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Escola Secundária de Leal da Câmara Curso EFA / Secundário – 2009/10 Núcleo Gerador 5 – Tecnologias da Comunicação e Informação Tema: (Contexto Macro-estrutural) – Redes e Tecnologias Competência: Perceber os impactos das redes de internet nos hábitos perceptivos, desenvolvendo uma atitude crítica face aos conteúdos aí disponibilizados Ficha Blogosfera, geradora de Comunidades O verdadeiro valor de uma rede tem menos a ver com a informação e mais com a comunidade. A auto-estrada da informação é mais do que um atalho para a biblioteca do congresso. Está a criar um tecido social global completamente novo. Nicholas Negroponte COMUNIDADE REAL vs COMUNIDADE VIRTUAL? Procurando respostas às interrogações, começa-se com a questão de saber se os bloguistas procuram tão só o acesso à informação e diversão ou algo mais como as interacções sociais que aí ocorrem. Por outras palavras, se é possível erguerem-se comunidades através da "ponta dos dedos que clicam teclados em terminais de computador", utilizando a expressão de Dominique Wolton. As tecnologias de comunicação permitem o acesso instantâneo não apenas à informação mas também às pessoas. Estão a originar o surgimento de novas formas de associação humana que estão a ser reinseridas na vida quotidiana e não existiam em enquadramentos modernos anteriores. Não se pode deixar para trás o contexto desta mudança e o facto de que o maior fluxo de comunicação no ciberespaço não ficar por conta da procura de informação, nem do comércio electrónico, mas da comunicação interactiva. O ser humano não se contenta apenas com informações, porque acima de tudo é portador de emoções. Física ou virtualmente, os indivíduos procuram quem possua os mesmos interesses a fim de os desenvolver. Nesta linha, como exemplo, a Yahoo (uma das maiores empresas da área tecnológica ligada aos serviços online) adquiriu o portal de redes sociais del.icio.us que permite aos utilizadores registados criarem páginas web e partilharem os seus interesses com outros internautas. Estes serviços de redes sociais são uma das áreas da Internet onde se espera um crescimento mais rápido e um maior investimento ao nível da publicidade on-line. Cultura, Língua e Comunicação Formador: Pedro Vitória 1/5

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Escola Secundária de Leal da CâmaraC u r s o E FA / S e c u n d á r i o – 2 0 0 9 / 1 0

Núcleo Gerador 5 – Tecnologias da Comunicação e Informação

Tema: (Contexto Macro-estrutural) – Redes e Tecnologias

Competência: Perceber os impactos das redes de internet nos hábitos perceptivos, desenvolvendo uma atitude crítica face aos conteúdos aí disponibilizados

Ficha

Blogosfera, geradora de Comunidades

“O verdadeiro valor de uma rede tem menos a ver com a informação e mais com a comunidade. A auto-estrada da informação é mais do que um atalho para a biblioteca do congresso.Está a criar um tecido social global completamente novo.”

Nicholas Negroponte

COMUNIDADE REAL vs COMUNIDADE VIRTUAL?

Procurando respostas às interrogações, começa-se com a questão de saber se os bloguistas procuram tão só o acesso à informação e diversão ou algo mais como as interacções sociais que aí ocorrem. Por outras palavras, se é possível erguerem-se comunidades através da "ponta dos dedos que clicam teclados em terminais de computador", utilizando a expressão de Dominique Wolton.

As tecnologias de comunicação permitem o acesso instantâneo não apenas à informação mas também às pessoas. Estão a originar o surgimento de novas formas de associação humana que estão a ser reinseridas na vida quotidiana e não existiam em enquadramentos modernos anteriores.

Não se pode deixar para trás o contexto desta mudança e o facto de que o maior fluxo de comunicação no ciberespaço não ficar por conta da procura de informação, nem do comércio electrónico, mas da comunicação interactiva . O ser humano não se contenta apenas

com informações, porque acima de tudo é portador de emoções.

Física ou virtualmente, os indivíduos procuram quem possua os mesmos interesses a fim de os desenvolver. Nesta linha, como exemplo, a Yahoo (uma das maiores empresas da área tecnológica ligada aos serviços online) adquiriu o portal de redes sociais del.icio.us que permite aos utilizadores registados criarem páginas web e partilharem os seus interesses com outros internautas. Estes serviços de redes sociais são uma das áreas da Internet onde se espera um crescimento mais rápido e um maior investimento ao nível da publicidade on-line.

É por isso que Lee Sproull e Samer Faraj defendem a tecnologia enquanto fonte de informação mas também propiciadora das sociabilidades com os indivíduos a procurarem afirmação, pertença e partilha.

O mundo "lá fora", sem espaço nem tempo definidos, não parece ser, nem impessoal nem a-social. Está a transformar-se mediante aquilo que alguns pensadores, como Castells, designam de

"privatização da sociabilidade", isto é, o estreitamento de laços não com o colega ou o vizinho, mas com alguém, ainda que longe, que revele gostos semelhantes.

Porém, antes de se avançar mais, o próprio conceito de comunidade é esquivo e abre-se agora a um plano mais amplo de discussões, pois tanto pode servir para apontar a vida comunal de uma aldeia que nem sequer vem referenciada nos mapas, como poderá identificar um conjunto de indivíduos que raramente se encontram cara a cara mas que mantêm com êxito um trabalho de solidariedade e cooperação on-line.

De acordo com algumas críticas dirigidas à Internet, a experiência presencial é um pré-requisito para a formação de relações entre os membros de uma "comunidade."

Essa é também uma das razões apontadas pelos 28% de bloguistas inquiridos que responderam não sentir fazer parte de uma comunidade na blogosfera. Outros argumentos apresentados ajudam a perceber esta perspectiva:

- "Pelo facto de publicarmos artigos que têm a ver com as nossas sensibilidades mais directas."- "Não existe uma comunidade blogger em Portugal, porque um determinado grupo criou uma

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elite onde mais ninguém entra."- "Porque há uma miríade de razões para criar um blogue, e é improvável que eu partilhe das mesmas razões que a maioria dos que são activos na blogosfera."

Contudo, segundo este pensamento, a tecnologia serviria como barreira entre as pessoas e não é isso que se verifica. (Querido) Devido à distância física, para muitas pessoas, o ciberespaço é a única forma de se manterem em contacto com amigos e familiares e até de conhecerem outras pessoas.

Os serviços interactivos de troca instantânea de mensagens e mesmo os blogues podem servir para ajudar a resolver dois problemas existenciais da Modernidade. "Temos, pois, simultaneamente, o indivíduo, o antídoto para a solidão e a porta aberta à solidariedade." (Wolton)

A Rede possibilita a continuação de relações no mundo real, bem como promove a criação de novos contactos. Neste sentido, os blogues não são apenas uma ferramenta de comunicação pessoal, são também um meio socializante ou porque não dizê-lo, social.

É certo que uma forte característica deste meio, a Internet, prende-se justamente com a desinibição dos sujeitos uma vez que a aparência física serve muitas vezes de factor de inibição. "Mas online o factor aparência não é levado em consideração (pelo menos até à hora, se esta chegar, de levar a relação para novos patamares de intimidade, mais à real luz do dia) ". (Querido, 2005: 20)

Libertos da soberania do corpo, sem qualquer indício visual de género, idade e categoria social, as conversas dão-se a direcções que de outra forma muito provavelmente seriam evitadas. "Quem tem dificuldades em fazer novas amizades devido a deficiências físicas descobre que nas comunidades virtuais é tratado como sempre desejou - como ser racional, transmissor de ideias e sentimentos , e não como um recipiente carnal com determinada aparência, andar ou falar (ou mesmo sem andar ou falar)." (Rheingold)

Barry Wellman e Milena Gulia relembram que vários estudos comprovaram, empiricamente, que a participação em comunidades virtuais, pode aumentar a participação nas comunidades face a face. Os mesmos autores são, quanto a este tema, categóricos. A noção de comunidade, com laços estreitos, espacialmente definida baseando-se no apoio e pertença é idílica e provavelmente já nem nas sociedades rurais ela existe.

Chame-se também Pierre Levy à discussão. Este autor lembra que é um erro pensar nas relações entre os novos e antigos dispositivos de comunicação em termos de substituição. Pelo menos é isto que a História conta. "Da mesma forma que o cinema não substituiu o teatro mas constituiu um género novo com a sua tradição e os seus códigos originais..." O mesmo pensador avança mais no tema: "É muito raro que uma nova forma de comunicação ou de expressão suplante completamente as antigas. Fala-se menos desde que a escrita foi

inventada? (...) A escrita não fez desaparecer a palavra, ela tornou mais complexo e reorganizou o sistema de comunicação e da memória social.'

Contudo, é preciso não perder de vista que a Rede não tem correspondência com uma "comunidade específica" mas sim com milhares delas e que nem todos os grupos virtuais podem ser considerados comunidades. D. W. McMillan e D. M. Chavis definem o sentido de comunidade sustentado por quatro fundamentos e para todos eles o inquérito realizado (a autores de blogues) sobre a comunidade da Blogosfera obteve respostas das pessoas que apontam para eles:

a) O sentimento de pertencer a e identificar-se com a comunidade.- "Porque quando contactamos com as mesmas pessoas diariamente, acabamos por formar essa comunidade"- "No fundo conhecemo-nos todos, é um convívio."- "O blogue é colectivo e os seus autores têm círculos de amigos e conhecidos que conheceram através dos blogs"

b) O sentimento de ter influência em e ser influenciado pela comunidade.- "Vamo-nos conhecendo, lemo-nos uns aos outros, saudamo-nos, partilhamos informação"- "Tal como vivemos em sociedade necessitamos uns dos outros entendo que a blogosfera é também uma espécie de sociedade em que estamos todos interligados"

c) O sentimento de ter o suporte dos outros membros da comunidade e vice--versa.- "Porque todos temos elos de ligação (...) e porque tento fomentar esses elos com iniciativas em grupo."- "Para um blogue que possui uma média de 600 visitas diárias, e digamos uns 75 comentários por dia claro que sinto fazer parte de uma comunidade" "Porque há um grupo alargado de leitores que, diariamente, lê e comenta o que escrevo."- "Estabelecem-se ligações com outros bloggers, links, trocas de visitas e comentários, desafios, correntes, etc."- "Sim tenho alguns amigos na blogosfera... e através do blogue conheci gente interessante, com as mesmas preocupações."

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d) O sentimento de relações, partilhas de histórias de vida e o próprio espírito de comunidade.

- "Nomeadamente a nível local, posso afirmar que existe uma comunidade de blogues onde estamos inseridos"- "Faço parte de algumas [comunidades] - a dos bloggers que vão a encontros), a dos bloggers que falam de jornalismo, etc..."- "Quem anda há algum tempo pelos Blogue acaba por ganhar algum protagonismo e ser reconhecido e criam-se laços com os bloguistas e outros bloggers." "Encontro-me regularmente com outros bloggers para troca de opiniões."

Giuseppe Granieri para terminar: "A chamada blogosfera, portanto, acaba por ser um conjunto de clusters comunicantes em que, para parafrasear Michael Goldhaber, cada um é ‘estrela’ em alguns ambientes e 'fã' noutros. (...) Cada um destes clusters [são] conjuntos circunscritos em que as relações de influência entre as pessoas assumem algumas características bem definidas." (2006: 58)

Retirado e adaptado de: Paula Oliveira Silva, Blogo, logo existo, Editora Media XXI, Porto, 2009

Tarefas:

1. Procura-se conteúdo informativo e conhecimento na rede / blogosfera, ou antes e principalmente, uma outra coisa?

Identifique-a.

2. Fala-se de um novo conceito de comunidade em contraponto a um mais tradicional. Identifique cada um deles: primeiro, a

antiga noção de comunidade e, de seguida, em segundo lugar, a nova concepção de comunidade.

3. Dominique Wolton refere que os blogues e outras ferramentas de comunicação online poderão ajudar a resolver dois

problemas existenciais da humanidade. Concorda? Justifique a sua posição.

4. A aparência física é, muitas vezes, um problema na socialização, as comunidades virtuais ou online parecem apresentar

vantagens para quem julgar ter essas inibições. O que pensa desta afirmação?

5. Os blogues e outras ferramentas online semelhantes substituirão as comunidades tradicionais?

6. Quando participa em redes sociais, sente que está a desenvolver os quatro fundamentos do sentido de comunidade, que

são referidos no texto acima transcrito? Analise cada um deles, apresentando exemplos da sua experiência pessoal.

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