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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA FACULDADE DE DIREITO DE CURITIBA GABRIELLE BOLONHEZ PICHORIM CABEDA A ESTABILIZAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA ANTECIPADA EM CARÁTER ANTECEDENTE CURITIBA 2019

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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA FACULDADE DE DIREITO DE CURITIBA

GABRIELLE BOLONHEZ PICHORIM CABEDA

A ESTABILIZAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA ANTECIPADA EM CARÁTER

ANTECEDENTE

CURITIBA

2019

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GABRIELLE BOLONHEZ PICHORIM CABEDA

A ESTABILIZAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA ANTECIPADA EM CARÁTER

ANTECEDENTE

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito do Centro Universitário Curitiba.

Orientadora: Tatiana Denczuk

CURITIBA

2019

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GABRIELLE BOLONHEZ PICHORIM CABEDA

A ESTABILIZAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA ANTECIPADA EM CARÁTER

ANTECEDENTE

Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em

Direito do Centro Universitário Curitiba, pela Banca Examinadora formadas pelos

professores:

Orientadora: Tatiana Denczuk

____________________________________

Prof. Membro da Banca

Curitiba, ____ de _________de 2019.

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RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo desenvolver o estudo sobre a tutela antecipada em caráter antecedente e, principalmente, compreender o instituto da estabilização da tutela trazido pelo artigo 304, §§ 5º e 6º da Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015. Pretende-se destacar os alcances e os limites da técnica da estabilização, tendo como base de estudo a conceituação das tutelas provisórias, bem como a justificativa e momentos de sua concessão. Ainda, será observada a distinção entre a cognição sumária e exauriente e a aplicação da tutela antecipada antecedente como técnica de satisfação imediata do bem da vida, que é concedida como se fosse tutela definitiva, mas com base em cognição sumária. Ademais, será abordado o conceito da tutela antecipada antecedente que pode ter seus efeitos estabilizados e será realizado um estudo da divergência doutrinária que pesa sobre a possibilidade da estabilização ter força de coisa julgada, ou não, e, quais os danos irreversíveis da inafastabilidade dessa medida. Palavras-chave: Tutelas de urgência. Tutela antecipada antecedente. Cognição sumária e exauriente. Coisa julgada. Estabilização da tutela.

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ABSTRACT

The purpose of this study is to develop a study on early guardianship in a prior history and, mainly, to understand the institute of stabilization of guardianship brought by the legislator in article 304 of the civil procedure code of 2015. It is intended to highlight the scope and limits of the technique of stabilization, first having as study basis, the conceptualization of provisional tutelages, as well as the justification and moments of its concession. Moreover, the distinction between summary and exurrent cognition and the application of antecedent antecedent protection will be observed as a technique of immediate satisfaction of the good of life that is granted as if it were definitive tutelage, but based on summary cognition. In addition, it will be approached the concept of the antecedent guardianship antecedent that can have its effects stabilized, as well as a study of the doctrinal divergence that weighs on the possibility of the stabilization to have force of res judicata or not, and what irreversible damages of the inafastabilidade of this measure. Keywords: Guardianship urgent. Antecedent guardianship antecedent. Summary and exuberant cognition. Res judicata. Stabilization of guardianship.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................................. 6

2 HISTÓRICO DAS TUTELAS ...................................................................................................... 8

2.1 TUTELA E PROVISORIEDADE ......................................................................................... 8

2.2 PROCEDIMENTO CAUTELAR NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 ..... 11

2.3 NOVIDADES E ALTERAÇÕES TRAZIDAS COM O NOVO CÓDIGO DE

PROCESSO CIVIL ..................................................................................................................... 15

2.3.1 Pressupostos Processuais para a Concessão das Tutelas ................................. 17

3 CARACTERÍSTICAS DAS TUTELAS ANTECIPADAS ...................................................... 22

3.1. PROVISORIEDADE ........................................................................................................... 22

3.2. SATISFATIVIDADE ............................................................................................................ 24

3.3. MOMENTO DA CONCESSÃO ......................................................................................... 27

3.4. COGNIÇÃO NO ASPECTO VERTICAL E HORIZONTAL ........................................... 30

4 ESTABILIZAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE ......... 35

4.1. A ESTABILIZAÇÃO TEM FORÇA DE COISA JULGADA? ......................................... 40

4.2. O PRINCÍPIO DA EFETIVIDADE E A SEGURANÇA JURÍDICA ............................... 46

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................................... 50

REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 52

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1 INTRODUÇÃO

O estudo a ser abordado abrange as tutelas antecipadas e, por isso, é

importante entender sua conceituação. A tutela antecipada é aquela concedida em

caráter provisório e satisfativo, tornando possível a concessão antecipada do direito

que só seria obtido ao final do processo.

Essa tutela poderá ser requerida de forma incidental ou antecedente. Será

incidental no caso em que, durante o trâmite processual, ou seja, quando já iniciado o

processo, faz-se necessário um pedido de tutela de urgência, que é concedido

também inicialmente, ou seja, no trâmite do processo. Igualmente, ela é considerada

incidental quando a petição inicial, que dá início à ação, contém todos os pedidos

finais, definitivos e satisfativos que a parte autora pretende obter e também o pedido

de tutela antecipada, com base na urgência.

Por outro lado, será requerida de forma antecedente, quando a petição inicial

contém apenas o pedido urgente – provisório e antecipado – e oportunamente será

feita a complementação dos fatos, argumentos jurídicos e formulação do pedido final

e definitivo.

O tema deste trabalho busca solucionar as dúvidas trazidas com o advento do

artigo 304, §§ 5º e 6º, do Código de Processo Civil de 2015. De acordo com o artigo

já mencionado, a decisão interlocutória concedida em tutela antecipada antecedente

terá seus efeitos estabilizados.

Isso significa que se o réu não recorrer ou impugnar a decisão que conceder a

tutela antecipada em caráter antecedente, ela poderá tornar-se estável e o processo

poderá ser julgado extinto. Nesse caso, dentro do prazo de dois anos, a parte poderá

rever tal decisão, mas apenas em outra ação, que terá cognição exauriente.

Dito isso, evidencia-se que o estudo a respeito do instituto da estabilização

justifica-se em razão de que os efeitos que se tornarão estáveis, em razão da inercia

do réu, somente poderão ser discutidos em ação própria, e dentro do prazo de 2 anos.

E, nesse caso, questiona-se se, após o prazo de dois anos, tal decisão teria força de

coisa julgada ou não.

Diante disso, o presente trabalho será desenvolvido conforme a abordagem

dos conceitos das tutelas provisórias, com uma análise pormenorizada dos

pressupostos que caracterizam as tutelas de urgência.

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E, após o estudo das tutelas provisórias, a pesquisa será delimitada ao estudo

detalhado dos efeitos da estabilização da decisão concedida em tutela antecipada

antecedente, com o questionamento da possibilidade da decisão estável se tornar

“indiscutível” sem ter atingido uma cognição exauriente.

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2 HISTÓRICO DAS TUTELAS

No presente capítulo, será abordado o histórico das tutelas, isto é, ficará

demonstrado as inovações trazidas pelo legislador no decorrer do tempo, bem como

qual a importância do instituto das tutelas provisórias para que ocorra a adequada

prestação jurisdicional no âmbito do processo civil.

2.1 TUTELA E PROVISORIEDADE

Inicialmente, é importante esclarecer, ainda que de forma sucinta, a distinção

entre tutela jurisdicional definitiva e provisória. A tutela definitiva advém de uma

cognição exauriente respeitando o devido processo legal e traz uma decisão apta à

imutabilidade, enquanto a tutela provisória é concedida em cognição sumária e tem

por objetivo antecipar os efeitos da tutela definitiva.

O objeto de estudo deste trabalho é a tutela provisória, portanto, trazendo um

conceito mais delimitado, entende-se que essa tutela é uma proteção que deverá ser

concedida pelo Poder Judiciário quando houver omissão no cumprimento de algum

direito ou quando esse direito estiver perecendo ao ponto de colocar em risco o

resultado útil do objeto da ação. Em outras palavras, o autor Eduardo Arruda Alvim1

esclarece que

A tutela provisoria e, como anunciado, um instituto que visa assegurar um acesso efetivo ao Judiciário, quando haja o perigo de perecimento do direito, (...)”ou ainda quando houver risco ao resultado util da demanda (conforme o art. 300 do CPC/2015, ao tratar da tutela cautelar) e quando a subordinação do autor ao tempo se mostrar desnecessária, por ser ínfima a probabilidade de não ser ele vitorioso (...)

Importa salientar que em alguns casos, para a concessão da tutela provisória,

o direito ao contraditório e à ampla defesa poderão ser mitigados, pois há situações

de urgência em que a segurança jurídica tem que ceder lugar à efetividade da tutela

que a parte precisa.

Exemplo disso ocorre quando há risco à violação dos direitos fundamentais da

parte. Por isso, nessas circunstâncias, o magistrado poderá deferir a tutela provisória

1 ALVIM, Eduardo Arruda. Tutela provisória. – 2. ed. – São Paulo: Saraiva, 2017, p. 26.

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de forma antecipada para proteger o direito material do autor que é, nessa situação,

mais importante que o direito processual e a segurança jurídica no processo.

A tutela provisória, de acordo com Fredie Didier Jr.2, é concedida com base em

um juízo de probabilidade, uma vez que o juiz não tem como obter um juízo de certeza

com base em cognição sumária do processo, ou seja, com base em uma análise

superficial dos fatos objeto da causa.

Sendo assim para concluir o raciocínio, também segundo Fredie Didier Jr.3

entende-se que a tutela provisória

(...) por ser assim sumária e precária (...) é inapta a cristalizar-se com a coisa

julgada material. A tutela provisória, por excelência, é a tutela antecipada. É aquela que antecipa os efeitos da tutela definitiva, isto é, a satisfação ou a cautela do direito afirmado (...).

Essa antecipação dos efeitos da tutela foi pensada pelo legislador a fim de que

o direito postulado pela parte seja prestado de forma rápida, efetiva e de acordo com

o “justo processo” advindo, portanto, uma decisão judicial fundada em um juízo de

probabilidade para proteger um direito que está perecendo ou que já tenha sido

lesionado. Isso porque, nesses casos, aguardar um processo com uma cognição

exauriente seria notoriamente mais prejudicial para a parte. Dessa mesma forma,

também pensa Artur César de Souza 4

(...) quando a duração do processo dilata-se, quando existe o perigo efetivo de que o pronunciamento final chegue demasiado tarde e não sirva já para nada, é justamente então onde há que se garantir a utilidade da decisão final por meio de medidas antecipatórias e cautelares.

Diante do exposto, evidencia-se que a tutela provisória produz uma eficácia

imediata e, depois será substituída por uma tutela definitiva. Ou seja, a tutela definitiva

que só seria executada ao final do devido processo legal (após respeitado os

princípios da ampla defesa e o contraditório) passou a produzir efeitos na fase inicial

do processo no momento do deferimento da tutela provisória. Portanto, é uma tutela

que permite a fruição imediata dos direitos que só seriam concedidos ao final da

2 DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 2 – 9ª Edição. Salvador: Editora JusPodivm, 2014, p.463. 3 Ibid., p.464. 4 SOUZA, Artur César de. Tutela Provisória: tutela de urgência e tutela de evidencia – 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Almedina, 2017, p. 35.

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demanda, mas também, por ser provisória, pode ser modificada ou revogada a

qualquer tempo caso o magistrado assim entender.

Mas apesar de estar-se aqui utilizando do termo “provisorio”, tal qual o faz o

Código de Processo Civil de 2015, como sinônimo daquilo que não é definitivo, é

necessário esclarecer que, para a doutrina há uma diferença entre aquilo que é

“provisorio” daquilo que e “temporário”, justificando que apenas a tutela antecipada

(satisfativa) seria provisória, enquanto que a tutela cautelar seria temporária. Explica-

se:

A tutela cautelar é concedida somente para assegurar e preservar o direito

pleiteado no processo pelo tempo em que houver ameaça, por isso, tem efeitos

temporários. Isso porque, depois de cumprida sua função acautelatória, a decisão que

concedeu a tutela será extinta e nada virá em seu lugar. Ou seja, é temporária porque

seus efeitos perduram somente pelo tempo limitado em que houver ameaça à fruição

futura do direito e, por este mesmo motivo, a tutela cautelar é meramente

assecuratória. Fredie Didier Junior5 explica que

Temporários são seus efeitos fáticos, práticos, afinal a cautela perde sua eficácia quando reconhecido e satisfeito o direito acautelado (ou quando denegado), mas a decisão que a concedeu, ainda assim, permanece imutável, inalterável em seu dispositivo.

De outro lado, seria provisória a tutela antecipada, porque ela faz com que o

próprio direito almejado - que só seria concedido após o devido processo legal, através

de cognição exauriente - seja concedido de forma imediata e antecipada. Assim, a

decisão antecipada é provisória enquanto não vier decisão definitiva de mesma

natureza que a substituía. Tutela provisória, portanto, é sinônimo de tutela antecipada.

O instituto das tutelas provisórias surgiu, de acordo com Luiz Guilherme

Marinoni6, “como um combate à morosidade na prestação da tutela jurisdicional”.

Contudo, resta esclarecer que não foi sempre que se deu a devida importância à

razoável duração do processo, isso porque o que mais interessava era o estrito

cumprimento da técnica processual.

5 DIDIER JR., 2014, p.461. 6 MARINONI, Luiz Guilherme. Novo Curso de Processo Civil: tutela dos direitos mediante procedimento comum, volume II/ Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart, Daniel Mitidiero. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 195.

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O mesmo autor esclarece também que houve um momento em que o tempo

não era levado em consideração no processo, isso porque o processo civil dava estrita

importância e atinha os seus olhos somente no cumprimento das técnicas

processuais, independentemente se o ônus do tempo fosse prejudicial à parte de

modo que prejudicasse a fruição regular do seu direito postulado. Ou seja, havia um

(...) descompromisso do processo civil senão com os seus próprios conceitos – em

um frio e indiferente purismo metodológico (...)”

Assim, a solução encontrada pelo legislador foi a criação das tutelas não

definitivas e antecipadas, a fim de que não fossem levadas em consideração tão

somente as regras processuais e para que o ônus do tempo não fosse tão prejudicial

para as partes. Assim, ainda de acordo com o mesmo autor7

(...) procurou-se uma correção de rumo – e o combate a morosidade na prestação da tutela jurisdicional e contra o asséptico processualismo acabaram sendo travados com a colaboração da técnica processual com a tutela dos direitos (...).

Verifica-se então que a técnica das tutelas provisórias, de acordo com José

Roberto dos Santos Bedaque 8 ocasionou que

Em substituição ao longo processo de cognição plena, com todas as garantias a ele inerentes, surge a ideia de uma tutela mais rápida, com cognição limitada, que possibilite a parte obter antecipadamente o resultado da atuação jurisdicional.

Dessa forma, constata-se que a tutela provisória visa a proteção do direito da

parte e objetiva um processo justo com a harmonização entre a segurança jurídica e

a celeridade do processo.

Mas antes de se adentrar ao estudo das tutelas provisórias no Código de

Processo Civil de 2015, necessário analisar como teve início seu tratamento na

legislação anterior e quais foram as modificações levadas a efeito pelo atual código.

2.2 PROCEDIMENTO CAUTELAR NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973

7 MARINONI, 2015, p. 196. 8 BEDAQUE, Jose Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: Tutelas sumárias e de urgencia (tentativa de sistematização). 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 119.

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O Código de Processo Civil de 1973 foi baseado na doutrina clássica italiana.

Essa doutrina, considerava a tutela cautelar, um terceiro processo utilizado como

instrumento do processo principal. Em outras palavras, Marcos Destefenni9 diz que o

processo cautelar servia para “garantir, para assegurar a utilidade e a efetividade de

um processo principal. (...)” Seria, pois, ”um instrumento do instrumento”.

Esse direito de cautela, inclusive, é uma garantia constitucional prevista no

artigo 5º, inciso XXXV da Constitucional Federal de 1988, o qual preve que “a lei não

excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Apos análise

do artigo mencionado, verifica-se que o termo “ameaça a direito” se refere aos perigos

de dano que poderão ser causados ao direito de determinada pessoa. Esse direito,

portanto, deve ser protegido e acautelado para que a ameaça não se torne real.

Assim, verifica-se que “há um direito material (constitucional) de cautelar, a

partir do pressuposto da existência de uma garantia constitucional à tutela de

urgencia, cautelar ou antecipatoria”.10

Para entender melhor o procedimento cautelar do Código de Processo Civil de

1973, primeiramente, necessário definir a compreensão do processo cautelar

existente a epoca que, seria entendido como “instrumento do instrumento porque

segundo Luiz Rodrigues Wambier.

(...) se de um lado, se pode afirmar que todo processo tem caráter instrumental com relação ao direito material (...), porque existe para fazer com que sejam efetivamente cumpridas estas normas, de outro lado, o processo cautelar existe para garantir a eficácia do processo de conhecimento ou da execução, sendo, logo, nesse sentido e nessa medida, instrumento do instrumento.11

No processo cautelar era proferida uma decisão com base em uma aparência

de direito (fumus boni iuris) e, além disso tinha caráter provisório, pois perdurava

somente enquanto houvesse ameaça ao direito postulado no processo principal. Ou

seja, quando o direito material pleiteado no processo principal fosse concedido, o

processo cautelar seria extinto.

9 DESTEFENNI, Marcos. Curso de Processo Civil, 3: processo cautelar e procedimentos especiais / - 3. ed. ver., atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2010, p. 90. 10 Ibid., p. 95. 11 WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de Processo Civil, vol. 3: processo cautelar e procedimentos especiais – 14. Ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 56.

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No Código de Processo Civil de 1973 o processo cautelar era um processo

autônomo, mas, apesar de autônomo, havia uma relação com o processo principal,

uma vez que servia de instrumento ao processo principal, acautelando o direito que

só seria obtido no final do tramite processual e que poderia perecer caso não fosse

protegido.

O que se verificava era que o legislador tão apenas admitia que, com base em

cognição sumária, somente poderia ser deferida tutela assecuratória, jamais

satisfativa. Isso mudou com a Lei 8.952/1994, que inseriu o poder geral de

antecipação no procedimento comum, através do artigo 273.

Antes da reforma, a tutela antecipada satisfativa só era prevista para alguns

casos em específico como no procedimento especial das ações possessórias, pois

nas demais situações em que havia casos genéricos do direito não havia previsão

legal de uma tutela provisória satisfativa, ou seja, o rito comum era insuficiente para a

prestação dessa tutela, conforme o que explica com mais destreza Fredie Didier

Junior12

Enquanto já se tinha instruído no diploma processual brasileiro o poder geral de cautela (art. 798, CPC), com a possibilidade de concessão de medidas cautelares atípicas – inclusive em caráter antecipatório, art. 804 do CPC -, não se tinha, ainda, a consagração legal do poder geral de antecipação satisfativa, ficando o magistrado restrito a possibilidade de concessão das medidas antecipatórias satisfativas expressamente tipificadas em lei, previstas em alguns procedimentos especiais, como nas ações possessórias e no mandado de segurança.

Diante dessa lacuna da lei havia uma problemática para a adequada prestação

das tutelas jurisdicionais e, por isso, com o passar do tempo foram criadas as

chamadas “cautelares satisfativas” pela jurisprudencia, sendo estas medidas

cautelares utilizadas para conceder tutelas antecipatórias satisfativas.

Com a criação jurisprudencial das “cautelares satisfativas”, apos o decorrer do

tempo, houve então, conforme já exposto, a reforma dos artigos 273 e 461, §3º do

Código de Processo Civil de 1973 pela Lei 8952/1994 que inseriu o poder geral de

antecipação (satisfativa). Para explicar isso, o mesmo autor13 supracitado relata em

sua obra que:

12 DIDIER JR., 2014, p.472. 13 Ibid., p. 473.

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Com a reforma (...) inseriu-se, no bojo do procedimento comum, o poder geral de antecipação (satisfativa), generalizando a autorização legislativa para a concessão da tutela antecipada satisfativa, agora permitida para “qualquer direito”, e não apenas para aqueles que se tutelavam por alguns procedimentos especiais.

Ainda, é inegável que no antigo Código de Processo Civil de 1973, segundo

Destefenni, havia uma dificuldade de distinguir se a pretensão do autor era a tutela

antecipada ou medida cautelar, até porque esses conceitos não poderiam ser

considerados absolutamente distintos uma vez que fazem parte de um mesmo gênero

das medidas urgentes. Dessa forma, em razão inclusive da semelhança entre as

tutelas, houve a utilização do mecanismo da fungibilidade, conforme nota-se a seguir

o que diz o autor já citado

O legislador, realmente se curvou a grande semelhança entre as tutelas cautelares e antecipatórias, tanto que enunciou a fungibilidade entre elas no §7º do art. 273, acrescido ao CPC (...): Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providencia de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter

incidental do processo ajuizado. 14

Essa fungibilidade trazida no §7º do art. 273 opera como uma via de mão dupla,

pois de acordo com Cândido Rangel Dinamarco15 “O novo texto não deve ser lido

somente como portador de autorização a conceder uma medida cautelar quando

pedida a antecipação da tutela. Tambem o contrário está autorizado”. Sendo assim,

mesmo o legislador tendo sido omisso, o entendimento era de que quando ocorresse

o contrário, ou seja, se fosse pedido medida cautelar o juiz poderia substitui-la pela

concessão da medida de antecipação da tutela.

Isto posto e, após analisado o procedimento antes previsto no Código de 1973,

sintetiza-se que a antecipação da tutela trazida com a reforma de 1994 oferece ao

autor o próprio bem que só seria alcançado no final do processo, enquanto a tutela

cautelar, que antes era obtida através de um processo autônomo, somente tem o

dever de assegurar esse bem para que a pretensão do autor não seja frustrada com

o passar do tempo.

14 DESTEFENNI, 2010, p. 81. 15 DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma, São Paulo: Malheiros, 2002, p. 92.

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Por fim, explica Victor Bonfim Martins16 que “a antecipação da tutela tem o

escopo de implementar desde logo efeitos práticos da sentença de procedência. Já a

tutela cautelar tem por função assegurar a idoneidade do processo”.

2.3 NOVIDADES E ALTERAÇÕES TRAZIDAS COM O NOVO CÓDIGO DE

PROCESSO CIVIL

O Código de Processo Civil de 1973 trazia três tipos de processo: o de

conhecimento, o de execução e o cautelar, mas atualmente, apesar de continuar

existindo mecanismos de proteção ao direito ameaçado, o Código de Processo Civil

de 2015 trouxe inovações no âmbito da tutela provisória da urgência com a extinção

do processo cautelar.

Artur César17 comenta que o Código de Processo Civil de 1973 foi “aliás, o

primeiro código de processo civil do mundo a dedicar um livro especial para a

disciplina cautelar, elevando a ação cautelar ao nível da ação de conhecimento e da

ação exauriente”. Contudo o Codigo de Processo Civil de 2015 excluiu o Título III do

antigo código e passou a regulamentar no seu Livro V a tutela provisória de urgência

e de evidencia.

O processo cautelar foi extinto no sentido de que não há mais um processo

autônomo e específico para obter medidas cautelar, que agora são obtidas

internamente ao processo em que se objetiva a tutela satisfativa, definitiva e final.

Todavia, o processo continua desempenhando a sua função de modo a garantir “a

eficácia plena (...) do provimento jurisdicional, a ser obtido por meio de futuro (ou

concomitante) processo de conhecimento, ou da propria execução (...)”, conforme Luiz

Rodrigues Wambier18.

O sistema que era adotado no Código de 1973 foi alterado com o novo Código

de 2015, o qual trouxe a ideia de que as tutelas de urgência não se destinam mais a

um processo específico. Dessa forma, o processo cautelar deixou de ser uma relação

jurídica autônoma, bem como de ser equiparado pela lei ao mesmo status do processo

de conhecimento e de execução. É o que explica Luiz Rodrigues Wambier a seguir.

16 MARTINS, Victor Bonfim. Antecipação da tutela e tutela cautelar, in Aspectis polêmicos da antecipação de tutela, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 567. 17 SOUZA, 2017, p.58. 18 WAMBIER; TALAMINI, 2015, p. 56.

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O que há, agora, são atividades judiciais, anteriores ou concomitantes ao processo de conhecimento, voltadas as mesmas finalidades historicamente consagradas para o processo cautelar, isto é, para instrumentalmente proteger a eficácia do processo de conhecimento, mediante a realização de medidas assecuratórias (...). Mas ainda que antecedentes, isto é, requeridas previamente ao ajuizamento do processo de conhecimento, dele farão parte

integrante (...).19

Esclarece Luiz Rodrigues Wambier20 que atualmente o Código de Processo

Civil de 2015 trouxe a nomenclatura “tutela provisoria de urgencia” como genero, bem

como a diferenciação das espécies tutela cautelar e tutela antecipada, as quais

poderão ser postuladas pela parte tanto em caráter antecedente ao processo de

conhecimento quanto de forma incidental.

Essa diferenciação das espécies da tutela cautelar e antecipada passou a ser

obrigatória no Código de 2015, vez que o efeito da estabilização, que veremos mais

adiante, somente ocorre em relação à tutela antecipada. E por isso, como atualmente

o código trouxe a diferença de conceitos e hipóteses de concessão para as duas

espécies, não há mais o que se falar na aplicação do princípio da fungibilidade.

Artur César de Souza esclarece que

Por isso, o princípio da fungibilidade, previsto no art. 273, §7º, do C.P.C. de 1973, que era uma “tabua de salvação” para aqueles que não compreendiam a distinção entre tutela antecipada e tutela cautelar, não poderá mais ser utilizado como álibi do desconhecimento conceitual de ambas as tutelas.21

Dessa forma, com as alterações trazidas com o Código de Processo Civil de

2015, ocorreu a devida diferenciação entre a tutela de urgência cautelar e antecipada

e, por isso tecnicamente uma tutela não poderia mais ser substituída pela outra.

Contudo, em alguns casos, deve ser admitida ampla fungibilidade, em razão do

princípio da celeridade, bem como para que seja prestada uma tutela adequada e

efetiva. Ou seja, o objetivo é de que o direito processual seja utilizado de modo a

garantir que o direito pleiteado não seja ameaçado ou venha a perecer, e não

atrapalhando mais ainda a fruição desse direito. Dessa mesma forma é o que diz

Eduardo Cambi et al.

Assim, deve o juiz, com especial destaque no princípio da colaboração processual (NCPC, art. 6º), ao analisar o caso concreto, receber a tutela

19 WAMBIER; TALAMINI, 2015, p. 57. 20 Idem. 21 SOUZA, 2017, p.111.

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cautelar como antecipada ou a antecipada como cautelar, com a determinação dos ajustes que se fizerem necessários, para proteger a situação urgente, não prejudicando a parte que tenha se valido da técnica

processual inadequada. 22

Ainda, outra alteração trazida foi a de que, atualmente, ambas as tutelas

passaram a poder ser requeridas de forma antecedente – ou seja, antes de formulado

o pedido principal na demanda. Ao passo que, o tratamento dado no Código anterior,

era no sentido de que somente as medidas cautelares poderiam ser concedidas de

forma antecedente à ação principal.

Assim, restou demonstrado algumas diferenças e alterações trazidas com o

Novo Código de Processo Civil, mas importa destacar que a possibilidade da

estabilização da tutela antecipada antecedente - alteração trazida com o Código de

Processo Civil de 2015, é o tema principal desta pesquisa e, por isso, será estudado

oportunamente.

2.3.1 Pressupostos Processuais para a Concessão das Tutelas

O deferimento das tutelas provisórias gera a antecipação dos efeitos, os quais

só seriam alcançados ao final do processo com o trânsito em julgado da decisão

proferida em cognição exauriente. Deste modo, é evidente o risco que há quando

ocorre a antecipação dos efeitos, pois, o direito almejado que só seria obtido ao final

do trâmite processual é garantido à parte antecipadamente sem que o juiz tenha

chegado ao juízo de certeza.

Assim, em razão da ausência de segurança jurídica, é de suma importância

restar demonstrado e comprovado, através do preenchimento dos requisitos

processuais, o porquê é adequada a antecipação desses efeitos.

Diante disso, o legislador elencou alguns pressupostos processuais para que o

juiz, ao analisar o caso concreto, defira ou não a tutela pleiteada para o autor da

demanda. O juiz, portanto, não tem discricionariedade para deferir ou não a tutela

pleiteada, pois ele deve proferir sua decisão de forma fundamentada ao fazer a análise

22 CAMBI, Eduardo; DOTTI, et al. Curso de Processo civil completo – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017, p. 277.

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dos pressupostos processuais naquele determinado caso concreto. Explica isso de

forma mais clara, Cassio Scarpinella Bueno23

Absolutamente vencedora em doutrina e a lição de que não há “liberdade” ou “discrição” para o magistrado na concessão ou na rejeição do pedido de antecipação de tutela. Ele deve deferir o pedido porque está diante dos pressupostos ou ele deve rejeitá-lo a falta de seus pressupostos autorizadores: não há meio-termo, não há uma terceira alternativa para o magistrado.

Entendida a importância dos pressupostos processuais para a concessão das

tutelas provisórias, faz-se necessário compreender também o objetivo de cada um

deles, os quais sofreram algumas alterações com o novo Código de Processo Civil.

Primeiramente, é importante relembrar que no Código de 1973, a antecipação

da tutela estava condicionada à existencia do requisito de “prova inequívoca” capaz

de convencer o juiz a respeito da “verossimilhança da alegação do autor”, ou seja,

uma prova que não gerasse dúvidas do direito do autor. Contudo, com o advento do

novo código de 2015, o legislador resolveu abandonar os termos citados

anteriormente, dando preferencia ao conceito de “probabilidade do direito”, também

conhecido como “fumus boni iuris” (fumaça do bom direito), bem como o conceito do

perigo da demora, conhecido como “periculum in mora”.

Eduardo Arruda Alvim explica essa mudança trazida pelo legislador, o qual

abandonou o requisito de “prova inequívoca” e trouxe o requisito de probabilidade do

direito que se enquadra tanto para a tutela cautelar quanto para a antecipada,

conforme verifica-se na citação abaixo.

Ao tempo do CPC/73, falava-se em fumus boni iuris, vinculada às medidas cautelares, e em “prova inequívoca” e “verossimilhança”, para a tutela antecipada. Já naquele tempo, entendíamos não haver nenhuma distinção prática entre ambas, a despeito da diferença terminológica. O código, portanto, reforçou tal entendimento, deixando claro que não há distinção entre a probabilidade que autoriza a concessão de tutela antecipada e a probabilidade que autoriza a concessão de tutela cautelar.24

Salienta-se, ainda, que o conceito de “probabilidade” e diferente de

“possibilidade”, uma vez que é muito maior a chance do direito que é provável existir,

23 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil, vol. 4: tutela antecipada, tutela cautelar, procedimentos cautelares específicos - 6ª ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 40. 24 ALVIM, 2017, p. 66.

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se comparado com o direito que é apenas possível, conforme verifica-se o que diz

Cassio Scarpinella Bueno et al25

No sistema do CPC de 1973, os juízes se contentavam com a mera possibilidade. Não bastam, assim, meras alegações sem qualquer comprovação. E preciso ter provas robustas do quanto alegado. Se o requerente da medida não tiver prova documental que demonstre a probabilidade do direito existir, poderá requerer audiencia de justificação para produzir provas orais.

Por isso, é inegável a extrema importância da parte demonstrar a probabilidade

do seu direito existir, bem como o outro requisito, qual seja, o perigo da demora.

O perigo da demora poderá ser alegado pela parte, a fim de que seja

demostrado que a demora do processo poderá ter como consequência a frustração

do direito almejado, assim como poderá frustrar o resultado útil do processo. Conclui-

se, portanto, que o perigo da demora está relacionado ao risco ao próprio bem jurídico

pleiteado no que tange à tutela antecipada, bem como com o risco à efetividade

processual no que tange à tutela cautelar. Conforme explica Eduardo Arruda Alvim26

Não se ignora, porem, que esse requisito da “urgencia” assume uma face para a tutela de urgência antecipada e outra para a tutela de urgencia cautelar. Para a primeira, trata-se do risco de dano no mundo empírico, isto e, o bem da vida em disputa se acha sujeito a perigo, ao passo que o perigo de dano cautelar representa o risco de que o processo, enquanto instrumento, se mostre inefetivo.

Os dois pressupostos citados anteriormente, estão contidos no artigo 300 do

Código de Processo Civil de 2015, o qual prevê que “A tutela de urgencia será

concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o

perigo de dano ou o risco ao resultado util do processo”.27

Após a análise desse artigo, verifica-se que os pressupostos são comuns tanto

para a tutela de urgência cautelar quanto para a tutela de urgência antecipada,

diferentemente do que acontecia no Código de Processo Civil de 1973, conforme

esclarece o Enunciado número 143 do Fórum Permanente de Processualistas Civis.

25 BUENO, Cassio Scarpinella et al. Tutela provisória no novo CPC: dos 20 anos de vigência do art. 273 do CPC/1973 ao CPC/2015 – São Paulo: Saraiva, 2016, p. 57. 26 ALVIM, 2017, p. 68. 27 BRASIL. Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015 – Novo Código de Processo Civil. Brasília, Senado Federal, 2015. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm > Acesso em: 19 out. 2018.

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A redação do art. 300, caput, superou a distinção entre os requisitos da concessão para a tutela cautelar e para a tutela satisfativa de urgência, erigindo a probabilidade e o perigo na demora a requisitos comuns para a prestação de ambas as tutelas de forma antecipada28

Para ser preenchido o requisito da probabilidade do direito, o juiz deverá

analisar se os fatos alegados pela parte são capazes de realmente terem acontecido,

ou seja, se tem uma verossimilhança com a realidade fática e se há chances de vitória

da parte.

Nas palavras de Fredie Didier Jr, Paula Sarno Braga, Rafael Alexandria de

Oliveira 29 “É preciso que se visualize, nessa narrativa, uma verdade provável sobre

os fatos, independentemente da produção de prova”.

Por outro lado, o requisito do perigo da demora, também conhecido como

“periculum in mora”, remete-se ao fato de que a prestação jurisdicional deve ser efetiva

e célere, caso contrário, o direito almejado poderá correr risco de dano irreparável ou

de difícil reparação. De acordo com Athos Gusmão Carneiro30.

Enfim, o deferimento da tutela provisória somente se justifica quando não for possível aguardar pelo término do processo para entregar a tutela jurisdicional, porque a demora do processo pode causar à parte um dano irreversível ou de difícil reversibilidade.

Além dos pressupostos supracitados, no §3º do artigo 300 do Código de

Processo Civil, está presente um pressuposto mais específico, qual seja, a

reversibilidade da tutela provisória satisfativa, o qual será esclarecido a seguir.

A tutela provisória satisfativa torna possível a concessão antecipada do direito

que só seria obtido ao final do processo, por isso, é notório que a tutela satisfativa

concedida no início do tramite processual não é capaz de produzir um juízo de certeza

no magistrado se comparado com o momento da prolação da sentença.

Em razão da ausência desse juízo de certeza no âmbito das tutelas, o legislador

criou o pressuposto da reversibilidade, pois, caso a tutela satisfativa não seja

28 DIDIER JR, Fredie; SICA, Heitor. Enunciados do Fórum Permanente de Processualistas Civis. São Paulo, 18, 19 e 20 de março, 2016. Disponível em: <https://www.legale.com.br/uploads/023fdd63cbbdf91ccff44580d1009184.pdf > Acesso em: 19 out. 2018. 29 DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; DE OLIVEIRA, Rafael Alexandria. Curso de Direito Processual Civil: teoria da prova, direito probatório, decisão, precedentes, coisa julgada e tutela provisória. Vol. 2 – 13ª ed. rev. e atual. Editora JusPodivm, 2018, p. 686. 30 CARNEIRO, Athos Gusmão. Da antecipação da tutela, 5ª ed., Editora Forense, 2004, p. 31.

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confirmada no final do processo, ela deve voltar ao status quo, sem maiores prejuízos

ao réu.

Em consequência disso, esse pressuposto garante que não seja concedida a

tutela provisória satisfativa quando houver a hipótese do réu sofrer efeitos

irreversíveis. É o que explica Fredie Didier Jr, Paula Sarno Braga, Rafael Alexandria

de Oliveira31

Conceder uma tutela provisória satisfativa irreversível seria conceder a própria tutela definitiva – uma contradição em termos. Equivaleria a antecipar a própria vitória definitiva do autor, sem assegurar ao réu o devido processo legal e o contraditório.

Apesar de ser um pressuposto utilizado para proteger o réu de grandes

prejuízos, há algumas críticas quanto à reversibilidade. Isso porque, para alguns

doutrinadores, não haveria lógica abrir mão de um direito que é provável, em

detrimento de um prejuízo que talvez possa ser causado ao réu. Para complementar

o raciocínio, Luiz Guilherme Marinoni32 comenta a seguir.

(...) tendo a técnica antecipatória o objetivo de combater o perigo na demora capaz de produzir um ato ilícito ou um fato danoso – talvez irreparável – ao direito provável, não há como não admitir a concessão dessa tutela sob o simples argumento de que ela pode trazer um prejuízo irreversível ao réu. Seria como dizer que o direito provável deve sempre ser sacrificado diante da possibilidade de prejuízo irreversível ao direito improvável – o que é obviamente um contrassenso.

Diante do estudo dos pressupostos processuais, verifica-se que há uma

preocupação do legislador em querer proteger tanto o direito provável pleiteado pelo

autor, quanto o direito de contraditório e ampla defesa do réu.

Por isso, conclui-se que quem almeja pelo deferimento de uma tutela de

urgência deve se ater aos detalhes e ao fiel cumprimento dos requisitos processuais

elencados anteriormente, pois mesmo não se exigindo mais a prova inequívoca, ainda

deve-se levar em conta o fumus boni iuris e o periculum in mora, bem como a relação

de equilíbrio entre as partes, a fim de que o réu não seja o polo vulnerável da relação

processual.

31 DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; DE OLIVEIRA, Rafael Alexandria, 2018, p. 690. 32 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil Comentado. 4ª ed. rev. atual e ampl. – São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 413.

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3 CARACTERÍSTICAS DAS TUTELAS ANTECIPADAS

É de suma importância o estudo das características que compõe o instituto das

tutelas. Isso porque, a depender do caso concreto, será feito o requerimento de uma

tutela de urgência cautelar ou antecipada. Dessa forma, é evidente que se torna

preciso conhecer a diferença dessas duas espécies. Inclusive, porque, somente as

tutelas antecipadas antecedentes poderão ter seus efeitos estabilizados, conforme

veremos adiante.

3.1. PROVISORIEDADE

É importante também o estudo do conceito de provisoriedade das tutelas

provisórias satisfativas para que haja o entendimento efetivo de sua função. Importa

destacar que essas tutelas, perduram por um tempo determinado, uma vez que,

enquanto não sobrevier decisão definitiva em seu lugar, a tutela provisória satisfativa

terá seus efeitos mantidos. Ou seja, a tutela mencionada terá duração provisória até

que seja substituída por outra decisão definitiva.

Em razão do exposto, é evidente que o conceito de provisoriedade significa que

os efeitos da tutela satisfativa surtirão eficácia somente durante determinado lapso

temporal, até que sobrevenha decisão com base em uma cognição exauriente e em

um juízo de certeza.

Esclarece Humberto Theodoro Júnior33 "(...) que as medidas cautelares têm

duração limitada àquele período de tempo que deverá transcorrer entre a sua

decretação e a superveniência do provimento principal ou definitivo".

Humberto Theodoro Junior cita a provisoriedade das medidas cautelares, mas

é preciso levar em consideração que, com o advento do Código de Processo Civil de

2015, o conceito de provisoriedade somente aplica-se às tutelas satisfativas e, por

isso, não pode ser confundido com o conceito de temporariedade inerente às tutelas

cautelares.

Deve-se salientar que o conceito de provisoriedade é muitas vezes confundido

com o conceito de temporariedade, porque as medidas cautelares também serão

33 THEODORO JR. Humberto. Curso de direito processual civil – processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência. v. II. 41. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 541.

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substituídas pelo provimento definitivo. Entretanto, o termo “temporariedade” e mais

adequado para as medidas cautelas, em que pese existirem casos em que a tutela

cautelar continuará surtindo efeitos até que cesse a situação de perigo, mas não até

que sobrevenha decisão com caráter definitivo como ocorre para as tutelas

satisfativas.

Para esclarecer essa confusão, deve-se levar em consideração as palavras de

Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart34 "a eficácia da tutela cautelar se liga

ao perigo de dano, tendo com ele uma relação de temporariedade, e não com a

sentença de mérito, com a qual teria uma relação de provisoriedade".

Diante desse conceito trazido por Marinoni e Arenhart, conclui-se que a

temporariedade tem uma relação com o perigo de dano, ou seja, a tutela cautelar

concedida, perdura enquanto existir o risco de dano ao direito pleiteado. E de outro

lado, a provisoriedade tem uma relação com a sentença de mérito, pois será

substituída por uma decisão final, a qual confirmará os fundamentos da decisão

interlocutória, ou, revogará e modificará o que foi concedido.

Ademais, Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero

esclarecem que a provisoriedade traz consigo três considerações, quais sejam:

revogabilidade, termo final de eficácia e, por fim, a relação existente entre o

provimento provisório e o provimento definitivo.

Quanto à revogabilidade, entende-se que a tutela é provisória, pois poderá ser

revogada e modificada durante o tramite processual até o que magistrado alcance seu

convencimento, inclusive, porque poderão aparecer novas circunstancias que

justifiquem a alteração do quadro fático. Em outras palavras e, segundo os mesmos

autores supracitados35

(...) o fato de a técnica antecipatória ter na sua base cognição sumária já aponta para a circunstância de o desenvolvimento do procedimento – com o conseguinte exaurimento da cognição – poder trazer novos elementos para o processo capazes de alterar a convicção judicial a respeito da existência ou não do direito postulado em juízo.

34 MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil. v. 4. – processo cautelar – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p.31. 35 MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz, MITIDIERO, Daniel. Novo Curso de processo civil: tutela dos direitos mediante procedimento comum, vol. 2. – 2. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 219.

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Quanto ao termo final de eficácia, ou seja, em relação à eficácia temporal, a

regra é que os efeitos da tutela irão durar enquanto não sobrevier o termo final com a

decisão definitiva, mas a exceção ocorre quando os efeitos da tutela vão para além

da prolação da sentença, pois nesses casos o perigo da demora pode trazer danos

irreversíveis à existência do direito.

Conforme Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero

Logicamente, a vocação do provisório é ser substituído pelo definitivo. Essa é a regra (...) – isto é, enquanto não sobrevier sentença. Excepcionalmente, (...) é possível manter uma tutela provisória eficaz – de natureza satisfativa (antecipada) ou cautelar – para além da prolação da sentença definitiva. (...) Existem circunstancias, portanto, que o perigo se sobrepuja à convicção

judicial a respeito da existência ou inexistência do direito. 36

Por fim, é preciso entender a relação existente entre o provimento provisório e

o provimento definitivo. No que tange à tutela satisfativa, há uma relação processual

entre o provisório e o definitivo, vez que se antecipa a mesma coisa que viria ao final

do processo, portanto, o provisório é incorporado pelo definitivo. Contudo, no que

tange à tutela cautelar, há apenas uma relação material e de referibilidade, pois o

objetivo da cautelar é assegurar a fruição do direito futuro e, dessa forma, a tutela

cautelar como é diferente da satisfativa, uma não pode ser substituída pela outra da

mesma forma que ocorre com o provimento provisório e o definitivo.

Portanto, conclui-se que a provisoriedade conserva a eficácia da tutela até que

sobrevenha sentença, ou seja, só será concedido provisoriamente aquilo que pode

sê-lo definitivamente.

3.2. SATISFATIVIDADE

Conforme já estudado, é notório que as tutelas podem ser tanto satisfativas

quanto cautelares, contudo, neste momento, será dado um enfoque especial somente

às tutelas satisfativas.

De tal modo, em relação às tutelas provisórias satisfativas deve-se

compreender que elas estão aptas a realizar o direito no plano concreto, antecipando

a fruição futura daquele determinado direito.

36 MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2016, p. 220.

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Nas palavras de Teori Albino Zavascki37 “A tutela definitiva satisfativa e aquela

que visa certificar e/ou efetivar o direito material. Predispõe-se à satisfação de um

direito material com a entrega do bem da vida almejado. É a chamada tutela-padrão”.

Há dois tipos de tutela satisfativa: a executiva e a cognitiva. A tutela satisfativa

executiva é aquela em que, conforme previsão legal, o sujeito já tem o seu direito

materializado em um título judicial ou extrajudicial e, por isso, de imediato poderá

requerer a execução do seu direito, uma vez que não há necessidade de um processo

de conhecimento.

De outro lado, a tutela satisfativa cognitiva, ocorre na hipótese em que o juiz

terá que certificar se o direito é devido à parte, fazendo a análise das alegações e

provas apresentadas. Ou seja, o magistrado só irá conceder ou negar o que foi

pleiteado, após o devido processo legal, respeitando cada fase processual e,

inclusive, a produção de provas.

Em que pese a tutela satisfativa demandar, muitas vezes, de um processo que

exige uma cognição mais densa, é evidente que a demora para a sua concessão

poderá acarretar o perigo de dano àquele direito pleiteado. Assim, em razão desse

perigo de demora, o legislador criou as tutelas não satisfativas – cautelares-, as quais

tem por objetivo conservar o bem da vida daquele determinado processo e assegurar

a satisfatividade.

Após a análise das espécies de tutela satisfativa, bem como da importância das

medidas cautelares para assegurar a fruição da tutela satisfativa, retorna-se à análise

do conceito de satisfatividade trazido por Luiz Rodrigues Wambier38, o qual diz que

“(...) o que se concede ao autor liminarmente coincide, em termos práticos e no plano

dos fatos (embora reversível e provisoriamente), com o que está sendo pleiteado (...)”.

Diante das palavras trazidas pelo autor supramencionado, conclui-se que a

tutela satisfativa concede o mesmo direito que se pretende e que seria alcançado após

o tramite processual.

Ademais, salienta-se o que diz Eduardo Cambi et. al.

37 ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação de Tutela. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 18-21. 38 WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de Processo Civil, vol. 1: teoria geral do processo e processo de conhecimento – 15ª ed. rev. atual.– São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 457.

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As medidas urgentes, de natureza satisfativa, regem-se pelo instituto da antecipação de tutela, na medida em que permitem a outorga do direito

material, em caráter provisório, até que seja proferida a tutela definitiva.39

Com os conceitos expostos anteriormente, nota-se que a satisfatividade é o

elemento essencial inerente à antecipação da tutela e, por isso, esse elemento auxilia

na diferenciação da tutela antecipada satisfativa com a tutela de cautelar, já que

ambas se fundamentam na urgência. A satisfatividade é elemento próprio à tutela

antecipada, porque somente a tutela antecipada satisfativa concede o pedido principal

de forma “precipitada”, enquanto a tutela cautelar apenas assegura a futura

concessão desse pedido principal.

Destaca-se, portanto, o que diz Donaldo Armelin sobre a importância da

satisfatividade.

A importância dessa qualificação resulta no contraste entre a categoria da tutela jurisdicional satisfativa e a cautelar. Nesta, a tutela jurisdicional não serve apenas aos que a reclamaram, mas também a uma tutela jurisdicional do tipo satisfativo a ser prestada ou que está sendo prestada em processo incoado. Tem, pois, a tutela jurisdicional cautelar um caráter instrumental em relação à satisfativa.40

Enfatiza-se que a tutela provisória satisfativa e “suficiente por si so”, uma vez

que ela visa antecipar de forma total ou parcial os efeitos da própria tutela final

pretendida pelo autor. Segundo Artur César de Souza41 “Entende-se por tutela

satisfativa aquela que é em si bastante, exaustiva e definitiva e que não depende de

qualquer outro complemento para atender os objetivos da parte”.

Diante disso, destaca-se também a consideração a respeito da satisfaitivade

da tutela feita por Eduardo Arruda Alvim42

Já as decisões antecipatorias de tutela satisfazem tambem num sentido mais estrito. Por meio da tutela de urgencia antecipada, são trazidos para um momento anterior do processo efeitos que normalmente so se fariam sentir quando da prolação da sentença. Portanto, a decisão antecipatória de tutela satisfaz no sentido de que aquele que dela e beneficiário passa a usufruir, desde logo, de efeitos que normalmente so poderia vir a desfrutar quando proferida decisão favorável de merito.

39 CAMBI, Eduardo; DOTTI, et al., 2017, p. 312. 40 ARMELIN, Donaldo. A tutela jurisdicional cautelar. In: Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, São Paulo, n.23, jun. 1985, p. 114. 41 SOUZA, 2017, p. 116. 42 ALVIM, 2017, p. 252.

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Conclui-se que, enquanto a medida cautelar não satisfaz, mas apenas

assegura que o direito pleiteado possa vir a ser satisfeito futuramente, somente as

tutelas de urgência antecipadas revestem-se do cunho de satisfatividade, pois fazem

com que os efeitos que só seriam obtidos após o devido processo legal sejam obtidos

e satisfeitos desde logo.

Por fim, é imperioso destacar que o estudo do conceito de satisfatividade é

importante, uma vez que somente a tutela antecipada - a qual tem caráter satisfativo,

é passível de ter seus efeitos estabilizados. Contudo, em momento oportuno, será

retratado com mais detalhes dos efeitos da estabilização da tutela antecipada.

3.3. MOMENTO DA CONCESSÃO

Faz-se necessário o estudo do momento processual em que as tutelas

jurisdicionais poderão ser deferidas, as quais podem estar fundadas na urgência, bem

como na evidencia.

Em que pese nada ter sido comentado sobre a tutelas de evidencia, esta não

será abordada no presente trabalho, inclusive, porque ela não se faz apta a produzir

os efeitos da estabilização.

De tal modo, no que tange às tutelas provisórias de urgência (antecipada e

cautelar), estas poderão ser deferidas em qualquer momento do processo até mesmo

na prolação da sentença, por isso, não há que se falar em preclusão para o

requerimento dessas tutelas.

Assim, as tutelas provisórias de urgência poderão ser requeridas e concedidas

a qualquer tempo, mesmo porque pode ser que no momento em que foi distribuída a

petição inicial não havia caráter urgente, mas que, durante o curso processual tenha

aparecido uma situação de urgência que gerasse risco ao direito da parte.

Diante disso, importa destacar o que diz Eduardo Alvim Arruda

Com relação a antecipação da tutela enquanto tutela provisória de urgência, pode ser que esse elemento “urgência” só se faça presente no curso do processo, justificando que o pedido de antecipação de tutela seja formulado não na petição inicial, mas por petição avulsa no instante processual em que a urgência vier a restar efetivamente caracterizada.43

43 ALVIM, 2017, p. 105.

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Nesse sentido, sabe-se que a concessão das tutelas de urgência pode dar-se

no início ou no final do tramite processual, pois depende do momento em que for

caracterizado o perigo ao direito pleiteado.

Segundo Humberto Dalla Bernardina de Pinho

A tutela pode se denominar liminar ou final, tendo em vista o momento do procedimento em que foi ela concedida. Tutela liminar é a proteção concedida nos momentos iniciais do procedimento, normalmente, sem que se ouça a

parte contrária. 44

Sendo assim, nota-se que não há um momento definido por lei para a

concessão da tutela provisória de urgência, uma vez que ela poderá ser deferida tanto

liminarmente quanto na própria sentença, conforme relata Eduardo Alvim Arruda.45

A antecipação de tutela fundada na urgência (...), pode dar-se mediante decisão interlocutoria antes mesmo da oitiva do reu, se preciso, ou, ainda, por decisão interlocutoria no curso do processo, se os motivos ensejadores da antecipação aflorarem nessa oportunidade e, como vimos, ate mesmo na sentença101-102-103, sendo tal possibilidade reconhecida expressamente pelo art. 1.012, § 1o, V, do CPC/2015.

Destaca-se, portanto, que quando a tutela for concedida antes da citação e do

contraditório do réu, ela terá caráter liminar e, nesses casos para manter o equilíbrio

entre as partes, o juiz poderá exigir do autor uma caução real ou fidejussória. Contudo,

é importante ater-se ao seguinte detalhe: o requerimento liminar da tutela não quer

dizer que ela será concedida também em caráter liminar.

A tutela terá caráter liminar quando for concedida sem que tenha tido qualquer

manifestação formal pela parte adversa. Inclusive, salienta-se que continuará tendo

efeito liminar àquela tutela concedida após a audiência de justificação prévia. Isso

porque, a referida audiência só tem por objetivo esclarecer melhor os fatos, e não tem

como requisito a presença do réu, mesmo porque, ele não exerce seu contraditório na

audiência de justificação prévia.

Conforme José Herval Sampaio Junior

(...) o momento oportuno para concessão da liminar e aquele em que ainda não tenha havido qualquer manifestação formal do requerido, devendo ser

44 PINHO, Humberto Dalla Bernardino. Direito Processual Civil Contemporaneo: processo de conhecimento, cautelar, execução e procedimentos especiais, vol. 2 – São Paulo: Saraiva, 2012, p. 365. 45 ALVIM, 2017, p. 107.

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compreendido como denegado o pedido de liminar quando o juiz se reserva para apreciação da medida após ouvida da parte contraria, e acaso deferida uma medida com as mesmas características das liminares em outro momento, será tida como uma decisão que resolve questão incidente, mas

não liminar propriamente dita. 46

É evidente que será liminar a tutela deferida logo no início do processo, ou,

após a audiência de justificação prévia, desde que o réu não tenha apresentado

nenhuma manifestação, vez que, para que seja caracterizada uma medida em caráter

liminar somente serão consideradas as argumentações da parte autora. Assim, resta

claro que tudo aquilo que for requerido ou deferido após o réu ter apresentado sua

defesa será configurado como incidental.

Ainda, importa destacar que as tutelas provisórias também podem ser deferidas

no corpo da sentença, ou em grau recursal. No segundo caso, na hipótese em que o

processo já está em tramite perante o tribunal, a parte deverá requerer a tutela

provisória por meio da sustentação oral, ou através de petição incidental dirigida ao

próprio tribunal, ficando o relator do recurso prevento à essa petição.

Diante do exposto, resta claro que não há preclusão para a parte requerer a

tutela de urgência, pois a qualquer momento, quando houver risco ao direito almejado,

a parte poderá pleitear a tutela antecipada ou cautelar.

Importa destacar que o estudo do presente assunto, tem por objetivo a

compreensão do momento de concessão das tutelas de urgência e, principalmente,

porque a depender do momento da concessão, a cognição do processo poderá ser

sumária ou exauriente, conforme veremos a seguir.

É importante compreender o momento da concessão das tutelas de urgência,

pois propicia uma facilidade no entendimento do conceito da tutela antecipada

antecedente, a qual foi criada a fim de solucionar as hipóteses em que a urgência é

antecedente à propositura da ação. Em outras palavras, a tutela antecipada

antecedente foi trazida pelo Código de Processo Civil de 2015, para suprir as

problemáticas trazidas quando o perigo da demora fosse tão excessivo que o

advogado teria que delimitar a petição inicial tão somente ao pedido de urgência e,

oportunamente faria a devida complementação dos fatos, argumentos jurídicos e

formulação do pedido principal.

46 SAMPAIO JÚNIOR, José Herval. Tutelas de urgência: sistematização das liminares – São Paulo: Atlas, 2011, p. 104.

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3.4. COGNIÇÃO NO ASPECTO VERTICAL E HORIZONTAL

A cognição é uma técnica desenvolvida pelo julgador para que ele consiga

aplicar o direito material no caso concreto e resolver o conflito que se coloca a frente

dele. O juiz, portanto, ao conhecer os fatos e analisar as provas, profere uma decisão

por meio de um exame fundamentado dessas alegações, chegando-se, deste modo,

a uma cognição plena e exauriente que levou ao seu convencimento.

As técnicas de cognição dividem-se em horizontal e vertical, as quais

respectivamente subdividem-se em duas espécies: cognição plena ou parcial e

cognição exauriente ou sumária.

Conforme verifica-se acima, foi utilizado os conceitos de cognição “plena ou

parcial” e “exauriente ou sumária” de forma alternativa, isso porque, cada uma dessas

terminologias pertence a uma espécie de técnica de cognição utilizada pelo julgador

e, deste modo, precisam ser distintas uma da outra, conforme se verificará a seguir.

A cognição no aspecto horizontal, refere-se ao quanto de matéria que o juiz

poderá analisar. Em outras palavras, refere-se à amplitude que o magistrado terá para

verificar tudo o que foi produzido no processo.

A cognição no aspecto horizontal subdivide-se em plena ou parcial e limitada,

conforme esclarece Artur César de Souza47

A cognição pode ser avaliada (...), no plano horizontal que pode ser plena ou plenária (quando toda a extensão fática e jurídica do conflito de interesse é levado à apreciação do juiz), ou parcial (quando o legislador desenha procedimentos reservando determinadas exceções, quando o juiz fica impedido de conhecer as questões reservadas, ou seja, as questões excluídas pelo legislador – ex: nas ações possessórias não se pode, em regra, discutir questão de domínio).

Portanto, compreende-se que na cognição plena, em regra não há limitações

para o juiz analisar o objeto do litígio, ao passo que na cognição parcial, a lei traz

limitações para alguns casos específicos. Importa destacar o comentário de José

Roberto dos Santos Bedaque48

Em substituição ao longo processo de cognição plena, com todas as garantias a ele inerentes, surge a ideia de uma tutela mais rápida, com

47 SOUZA, 2017, p. 114. 48 BEDAQUE, 2006, p. 119.

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cognição limitada, que possibilite a parte obter antecipadamente o resultado da atuação jurisdicional.

Ainda, é imperioso salientar a explicação de Luiz Guilherme Marinoni a respeito

do conceito da técnica da cognição parcial, a qual pode ser utilizada, por exemplo para

as ações possessórias:

O legislador, através da técnica da cognição parcial, pode desenhar procedimentos reservando determinadas exceções, que pertencem à situação litigiosa, para outros procedimentos; nos procedimentos de cognição parcial, o juiz fica impedido de conhecer as questões reservadas, ou seja, as questões excluídas pelo legislador para dar conteúdo a outra demanda. (...) o procedimento de cognição parcial privilegia os valores certeza e celeridade, ao permitir o surgimento de uma sentença com força de coisa julgada material em um tempo inferior àquele que seria necessário ao exame de toda a extenção da situação litigiosa (...).49

A segunda técnica utilizada pelo julgador é a cognição no aspecto vertical, a

qual refere-se a sua profundidade, ou seja, o quanto foi possível o juiz se aprofundar

no momento de examinar as provas e alegações do processo. Essa cognição

subdivide-se em exauriente ou sumária e superficial. Destaca-se o conceito trazido

por Artur César de Souza50

Pode ser avaliada, ainda, no plano vertical, que diz respeito à profundidade de cognição realizada pelo magistrado sobre as questões de fato e de direito, sendo caracterizada como exauriente (típica do processo de conhecimento, visando a dar solução definitiva à lide com força de coisa julgada material), sumária (característica dos processos, cuja cognição se dá com base na verossimilhança ou na plausibilidade, realizada em razão do perigo existente e da urgência reclamada) e superficial (na qual há menos cognição que na sumária, como por exemplo, a concessão de liminares (...)

A cognição exauriente é a técnica usual utilizada para as decisões que vão

formar a coisa julgada, pois será uma decisão com base em um juízo de certeza,

prestigiando, portanto, o valor da segurança jurídica. Essa cognição tem por objetivo

a busca da realidade fática, a fim de que o julgador obtenha a convicção da verdade

e um juízo de certeza. É o que explica Luiz Guilherme Marinoni abaixo.

A tutela de cognição exauriente garante a realização plena do princípio do contraditorio, ou seja, não permite a postecipação da busca da “verdade e da

49 MARINONI, 2018, p. 30. 50 SOUZA, 2017, p. 114.

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certeza”. Por isso mesmo, a tutela de cognição exauriente, ao contrário da tutela sumária, é caracterizada por produzir coisa julgada material.51

De outro lado, quando o juiz decide com base na cognição sumária, a decisão

não está apta a formar coisa julgada e, por isso, pode ser revista a qualquer momento.

Assim, é evidente que a cognição sumária não se aprofunda na busca pela realidade

fática, mas somente obtém uma aparência da verdade (verossimilhança) e um juízo

de probabilidade.

Deste modo, nota-se que enquanto a cognição exauriente prestigia o valor da

segurança jurídica, a cognição sumária prestigia somente a efetividade do processo,

em que pese não ter obtido um juízo de certeza.

Conforme Eduardo Arruda Alvim52,

Importa destacar que a sumariedade da cognição, que caracteriza os provimentos provisórios em análise, não significa que o juiz deva ter conhecimento de parte dos atos, mas sim que deva ter conhecimento superficial deles, que será aprofundado no curso do processo, antes da prolação da decisão final, após cognição exauriente.

Importa destacar que, pode ocorrer a hipótese em que o juiz, no momento em

que foi deferir uma tutela jurisdicional, deparou-se com uma situação de risco, não

permitindo que ele obtivesse uma cognição exauriente daqueles fatos, mas tão

somente, uma cognição sumária. Isso porque, nas hipóteses de concessão das tutelas

de urgência com base em uma cognição sumária, o objetivo é impedir que o perigo

da demora afete o próprio direito buscado pela parte naquele caso concreto.

Assim, entende-se que a cognição sumária é outra característica das tutelas de

urgência, pois há situações em que, quando o juiz for conceder essa tutela, a sua

decisão será com base em cognição sumária, objetivando a proteção daquele

determinado direito que se encontra em risco. Dessa forma, o juiz poderá “agilizar” a

prestação jurisdicional em uma luta contra o tempo ao proferir uma decisão com base

em um conhecimento superficial a respeito do objeto do litigio.

Conforme elucida Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel

Mitidiero53 “(...) a cognição exauriente subjacente à sentença substitui-se à cognição

sumária que suporta a decisão provisoria”. Ou seja, as tutelas que foram deferidas e

51 MARINONI, 2018, p. 33. 52 ALVIM, 2017, p. 22. 53 MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2018, p. 408.

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fundamentadas em uma cognição sumária, em momento oportuno, deverão ser

substituídas por uma decisão fundada em uma cognição exauriente, apta a conduzir

uma segurança jurídica ao processo e, consequentemente capaz de formar coisa

julgada.

Segundo Eduardo Talamini54 só ocorrerá a formação da coisa julgada quando

houver o exaurimento da cognição:

Outro parâmetro fundamental para a atribuição da coisa julgada e a presença de cognição exauriente. O instituto – que tem por essência a imutabilidade – e constitucionalmente incompatível com decisão proferida com base em cognição superficial e, por isso mesmo, provisoria, sujeita a confirmação. Há uma vinculação constitucional da coisa julgada a cognição exauriente. Ainda que não exista disposição expressa nesse sentido, isso e uma imposição da proporcionalidade e da razoabilidade extraíveis da cláusula do devido processo.

Deste modo, haja vista os conceitos trazidos em relação às duas técnicas de

cognição, verifica-se que de um lado a cognição sumária conduz somente ao juízo de

verossimilhança capaz de antecipar uma decisão que só seria obtida através do

procedimento ordinário. Daniel Mitidiero diz que “a cognição sumária e o juízo de

probabilidade que estão à base da técnica antecipatória colocam-nos na contingência

de enfrentar o problema dos conceitos de verdade, probabilidade e verossimilhança

no processo civil. ”55

E, de outro lado, a cognição exauriente conduz ao efetivo juízo de certeza e à

busca pela verdade, por meio da realização completa do princípio do contraditório e,

consequentemente, produzindo a coisa julgada material.

Assim, segundo Cassio Scarpinella Bueno et. al.56 “Com efeito, se a coisa

julgada visa a eliminação da incerteza, tal so pode legitimamente se dar a partir de

uma decisão que tenha sido proferida para alcançar tal desiderato”.

Conclui-se o entendimento da diferença entre cognição no aspecto vertical e

horizontal, conforme o que explica a revista dos tribunais.

A obtenção da tutela realizada com cognição sumária ocorre com limites à cognição no que diz respeito à profundidade, enquanto o conhecimento é

54 TALAMINI, Eduardo. Coisa julgada e sua revisao. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 54. 55 MITIDIERO, Daniel. Antecipação da Tutela: da tutela cautelar à técnica antecipatória. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017, p. 114. 56 BUENO, Cassio Scarpinella et. al, 2016, p. 38.

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pleno e ilimitado nas tutelas oriundas do procedimento ordinário, cuja cognição é plena e exauriente.57

Diante do exposto, considerando que a formação da coisa julgada é inerente à

cognição exauriente, questiona-se se há a possibilidade de formação de coisa julgada

com base na cognição sumária, uma vez que os efeitos da estabilização da tutela

antecipada parecem nitidamente semelhantes a uma decisão imutável e indiscutível,

da mesma forma como ocorre em cognição exauriente com a formação da coisa

julgada.

Contudo, o questionamento abordado anteriormente será retratado a seguir no

capítulo acerca da estabilização dos efeitos da tutela antecipada antecedente.

57 BUIKA, Heloisa Leonor. A ambiguidade da estabilização dos efeitos da tutela antecipada e a coisa julgada o novo Código de Processo Civil. Revista de Processo. vol. 267. ano 42. São Paulo: Ed. RT, maio 2017, p. 290.

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4 ESTABILIZAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE

Primeiramente, é importante a compreensão do conceito de estabilização, bem

como o porquê este instituto tem aplicabilidade tão somente em relação às tutelas

antecipadas requeridas em caráter antecedente, para que, posteriormente, seja

abordado o questionamento feito no capítulo anterior.

O instituto da estabilização tem aplicabilidade para as tutelas antecipadas

antecedentes e, por isso, não se enquadra nas tutelas cautelares, em razão da própria

natureza da cautelar, a qual não tem caráter definitivo e satisfativo da mesma forma

que as tutelas antecipadas. Conforme já visto anteriormente, a tutela antecipada

antecedente tem caráter satisfativo, pois visa a concessão do próprio direito pleiteado,

ou seja, antecipada a tutela definitiva. Essa tutela será postulada quando a urgência

for contemporânea à propositura da ação. Assim, o autor deverá delimitar seu pedido

tão somente ao pedido de urgência, para posteriormente formular o pedido principal

com as devidas complementações.

Após a complementação do autor, caso a tutela seja concedida e o réu não

recorra da decisão, a tutela antecipada concedida será estabilizada, ou seja, as partes

poderão fruir de imediato do bem da vida concedido em sede de cognição sumária e

o processo será extinto.

É evidente que não faz sentido aplicar o efeito de estabilização para uma tutela

cautelar que não nada satisfaz. É o que explica Eduardo Arruda Alvim58

Alem disso, a estabilização não se ajusta a tutela de urgencia cautelar, seja em razão da falta de previsão legal nesse sentido, seja em razão da propria natureza da tutela cautelar. Como vimos em várias passagens deste trabalho, a tutela de urgencia cautelar possui índole conservativa, tendo por finalidade evitar que o processo, enquanto instrumento, se mostre inefetivo.

A estabilização é inerente às tutelas antecipadas, pois somente essa espécie

de tutela de urgência é capaz de antecipar o bem da vida que somente seria obtido

ao final da cognição exauriente. Mais precisamente, os efeitos da estabilização

aplicam-se à tutela antecipada requerida em caráter antecedente e, essa espécie de

tutela ocorre quando há extrema urgência para que seja deferido determinado pedido,

por isso, o autor restringe a petição exclusivamente com o pedido de tutela

58 ALVIM, 2017, p. 208

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antecedente e, depois, em momento oportuno, faz a complementação da petição

inicial com novas alegações, provas e outros pedidos.

Ainda, importa destacar que mesmo o legislador ter colocado apenas a

hipótese da estabilização para as tutelas antecipadas requeridas em caráter

antecedente, é notório que implicitamente a estabilização deve ser aceita quando ela

for requerida na petição inicial proposta regularmente, pois segundo Luiz Guilherme

Marinoni:

Ora, não há motivo razoável algum para se entender que apenas a tutela antecipada requerida na forma antecedente pode se tornar estável. Isso seria afirmar que somente o autor que, diante da situação de urgência, não tem tempo para elaborar adequadamente a petição inicial da ação, pode gozar dos benefícios da inércia do demandado. (...) Ao admitir a estabilização da tutela antecipada requerida na forma antecedente, o art. 304 aceitou implicitamente a estabilização da tutela antecipada requerida na petição inicial da ação regularmente proposta.59

A tutela antecipada antecedente está prevista no artigo 303 do Código de

Processo Civil60, o qual prevê que nos casos em que a urgência for contemporânea à

propositura da ação, poderá o autor requerer a tutela antecipada de forma

antecedente ao pedido da tutela final. Ou seja, a tutela antecipada antecedente é

requerida quando a situação de urgência é extrema e já existe no momento em que

foi proposta a ação, conforme explica Leonardo Ferres da Silva Ribeiro.

(...) não se pode perder de vista que o pedido de tutela antecipada antecedente é medida excepcional, justificando-se diante de uma urgência contemporânea à propositura da ação (art. 303), ou seja, a impossibilidade de, naquele determinado momento, dada uma situação de urgência urgentíssima, instruir adequadamente a ação que contemple o pedido final.61

Dessa forma, quando for proferida uma decisão deferindo a tutela antecipada

antecedente e o réu se mantiver inerte, o legislador trouxe a hipótese de estabilização

dos efeitos da decisão. Estabilizar a tutela antecipada é substituir seu efeito provisório

e conceder a ela efeito definitivo, de tal modo que, se as partes forem omissas, não

haverá prejuízo. Isso porque, após a estabilização não é necessária qualquer

59 MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela de urgência e tutela de evidencia: soluções processuais diante do tempo da justiça. 2. ed. rev. – São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 235. 60 BRASIL. Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015 – Novo Código de Processo Civil. Brasília, Senado Federal, 2015. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm > Acesso em: 26 out. 2018. 61 RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva. Tutela provisória: tutela de urgência e tutela da evidência: do CPC/1973 ao CPC/2015. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 219.

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atividade jurisdicional para que a parte consiga usufruir de imediato o direito pleiteado

já concedido com a tutela antecipada. Assim, após a concessão da tutela que se

tornou estável, não há sequer a necessidade do juiz proferir uma sentença de mérito,

pois os efeitos se tornaram definitivos e estáveis.

Ou seja, um dos objetivos da estabilização é não ter que discutir a controvérsia

do processo novamente no caso em que o próprio réu se manteve inerte, bem como

é fazer com que um processo que poderia ser extinto, venha a produzir efeitos,

conforme explica Luiz Guilherme Marinoni.

Portanto, se a estabilidade da tutela antecipada é o preço da inércia do demandado, esse somente é realmente pago porque se deixa claro que a tutela não impugnada produz efeitos para além do processo em que concedida. Ou melhor, se a razão da técnica processual é otimizar a prestação jurisdicional quando presente o desinteresse do demandado, a ideia de estabilização da tutela representa a manutenção atemporal dos efeitos da tutela.62

Ainda, Eduardo Arruda Alvim, também explica de forma sucinta a técnica da

estabilização, conforme verifica-se a seguir.

Em suma, está estabelecida no art. 304 uma tecnica especial de resolução provisória do conflito, por meio da qual uma tutela provisória passa a gozar de autonomia, permitindo as partes a fruição de seus efeitos práticos, independentemente da discussão de mérito, na expectativa de que isso sirva para diminuir a litigiosidade.63

O caráter definitivo da tutela provisória antecipada antecedente foi trazido com

a estabilização no artigo 304 do Código de Processo Civil, o qual preve que “A tutela

antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável se da decisão que a

conceder não for interposto o respectivo recurso. ”64

Do artigo mencionado, entende-se que a estabilização ocorrerá quando a tutela

que foi concedida de forma antecedente não sofrer impugnações por parte do réu pela

falta de interposição do respectivo recurso. Assim, os efeitos dessa tutela se tornarão

definitivos e estáveis, até que sobrevenha ação proposta por qualquer uma das partes,

a fim de exaurir a cognição.

62 MARINONI, 2018, p. 232. 63 ALVIM, 2017, p. 200. 64 BRASIL. Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015 – Novo Código de Processo Civil. Brasília, Senado Federal, 2015. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm > Acesso em: 26 out. 2018.

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Destaca-se que o artigo 304 do Código de Processo Civil prevê somente a

hipótese do réu interpor recurso para evitar a estabilização, qual seja, o recurso de

agravo de instrumento. Porém, o entendimento que vem sendo adotado pela doutrina

é diverso, de tal modo que, se o réu não interpor recurso, mas apresentar contestação

ou qualquer outra impugnação à decisão que concedeu a tutela, bem como requerer

a realização de audiência de conciliação ou mediação, entende-se que essa

manifestação também serve para evitar a estabilização dos efeitos da tutela.

Em outras palavras, Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel

Mitidiero expõe que:

Essa solução tem a vantagem de economizar o recurso de agravo e de emprestar a devida relevância à manifestação de vontade constante da contestação ou do intento de comparecimento à audiência. Em ambas as manifestações, a vontade do réu é inequívoca no sentido de exaurir o debate com o prosseguimento do processo.65

Ainda, conforme uma outra obra de Luiz Guilherme Marinoni, o autor relata que

qualquer forma de impugnação do réu deve ser levada em consideração, pois é uma

forma dele se manifestar contra à estabilização.

(...) é preciso que qualquer forma de reação, ainda que não o agravo de instrumento, seja vista como sinal de inconformidade, capaz de determinar o prosseguimento do processo não apenas para a discussão do caso, mas para que o autor de se desincumba do ônus de provar as alegações de fato que foram admitidas como prováveis.66

Conclui-se, portanto, que os efeitos tornar-se-ão estáveis quando forem

preenchidos alguns pressupostos, quais sejam: quando o autor houver se manifestado

na petição inicial quanto ao pedido de tutela antecipada antecedente que faz presumir

o interesse pelo efeito da estabilização, bem como quando o autor ou o réu não se

manifestarem, no prazo de dois anos, quanto ao exaurimento da cognição após o

deferimento da tutela antecipada.

Todavia, importa destacar que no caso em que não forem preenchidos os

pressupostos acima citados, ainda assim, quando as partes tiverem realizado um

negócio jurídico, antes ou durante o processo, a estabilização surtirá efeito. É o que

65 MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2018, p. 418. 66 MARINONI, 2018, p. 234.

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explica Fredie Didier Jr.67 “Mas nada impede que, mesmo na ausencia destes

pressupostos, as partes selem entre si negócio jurídico, antes ou durante o processo,

avençando a estabilização de tutela antecipada antecedente em outros termos (...)”.

Ainda, importa destacar o Enunciado n.32 do Fórum Permanente de

Processualistas Civis, o qual trata da hipótese de concessão dos efeitos estáveis

quando as partes houverem avençado nesse sentido “Alem da hipotese prevista no

art. 304, é possível a estabilização expressamente negociada da tutela antecipada de

urgencia antecedente”.68

Diante do exposto, é notório que os efeitos que se tornaram estáveis fazem

com que não seja necessária a reafirmação em um provimento com uma cognição

exauriente. Contudo, caso o autor ou o réu queiram o exaurimento da cognição do

processo, poderão propor ação dentro do prazo de dois anos a contar da ciência da

decisão que tornou a tutela estável e extinguiu o processo, conforme leciona Luiz

Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, abaixo.

Não tendo o réu se manifestado pelo exaurimento da cognição, qualquer das partes poderá dentro do prazo de dois anos (art. 304, §5º do CPC), propor ação visando a exaurir a cognição – isto é, com o objetivo de aprofundar o debate iniciado com a ação antecipada antecedente (...)69

Dispõe o artigo 304, §5º do Código de Processo Civil que “O direito de rever,

reformar ou invalidar a tutela antecipada, previsto no §2º deste artigo, extingue-se

após 2 (dois) anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo, nos

termos do §1º”. 70

Após a leitura do artigo supracitado, entende-se que a tutela satisfativa

antecedente continuará produzindo efeitos até que uma das partes proponha ação

autônoma dentro de dois anos, a fim de revisar, reformar ou invalidar a decisão.

Contudo, diversos autores criticam o instituto da estabilização em que pese a decisão

proferida em cognição sumária tornar-se definitiva após vencido o prazo de dois anos

67 DIDIER JR.; BRAGA; DE OLIVEIRA, 2018, p. 702. 68 DIDIER JR, Fredie; SICA, Heitor. Enunciados do Fórum Permanente de Processualistas Civis. São Paulo, 24, 25 e 26 de março, 2017. Disponível em < https://institutodc.com.br/wp-content/uploads/2017/06/FPPC-Carta-de-Florianopolis.pdf > Acesso em: 03 abril 2019. 69 MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2018, p. 418. 70 BRASIL. Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015 – Novo Código de Processo Civil. Brasília, Senado Federal, 2015. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm > Acesso em: 28 out. 2018.

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sem sequer o juiz ter obtido um juízo de certeza da forma como ocorre em decisões

com força de coisa julgada.

4.1. A ESTABILIZAÇÃO TEM FORÇA DE COISA JULGADA?

O presente trabalho tem por objetivo principal o estudo da estabilização das

tutelas provisórias antecipadas, bem como uma análise doutrinária a respeito da sua

semelhança com a formação de decisões com coisa julgada. Todavia, antes de iniciar-

se um estudo doutrinário a respeito do questionamento se a estabilização tem força

de coisa julgada, deve ser analisado o conceito de coisa julgada.

É sabido que o conceito mais comum da coisa julgada é que ela é uma decisão

que não comporta mais a interposição de recursos. Contudo, muitos autores criticam

esse conceito, dizendo que ele é muito simples, pois não indica a essência e a função

desempenhada pela decisão com autoridade de coisa julgada.

De acordo com Eduardo Cambi et. al.71, “Aprimorando-se esse conceito, pode-

se definir coisa julgada como a qualidade consubstanciada na imutabilidade do

comando emergente de uma decisão para a definição do direito controvertido. ”

A coisa julgada é formada após o devido processo legal, com o restrito

cumprimento aos princípios do contraditório e da ampla defesa, a fim de que o direito

pleiteado seja vastamente discutido e analisado, possibilitando ao juiz utilizar uma

técnica de cognição exaustiva e satisfatória, assim, o processo estará apto para

transitar em julgado e formar uma decisão imutável com autoridade de coisa julgada

formal e material.

Ainda, salienta-se que a coisa julgada tem um caráter dúplice: a coisa julgada

formal e a material. A coisa julgada formal é a própria característica de

irretratabilidade, ou seja, é quando a imutabilidade surte efeitos dentro do próprio

processo, fazendo com que os detentores do poder jurisdicional não possam mais

rever aquele determinado processo novamente. Em outras palavras, explica Eduardo

Cambi et. al.:

Assim, quando forem esgotados todos os recursos possíveis, porque já foram interpostos e julgados ou porque não foram conhecidos, bem como após o julgamento da remessa necessária (quando houver), ocorre a coisa julgada

71 CAMBI, et. al., 2017, p. 935.

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formal, que é a imutabilidade da decisão dentro do mesmo processo, por falta de meios de impugnação possíveis.72

Assim, enquanto a coisa julgada formal é um fenômeno endoprocessual, pode-

se afirmar que a coisa julgada material é um fenômeno extraprocessual. Isso porque,

ela projeta seus efeitos para fora do processo, atingindo as pessoas que também não

fazem parte daquele litigio, conforme Eduardo Cambi et. al., a coisa julgada material:

(...) é a imutabilidade do comando da decisão de mérito e seus efeitos – torna impossível a rediscussão da causa, reputando-se repelidas todas as alegações e defesas que a parte poderia opor ao acolhimento ou a rejeição do pedido. (...) Por exemplo, se a ação foi julgada improcedente por falta de provas, transitada em julgada a sentença de mérito, não serão novas provas que vão possibilitar a renovação do pedido.73

Conclui-se que a coisa julgada ocorre quando uma decisão se torna imutável e

indiscutível e, o processo fica apto para transitar em julgado. Sendo assim, em que

pese a decisão se tornar indiscutível, é evidente que só terá autoridade de coisa

julgada material e formal aquela decisão que passou por um devido processo legal,

respeitando os princípios do processo civil.

Diante do exposto, restou claro que a função principal da coisa julgada é trazer

uma maior segurança jurídica ao processo, bem como garantir uma maior estabilidade

às decisões que foram decididas com base numa cognição exauriente.

Assim, resta responder a indagação se a estabilização da tutela antecipada

concedida em caráter antecedente teria força de coisa julgada.

Há doutrinadores que criticam o instituto da estabilização e, inclusive, dizem

que ele é inconstitucional. Entretanto, há quem diga que a estabilização trouxe

benefícios às partes, pois traz maior efetividade ao processo e economia processual.

Dessa forma, de um lado há quem diga que a estabilização não viola nenhum

princípio constitucional, pois não adquire autoridade de coisa julgada. Isso porque,

após vencido o prazo de dois anos, ainda há oportunidade para as partes requerem o

exaurimento da cognição até que prescreva ou decaia o direito material pleiteado. No

mesmo sentido, posiciona-se Eduardo Cambi:

Com efeito, a decisão que concede a tutela antecipada está baseada em cognição sumária e, por isso, não faz coisa julgada, mas a estabilização dos

72 CAMBI, et. al., 2017, p. 938. 73 Ibid., p. 939.

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respectivos efeitos só será afastada por uma das partes, nos termos do § 2º do art. 304 do NCPC. Assim, não compromete a garantia constitucional do

contraditório (art. 5º, LV CF), que fica apenas eventualmente postergado. 74

Contudo, de forma diversa, há doutrinadores que comentam que a

estabilização produz efeitos com força de coisa julgada, conforme explica Jesualdo

Eduardo de Almeida Junior et. al.75 a estabilização é “(...) a pretensão de emprestar

força de coisa julgada à decisão antecipatória dos efeitos da tutela, requerida

preparatoria ou incidentalmente, com a simples omissão das partes envolvidas”.

Ou seja, estabilizar uma decisão é substituir seu efeito provisório característico

de uma tutela concedida em cognição sumária e conceder a ela efeitos definitivos

como se houvesse exaurido a cognição no processo e, consequentemente, formando

coisa julgada, a fim de busca efetividade e economia processual. É o que explica a

seguir Donaldo Armelin76

Atribuir as decisões de verossimilhança a estabilidade da coisa julgada não e outra coisa senão realizar uma opção que, reduzindo a amplitude que o paradigma da ordinariedade outorgou ao valor segurança, prestigia a efetividade e busca reduzir o tempo de tramitação dos processos.

Ainda, há doutrinadores que criticam o legislador ao ter criado o instituto da

estabilização, pois esclarecem que ela produz efeitos semelhantes à uma decisão

com força de coisa julgada e que isso é inconstitucional, pois é uma decisão que tem

efeitos definitivos e imutáveis mesmo tendo sido proferida com base em uma cognição

sumária. Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero questionam

em sua obra qual a qualificação da estabilização, pois de acordo com eles, mesmo o

legislador tendo sido claro ao dizer que a estabilidade não faz coisa julgada, é evidente

que se gera uma dúvida de qual é, então, a característica da estabilização, ou seja,

não se sabe como qualifica-la.

O legislador é claríssimo ao afirmar que a decisão que concede a tutela antecipada antecedente não faz coisa julgada. Além de dizê-lo expressamente (art. 304, §6º), prevê ainda ação exauriente para o aprofundamento da cognição (art. 304, §§2º e 5º). Contudo, a questão que

74 CAMBI, Eduardo; NEVES, Aline Regina das. Acesso à justiça, tutela antecipada e técnicas processuais. In: DIDIER JUNIOR, Fredie (Coord.). Procedimentos especiais, tutela provisória e direito transitório. Salvador: Juspodium, 2015, p. 112. 75 ALMEIDA JUNIOR, Jesualdo Eduardo de et. al. Comentários ao Novo Código de Processo Civil. 1. ed. Birigui, São Paulo: Editora Boreal, 2017, p. 51. 76 ARMELIN, Donaldo. Tutelas de urgência e cautelares: estudos em homenagem a Ovídio A. Baptista da Silva – São Paulo: Saraiva, 2010, p. 300.

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fica – apenas aparentemente – em aberto é a seguinte: como qualificar a força de estabilidade depois de transcorridos dois anos sem que tenha sido proposta a ação exauriente?77

Os mesmos autores citados acima, respondem ao questionamento fazendo

uma crítica à estabilização, explicando que a decisão estável faz coisa julgada sim,

pois não há outra denominação a ser utilizada para uma decisão que tem efeito

definitivo e que não pode ser discutida após determinado prazo, a não ser “coisa

julgada”. Por isso, Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero

afirmam que a estabilização viola e compromete uma garantia constitucional.

O que é de duvidosa legitimidade constitucional é equiparar os efeitos do procedimento comum – realizado em contraditório, com ampla defesa e direito à prova – com os efeitos de um procedimento cuja sumariedade formal e material é extremamente acentuada.78

Ou seja, é um absurdo atribuir um juízo de certeza - inerente à coisa julgada -

à uma decisão proferida em cognição sumária que se tornou estável. Isso porque,

pela própria natureza das tutelas antecipadas antecedentes, verifica-se que elas são

proferidas em um momento do processo em que o juiz não está apto a formar seu

convencimento pleno.

Desse modo, alguns doutrinadores criticam a possibilidade de atribuição da

estabilidade à uma decisão proferida em um momento processual de incerteza em

que o juiz tem conhecimento limitado da demanda, ou seja, seria inviável atribuir força

de coisa julgada para uma decisão que não é conclusiva, mas tão somente sumária e

que alcançou apenas um juízo de verossimilhança. Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio

Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero esclarecem que:

O legislador é igualmente claro – embora não tenha se atrevido a dizê-lo diretamente: se a “estabilidade dos respectivos efeitos so seria afastada por decisão” tomada na ação exauriente (art. 304, §6º, CPC), então e evidente que, inexistindo ação posterior ajuizada no prazo legal, a estabilidade torna-se “inafastável”. Em outras palavras: “imutável” e “indiscutível” (art. 502, CPC, a impossibilidade de revisão do decidido em outro processo dificilmente pode ser caracterizado de modo diverso da coisa julgada).79

77 MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2015, p. 226. 78 Ibid., p. 227. 79 MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2018, p. 418.

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A citação colacionada acima, explica que o legislador não atribui à estabilização

uma qualificação de coisa julgada, todavia, por sua natureza, é notório que ela não

poderá mais ser discutida após vencido o prazo de dois anos, conforme previsão legal.

Tornando-se, assim, uma decisão com efeitos estáveis, que não pode ser afastada ou

discutida novamente e, portanto, tem efeitos semelhantes à coisa julgada material.

Da mesma forma é o que explica Eduardo Cambi et. al. a seguir.

Assim, embora a decisão que antecipou a tutela antecipada não se revista da autoridade da coisa julgada material, pois está fundada em cognição sumária e a vinculação constitucional da coisa julgada depende de cognição exauriente (inerente à observância das garantias constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal), seu conteúdo se torna imutável e indiscutível para as partes, permitindo-se concluir que a equiparação dos efeitos dessa estabilidade qualificada possui autoridade de coisa julgada material.80

Em suma os autores Eduardo Cambi et. al., comentam que as características

dos efeitos da estabilidade equiparam-se a uma decisão com autoridade de coisa

julgada, mesmo não sendo revestida de uma cognição exauriente. Além disso,

segundo esses mesmos autores, ainda que a estabilidade possa ser equiparada à

coisa julgada, ela também é uma decisão baseada em um juízo provisório e

superficial, e, por isso, esta não pode ser objeto de ação rescisória. “Isso porque o art.

304, §6º do novo Código de Processo Civil afirma que a decisão que concede a tutela

não faz coisa julgada e o art. 966 do Código de Processo Civil de 2015 exige que a

decisão de merito necessariamente transite em julgado para ser rescindida. ”81

Diante de todo o exposto, é evidente que a interpretação do artigo 304 do

Código de Processo Civil gerou uma divergência doutrinária, pois conforme Luiz

Guilherme Marinoni: “Enquanto alguns admitiram que a decisão se torna definitiva,

transformando-se em decisão imutável, dotada de verdadeira e própria autoridade de

coisa julgada material, outros concluíram que a tutela conserva apenas a sua eficácia

executiva. ”82

Ainda, segundo Luiz Guilherme Marinoni:

(...) como a passagem do prazo de dois anos para o exercício do direito de revisão da tutela estabilizada não faz surgir coisa julgada, a questão jurídica decidida enquanto prejudicial à concessão da tutela não só pode voltar a ser

80 CAMBI, et. al., 2017, p. 296. 81 Ibid., p. 298. 82 MARINONI, 2018, p. 243.

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analisada enquanto pedido em ação de cognição exauriente, como também pode permitir decisão inversa ou contrária sem que se possa falar em violação de coisa julgada.83

O autor supramencionado entende que não há efeito preclusivo próprio à coisa

julgada no caso da estabilização, pois os efeitos estáveis somente impedem que, após

o prazo legal, a tutela concedida seja reformada, revista ou invalidada. Ou seja, não

há formação de coisa julgada, uma vez que o direito material que está sendo discutido

poderá ser revisto em ação autônoma.

Ademais, importa destacar os comentários de Teresa Arruda Alvim acerca da

ambiguidade da estabilização dos efeitos da tutela antecipada:

Em nosso sentir, há uma verdadeira ambiguidade entre o §5º e o §6º do artigo 304 do novo diploma legal, haja vista a limitação do tempo para propositura da ação reformista da estabilização, uma vez que após o interregno de dois anos a decisão ficará estabilizada ad eternum, sem a possibilidade de ser revista e sem a formação de coisa julgada.84

Conclui-se, então, que há uma grande ambiguidade e contradição a respeito

do instituto da estabilização, pois, enquanto o §5º do art. 304 do Código de Processo

Civil diz que o direito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada extingue-se

após vencido o prazo de 2 anos, o §6º do mesmo artigo do Código de Processo Civil

prevê que não há formação de coisa julgada da decisão estável que concedeu a tutela.

Sendo assim, há uma contradição, porque a imutabilidade – também

denominada de coisa julgada formal -, é uma característica inerente às decisões com

autoridade de coisa julgada, mas não para as decisões com caráter provisório

estabilizadas. Contudo, mesmo assim, há quem diga que não há formação de coisa

julgada porque o direito material pleiteado não passou por uma cognição exauriente e

a sua existência não foi declarada com o devido processo legal, conforme explica

Teresa Arruda Alvim:

(...) concluímos que a estabilização da decisão concedida em tutela antecipada requerida em caráter antecedente não faz coisa julgada, por não declarar a existência ou não de um direito, mas mantém os mesmos efeitos, como se tivesse ocorrido a coisa julgada, razão pela qual a caracterizamos como ambígua.85

83 MARINONI, 2018, p. 246. 84 BUIKA, maio 2017, p. 311. 85 Ibid., p. 312.

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Desse modo, é notório que se o legislador não houvesse estipulado o limite do

prazo de 2 anos para rever, reformar ou invalidar a tutela, ou, se o legislador

simplesmente declarasse que após referido prazo haveria sim a formação de coisa

julgada, essa ambiguidade não iria existir.

O ordenamento jurídico, mais precisamente a Constituição Federal prevê que

há transito em julgado quando não é mais permitido às partes reverem a decisão, pois

formou-se coisa julgada, ou seja, não se admite a interposição de qualquer recurso,

tornando a decisão imutável.

Dessa mesma forma, no Código de Processo Civil de 2015, o legislador deixou

claro que findo o prazo legal de 2 anos - previsto no §5º do art. 304 do mesmo código,

não é mais possível à parte discutir novamente sobre a decisão que concedeu a tutela

e teve seus efeitos estabilizados.

Portanto, como visto, já que a hipótese de não se permitir rever a decisão seria

apenas a da formação da coisa julgada, percebe-se a postura equivocada do

legislador ao atribuir a impossibilidade de rever uma decisão que foi fundada tão

somente em cognição sumária e que é incapaz de formar coisa julgada, mas que, por

uma consequência lógica, acaba sendo uma decisão estável com efeitos imutáveis,

indiscutíveis, mas que não pode ser classificada como coisa julgada.

4.2. O PRINCÍPIO DA EFETIVIDADE E A SEGURANÇA JURÍDICA

Restou claro que o presente trabalho teve por objetivo o estudo das tutelas

provisórias, bem como o estudo dos efeitos estáveis que as tutelas antecipadas

antecedentes podem produzir.

Após a reflexão e análise desses temas, é evidente a grande importância dos

procedimentos sumários para garantir a efetividade, bem como um processo com

celeridade para que o direito do autor não pereça, principalmente quando estiver

configurada uma situação de urgência, conforme explica Gustavo Henrique Schneider

Nunes a seguir.

Por meio dessas técnicas de aceleração do processo, almeja-se a resolução dos problemas do autor que aciona o Estado-juiz e que dele aguarda o proferimento de uma resposta justa, rápida e eficiente, realizando os seus direitos materiais.86

86 NUNES, Gustavo Henrique Schneider. Tempo do Processo Civil e Direitos Fundamentais. 1. ed. – São Paulo: Letras Jurídicas, 2010, p. 192.

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Ocorre que, em alguns casos há urgência no pedido do autor, por isso, se o

bem da vida almejado pela parte só fosse concedido em um momento processual com

base em uma cognição exauriente, o direito pleiteado sequer poderia existir mais, e,

consequentemente, não poderia ser usufruído pelo autor.

Dessa forma, é evidente a importância das técnicas processuais fundadas em

uma cognição sumária, pois, o instituto das tutelas antecipadas, além de serem uma

forma de diminuir as inúmeras demandas que lotam o judiciário, também garantem

que o bem da vida seja concedido de imediato, conforme explica Heloísa Buika.

Indiretamente, o instituto da tutela antecipada contribui para a diminuição do número de processos que abarrota o Judiciário, por ser um instrumento eficaz de rápida solução das controvérsias, uma vez que tempestivamente outorga a prestação jurisdicional ao demandante. A tutela antecipada encontra-se inserida num contexto político mundial de valorização da sumarização da tutela civil e descrédito do processo ordinário.87

Contudo, ao passo que essa técnica sumária possibilita a efetividade e

celeridade do processo, bem como contribui para a diminuição do número de

processos do Judiciário, ela gera um confronto em relação ao princípio da segurança

jurídica. Isso porque, a segurança jurídica é um princípio inerente à cognição plena e

exauriente, uma vez que, quanto mais o magistrado alcançar um juízo de certeza e o

exaurimento da cognição, mais segurança jurídica ele alcançará para o processo.

Destaca-se o que diz Donaldo Armelin a seguir.

Poder-se-ia dizer, e bem verdade, que a plenariedade da cognição aumenta a segurança da decisão, ampliando a investigação das questões relevantes e que, por isso, deve ser prestigiada pelo sistema. Cuida-se, como e evidente, de uma opção adotada em vista do valor segurança.88

Sendo assim, é evidente que no momento da concessão das tutelas provisórias

há uma confrontação entre o princípio da efetividade que é próprio da cognição

sumária e o princípio da segurança jurídica que pertence à técnica de cognição

exauriente. Esse confronto deve ser solucionado, conforme cada caso concreto, com

base em uma análise dos dois princípios, a fim de que se chegue a uma conclusão de

qual princípio irá preponderar em relação ao outro.

87 BUIKA, 2017, p. 291. 88 ARMELIN, 2010, p.299.

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De um lado, há o princípio constitucional da efetividade do processo, o qual

garante que o indivíduo que teve seu direito violado, obtenha a efetiva prestação

jurisdicional, a fim de que o bem da vida almejado por ele seja concedido em tempo

razoável e sem dilações impróprias, conforme o que esclarece Teori Albino Zawascki.

O direito fundamental à efetividade do processo – que se denomina também, genericamente, direito de acesso à justiça ou direito à ordem jurídica justa – compreende, em suma, não apenas o direito de provocar a atuação do Estado, mas também e principalmente o de obter, em prazo adequado, uma decisão justa e com potencial de atuar eficazmente no plano dos fatos.89

Ainda, João Batista Lopes descreve que o processo efetivo é aquele que:

Se desenvolve com respeito às garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório da ampla defesa e do contraditório, obtendo-se o máximo de rendimento com o mínimo trabalho, no menor tempo possível, sem sacrificar o direito da parte e a segurança jurídica.90

Desse modo, o processo será efetivo quando proferir decisões eficazes e

dentro de um tempo razoável. Todavia, de outro lado, a Constituição Federal também

garante, através do princípio do devido processo legal, que o direito almejado pela

parte alcance uma cognição exauriente, capaz de trazer segurança jurídica ao

processo, respeitando os princípios da ampla defesa e do contraditório. Em outras

palavras é o que ilustra Teori Albino Zawascki abaixo.

É, pois, o direito fundamental do litigante demandado (como o é, também, do litigante demandante) o direito à chamada cognição exauriente, assim entendida a que submete as soluções definitivas dos conflitos a procedimentos prévios nos quais se ensejam aos litigantes o contraditório, a ampla defesa e a interposição de recursos.91

É inegável que a tutela provisória que for concedida garante o princípio da

efetividade, mas coloca a segurança jurídica em segundo plano. Assim, o Direito

Processual Civil deve sempre buscar uma harmonização entre o binômio efetividade-

segurança, a fim de que o magistrado seja capaz de ponderar qual necessidade é

maior a depender do caso concreto.

89 ZAWASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. 3. ed. rev. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2000, p.64. 90 LOPES, João Batista. Curso de Direito Processual Civil. v. 1 – São Paulo: Atlas, 2005, p. 65. 91 ZAWASCKI, op. cit., p. 65.

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Ainda, destaca-se o que diz Cláudia Elisabete Schwerz Cahali “Todavia, não

se pretende a celeridade com sacrifício do direito da parte, nem o comprometimento

do direito ao contraditório e da ampla defesa.” 92 Ou seja, no Direito Processual Civil,

ao mesmo tempo que há uma busca pela efetividade e a celeridade do processo, não

pode ocorrer uma violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa, isso

porque, sempre deve-se almejar pelo equilíbrio processual entre uma decisão célere

e uma decisão capaz de proporcionar segurança jurídica.

Dessa forma, quando estiver configurada uma situação de urgência em que o

bem da vida pleiteado pelo autor estiver comprometido, a segurança jurídica deve ser

colocada de lado para ser obtida em momento oportuno, e, desde logo, o direito

almejado deve ser acautelado ou concedido antecipadamente. Em outras palavras é

o que explica Gustavo Henrique Schneider Nunes.

O direito de ação, garantido constitucionalmente no art. 5º, XXXV, é instrumentalizado pelas normas processuais, e, dentre estas, a tutela antecipatória é considerada o meio pelo qual a tutela jurisdicional é obtida com o maior grau de efetividade. (...) de nada vale um direito garantido constitucionalmente se não puder ser efetivado.93

Em suma, é evidente que a técnica da antecipação é utilizada para garantir

uma melhor prestação jurisdicional. Ainda importa destacar a citação abaixo de Teori

Albino Zawaski.

As medidas antecipatórias e as medidas cautelares têm um objetivo e uma função constitucional comuns: são instrumentos destinados a, mediante a decisão harmonização, dar condições de convivência simultânea aos direitos fundamentais da segurança jurídica e da efetividade da jurisdição. E é nesta função instrumental concretizadora que ditas medidas legitimam-se constitucionalmente.94

Diante de todo o exposto, com o presente trabalho, restou evidente que a

técnica da cognição sumária, utilizada para a concessão das tutelas de urgência

provisórias e, consequentemente para a aplicação dos efeitos estáveis, é de extrema

importância para que sejam proferidas decisões efetivas, principalmente, quando o

fator tempo for ameaça à futura fruição do direito pleiteado.

92 CAHALI, Cláudia Elisabete Schwerz. O gerenciamento de processos judiciais: em busca da efetividade da prestação jurisdicional com remissões ao projeto do novo CPC. 1. ed. – Brasília, DF: Gazeta Jurídica, 2013, p. 163. 93 NUNES, 2010, p. 191. 94 ZAWASCKI, 2000, p. 68.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O tema estudado compreendeu o assunto das tutelas provisórias, em

específico, tutela antecipada requerida em caráter antecedente, que pode ter seus

efeitos estabilizados, conforme dispõe o artigo 304, §§5º e 6º do atual Código de

Processo Civil. O questionamento proposto foi analisar se a tutela antecipada

antecedente, que se tornou estável, poderá ser equiparada a uma decisão apta a

formar coisa julgada.

A decisão se torna estável quando a tutela antecipada, exclusivamente na

forma antecedente, é concedida e o réu não interpõe recurso de agravo de

instrumento, na intenção quiçá do não exaurimento da cognição e da sumarização do

procedimento. Diante da inércia do réu, a antecipação da tutela tem seus efeitos

estabilizados indefinidamente no tempo, caso nenhuma das partes proponha ação

exauriente no prazo de dois anos.

O problema que surge é que o artigo 304, §6º do Código de Processo Civil,

dispõe que a decisão que concede a tutela antecipada antecedente não fará coisa

julgada, mas será apenas estável. Contudo, o instituto da estabilização acaba por ter

efeitos semelhantes a uma decisão com força de coisa julgada que também é

“inafastável”.

Diante dessa problemática, constatou-se a dificuldade em reconhecer que, uma

vez concedida a tutela antecipada antecedente, esta poderá se tornar estável e seus

efeitos não poderão ser afastados, ainda que tenha sido concedida em cognição

sumária. Em razão disso, verificou-se uma insegurança jurídica, ao passo que há uma

decisão com efeitos imutáveis, mas sem que tenha ocorrido uma cognição plena e

exauriente no processo.

É evidente que com o advento do instituto da estabilização, não obstante o bom

interesse do legislador ao objetivar um processo mais célere e efetivo, a segurança

jurídica acabou sendo deixada de lado. O Código de Processo Civil de 2015, priorizou,

por muitas vezes, a efetividade e a celeridade, em detrimento ao formalismo que

pesava sobre o Código de Processo Civil de 1973.

A possibilidade de estabilização da tutela antecipada, em que pese ter sido

dada com base em cognição sumária e sem que tenha ocorrido um juízo de certeza,

presume que o autor e o réu anuíram com a decisão estabilizada, portanto, nesses

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casos, haverá simplificação do processo, especialmente porque a tutela concedida

resolve o conflito havido entre as partes.

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