Componentes químicos das células

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1.COMPONENTES QUÍMICOS DAS CÉLULAS Todas as células apresentam muito em comum. A diversidade das células encontra-se nas variações demonstradas quanto à natureza química e o arranjo de seus componentes moleculares. Estas variações conferem propriedades especiais para cada tipo celular e permitem que as mais diversas células realizem funções específicas. Portanto, para entender o funcionamento de uma célula é necessário conhecer as moléculas que fazem parte da estrutura, assim como os processos químicos que acontecem nas mesmas. As moléculas, especialmente as macromoléculas, também denominadas de biomoléculas, correspondem às estruturas básicas e fundamentais das células, sendo que as macromoléculas são formadas por subunidades mais simples (figura 1). Célula Complexo supramolecular Macro- moléculas Unidades monomérica s Figura 1. Hierarquia estrutural da organização molecular das células (Nelson, 2011) Ligações químicas As macromoléculas são constituídas por unidades menores que são os elementos químicos. Elementos químicos encontrados nos seres vivos incluem hidrogênio, carbono, oxigênio, nitrogênio, enxofre e fósforo. Portanto, esses elementos unem-se, através de ligações químicas para formarem as moléculas da vida. Uma molécula é constituída por dois ou mais átomos ligados quimicamente entre si. Por exemplo, dois átomos de hidrogênio(H) e um de oxigênio(O 2 ) formam a molécula da água (H 2 O) que é o elemento inorgânico mais encontrado nos seres vivos. Da mesma forma, átomos de carbono (C), hidrogênio (H) e Oxigênio, podem combinar-se, para formar uma molécula orgânica de glicose (C 6 H 12 O 6 ), um carboidrato.

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1.COMPONENTES QUÍMICOS DAS CÉLULAS

Todas as células apresentam muito em comum. A diversidade das células encontra-se nas variações demonstradas quanto à natureza química e o arranjo de seus componentes moleculares. Estas variações conferem propriedades especiais para cada tipo celular e permitem que as mais diversas células realizem funções específicas.

Portanto, para entender o funcionamento de uma célula é necessário conhecer as moléculas que fazem parte da estrutura, assim como os processos químicos que acontecem nas mesmas. As moléculas, especialmente as macromoléculas, também denominadas de biomoléculas, correspondem às estruturas básicas e fundamentais das células, sendo que as macromoléculas são formadas por subunidades mais simples (figura 1).

Célula Complexosupramolecular

Macro-moléculas

Unidades monoméricas

Figura 1. Hierarquia estrutural da organização molecular das células (Nelson, 2011)

Ligações químicas

As macromoléculas são constituídas por unidades menores que são os elementos químicos. Elementos químicos encontrados nos seres vivos incluem hidrogênio, carbono, oxigênio, nitrogênio, enxofre e fósforo. Portanto, esses elementos unem-se, através de ligações químicas para formarem as moléculas da vida. Uma molécula é constituída por dois ou mais átomos ligados quimicamente entre si. Por exemplo, dois átomos de hidrogênio(H) e um de oxigênio(O2) formam a molécula da água (H2O) que é o elemento inorgânico mais encontrado nos seres vivos. Da mesma forma, átomos de carbono (C), hidrogênio (H) e Oxigênio, podem combinar-se, para formar uma molécula orgânica de glicose (C6H12O6), um carboidrato.

As ligações químicas, responsáveis pela união estável entre os átomos, resultando na formação de moléculas, sendo estas as bases constituintes de toda matéria que conhecemos. As interações entre os átomos podem ocorrer por doação de elétrons, compartilhamento de elétrons ou ainda deslocalização de elétrons.

Os Elementos químicos podem formar ligações fortes, nos quais os elétrons podem ser compartilhados de forma equitativa entre os átomos. Estas ligações são denominadas de ligações covalentes (figura 2). Em alguns elementos podem ocorrer ligações simples, duplas ou mesmo triplas. A força de ligação aumenta significantemente de acordo com o seu número. Nas células, as ligações covalentes simples e duplas são as mais comuns; substâncias apresentando ligações triplas são raras.

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Os elementos químicos podem fazer diferentes combinações para formar monômeros, moléculas pequenas que, por sua vez, ligam-se entre si, formando moléculas maiores, denominadas de polímeros. Nas células, polímeros ligados covalentemente, são conhecidas como macromoléculas. As células presentam milhares de monômeros diferentes, sendo que apenas um pequeno número desempenha papel importante nas quatro classes de macromoléculas. Em grande parte das macromoléculas, as suas funções e estruturas distintas são determinadas pelas propriedades químicas dos seus monômeros.

Figura 2. Ligação covalente em quatro moléculas (Campbell, ARTMED)As pontes de hidrogênio, são ligações químicas fracas, que formam-se das interações eletrostáticas fracas entre os átomos de hidrogênio e outros átomos mais eletronegativos (que atraem elétrons), como o oxigênio, enxofre ou nitrogênio. Por exemplo, o fato do átomo de oxigênio ser mais eletronegativo e um átomo de hidrogênio não, os elétrons compartilhados, na ligação covalente entre oxigênio e hidrogênio, orbitam ligeiramente mais próximos do núcleo do oxigênio do que o núcleo do hidrogênio. Como os elétrons possuem carga negativa, isso leva a uma separação de cargas, com o oxigênio levemente negativo e o hidrogênio levemente positivo; essa é a ponte de hidrogênio (figura 3). Uma única ponte de hidrogênio é muito fraca, no entanto, quando várias pontes de hidrogênio são formadas entre moléculas, a estabilidade total da molécula pode aumentar.

As forças de van der waals são atrações fracas que ocorrem entre átomos quando eles encontram-se a uma distância menor do que, aproximadamente, 3-4 angstrons. As forças de van der waals podem desempenhar papéis significativos no processo de ligação entre enzima substrato e entre interações proteína-ácido nucléico.

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As ligações iônicas são interações eletrostáticas fracas que sustentam a ionização em solução aquosa nos sistemas orgânicos. Muitas biomoléculas importantes como ácidos carboxílicos e fosfatos são ionizados em pH que variam de 6 a 8 e, assim, podem ser dissolvidos até altas concentrações no citoplasma das células. Um exemplo, de ligação iônica é que ocorre entre o Na+ e o Cl- no NaCl (figura 4)

Figura 4. Transferência de elétrons e ligação iônica. A atração entre átomos de cargas opostas, ou íons, é uma ligação iônica. (Campbell, Artmed)

As interações hidrofóbicas são consideradas ligações fracas, pois ocorrem quando moléculas apolares ou regiões apolares de moléculas ou biomoléculas associam-se em um ambiente polar. Portanto as interações hidrofóbicas mantém as regiões apolares de moléculas diferente juntas (figura 5). Resultam de uma maior estabilidade termodinâmica através da minimização de interações com a água. Essas interações entre aminoácidos apolares são importante na estabilização de proteínas, formando uma molécula biologicamente ativa, bem como auxiliam na estabilização do RNA e das membranas celulares.

O Carbono é um dos principais componentes da macromoléculas ou biomoléculas. O carbono, apresenta uma propriedade química importante, que é a capacidade de fazer ligações entre si e com muitos outros elementos químicos, dando origem a estruturas de grande diversidade e complexidade. Nas células, diferentes compostos orgânicos, contendo carbono, demonstram diferentes padrões de ligação. Cada um destes padrões diferentes, são denominados de grupamentos funcionais, apresentando propriedades químicas exclusivas, as quais são

Figura 3. A ponte de hidrogênio é representada por três linhas azuis entre o átomo de oxigênio da molécula de cima e hidrogênio da molécula de baixo. (Nelson, 2011)

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importantes para o papel biológico desempenhado dentro da célula. Nas figura 5 e 6, encontram-se vários grupos funcionais de importância bioquímica.

Figura 5. Versatilidade das ligações de carbono. (Nelson, 2011)

Figura 6. Alguns grupos funcionais encontrados nas biomoléculas (Nelson, 2011)

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2. MACROMOLÉCULAS OU BIOMOLÉCULAS

As células são formadas por compostos de carbono. Em comparação com todos os demais elementos, o carbono é capaz de formar moléculas grandes. O átomo de carbono pode formar quatro ligações covalentes com outros átomos, além de poder se ligar com outros átomos de carbono por meio de ligações C-C (ligações estáveis) de modo a formar cadeias e anéis, originando moléculas grandes e complexas. Os compostos de carbono formados pelas células são conhecidos como moléculas orgânicas. Essas moléculas são encontradas, livres, sendo constituídas por subunidades, os monômeros, na constituição de macromoléculas poliméricas. Outras moléculas orgânicas menores podem ser utilizadas para produção de energia através das vias metabólicas. Em uma célula, pode-se encontrar milhares de diferentes tipos de moléculas orgânicas (Tabela 1).

Tabela. Composição química aproximada de uma procarionte.Compostos Percentual da massa

celular totalNúmero de cada tipo de

moléculaÁgua 70 1Íons inorgânicos 1 20Carboidratos e precursores 1 250Aminoácidos e precursores 0,4 100Nucleotídeos e precursores 0,4 100Ácidos graxos e precursores 1 50Outras moléculas pequenas 0,2 300Macromoléculas (proteínas, ácidos nucléicos e polissacarídeos) 26 3000(Nelson, 2011)

De um modo simples, pode-se considerar que as células apresentam quatro principais famílias de moléculas orgânicas pequenas: os carboidratos, os lipídeos, as proteínas e os ácidos nucléicos.

Os Carboidratos são amplamente distribuídos nas plantas e nos animais, onde desempenham funções estruturais e metabólicas. Recebem outras denominações como Hidratos de carbono,

Glicídeos, glícides, glucídios ou açúcares. Apresentam na sua Composição C (carbono), H

(hidrogênio) e O (oxigênio), a sua formula geral é representada por CnH2nOn, onde n é o número de átomos de cada composto. Os carboidratos podem ser classificados quanto ao número de monômeros em monossacarídeos, dissacarídeos, oligossacarídeos (trissacarídeos, tetrassacarídeos,...) e polissacarídeos. Os Monossacarídeos são açúcares Fundamentais (não necessitam de qualquer alteração para serem absorvidos), apresentando fórmula Geral: C nH2nOn,

onde n≥ 3. As propriedades que caracterizam os carboidratos são: solúveis em água e insolúveis em solventes orgânicos, brancos e cristalinos, maioria com saber doce e estão ligados à produção energética. O nome genérico do monossacarídeo é dado baseado no número de carbonos mais a terminação “ose”, por exemplo, 03 carbonos – trioses; 04 carbonos – tetroses; 05 carbonos – pentoses; 06 carbonos – hexoses; 07 carbonos – heptoses. Podem ainda, ser classificados ainda como aldoses (grupamento químico funcional aldeído) ou cetoses (grupamento químico funcional cetona) (figura 8).

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As moléculas orgânicas que apresentam a mesma fórmula, mas formas estruturais diferentes, são conhecidos como isômeros. E os conjuntos de moléculas que formam pares especulares são denominados isômeros ópticos. Os isômeros são largamente distribuídos entre as moléculas orgânicas em geral e têm um papel fundamental da geração da enorme variedade de

Gliceraldeído Aldotriose Diidroxiacetona Cetotriose GlicoseAldohexose

Frutosecetohexose

Figura 8. Fórmulas estruturais de alguns carboidratos comuns. (Nelson, 2011)

carboidratos. Por exemplo, a glicose pode ser convertida em açucares diferentes como a manose ou galactose, pela simples troca de orientação em relação ao carbono quiral, em relação ao resto da molécula. Por definição, é o átomo de carbono que possui 4 ligantes diferentes e que também pode receber o nome de carbono quiral. Os isômeros que diferem em apenas um carbono quiral denominados de epímeros. Na forma de anel, o epímero é chamado de anômero (figura 9).

Os dissacarídeos são combinações de açúcares simples que, por hidrólise, formam duas moléculas de monossacarídeos, iguais ou diferentes. São exemplos de dissacarídeos a lactose (glicose + galactose), maltose (glicose + glicose) e sacarose (glicose + frutose). Os polissacarídeos são carboidratos ou açúcares complexos que têm, aproximadamente, mais de 10 moléculas de monossacarídeos.

A maneira pela qual os monômeros de carboidratos ligam-se entre si, são através de ligações glicosídicas. Quando dois monossacarídeos então unidos entre si, temos então um dissacarídeo. A adição de mais um monossacarídeos origina um trissacarídeo, enquanto que a adição de outros monossacarídeos origina um oligossacarídeo. Uma cadeia extremamente longa, com centenas ou milhares de monossacarídeos origina um polissacarídeo.

As ligações glicosídicas podem ser formadas por duas orientações geométricas distintas, denominadas de alfa (α) e beta(β). Polissacarídeos que apresentam a glicose como monômero, unidos por carbonos com orientação 1 e 4 alfa, são importantes reservatórios de carbono e de energia nas células animais, vegetais e bactérias. Outro polissacarídeo muito comum, a celulose é formado pela união de monossacarídeos com ligação glicosídica do tipo β-1,4 (figura 10).

Em polissacarídeos, a unidade de repetição do polímero é frequentemente limitada a um (homopolissacarídeos) ou dois tipos de monômeros (heteropolissacarídeos). A Celulose e quitina são polissacarídeos estruturais. Já, o amido e glicogênio são polissacarídeos de reserva. Os Glicosaminoglicanos formam géis altamente hidratados.

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A celulose (principal componente estrutural da parede celular das plantas) e a quitina (principal componente estrutural do exoesqueleto de crustáceos, insetos e aranhas, maioria dos fungos e de muitas algas) são polímeros baseados em dois únicos tipos de unidades de monômeros - a glicose e a N-acetilglicosamina, respectivamente. Os dois polímeros atuam estruturalmente nos organismos. O amido (reserva energética de plantas) é constituído por dois tipos de polímeros de -D-glicose, a amilose e amilopectina. A amilose é linear e

Figura 9. Glicose e seus isômeros. Na figura acima, estão representados epímeros da glicose que diferem no centro quiral marcado de rosa. Ao lado vem dois estereoisômeros da glicose que são anômeros α e β. Os anômeros se interconvertem livremente em soluções aquosas, por exemplo, em equilíbrio uma solução contendo glicose apresenta 63,6% de anômeros e 35,4% de anômeros.(Nelson, 2011)

Figura 10. Representação esquemática das ligações glicosídicas do tipo α-1,4 (entre o carbono 1 e carbono 4); α-1,6 (entre carbono 1 e carbono 6); β-1,4 (entre o carbono 1 e carbono 4). (Nelson, 2011)

apresenta ligações glicosídicas (14). A amilopectina é ramificada e apresenta ligações glicosídicas (14) e (16) a cada 24 a 30 resíduos. O amido é encontrado em plantas. O glicogênio (polissacarídeo de reserva dos animais), que ocorre em animais, são polímeros de glicose para armazenamento de energia. Eles se diferem no grau de ramificação na estrutura do polímero, e diferem-se da celulose na estereoquímica da ligação glicosídica entre os monômeros. Em glicoproteínas, os resíduos de carboidratos são ligados covalentemente à cadeia polipeptídica; as glicoproteínas atuam como sítios de

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reconhecimento de antígenos e na adesão à superfície celular (figura 11). O acido hialurônico ou hialuronato é um glicosaminoglicano encontrado na composição do tecido conectivo, do líquido sinovial (fluido lubrificante das juntas) e do humor vítreo dos olhos. As moléculas de hialuronato são compostas de 250 a 25.000 unidades dissacarídicas unidas por ligações β(1 → 4) que consistem em ácido D-glicurônico e N-acetil-D-glicosamina (GlcNAc) unidos por uma ligação β(1 → 3).

As paredes celulares de bactérias são constituídas por peptideoglicano que é um heteropolissacarídeo, sendo responsável por dar as formas características das células bacterianas (ex: cocos ou bacilos) e proteger estas contra a lise osmótica, visto que as células bacterianas apresentam um pressão osmótica, normalmente maior, do que a do meio onde vivem. A unidade repetida de peptideoglicano é um dissacarídeo N-acetilglicosamina ligado ao ácido N-acetilmurâmico (unidas por ligações β:1 → 4) cuja cadeia lateral láctil forma uma ligação amida com um tetrapeptídeo (4 aminoácidos laterais). (Figura 12). A parede celular bacteriana consiste em cadeias polissacarídicas e polipeptídicas ligadas de modo covalente, que formam uma macromolécula como um saco que envolve completamente a célula.

Os lipídeos (do grego lipos, gordura) constituem um grupo de moléculas encontradas em todas as células. Diferentemente dos ácidos nucleicos, das proteínas e dos polissacarídeos, os lipídeos não são poliméricos. Contudo, eles se agregam e, nesse estado, desempenham sua função central como matriz estrutural das membranas biológicas. Os lipídeos exibem variedade estrutural maior que as outras classes de moléculas biológicas. Até certo ponto, eles constituem uma ampla categoria de substâncias semelhantes pelo fato de serem principalmente hidrofóbicas e levemente solúveis em água. Devido à sua hidrofobicidade, a análise dos lipídeos requer mais esforço do que os estudos de moléculas mais solúveis (e, portanto, mais fáceis de serem

Figura 11.

( Nelson, 2011)

(

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manuseadas). Os lipídeos são substâncias solúveis em solventes orgânicos de origem biológica, como clorofórmio e metanol. Os lipídeos podem ser classificados em óleos e gorduras (triglicerídeos ou triacilgliceróis), esteroides, fosfolipídeos, cerídios e carotenoides.

Figura 12. Peptidoglicano. (a) A unidade repetida de peptidoglicano é um dissacarídeo N-acetilglicosamina–ácido N-acetilmurâmico; cadeia lateral com um tetrapeptídeo. (b) O peptidoglicano da parede celular da bactéria S. aureus, mostrando suas pontes de conexão de pentaglicina (em roxo). (VOET, 2014).

Em geral, os lipídeos desempenham funções biológicas (embora certos lipídeos aparentemente

exerçam mais de uma função em algumas células) importantes como: reserva de energia e

combustível celular (triacilgliceróis); estrutura e composição das membranas celulares (fosfolipídeos e glicolipídeos); isolamento e proteção de órgãos (Impermeabilizante-ceras; isolante térmico); hormonal-comunicação celular (esteróides); anti-oxidante (vitaminas A e E) e digestiva (sais biliares).

Ácidos graxos são ácidos carboxílicos de cadeia longa, saturados ou insaturados que possuem

número par de carbonos uma vez que são sintetizados a partir da acetil-CoA. Os ácidos graxos

são as biomoléculas mais calóricas, apesar de os carboidratos serem bem mais eficazes na produção de energia. O metabolismo energético dos lipídeos acontece, portanto, secundariamente ao dos carboidratos, o que torna os lipídeos que contém ácidos graxos, notadamente os tri-acil-gliceróis (triglicerídeos) as principais biomoléculas de reserva energética. De fato, a própria absorção dos lipídeos se dá de forma a favorecer esta função. Nas plantas e nos animais superiores, os resíduos de ácidos graxos predominantes são os de C16 e C18: ácidos palmítico, oleico, linoleico e esteárico. Ácidos graxos com número de átomos de carbono , 14 ou 20 são incomuns. A maioria dos ácidos graxos tem número par de átomos de carbono, pois são biossintetizados pela associação de unidades C2. Mais da metade dos resíduos de ácidos graxos dos lipídeos dos vegetais e dos animais são insaturados (contêm ligações duplas) e,

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muitas vezes, são poli-insaturados (contêm duas ou mais ligações duplas). Os ácidos graxos bacterianos raramente são poli-insaturados, mas em geral são ramificados, hidroxilados ou contêm anéis de ciclopropano (Figura 13).

As gorduras e os óleos existentes em plantas e em animais consistem, na sua maioria, em misturas de triacilgliceróis. Gorduras e óleos (que se diferem somente pelo fato de gorduras serem sólidas e óleos serem líquidos em temperatura ambiente) são misturas complexas de triacilgliceróis, cujas composições de ácidos graxos variam com o organismo que os produz. Os óleos vegetais são geralmente mais ricos em resíduos de ácidos graxos insaturados que as gorduras animais, como o menor ponto de fusão dos óleos indica.

Figura 13. Ácidos graxos e triacilgliceróis (VOET,2014)

Ácidos graxos biológicos mais comuns

As gorduras, fornecem em torno de seis vezes mais energia metabólica do que o mesmo peso de glicogênio hidratado. Nos animais, os adipócitos são células de gordura especializadas na síntese e no armazenamento de triacilgliceróis. O tecido adiposo é mais abundante na camada subcutânea e na cavidade abdominal. O conteúdo gorduroso de seres humanos normais (21% nos homens e 26% nas mulheres) permite que eles sobrevivam a um jejum de dois ou três meses. O panículo adiposo é importante no isolamento térmico de muitos animais, por exemplo, em animais aquáticos de sangue quente, como baleias, focas, gansos e pinguins, que rotineiramente são expostos a baixas temperaturas.

Os lipídeos com ácidos graxos em sua composição são saponificáveis, pois reagem com bases formando sabões. São as biomoléculas mais energéticas, fornecendo acetil-coA para o Ciclo de Krebs (ex: glicerídeos, ceras, fosfolipídeos, esfingolipídeos, glicolípideos). Os lipídeos que não contêm ácidos graxos não são saponificáveis. As vitaminas lipossolúveis e o colesterol são os principais representantes destes lipídeos que não energéticos porém desempenham funções fundamentais no metabolismo (ex: terpenos–vitamina E e K; esteróides-colesterol e vitamina D;

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isoprenoides-carotenoides-vitamina A; prostaglandinas, tromboxanas e leucotrienos - eicosanoides).

Os glicerofosfolipídeos ou fosfoglicerídeos ou fosfolipídeos são o principal componente lipídico das membranas biológicas. Eles consistem em glicerol-3-fosfato ligados a duas cadeias de ácidos graxos. Os glicerofosfolipídeos são, portanto, moléculas anfifílicas com “caudas” apolares alifáticas (hidrofóbicas) e “cabeças” polares contendo o grupo fosfato (hidrofílicas). A formação das bicamadas lipídicas das membranas celulares é guiada pelo efeito hidrofóbico. Em soluções aquosas, moléculas anfifílicas, como os sabões e os detergentes, formam micelas (agregados globulares cujos grupos hidrocarbonados não estão em contato com a água). Esse arranjo molecular elimina contatos desfavoráveis entre a água e a cauda hidrofóbica das moléculas anfifílicas, ao mesmo tempo em que permite a solvatação das cabeças polares(Figura 14). Estudos tem demonstrado que os lipídeos das membranas biológicas estão distribuídos de forma assimétrica (figura 15). As fosfolipases são enzimas capazes de degradar os glicerofosfolipídeos agindo em diferentes sítios destes (figura 16).

Figura 14. Glicerofosfolipídeos mais comuns (Voet, 2014)

Os esteroides, a maioria de origem eucariótica, são derivados do ciclopentanoperidrofenantreno, composto que consiste em quatro anéis não planares fusionados. O colesterol, esteroide mais abundante nos animais, é também classificado como esterol. Nas membranas celulares este esterol representa cerca de 30% a 40% de todos os lipídeos. As plantas possuem pouco colesterol. Já, os fungos leveduriformes ou filamentosos sintetizam um outro esterol, o ergosterol.

Nos mamíferos, o colesterol é o precursor metabólico dos hormônios esteroides (cortisol, aldosterona, testosterona, estradiol), substâncias que regulam grande variedade de funções

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fisiológicas (figura 17). Os glicocorticoides, como o cortisol, afetam o metabolismo de carboidratos, proteínas e lipídeos e influenciam em uma variedade de outras funções vitais, incluindo reações inflamatórias e a capacidade de lidar com estresse. O aldosterona e outros mineralocorticoides regulam a excreção de sal e água pelos rins. Os androgênios e os estrogênios afetam o desenvolvimento e a função sexual. A testosterona é o protótipo do androgênio (hormônio sexual masculino), enquanto o β-estradiol é um estrogênio (hormônio sexual feminino). Outro hormônio derivado de esterol é a vitamina D que regula o metabolismo de Ca++ na célula.

Figura 15. Distribuição dos glicerofosfolipídeos em ambos lados da membrana celular (Voet, 2014)

Figura 16. Especificidade de clivagem das fosfolipases.

O colesterol é transportado pelo sangue humano associado a lipoproteínas. O LDL ou liproteína da baixa densidade transporta o colesterol aos tecidos, seu excesso ocasiona uma reação inflamatório no endotélio vascular que leva a formação de depósitos calcificados na parede dos vasos, podendo, obstruí-los. Já, o HDL ou lipoproteínas de alta densidade auxiliam na remoção

Figura 17. Colesterol e hormônios derivados do colesterol (Voet, 2014).

do excesso de colesterol do sangue, transportando-o para o fígado, onde a maior parte deste colesterol é convertido em sais biliares e armazenado na vesícula biliar.

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Os eicosanoides são moléculas sinalizadoras biológicas que agem em concentrações muito baixas e estão envolvidos no surgimento de dor e febre e na regulação da pressão arterial, da coagulação sanguínea e da reprodução. Diferente da maioria dos outros tipos de hormônios, os eicosanoides não são transportados pela corrente sanguínea aos seus sítios de ação, tendendo a agir localmente, próximo às células que os produzem. Na verdade, a maioria dos eicosanoides decompõe-se em segundos ou em minutos, o que limita seus efeitos a tecidos vizinhos. Os eicosanoides são sintetizados a partir de ácidos graxos poli-insaturados de 20 carbonos. Nos seres humanos, o precursor mais importante do eicosanoide é o ácido araquidônico, um ácido graxo poli-insaturado com quatro ligações duplas. São exemplos de eicosanoide, as prostaglandinas e compostos relacionados – prostaciclinas, tromboxanas, leucotrienos e lipoxinas.

Lipideos simples constituídos por uma molécula de álcool ligada a uma ou mais moléculas de ácidos graxos são denominados de ceras. A principal característica das ceras é a sua total insolubilidade em água e isso faz com que elas sejam muito úteis a plantas e animais. As ceras estão presentes na cutícula das plantas, onde protegem as células do dessecamento ao formarem uma barreira impermeável à água. O corpo de certos animais também é revestido por ceras, como é o caso das aves aquáticas, que têm suas penas recobertas de ceras produzidas pelas glândulas uropigianas utilizadas, sobretudo, para facilitar a sua flutuação. No ouvido humano, as ceras (ou cerume) são produzidas e expelidas pelas glândulas sebáceas e desempenham a função de proteger a estrutura contra infecções por microrganismos.

O reino vegetal é rico em compostos isoprenoides, que servem como pigmentos, sinalizadores moleculares (hormônios e feromônios) e agentes de defesa. De fato, já foram caracterizados mais de 25.000 isoprenoides (também conhecidos como terpenoides), na sua maioria de origem vegetal, fúngica e bacteriana. Durante o curso da evolução, o metabolismo dos vertebrados incorporou vários desses compostos com outros propósitos. Alguns deles (p. ex., a vitamina D) são conhecidos como vitaminas lipossolúveis (vitaminas são substâncias orgânicas que os ani- mais necessitam em pequenas quantidades, mas não conseguem sintetizar e, por isso, as obtêm a partir da dieta). A vitamina A, ou retinol, é derivada de produtos vegetais como β-caroteno. O betacaroteno é um pigmento vermelho presente nos vegetais verdes assim como na cenoura (de onde se originou o nome) e no tomate. O retinol é oxidado ao seu aldeído correspondente, retinal, que atua como fotorreceptor dos olhos em baixa intensidade luminosa. A luz promove a dimerização do retinal, desencadeando um impulso pelo nervo óptico, por meio de uma rota de sinalização complexa. A deficiência grave de vitamina A pode levar à cegueira. O ácido retinoico também tem propriedades hormonais, estimulando o reparo dos tecidos. E utilizado para tratar acne grave e úlceras de pele e também como cosmético para eliminar rugas. Os carotenos são responsáveis pelas colorações vistosas das penas das aves (figura 18).

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As proteínas compõem tecidos, membranas, auxiliam reações químicas do organismo, entre outras funções. São polímeros compostos por aminoacidos. Obtemos proteínas na alimentação, elas digeridas no tubo digestório (estômago). As Ligações peptídicas unem os aminoácidos. A ligação peptídica ocorre entre o grupo a-carboxila de um aminoácido e o grupo a-amino de outro aminoácido. As análises de um grande número de proteínas de quase todas as fontes imaginaveis mostrou que todas elas são compostas de 20 aminoácidos-padrão. Nem todas as proteínas contêm todos os 20 tipos de aminoácidos, mas a maior parte das proteínas contém a maioria deles, se não todos. Estes 20 aminoácidos são determinados por códons específicos (triplets de nucleotídeos; códons) no material genético dos seres vivos. Além destes 20, existem outros mais 2 aminoácidos protéicos que são determinados geneticamente: pirrol-lisina (somente em Archaea) e selenocisteína (presente em animais, algumas bactérias, mas ausente em plantas e Archaea). Os aminoácidos comuns são conhecidos como α-aminoácidos porque têm um grupo amino primário (¬NH2) ligado ao carbono α, que é o carbono próximo ao grupo carboxílico (¬COOH). A única exceção é a prolina, que tem um grupo amino secundário (¬NH¬); todavia, por questão de uniformidade, ela será chamada de α-aminoácido. Em pH neutro, o grupo amino de um aminoácido é protonado, e seu grupo carboxílico é ionizado. Os aminoácidos se diferenciam entre si quanto ao tipo de cadeia lateral, ou grupo radical R, que apresentam (figura 19).

Figura 18.

(Nelson, 2011).

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Para entender a complexidade estrutural de uma proteína é necessário primeiro compreender as propriedades de seus aminoácidos constituintes. As variações no comprimento e na sequência de aminoácidos de polipeptídeos são os maiores contribuintes para a diversidade nas formas e nas funções biológicas das proteínas. Proteínas nas células eucariontes frequentemente são compostas por L-aminoácidos. Vale lembrar, que os aminoácidos são moléculas quirais, ou seja, os átomos centrais nessas moléculas são conhecidos como centros assimétricos ou centros quirais, tendo a propriedade da quiralidade (do grego cheir, mão). Os átomos Cα dos aminoácidos (exceto a glicina) são centros assimétricos. Os centros quirais geram enantiômeros. As moléculas não sobreponíveis às suas imagens especulares são conhecidas como enantiômeros. A síntese química de uma molécula quiral produzirá uma mistura racêmica (mistura que contém quantidades iguais de cada enantiômero). Os processos biossintéticos quase sempre produzem estereoisômeros puros. Visto que a maior parte das moléculas biológicas é quiral, determinada molécula – presente em uma única forma enantiomérica – vai ligar-se a ou reagir apenas com um único enantiômero de outro composto. Por exemplo, uma proteína composta de resíduos de L-aminoácidos que reage com um resíduo específico de L-aminoácido não reage com a forma D daquele aminoácido. Alguns peptídeos bacterianos contêm D-aminoácidos. A presença de D-aminoácidos torna as paredes celulares menos suscetíveis ao ataque pelas peptidases (enzimas que hidrolisam ligações peptídicas) produzidas por outros

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organismos para digerir bactérias. Da mesma forma, os D-aminoácidos são componentes de muitos antibióticos (valinomicina/actinomicina D) peptídicos bacterianos.

A importância da estereoquímica nos sistemas vivos é também uma preocupação para a indústria farmacêutica. Muitos fármacos são sintetizados como misturas racêmicas, embora apenas um enantiômero tenha atividade biológica. Na maioria dos casos, o enantiômero inativo é biologicamente inerte e é embalado junto com o enantiômero ativo. Isso é verdade, por exemplo, para o agente anti-inflamatório ibuprofeno, em que apenas um dos enantiômeros é fisiologicamente ativo. Ocasionalmente, o enantiômero inativo de um fármaco útil produz efeitos prejudiciais, devendo ser eliminado da mistura racêmica. O exemplo mais intrigante é o fármaco talidomida, sedativo suave cujo enantiômero inativo provoca graves defeitos de nascimento (figura 20).

Figura 20. Importância do composto quiral na natureza.

O enantiômero S da talidomida é teratogênica enquanto que a forma R é um potente sedativo. Já o aspartame apresenta um enantiômero S de sabor doce e R de saber amargo.

Alguns aminoácidos são biologicamente ativos, por exemplo, a glicina, o ácido gama-aminobutírico (GABA; produto da descarboxilação da glutamina) e a dopamina (derivado da tirosina), por exemplo, são neurotransmissores, substâncias liberadas pelas células nervosas para alterar o comportamento de suas células vizinhas. A histamina (o produto da descarboxilação da histidina) é um potente mediador local de reações alérgicas. A tiroxina (outro derivado da tirosina) é um hormônio da tireoide que contém iodo e que geralmente estimula o metabolismo de vertebrados.

As propriedades das proteínas dependem, em grande parte, do seu tamanho e da sequência dos seus polipeptídeos. Para a proteína ter uma função ela precisa ter uma forma. As proteínas evoluem por meio de alterações de sua estrutura primária, assim, encontramos nas proteínas quatro níveis de complexidade estrutural (estrutura primária, secundária, terciária e quaternária) que são utilizados para descrever as formas tridimensionais das proteínas. E importante, lembrar que a forma da molécula é determinante de sua função.

A estrutura primaria está associada com a cadeia linear de aminoácidos que a compõe. A estrutura secundaria das proteínas inclui os padrões regulares de enovelamento de polipeptídeos, como as hélices, as folhas pregueadas e as voltas. A α-hélice é uma estrutura secundária regular, na qual ligações de hidrogênio são formadas entre grupos do esqueleto distantes a quatro resíduos. Na folha β, as ligações de hidrogênio formam-se entre os esqueletos de segmentos polipeptídicos separados. As proteínas fibrosas são caracterizadas por terem um único tipo de estrutura secundária: a α-queratina é uma espiral voltada para a esquerda de duas α-hélices, e o colágeno é um arranjo de três hélices voltadas para a esquerda, com três resíduos

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por volta. A estrutura terciária é o construída a partir de uma combinação de elementos estruturais secundários. As proporções de α-hélices e folhas β e a ordem em que elas estão proporcionam uma maneira informativa de classificação e análise da estrutura da proteína. A estrutura das proteínas tem sido determinada principalmente por cristalografia por raios X ou espectroscopia por ressonância magnética. Na estrutura terciaria, as cadeias laterais apolares de uma proteína globular tendem a ocupar o interior da proteína; as cadeias laterais polares tendem a definir sua superfície. A estrutura terciária é mantida por ligações e interações como: pontes de hidrogênio, interação hidrofóbica, ligação iônica e pontes dissulfeto. Na estrutura quaternaria as formam agregados de 2 ou mais subunidades (cadeias polipeptídicas terciárias) (figura 21).

Figura 21. Níveis organizacionais das proteínas

A estrutura terciária é mantida por ligações e interações como: pontes de hidrogênio, interação hidrofóbica, ligação iônica e pontes dissulfeto, como representado na figura abaixo. O efeito hidrofóbico tem grande influência na estabilidade da proteína. O efeito hidrofóbico, que minimiza o contato das substâncias apolares com a água, é o principal determinante da estrutura de

proteínas nativas. Interações eletrostáticas contribuem para a estabilidade da proteína. As

proteínas na sua conformação funcional e enovelada estão em seu estado nativo.

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Certas combinações da estrutura secundária formam motivos. Agrupamentos de elementos estruturais secundários, chamados de estruturas supersecundarias ou motivos, ocorrem em muitas proteínas globulares (estrutura terciária) não relacionadas (figura 22). As estruturas das proteínas podem ser classificadas com base nos seus motivos, no seu conteúdo de estrutura secundária, na sua topologia ou sua arquitetura dos domínios. Os domínios são cadeias polipeptídicas contendo mais de 200 resíduos normalmente se dobram em dois ou mais aglomerados globulares que conferem a essas proteínas uma aparência bi ou multilobular.

Figura 22. Representação de motivos ou estruturas super-secundárias (Voet, 2014).

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A maioria das proteínas, particularmente as com massas moleculares >100 kDa, é constituída por mais de uma cadeia polipeptídica (estrutura quaternária). Por vários motivos, as proteínas com multissubunidades são muito comuns. Em grandes arranjos de proteínas, como nas fibrilas do colágeno, as vantagens da construção de subunidades durante a síntese de uma enorme cadeia polipeptídica são análogas a que se utilizam componentes pré-fabricados para se construir um “edifício”. E possível corrigir defeitos por meio da simples reposição de uma subunidade defeituosa, pois o local de síntese das subunidades pode ser diferente do local de montagem do produto final, e a única informação genética necessária para especificar o “prédio” inteiro é a informação que especifica poucas subunidades automontáveis diferentes. No caso das enzimas, o aumento no tamanho da proteína tende a melhorar o arranjo das posições tridimensionais dos seus grupos reativos. O aumento do tamanho de uma enzima pela associação de subunidades idênticas é mais eficiente do que o aumento da cadeia polipeptídica, pois cada subunidade tem um sítio ativo.

Os elementos estruturais têm mais probabilidade de serem evolutivamente conservados do que as sequências de aminoácidos. As milhares de estruturas de proteínas conhecidas, englobando um número ainda maior de domínios separados, podem ser agrupados em famílias por meio da análise dos padrões gerais seguidos por suas cadeias polipeptídicas. Embora seja estimada a existência de mais de 1.400 famílias diferentes de domínios de proteínas, 200 padrões de enovelamento diferentes são responsáveis por aproximadamente metade de todas as estruturas de proteínas conhecidas.

A complexidade estrutural e a variedade de proteínas permitam a realização de uma série enorme de tarefas biológicas especializadas. Por exemplo, os catalisadores enzimáticos de praticamente todas as reações metabólicas são proteínas, as enzimas. A informação genética permaneceria confinada ao DNA se não fosse pelas proteínas que participam na decodificação e na transmissão dessa informação. E admirável que os milhares de proteínas que participam na construção, na sustentação, no reconhecimento, no transporte e na transformação de componentes celulares atuem com velocidade e precisão incríveis, estando sujeitas, em muitos casos, a vários mecanismos regulatórios. Por exemplo, a mioglobina e hemoglobina, são proteínas que ligam oxigênio; actina e miosina, são proteínas responsáveis pela contração muscular; e os anticorpos são imunoglobulinas sintetizadas pelo sistema imune para combater moléculas estranhas ou antígenos.

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As proteínas são biomoléculas que estão sujeitas à desnaturação e à renaturação. As baixas estabilidades conformacionais das proteínas nativas tornam-nas muito suscetíveis à desnaturação por alteração do balanço das forças fracas (que não de ligação) que mantêm a conformação nativa. As proteínas podem ser desnaturadas por uma grande variedade de condições e de substâncias: calor, ou seja, a aquecimento em variações pequenas de temperatura causa uma alteração abrupta de propriedades conformacionais sensíveis, viscosidade e absorção de UV. Essa transição brusca indica que o polipeptídeo se desdobra ou “se funde” cooperativamente, isto é, de modo quase simultâneo. A maioria das proteínas apresenta pontos de fusão bem inferiores a 100°C. Entre as exceções estão as proteínas de bactérias termofílicas; as variações de pH alteram o estado iônico das cadeias laterais de aminoácidos, alterando, portanto, a distribuição de cargas e a exigência de ligações de hidrogênio; os detergentes associam-se aos resíduos apolares de uma proteína, interferindo nas interações hidrofóbicas responsáveis pela estrutura nativa dela; os agentes caotrópicos, como o íon guanidina e a ureia em concentrações entre 5 e 10 M, são os desnaturantes proteicos mais utilizados. Os agentes caotrópicos são íons ou moléculas orgânicas pequenas que aumentam a solubilidade de substâncias apolares na água. Sua efetividade como desnaturantes é devida à sua habilidade em romper interações hidrofóbicas, embora seu mecanismo de ação ainda não esteja bem compreendido.

Os acidos nucleicos, DNA e RNA , são polinucleotideos. Os nucleotídeos são constituídos por uma base púrica ou pirimídica ligada a uma ribose, a qual, por sua vez, tem pelo menos um grupo fosfato ligado. O RNA é composto de ribonucleotídeos; o DNA é composto de desoxirribonucleotídeos. Os nucleotídeos estão envolvidos em todas as facetas da vida celular. Eles participam de reações de oxidação-redução, transferência de energia, sinalização intracelular e reações biossintéticas. Seus polímeros, os ácidos nucleicos DNA e RNA, são os participantes básicos no armazenamento e na decodificação da informação genética. Os nucleotídeos e os ácidos nucleicos também desempenham funções estruturais e catalíticas nas células.

Um nucleotídeo e composto de açúcar (pentose) que pode ser uma ribose (-D-ribofuranose-RNA) ou desoxirribose (-D-2´-desoxirribofuranose - DNA); uma Base nitrogenada que pode ser uma purina (adenina e guanina) e pirimidina (citosina, timina e uracila) (figura 23); e um grupo fosfato. Um nucleosídeo contêm apenas uma pentose e uma base nitrogenada (figura 24).

Figura 23. Bases nitrogenadas: purinas e pirimidinas (Nelson, 2011)

Figura 24. Representação dos nucleotídeos e nucleosídeos (Nelson, 2011)

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Os ácidos nucleicos são cadeias de nucleotídeos, ligados por pontes de grupos fosfato as unidades de ribose vizinhas. Os fosfatos desses polinucleotídeos são ácidos; por isso, os ácidos nucleicos formam poliânions em pH fisiológico. O modelo de Watson e Crick (1953) mostra o DNA como uma fita retorcida (Dupla Hélice). No DNA, duas cadeias antiparalelas de nucleotídeos unidos por ligações fosfodiéster formam a dupla-hélice. As bases em fitas opostas formam os pares: A com T e G com C (figura 25). O DNA é o material genético das células, é grande, complexo e possui grande quantidade de informações. Esta biomolécula pode se duplicar, gerando cópias perfeitas de si mesmo. Além disto, comanda a síntese de proteínas, controla o

metabolismo e a arquitetura da célula. O genoma de um organismo, seu conteúdo específico de DNA, pode estar distribuído em diversos cromossomos (do grego, chromos, cor soma, corpo), cada um contendo uma molécula de DNA separada. Observe que vários organismos são diploides; isto é, possuem dois conjuntos equivalentes de cromossomos, cada um é derivado de um dos genitores. O conteúdo de DNA de um único conjunto (haploide) é a metade do DNA total. Por exemplo, os seres humanos são organismos diploides que contêm 46 cromossomos por célula; por- tanto, o seu número haploide é 23. Devido ao seu comprimento muito longo, as moléculas de DNA são descritas em termos do número de pares de bases (pb) ou milhares de pares de bases (pares de quilobases ou kb). Os DNA que ocorrem naturalmente variam, em comprimento, desde 5 kb em pequenos vírus de DNA até mais de 250.000 kb nos maiores cromossomos de mamíferos. Apesar de cada molécula de DNA ser longa e relativamente firme, ela não é completamente rígida.

A forma mais comum do DNA é a DNA-B, que consiste em uma dupla-hélice orientada à direita, com pares de bases A - T e G - C de geometria similar. A hélice de DNA-A, que também ocorre no RNA de fita dupla, é mais larga e achatada do que a hélice de DNA-B. A hélice de DNA-Z, orientada à esquerda, pode ocorrer em sequências que alternam purinas e pirimidinas (figura 26).

Figura 25. Diferentes esquemas representativos da molécula de DNA. a)ligação fosfodiester no esqueleto covalente do DNA e RNA; b) pontes de hidrogênio e antiparalelismo da molécula de DNA; c) padrão de difração de Raio X do DNA; d) Modelo de Watson e Crick para estrutura da molécula de DNA. (Nelson, 2011)

a. b. c.

d.

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Figura 26. Características estruturais de DNA-A, DNA-B e DNA-Z ideais (Voet, 2014).

O RNA ocorre principalmente como fita simples, em geral formando estruturas compactas em vez de cadeias frouxas estendidas (o RNA de fita dupla é o material genético de certos vírus). Uma fita de RNA – idêntica à fita de DNA, exceto pela substituição da timina por uracila – pode parear com uma fita complementar de RNA ou DNA. Como esperado, A pareia com U (ou T no DNA), e G pareia com C. O pareamento das bases com frequência é intramolecular, formando estruturas de grampo (Figura 27) ou estruturas ainda mais complexas, quando esses grampos interagem entre si. As estruturas complexas potencialmente adotadas pelas moléculas de RNA de fita simples fornecem uma evidência adicional de que o RNA pode estar envolvido em mais processos do que no simples armazenamento e na transmissão da informação genética. Várias investigações demonstraram que certas moléculas de RNA podem ligar-se especificamente a pequenas moléculas orgânicas e catalisar reações envolvendo essas moléculas, apresentando assim atividade enzimática. Os RNAs com atividade catalíticas são conhecidos como ribozimas. A molécula de RNA também desempenha papel fundamental na síntese de proteínas.

Figura 27. Formação de uma estrutura em grampo. O pareamento de bases entre sequências complementares em uma mesma fita de RNA permite que o polinucleo- tídeo dobre sobre si mesmo.(Voet, 2014)

Vale ressaltar que o RNA pode apresentar funções como: informacional - mRNA (pouco estável), RNA de vírus; transferência de informação – tRNA; estrutural - rRNA (ribossomo); catalítica - rRNA (tradução); regulatória - RNA líder (atenuação). O rRNA é a maior molécula de RNA, sendo o mais abundante (80% do RNA celular) e constitui os ribossomos junto com as proteinas. O tRNA é a menor molécula de RNA. O tRNA liga-se a um aminoácido para conduzi-lo até o local onde está ocorrendo a síntese protéica. Existe no mínimo um RNAt para cada tipo de aminoácido (15% do RNA celular). O número de nucleotídeos do mRNA é diretamente proporcional ao tamanho da proteína que codifica. Este RNA carrega as informações do núcleo até o citoplasma (5% do RNA celular).

Os ácidos nucleicos podem ser desnaturados pelo aumento da temperatura acima da sua temperatura de fusão e renaturados pela diminuição da temperatura a 25°C abaixo da sua temperatura de fusão. Quando uma solução de DNA fita dupla é aquecida acima de uma temperatura característica, sua estrutura original entra em colapso e suas duas fitas complementares se separam e assumem conformações aleatórias. O processo de desnaturação é acompanhado por uma mudança qualitativa das propriedades físicas do DNA. Por exemplo, a grande viscosidade característica de soluções de DNA nativo, decorrente da resistência à deformação das moléculas rígidas e em forma de bastão, diminui drasticamente quando o DNA decompõe-se em cadeias simples, as quais são conformacionalmente flexíveis.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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NELSON, D.L.; COX, M.M. Lehninger: Princípios de Bioquímica. 5. ed..Porto Alegre: Artmed. 2011.

VOET, D.; VOET, G.; PRATT, W. Fundamentos de Bioquímica: A Vida em Nível Molecular, 4ª ed.. Porto Alegre: ARTMED, 2014.