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Coagirpara disciplinar: História Comparada da formação do mercado de trabalho livre na Argentina e no Brasil María Verónica Secreto Universidade Federal do Ceará RESUMO: Este artigo aborda de forma comparada alguns aspectos da formação do mercado de trabalho livre no Brasil e na Argentina no século XIX; fazendo especial referência ao seu caráter coercitivo. PALAVRAS-CHAVE: História Comparada - Mercado de trabalho - Legislação - Vadiagem. ABSTRACf: In this article we analyze some comparative aspects on the free work rnarket formation in Brazil nd Argentina in XIXth. Century, we ernphasizes the repressive character of this kind of market. KEYWORDS: Compararive History - Work Market - Legislation - Vagrancy. ALGUMAS CONSIDERAÇOES SOBRE A HISTÓRIA COMPARADA A comparação histórica, do ponto de vista metodológico, é um recorte particular do objeto pelo qual se escolhem duas ou mais séries análogas de sociedades diferentes, com a finalidade de chegar a conclusões mais abrangentes. Os trabalhos que se inscrevem dentro da análise comparativa cobrem um amplo espectro, que inclui, de acordo com a 'tipificação' clássica que fez Marc Bloch, em 1928, comparações com alto nível e com baixo Trajetos. Revista de História UFC. Fortaleza, vol. 1, nO2, 2002. 165

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Coagirpara disciplinar:História Comparada da formação do mercado de

trabalho livre na Argentina e no Brasil

María Verónica Secreto

Universidade Federal do Ceará

RESUMO:Este artigo aborda de forma comparada alguns aspectos da formação do mercado de trabalholivre no Brasil e na Argentina no século XIX; fazendo especial referência ao seu carátercoercitivo.PALAVRAS-CHAVE:História Comparada - Mercado de trabalho - Legislação - Vadiagem.

ABSTRACf:In this article we analyze some comparative aspects on the free work rnarket formation inBrazil nd Argentina in XIXth. Century, we ernphasizes the repressive character of thiskind of market.KEYWORDS:Compararive History - Work Market - Legislation - Vagrancy.

ALGUMAS CONSIDERAÇOES SOBRE A HISTÓRIA COMPARADA

A comparação histórica, do ponto de vista metodológico, é umrecorte particular do objeto pelo qual se escolhem duas ou mais séries análogasde sociedades diferentes, com a finalidade de chegar a conclusões maisabrangentes. Os trabalhos que se inscrevem dentro da análise comparativacobrem um amplo espectro, que inclui, de acordo com a 'tipificação' clássicaque fez Marc Bloch, em 1928, comparações com alto nível e com baixo

Trajetos. Revista de História UFC. Fortaleza, vol. 1, nO2, 2002.

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nível de analogia; comparações sincrônicas, isto é, a comparação de sociedadescontemporâneas, e diacrônicas, unidades comparadas em diferentesmomentos de um eixo temporal.'

Embora a comparação esteja presente de forma implícita em todosos trabalhos históricos, sua expliciração requer certas condições. Primeiro,a intenção de fazer uma abordagem comparativa sistemática; segundo, acerteza de que essa abordagem permitirá que um processo histórico ilumineo outro; e terceiro, uma série de condições que facilitem a comparação eque permitam que seja inteligível, o que resumimos na sintética frase deCardodo e Pérez Brignoli: "comparar o realmente comparãvel't.!

A história comparada se apresentou, nas .primeiras décadas do séculoXX, como a possibilidade de tornar as conclusões históricas mais abrangentes,isto é, tornar a história mais científica. Em 1928, apareceu um artigo deMarc Bloch, na Revue de Synrhese Historique, que se converteu em referênciapara aqueles que refletiram sobre a história comparada. Bloch propunhaestudar paralelamente sociedades vizinhas e contemporâneas, constantementeinfluenciadas de forma recíproca, sujeitas, pela sua proximidade, às mesmasgrandes determinações. Isto formava parte de um programa que ele mesmocomeçou a realizar a partir do estudo da sociedade feudal; mas o programanão avançou muito depois de sua morte.

Majoritariamente, os trabalhos que abordam os antecedentes dahistória comparada reconhecem Marc Bloch como seu rnentor, e seu artigo,"Pour une histoire comparée des sociétés européennes", como uma espéciede manifesto comparativista. Nancy L. Green, sem negar este caráter doartigo, não deixa de reconhecer em François Simiand o primeiro defensordo método comparativo. Simiand escreveu, em 1903, um artigo intitulado"Méthode historique et sciences sociales", no qual apresentava o métodocomparativo como o fim dos males para a historiografia, ou como o fim dosnacionalismos. Esse método permitiria a pesquisa científica das regularidadese, desta forma, a história deixaria de ser descritiva para ser explicativa.Depois da primeira Guerra Mundial, e no contexto do primeiro congressode ciências históricas (1923), Henri Pirenne chamou a atenção para os efeitosnegativos do romantismo e do nacionalismo do século XIX e insistiu nahistória comparativa como meio de construir sínteses científicas. Este temavoltaria à tona depois da segunda Guerra Mundial. Mas o artigo de MarcBloch, segundo Green, aparece na conjuntura em que o cientificismo e oantinacionalismo não eram a prioridade do comparativismo militante; porisso, Bloch sublinha outros elementos: pesquisa e compreensão dos aspectos

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específicos e gerais de qualquer fenômeno, bem como a compreensão dacausas e origens dos fenôrnenos.! Além da influência das ciências sociais nosurgimento da história comparada, devemos lembrar a formação de Blochno campo da lingüística, como outro estímulo ao seu afã de definir ummétodo comparativo para a história.

A história comparada demanda duas condições importantes: umahistória comparável e uma historiografia comparativista. Uma história queapresente processos semelhantes e uma historiografia que permita odesenvolvimento de perspectivas comparadas.

Numa visão otimista, Mauriccia Salvati afirma que a função dacomparação é discutir as teses que são a origem da historiografia hegemônicade um país, não sendo nada assombroso, neste contexto, que as aproximaçõescomparativas se situem num clima de oposição à cultura dominante,convertendo-se numa espécie de contracorrente historiográfica nacional, ouantiparadigma. Esta possibilidade de discutir as teses das historiografias nacionaisseria uma das características mais importantes e a maior contribuição dahistória comparada. Salvati também salienta a diferença, entre métodocomparativo e aproximação comparativa. Esta última, diz, representa sobretudouma modalidade de explicação, é a elucidação pela acumulação de exemplos,enquanto à história comparada corresponderia a interpreração."

Seguindo os dois elementos que consideramos fundamentais, históriae hisroriografia, podemos dizer que a América Latina e, na visão de HebeClementi, o continente americano no seu conjunto apresentam-se como umpalco privilegiado para a história comparada. A comparação é favorecidapor certa unificação dos processos históricos. Claro que não negamos asgrandes divergências e particularidades regionais. Mas, em grandes traços, adescoberta, colonização, independência, criação dos estados nacionais e aincorporação ao mercado internacional proporcionam uma cronologia básicacomum que é o primeiro passo para a comparação. Simplesmente umprimeiro passo, porque como advertem Cardoso e Brignoli, às vezes, acomparação de sociedades contemporâneas não é critério suficiente, nãopermitindo ir alem de constatação de diferenças.

Embora a idéia de América Latina, como uma unidade plausível deser estudada em seu conjunto, não estivesse amplamente difundida antes dasdécadas de 30 e 40, algumas exceções são suficientemente significativaspara que possamos falar de História Comparada da América Latina comanterioridade a essa difusão e à do texto/manifesto de Marc Bloch.Consideramos como obra inaugural dessa perspectiva histórica a de Man -I

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de Oliveira Lima, que comparou a evolução histórica do Brasil com a daAmérica Espanhola e Inglesa, em uma série de conferências dadas nos EstadosUnidos, em 1912, publicadas em 1914.5 Esta primeira obra eminentementecomparativa de Oliveira Lima representa a confluência de duasintencionalidades: a norte-americana, de apreender uma realidadeescorregadia - por diversa -, como a latino-americana, e a do intelectuallatino-americano - neste caso brasileiro -, de explicar e fazer inteligível essarealidade complexa. A história comparada da América Latina nasce comsuas funções explicativa e interprerativa, como qualquer outra históriacomparada, e com forte componente didático.

Sobre algumas temáticas específicas, como terras e imigração, criou-se o que chamamos de roteiro da comparação, cujos termos foram Austrália,Canadá, Estados Unidos. Essas temáticas nasceram comparativas. Em grandemedida, o desenvolvimento capitalista e a criação dos mercados - de capitais,mercadorias e homens - incentivaram as comparações, conjuntamente como desenvolvimento e entronização da ciência estatística. Alguns países, noséculo XIX, como a Argentina e o Brasil, se pensaram como concorrentespara atrair o fluxo migratório e, nessa concorrência, tiveram que definirquais as "vantagens comparativas" que ofereciam.

REGULAMENTAÇÕES SOBRE MÃO-DE-OBRA LIVRE

Aquilo que um regime político faz em relação à mão-de-obra deixatransparecer claramente os seus ideais econômicos e sociais. Proverregularmente mão-de-obra foi urna das preocupações das novas nações sul-americanas. O Brasil resolveu o problema mantendo, após a independência,o regime escravista, embora algumas medidas para regulamentar a mão-de-obra livre também fossem tomadas a partir de 1830. No Rio da Prata, foiatravés de uma severa legislação, que visava ao controle estrito da população,que se tentou prover a mão-de-obra necessária às diferentes atividadesprodutivas."

A legislação sobre vadiagem começou muito cedo no Rio da Prata.Já nas primeiras décadas da vida independente, estabeleceram-se penalidadespara os habitantes do campo e da cidade que não pudessem comprovar seuvínculo em alguma atividade produtiva. Em ordem cronológica, foram ditadasas seguintes medidas contra vagabundos, ébrios e mendigos. Em 1815estabelece-se a papeleta assinada pelo empregador e o Juiz de Paz, que deviaser renovada trimestralmente. Em 19 de abril de 1822, um decreto do Poder

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Executivo da província de Buenos Aires, tendo em vista que "la clase d .vagabundos que, por desgracia, no es en el país de Ias inferiores en número,es tan perjudicial para sí como 10 es para la misma sociedad, a cujas expensasvive", ordenava ao chefe de polícia e seus dependentes que se "apoderassemdos vadios", isto é, que deviam ser aprisionados; depois do que, eramdestinados ao serviço militar, em que serviam pelo dobro de tempo que omenor prazo de um voluntário. Também podiam ser destinados a trabalhospúblicos, caso em que recebiam um salário. Aquele que fosse reincidenteera destinado a trabalhos públicos por três anos; na terceira vez, a penaaumentava para oito anos.?

Outro decreto, de 28 de fevereiro de 1823, regulamentava amendicidade, proibindo esta prática sem uma certidão da polícia quecomprovasse a indigência do portador. O mesmo decreto entendia pordelinqüente doloso de mendicidade toda pessoa que, pelo seu estado físico,pudesse trabalhar, e toda pessoa que, pelo seu estado de saúde, não pudesseganhar seu sustento, mas tivesse propriedade ou proteção da família.

Estas medidas parecem extremas, mas a próxima é ainda mais.Acertadamente, Bagú considera o decreto de 17 de julho de 1823, sobrecontratação de peões de campo, mais antijurídico e vexatório que osanteriores, estabelecendo que todo peão devia ser contratado unicamentepor contrato formal escrito, autorizado pelo comissário de polícia respectivo,no qual devia constar o tempo pelo qual era contratado e o tipo de serviçoque devia prestar. Não poderia ser contratado nenhum peão que nãoapresentasse certidão do patrão anterior, em que constasse que tinha cumpridoo contrato precedente. Quando o patrão necessitasse destinar um ou maispeões a tarefas fora da fazenda, teria que lhes dar uma papeleta assinada porele, na qual deviam estar previstos os dias que o peão ficaria fora doestabelecimento. Passados esses dias, o peão que fosse encontrado longe dachácara, fazenda ou estabelecimento de campo em que estava contratado,seria tido por vadio e sujeito à legislação sobre vagabundagem. Devemoslembrar que se trata de uma economia predominantemente pecuária, o queimplicava em freqüentes transumâncias com o gado.

Nesse período, também tentou-se solucionar a questão da mão-de-obra por meio da imigração. Data do primeiro Triunvirato (1812) a iniciativapara atrair imigrantes europeus.

Durante o governo de Rosas, a perseguição da vadiagem parecerecrudescer. Revisando os expedientes dos juizados de paz de dois partidos,um do Sudeste, Lobería, e outro do Sul, Bahía Blanca, encontramos que a

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regeria as relações de trabalho livre, principalmente envolvendo estrangeiros.A de 1830 ficou restrita aos nacionais. Até a lei de locação de serviços de1879, essas foram as que regularam e mediaram as relações de trabalho livre. II

A aplicação da lei de 1837 foi discutida, sobretudo, a partir dadécada de 1850 - quando predominaram os contratos de parceria. Esta leiordenava que os contratos fossem por escrito; esses contratos, que, a partirde então, podiam ser celebrados fora do Império do Brasil, seriamestabelecidos pelo prazo que acordassem locatário e locador. O locador podiadar por rompido o contrato, se o locatário o ferisse ou injuriasse a honra desua mulher, filhos ou pessoa de sua família ou se exigisse serviços nãoacordados. Estas eram consideradas justas causas e. o locador não pagavaqualquer quantia de que fosse devedor; o locatário que despedisse o locadorsem justa causa, devia pagar o tempo estipulado no contrato.

O locatário podia despedir o locador nos casos de doença, prisão,embriaguez, imperícia, e injúria feita à segurança, honra ou fazenda do locatário,sua mulher, filhos ou pessoa de sua família. Uma vez que o contrato era rompido,o locador devia pagar ao locatário o que devesse; caso contrário, seria preso edestinado às obras públicas pelo tempo necessário para pagar a dívida.

Apesar de esta lei não ser feita na medida de suas necessidades, osfazendeiros paulistas que implementaram os contratos de parceria muitasvezes fizeram uso dela. Não obstante, diz Gebara, essa lei foi a base para aregulamentação de diferentes sistemas de trabalho utilizados na segundametade do século XIX: meação, parceria e colonato.

Em 1879, em outro contexto, é promulgada a lei de locação deserviços. A legislação que regeu o trabalho livre esteve condicionada pelaexistência da escravidão e pela política destinada a ordenar a questão escrava.Assim, o antecedente imediato da lei de 1879 foi a lei do Ventre Livre, de1871. A lei de locação de serviços, decreto n° 2827, de 15 de março de1879, compreendia, além da locação de serviços propriamente dita, asparcerias agrária e pecuária e estabelecia o prazo que os contratos deviamter: seis anos para os brasileiros, cinco para os estrangeiros e sete para oslibertos. Por este decreto, o locatário não poderia transferir o contrato semo beneplácito do locador, nem este poderia pôr um substituto em seu lugar.Sobre os juros, uma das questões cruciais do sistema de parceria, estabeleciaque não se poderiam cobrar sobre as dívidas dos colonos, só vigoravamsobre as dívidas do transporte. As justas causas para demitir o locador eramas mesmas da lei de 1837, acrescentando-se a insubordinação do locador. Olocador podia ser demitido com justa causa nos casos de ausência sem aviso,

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sublocar o prédio da parceria, e negar-se trabalhar. Mas, se a re, usa 'otrabalho fosse coletiva - como no caso das revoltas -, os infratores s 'rial1'detidos até o julgamento.

A lei de 1879 não era para atrair imigrantes, mas para disciplinar amão-de-obra existente, embora se tenha dito que visava favorecer a imigraçã ,já que, comparada com a de 1837 e com os contratos de parceria em vigor,introduzia algumas medidas levemente atenuantes, que, no entanto, nãoconseguiam esconder as medidas penais mantidas. No contexto daemancipação gradual, a lei buscava disciplinar o trabalhador nacional e daruma garantia do cumprimento do contrato aos fazendeiros.

Os anos 80 trariam a solução ao problema de "braços para a lavoura"de São Paulo: a imigração subsidiada. Pelo decreto n° 213, de 22 de Fevereirode 1890, a lei de locação de serviços' era derrogada por constituir obstáculoà imigração. A partir de 1888, com a liberdade dos escravos, as medidastendentes a disciplinar o trabalhador nacional foram mais intensivas.

O Brasil não contou com um código rural, embora a lei de 1879tenha sido qualificada quase como um, na época de sua sanção. O senadorNabuco era da opinião de que a locação de serviços, como todos os contratos,deveria fazer parte do Código Civil, "Mas a locação de serviços agrícolas,por circunstâncias peculiares de nosso paíz, tem uma feição especial, que aexclue do direito commum e exige uma lei excepcional." 12 A excepcionalidadeencontrava-se em duas questões: na urgência com que se precisavaregulamentar a questão do trabalho livre rural e no fato de tratar-se de locaçãode serviços no meio rural, isto é, onde existiam alternativas de subsistência.

No mesmo momento em que se discutiu esta lei, estava em discussãoo Código Civil; inclusive chegou-se a colocar a questão de postergar-se a leidos contratos de trabalho, na espera da apresentação do Código. "A opiniãoque prevalecia, porém, era de que a locação de serviços era matéria especiale não assunto de direito geral." Por que matéria especial? Porque o CódigoCivil seria permanente e a locação de serviços estava vinculada à realidadpresente do Império, isto é, sobretudo à necessidade de braços para a lavourapaulista. Devemos lembrar que o Código Civil brasileiro finalmente roipromulgado em 1917.

A redação do Código Rural considerou a opinião dos fazcnd iros,como dissemos anteriormente; uma vez em vigor, o ministro Nicol.isAvellaneda voltou a consultã-los, desta vez através da Sociedade I IIl.d

Argentina, que formou uma comissão para analisar o código rOI III 111011

opiniões controversas justamente sobre as medidas referentes à vadi"!'.(·,,,

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apatria conducta de los jueces de paz de esos partidos, y de Ia impunidad conque son abrigados esros desertores no puede S. E. ya ser indiferente a rangraves faltas y muy pronto presentará S. E. su atención a cortar tan perniciosodesordenado descuido." (AGN, JP de Ias Flores y Lobería, 1836-1852 SalaX, legajo 21-2-4)

Desertores e vadios, homens que cruzavam a campanha pelos maisdiversos motivos, como Germán Sanchez, que, quando preso, disse estarnum posto de Don Juan Fernandez, no Quequén Chico, e que dai tinhapassado aos campos de Três Arroyos para fazer engordar o gado, pordisposição de seu patrão Daniel Arana, e que, na hora da detenção,simplesmente não levava o papel que certificasse este vínculo. Como dissemos,transitavam por diferentes motivos, mas sobretudo por não seremproprietários, ou por terem vínculo muito precário com a terra.

O vínculo precário com a terra vinha criando situações de conflito,há muito tempo, como os casos analisados por Gresores, no final do períodocolonial. Em 1799, dois posseiros de terras "realengas" (que pertenciam aorei) apresentam suas queixas ao vice-rei, acusando o Alcaide da Irmandadede derrubar injustamente seus ranchos e querer, com isto, obrigá-Ios a semudarem aos fortes na fronteira. O Juiz de paz teria oferecido a um delesuma papeleta para circular livremente; "assim compreendi - disse oinfortunado - que o motivo do Alcaide era outro", já que a nenhum homemque se considere mal vizinho se ofereceria esse papel, "por 10 que concluyeque el desalojo habría sido solicitado por algún allegado del alcalde interesadoen posesionarse de Ias tierras que él ocupaba"lG Segundo Gresores, a ordemcolonial utilizara esses sujeitos para construir uma fronteira necessária nosterrenos ganhos aos índios de forma instável. A política de fronteira foi ummecanismo de controle social fundamental, em que a situação deste sujeitonão seria permanente, conseguindo estabelecer-se provavelmente em terrasna fronteira até que novamente a pressão e a ambição sobre essas oempurrassem para outras mais marginais.

Pouco depois, em 1810, informava Manuel Garda que, no campoda província de Buenos Aires, havia grande quantidade de famíliasestabeleci das em terrenos "realengos" que simplesmente os tinham ocupado,ou arrendavam por um preço muito baixo; essas famílias, afirmava,dedicavam-se a uma agricultura muito precária, pelo que o Coronel os chamade "perniciosos lavradores". Perniciosos porque cornplemenravam sua escassacolheita com o produto dos gados dos fazendeiros vizinhos. Estes costumesestariam tão enraizados que mereciam uma solução "política". A proposta

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de Garda resumia-se a quatro pontos: 1- Medição das terras, 2- Divi~.,()repartição delas, 3- Formação de pequenos povoados, 4- Segurança ti 1

fronteira. Como se pode observar, os dois primeiros pontos se referem .1

outorga de terras medidas, preocupação que percorreu todo o século.Conhecimento e repartição, sustinha García, eram a chave do problemarural, e esse trabalho devia começar pela praça da Victoria, para seguir aordem estabelecida por Juan de Garay, que era como dizer que deviamcomeçar do zero. Uma coisa fica clara, os pequenos posseiros lavradores,agregados e arrendatários, indispunham-se com os fazendeiros criadores degado; entre uns e outros, o informante escolhia defender os interesses dospecuaristas, porque, até que a agricultura não fosse aperfeiçoada o suficiente,opinava García, o país dependia daqueles.

Os pequenos produtores têm chamado a atenção dos historiadoresdesde a década de 80, pelo que não nos estenderemos muito. Simplesmentequeremos ressaltar que existiu um grupo de habitantes rurais que, emboravinculados à terra, não dispunham de um laço sólido, dividindo-se entre aagricultura e a criação de algumas cabeças de gado, atividades que eramexercidas, quase sempre, em terras alheias que ocupavam como agregadosou arrendatários. Como atividade "extrema", havia a possibilidade de algumaação fora da lei, como o roubo de gado, ou de ir para a milícia defender afronteira ou para alguma das muitas guerras do século XIX, quando erampegos sem papeleta. O certo é que esta população constituiu também umamão-de-obra na medida das necessidades de uma demanda sazonal.

Muitas vezes, dizem Bonaudo e Sonzogni, confundia-se vadio compobre, ou melhor, vadio era assimilado a pobre, perspectiva que obviamentecriava inconvenientes na hora de executar a regulamentação. Em 1855,apareceram vários pedido de especificações dos comissários dirigidos aochefe político do Rosario:

"... ruego a Ud. me diga qué hombres deben considerarse vagos... ya que en eldistrito hay solarnenre familias pobres que no cuentan con más de un caballoo a1gunos con nada pero viven honradamente y sin causar dano alguno."?

O mesmo aconteceu no Brasil. O projeto de repressão à ociosidade,apresentado quase simultaneamente com a abolição da escravidão, reconheciaduas condições elementares para definir o delito de vadiagem: o hábito e aindigência. É de destacar que a que enquadrava o delito ou infração era estaúltima já que a ociosidade dos ricos não estava em questão.

Segundo Boris Fausto, até meados do século XIX, teve pouca

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importância a perseguição da vadiagem na cidade de São Paulo, por serárea secundária do ponto de vista econômico e de escassa urbanização. Poisa perseguição da vadiagem só pode acontecer, de forma sistemática, comocomplemento da formação de um mercado de trabalho livre. É um dosinstrumentos disciplinares para a mão-de-obra. Por isso, no Brasil, se fazfreqüente a perseguição de vadios e ébrios após a abolição.

Como dissemos, após a abolição, coloca-se o problema da mão-de-obra junto com o de manter a ordem social, nos termos de fazer concorrerao liberto, dono de sua força de trabalho, a vender essa força. Esta questãoapresentava, segundo Chalhoub, duas dimensões: por um lado, uma práticaque visava propor medidas que obrigassem este potencial trabalhador a vendersua força de trabalho e, por outro, a revisão de conceitos e de valores queconstruíssem a ética do trabalho.

Em 1888, foi apresentado um projeto na Câmara dos Deputadossobre repressão à ociosidade. Na mesma época, era dirigi da uma interpelaçãoao Ministro da Justiça exigindo que o governo tomasse medidas para protegera propriedade e a segurança pessoal dos cidadãos, "já que estas, de acordocom as interpelações estavam seriamente ameaçadas pelas 'ordas' de libertosque supostamente vagavam pelas estradas a 'furtar' e 'rapinar'." Para esseshomens, o fim do cativeiro significava a possibilidade de o liberto tornar-seocioso, furtar, roubar etc, O proble~a estava, segundo um dos deputados,nas mesmas circunstâncias que são assinaladas para a Argentina: no fácilacesso a meios de subsistência: "No Brasil ... o indivíduo encontra muitasfacilidades para subsistir, pois o nosso solo é rico ... Sendo assim, a nossapopulação não precisa ter hábitos ativos de subsistência ... " 18

O caso seguinte, acreditamos, apresenta vários dos elementosmencionados que talvez esclareçam a análise. Em 1898, Domingos da SilvaPenteado, Vicente Nascimento e Francisco José Alves de Oliveira foramdetidos pela autoridade policial de Campinas por terem incorrido nacontravenção do art. 399 do Código Penal, isto é, tinham sido presos porvadiagem.'?

A defesa alegava que os mesmos tinham sido tratados brutalmente econservados ilegalmente na cadeia durante nove dias. A primeira brutalidadetinha acontecido quando seu domicílio foi invadido para a prisão. Os acusadoseram proprietários de pequenas partes de uma fazenda no bairro de Rebouças,da comarca de Campinas. Praticavam a agricultura, de onde tiravam osustento. Tinham domicílio certo e não tinham nenhuma atividade ouocupação proibida por lei ou ofensiva à moral e bons costumes. Essas

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declarações foram confirmadas por quatro testemunhas.Os três processados foram acusados por alguns vizinhos, também

testemunhas, que afirmaram que os infratores não se ocupavam em coisaalguma, que não tinham profissão nem ofício,

"Que não só a ele depoente como a outros seus collegas tem faltado diversosanimais. Criação, etc. e que atribui esses furtos aos reús presentes, porqueestes em nada se occupam."(CMU, TJC, Of. 3°, Cx. 51, Processo 9851.)

E, em carta ajuntada ao processo, os vizinhos expressavam:

"Nós a~aixo .assignados proprietários e moradores do Foguete, pedimos a V.s. providencias sobre esta gente que segue, não podemos mais com elles, egado, porcos, anirnaes, tudo nos some e não é outra gente a não ser elles,porque não trabalham, quando muito, trabalham um dia por mês." (CMU,TJC, Of. 3°, Cx. 51, Processo 9851)

Observa-se que os processados foram acusados pelos vizinhos comoresponsáveis pelos furtos acontecidos no bairro. Da mesma forma, muitoantes, na província de Buenos Aires, as formas de ter acesso aos meios desubsistência sem trabalhar disciplinadamente tinham chegando ao seu fim.Esses mesmos três sujeitos, algumas décadas antes, poderiam ter sobrevividocomo agregados nas margens de alguma fazenda, mas então suas atividadesou ausência delas ficavam muito evidenciadas. Que aconteceu com os trêspequen~s proprietários? Foram postos em liberdade porque a prisão tinhaaco.ntecldo de forma ilegal, já que não tinha sido feita nem em fragrantedelito, nem por mandado judicial. Numa sociedade que rede{inia a noçãode trabalho, eram mal vistos os que viviam do provisório ou de pequenosexpedientes.

A legislação e as praticas policiais pretendiam terminar com osprejuÍzos causados pelos "vadios" à propriedade e obrigá-Ias a concorrer aomercado. Para isto, implementaram-se critérios coercitivos com uma legislaçãoque ~ava .garantia ~ p~opriedade rural, e à propriedade em geral, e à eliminaçãodos circuitos margmals de subsistência - como na Argentina, onde se impediua chegada dos habitantes rurais a mercados informais de intercâmbio de:rut.o~ da terra ou produtos roubados - daí o contrato obrigatório para osindivíduos sem profissão ou ocupação conhecida.

Uma coisa aparece como muito evidente: a periodizaçãc da práticade perseguição à vadiagem é esclarecedora sobre o processo histórico geraldo qual forma parte. No caso argentino, em que nem as formas hispânicas

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de trabalho indígena compulsivo, como a encomenda, nem o trabalho escravoformaram parte do grosso da mão-de-obra arregimentada para as tarefasrurais, o processo de disciplinamento e coerção para o trabalho livre foianterior ao caso brasileiro, no qual a escravidão resolveu a questão dadisponibilidade de mão-de-obra para as classes dominantes até 1888.

FINAlMENTE A SOLUÇÃO DA QUESTÃO DA MÃO-DE-OBRA

A idéia de atrair populações imigrantes, sobretudo europeus, estevepresente em todos os países sul-americanos em meados do século XIX, e emtodos aqueles com abundância relativa de terras. As classes dirigentes sul-americanas clamavam por imigrantes europeus, alardeando as vantagens destestrabalhadores, em comparação com os escravos no Brasil, ou com os gaúchosindolentes na Argentina. Os braços europeus regenerariam estes países,impulsionariam o desenvolvimento econômico e modernizariam os costumes.No caso do Brasil, esses braços eram necessários para tocar as plantações decafé já existentes, além das que se iriam criando com a grande expansãocafeeira do Oeste paulista; seriam os "salvadores" da cafeicultura, "os braçospara a lavoura". Na Argentina, eles teriam que criar uma agricultura deexportação, e de fato a criaram num país em que esta era só voltada aomercado interno. Por diferentes meios, alguns intencionais e outrascircunstâncias que foram totalmente alheias às políticas locais, os imigranteschegaram em massa aos portos de Santos e Buenos Aires nas últimas décadasdo século XIX. Para trás deixavam um passado com dificuldades suficientespara terem decidido emigrar para terras totalmente desconhecidas.

Finalmente chegou a solução, mas, ao chegar, já não era o que setinha almejado, se realmente se tinha almejado. "Mas seguramente não eraa menor das ironias da história brasileira, que quando finalmente se instaloua imigração em massa, ela não criou um novo Brasil, como se esperava, masserviu, ao contrário, para amparar a combalida estrutura do velho", afirmaMichael Hall. O mercado de trabalho continuou a manter-se"desterritorializado"; já não era o tráfico negreiro que manteria a oferta demão-de-obra, mas, como diz Luiz Felipe de Alencastro, "era ainda fora dopaís que os fazendeiros de café recrutariam a maioria de seus trabalhadores,antes vinham africanos, agora chegavam proletários estrangeiros"."

Depois de longos debates, o Brasil tinha optado pelas passagenssubsidiadas. Em relação a qual seria o melhor imigrante para o Brasil, tinhatriunfado a idéia de que o melhor imigrante era o mais pobre. Na Argentina,

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o processo não foi unívoco; na realidade, houve alternância entre imigraçãoespontânea e subsidiada." Dizemos que a imigração foi a solução para aquestão da mão-de-obra, mas no Brasil isso não valeu para todo o país, e simpara São Paulo. A abolição da escravidão resultou em problema para areposição da mão-de-obra nas regiões cuja atividade econômica principal seencontrava em decadência, ou não estava voltada para o mercadointernacional, como o caso do Rio de Janeiro.

Por outro lado, a imigração nos coloca uma questão que ficava semresolução: os nacionais. O trabalhador nacional foi quase esquecido e algumasvozes que se levantaram clamando por medidas que o incluíssem, não fazemmais do que evidenciar a sua marginalização. José Hernández, o escritor deMartin Fierro, defendia, na década de 80, a criação de colônias de nacionaisna província de Buenos Aires, argumentando que estas produziriam melhoresresultados que qualquer regime policial e que as mais severas disposiçõessobre a vadiagem. O "vício" e a "vadiagem" não eram parte do caráter dosfilhos da terra, mas acidentes impostos pelas circunstâncias. Em toda aAmérica Latina, dizia - com exceção do Chile -, predomina o costume demanter no abandono as classes proletárias: "EI lepero de México, el llanerode Venezuela, el montuvo de Ecuador, el cholo del Perú, el coya de Bolivia eel gaucho argentino no han saboreado todavía los beneficios de Iaindependencia, no han participado de Ias ventajas del progreso ..."22 É possívelacrescentar o caboclo, o caiçara, o liberto no Brasil? Acreditamos que sim.

Já não existiam fronteiras a defender, mas havia braços forçosamenteociosos por causa da falta de demanda do setor rural. Era o governo, segundoHernández, que devia dar solução à miséria dessa população, criando colôniasde argentinos. As leis que castigam, dizia, não são sempre as que corrigem,e, com certeza, as melhores eram as que previnem. "Las leyes penales buscanal delincuente para castigarIo; pero Ias leyes admministrativas deben buscaral hombre honrado para ayudarlo." No Brasil, as colônias de nacionais foramuma realidade, embora de alcance muito limitado, dada a quantidade depessoas no setor de subsistência. Segundo Halperín Donghi, do Martin Fierroa Juan Moreira, duas obras da literatura gauchesca argentina, passa-se dacrítica política à crítica social. Quando Martfn Fierro está preso na fronteira,tem como colegas de prisão um italiano e um inglês, que se queixavam d.l

ilegalidade da reclusão, dada a condição de estrangeiros. Esta desigualdadeseria a razão, segundo o mesmo autor, da animosidade dos pobres ruraiscom os despossuídos estrangeiros, mais bem defendidos pelo Estado opu SSOI,

Por outro lado, o Juan Moreira de Eduardo Gutierrez mata o COI1lClll.1I11l

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italiano rico que quer cobrar dele a dívida que mantinha. Com esses doisepisódios, Halperín ilustra essa passagem de que falamos. Na versão originaldo projeto imigratório, buscava-se - na imigração - o elemento transformadorda tradicional sociedade rural, mas, na década de setenta, aparece a idéia deestender para a população nativa os benefícios que aquela versão destinavaaos imigrantes. Esta posição foi defendida pelo já citado José Hernández, epor Nicasio Orofio e Alvaro Barros. .

Durante a década de 50, depois do fim do tráfico, quando fOIexperimentada a parceria na província de São Paulo, os relatórios dospresidentes da província quase deixam de fazer referência à evangelizaçãodos índios. Mas, uma vez comprovado o fracasso da parceria, voltam aaparecer alusóes à possibilidade de ser essa a saída para o problema da mão-de-obra.

"Devia ser este - dizia João Jacyntho de Mendonça ao se referir à catequesedos índios - talvez o serviço mais bem montado ... porque é bem singular quetenhamos feito os maiores sacrifícios para a obtenção da população estrangeira,e deixemos a indigena entregue aos seus habitos selvagens..."23

Outro momento de inflexão no debate da questão mão-de-obra, foia década de 70. Nesta década, em que foi sancionada a Lei do Ventre Livre,em 1871, realizaram-se dois Congressos Agrícolas, no Rio de Janeiro e noRecife, em 1878. No final dessa década, os preços nominais dos escravosatingiram seu auge, tanto no Vale do Paraíba como no Oeste Paulista. Oclima da década foi de busca de alternativas ao trabalho escravo. E, na provínciade São Paulo, o presidente chamava a atenção para o fato de que:

" ... não é só com colonos estrangeiros que temos trabalho livre: muitas famíliasnacionais existem hoje trabalhando em nossas fazendas, sob o mesmo contratoadmittido para as colonias e com proveito tanto para ellas como para osfazendeiros. É ainda um beneficio que devemos à immigração, foi dia que nosdeu tão bom exemplo, pois que antes não havia noúcia que uma só pessoalivre quezesse contratar-se como trabalhador para os serviços rurais dafazenda. "24

O presidente tinha um exemplo disso na carta de um fazendeiro, LuizAntonio da Silva Fidalgo, de São José do Parahyba, que tinha contratadotrabalhadores nacionais para a cultura do café e do algodão. Tratava-se de umafazenda com 63 famílias de nacionais trabalhando sob contrato de parceria.

Segundo Peter Eisenberg, o trabalhador livre nacional teve vários

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defensores no século XIX, motivo pelo qual é difícil determinar por quemotivo esta via não vingou. Para Furtado, havia uma oferta de mâo-de-obi ainterna potencial, que, por uma espécie de equilíbrio regional entreoligarquias, não foi mobilizada para o café. No caso do Brasil, o crescimentoeconômico, baseado na agricultura, era em extensão, o que significava ampliara utilização de fatores disponíveis, neste caso, a terra; mas, para isto acontecer,era necessária a incorporação de mão-de-obra. A chave do problema era amão-de-obra. Furtado se pergunta se não existia um oferta potencial demão-de-obra no setor de subsistência. Em primeiro lugar, o recrutamento,dentro deste setor, demandaria grandes recursos e a cooperação dos grandesproprietários de terra, que enchiam suas propriedades de dependentes. Noterceiro quartel do século XIX o preço do café se recupera, enquanto o doaçúcar continua baixo, criando-se uma forte pressão para transferir mão-de-obra de um setor para outro, do Norte do país para o Sul. Mas essa populaçãonão se deslocou na oportunidade, provavelmente pela não cooperação dosgrandes proprietários do Norte, embora tenha havido um grandedeslocamento por ocasião da borracha amazônica, como afirma Furtado. Aenorme transumância seria um indicador de que, no fim do século XIX, jáexistia no Brasil um' reservatório substancial de mão-de-obra, do que concluique, se não tivesse sido possível solucionar o problema da lavoura cafeeiracom imigrantes europeus, teria surgido uma solução alternativa dentro dopróprio país. No Congresso Agrícola do Rio de Janeiro, houve um certoconsenso, não só de que o trabalhador nacional era uma das alternativaspara resolver a "falta de braços", mas também de que a coerção era o meiopara fazer que este concorresse ao mercado. Segundo Peter Eisenberg: "Quemidentificava a ociosidade como resultado da falta de repressão apelou para a'correção e polícia que moralize e sujeite ao trabalhador a classe jornaleira'.Muita gente pediu uma maior repressão da vagabundagem, 'uma boa lei delocação de serviços' ... "25

Há uma diferença substancial entre o potencial trabalhador nacionalna Argentina e no Brasil. Neste último caso, como toda a bibliografia indica, apopulação no setor de subsistência era significativa do ponto de vista quantitativ ,enquanto que a Argentina era um país escassamente povoado, no qual, desd mprimeiros anos da vida independente, tinha-se tentado arregimentar e disciplinara população rural. Simplificando muito, o gaúcho não é pensado com limaalternativa "civilizatória", como o trabalhador a serviço do Estado 'dmfazendeiros. Só depois de se dispor de abundante mão-de-obra foi que, . P '11.\011

em incorporar o nacional ao país "recriado" pelos imigrantes,

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Quando, na historiografia argentina, se fala de conformação domercado de trabalho e, inclusive, de transição de formas pré-capitalistas detrabalho para formas capitalistas, faz-se referência a uma realidade muitodiferente da brasileira, de transição entre escravismo e mercado de trabalholivre. Mas, nas duas modalidades, não se prescindiu da violência. A"transição", no Brasil, diz Peter Eisenberg, estende-se por todo o séculoXIX, desde 1810, quando o tratado entre a Inglaterra e Portugal comprometeuD. João VI a cooperar com a abolição do tráfico de escravos, até 1888,quando é abolida a escravidão. E, inclusive, essas datas, acrescenta, dizemrespeito ao discurso oficial e a leis, sugerindo que a transição poderia tercomeçado, em algumas regiões, ainda antes do traslado da corte.

CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA COMPARAÇÃO PROPOSTA

Prover-se regularmente de mão-de-obra foi a premissa depois daindependência. As vias ensaiadas pelo Brasil e pela Argentina foramdiferentes. No Brasil, a escravidão e o sistema escravista permearam asociedade como um todo. A existência de uma fronteira aberta, mas inacessível- economicamente falando - sem trabalhadores que derrubassem as matas,criou uma camada de homens livres vivendo às "margens" do sistema. Quandoo fim da escravidão foi cogitado, a solução aventada foi a importação detrabalhadores, embora também se cogitasse a possibilidade de abastecer ademanda de braços com os nacionais. Não podemos esquecer duas coisas: aconjuntura internacional de grandes migrações e o consenso gerado em tornodos imigrantes europeus como regeneradores de costumes civilizados emsociedades degradadas. A legislação sobre contratos de trabalho tendeu aregulamentar a relação entre patrão e trabalhador, mas não propôs fazer otrabalhador, ou potencial trabalhador nacional, concorrer obrigatoriamenteno mercado em formação. Isto se faz mais evidente se comparada com alegislação do mesmo período na Argentina. Também foi difícil para otrabalhador estrangeiro chegar sem contrato de trabalho, porque, como dizGebara, essa relação de trabalho tipicamente capitalista, em que a ausênciade contrato é um instrumento de que dispõe o trabalhador para pressionar oempregador, não poderia prevalecer em zonas de fronteira agrícola, semafetar os custos de produção.

Uma das interpretações mais corriqueiras da lei de terras de 1850 éque e ta sancionou e consagrou a propriedade privada da terra e a venda01110 única forma de alienação da terra pública para impedir aos imigrantes

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o acesso à terra através da posse.26 Achamos oportuno fazer algunsesclarecimentos a respeito. Existe uma grande diferença entre a conjunturade 1850, quando foi feita a lei de terras e a de 1870, quando a imigraçãocomeça a ser quantitativamente considerável. São duas conjunturas políticase econômicas diferentes. Na década de 1850, ainda existia a possibilidadede um outro modelo, o da pequena propriedade, atuando como fator deatração da imigração espontânea. A década de 1870 constitui um momentode inflexão no debate da questão mão-de-obra; nessa década, sancionou-se aLei do Ventre Livre, de 1871, e realizaram-se os dois Congressos Agrícolas,nos quais também se debateu a questão do trabalhador. Luís Felipe deAlencastro diferencia as duas posições tomadas nos debates de 1850. Umadas posições era formada pelos interessados em manter a grande propriedadee a economia agrícola de exportação, representada por fazendeiros e grandescomerciantes. A outra posição era a dos que estavam preocupados com oestado social da nação, integrada pela burocracia imperial, a intelligentsia e apopulação branca das grandes cidades, interessados no embranquecimento.Daqui surgiram duas opções: imigração dirigida versus imigração espontânea.Se buscasse substituir os escravos pelos imigrantes nas fazendas, o Estadodevia intervir "aquém dos fluxos migratórios", com subvenções oficiais, e"abaixo dos fluxos migratórios", com a regulamentação do acesso ás terraspúblicas. "Se se pretendia atrair colonos ('imigração espontânea) parareestruturar a propriedade, a produção e a sociedade rural, os créditosorçamentários destinados à colonização seriam então concedidos para aelaboração de um cadastro de terras públicas." O que queremos salientar éque, em 1850, quando foi sancionada a Lei de Terras, o objetivo não foiimpedir o acesso do colono àquela; esta foi uma deturpação da Lei, e nãoseu espírito. Já na década de 70, a situação era outra."

No caso argentino, até que o imigrante se apresentou como soluçãoà escassez de braços, tentou-se obrigar o habitante rural livre e despossuídoao recrutamento para o trabalho "regular". A perseguição da vadiagem visavatrês objetivos. Em primeiro lugar, recrutar homens para a defesa da fronteirae outros serviços militares num país em contínuas guerras - internas cexternas. Em segundo lugar, acabar com as alternativas de subsistência dohabitante rural; este último objetivo apontava a proteção da propri dadcrural e, por outro lado, nos conduz ao terceiro, que era disponibilizar a míkde-obra para os fazendeiros. A existência da fronteira era um obstá ulo .Imtrês. Por outro lado, a necessidade de manter segura a fronteira levou a 11111.1

perseguição dos pequenos possuidores, nas asseguradas terra próxim.iv ,I

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Buenos Ai~es, ao ~orte do rio Salado, como exemplifica, empurrando-ospara. as mais próximas da linha de defesa. A perseguição da vadiagem noBrasil deu-~e em outro contexto, que foi o pós-abolicionista.

DIZ Andre~. Doeswijk que havia certa contradição entre a formade recrutamento militar e a demanda de mão-de-obra dos 1: dei d, . razen elros aprovíncia ~e Buenos Aires, sendo esta contradição parcialmente solucionadacom. a legIslação. que se dirigia a dificultar ao gaúcho sua subsistência comoser livre, O serviço da fronteira a guerra civil e a do P . l' .di . .' araguai e rrnrnaram ava lage~ da. forma mais radical, suprimindo o gaúcho livre ou acorrentando-? na .e.stancla. Mas a contradição, continua o autor, subsistia, já que, aoimobilizar o trabalhador, o mercado perdia flexibilidade na oferta. 28

. 1IÉod~p.roduç~o agrícola tem, como caracrensrica, as atividadessazonais. dlfíd medir este componente, mas evidentemente é m UI'to " .

1" ivid d rnarssazona, a atrvi a e cerealífera e pecuária dos pampas, que a da produçãodo cafe, que requer cuidados durante todo o ano Enquanto o . .. d '. . s anImaISpreclsa~ e malOr~s CUIdados, na época das parições, da tosquia, e damarcaçao, os cercars demandam maior quantidade de trabalho em doismoment~s: na sem~adura e na colheita, principalmente nesta última, quedeve realizar-se rapidamenre, para evitar prejuízo. Em síntese, a época detrabalho e:a.de novembro a maio. Por este motivo, as disposições anteriores,como o Codigo Rural (I 869), estipulavam que os contratos de trabalho podiser pelo tempo necessário, fosse por uns dias quinzena meses o Iam1 . " , u um ano,enquanto a er de locação de serviços estabelecia como mínimo cinco anospara os trabalhadores estrangeiros.

fi O modelo da pequena propriedade argüido na década de 50~acassava e o da grande propriedade ganhava uma nova justificativa. O

sistema de Wakelfield, que tinha sido debatido na década de 1840 éretomado: '

"Ascelebres palavras de Arthur Joung, diariamente repetidas: _'Dae ao homemposse se~ra de um rochado nú, e elle o rransformará em um jardim, dae-lheu~ Jardim com um longo arrendamento, e elle o transformará em um deserto'- Ja receberam dos factos, por seu exagero formal condemnação."

P A grande lavoura. n~cessitava de braços, dizia o presidente de São;ulo, em 188~, para substituir os braços escravos. Mas isto não era novidade;a a reproduçao, segundo ele, do que tinha acontecido em outros países:

"Quando, na Austrália ... se começou a duvidar das vantag d di _ens a ispersao

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dos colonos, collocados em pequenos campos, adquiridos a sua custa, inquiriase ... se não havia meio de, sem violar a liberdade individual, reter durantecerto tempo, os trabalhadores e os operários ao serviço dos capitalistas, emanter assim uma certa concentração que parecia útil ao progresso da culturae da civilização. "29

Na introdução do censo de 1920, que foi o primeiro documentoestatístico que mostrava o resultado da imigração nos estados do Sul doBrasil, Oliveria Vianna exaltava os valores da elite latifundiária, colocandoem segundo plano a questão numérica da imigração; era o reconhecimentooficial, disse Chiara Vangelista, do papel político, cultural e econômico danova elite paulista. ''A grande imigração começava a mostrar seu efeito nummomento pouco propício para um reconhecimento de parte dos intelectuaisnacionais." O silêncio tinha origens mais profundas que as referênciascronológicas - estes intelectuais tinham escrito entre a Semana de ArteModerna e o Estado Novo. "O nó da questão estava na forma de acesso àterra. O imigrante não constituía objeto de atenção e de estudo porque eraassimilado à terra (...) não era um agente transformador. ..»so

NOTAS

I BLOCH, Marc. Pour une histoire comparée des sociétés européennes. In: Mélangesbistoriques. Tome 1. Paris: S.E.Y.P.E.N., 1963, p.18-19; HAUPT, Heinz-Gerhard. Olento surgimento da uma história comparada. In: Passados Recompostos. Campos e canteirosda história, Rio de Janeiro: Editora UFRJ/Editora FGY, 1998. Segundo Lucette Valensi,o projeto de Bloch foi mal recebido tanto pela revista Annales como pela JJcolepratique desHautes Études - Vle Section. A primeira nem tem a rubrica regular sobre história comparadae a École não inscreveu o projeto dentro de seu programa. Cf. VALENSI, Lucette. Retourd'Orient: de qualques usages du cornparatisme en histoire. ln: ATSMA, Hartmut &BURGUIt.RE, André (Comp.) Marc Blocb auJourd'hui: histoire comparée & SciencesSociales. Paris: Éditions de l'École des Haures Études en Sciences Sociales, 1986, p.309-310.

2 Estas precondições são difíceis de determinar. Magnus Mõrner estimula todo tipo decomparação, inclusive aquelas com baixo nível de analogia e diacrônicas. Sobre esteparticular, Ciro Cardoso e Pérez Brignoli alertam quanto ao perigo de incorrer emanacronismo, embora não subestimem as possíveis contribuições de uma pesquisa queaborde as estruturas sociais globais diacrônicas, salvando as diferenças de contexto histórico.MORNER, Magnus. En torno al uso de Ia comparación en el análisis historico deAmérica Latina. [ahrbucb Lateinamerikas. IBLA, 3111994, p.376-377; e CARDO ,Ciro Flamarion & PÉREZ BRIGNOLI, Héctor, Os métodos da história. Rio de janeiro:Graal, 1983, p.416.

3 GREEN, Nancy L Lhistoire comparative et le champ des études migratoires, ln: Annaln

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ESC Nov/dez, 1990, nO 6, p.1335-1350.4 SALVATI, Mauriccia, Histoire conrernporaine et analyse comparative en Italie. Gêneses.

Sciences Sociales et histoire. n" 22, 1996, p.155.5 LIMA, Manoel de Oliveira, The euolution o/ Brazil compared with that o/ Spanish andAnglo-Saxon America. Connecticut: Greenwood Press Publishers, 1914 -,Antes deste,pode ser mencionada a trilogia de Handelmann composta por História dos Estados Unidosdo Norte; História da Ilha do Haiti e História do Brasil, as três formando sua História dacolonização e independência da América, que foi publicada em Kiel em 1856, e só traduzidaao português (tardiamente) sua História do Brasil. HANDELMANN, H. Historia doBrasil. Tradução do IHGB. 2 ed. Tomos 1 e 2. São Paulo: Melhoramentos/ InstitutoNacional do Livro/ Ministério de Educação e Cultura, 1978, p.23.

6 É de destacar que pelo "Brasil" estamo-nos referindo às regiões produtoras de café eaçúcar, já que outras pouco povoadas e com pequeno número de escravos, como o Ceará,recorreram desde cedo a um severo controle do movimento da população. Ver:PINHEIRO, Francisco José. A organização do mercado ele trabalho no Ceará (1850-1880).Dissertação de mestrado em História. Recife: Universidade Federal de Pernambuco,1990. Devemos lembrar que as restrições à liberdade de movimento da mão-de-obra têmantecedentes no Estatuto dos trabalhadores, de 1351, com que se tentou, através de umamedida do governo central inglês, reter os trabalhadores nas paróquias onde eram requeridospelos senhores. Maurice Herbert Dobb, A evolução do capitalismo. São Paulo: Abril, 1983,p.38. Em artigo recente, Lígia Osório Silva resgata, dentre a historiografia portuguesa, aperspectiva de "lei de trabalho" mais do que "lei de terras" que tinha a que foi conhecidae divulgada como Lei de Sesmarias, promulgada em meio à crise agrária do século XIV: Leique mencionava 19 vezes o verbo coagir e nenhuma vez sesmaria ou sesmeiro. VirgíniaRau informa que data do século XIII (1211) o primeiro diploma legislarivo português quemanda perseguir os vadios. Quando nas cones de Lisboa de 1371 e 1372 se elabora a Leide Sesmarias, o problema no campo se alastrava havia mais de um século, " ... não tendocom as antigas sesmarias mais que um pontO de contato: a obrigatoriedade de cultivo (... )Tudo o mais é a codificação e aperfeiçoamento de preceitos legais anteriores referentes aoêxodo dos trabalhadores rurais, à cornpulsão ao mester da lavoura, a taxa dos salários, aosfalsos mendigos e vadios, erc.", RAU, Virgínia. Sesmarias medievais portuguesas. Lisboa:Presença, 1982, p.87-89 Ver: SILVA, Lígia Osório. Feudalismo, capital mercantil ecolonização. In: MORAES, João Quartirn de. e ROlO, Marcos Del.(orgs.) História domarxismo no Brasil. Volume IV: Visões do Brasil. Campinas: Editora da Unicamp, 2000,p.11-67, principalmente p.41-46.

7 Decreto do Poder Executivo da Província de Buenos Aires de 19 de Abril de 1822, em:BAGÚ, Sérgio. El plan económico del grupo riuadauiano 1811-1827, con secciôn Documental.Rosario: Instituto de Investigaciones Históricas, 1966, p.160.

R Partido: divisão territorial e administrativa que tem por cabeceira um povoado principal.Esta divisão corresponde à entidade política administrativa da província de Buenos Aires,as Outras províncias argentinas são divididas em departamentos. Ver: PICCIRILLI, Ricardo,ROMAY, Francisco e GIANELLO, Leoncio. Dicionário histórico Argentino. Buenos Aires:Ediciones Históricas Argentinas, 1954, p.673. Loberia foi até 1865, em que foram criadosv~rios partidos, entre eles o de Necochea, um extenso partido que incluía aquele.

'I Lembremos que o passaporte na época de Rosas era um instrumento necessário para

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transitar pelos Parnpas, a ponto de Charles Darwin necessitar um desses, feito em S li

caso, pelo próprio Juan Manuel de Rosas: "Ao chegarmos a uma casa de posta, informounos o proprietário de que, a não ser que levássemos passaporte regular, não poderíamospassar. .. Quando leu em meu passaporte, porém que começava 'EI naturalista DonCarlos', encheu-se de tanto respeito e cortesia quanto antes tinha de desconfiança."DARWIN, Charles. Diario das investigações sobre a História Natural e geologia dos paisesvisitados durante a viagem ao redor do mundo pelo navio de Sua Magestade 'Beagle' sobcomando do capitão Fitz Roy. (1871) São Paulo: Abril. s/d, p.37. Este mesmo instrumentode controle também é encontrado em algumas províncias do nordeste brasileiro, ver:PINHEIRO, Francisco José, A organização do mercado de trabalho no Ceará (1850-1880)op. cit, Codigo Rural de Ia provincia de Buenos Aires, ln: GOYENA, Juan. Digesto ruraly agrario. Recopilación de leyes, decretos, resoluciones y f~los de Ias cortes feder~ yprovinciales, etc, Comprende desde 1810 a 1891. Buenos Aires: Irnprenta Juan Alsina,

1892, p.115-137. .:'o GEBARA, Ademir, O mercado eletrabalho livre no Brasil (1871-1888). São Paulo: Brasiliense,

1986, p. 79. ALBERDI, Juan Bausrita, Fundamentos da organização politica da Argentina.Tradução Angela Maria Naoko Tijiwa. Campinas: Editora da Unicarnp, 1994, p.189.Referindo-se à Constituição de 1823, Caio Prado Jr. diz: "O que choca em primeiro lugaré o xenofobismo estradado dos constituintes. No dizer de Aurélio Leal, o redator doprojeto, Antônio Carlos, cada vez que nela escreveu a palavra estrangeiro teve diante de sio fantasma português, que por seu turno evocava o espectro da re-colonização ( ... ) Porisso, o projeto está cheio de restrições aos estrangeiros ... " PRADO, Caio. Evoluçãopolitica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1985, p.54-55. LAMOUNIER, Maria. Lúcia, Daescravidão ao trabalho livre (a lei de locação de serviços de 1879). São Paulo: Papirus, 1988,

p.61.11 Brasil Colecção das leis, Lei de 13 de setembro de 1830, Lei 108 de lIde setembro de

1837 e Lei 2.827 de 15 de março de 1879. No que diz respeito ao escravo na legislaçãobrasileira no período 1808-1889, Chaia e Lisanti arrolaram 884 textos legais sobre diferentesaspectos como: castigos, impostos e taxas, alimentação e higiene, trabalho, etc. De todosos itens, punições e impostos mereceram mais medidas por parte dos legisladores. Ver:CHIARA, [osephina e LlSANTI, Luís, ° escravo na legislação brasileira, (1808-1889).Revista de História. Ano XXV, Vol. XLIX, 1974, p.241-248. "No âmbito do governoimperial, de todos os seus decretos, leis e decisões durante o século XIX com referência àescravidão, 81% foram promulgados entre 1850 e 1888", EISENBERG, Peter, Amentalidade dos fazendeiros no Congresso Agrícola de 1878. Homem esquecidos. Escravose trabalhadores livres no Brasil. Séculos XVIII e XIX. Campinas: Unicamp, 1989, p. 133-

166.12 LAMOUNIER, Maria Lúcia, Da escrauidão ao trabalho livre (a lei de locação de serviços

de 1879). op. cit., p.l06.l3 BOREA, Domingo, Legislación agraria en Ia República Argentina. Buenos Aires: Edi iOIH'\

Carlos Gide, 1948, p.204. Ver: STORNl, Carlos Mario, Las disposiciones de 105 ódi"O\rurales en matéria de labor y sus raíces históricas. Separata Revista de Histeria dei Der« /11I.

nOl, 1973, p.177-204.'4 FAUSTO, Boris, Crime e cotidiano. A criminalidade em São Paulo (1880 192 ). S.II'

Paulo: Brasiliense, 1984, p.35.

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15 Archivo General de Ia Nación, Juzgado de paz de Ias Flores y Lobería, 1836-1852 Sala X,legajo 21-2-4. Doravante AGN, JP, Sala e Legajo ao lado do texto. Suprimidos os cabildosem 1821 criaram-se os juizados de letrados de primeira instância e de paz. Dos primeirosdois, dois civis e dois penais, os quatro em Buenos Aires, e os juizados de paz, como únicasautoridade no meio rural. "Papeleta según eI diccionario de Ia Real Academia Espafiola,significa "cédula" y como tal, papel o documento oficial donde constan anotaciones decarácter jurídico, de diversa índole y que sirve para identificar Ia persona (...) En pri merlugar Ia papeleta fue el documento que acreditaba el cumplimiento de Ias obligaciones queIa ley imponia a los habitantes de Ia ciudad y Ia campafia en relación aios deberes de índolemilitar (...) pero también otro documento, con el mismo nombre de papelera servia paraprobar Ia condición de jornalero o asalariado ..." STORNI, Carlos Mario, Acerca de Iapapelera y los juzgados de paz de Ia campafia bonaerense. Revista dei Instituto de Historia deiDerecbo. nO20, 1969, p.153-156.

16 GRESORES, Grabriela, Productores direcros o criminales: miradas contradictoriassobre Iapoblación campesina, San Vicente, 1799. In: GRESORES, Gabriela & BlRACCO,Carlos M. Arrendamientos, desalojas y subordinaciôn campesina. Elementos para el análisisde Ia campafia bonaerense en el siglo XVIII. Buenos Aires: Fernado Garda Cambeiro,1992, p.13. Durante a época colonial, a justiça ordinária era exercida por dois alcaides, deprimeiro e segundo voto do Cabildo; esta instituição também designava os alcaides daSanta Irmandade, cuja jurisdição era civil e criminal no âmbito rural, não existindo umaseparação entre as funções judiciais, policiais e executivas. Não obsrante, adverte-nosRaúl Fradkin para a precariedade do poder destes funcionários, apesar do que poderiasugerir a concentração de funções. O número de alcaides e as subdivisões jurisdicionaisforam aumentando sucessivamente na medida em que cresciaa população rural. FRADKIN,Raúl. La experiencia de Ia jusricia: estado, propietarios y arrendatarios en Ia campafiabonaerense (1800-1830). Segundas Jornadas de Historia Econâmica, Montevideo, Julho de1999. Sobre organização judicial no período hispano ver: Ricardo ZORRAQufN BECÚ.Ia organización judicial argentina en el periodo hispânico, Buenos Aires, Librería del Plata,1952.

17 Archivo de Ia jefacura de Polida 1855, citado In: BONAUDO, Marta & SANZOGNI,Elida. Cuando disciplinar fue ocupar (Santa Fe, 1850-1890). Mundo Agrario, Revista deescudios rurales. n01, Segundo semestre, 2000.

18 CHALHOUB, Sidney, Trabalho, lar e botequim: vida cotidiana e controle social da classetrabalhadora no Rio de Janeiro da Belle Epoque. Dissertação de mesrrado. Niterói:Universidade Federal Fluminense, 1984, p.67.

19 Centro de Memória Unicamp, Tribunal Justiça Campinas, Oficio. 3°, Caixa. 51, Processo9851. "O controle social dos vadios foi feito em especial através das prisões, não havendoem regra muito empenho das autoridades em processã-los". FAUSTO, Boris, Crime ecotidiano. A criminalidade em São Paulo (1880-1924). op. cit., p.39. Ver na mesma obratabela da página 5, em que aparece a relação entre prisões e processos.

20 llALL, Michael M. Italianos em São Paulo (1880-1920). Anais do Museu Paulista, TomoXXIX, 1979, p.201; ALENCASTRO, Luiz Felipe de. Proletários e escravos: imigrantesportugueses e cativos africanos no Rio de Janeiro, 1850-1872. Novos Estudos Cebrap.n021, Julho 1988, p.30-56.

11 Já no governo de Juan Manuel de Rosas, se importaram trabalhadores galegos com

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passagens subsidiadas: "...significativamente es Ia casa Llavallol (antes especializada en Icomercio de negros) Ia que, apoyada en esas subvenciones, los introduce ..." HALPEIÚNDONGHI, Túlio. (Para que Ia inmigración? op. cito p.204. As presidências de MirreSarmiento optaram pelo que chamou-se imigração espontânea, Avellaneda pela artificial,que depois abandonou. Roca retomou a imigração subsidiada, e Juárez Celman a continuou.O orçamento passou de um milhão de pesos em 1887 a seis milhões em 1889. Ospresidente Pellegrini, Saez Pena e Uriburu seguiram o sistema de imigração espontânea.Ver: BELTRÁN, Manuel. Inmigraciôn y colonizaciôn, Tesis para optar al tículo de Doctoren jurisprudencia. Universidad de Buenos Aires, Faculrad de Derecho y Ciencias Sociales.Buenos Aires: Tipografía EI Hogar y Ia Escuela, 1899, p.30-33. Entre final do século XIXe início do XX uma série de reses que têm como tema a colonização e a imigração quevinculam a questão da imigração ao acesso à terra, são apresentadas na UniversidadeNacional de Buenos Aires, na Faculdade de Direito e Ciências Sociais para optar pelotítulo de Douror. Sobre passagens subsidiadas para aArgentina ver: CONTRERAS PfREZ,Francisco. Recluta masiva de emigrantes andaluces y su inserción social en Argentina(siglo XIX). Nuevas notas para su estudio. Anuario de Estudios Americanos, Tomo Llll, 2,1996, p.173-197.

22 HERNÁNDEZ, José. Colonias formadas por hijos del pais. In: HALPEIÚN DONGHl,Túlio. Proyecto y construcciôn de una naciôn: Argentina 1846-1880. Venezue!a: BibliotecaAyacucho, s/d, p.404.

23 Relatorio apresentado àAssem bléa Legislativa provincial de São Paulo na primeira sessãoda 14"legislatura pelo presidente Doutor João [acyntbo de Mendonça, São Paulo, 7jp. Imperial doJoaquim Roberto de Azevedo Marques, 1862, p.44.

24 Relataria apresentado à Assembléia Legislativa provincial de São Paulo pelo presidente daprovíncia, o Excellentissimo Senhor Doutor Antonio da Costa Pinto Silva, no dia 5 defevereirode 1871. São Paulo: Typ. Americana, 1871, p.40

25 FURTADO, Celso, Formação Econômica do Brasil. São Paulo: Editora Nacional, 1979,p.llO-135. EISENBERG, Perer, A mentalidade dos fazendeiros no Congresso Agrícola de1878. op. cir., p.133-166. No mesmo ano, em seu relatório anual, o presidente daprovíncia de São Paulo o expressava nas seguintes palavras. "A lavoura precisa de braços,e o meio de obtel-os será uma conveniente lei de locação de serviços para nacionaes e acolonisação." Relatorio com que o Exm. Senhor Doutor Sebastião José Pereira passou aadministração da prouincia ao 3°vice- presidente suplente Monsenhor Joaquim Manoel Gonçalvesde Andrade, São Paulo: Typ. do Diario, 1878, p.32.

26 Ver: SALLUM JÚNIOR, Brasilio, Capitalismo e cafeicultura: Oeste Paulista, 1888-1930.São Paulo: Duas Cidades, 1982, p.14-30; e MARTINS, José de Souza, A imigração e a crisedo Brasil Agrdrio. São Paulo: Pioneira Editora, 1973, p.81 e seguintes.

27 ALENCASTRO, Luiz Felipe de. Proletários e escravos. op. cit., p.32; PETRON "Maria Thereza Schorer, O imigrante e a pequena propriedade, 1824-1930. São Paulo:Brasiliense, 1984, p.ll.

28 DOESWIJK, Andreas Leonardo. Linyeras, braceros y bohemios de Ia lJanura parnpearu(1917-1930). Jornadas lnterescuelas de Historia. Montevidéu: Setembro, 1995. Mirneo.

29 Relatorio apresentado à Assembléa Legislativa provincial de São Paulo pelo presidente ri/I

provincia Exm. Senhor Doutor Francisco de Paula Rodrigues Alues, no dia 10 de [nnrir« tl1888. São Paulo: Typ. a Vapor de Jorge Seckler & Comp., 1888, p.31 e 3

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Page 13: Coagirpara disciplinar: História Comparada daformação do ......Nancy L. Green, sem negar este caráter do artigo, não deixa de reconhecer em François Simiand o primeiro defensor

so VANGELISTA, Chiara. Fronriera, immigrazione e cultura nazionale in Brasile tra orto enovecento. In: BLENGINO, Vanni; FRANZINA, EmiJio e PEPE, Adolfo. La riscopertadelle Americbe: lovorati e sindicato nell'emigrazione italiana in América Latina 1870-1970. Milano: Teti Editore, 1994, p.562-579.

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