Cinema IMS-RJ - março de 2012

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FELLINI | INSTITUTO MOREIRA SALLES CINEMA | MARÇO 2012

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Programação de Cinema do IMS-RJ - março de 2012

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FELLINI | INSTITUTO MOREIRA SALLES

CINEMA | MARÇO 2012

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FELLINI SEGUNDO PASOLINI | PASOLINI SEGUNDO FELLINI | UM DIÁLOGO CINEMATOGRÁFICO

Em 1955, Pier Paolo Pasolini (ele acabara de publicar seu primeiro romance, Ragazzi di vita) foi convidado por Federico Fellini (ele acabara de realizar A trapaça / Il bidone) para colaborar no roteiro de seu filme seguinte, As noites de Cabiria.

Pasolini relembrou o primeiro encontro com Fellini na introdução do livro com o roteiro do filme, lançado na Itália em 1957, na coleção Dal soggetto al film. Diz que saíram conversando no carro dele, “eu, um pequeno gato peruano ao lado de um grande gato siamês, escutava”. Enquanto contava a história de Cabiria, Fellini dirigia “como se estivesse se divertindo com um carro de brin-quedo”. Com uma das mãos, “maternal como uma velhota coquete e concen-trado como um alquimista, tocava o volante. Com a outra, enrolava e voltava a enrolar seus cabelos com o dedo indicador”.

Fellini relembrou o encontro numa entrevista publicada na Itália em 1992. Diz que foi como conversar com um irmão mais jovem dono de “um olhar ávido e uma curiosidade inesgotável”. Pasolini aceitou de imediato e com en-tusiasmo a proposta de trabalhar no roteiro de As noites de Cabiria e “desde essa primeira conversa ficamos amigos”. Fellini diz que logo se deu conta de que Pasolini era um criador com um agudo e implacável senso crítico – “uma qualidade que me falta completamente”. Enquanto cria “parte do cérebro de Pasolini trabalha como um laboratório crítico, atento ao que o artista cria”.

A feitura do roteiro de As noites de Cabiria (em colaboração com Tullio Pinelli e Ennio Flaiano) levou Pasolini a concluir que a força do cinema de Fellini se deve ao fato de seu processo de criação obedecer mais ao instinto que à consciência. “A realidade de Fellini é um mundo misterioso – ou horrivelmen-te ameaçador ou perdidamente doce – e o homem de Fellini é uma criatura igualmente misteriosa que vive à mercê desse horror e dessa doçura. Gelsomi-na era assim, e também, e de uma maneira muito mais poética, Cabiria é assim (...) Fellini é uma savana cheia de areias movediças, para entrar nela é preciso ou o guia negro da descrença ou o explorador claro da racionalidade: mas nem um nem outro são suficientes. O território continuaria inexplorado se Fellini não enviasse, distraidamente, como ao acaso, para guiar-nos, um pássaro má-gico, um grilo falante, uma borboleta pascoliana.” 1

Depois de As noites de Cabiria Fellini e Pasolini voltaram a trabalhar juntos, no roteiro de Viagem com Anita (Viaggio con Anita), baseado num argumento de de Tullio Pinelli, projeto não realizado, e no roteiro de A doce vida (La

1. Referência a Giovanni Pascoli, autor,

entre outros poemas, de I gelsomino notturno

(E s’aprono i fiori notturni, / nell ’ora che penso

a’ miei cari. / Sono apparse in mezzo ai viburni / le

farfalle crepuscolari ) A poesia de Pascoli foi

tema da tese de mestrado de Pasolini em 1945,

Antologia della lirica pascoliana.

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Pier Paolo PasoliniFederico Fellini

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Dolce vita) – Pasolini escreveu as cenas do intelectual suicida Steiner, mas seu nome não consta dos créditos porque a ação e o diálogo foram modificados na filmagem. Mais tarde, diante das reações negativas nos jornais italianos na estreia de A doce vida publicou um longo ensaio em defesa do filme (Per me si trata d’un film cattolico em Il Reporter, 23 de fevereiro de 1960): “é uma obra importante demais para que se fale dela assim como se fala de um filme comum”. Importante, entre outras razões, porque anuncia “um novo período caracterizado pela supremacia ou excesso de estilo, um neo-decadentismo”. Para Pasolini, assim como “o neorrealismo cinematográfico se antecipou ao neorrealismo literário”, o “neo-decadentismo felliniano” era uma antecipação de “um período neo-decadente na literatura”. Neo-decadente e católico, pois “a única problemática (ou quase isso) discutida em A doce vida é a relação não dialética entre pecado e inocência – não dialética, que dizer, regida pela graça”. Existe no filme “um irracionalismo católico, de um certo modo ingênuo, qua-se infantil”, porque muitas vezes, “com uma astúcia diabólica”, Fellini cede a palavra à criança que existe dentro dele. Diz em seguida que, profundamente emocionado com A doce vida, não se lembra de ter visto outro filme em que os personagens se encontrem tão fortemente impregnados de uma alegria de viver – “mesmo os momentos dolorosos, as tragédias, são representados como fenômenos carregados de vitalidade, como espetáculos”. Todos os persona-gens são “puros e cheios de vida”, aparecem apenas “em momentos em que transbordam uma energia quase sagrada (...) Não existe no filme um único personagem triste, digno de pena. Todo mundo é belo, todo mundo é gentil, embora nada funcione”.

Ainda em 1960, Fellini se associa a Angelo Rizzoli para produzir o primeiro filme de Pasolini, mas se retira do projeto no meio da filmagem. Concluído pelo produtor Alfredo Bini (Bernardo Bertolucci também participou da pro-dução), e pronto para exibição, Accattone foi proibido pela censura em outubro de 1961. Fellini, ao lado de Pasolini, participou de um debate público para exigir a liberação do filme. Depois disso não voltaram a trabalhar juntos, mas voltaram a conversar, de forma indireta, em pelo menos duas outras ocasiões, por meio de filmes – curiosamente, dois filmes sobre a realização de um filme: em La ricota, de Pasolini, os personagens preparam um filme sobre o catolicis-mo arcaico; em Tobby Dammit, de Fellini, os personagens preparam o primeiro western católico da história do cinema.

No filme de Pasolini, episódio do longa-metragem Rogopag,1 o diretor de ci-nema interpretado por Orson Welles responde à pergunta de um jornalista (“o que o senhor pensa do grande diretor italiano Federico Fellini?”) com uma re-

1. Rogopag (1963), produção italiana em quatro episódios com título formado pelas

iniciais dos sobrenomes dos realizadores,

Roberto Rosselini, (Castidade /Illibatezza )

Jean-Luc Godard (O novo mundo / Il nuovo mondo),

Pier Paolo Pasolini (A ricota / La ricota)

e Ugo Gregoretti (Frango do quintal /

Il pollo ruspante).

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ticência irônica: “Ele dança” – diz; e depois de um breve silêncio marcado por uma contração das sobrancelhas, repete: “Ele dança”. Antes que o jornalista se retire, o diretor abre um livro (na capa, o título do segundo filme de Pasolini, Mamma Roma) e lê um poema (“eu sou uma força do passado. Só na tradição o meu amor reside”) do próprio Pasolini (“E eu, feto adulto, perambulo / Mais mo-derno que todos os modernos / À procura de irmãos que não existem mais”). No fil-me de Fellini, episódio do longa metragem Histórias extraordinárias (Histoires extraordinaires,1968) o assistente especial de direção interpretado por Salvo Randone resume a história do primeiro western católico do cinema para o ator Tobby Dammit interpretado por Terence Stamp: é a história de Jesus Cristo que volta à terra como um cowboy para salvar os homens. Será filmado, explica, à maneira de Pasolini, em pouco cenários e com poucos recursos. O primeiro western católico será um meio termo entre Pasolini e John Ford.

Nos anos seguintes, Pasolini continuou analisando Fellini, em textos sobre Roma, (“o melhor de seus filmes porque ele teve a coragem de destruir o perso-nagem: resta uma poeira de personagens, pequenas sombras da vida”) e Amar-cord (“onde estão os grandes movimentos de câmera que avançavam entre os personagens, chegava ao primeiro plano de um ou se afastava de todos para mostrar a totalidade? Em Amarcord quase todos os planos são fixos, quer dizer, o filme cede a palavra às coisas”). E Fellini continuou sonhando com Pasolini – em Il libro dei sogni, estão anotados pelo menos cinco sonhos com Pasolini, dois deles especialmente significativos, entre outros motivos porque sonhados em 1977, dois anos depois da morte de Pasolini.

No primeiro sonho, 6 de junho, a anotação está na página 336 do livro dos sonhos, alguém cantava “a morte também é vida” – era uma canção de O tro-vador de Verdi, diziam no sonho. Pasolini fazia um pequeno papel no filme que Fellini dirigia. Durante a filmagem ele tinha sido todo o tempo gentil e simpático. Era a cena final. Fellini pensou que o trabalho estava terminado, Pasolini já ia para casa quando ele se lembrou que queria filmar ainda um pri-meiro plano dele. Teria de fazer isso no dia seguinte. E então, Fellini está no carro com Pasolini e um pega na mão do outro de brincadeira. Pasolini olha os muros da Roma antiga pela janela do carro e pergunta: “como conseguir des-crever essas ruínas extraordinárias?” Com um sorriso melancólico, cantarola: “è la vita anche la morte”. Fellini desperta com a música nos ouvidos. “O verso misterioso mas de significado cristalino” – a morte também é vida. Em seu livro dos sonhos, conclui a descrição do que sonhara com uma pergunta: “seria a cena final do filme?”

2. Histórias extraordinárias (1968) filme francês em três episódios baseados em contos de Edgar Allan Poe: Tobby Dammit de Fellini, William Wilson de Louis Malle e Metzengerstein de Roger Vadim.

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O segundo sonho, 26 de setembro, está anotado na página 340 do livro dos sonhos. Fellini sonhou que estava na casa de Pasolini com um aperto no cora-ção, porque sabia que Pasolini fora condenado à morte. Ele era acusado de ter assasinado um amigo, o “diretor”, mas Fellini está convencido de que isso não é verdade. Ele se surpreende com a calma de Pasolini, que, em tom de brin-cadeira, pergunta como está a saúde dele, como anda a atividade sexual dele. Fellini responde que está bem, que está cheio de vitaminas. Pasolini, com um sorriso doce, pergunta porque ele não bota algumas dessas vitaminas em seu “Agnese”, um texto que ele havia escrito e queria que Fellini adaptasse para o cinema. Muito angustiado com a possibilidade de Pasolini ser executado de uma hora para outra, Fellini diz com lágrimas nos olhos que era preciso pedir clemência ao Presidente, mas sabe que as regras e os labirintos da burocracia não deixam saída. Ele se senta numa cadeira ao lado de Pasolini, mas o cachor-ro dele começa a latir e ele se senta no chão. Pasolini explica que o cachorro é o dono daquela cadeira. O cachorro pula para a cadeira e fica sentado lá. O sonho acaba com Fellini e Pasolini sentados no chão do quarto modesto, em silêncio, tranquilos.

“Vivenciava tudo de modo desesperado e intenso. Daí seu exemplo ser o mais pertinente, o mais heroico, o mais trágico” – disse Fellini sobre Pasolini.

“Possui uma reserva infinita de amor pelo mundo tal como percebido pelo olhar e assim consegue esses enquadramentos mágicos que nos dão a sensação de imagens em três dimensões: até mesmo o ar é fotografado” – disse Pasolini sobre Fellini.

Pasolini e Fellini, durante a filmagem de As noites de Cabíria

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A cidade das mulheresMarcello Mastroianni e Anita Ekberg: A doce vida

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SONHADORES DO MUNDO TODO, UNI-VOS | JOSÉ CARLOS AVELLAR

E la nave va... Na cena, duas moças no convés do navio se encantam com a luz do entardecer, o sol cortado ao meio pela linha do horizonte, parte dele ainda no céu, parte dele já dentro do mar. No cinema, no convés com as moças, o es-pectador se encanta com outra coisa, com os materiais usados para representar o entardecer. Os materiais da representação aparecem mais que a paisagem representada. Quem vê a imagem se dá conta de duas atrizes num estrado de madeira, sobre um tapete de plástico enrugado que cobre o chão frente a uma parede lisa e alta, metade cinza metade azul claro. No pé da parede, no centro, um meio disco vermelho-alaranjado. O tapete se mexe, agitado por um mecanismo qualquer, a luz cai mais forte sobre o meio disco. Brilha o falso sol, brilha o plástico enrugado. Nada é como um entardecer de verdade, mas tudo sugere, critica, sonha, caricatura um entardecer de verdade. Uma das moças no convés comenta que a tarde está tão bonita que até parece de mentira.

A cidade das mulheres. Um grupo de jovens entra num cinema ou no quarto da casa, para dormir. Impossível saber ao certo. Na parede do fundo da sala temos uma tela e do outro lado a janela pequenina de uma cabine de projeção, como num cinema. Mas na plateia, em lugar de poltronas, uma enorme cama com dois grandes travesseiros e uma ampla coberta. Apaga-se a luz. Satisfeitos, todos batem palmas e se preparam para o filme ou para o sonho: Deitam-se, cobrem-se, arregalam os olhos. Na cabine a luz do projetor se acende.

No espaço entre uma e outra destas cenas, o cinema de Federico Fellini: seus filmes reinventam a aparência primeira da realidade, para reorganizá-la como se ela fosse um sonho. Partem às vezes de dados autobiográficos, de situações que ele viveu ou presenciou. Mas ao contar o acontecido, ele mente, exagera, delira. Seu cinema sai do neorrealismo italiano, do registro direto e quase do-cumental, para uma outra expressão bem italiana: a fantasia solta da ópera.

O sonho, nos primeiros filmes, estava mais perto da aparência neorrealista. A câmera era uma observadora atenta de personagens que sonhavam acordados – como, por exemplo, a jovem esposa de Lo Sceicco Bianco (entre nós, Abismo de um sonho, 1952): na viagem de lua de mel, ela sai às escondidas para ver o herói de seus sonhos, o Sheik Branco das fotonovelas. Ou como a Gelsomina de A estrada da vida (La strada, 1954) sonhadora de olhos sempre muito abertos para ver o que não encontra à sua volta, um mundo sem violência. Ou ainda como a ingênua prostituta de As noites de Cabíria (Le notti di Cabiria, 1957) que pede a sua santa padroeira um milagre que a faça mudar de vida. Depois

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de ver esta muita gente que sonha acordada, a câmera de Fellini começou ela mesma a sonhar de olhos abertos. Em As tentações do Doutor Antônio (Le ten-tazioni del Dottor Antonio, 1962) dá vida ao cartaz diante da janela do puritano Doutor Antônio: Anita Ekberg, seios enormes pulando fora do decote, para ilustrar a frase “beba mais leite”. Em Amarcord (Amarcord, 1974) pendura-se com o tio louco no alto da árvore para gritar com ele “voglio una donna” ou se deixa ficar com o avô, assustado, no meio do nevoeiro, sem ver nada, porque o mundo foi embora, ou então aperta ainda mais a cara do jovem Titta, já quase esmagado pelos imensos seios da Gradisca. Em Oito e meio (Otto e mezzo, 1963) dá vida ao sonho de Guido Anselmi, uma casa feita só de cozinha e de quarto de dormir e povoada por todas as mulheres do mundo: a tia, as primas, a professora, a enfermeira, a prostituta, a estrela de cinema, a mãe, a irmã, a esposa, a amante. E delira mais e mais, até chegar ao mar de plástico e ao sol vermelho-alaranjado na parede.

“Meus filmes empregam a linguagem dos sonhos. Nos sonhos guardamos e recriamos as experiências do cotidiano.Tinha nove anos, foi num circo em Paris: um palhaço com copos de água e de vinho. Ele começou a beber e a fingir que ia ficando bêbado, cambaleava, parecia que ia embora, e de repente voltou. Começou a tocar com os dedos nas bordas dos copos a música que os dois Rubetti tocam no filme – um fragmento de Schubert. Revi tudo isto num sonho, resolvi incluir no filme. Dou muita atenção aos sonhos porque eles são o primeiro sinal que recebo de um filme. Um indício, uma suspeita de um filme que talvez venha a ser feito. Daí em diante é seguir o longo ritual que prepara um filme, para ver se consigo dar forma concreta ao sonho.”

Fellini começou a fazer cinema com o Neorrealismo, a partir de um encontro com Roberto Rossellini. Na verdade começou um pouco antes, com situações cômicas escritas entre 1939 e 1943 para filmes de Mário Matolli (entre eles: Lo vedi come sei, 1939; Il pirato sono io, 1940; L’ultima carrozzella, 1943). Ou talvez antes: o cinema começou para ele com o desenho, com as caricaturas de gente de cinema para jornais e para a revista Cinemagazzino. O que come-çou com desenho, seguiu com desenho: ele continuou a fazer caricaturas para pensar seus filmes antes de filmá-los. O encontro com Rosselini foi na loja de desenhos de Fellini, a Bottega della Faccia Buffa, a Funny Face Shop :

“Caricaturas, retratos, ‘very similar profiles’, ‘records with your voices’. Eu era o diretor artístico de toda a barraca (...) havia uma atmosfera de filmes wes-

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tern, algo entre o saloon e a sala de espera de uma casa de encontros. Fazia desenho dos soldados americanos, ingleses e canadenses em Roma. Um dia, conta, “eu desenhava um soldado chinês quando vi Rossellini aparecer na Bottega. Pálido, com seu queixo aguçado, o chapéu frouxo de um lado, che-gou bonzinho, curioso, com ar de quem estava refletindo. Talvez estivesse pensando se lhe convinha tornar-se meu sócio na loja ou permanecer fiel ao propósito que o havia conduzido a mim, convidar-me a trabalhar com Sergio Amidei num curta-metragem sobre a vida de Don Morosini, os primeiros traços de Roma, cidade aberta (Roma,città aperta, 1945) Colocou-se às minhas costas e começou a fazer sinais de aprovação para o chinês como para ante-cipar que o retrato estava saindo bem. E ali mesmo, enquanto eu desenhava, sem parar de balançar a cabeça como quem aprova o desenho, perguntou-me se eu não queria colaborar com ele no roteiro de um filme sobre Don Moro-sini. O cinema me parecia uma coisa remota, muito longe do alcance de nós, italianos. Cinema, para todo mundo, era Fred Astaire, Gary Cooper, Cra-wford ou Harlow. Acho que comecei a dizer isso, mas Rosselini continuou a bisbilhotar sobre minhas costas e a insistir no convite. Não me lembro como continuou a conversa. Só me lembro que, terminado o desenho, o chinês pulou como um gato sobre o balcão com uma navalha na mão aos gritos: “I’m not yellow! I’m not yellow!” E lembro de Rosselini que tentava tranqüilizar o chinês, “You not yellow! It’s true, You not yellow”, e do chinês que gritava ainda mais forte: “He made me yellow!”, e lembro bem de Rosselini me aconselhar: “faz o cara rosa! Não tem aí pouco de rosa?”. Em suma, por sorte chegaram dois policiais que desarmaram o chinês.”

Desta primeira colaboração, como roteirista e assistente de direção, seguiram--se outras com Rossellini (Paisà, 1946; Il miracolo, 1948; Francesco Giullare de Dio, 1950; Europa 51, 1952). E colaborações como roteirista para Pietro Germi (In Nome della Legge, 1948; Il Camino della Speranza, 1950; La Città si Difende, 1951) e para Alberto Lattuada (Il delitto di Giovanni Episcopo, 1946). Logo depois ao acompanhar a filmagem de Paisà (1946 ) percebe que “a babel de vozes, reclamações, gruas, refletores, megafones e toda a maquinária da fil-magem era apenas uma moldura barulhenta do espaço aberto em que o artista compõe suas imagens”. Ao ver Rossellini trabalhar ele descobre, “pela primeira vez, com repentina clareza, que era possível fazer cinema com o mesmo re-lacionamento particular, direto, imediato com o qual um escritor escreve ou um pintor pinta (...) Se o cinema era isso, se podia ser feito daquela maneira desenvolta e desajuizada, se podia ser vivido como um happening contínuo entre a vida e a representação da vida, então era como se me pertencesse ainda

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mais, como se fosse desenhar ou escrever, com os mesmos incômodos, fadigas, tentativas que devem ser enfrentadas para se chegar à ideia que temos na ca-beça”. E então, escreve para Alberto Lattuada (Il mulino del Pò, 1949), divide com Lattuada a direção de Mulheres e luzes (Luci del varietà, 1950) e dois anos depois estreia como diretor, Lo Sceicco Bianco, a partir de um argumento escrito com a colaboração de Michelangelo Antonioni. Começa então um meticuloso trabalho de engenharia para armar uma ponte que, saindo do neorrealismo, do registro tão fiel quanto possível da realidade imediatamente visível, levasse à fantasia tão solta quanto a que provoca nas duas moças no convés do navio a exclamação de que o entardecer, de tão belo que estava, até parecia de mentira.

“Nós cineastas somos questionados a todo instante, como se fôssemos pro-fetas, políticos, ou chefes de uma igreja“, disse certa vez, para reafirmar que é impossível explicar como se faz um filme. “Por que desenho os personagens? Por que faço notas gráficas dos rostos, narizes, dos queixos, das gravatas, das sacolas, das roupas e do modo de cruzar as pernas das pessoas que me pro-curam no escritório? Talvez tudo isto seja um modo de olhar um filme cara a cara, tentar descobrir que filme é esse ainda indefinido na cabeça. É uma tentativa de fixar uma qualquer coisa. Não sei. A verdade é que não consigo teorizar os meus vários tiques. Eles formam um ritual que me acompanha em meu trabalho. Rituais são importante. Os rituais da existência – o batismo, o casamento, o funeral, a primeira comunhão, o Natal, os diplomas, os aniver-sários –, quase todos, perderam o seu simbolismo. Eles se desgastaram porque foram vividos distraidamente, sem respeito, com pouco tempo e com pouca emoção. O rito e a cerimônia são uma representação, logo uma meditação, um meio menos perigoso de entrar em contato com a realidade, uma espécie de proteção, uma armadura. Nada mais estúpido e triste que um ritual vazio. Muitos de meus filmes são sobre o grotesco e o agressivo de um ritual vazio, mas Todos eles são precedidos por um longo ritual de preparação”.

Desenhos, anotações de sonhos, lembranças mais ou menos imprecisas apa-nhadas no fundo da memória, delírios, caricaturas de pessoas encontradas ao acaso – estes os materiais usados para compor a representação, este o ritual que permite um melhor contato com a realidade. Quando tudo isto se monta harmoniosamente se opera então o milagre de um filme, comenta Fellini. Um milagre semelhante ao que ocorre quando os diferentes músicos de uma or-questra se reúnem para fazer música.

“Cada um deles chega carregando seu instrumento e carregando também seus problemas pessoais. Cada um com seu mau humor, sua doença, seu rá-

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dio de pilha para ouvir o futebol. E à custa de repetidos ensaios, chega-se a fundir aquela massa heterogênea numa forma única, abstrata mesmo, que é a música. Essa operação de ordenação da desordem sempre provocou em mim uma grande emoção”.

Ordenar a desordem, desorganizar a ordem. O cinema de Fellini segue mais ou menos este caminho, procura montar numa expressão coerente as muitas sensações que nascem do que ele chama de nossa zona obscura sem submetê--las ao julgamento de “uma espécie de tribunal da racionalidade, onde tende-mos a analisar, diagnosticar, compreender o que é indecifrável”. Assim, quando em Amarcord, na porta do hospício o pai de Tita procura um enfermeiro para saber da saúde mental de seu irmão Teo, que ele viera buscar para um passeio com o resto da família. “Está bem, muito bem. Normal” – responde o enfer-meiro, e diante da insistência na pergunta repete: “Normal. Não está menos normal que as pessoas que vivem fora do hospício”. Durante o passeio, o nor-mal tio Teo pára na estrada para urinar e esquece de desabotoar a calça. Sobe numa árvore e se recusa a descer, joga pedras nos que tentam se aproximar.

Amarcord é tanto uma recordação da província em que Fellini nasceu quan-to de uma outra, parecida com aquela mas livremente inventada por ele em filmes anteriores; um novo encontro com personagens que fazem parte da família cinematográfica do diretor, uma família que pode ser definida com a mesma palavra usada pelo enfermeiro para caracterizar o comportamento do tio de Tita: Normal. Não são menos loucos que as pessoas que vivem no hospício. Quando as pequenas extravagâncias do tio Teo surgem na tela, um pouco depois da metade do filme, não parecem um sinal de loucura, mas um comportamento integrado às particulares convenções gerais da província dos familiares e conhecidos de Fellini.

O magro tio Teo que sobe numa árvore à procura de uma mulher não difere muito da gorda proprietária da tabacaria que baixa a porta da loja, e logo de-pois a blusa, para oferecer o imenso seio ao pequenino Tita. Não difere muito do desajeitado Biscein, que afirma ter feito amor com trinta mulheres numa só noite. Nem difere dos garotos que se masturbam com o pensamento em artistas de cinema ou nas garotas da cidade. Nem diferem da prostituta que sonha com a chegada de Gary Cooper à cidade para casar-se com ele e mudar de vida. A normalidade especial do tio Teo, que joga pedras nas pessoas, é in-gênua e humana – nada a ver com a fúria estúpida e ridículamente bem disci-plinada da parada fascista, com enormes retratos de Mussolini feitos de flores. As pedras são mais delicadas e humanas que as flores e os frascos de óleo de rí-

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cino enfiados goela abaixo contra as vozes em desacordo com o fascismo. Uma província como essa caricaturada aqui talvez tenha mesmo existido, com seus Teos, seus Biscein e suas tabacarias de mulheres gordas. Estas personagens e histórias podem ter ocorrido de verdade, mas Amarcord importa não como reconstituição do que ocorreu em algum momento no passado e sim como a projeção do que ocorre hoje, na memória, na lembrança, no imaginário, no presente do realizador.

Na memória, a visita do líder fascista à província é um episódio central, como se esse pesadelo tragicômico fosse a imagem essencial, o ponto de partida para a invenção desse filme onde o diretor sugere que na vida contemporâ-nea persiste algo da província de outrora e que nesse extemporâneo ambiente provinciano o fantasma do fascismo reaparece para uma visita. O grotesco desta aparição comanda o episódio. Na cena predomina o gesto infantil para assinalar que a violência maior aqui resulta do fato desta volta do fascismo ter algo a ver com uma negação da maturidade. Nesta província em que o normal é ser criança, as pessoas se submetem quase sem resistência a um po-der que esconde sua brutalidade por trás de uma aparência bufa, circense. Os personagens centrais se encontram todos em cena na visita do líder fascista: professores, alunos, autoridades, advogados, prostitutas – cada um deles com suas pequenas normalidades:

“Até então seus tiques pareciam inofensivos, mas reunidos nesta festa ga-nham um sentido diferente e me parecem uma demonstração clara de estu-pidez total”.

É como se a vida na Itália fosse uma volta à província, um retorno “à falta de informação, à ignorância dos problemas concretos e reais, à recusa de co-nhecer as coisas da vida por preguiça, preconceito, comodidade ou vaidade”. Uma volta às loucuras inofensivas de Os boas vidas (I Vittelloni, 1953) e Oito e meio (Otto e mezzo, 1963) e à violência do fascismo de Roma (Fellini Roma, 1972). Tal como outros cineastas europeus (Ingmar Bergman, por exemplo) Fellini transpõe personagens e temas de um filme para outro, levados talvez pela vontade de examinar a questão de múltiplos pontos de vista. O titulo, que ele insiste ter escolhido pela sonoridade e não pelo significado, soa próximo de eu me recordo (Pasolini observou num texto sobre o roteiro e sobre a sua concretização em filme, que o “eu” aqui é sentido pelo espectador, chamado a participar como cúmplice da cena, como um “nos”, nós nos recordamos, é o significado de amarcord para ele). Amarcord é uma espécie de (auto) retrato de Fellini quando jovem. É mais do que provável: a história possui verdadeiras

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lembranças da infância do diretor, mas desde seu título, desde a palavra que não existe, que foi inventada para dizer algo parecido com eu me recordo, desde aí o filme sugere que o objetivo é lembrar-se de algo que não aconteceu. Fellini pode ter vivido enquanto criança numa província e num tempo pare-cido com o da cidade em que vivem os personagens de seu filme, mas como agora vive no cinema, ele adulto se encontra numa realidade-outra em que a memória pode ser livremente inventada, em que existe a possibilidade de uma lembrança sem que exista algo para ser lembrado, inventar algo naquele exa-to instante para existir exclusivamente como uma recordação: Amarcord, uma espécie de memória do que vai acontecer daqui a pouco, uma lembrança an-tecipada de amanhã. No filme, sim, existem lembranças da infância e adoles-cência do realizador, mas não como se ele tivesse ido buscar documentos para refrescar a memória – ao contrário, ele possivelmente procurou esquecer o fato acontecido para criar dele uma nova memória cinematográfica. Inventou uma ficção, não uma reconstituição, não um documento. Não os fatos como eles efetivamente existiram, mas talvez como foram fantasiados na memória, numa realidade delirada, corrigida, criticada, reinventada pela imaginação: a imagem é mais uma reflexão do que um reflexo – uma reflexão meio caricaturada tal-vez, uma reflexão do tio Teo.

Para o diretor, o que importa não é a luz do sol, mas a caricatura de luz do sol criada em estúdio. Não um real nevoeiro, o mar, uma árvore, um transatlântico de verdade, mas cenários, efeitos mecânicos e os truques fotográficos capazes de criar uma ilusão que não imita mas deforma realidade, que, exatamente porque percebida como uma ilusão, se mostra numa certa medida mais real que um direto registro fotográfico.

“Num certo sentido, a expressão pode ser sempre entendida como uma defor-mação, e talvez seja porque a realidade é filtrada, reorganizada na expressão. A arte, como harmonia recortada do caos, deforma, a realidade é deformada pela poesia, pela pintura, pela música - e no cinema, pela luz. A luz surge até antes do argumento. Acredito na luz, e a luz deve ser a exigida pela minha imaginação. Minha luz não será jamais a do sol. Acredito no cinema feito por meio da reconstrução no estúdio da luz do dia e da cor do mar. Reconstruí o mar em Amarcord e nada é mais verdadeiro que este mar feito de dois telões de plástico agitados por maquinistas de boa vontade”.

O som, como a imagem, é livremente desenhado:

“Durante a filmagem peço aos atores para repetirem números ou orações. O som, as falas, acrescento depois, na hora da dublagem, para controlar melhor

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vozes e texto. Não gosto de usar o mesmo ator para a imagem e o som, o rosto e a voz. É importante para mim que o ator tenha uma voz que o torne ainda mais expressivo. Para mim, a dublagem é indispensável, uma operação musical para reforçar o significado das figuras”.

Imagens e sons livremente inventados porque cada pedaço do filme deve aten-der às leis internas do espetáculo cinematográfico, leis determinadas por um impulso semelhante ao que conduz a normalidade do tio Teo, leis que obede-cem à lógica de um sonho.

Fellini definiu certa vez o trabalho de criação artística como um mecanismo semelhante ao que inventa os sonhos, isto é, as imagens nascem sem controle da razão. Aparentemente ele se encontra agora no que definiu como a segunda fase do trabalho de criação, aquele feito a posterior, onde procuramos as chaves que possam explicar cada um dos signos. Ou então, mais fiel que nunca a seu método de trabalho, recorre aos filmes antigos como ponto de partida para a criação de uma nova memória ou de uma nova ilusão de realidade no estúdio. A matéria-prima já não é o mundo que ele apreende com os olhos, nem mes-mo o que fixou na memória do mundo material, mas a projeção de uma forma artística nesse espaço. Uma livre invenção, feita da fusão do que ele delirou como um visionário sobre o que ele efetivamente viu. Uma invenção até certo ponto semelhante a uma paisagem natural, mas feita de plástico e movida por maquinistas de boa vontade.

Zampanô, Guido, Trimalcione, Steiner, Snaporaz ou o tio Teo; Gelsomina, Cabiria, Saraghina, Gradisca, Luísa, ou a mulher gorda da tabacaria: Fellini conta histórias de personagens que ele viu talvez na rua, talvez em sonhos. Ele já não sabe, ou, o que é mais provável, não quer separar o que viu quando des-perto do que viu em sonhos. Todas essas figuras existem para ele como pessoas vivas, vizinhos, conhecidos, colegas de trabalho. Existem numa dimensão es-pecial, de luzes e sons, e estimulam a brincadeira de fazer um filme, de repetir alegremente a mágica de dar vida a uma sala escura.

“O palco com suas luzes apagadas exerce uma enorme fascinação sobre mim. Imaginar um cenário, maquilar um ator, vesti-lo, estimular seus gestos, são coisas que me dominam de forma absoluta. Sei bem que isto está fora de moda, que parece um modo de fugir da realidade. Sei dos limites, das alie-nações, dos riscos que tudo isto comporta. Mas não conheço outra maneira de me sentir à vontade, tão de acordo comigo mesmo. Só ao fazer cinema. Não sei mesmo distinguir um filme do outro – que dizer, falo de meus filmes. Tenho a sensação de haver filmado sempre a mesma coisa. São imagens, e

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somente imagens, que filmei utilizando o mesmo material. Fui, talvez, soli-citado a cada instante por pressões diferentes, mas usei o mesmo material. O que sei é que obedeço um impulso para fazer um filme. Não digo isto para aparentar modéstia. Francamente, contar histórias me parece a única coisa que vale a pena ser feita. Quando eu realizo um filme me sinto livre, livre de todos os embaraços. Sinto que tenho sorte. Fico feliz ao participar outra vez deste brinquedo chamado cinema”.

Para guardar o cinema de Fellini na memória, o melhor talvez seja ordenar livremente a cena de um de seus filmes com a de um outro, uma em preto e branco ao lado de outra em cores: a dança da gorda Saraghina ao lado do sapateado de Ginger e Fred no estúdio de televisão e do gesto zombeteiro dos boas-vidas para os trabalhadores na estrada, pouco antes do carro enguiçar. A voz alegre das crianças repetindo a palavra mágica Asanisimasa ao lado do res-mungo sussurrado de Anna Magnani (Federico, vá dormir!) e do resmungo mal humorado da funcionária que recebe o diretor em Paris e troca seu nome: (Se-nhor Bellini? Veio ver uns filmes antigos, não é?). A música suave que a orquestra toca só para a aranha balançar a sua teia no teto ao lado da voz do cantor que se propõe a hipnotizar uma galinha com sua música. O Snaporaz que dorme no trem para sonhar com a mulher bonita sentada no banco em frente ao lado do Marcello que não sabe o que fazer com Anitona na Fontana de Trevi. E, sobretudo, montar essas imagens e sons com aquele pedacinho de Otto Mezzo em que Guido Anselmi diz para si mesmo o que gostaria de dizer para todos os amigos: “a vida é uma festa, festejemos todos juntos”.

Marcello Mastroianni: Oito e meio

As vinhetas das páginas anteriores são

desenhos de Fellini feitos durante a

preparação de As noites de Cabíria, Na estrada da vida, Ensaio de orquestra,

E la nave va e Julieta dos espíritos

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“A realidade não se encontra em apenas um sonho, mas em muitos sonhos” – adverte um letreiro no começo de As mil e uma noites (Il fiore delle mille e una notte, de Pier Paolo Paso-lini,1974). Assim, na tela, mil histórias super-postas: a segunda nasce de dentro da primeira, a terceira de dentro da segunda. A paixão de Nuredin e Zumurrud ainda não terminou de ser contada quando um personagem num can-to da cena se transforma no narrador de uma outra história, a de Tifanè e Zeudi, que por sua vez, antes de se concluir, cede lugar para a paixão de Aziz e Aziza que logo se entrelaça com a de Tagi e Dunia, por sua vez cortada para que se inicie a do Príncipe Shazaman.

Esse relato múltiplo parece ter sua origem na última fala de O decamerão (Il Decamerone, 1971), o primeiro filme da Trilogia da vida (o segundo foi Os contos de Canterbury /I racconti di Canterbury, 1972). Na última imagem de O decamerão, o pintor diante da obra terminada, cercado de gente que celebra a conclusão do trabalho, lamenta: “por que realizar uma obra se a verdadeira beleza está em sonhar a obra?” O fato do pintor ser interpretado pelo próprio Pasolini empresta à cena um jeito de trailer de As mil e uma noites: por que concluir o sonho se o melhor é sonhar?

A observação feita em Cinema de poesia (en-saio escrito em 1965), “a memória e os so-nhos são os instrumentos linguísticos sobre os quais se apoia o cinema, que é fundamen-talmente onírico”, prossegue na frase extraí-da de As mil e uma noites para abrir essa série de narrativas entrelaçadas – La verità non sta in un solo sogno, ma in molti sogni”. Portanto,

A REALIDADE ESTÁ NOS SONHOS | AS MIL E UMA NOITES DE PASOLINI

a superposição (de sonhos, de relatos) como figura central da composição – pois do mes-mo modo que uma história nasce de dentro de outra para compor uma história sem fim (e quase sem princípio algum) do mesmo modo, assim também, de dentro da ficção nasce um quase documentário sobre as pessoas e paisa-gens registradas pela câmera. O espectador ao ver o conto percebe também a pessoa que con-ta – a narração narra o narrador. No cinema de Pasolini, a ficção documenta.

“Minha maneira de filmar se opõe aos ensi-namentos neorrealistas. O neorrealismo, para imitar a vida, usa planos longos e sequências que procuram reproduzir o ritmo do cotidia-no, do real. Eu, ao contrário, procuro construir tudo. Procuro evitar uma reconstrução natu-ral, não quero imitar o que se passa na vida. Em Il fiore delle mille e una notte, campo e con-tracampo. Nenhum plano-sequência, somen-te duas ou três panorâmicas. Acrescentei a passividade da câmera. O que importa está no espaço “pro-filme”. O filme está colado nesse mundo pré ou pró filme tal como os sonhos colam na realidade. O destino é que comanda os acontecimentos, a câmera não tem muito a fazer, não é tão necessária – deve ser contem-plativa”.

A ficção colada no documentário tal como um sonho na realidade, para tomar as histórias como um suporte para o rosto e a expressivi-dade natural das pessoas e paisagens: “Como de hábito trabalhei com atores reais, escolhi-dos nos locais de filmagem, atores reais cuja presença física seja suficiente para passar um sentimento de realidade. Em meus filmes o

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trabalho do ator fica mutilado, ou pelo menos fragmentado – ele não pode utilizar seus re-cursos habituais. Além disso, eu empresto tão grande importância à montagem que pratica-mente não resta nada do trabalho pessoal do ator”.

“A principal fonte de inspiração desse filme é uma leitura crítica de As mil e uma noites, tal-vez a mais célebre obra literária da civilização árabe” – disse Pier Paolo Pasolini num bre-ve texto de 1974 para a exibição no Festival de Cannes, Notazione sur Il fiore delle mille e una notte. “Na verdade, uma estranha leitura crítica, porque não sou versado em literatura árabe, nem mesmo na história da cultura ára-be”. Uma efetiva leitura crítica não é possível à margem de uma informação histórica, adverte, mas “o estruturalismo permite uma aproxima-ção crítica que se concentra na análise de um texto em si, isolado de suas circunstâncias (...) e a leitura contemporânea dessa coleção de re-latos nos remete não somente ao cotidiano do antigo mundo árabe, estudado nessas histórias com um rigor quase etnológico, a leitura nos remete igualmente às incontáveis sugestões que ela deixou na literatura de todo o mundo” – diz antes de lembrar que: “a ideia do drama de Calderón de la Barca La vida es sueño se encontra em As mil e uma noites”.

Para o diretor, “os contos de As mil e uma noites são o produto de uma série de anomalias do destino. O destino engendra de maneira vela-da os acontecimentos normais (nascimentos, casamentos, falecimentos), mas de quando em quando ele desperta, ele se manifesta, ele aparece: eis então uma anomalia. Os contos começam com uma ‘aparição’ do destino e ter-minam num ‘desaparecimento’ do destino, ter-

minam quando ele se deixa envolver pela so-nolência da vida cotidiana. O que me inspirou foi ver o destino em ação, ver o momento em que ele se desloca da realidade, não na direção do surreal ou da magia, mas em direção a uma desrazão reveladora da vida, uma desrazão que só tem sentido quando percebida como um sonho ou como uma visão. Fiz um um filme realista, mas, ao mesmo tempo, um filme vi-sionário: os personagens vivem um estado de contentamento, animados, mesmo sem se dar conta disso, por uma ânsia de conhecimento. A aparente passividade deles passa a ser algo estranhamente heroico, graças a esta sede de conhecimento. Eles são um joguete nas mãos do destino (da vontade dos deuses) que quer transformá-los, embora de maneira furtiva, em humildes seguidores de Ulisses, perseguidores da virtude e do conhecimento. O protagonista de meu filme é, portanto, o destino, entendido como normalidade, como ontologia de todo acontecimento e de toda condição humana”.

Alguns críticos não veem com simpatia minha insistência em filmes estranhos ao contempo-râneo e à ideologia – se Fellini tivesse dado ouvidos à impaciência dos críticos não teria feito o belíssimo filme que acabou de realizar, Amarcord. Eu detesto o mundo atual, peque-no burguês e falsamente tolerante (...) As mil e uma noites, deve ser visto como “uma oposição ao mundo atual. É uma realidade desapareci-da que sobrevive em algumas áreas do terceiro mundo, inteiramente alegre e feliz”.

A exibição de As mil e uma noites na terça-feira 13 às 18h00, assinala o lançamento do número 10 da re-vista Serrote, que publica a transcrição de um diálogo entre Pier Paolo Pasolini e Ezra Pound num progra-ma da televisão italiana em julho de 1967.

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QUINTA 1 a SExTA 9 Filmes do circuito comercial exibidos em parceria com o Espaço Itaú de Cinema

SÁbADO 1014h30 : E la nave va (E la nave va) de Federico Fellini (Italia, França, 1983. 132’)“Meus filmes empregam a linguagem dos sonhos. Nos sonhos guardamos e recriamos as experiências do cotidiano”, disse Fellini ao explicar a cena em que dois músicos tocam um fragmento de Schubert passando os dedos em copos de vinho. “Tinha nove anos, foi num circo em Paris: um palhaço com copos de água e de vinho. Ele começou a beber e a fingir que ia ficando bêbado, cambaleava. Parecia que ia embora e de repente voltou. Começou a tocar com os dedos nas bordas dos copos a música que os personagens tocam no filme. Revi tudo isto num sonho, resolvi incluir no filme.”

17h00 : As noites de Cabiria (Le notti di Cabiria) de Federico Fellini (Italia, França, 1957. 110’) “Que feliz domínio da cena!” exclamou François Truffat num texto em Arts em maio de 1957. “Que tranquila maestria, que invenção divertida! Fellini correu muitos riscos ao conduzir As noites de Cabiria por caminhos conflitantes – de esperança e desesperança, de banalidade e de sofrimento, de amizade e de traição”.

20h00 : Ensaio de orquestra (Prova d’orchestra) de Federico Fellini (Italia, Alemanha. 1978. 70’)A ideia surgiu durante um ensaio para a gravação da música de um de seus filmes. “Um sentimento de surpresa e de incredulidade diante do milagre que se realizava debaixo de meus olhos. Eu via chegar ao estúdio de gravação indivíduos muito diferentes uns dos outros, carregando seus instrumentos e carregando também seus problemas pessoais. Maravilhado, observava a fusão daquela massa heterogênea numa forma única, abstrata mesmo, que é a música. Essa ordenação da desordem provocava em mim uma grande emoção”.

OS FILMES DE MARÇO

DOMINGO 1114h30 : Os boas vidas (I vitelloni) de Federico Fellini (Itália, França, 1953. 101’)Quatro capítulos e um epílogo: capítulo um, o casamento apressado de Fausto, que engravidou Sandra, irmã de seu amigo Moraldo. Capítulo dois, os outros boas-vidas durante a lua-de-mel de Fausto e Sandra. Três:Fausto tenta dedicar-se a um trabalho estável. Quarto: nova traição de Fausto e uma crise conjugal séria. No epílogo, a despedida de Moraldo, que da janela do trem em movimento observa os amigos

17h00 : Amarcord (Amarcord) de Federico Fellini (Italia, França, 1973. 123’) “Fico um pouco magoado quando alguém diz que meus filmes são autobiograficos; isso sempre me parece uma redução, sobretudo quando autobiográfico é tomado como algo anedótico, como se eu estivesse contando as recordações de meu tempo de colégio” anotou o diretor no material de divulgação para o lançamento do filme. “Amarcord, na verdade não quer dizer ‘eu me recordo’. É uma espécie de fórmula cabalística, um chamariz, marca de bebida, algo assim: Amarcord. Seria um grande erro ver o filme como um romance autobiográfico”.

19h30 : Roma (Roma) de Federico Fellini (Itália, França, 1972. 128’)O jovem acabou de chegar do interior e se instala na casa de parentes. De noite desce para jantar no restaurante em frente. As mesas se espalham sobre a calçada e sobre a metade da rua, que se transforma num imenso restaurante com uma estreita faixa aberta para a circulação do bonde. A cena é (ou parece ser) uma recordação de algo que o diretor viveu, uma recordação fantasiada, livremente reinventada pela imaginação.

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TERÇA 1314h30 : Julieta dos espíritos (Giulietta degli Spiriti) de Federico Fellini (Itália, 1965. 137’)“Giulietta é a alma de meu filme. Seu personagem é a de uma mulher de mais ou menos 35 anos”, disse Fellini no lançamento do filme. “Seu marido, Giorgio, é um homem de negocios cercado de gente bizarra: pintores, atrizes, videntes, um bando de loucos. Giulieta, no meio dessa gente, volta à infância, mistura realidade, sonho e pesadelo”.

17h30 : As mil e uma noites (Il Fiore delle Mille e una Notte) de Pier Paolo Pasolini (Itália, 1974. 130’)Às 20h00: debate com Waltercio Caldas e Luiz Camillo Osorio, para o lançamento da revista SerroteEm seu décimo número, a revista publica um ensaio visual de Waltercio Caldas, o trabalho vencedor do Prêmio de Ensaísmo Serrote, de Luciano Gatti, sobre a obra de W.G. Sebald, e uma conversa sobre literatura e política entre Ezra Pound e Pasolini, gravada em julho de 1967.

QUARTA 1414h00 : boccaccio 70 (Boccaccio 70) Filme em episódios baseados no Decamerão dirigidos por Federico Fellini, As tentações do Dr. Antônio (La tentazioni

del dottor Antonio), Vittorio de Sica, A rifa (La riffa), Mario Monicelli, Renzo e Luciana (Renzo & Luciana), e Luchino Visconti, O trabalho (Il lavoro) (Itália, França, 1962. 200’)

17h45 : Roma (Roma) de Federico Fellini (Itália, França, 1972. 128’)O jovem acabou de chegar do interior e se instala na casa de parentes. De noite desce para jantar no restaurante em frente. As mesas se espalham sobre a calçada e sobre a metade da rua, que se transforma num imenso restaurante com uma estreita faixa aberta para a circulação do bonde.

20h00 : Amarcord (Amarcord) de Federico Fellini (Italia, França, 1973. 123’) “Amarcord, na verdade não quer dizer ‘eu me recordo’. É uma espécie de fórmula cabalística, um chamariz, marca de bebida, algo assim: Amarcord. Seria um grande erro ver o filme como um romance autobiográfico”, anotou o diretor no material de divulgação para o lançamento do filme.

QUINTA 1514h00 : Histórias extraordinárias (Histoires extraordinaires)

Filme em episódios baseados em Edgar Allan Poe dirigidos por Federico Fellini Tobby Dammit (Toby Dammit), Roger Vadim, Metzengerstein (Metzengerstein) e Louis Malle, William Wilson (William Wilson) (França, Itália 1968. 121’) 16h30 Satyricon (Fellini Satyricon) de Federico Fellini (Itália 1969. 128’)“Trabalhei como um louco,  consultei textos e textos e finalmente descobri uma chave para a realização ”, disse o diretor no Festival de Veneza. “Procurei mostrar o que era a Antiguidade antes da moral cristã impor suas regras”.

19h30: Oito e meio (Fellini Otto e mezzo) de Federico Fellini (Itália, 1963. 145’)“É um meio termo entre uma desordenada sessão de psicanálise e um ainda mais desordenado exame de consciência numa atmosfera nebulosa”, disse Fellini no folheto de divulgação, maio de 1963 . “É um filme melancólico, quase fúnebre, mas decididamente cômico. Durante mais de um ano eu fiquei andando às cegas em torno de uma ideia que me fascinava exatamente por sua imprecisão”.

Ingressos avulsos R$ 10,00 (inteira) e R$ 5,00 (meia). Passaporte O Passaporte para o mês de março – no valor de R$ 30,00 – é válido para 10 sessões da mostra Federico Fellini, da sessão Cinética e da sessão Abraci. O passaporte é pessoal e intransferível. Deve ser adquirido exclusivamente na bilheteria do Instituto. O portador deverá apresentá-lo até 15 minutos antes da sessão com documento de identidade para a retirada do ingresso. Capacidade da sala: 113 lugares. Os ingressos e senhas estão sujeitos à lotação da sala. Ingressos disponíveis também em www.ingresso.com

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SExTA 1614h00 : As noites de Cabiria (Le notti di Cabiria) de Federico Fellini (Italia, França, 1957. 110’) Apresentação de José Carlos Avellar. Entrada franca“Que feliz domínio da cena!” exclamou François Truffat num texto em Arts em maio de 1957. “Que tranquila maestria, que invenção divertida! Fellini correu muitos riscos ao conduzir As noites de Cabiria por caminhos conflitantes – de esperança e desesperança, de banalidade e de sofrimento, de amizade e de traição”.

17h30 : Os palhaços (I clown) de Federico Fellini (Italia, França, 1970. 92’)“É provável que se o cinema não existisse, se eu não tivesse conhecido Rosselini e se o circo ainda fosse um tipo de espetáculo com uma certa atualidade, eu teria adorado ser o diretor de um grande circo”, disse o diretor no lançamento do filme. “O circo tem exatamente a mesma mistura de técnica, de precisão e de improvisação que encontramos no cinema”.

19h30 : E la nave va (E la nave va) de Federico Fellini (Italia, França, 1983. 132’)“Meus filmes empregam a linguagem dos sonhos”, disse Fellini ao explicar a cena em que dois músicos tocam um fragmento de Schubert passando os dedos em copos de vinho. “Tinha nove anos. Num circo em Paris, um palhaço com copos de água e de vinho. Ele começou a beber e a fingir que ia ficando bêbado. Parecia que ia embora e de repente voltou. Começou a tocar com os dedos nas bordas dos copos a música que os personagens tocam no filme. Revi isto num sonho, resolvi incluir no filme.”

SÁbADO 1714h00 : Os boas vidas (I vitelloni) de Federico Fellini (Itália, França, 1953. 101’)Quatro capítulos e um epílogo: capítulo um, o casamento apressado de Fausto, que engravidou Sandra, irmã de seu amigo Moraldo. Capítulio dois, a existência dos outros boas-vidas durante a lua-de-mel de Fausto e Sandra. Três,:Fausto tenta, sem sucesso, dedicar-se a um trabalho estável. Quarto: mais uma traição de Fausto e uma crise conjugal séria. No epílogo a despedida de Moraldo, o mais jovem dos vitelões, que da janela do trem em movimento observa os amigos adormecidos.

16h00 : Ensaio de orquestra (Prova d’orchestra) de Federico Fellini (Italia, Alemanha. 1978. 70’)Apresentação de Herrnani HeffnerA ideia surgiu durante um ensaio para a gravação da música de um de seus filmes. “Um sentimento de surpresa e de incredulidade diante do milagre que se realizava debaixo de meus olhos. Eu via chegar ao estúdio de gravação indivíduos muito diferentes uns dos outros, carregando seus instrumentos e carregando também seus problemas pessoais. Maravilhado, observava a fusão daquela massa heterogênea numa forma única, abstrata mesmo, que é a música. Essa ordenação da desordem provocava em mim uma grande emoção”.

20h00 : Abismo de um sonho (Lo sceicco bianco)de Federico Fellini (Itália, 1952. 86’)Primeiro filme inteiramente dirigido por Fellini, depois de uma série de roteiros para outros diretores e da estréia em Mulheres e luzes (Lucci del varietà), realizado dois anos antes em colaboração com Alberto Lattuada. Recém casado, Ivan Cavalli vem com a esposa, Wanda, a Roma para uma audiência com o Papa e uma visita à família de seu tio. A jovem esposa, no entanto, sonha encontrar-se com o herói de uma foto-novela que acompanhava com paixão, o Sheik Branco. Enquanto o marido cochila no hotel, Wanda sai em busca da redação da revista que publica as histórias do herói, e uma vez lá é convidada a acompanhar o Sheik Branco em sua nova aventura. O roteiro vem de um argumento de Michelangelo Antonioni, desenvolvido por Fellini, Tulio Pinelli e Ennio Flaiano.

Ao longo da exposição Tutto Fellini, entre 10 de março e 17 de junho, todas as sextas-feiras, um filme do diretor acompanhado de debate em sessão com entrada franca.

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DOMINGO 1814h00 : A estrada da vida (La Strada) de Federico Fellini (Italia,1954. 108’)Pela janela do carro, numa estrada, Fellini passou ao acaso por “um homem forte conduzindo uma carreta empurrada por uma mulher pequenina e magra”. Daí nasceu a história de Gelsomina e Zampanô, ela vendida pela mãe para trabalhar com ele, um ator ambulante que se acorrentava para em seguida arrebentar a corrente com as mãos.

16h00 : Oito e meio (Fellini Otto e mezzo) de Federico Fellini (Itália, 1963. 145’)“Durante mais de um ano eu fiquei andando às cegas em torno de uma ideia que me fascinava exatamente por sua imprecisão”, disse o diretor em maio de 1963.

19h00 : La dolce vita (La dolce vita) de Federico Fellini (Itália, 1960. 174’)Para Pasolini, “uma obra importante demais para que se fale dela assim como se fala de um filme (...) Não existe nele um único personagem triste, digno de pena. Todo mundo é belo, todo mundo é gentil, embora nada funcione”.

QUARTA 2114h00 : Casanova (Il Casanova di Fellini) de Federico Fellini (Itália, 1976.155’)Filme inspirado na autobiografia de Giacomo Casanova e marcado por um raro incidente em sua produção: o roubo e destruição de parte dos negativos do laboratório, o que obri-gou o diretor a refilmar uma sequência e a abandonar outra.

16h45 : Julieta dos espíritos (Giulietta degli Spiriti) de Federico Fellini (Itália, 1965. 137’)“Giulietta é a alma de meu filme”, disse Fellini no lançamento do filme. “Seu marido, Giorgio, é um homem de negocios cercado de gente bizarra (...) Giulieta, no meio dessa gente, volta à infância, mistura realidade, sonho e pesadelo”.

19h30: bom dia, noite (Buongiorno, notte)de Marco Bellochio (Itália, 2003. 106’)O sequestro de Aldo Moro, líder da democracia cristã italiana em 1978, num filme inspirado no livro O prisioneiro, de Anna Laura Braghetti. Sessão Cinética, seguida de debate com os críticos da revista

QUINTA 2214h00 : Satyricon (Fellini Satyricon) de Federico Fellini (Itália 1969. 128’)“Trabalhei como um louco,  consultei textos e textos e finalmente descobri uma chave para a realização ”, disse o diretor ao apresentar o filme no Festival de Veneza. “Procurei mostrar o que era a Antiguidade antes da moral cristã impor suas regras”.

16h30 : As noites de Cabiria (Le notti di Cabiria) de Federico Fellini (Italia, França, 1957. 110’)“Que feliz domínio da cena!” exclamou François Truffat num texto publicado em Arts em maio de 1957. “Que tranquila maestria, que invenção divertida! Fellini correu muitos riscos ao conduzir As noites de Cabiria por caminhos diferentes - de esperança e desesperança, de banalidade e de sofrimento, de amizade e de traição”.

19h30: Aruanda de Linduarte Noronha (Brasil, 1960. 30’)Aruanda visto por Linduarte Noronha de Geraldo Sarno (Brasil, 2000. 26’)Sessão em parceria com a Abraci, Associação Brasileira de Cineastas em memória de Linduarte Noronha. Apresentação e debate com Geraldo Sarno.“Linduarte Noronha é o pai do moderno cinema documentário brasileiro”, sublinha Sarno. “Devemos a ele uma nova maneira de olhar um Brasil desconhecido. Aruanda trouxe uma nova temática e uma nova linguagem, um novo cinema. A nova temática traçou o programa do cinema documentário brasileiro na década de 1960 e seguintes. Passamos a documentar o saber e as habilidades do povo na busca da sobrevivência dando sequência a um trabalho iniciado por Linduarte.

SÁbADO 24 a DOMINGO 1 DE AbRIL

É TUDO VERDADEFestival Internacional de Documentários criado em 1996 pelo crítico Amir Labaki. Nele se exibem anualmente pouco mais de cem filmes brasileiros e internacionais, entre lançamentos e clássicos, simultaneamente em São Paulo e no Rio de Janeiro.As sessões do É tudo verdade têm entrada franca.

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SExTA 2314h00 Tobby Dammit (Toby Dammit) de Federico Fellini (Episódio de Histoires extraordinaires França, Itália 1968.) Apresentação de José Carlos Avellar e Teresa Azambuja. Entrada franca.Um ator alcoólatra chega a Roma para interpretar um western católico, mistura de Zinnemann Pasolini e Ford.

17h00 : Oito e meio (Fellini Otto e mezzo) de Federico Fellini (Itália, 1963. 145’)“É um meio termo entre uma desordenada sessão de psicanálise e um ainda mais desordenado exame de consciência”, disse diretor em maio de 1963 .

20h00 : Abismo de um sonho (Lo sceicco bianco)de Federico Fellini (Itália, 1952. 86’)Primeiro filme inteiramente realizado pelo diretor, a partir de um roteiro de Michelangelo Antonioni, Tulio Pinelli e Ennio Flaiano. Em Roma, nos primeiros dias da lua de mel, uma jovem esposa descobre a redação de uma revista de foto-novelas de seu herói preferido, o Sheik Branco.

SÁbADO 2414h00 : Autorretrato de Fellini (Fellini Racconta: un autoritratto ritrovato) de Paquito del Bosco (Itália, 200. 54’)Montagem de depoimentos para a televisão italiana e de entrevista diversas, algumas durante a filmagem de A doce vida.

SExTA 3014h00 : As tentações do dr. Antonio (La tentazioni del dottor Antonio) de Federico Fellini, (episódio de boccaccio 70, Itália, França, 1962. ) Apresentação José Carlos Avellar e Teresa Azambuja. Entrada franca.

Um moralista obcecado com a enorme imagem de uma mulher sensual num cartaz em frente à janela de sua casa.

SÁbADO 3114h00 : Entrevista com Federico Fellini (A Diretor’s Notebook ) de Federico Fellini (Itália, 1969. 54’)O processo de trabalho do diretor em um filme feito para a televisão durante a preparação de Satyricon.

Instituto Moreira Salles Rua Marquês de São Vicente, 476. Gávea. Telefone: (21) 3284-7400

www.ims.com.br

De terça a sexta, das 13h às 20h. Sábados, domingos e feriados das 11h às 20hAcesso a portadores de necessidades especiais. Estacionamento gratuito no local. Café WiFi.

Como chegar as seguintes linhas de ônibus passam em frente ao IMS:

158 – Central-Gávea (via Praça Tiradentes, Flamengo, São Clemente)

170 – Rodoviária-Gávea (via Rio Branco, Largo do Machado, São Clemente)

592 – Leme-São Conrado (via Rio Sul, São Clemente)

593 – Leme-Gávea (via Prudente de Morais, Bartolomeu Mitre)

Ônibus executivo Praça Mauá - Gávea

O programa de cinema de março tem o apoio da

Cinemateca do MAM do Rio de Janeiro,

do Instituto Italiano de Cultura,

do Instituto Luce, Cinecittà, do Instituto Goethe,

da Cinemateca da Embaixada da França,

do Arquivo Nacional e do Centro Técnico

Audiovisual. O programa conta ainda com a

parceria do Espaço Itaú de Cinema,

da Videofilmes, da www.revistacinetica.com.br

e da Associação Brasileira de Cineastas.

Curadoria: José Carlos Avellar. Coordenação do IMS - RJ: Elizabeth Pessoa. Assessoria de coordenação: Laura Liuzzi. Capa : Giulieta Masina: A estrada da vida (La Strada) de Federico Fellini Quarta capa: Gelsomina, desenho de Fellini para a filmagem de A estrada da vida

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FELLINI