Cidadania Ambiental

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O Design, as novas mídias e a Educação na construção de uma cidadania ambiental. Ailton Santos Leite Bacharel em Desenho Industrial pela Universidade Federal do Rio de Janeiro; Especialista em Gestão Ambiental para Educação pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro; Mestrando em Design pela PUC-Rio. Palavras-chaves : design, comunicação, mídia, interdisciplinaridade, educação ambiental. Resumo Como o Design pode ser um instrumento para a aplicação da Educação Ambiental? Em resposta a esta indagação, este artigo propõe uma reflexão acerca do Design, em conjunto com os meios nos quais ele se insere, como mediador de relações construtivas em Educação Ambiental. Para subsidiar o ingresso na discussão, vamos definir o conceito atual de Educação Ambiental, os meios que o Design utiliza para expressão, mais especificamente em Comunicação Visual, através de uma linguagem icônica para a transmissão de conhecimento e saberes. As relações entre o design e outras áreas do saber também serão revistas, bem como, a análise de como estas novas formas de leitura podem ser eficazes no processo educacional.Busca-se também, neste trabalho, a sensibilização do profissional de design para as diversas possibilidades de ação que o campo ambiental proporciona para esta atividade profissional e seu papel na construção de uma cidadania ambiental que contemple as necessidades sócio-econômicas, culturais, mercantis e políticas entre todos os atores sociais envolvidos na sustentação da estrutura de uma sociedade pós- industrial, como a que vivemos atualmente. As áreas envolvidas neste estudo apresentam relações interdisciplinares notáveis, as quais, ao longo do texto, são destacadas através de citações, referências bibliográficas, e de um breve relato sobre um estudo de caso. Durante a experiência, foram experimentadas as teorias acerca do relacionamento interdisciplinar entre

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Texto sobre ética ligada a questão ambiental

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O Design, as novas mídias e a Educação na construção

de uma cidadania ambiental.

Ailton Santos Leite

Bacharel em Desenho Industrial pela Universidade Federal do Rio de Janeiro;

Especialista em Gestão Ambiental para Educação pela Universidade do Estado

do Rio de Janeiro; Mestrando em Design pela PUC-Rio.

Palavras-chaves: design, comunicação, mídia, interdisciplinaridade,

educação ambiental.

Resumo

Como o Design pode ser um instrumento para a aplicação da Educação

Ambiental? Em resposta a esta indagação, este artigo propõe uma reflexão

acerca do Design, em conjunto com os meios nos quais ele se insere, como

mediador de relações construtivas em Educação Ambiental. Para subsidiar o

ingresso na discussão, vamos definir o conceito atual de Educação

Ambiental, os meios que o Design utiliza para expressão, mais

especificamente em Comunicação Visual, através de uma linguagem icônica

para a transmissão de conhecimento e saberes. As relações entre o design e

outras áreas do saber também serão revistas, bem como, a análise de como

estas novas formas de leitura podem ser eficazes no processo

educacional.Busca-se também, neste trabalho, a sensibilização do

profissional de design para as diversas possibilidades de ação que o campo

ambiental proporciona para esta atividade profissional e seu papel na

construção de uma cidadania ambiental que contemple as necessidades

sócio-econômicas, culturais, mercantis e políticas entre todos os atores

sociais envolvidos na sustentação da estrutura de uma sociedade pós-

industrial, como a que vivemos atualmente. As áreas envolvidas neste

estudo apresentam relações interdisciplinares notáveis, as quais, ao longo

do texto, são destacadas através de citações, referências bibliográficas, e de

um breve relato sobre um estudo de caso. Durante a experiência, foram

experimentadas as teorias acerca do relacionamento interdisciplinar entre

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essas áreas que pode agregar novos saberes e novos valores a uma

comunidade nos processos de construção do saber e de cidadania.

As origens com a mudança nos padrões éticos e sociais.

No final do século XVIII e o século XIX, com a hegemonia do pensamento

iluminista e do Positivismo nas ciências, considerava-se que os assombrosos

avanços técnicos e científicos da época eram suficientes para promover o

progresso social e moral, igualitariamente e concomitantemente, para toda

a humanidade. Algumas vozes se levantaram para criticar a corrida

industrial e o sistema capitalista que emergia na época. Dentre estes

merecem destaque os naturalistas Ralph Waldo Emerson e Henry David

Thoureau. Keith Thomas (1988) relata que em 1909 o naturalista Robert

Gray considerava os humanos muito mais selvagens do que as outras

espécies de animais. Corroborando com esta mesma opinião, o Conde de

Clarendon declarava na mesma época: “a maior parte do mundo ainda é

habitada por homens tão selvagens quanto as feras com que eles

convivem”.

Constatou-se no decorrer do tempo que o progresso científico no máximo

proporcionou o progresso material ao homem, mas não necessariamente o

progresso moral e ético, na mesma proporção (Bobbio, 2000).

Primeiramente, com a Revolução Industrial e os avanços científicos, não se

falava em preservação ambiental, pois havia a crença de que os recursos

naturais seriam inesgotáveis e a extinção de espécies inteiras de plantas e

animais era apenas um detalhe insignificante diante do progresso e do bem

estar proveniente do mesmo. Esta visão foi se modificando aos poucos, não

porque foi criada uma consciência ambiental mundial, mas sim porque foi

constatou-se que as reservas naturais poderiam se esgotar e isso tornaria

inviável a sobrevivência da raça humana, sem contar as implicações

econômicas que um colapso nas reservas naturais de energia causariam

para o mundo capitalista. A mudança dos padrões éticos seja com relação

ao meio ambiente ou a qualquer outra área, até porque as regras sociais e

éticas de convívio e conduta não evoluíram na mesma proporção que as

técnicas de domínio e controle da natureza (Bobbio, op.cit.), sempre foram

regidas por interesses políticos e econômicos, como podemos ver no trecho

a seguir:

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“Até pouco tempo atrás, a exploração da natureza era considerada

obra a ser louvada e estimulada, enquanto a exploração do homem

pelo homem é percebida ainda agora, não obstante a crise do

marxismo, que dela fez seu principal objeto de crítica à sociedade

capitalista, uma ação cruel. Mesmo quando o individuo humano é

levado em consideração unicamente como ser natural por parte das

ciências biológicas, a sua manipulação suscita problemas de limites

morais e jurídicos, que se tornaram temas constantes de discussão

por parte da bioética”(Bobbio, op.cit)

O autor ainda afirma que os progressos científicos e técnicos são cada vez

mais acelerados, irresistíveis e irreversíveis. A partir desta premissa, apesar

do discurso positivista não ter mais lugar na sociedade pós-moderna, o

discurso apocalíptico também não atende as nossas necessidades de viver

em uma sociedade em que certas situações não são passíveis de retroceder.

É aí que é aplicável o conceito atual de ecologia baseado na busca de novos

processos alternativos de geração de energia, na Educação Ambiental para a

formação de agentes multiplicadores de uma cidadania ambiental e no uso

consciente dos recursos naturais.

Ainda sobre as relações éticas, Mauro Grün (Grün, 1994) chama a atenção

para a responsabilidade não assumida pelo sistema de produção pela

degradação do ambiente, cujo passivo somos todos no final, vítimas. A

influencia do pensamento cartesiano na sociedade industrial seria, segundo

o mesmo autor um dos principais fatores para a valorização da visão

antropocêntrica da sociedade em relação ao ambiente que a cerca. Este

raciocínio explicaria em a mudança de comportamento da sociedade com

relação aos recursos naturais, visando a sobrevivência da raça humana, que

é dependente destes recursos para sobreviver, sem contudo, haver uma

verdadeira preocupação com o planeta como um todo. Isso é facilmente

percebido na questão do Direito em relação aos outros seres vivos, já que a

bioética discute de forma veemente as ações da ciência com relação à raça

humana, mas negligencia, para não dizer ignora, iniciativas para que se

amplie a noção de direito dos seres que ainda não o tem.

Já Leff (2002), faz uma crítica a forma com que a Educação Ambiental vem

sido ministrada, no que diz respeito à formação de uma consciência

ecológica. Segundo o autor, a transversalidade na transmissão de conceitos

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ambientais no ensino formal, não se dá de fato, reduzida a umas poucas

iniciativas pontuais. Para Leff, a ética ecológica, aquém das visões sobrenaturais

e religiosas, busca arraigar o sentido da existência do mundo em bases naturais.

Sato, assim como Leff, também aponta estas deficiências tanto no âmbito

formal da Educação Ambiental quanto no não formal. Ela afirma, porém,

que apesar da conjuntura atual, a Educação Ambiental não está estagnada

(Sato, 2002). Já Prigogine (Prigogine & Stengers, 1984), defende que esta

mudança de comportamento passa pela transformação conceitual das

relações entre o individuo, o meio e a ciência, através de novas práticas

culturais, políticas e sociais, estabelecendo assim uma “nova aliança” entre

os atores sociais envolvidos no processo.

Jürgen Habermas, aborda a questão da moral e da ética de forma coletiva,

universalista. De acordo com Habermas, a formação moral provém de um

agir comunicativo que culmina em um discurso em prol do entendimento

mútuo, que faz parte de nosso cotidiano, toda vez que nos comunicamos

com o outro e trocamos informações, vivencias e saberes, como também,

através dos princípios fundamentais de hermenêutica enquanto função de

linguagem (Habermas, 1989). É neste sentido que a Educação Ambiental

pode contribuir para esta formação ética e moral com relação ao ambiente,

pois a transmissão dos conceitos que permeiam a E.A., sem a imposição de

valores e nem a distorção das informações transmitidas, pode, segundo o

principio da universalidade, transformar as relações vigentes entre os seres

humanos e o ambiente que o cerca.

A Educação Ambiental.

Primeiramente, é necessário que se esclareça o conceito de Educação

Ambiental e Meio Ambiente na contemporaneidade. As origens da Educação

Ambiental são oriundas do movimento ecológico que tomou corpo em todo o

mundo a partir da década de 70 do século passado, principalmente após a

crise do petróleo e alguns desastres ambientais cujas conseqüências

econômicas foram mais contundentes do que os prejuízos ecológicos. Por

ter se originado no ecologismo, a Educação Ambiental é até hoje

compreendida pela maior parte da população, principalmente a urbana,

como algo distante, que diz respeito apenas à preservação da natureza e

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não a questões relacionadas ao cidadão diretamente e sim aos governos, ou

seja, como se não estivesse inserido no meio em que vive. Com a crise

mundial de energia, criou-se o temor que os recursos naturais se

esgotassem, e com isso, diversos movimentos a favor da preservação

ambiental surgiram no contexto internacional.

A Educação Ambiental não é mais vista como uma forma de apenas ensinar

as pessoas a preservarem a natureza ou não poluírem o meio ambiente.

Desta forma, a questão ambiental por práticas do cotidiano de qualquer um

de nós, como por exemplo, o simples lançamento de uma embalagem

descartada no meio da rua, que pode ir na primeira chuva, juntamente com

outros detritos, obstruir o escoamento das águas pluviais, causando morte e

destruição. Entendemos hoje por meio ambiente todos os espaços aos quais

estamos inseridos, sejam urbanos, rurais, naturais, nossas casas, nossa

escola, enfim, qualquer ambiente com a qual venhamos a interagir (Leite,

2003). Reforçando este princípio, Carvalho (1992) afirma que:

“Entendendo o meio ambiente como o espaço comum, de

convivência, onde afetamos as Ações que se dão na esfera pública

e somos afetados por elas, meio ambiente, política e cidadania

estão absolutamente ligados.” (Carvalho, 1992)

No que se refere à Educação Ambiental, o meio ambiente é apresentado

como tema transversal, ou seja, incorporado a diferentes disciplinas nos

Parâmetros Curriculares Nacionais. O grande problema é que para isso é

necessário que o individuo tenha acesso a escola, o que nem sempre

ocorre. Não cabe aqui negar a importância da educação formal, apenas é

levantada a hipótese de que os programas de educação ambiental deveriam

atingir, de forma eficiente, o seu objetivo final, ou seja, construir novas

relações entre o individuo e o ambiente, alterando alguns paradigmas

culturais e padrões de comportamento, sem estar preso a um sistema

didático formal.

Quando a Educação Ambiental é proposta para se alcançar o ideal de

sociedades sustentáveis, é necessária a formação de novos agentes

multiplicadores para a construção de uma cidadania ambiental (Unesco-

Unep, 1998; Tilbury, 1992; Fien & Rawling, 1996). Para isto é fundamental

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que se reúnam profissionais de diversas áreas do conhecimento

incentivando a construção de uma rede de saberes capaz de articular

informações direcionadas para a compreensão da educação de cunho

ambiental de forma mais ampla (Reigota, 1999).

Como o Design e o designer podem se apropriar dos meios de comunicação,

das novas mídias e da tecnologia para se formular novas metodologias de

aprendizagem e leitura, estimulando conseqüentemente, a germinação de

uma nova relação entre os indivíduos e o meio?

Aplicando o Design e a Comunicação em Educação Ambiental

O Design, que surgiu em plena era da Revolução Industrial (Pevsner, 1996;

Denis, 2000) é uma peça determinante no processo de revisão da relação

do homem com o meio em que vive, já que ele depende da produção

industrial para existir e a indústria depende das matérias-primas e dos

recursos naturais para também existir.

Ao partirmos para a Comunicação visual, considerando que a decodificação

icônica, a leitura de “mensagens” passa, no contexto de uma sociedade pós-

moderna, pelo que “representa” o bem de consumo, pela “tradução” do que

seria um estilo de vida, podemos afirmar, baseado no que dizem Green &

Bigum (1995) que a mídia é cada vez mais presente no processo de

escolarização e aprendizagem. O Design, no que concerne a Comunicação

Visual, é fundamental para conferir sentido estético ao consumo. É através

da estética imposta pela sociedade de consumo que o individuo constitui sua

subjetividade, à partir do seus estereótipos, que determinam que os

“diferentes” convivam tentando serem iguais entre si (Canclini, 2001;

Castro, 1998). A conexão entre as novas tecnologias, a Comunicação e suas

mídias, que são partilhadas com o Design, pode ser um caminho para a

reorganização da formação escolar, dentro a realidade multicultural que

vivemos (Candau, 2000). Desta forma, podemos considerar uma nova

função para o papel da Comunicação que não seja o de apenas transformar

os atores sociais envolvidos – crianças e jovens - em meros modelos ideais

de consumidores, aos quais só é permitido a persuasão para a aquisição de

bens de consumo e não o questionamento da subjetividade do ato de

consumir (Pereira, 2000; Castro, op.cit; Baudrillard, 1985).

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Os meios de comunicação sempre foram utilizados para a transmissão de

mensagens e por diversas vezes foram ajustados para servir aos interesses

das classes dominantes dando identidade a movimentos políticos e

econômicos – vide o fascismo e o nazismo – como muito bem identificou

Benjamim (1985). No entanto, a indústria cultural vai muito além da função

de entretenimento e os espaços de conhecimento aqui abordados – Design,

Comunicação e Educação – estão intimamente ligados a essa “indústria”. O

que está sendo proposto é a apropriação destes bens culturais de forma

positiva (sem com isso fazer a defesa de discurso integrado) e a serviço do

estabelecimento de novas relações sociais entre o culto e o popular, entre

dominadores e dominados e entre o homem e o seu meio. Barbero (2003)

apresenta diversos exemplos na América Latina – cinema no México; o

rádioteatro na Argentina; música no Brasil -, onde os bens culturais foram

deslocados, de meios para mediações, pelas massas. Esta transição do uso

dos meios pela massa, quando esta adere (ou é aderida) à engrenagem da

industrial cultural e de consumo, revela como as massas resignificam o

relacionamento com a estrutura para o seu dentro de seu olhar, sob a sua

própria ótica, driblando espontaneamente a manipulação. Este processo é

que nos incentiva a pensar de como podemos transformar estes

mecanismos de dominação para que estejam também a serviço da

Educação, mais especificamente da Educação Ambiental.

O processo educativo há muito extrapola o ambiente escolar tradicional,

já que o indivíduo tem a sua formação baseada na diversidade cultural, a de

consumo e a escolar. A primeira vista, a cultura escolar é conflitante com as

culturas não escolares, e é na diluição deste aparente contraste que o

Design, agregando os meios partilhados com a Comunicação pode atuar

como mediador na construção do desenvolvimento de uma cultura de

responsabilidade ambiental, procurando ser um mecanismo modificador e

de formação de novos conceitos relativos à melhoria da qualidade de vida,

através de uma reestruturação dos contatos entre o homem e o meio.

Essas considerações legitimam que se tomem iniciativas de revisão do que

se tem produzido em design gráfico para a Educação Ambiental, abrindo

também alianças interdisciplinares com outras áreas do saber como a

Comunicação Social e a Educação. O campo é muito abrangente e o público

alvo mais ainda, portanto é necessário que qualquer empreendimento em

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Educação Ambiental, seja precedido de em estudo que levante as

informações necessárias para o êxito das ações. Não se deve negligenciar a

capacidade de apreensão de informação do receptor da mensagem,

aplicando modelos pré-concebidos de transmissão de conhecimento,

relegando o aspecto educativo e comunicacional a um segundo plano (Leite,

2002).

Ainda com relação ao alfabetismo visual, existem outros autores

(principalmente os da linha de pensamento da Escola de Frankfurt) que

criticam veementemente a eficácia da comunicação visual e dos meios de

comunicação como instrumentos possíveis e legítimos de educação e

cultura, por julgarem que os mesmos estão a serviço das classes

dominantes. Giroux (1997) chega afirmar que a cultura visual contribui

significativamente para o analfabetismo e para a aculturação do ponto de

vista do alfabetismo verbal e formal. Já Defleur e Ball-Rokeach (1993)

consideram que os meios de comunicação de massa podem persuadir o

receptor das mensagens, sobretudo quando estas forem dirigidas a

aquisição de bens de consumo, porém, estes mesmos meios são filtrados

pelo receptor no que concerne à aquisição de conhecimento e a alterações

de paradigmas comportamentais e cognitivos. Desta forma, entende-se que

o receptor não é um mero agente passivo e manipulável da ação, a não ser

que ele se permita a isso.

Alguns outros autores como Canclini, (1998 e 1999); Sarlo, (1997) e

Barbero, (op.cit.), vão mais além, defendendo que os meios de comunicação

de massa são, hoje, hegemônicos e acessíveis a todas as camadas e os

valores transmitidos pelas mensagens, através dos meios de comunicação e

da mídia, não são impostos às camadas menos privilegiadas

economicamente, mas sim consumidos por elas à sua maneira. Por

exemplo, as telenovelas podem não ser o modelo mais adequado para se

tratar de literatura, mas é inegável que este tipo de entretenimento alcança

a todas as camadas sociais e temos exemplos de programas que seguem a

mesma linha narrativa que adaptaram clássicos da literatura que só foram

conhecidos por algumas camadas da população através deste gênero de

programa, sem contar com programas de alfabetização e ensino que

utilizam a televisão como veículo. A popularização de alguns bens de

consumo fez com que estas mensagens fossem transmitidas a estas

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camadas, que estariam hipoteticamente excluídas do processo de aquisição

de conhecimento por estes bens, e fossem transformadas e resignificadas

por eles, trazendo novos valores a sua realidade econômica, social, cultural

e estética. A troca entre o emissor e o receptor sob a ótica da educação é

bem sintetizada por Paulo Freire (1987) quando diz que ‘Ninguém educa

ninguém - ninguém se educa a si mesmo - os homens se educam entre si,

mediatizados pelo mundo’. Todos esses exemplos teóricos só me fazem

comprovar que a prática da Educação Ambiental não precisa estar atrelada

e nem tolhida por materiais didáticos limitados a formatos e suportes

impressos como livros e cartilhas, apesar de toda a importância que os

mesmos tem para a Educação, mas que podem ser utilizados outros

suportes e outras mídias que façam o mesmo papel que o livro, ou seja,

informar, acrescentar, trocar, formar e enriquecer o individuo.

No âmbito da produção industrial o design pode atuar também no uso de

matérias – primas que sejam absorvidas pelo ambiente ou recicladas após o

descarte, no uso consciente destes mesmos recursos naturais para se evitar

o desperdício, bem como investir na filosofia da qualidade de vida

priorizando-a sobre o volume de produção (Denis, 2000)

O caso da Hidroelétrica de Manso.

Figueiredo (2002) descreve o estudo de caso do Programa de Comunicação

Comunitária integrante do Projeto Básico Ambiental para a instalação da

Hidroelétrica de Manso em Mato Grosso. O referido programa utilizou

diversos métodos não formais para fazer a ligação entre a Comunicação

Comunitária, a Comunicação Visual, a Educação Ambiental e a comunidade.

Dentre estes métodos podemos destacar as oficinas que foram idealizadas

para o programa.

Figura1: Oficina de criação para jornal entre as crianças da comunidade.

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A oficina de TV Comunitária trabalhou a capacitação em produção de vídeo

usando essa linguagem como ferramenta de expressão e comunicação entre

as comunidades, com o objetivo principal de fortalecer a autonomia, a

articulação e a participação popular através da construção de sua própria

linguagem. A linguagem audiovisual foi uma grande novidade na vida de

muitas pessoas dessas comunidades. Algumas sequer possuíam televisão

em suas casas, antes de mudarem para os assentamentos, pois não havia

energia elétrica. Essa atividade permitiu a construção de um espaço para

que esse público colocasse suas principais questões. Posteriormente, além

da oficina de TV Comunitária, foram implantadas as oficinas de Repórter

Comunitário e de Teatro do Oprimido. Fotografia, desenho em quadrinhos,

diagramação, enfim, uma gama de novos instrumentos foram apresentados

para que esses atores sociais pudessem estabelecer veículos de troca. ‘As

dificuldades técnicas e com a língua portuguesa não representaram um obstáculo

para os repórteres comunitários, pois todos estavam estimulados em aprender cada

vez mais’ (Figueiredo, op.cit.).

Figura2: Oficina de repórteres comunitários adolescentes.

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Esta experiência demonstra que a criatividade e a adoção de metodologias

alternativas e supostamente estranhas ao meio superam algumas

dificuldades e barreiras que podem advir da deficiência de uma formação

educacional tradicional, incluindo o cidadão no processo de transformação

de sua realidade sem que haja perdas de tradições e de culturas.

O educador deve estar atento as novas tecnologias educativas, para que se

utilize delas em prol de uma maior eficácia didática do ensino. As novas

mídias, tão familiares a nós designers, costumam ser vistas com reservas

pelos profissionais de Educação. E mesmo quem procura se relacionar com

essas ferramentas costuma apresentar queixas a respeito da baixa

qualidade de alguns produtos que são veiculados. Estas observações são

procedentes, de acordo com Kenski (1998), mas a autora também

apresenta algumas soluções para minimizar o problema. Uma delas seria a

inserção do educador na formulação dos programas e dos softwares

educativos desde a sua formação acadêmica, capacitando-os para tal. Isso

traria para o profissional um maior embasamento crítico e teórico para o

domínio e o uso de novas tecnologias educacionais.

Conclusão

A contribuição deste artigo foi apenas o levantamento de algumas

referências encontradas na vasta literatura sobre estas áreas do

conhecimento. As características interdisciplinares que permeiam estas

áreas demonstram como as trocas de vivências, saberes e conceitos podem

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ampliar as fronteiras do conhecimento de cada, enriquecendo-se

mutuamente, sem, contudo, perderem as suas identidades e características

especificas. Este intercâmbio de conhecimento em prol da edificação de um

saber comum, só pode ser benéfico para uma melhor compreensão da

Educação e mais especificamente da Educação Ambiental.

Fotos

Gustavo Furtado

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