão por se achar presa em um apartamento fechado, como ela mesmo

relata:

No começo eu adoeci, eu adoeci bastante, tive um problema muito sério

devido uma coisa que veio acontecendo em relação à moradia. Acho que no

começo, por eu não ter me adaptado, eu adoeci. Eu tô tentando me recuperar

agora. Acho que é devido eu não tá querendo (a usuária fica pensativa) da

mudança né, tem a questão de morar em lugares assim principalmente

condomínios assim fechados, a minha moradia é mais assim aberta né, aí eu

não sei. Acho que foi um abalo que eu tive, eu adoeci, eu passei bem uns três

meses doente. Hoje eu vou mostrar o exame ao médico pra ver se passou, tá

melhor. (M.L moradora do aluguel social, quando questionada sobre as

mudanças que aconteceram em sua vida depois de mudar-se para o

apartamento).

Esta não é a única usuária que fala do isolamento depois da mudança, seja pela

distância de seus bairros de origem, por sentirem-se presas dentro dos próprios apartamentos.

A falta de espaço é um tema constante nas entrevistas e um dos aspectos que incomodam

como relata outra usuária:

Aqui? tive como quintal, assim área interna pra fora que não tinha. Eu ainda

me sinto um pouco presa por causa do muro, porque a gente morar numa

casa é na rua já né? (...) e aqui só o que eu acho assim mais, é que eu me

sinto assim como se tivesse presa por causa do muro, mas fora isso to me

adaptando (M.F quando questionada se teve alguma dificuldade de inicio em

relação ao beneficio).

A divisão e convivência nos espaços comuns a todos os moradores nem sempre

agradam. Para alguns entrevistados, isso não é um problema, entendendo que esta divisão é

algo comum em condomínio, mas há aqueles que não aceitam o fato de ter que morar em um

condomínio e preferiam ter esperado mais tempo no aluguel social por uma casa.

Esses moradores são os que mais resistem a participar das reuniões informativas;

não aceitam e não entendem o papel do síndico, não acham correto precisar de um síndico

para resolver problemas em relação a seus próprios apartamentos. Para estes moradores há

uma dificuldade maior de obedecer às regras de adaptação, como afirma outra usuária do

PMCMV:

Ainda não me acostumei, eu não gostei de nada, nada daqui eu gosto, por

exemplo, eu não passo o dia em casa, hoje foi um milagre tu te me pegado

em casa porque o meu tempo eu passo todo lá nas minhas irmãs na Mucunã

(Bairro de Maracanaú), porque basta eu vim pra cá que eu fico doente,

criatura. Ontem eu cheguei aqui boazinha pode perguntar a minha filha, aí tô

gripada, tô rouca, ontem quase que eu nem falo, muito quente aqui. Essa

menina só vive doente essa bebezinha (a usuária aponta para a neta pequena

que está no colo da mãe), é ela e eu doente dentro de casa. Aqui no

apartamento eu só gosto dos meus vizinhos, é a única coisa boa que tem aqui

nesse condomínio (I.P quando questionada sobre o processo de adaptação do

condomínio).

A entrevistada, como ela mesma relata, tem muita dificuldade em ficar no

apartamento por ser muito quente. Mas o dela não é o único; todos os apartamentos têm

janelas para a entrada de ar, mas a construção do empreendimento foi feita em uma área

isolada, com pouca umidade, longe do centro da cidade e da parte mais habitada e populosa.

Durante as entrevistas a pesquisadora sentiu muita dificuldade de ficar algum tempo dentro

dos apartamentos, por serem muito quentes, sem ventilação e abafados. Isso piora quando os

apartamentos ficam do lado do sol. O Artigo 11, §1º do Pacto Internacional dos Direitos

Humanos – PIDESC diz que o conceito de moradia adequada inclui entre outros aspectos, e)

“boas condições de habitação, respeitando um tamanho mínimo, com proteção contra frio,

calor, chuva, vento ou outras ameaças à saúde, riscos estruturais e suscetibilidade e doenças”.

Os condomínios preferencialmente atendem o bairro em que está localizado e as

áreas próximas, ou seja, um condomínio é capaz de atender cinco bairros. Para essas pessoas,

não é uma mudança de localidade muito grande, pois já estão acostumadas com aquela parte

da cidade. No caso dos moradores do aluguel social, muitos moravam em bairros localizados

em pontos extremos da cidade, a mudança sem a opção de espera devido à morosidade das

entregas dos apartamentos, causa um choque cultural grande, pois a cidade em questão ainda

conserva áreas interiorano em alguns bairros. Não sendo mais possível cultivar plantas,

pequenas roças, criar galinhas e porcos como alguns entrevistados faziam.

Existem moradores que mesmo beneficiados, passam mais tempo no antigo bairro

do que em sua nova moradia, pois não se acostumam a morar em apartamentos.

3.2 OS DESAFIOS DOS MORADORES DO ALUGUEL SOCIAL ATENDIDOS PELO

PMCMV

Para alguns entrevistados, a entrega da casa foi a melhor coisa que poderia ter

acontecido em suas vidas, significando um recomeço depois de tanta espera e de tanta luta por

uma moradia digna. A conquista da casa própria é almejada por muitos brasileiros, e no caso

da população de baixa renda, muitas vezes só é alcançada mediante benefícios

governamentais como a habitação de interesse social e o PMCMV.

As condições de habitabilidade das famílias pesquisadas não podem ser ignoradas,

como as casas de taipas sem banheiro, sem saneamento básico, sem água, sem luz; casas em

condições insalubres, próximas à encosta de rios, sofrendo alagamentos a cada chuva mais

forte; invasões em terrenos da prefeitura e construções sem nenhuma segurança.

Nesses casos conseguir a tão sonhada e prometida casa própria é uma dádiva, o

difícil é deparar-se com o fato de que a esperança/sonho da casa própria não se concretiza em

forma de casa, e sim de apartamento. Os moradores não tem espaço como quintal e não é

possível levar seus animais de estimação para dentro do condomínio, pois é proibido criar

animais nos empreendimentos. A privacidade diminui, devido à proximidade das janelas,

como relata uma das beneficiarias:

Pra falar a verdade não, eu esperava dele ser um pouco afastado, não ser

janela com janela a gente olhar assim pro canto e olhar pra pessoas que não

gostam da gente. Eu esperava outra coisa melhor (M. L, quando questionada

sobre se o apartamento atendeu às expectativas).

A falta de privacidade é uma constante nas entrevistas, podendo ser percebida pela

coletividade em outros espaços na rotina do condomínio. Os locais onde se estendem roupas

depois de lavadas são coletivos, além do fato de que, para o vizinho de cima acessar estes

locais, primeiro precisa falar com o vizinho de baixo. É necessário aprender a conviver em um

condomínio, assumir responsabilidades como taxas fixas todo início de mês e saber que o

descumprimento pode levar à perda do apartamento, bem como ter o seu nome “sujo” no

comércio impedindo de realizar qualquer compra a crédito. Fere-se assim o Artigo 11, §1º do

Pacto Internacional dos Direitos Humanos – PIDESC que estabelece o direito: a) “uma

condição de ocupação estável, ou seja, morar em local sem medo de remoção ou ameaças

indevidas ou inesperadas”.

O descumprimento do pagamento das taxas cobradas pelos PMCMV, e a ameaça

iminente da perda do apartamento são algumas das principais reclamações dos beneficiários

do aluguel social tendo no seu total dos pesquisado apenas, 37% dos moradores que

conseguiram estar em dias com todas as taxas, incluindo o apartamento e a taxa de

condomínio, 38% do entrevistados só pagam o apartamento e não pagam a taxa de

condomínio e 25% dos entrevistados até a data da pesquisa não tinham pague nenhuma

prestação do apartamento nem da taxa de condomínio. Isso ocorre porque como foi visto no

primeiro gráfico a principal fonte de renda dos pesquisados é o Bolsa família. Veja no gráfico

a seguir:

Gráfico 2:

Fonte do gráfico: Direta, 2012.

É possível observar que mais da metade dos entrevistados não paga taxa de

condomínio, e, mesmo os que conseguem pagar priorizam os apartamentos por não acharem

importante pagar o condomínio ou por não ter dinheiro suficiente para os dois. O fato é que o

descumprimento do pagamento da taxa de condomínio gera um constrangimento imenso para

quem não paga, pois quem paga sabe através de cartas e comunicados colocados pelos

síndicos nas portas dos moradores inadimplente, gerando uma grande revolta no condomínio

da por parte de quem paga exigindo melhorias de estrutura e segurança que deveriam ser

cobradas pelas taxas condominais.

Boa parte do valor das taxas destina-se as despesas condominais, a outra vai para

um caixa do condomínio. Como muitos não pagam a taxa de condomínio, este não tem

37%

38%

25%

Pagamento das Taxas do Apartamento e Condomínio

Apartamento e condomínio Só apartamento Nenhuma taxa

dinheiro para pagar suas despesas e isso reflete nos moradores que não pagam condomínio,

cerca de 63% dos pesquisados.

Alguns dos entrevistados já tinham renegociado a taxa de condomínio com seus

síndicos, mas até a data das entrevistas ainda não tinham conseguido pagar. A pressão em

relação ao pagamento da taxa por parte de quem paga existe porque é de responsabilidade dos

moradores a manutenção do condomínio.

A construtora que construiu os três Virgílio Távora faliu. Para o Virgílio Távora

II, deixou uma dívida de mais de quinze mil reais com a COELCE, porque usou a energia

desse condomínio para construir os Virgílio Távora I e III. Os apartamentos foram entregues e

a dívida aumentou. A CEF não assumiu a dívida a qual foi repassada para os moradores, que

até hoje pagam esse débito que existe antes mesmo deles serem beneficiados.

Os moradores do aluguel social que não conseguem pagar a taxa de condomínio

não se sentem a vontade para participar das reuniões sobre prestação de contas e informativas

por não conseguirem pagar o condomínio.

Outro fator relevante nas pesquisas é a oferta de cursos de capacitação

profissional pela CEF. Este fator conta porque muitos beneficiários trabalham de forma

independente, são autônomos, desenvolvem atividade de comércio dentro do condomínio,

pois já desenvolviam essas atividades antes do benefício, tais como vendas, sorveterias e salão

de beleza. O que conflita para alguns dos nossos entrevistados é que atividades comerciais

dentro dos apartamentos são proibidas pela CEF, constando como cláu sula no contrato que

eles assinaram.

Os cursos de capacitação profissional disponíveis para os moradores seriam

cursos de corte e costura, gastronomia, cabeleireiro, auxiliar de escritório entre outros, para

isso foi realizada uma pesquisa de opinião dentro dos condomínios com os moradores.

Para alguns, os cursos seriam uma oportunidade de aprimorar técnicas já

conhecidas; para outros a oportunidade de montar um negócio, uma chance de

empreendedorismo. Mas existem os que não acreditam na efetivação desses cursos, já que

atividades comerciais não podem ser exercidas dentro dos condomínios e os comércios já

existentes passam por vigilância frequente da prefeitura, sendo denunciados por outros

moradores que não acham justo alguns possuírem comércios em suas residências e outros não.

Essa revolta acontece porque a equipe da prefeitura trabalha na implementação do

Trabalho Técnico Social com os moradores dos condomínios. Desse modo há casos de

denúncias, esses casos são repassados para a CEF que tem poder maior do condomínio, já que

os beneficiários assinam contrato com a CEF e não com a Prefeitura de Maracanaú. A

morosidade da CEF em atender as denúncias, repassadas pelas assistentes sociais da

Prefeitura de Maracanaú, irrita os moradores, pois existe também uma deficiência em

fiscalizar os condomínios gerando grande revolta nos beneficiários, que não conseguem ser

atendidos na Superintendência da Caixa Econômica Federal, localizada em Fortaleza capital

do Estado, divido a localização da CEF e em muitas vezes por não ter como chegar lá.

Outra dificuldade bastante relatada foi falta de vagas nas escolas do bairro, a

locomoção até elas e também a falta de vagas nos postos de saúde. Alguns usuários se

mudaram em maio no meio do primeiro semestre, e encontram as escolas próximas já lotadas

e nenhuma creche disponível. O transporte escolar só foi disponibilizado pela Secretária de

Educação quase um mês depois da mudança e não levava crianças com menos de sete anos de

idade. Algumas mães deixaram seus filhos matriculados nas antigas escolas, mas não tinham

dinheiro todos os dias para passagem que custa R$ 2,70 centavos inteira, ficando inviável este

valor por dia, dependendo da quantidade de pessoas da família.

Algumas dificuldades de acesso a escolas e serviços de utilidade pública. Artigo

11, §1º do Pacto Internacional dos Direitos Humanos – PIDESC também dispõem sobre: b)

“acesso a serviços, bens públicos e infraestrutura, com energia elétrica, sistema de esgoto e

coleta de lixo”.

(...) ainda hoje eu tô tendo dificuldade é com colégio pra conseguir

matricula. Elas estudam ainda lá no “Narcisio”, lá no Residencial (Bairro de

Maracanaú) onde eu morava (...) não, posto de saúde já foi resolvido tem

problema não, só a escola mesmo que é a minha maior dificuldade aqui,

colégio (M.F quando questionada sobre o acesso a bens e serviço público).

O caso da usuária não é o único. Uma moradora também conta suas dificuldade de

acesso às escolas no novo bairro onde ficam localizados os condomínios onde estão morando.

Assim os colégios que não tinham vagas, o transporte também que não

tinham como trazer e lá não tinha que já tinha um bocado de gente que já

tinha conseguido né, tinha ido lá pedir ai não tinha (E. E quando questionada

sobre o acesso a bens e serviço público).

A falta de acessibilidade desses moradores do aluguel social aos serviços públicos

não é isolada. Isso ocorre porque não existe um planejamento urbano onde esses

empreendimentos são construídos. Com a especulação imobiliária cada vez mais alta nas

grandes cidades, as construtoras não conseguem terrenos baratos dentro dos grandes centros,

tendo que construir seus prédios nas extremidades das cidades, em terrenos cedidos pelas

Prefeituras, onde também não há infraestrutura para atender às populações recém-chegadas.

Não existem escolas suficientes, postos de saúde, supermercados, espaços de

convivência coletiva para lazer. Nada isso é oferecido, pois, não se identifica primeiramente

as reais necessidades desses espaços e desta população. Não há um projeto de urbanização

para esses locais e para esta população, que já vem sofrendo com o descaso por falta de

planejamento urbano.

O que os moradores encontram é apenas o mínimo. Não há um planejamento

inicial de preparação para as famílias. A assinatura do contrato para a mudança acontece em

um espaço de tempo muito curto; dependendo da localidade onde essas famílias estavam

morando, fica difícil ir atrás de escolas para os filhos, por não conhecerem a região e muitas

vezes, por não terem com quem deixar as crianças ou por não terem o dinheiro da passagem.

O espaço de tempo entre a assinatura de contrato com CEF e a mudança para o

condomínio é de, no máximo, vinte dias. Mesmo morando no aluguel social alguns moradores

precisam se preparar para sair das casas onde moram, pois existe todo um vínculo com o

bairro onde estão morando até então. Os familiares próximos que moram no mesmo bairro, as

crianças que já estão acostumadas à escola do bairro onde estão morando, esse tempo de

preparação não é disponibilizado podendo piorar, ou seja, ficar ainda mais curto, dependendo

da época do ano em que esses contratos são assinados. Quase sempre as assinaturas

acontecem em períodos letivos, fato que complica muito a vida escolar das crianças.

Nesse caso há uma grande procura por vagas nas escolas próximas aos

condomínios. O posto de saúde do bairro também não foi preparado para atender a nova

demanda existente, devido à implementação dos três condomínios. Até a regularização dessa

situação, no caso do posto de saúde, a Secretaria de Saúde do Município disponibilizou mais

pessoal para atender a nova demanda do bairro. Até a data das entrevistas os moradores do

aluguel social beneficiados pelo PMCMV, ainda encontram dificuldade de matricular seus

filhos nas três escolas mais próximas ao condomínio devido à falta de vagas.

3.3 O PMCMV NA ÓTICA DOS BENEFICIADOS

Para ser beneficiado pelo PMCMV de baixa renda, as famílias devem receber até

três salários mínimos que dá um total de R$ 1.866,00 (mil oitocentos e sessenta e seis reias).

Mas no município de Maracanaú esse três salários mínimos são no máximo R$ 1.600,00 (mil

e seiscentos reais).

Mesmo com essa renda de R$ 266,00 (duzentos e sessenta e seis reais) abaixo da

média nacional, um dos grandes questionamentos dos moradores do aluguel social

beneficiados pelo PMCMV era em relação à disparidade entre eles para os outros moradores

do condomínio. Na visão dos usuários o benefício de casas de baixa renda só poderia ser

concedido a quem – como eles dizem – realmente necessita. Isto acontece porque dentro dos

condomínios moram pessoas de classe média, que possuem automóveis eletrodomésticos de

última geração. Como ar-condicionado (mesmo sendo proibido pelo Programa, devido à

condição das paredes, que são de alvenaria estrutural, ou seja, cada parede é uma coluna, além

de a caixa de energia não suportar a energia gerada pelo ar-condicionado e queimar os

eletrodomésticos dos vizinhos). Desse modo, ressalta uma entrevistada:

Nessa parte aí, porque se eles fiscalizassem mesmo eles iam ver que tá

errado aí, porque tem muita gente precisando de uma moradia, como tem

muitos aqui que não precisam e moram num apartamento desses. E também,

cada qual paga uma taxa diferente como tu sabe e todo canto, acho que a

minha é mais pouca e eu não tenho condições de pagar. Eu acho que a

maioria aqui paga porque tem condições, trabalha marido, trabalha esposa,

trabalha todo mundo. Porque eu acho assim: eles tem que vê também como é

a condição da pessoa né, eu acho difícil mulher pra mim é difícil isso aqui,

não vou mentir (I.P, quando questionada se via alguma falha ou

irregularidade no PMCMV).

Nesse caso, é relatada por parte da entrevistada a diferença na cobrança dos

apartamentos entre os moradores dos condomínios. Sabe-se que o valor máximo a ser cobrado

e de 5% da renda declarada, mas na prática isso não acontece.

O valor mínimo cobrado para esses moradores é de R$ 25,00 (vinte e cinco reias),

mas isso aconteceu a partir de julho de 2012. Dos oito entrevistados, somente um paga R$

27,00 (vinte sete reais); para os outros, o valor mínimo pago é de R$ 50,00 (cinquenta reais).

Na renda dos entrevistados esse valor faz muita falta, já que, como foi visto no gráfico 1, mais

da metade dos usuários vive do Bolsa família e alguns entrevistados não têm renda alguma.

Outra moradora relata o que vê como falha do PMCMV:

Falhas tem muitas. Assim ó, por exemplo, como eu te falei, eles disseram

que era uma coisa, era outra. No início eu pensei que fosse uma casa, e não

um apartamento, mas depois elas vieram e disseram que era apartamento.

Num era pra gente pagar nós tamo pagando, entendeu? Essas coisas assim

porque quando nos vinhemo pra cá eles disseram que aqui ia ter colégio,

mercantil, ia ter segurança, ia ter muitas coisas que não tem, então tem

muito. Se a gente procurar a habitação hoje, como a taxa que a gente

pagamo, não tem resposta no momento (M. F, quando questionada se via

alguma falha ou irregularidade no PMCMV).

É possível perceber que as queixas dos moradores são muito parecidas que o

descontentamento em a nova moradia, por não se tratar de uma casa e sim de um apartamento,

está presente na maioria dos entrevistados. Mesmo os que gostam da nova moradia ainda sim

preferiam uma casa. Em relação à taxa que a entrevistada se refere, é taxa de cartório no valor

de R$ 417, 25 (quatrocentos e dezessete reais e vinte cinco centavos), para os primeiros dois

condomínios entregues em Maracanaú, o Residencial Jornalista Blanchard Girão e o

Residencial Virgílio Távora II. Segundo dados da Habitação de Maracanaú, essa taxa foi

responsável por cerca de 25% de desistências dos inscritos no Programa, pois precisava ser

paga ao cartório em menos de uma semana e muitos não tinham esse dinheiro.

Já na entrega dos últimos condomínios, a taxa não existia mais e o valor mínimo

da cobrança do apartamento variou de 10% para 5%, mas aqueles que pagaram a taxa, até

hoje lutam para receber o dinheiro que foi pago aos cartórios. Porém a devolução fica

inviável, pois os donos do cartório não têm nenhuma obrigação legal para a devolução do

dinheiro e a CEF não toma nenhum posicionamento em relação a essa questão, deixando todo

e qualquer esclarecimento a cargo das assistentes sociais da Prefeitura de Maracanaú.

Alguns usuários ainda não perderam a esperança de receber esse dinheiro e

contam com ele para futuras despesas ou para ajudar a pagar as parcelas das “casas”.

As irregularidades vistas pelos usuários perpassam este capítulo e aos poucos, são

contatadas em suas falas, que revelam dúvidas e preocupações, além da falta de conhecimento

em relação a seus direitos, sobretudo o direito a moradia, o qual o Programa em que estão

inseridos visa garantir.

Porém, esse direito, na visão de alguns, significa as regras do condomínio e ter

suas reclamações atendidas pelos síndicos, devido ao fato de o apartamento ser pago todos os

meses. O direito à moradia é desconhecido por muitos entrevistados e, em alguns casos,

comprado como regulamentação de convivência condominial.

Essa falta de informação remete a outro dado importante da pesquisa, qual seja o

nível de escolaridade dos entrevistados. Dos oito entrevistados apenas 13% concluiu o Ensino

Médio; 12% não concluíram o Ensino Médio; 25% não terminaram o Ensino Fundamental e

50% não chegaram ao 5º ano do Ensino Fundamental, como ilustra o gráfico abaixo:

Fonte do gráfico: Direta, 2012.

O nível de escolaridade dos usuários foi um dos impasses em relação à assinatura

de contrato de muitos deles, pois quem não sabia assinar precisava de um procurador legal

para que o mesmo assinasse o contrato com a CEF em seu nome. Porém, para alguns

beneficiários, isso foi um constrangimento terrível, pois a CEF, não aceita a digital como

assinatura; o usuário precisa achar alguém de sua confiança que aceite assinar em seu lugar e

que precise estar à disposição todas as vezes que a CEF, em conjunto com a COHAB,

solicitarem esse procurador, não sendo necessária a presença do titular na assinatura de

contrato, caso este tenha a digital substituída pela assinatura do procurador.

Outros fatos são relatados pelos entrevistados, tais como o que eles julgam como

irregular e o que acham do processo de seleção de pessoas para as casas uma usuária do

aluguel social beneficiada pelo PMCMV comenta:

É isso aí, dá a casa só para aquelas pessoas que não tivesse condições de

pagar. Que nem isso ai né essa minha casa (a entrevistada se refere à casa do

projeto de interesse social em que tinha sido beneficiada anteriormente),

porque tem muita gente que não tem condições de pagar aí a gente vem pra

cá é sujeito a eles botar a gente pra fora, aí se eu chegar atrasado, bota eu pra

fora porque eu não tenho condições de pagar. Eu já disse a habitação porque

eu pago só do bolsa família eu não sei até quando (E.E, quando questionada

se via alguma falha ou irregularidade no PMCMV).

O medo do despejamento mesmo depois de beneficiados, ainda acompanha

muitos usuários do PMCMV, que viam o Programa como uma forma de moradia digna e

segura. Mas, por descumprirem com os pagamentos, muitos usuários acreditam que serão

despejados a qualquer momento, devido às cobranças da CEF que recebem mensalmente.

A insegurança e incerteza das famílias crescem à medida que os meses passam e

elas não conseguem quitar suas dívidas, tentam renegociar, conversar com os síndicos de cada

prédio, fazer trabalhos-extra, por medo de perder o único bem que “possuem”.

Mas há também aquelas famílias que não tem esperança para isso, que veem o

PMCMV como a pior coisa que aconteceu em suas vidas devido à quantidade de contas que

assumiram com ele, como relata à entrevistada:

Aumentou foi muito as minhas preocupações, porque tem que pagar isso

daqui, tem que negócio de alimentação, tem que comprar gás, tem que pagar

num sei o que. Aumentou foi, mas desempregada, sem ganhar nem um

benefício, como é que eu vou (...) com essas coisas? (I. P, quando

questionada sobre suas preocupações em relação ao PMCMV).

Nessa fala também é possível perceber o medo em relação ao desabrigamento,

além da dificuldade que a moradora está tendo com despesas mais urgentes, como

alimentação. E também é possível perceber o desânimo e o descontentamento com o

benefício, que para alguns trouxe mais “dor de cabeça”.

Outra questão observada refere-se ao que os entrevistados acham dos outros

moradores do condomínio. A maioria questiona o modo de seleção para os beneficiados do

PMCMV. Muito é ouvido em relação a outros moradores que possuem casas próprias. Mas,

em Maracanaú, além das consultas da CEF, o único meio de verificação é por um sistema da

prefeitura que consulta o CPF do usuário, verificando se o mesmo tem Imposto Predial e

Territorial Urbano – IPTU ou não.

Caso esse usuário não possua nenhum bem em seu nome não há como provar que

o mesmo possuí outro imóvel, por isso a forma mais rápida e eficaz de constatar isto é através

de denúncias dos próprios moradores. Depois das denúncias feitas, os casos são repassados

para a CEF que fica responsável pela fiscalização. Mas devido à morosidade da CEF, muitos

usuários se sentem enganados enquanto a está fiscalização e enquanto a autonomia de um

bem a qual estão pagando, pois os moradores não vêem a CEF nos apartamentos fazendo este

trabalho. De acordo com uma usuária:

(...) cada pessoa aqui é diferente; num tem classe num tem nada, é tudo

misturado; é pobre, é rico, é branco, é preto. Porque eu acho assim, só pros

pobres tem que ser só os pobres os que não tem condições, mas não tem

muita gente aqui que tem condição tem onde morar, tem casa própria e mora

aqui, entendeu? Isso que eles (a usuária se refere aos representantes da CEF)

disse que ia fazer, ia passar uma pessoa pra fiscalizar quem tem condições

quem não tem condições porque a maioria aqui tem. Isso aqui é pros pobres?

Em cada apartamento desse aqui você vê as pessoas diferentes umas das

outras, aqui não tem só as pessoas pobres, já viu um pobre ter um carro?

Pode ter com muita dificuldade, aí todo mundo sabe (I.P quando questionada

se via alguma falha ou irregularidade no PMCMV).

O fato é que o PMCMV veio como uma tentativa de solução para o problema

habitacional brasileiro e não se podem negar os avanços que o mesmo trouxe à política

habitacional. Entretanto, fatos antigos ainda ocorrem mesmo com a mudança de programa

para programa, fatos vistos no primeiro capítulo como os modelos de conjuntos habitacionais

da década de 1960, na época da ditadura militar, parecem servir como referência para o

modelo atual no que diz respeito ao processo seletivo. A política sofreu avanços, mas a suas

formas de elaboração e implementação, em alguns casos não.

Durante toda pesquisa o que mais ficou evidente, foi á esperança dos

entrevistados com relação à casa própria, os anseios, os planos com um futuro próximo. Mas,

com a conquista das “casas”, veio às decepções narradas durante todo este capítulo, as

frustrações, a dificuldade em relação aos pagamentos e a convivência coletiva nos

apartamentos.

Ainda é preciso haver planejamento urbano, participação popular das famílias que

virão a ser beneficiadas em qualquer programa habitacional, além de não isolar essas famílias

a locais errôneos da cidade, obrigando-as a criar sua própria cidade dentro de uma cidade já

existente e que deveria oferecer toda infraestrutura a qual estas famílias têm direito.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho teve por objetivo mostrar os limites e as contradições do Programa

Minha Casa, Minha Vida implementado no município de Maracanaú, tendo como sujeitos os

moradores do aluguel social que foram beneficiados pelo Programa em questão.

Feito este estudo, concluiu-se que, para a maioria dos entrevistados, o Programa

não atendeu suas expectativas em relação ao que foi proposto desde o cadastramento pela

Prefeitura de Maracanaú. Em grande parte os beneficiários não se adaptaram a morar em

condomínios fechados, longe dos seus bairros de origem e do centro da cidade. Aspectos

como o tamanho dos apartamentos e a falta de espaço podem ser observados durante a

pesquisa, que limita os usuários dentro de seus apartamentos e força-os a locais coletivos para

algumas atividades básicas.

Em muitos casos o que mais desagradou foi à dificuldade de acesso às escolas e

postos de saúde do bairro onde estão morando. Por essa razão ainda é grande a procura desses

moradores nos postos de saúde de seus antigos bairros.

Apesar das dificuldades encontradas, algumas conclusões podem ser tiradas. O

PMCMV colocou à habitação, novamente, um papel de destaque na política social

governamental, fato ainda não ocorrido após a redemocratização do País. Este retorno da

habitação na pauta nacional deve ser creditado a uma série de fatores, como o forte

crescimento do PIB e os avanços institucionais nos últimos anos possibilitando melhores

condições de crédito e acesso à moradia própria.

Porém, foi à crise internacional, ocorrida em setembro de 2008, o fator que

desencadeou todo este processo, alimentando o Programa com recursos orçamentários.

Em se tratando de resultados específicos do Programa, conclui-se que o PMCMV

não logrou, nestes quatro anos de atividade, resultados satisfatórios para as camadas mais

pobres da população, assim como o extinto BNH. Como no programa criado em 1964, as

famílias de classe média foram as principais beneficiadas. Isso se deve a dificuldade que o

Estado encontra em estabelecer empreendimentos populares, de baixo custo, nas regiões onde

o problema do déficit habitacional é mais agudo, como nos grandes centros urbanos.

Esta dificuldade está baseada nos altos preços dos terrenos nestas regiões que,

aliados à falta de interesse por parte das incorporadoras na construção de empreendimentos

básicos para as camadas mais pobres da população, acabam por tornar inviáveis as reduções

dos problemas nas grandes regiões metropolitanas.

Mesmo sendo visto como algo revolucionário na política habitacional brasileira

em muitos anos, o PMCMV, ainda comete vícios antigos, como no caso do processo de

seleção das famílias de baixa renda e da localidade das habitações.

Com isso também reproduz problemas antigos, como a dificuldade de acesso

desses conjuntos ao centro da cidade, escolas, lazer, infraestrutura e todos os espaços de bens

públicos ao qual essa população tem direito.

Provocando o sentimento de decepção no beneficiários depois da conquista da tão

sonhada “casa” própria, que vêm acompanhadas de uma séria de regras e dificuldades, que

não se adequar a vida dos novos moradores.

Cabe agora esperar os rumos a serem tomados pelos moradores do aluguel social

beneficiados pelo PMCMV nesses condomínios pesquisados, na jornada de dez anos para a

quitação dos apartamentos e esperar que o Estado garanta Direitos essenciais à sobrevivência

desses moradores na localidade onde estão.

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ANEXOS

Roteiro de entrevistas com os representantes das famílias do aluguel

social beneficiadas pelo programa Minha Casa, Minha Vida nos

condomínios, Virgílio Távora I, II e III - Maracanaú/Ce

Nome:

Idade: Naturalidade:

Escolaridade:

Feminino ( ) Masculino ( )

Aluguel social ( )

1- É natural de Maracanaú? Se não, como foi o processo de chegada ao município?

2- Tem filhos? Quantos? Idade e escolaridade?

3- Exerce alguma atividade remunerada e qual sua renda mensal?

4- Tem cônjuge? O mesmo exerce alguma atividade remunerada? Se sim, qual a renda

mensal?

5- É beneficiário de algum programa assistencial? Qual?

6- Participa de alguma associação política? Qual?

7- Onde morou antes de chegar ao aluguel social? Comente as condicionalidades de sua

moradia como saneamento, tipo de casa e quantos cômodos, antes de ser beneficiada

pelo PMCMV?

8- Passou por algum abrigo? Como era sua vida no tempo em que morou no abrigo ou

aluguel social, comente os problemas que o atingiram ?

9- Como teve conhecimento do PMCMV? Teve alguma dificuldade na inscrição do

programa? Quais?

10- O que você acha dos critérios para inscrição no PMCMV? Na sua opinião, quem

deveria ter acesso ao PMCMV? Justifique.

11- Foi encaminhada por algum equipamento de Assistência Social para Coordenadoria de

Habitação –COHAB? Se foi qual?

12- Quanto tempo esperou para ser beneficiado no PMCMV?

13- Nesse tempo, quais eram as suas expectativas, sentimentos e preocupações?

14- Teve alguma dificuldade de inicio em relação ao benefício? Se sim, comente.

15- Como foi o processo de adaptação dentro do condomínio? O que gostou o que não

gostou?

16- O apartamento atendeu as expectativas? Expresse sua opinião sobre as

condicionalidades existentes no PMCMV, dificuldades de adaptação ás regras ao

pagamento de taxas e etc.

17- Quantas pessoas moram na sua residência, quantas trabalham e quem é o chefe da

família?

18- Que mudanças aconteceram em sua vida depois de ir morar no codomínio?

19- Quais os anseios da família beneficiada no que tange os cursos de capacitação

profissional a serem oferecidos pelo PMCMV, tem alguma sugestão?

20- Quais suas perspectivas no que engloba o pagamento das parcelas do financiamento

pelos próximos dez anos?

21- Qual sua visão sobre o direito à moradia digna e de qualidade para todos e qual o

entendimento sobre à aquisição do seu imóvel?

22- Na sua opinião, quais as falhas do PMCMV? Você observa alguma irregularidade?

Qual? Comente.

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Título da Pesquisa: “DA ESPERANÇA À DECEPÇÃO: OS LIMITES E

CONTRADIÇÕES DO PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA NO MUNICÍPIO

DE MARACANAÚ.”

Pesquisadora: Ana Jessica da Costa Gonçalves

Orientador (a): Mônica Duarte Cavaignac

Sr. (Sra.) está sendo convidado(a) a participar desta pesquisa que tem como finalidade

analisar a perspectiva do usuário morador do Aluguel Social, beneficiado pelo Programa

Minha Casa, Minha Vida.

Ao participar deste estudo o Sr. (Sra.), permitirá que a pesquisadora utilize suas

informações para a realização desta pesquisa. Entretanto, os dados obtidos serão mantidos em

sigilo, somente a pesquisadora e o orientador (a) terão conhecimento dos dados.

O participante tem a liberdade de desistir a qualquer momento do estudo caso julgue

necessário, sem qualquer prejuízo. A qualquer momento poderá pedir maiores

esclarecimentos sobre a pesquisa através do telefone da pesquisadora do projeto.

O maior benefício para o participante será a sua contribuição pessoal para o

desenvolvimento de um estudo científico de grande importância, onde a pesquisadora se

compromete a divulgar os resultados obtidos.

O Sr. (Sra.) não terá nenhum tipo de despesa para participar desta pesquisa, bem como

nada será pago por sua participação.

Após estes esclarecimentos, solicito o seu consentimento de forma livre para participar

desta pesquisa. Portanto preencha, por favor, os itens que se seguem:

Consentimento Livre e Esclarecido

Tendo em vista os itens acima apresentados, eu, de forma livre e esclarecida,

manifesto meu consentimento em participar da pesquisa.

____________________________________________

Nome do participante

____________________________________________

Assinatura do participante

____________________________________________

Assinatura da pesquisadora

____________________________________________

Assinatura do orientador (a)

TELEFONES:

Pesquisadora: (85) 8691 1507

Orientador (a): (85) 9973 9965