Comunicação na Cidade

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  • Intercom Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicao XXIX Congresso Brasileiro de Cincias da Comunicao UnB 6 a 9 de setembro de 2006

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    A comunicao na cidade: polifonia e produo de subjetividade no espao urbano 1 Rachel Fontes Sodr2 Universidade Federal do Rio de Janeiro Resumo As cidades contemporneas so ricas em fluxos humanos, comerciais e simblicos e marcadas pela profuso de signos comunicacionais com origens, estticas e contedos variados, o que, para ns, caracteriza a polifonia urbana. Propomos, a partir da observao da cidade e da anlise da bibliografia relativa ao tema, um estudo acerca dos processos de comunicao urbanos e dos signos que os compem. A partir da leitura dos trabalhos de Guattari e Caiafa, respectivamente, entendemos que a vivncia do espao citadino envolve de forma complexa as faculdades subjetivas, sendo capazes de nos mobilizar, produzir memria e de se constituir em componemtes subjetivos. Palavras-chave Comunicao e culturas urbanas; Culturas juvenis - grafite; subjetividade; polifonia urbana. 1. Introduo: a comunicao na cidade

    As cidades contemporneas se configuram como ricos campos de comunicao,

    seja pelos contatos humanos possibilitados pela ocupao coletiva dos espaos pblicos

    ou pela variedade de estmulos visuais e de informao que proliferam nas ruas. Dos

    desenhos arquitetnicos s vitrines das lojas, dos bustos de heris imortalizados nas

    praas fugacidade das siglas pichadas por grupos annimos, quase tudo que vemos no

    meio urbano nos comunica de alguma forma.

    Dentro desta perspectiva, podemos entender a cidade no apenas como palco de

    importantes acontecimentos socia is, polticos e culturais ou como centro de fluxos

    financeiros e trocas comerciais, mas como campo semntico3 e lugar de experimentao

    da alteridade no interior do qual subjetividades, criadoras ou no, podem ser geradas.

    Uma caracterstica marcante da comunicao que se processa nas ruas das grandes

    cidades seu carter predominantemente visual. As imagens prevalecem em relao

    linguagem verbal, e mesmo quando h apenas texto como acontece em alguns 1 Trabalho apresentado ao NP Comunicao e Culturas Urbanas, do VI Encontro dos Ncleos de Pesquisa da Intercom. 2 Jornalista, mestranda do Programa de Ps-graduao em Comunicao e Cultura da Escola de Comunicao da UFRJ. Pesquisa Comunicao urbana: a produo de grafite na cidade do Rio de Janeiro. E-mail:[email protected] 3 MOLES, 1987, p. 18

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    letreiros, pichaes e cartazes as letras so estilizadas, desenhadas, com cores e

    formas dando o tom da mensagem que se quer transmitir. Moles indica que a imagem

    mais percuciente e mais facilmente assimilvel do que o texto4. Dessa forma, a

    predominncia da imagem na comunicao urbana contribui para que as mensagens

    sejam mais facilmente apreendidas e compreendidas com maior rapidez num ambiente

    marcado pela velocidade dos fluxos humanos e de veculos e no qual signos

    comunicacionais proliferam por todos os lados disputando o olhar apressado do passante.

    Ao considerar a diversidade de elementos que compem o cenrio comunicacional

    da cidade, cada qual com origem, esttica, contedo e propsito particulares, fica claro

    que a comunicao urbana marcada pela polifonia. Assim sendo, os diferentes signos

    que constituem a paisagem das cidades integram um imenso coral urbano e cada

    elemento pode ser considerado uma voz que canta num tom particular fragmentos de

    uma mesma cano polifnica.

    possvel ir mais alm e constatar a coexistncia de vozes cont raditrias dentro

    de um mesmo espao urbano. Tendo em vista a convivncia de to variados elementos

    de comunicao na cidade possvel entender o fenmeno da comunicao urbana no

    contexto de uma luta simblica no s pelo territrio da cidade como tambm na

    disputa de idias e posies subjetivas que nela se geram.

    A perspectiva brevemente descrita nos pargrafos acima nos permite pensar a

    cidade como um rico cenrio de abundantes fluxos e trocas simblicas e comunicacionais.

    necessrio ressaltar a importncia dos processos de comunicao que tm lugar

    nos centros urbanos, pois eles fazem parte da vida diria de todos aqueles que ali

    habitam, trabalham, se deslocam por suas ruas, utilizam os transpores pblicos e

    usufruem os espaos comuns de sociabilidade. Ao contrrio dos processos

    comunicacionais levados a cabo pelos diferentes meios de comunicao de massa, os

    quais dependem da vontade do espectador em interagir com eles seja comprando o

    jornal, ligando a televiso ou indo ao cinema -, a comunicao das ruas quase um

    imperativo pois no temos nenhum poder de deciso a respeito dos outdoors, cartazes,

    pichaes e outros signos que nos interpelaro em nossos deslocamentos urbanos.

    Tanto mais significante se revela a comunicao que se processa na cidade

    quando consideramos sua potncia em mobilizar e engendrar subjetividades.

    4 Ibidem, p.21.

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    A questo da produo de subjetividades no meio urbano ser retomada e melhor

    esclarecida mais adiante, por hora necessrio descrever o cenrio do qual trata este

    artigo e os diferentes elementos de comunicao visual que o compem.

    2. Os signos da cidade

    As grandes cidades capitalistas so marcadas pela profuso de signos

    comunicacionais, sobretudo em seus centros comercias. Semiticas mltiplas, de

    origens variadas e com propsitos tambm distintos ocupam os lugares pblicos das

    cidades e interpelam, de diferentes maneiras, os cidados.

    O espao polifnico e heterogneo da urbe abriga uma diversidade bem maior de

    elementos comunicacionais do que aqueles que seremos capazes de estudar aqui, por

    isso nosso recorte tentar dar conta apenas dos signos de comunicao urbana que por

    sua visualidade transmitem algum tipo de mensagem, informao ou sensao. Neste

    grupo sero englobadas semiticas diversas, verbais e no verbais, elaboradas ou no

    com finalidade de comunicar. Dentro desta perspectiva, consideraremos os seguintes

    elementos: o espao construdo, as diferentes modalidades de mdia exterior e as

    inscries marginais.

    Levando em conta a variedade dos signos que so emitidos simultaneamente no

    espao urbano, possvel considerar a cidade como um ambiente polifnico, pois

    atravessado por diversas vozes nem sempre consonantes. A esse respeito, Canevacci

    explica: a cidade em geral e a comunicao urbana em particular comparam-se a um

    coro que canta com uma multiplicidade de vozes autnomas que se cruzam, relacionam-

    se, sobrepem-se umas s outras, isolam-se ou se contrastam... 5

    Em perspectiva semelhante, Canclini, compara a cidade a um videoclip montagem

    efervescente de imagens descontnuas6 pois nela tudo denso e fragmentrio. Como

    nos vdeos, a cidade se faz de imagens saqueadas de todas as partes7, escreve.

    Tendo em vista o conceito de polifonia, procuraremos identificar algumas das

    vozes que fazem parte do grande coro urbano, utilizando como fatores de

    classificao aspectos como: inteno comunicativa, legalidade (ou ausncia dela) e

    caractersticas estticas comuns.

    5 CANEVACCI, 1997, p.17. 6 CANCLINI, 1999, p.153 7 Ibidem, p.156.

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    a) Arquitetura, paisagismo e urbanismo

    Este grupo engloba os diversos elementos que compem o espao construdo das

    cidades: edifcios, monumentos, praas e todo tipo de construo.

    Apesar de os componentes deste grupo no serem elaborados com finalidade

    comunicativa, acreditamos que sua visualidade capaz de produzir enunciados e

    interpelar os cidado. Eles podem, por exemplo, dar pistas sobre a poca em que foram

    construdos, conter forte simbolismo histrico (no caso de prdios antigos ou

    monumentos) ou comercial (no caso de shopping centers, lojas, galerias comerciais

    etc.); podem ser esteticamente atraentes, no chamar a ateno ou at mesmo

    desagradveis ao olhar, estimulando no observador sensaes de sujeira, descuido,

    abandono, perigo entre tantas outras possveis.

    De acordo com Guattari, as construes podem nos fornecer discursos e manipular

    em ns impulsos cognitivos e afetivos. Quer tenhamos conscincia ou no, o espao

    construdo nos interpela de diferentes pontos de vista: estilstico, histrico, funcional,

    afetivo... Os edifcios e construes de todos os tipos so mquinas enunciadoras8, escreve.

    A vivncia do espao construdo das cidades pode tanto apontar no sentido de uma

    percepo racional dos aspectos funcionais, estticos e da historicidades das construes,

    como pode envolver faculdades subjetivas, evocar sensaes e mobilizar afetos.

    Assim, por um lado, podemos extrair dos aspectos fsicos, estticos e funcionais

    das construes, informaes e enunciados que funcionam como expresso de uma

    sociedade ou de uma poca, pois, como pegadas em uma trilha, a interveno humana

    no espao deixa traos e marcas culturais, econmicos e tecno-cientficos da sociedade

    que ali viveu e do momento histrico em que se deu sua construo. Ao mesmo tempo, o

    espao construdo capaz de oferecer uma vivncia subjetiva, funcionando como

    mquina de sentido e de sensao9. A respeito da experimentao subjetiva do espao,

    Caiafa escreve:

    O espao construdo parece conservar, misteriosamente, experincias que ali se passaram. Pela interpelao que realiza, dir-se-ia, pelo abrigo que oferece, pelo tipo de ocupao que provoca, por enfim mobilizar hoje como antes afetos e suvenires, pela experincia subjetiva que se torna possvel10

    8 GUATTARI, 1992, p.158. 9 Ibidem, p. 157. 10 CAIAFA, 2002a, p. 102

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    b) comunicao institucional: publicidade ao ar livre

    Deste grupo fazem parte as diversas modalidades de mdia exterior, encontradas em

    tamanhos e suportes variados: outdoors, painis que compem a apresentao externa de

    instalaes comerciais, painis digitais e iluminados, letreiros luminosos, busdoors etc.

    Estes signos, que contm elementos verbais e/ou imagens, podem ser considerados

    legais ou oficiais, uma vez que provavelmente possuem permisso legal para ocupar o espao

    pblico de onde comunicam. possvel tambm sugerir que, provavelmente, so produzidos

    por grupos mais privilegiados que tm acesso ao poder econmico e/ ou poltico.

    Com suas cores, imagens e mensagens os diferentes tipos de mdia exterior gritam

    nas cidades suas marcas e produtos. Sua funo vender objetos, servios, status e estilos

    de vida. Tarefa que cumprem ao estimular ou criar necessidades, seduzindo o cidado e

    convidando-o ao consumo. No gritam em unssono, cada um anuncia seu reclame.

    Entretanto, a mensagem final, o grande refro, diz a mesma coisa Compre, tenha, seja.

    c) Comunicao marginal: inscries urbanas

    Este grupo bastante plural, pois contm elementos com estticas e intenes de

    comunicao variadas. Entretanto, o elo de ligao entre eles o fato de que suas

    materializaes so, freqentemente, efetuadas fora dos meios oficiais e

    institucionalizados de comunicao, o que os torna, em algum grau, marginais.

    Se o discurso oficial da mdia e do mercado est estampado nas diferentes

    modalidades de mdia exterior que, juntamente com os letreiros e vitrines das lojas,

    reproduzem o discurso globalizado e globalizante do consumo, h imagens urbanas que

    nascem dos sussurros das periferias sociais e culturais. Vozes que no se enquadram no

    discurso emitido pela mdia de massa ou que no encontram nela eco ou expresso se

    apropriam ilegalmente dos espaos disponveis na cidade para ganhar notoriedade.

    Tratam-se das inscries que proliferam em muros, paredes de edifcios, viadutos,

    tapumes, monumentos e outros espaos livres da urbe.

    Meio de expresso das ideologias, opinies e do modo de vida de grupos sociais

    que no tm acesso aos meios de comunicao de massa, tais inscries possibilitam

    tambm que seus executores, ou grupos que representam, conquistem notoriedade e

    visibilidade no meio urbano.

    Marginalidade e subverso so caractersticas marcantes deste tipo de inscrio.

    Seja pelo carter ilegal do modo de efetuao, pelos contedos veiculados ou por uma

    postura esttica diferenciada, o carter subversivo se faz presente.

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    Este grupo proposto sob o rtulo genrico de inscries urbanas compreende

    subgrupos com caractersticas bastante particulares. Se o aspecto que os aproxima a

    marginalidade, o tipo de agente urbano que produz a inscrio, a motivao, o contedo,

    a forma, o suporte e os materiais utilizados, assim como o grupo social que ir interagir

    com ela so aspectos que os diferenciam.

    Lara prope algumas categorias nas quais podemos agrupar as diferentes

    inscries urbanas: panfletria, publicitria, grafitagem e pichao.

    As inscries publicitrias possuem as caractersticas da propaganda. As frases ou

    marcas, em geral encomendadas por comerciantes, so pintadas com tinta cal, ltex ou

    spray nos muros e paredes para promover produtos ou servios. Este , segundo Lara,

    um modo alternativo de anunciar ao qual se recorre por motivo de economia.

    Entendemos que estas inscries devem ser consideradas marginais apesar do carter

    publicitrio j que se trata de um meio no institucional de anunciar, sendo considerado,

    por isso mesmo, publicidade ilegal pela Central de Outdoor.

    A inscrio panfletria tambm pode ser definida como propaganda ideolgica.

    Trata-se da apropriao do espao urbano por movimentos polticos ou religiosos, com

    o objetivo de expressar publicamente suas idias, em geral reprimidas ou estigmatizadas

    pela mdia oficial, assim como os grupos que lhes do origem. Essas inscries

    assumem a forma de frases escritas mo livre, em muros, portas, paredes, placas e

    cartazes elaborados com tinta, spray, carvo etc. No Rio de Janeiro, frases como S

    Jesus expulsa os demnios das pessoas, Yankes go home, Halloween o cacete.

    Viva a cultura nacional, Banqueiros roubam R$ 250.000.000.000,00 do Brasil, por

    ano!!!, Entregue sua arma e torne-se um escravo! 11 so alguns dos muitos exemplos

    que poderamos citar deste tipo de inscrio.

    Apesar de alguns autores no fazerem distino entre pichao e grafite, optamos

    por buscar uma delimitao a mais precisa e especfica possvel. As diferenas entre

    essas duas linguagens so muito significativas e dizem respeito a vrios aspectos tais

    como a tcnica utilizada, os contedos veiculados, a motivao dos grupos que as

    produzem e a forma como interagem com a cidade.

    Lara explica que o grafite se caracteriza pelo requinte tcnico e por um planejamento

    prvio da execuo, fatores que geram um resultado final mais bem elaborado e de

    11 As trs ltimas frases da seqncia so impressas em cartazes produzidos e espalhados pela cidade do Rio de Janeiro pela ong MV-Brasil (Movimento pela Valorizao da Cultura, do Idioma e das Riquezas do Brasil). Cf. www.mv-brasil.org.br

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    melhor qualidade comparativamente pichao. O grafite tambm se diferencia das

    demais inscries marginais e, principalmente, da pichao, porque procura fugir ao

    estigma do vandalismo, alm de privilegiar contedos variados e bastante plurais. Dessa

    forma, um grafite pode tanto conter cenas de humor, heris das histrias em quadrinhos,

    personagens criados pelos prprios grafiteiros, como pode retratar cenas do cotidiano,

    caricaturar personalidades da poltica ou da indstria cultural, fazer denncias, podendo

    funcionar para levantar bandeiras ou como forma de afirmar culturalmente no meio

    urbano um determinado grupo e demarcar seu territrio.

    Gitahy chama a ateno para as caractersticas estticas e conceituais do grafite.

    Do ponto de vista esttico, a produo de grafite marcada por aspectos como:

    expresso plstica figurativa e abstrata; natureza grfica e pictrica; utilizao de

    imagens do inconsciente coletivo; repetio de um mesmo original por meio de uma

    matriz ou de um mesmo estilo. A partir do enfoque conceitual, pode-se descrever o

    grafite como uma linguagem subversiva, espontnea, gratuita, efmera que discute e

    denuncia valores sociais, polticos e econmicos com humor e ironia, alm de

    democratiza r e desburocratizar a arte, aproximando-a do homem comum.12

    Quanto interao que o grafite prope cidade, interessante notar que, ao

    contrrio das pichaes, que privilegiam linguagens cifradas e dialogam apenas com grupos

    restritos, a grafitagem se presta a um a comunicao mais ampla. Conforme ressalta Gitahy

    O graffiti dialoga com a cidade, na busca no da permanncia, enquanto significado de arte consagrada de uma poca, mas de expanso, da arte que exercita a comunicao e faz propostas ao meio, de forma interativa. As cidades no s so o suporte, mas os tons das tintas e os movimentos todos do surpreendente imaginrio urbano13 Entendemos, ento, que ao contrrio do grafite, que dialoga com a cidade, a

    linguagem da pichao restrita aos grupos que compreendem seus cdigos que

    dominam seus signos.

    A respeito das caractersticas estticas, podemos dizer que enquanto o grafite

    privilegia a imagem, a pichao, a palavra e/ou a letra. Letras estilizadas ou distorcidas,

    formando nomes, apelidos individuais ou de gangues traadas com tinta, spray ou

    carvo sobre muros, portas, paredes, placas, cartazes, prdios, parapeitos, soleiras,

    beirais, etc. compem a linguagem dos pichos.

    Bastante comuns no Rio de Janeiro, assinaturas de indivduos ou grupos

    pichadores so ilegveis para a maioria da populao, sendo apenas decifrveis por

    12 GITAHY, 1999 , p. 17 e 18. 13 Ibidem, p. 74.

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    aqueles que pertencem ao grupo. Por exemplo, a inscrio C.V. em vermelho no faz

    o menor sentido para quem no conhece a dinmica do trfico carioca, mas para os

    moradores da cidade esta sigla indica a presena ou influncia do grupo de traficantes

    Comando Vermelho em determinada localidade.

    Tendo esta caracterstica em vista, possvel concluir que as pichaes no tm

    objetivo de se comunicar com a cidade e seus habitantes. So antes, marcadores de

    territrio e meio de grupos ou indivduos sarem do anonimato e conquistarem

    notoriedade perante aqueles que compartilham o mesmo cdigo.

    3. A cidade e a produo de subjetividade

    A compreenso da cidade como um meio em interao com a sensibilidade e as

    emoes dos seus habitantes no recente e remete ao incio do sculo XX, quando se

    deu a ecloso das grandes metrpoles modernas.

    Em A metrpole e a vida metal, Georg Simmel manifesta sua preocupao com a

    vida psicolgica do metropolitano frente intensificao de estmulos nervosos nas

    grandes cidades da poca. Segundo ele, o modo de vida urbano - caracterizado pelo

    aumento de estmulos nervosos que, atravs da rpida convergncia de imagens em

    mudana, da descontinuidade aguda contida na apreenso com uma nica vista de

    olhos e do inesperado de impresses sbitas, se alteram rpida e ininterruptamente -

    cria condies psicolgicas prprias, bem especficas e adequadas a sua realidade. neste

    contexto que o autor se permite intuir a existncia de uma vida psquica metropolitana14.

    Abordagens contemporneas a respeito da funo subjetiva das cidades podem ser

    encontradas nos trabalhos de Flix Guattari e da antroploga brasileira Janice Caiafa. Ao

    contrrio de Simmel que numa postura quase negativa acredita que o metropolitano,

    frente multiplicao de estmulos, desenvolve uma atitude blas, o que o torna incapaz

    de reagir a novas emoes e embota seu poder de discriminar, tanto Guattari como Caiafa

    identificam aspectos positivos na experincia urbana, pois esta carrega em si o potencial

    de gerar subjetividades criadoras.

    O espao urbano rico em signos comunicacionais, estmulos visuais e fluxos

    humanos e de informao que interpelam constantemente os cidados, imprimindo-lhes

    sensaes em diferentes intensidades, capazes de evocar lembranas, criar afetos e de se

    constituir em componentes subjetivos. As cidades, escreve Guattari, so imensas

    14 SIMMEL, 1973, p.14

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    mquinas produtoras de subjetividade individual e coletiva15. Ele explica que os

    equipamentos urbanos materiais e imateriais participam da composio da experincia

    humana sob os mais variados aspectos.16

    Dessa forma, tanto os contatos humanos que ocorrem no meio urbano os quais

    identificamos como sendo os equipamentos imateriais de que fala Guattari - como o

    espao construdo, os monumentos histricos, as praas, letreiros e vitrines de lojas,

    grafites, pichaes e todo tipo de anncio publicitrio que prolifera pelas ruas da cidade

    - que entendemos como sendo os equipamentos materiais -, no apenas participam dos

    processos comunicacionais urbanos como tambm podem, cada um a seu modo e de

    diferentes maneiras, interpelar os cidados gerando experincias subjetivas, que podem

    ou no ser criadoras.

    Uma caracterstica importante dos processos subjetivos deflagrados nas cidades

    a possibilidade que carregam de fazer frente s subjetividades padronizadas em

    consonncia com a axiomtica capitalista. A partir de Deleuze e Guattari, Caiafa prope

    que, ao contrrio do Estado que se apia ressonncia de focos de poder17 e na

    verticalizao necessrias ao triunfo do capitalismo, as cidades, surgem na

    dissipao de uma horizontalidade desde o inicio se apoiando na disperso e no na

    concentrao18.

    As cidades conjuram o capitalismo e o Estado justamente por sua aventura prpria19: elas tendem sempre a emancipar-se quando na sobrecodificao do Estado se produzem brechas. E passam a funcionar na horizontalidade da disperso, como as cidades comerciais que se tornam grandes corredores numa rede aberta com outras cidades. Nessa operao de limiares, h algo que trabalha em algum momento contra o capitalismo.20

    Uma das figuras-chave deste processo de conjurao ao capitalismo o

    movimento prprio das cidades porque produz um grande espao de exterioridade

    em relao ao espao privado do sujeito e da famlia21. A exterioridade vai chamar

    para fora, preparar a mistura urbana e por vezes romper laos ou dissolver

    cristalizaes, promovendo novos arranjos sociais22, explica Caiafa. O contato,

    algumas vezes de choque, com a heterogeneidade dispersa focos de identidade e as

    15 GUATTARI, op. cit., p.172 16 Ibidem. 17 CAIAFA, 2002a, p. 18. 18 Ibidem, p.19 19 Conceito proposto por Deleuze e Guattari, que sugerem que haveria uma aventura prpria das cidades em contraste com a hegemonia do Estado. Cf. Caiafa 2002 20 CAIAFA, 2002a, p.19 21 Ibidem 22 Ibidem, p.20.

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    recorrncias do familiar, introduzindo portanto variao nos processos subjetivos23. A

    partir da imprevisibilidade que marca o contato com a alteridade, pode haver uma maior

    criatividade em tais processos, possibilitando a ocorrncia de transformaes e de

    produes subjetivas interessantes.

    A seguir, veremos que dependendo do uso, os equipamentos materiais e imateriais

    urbanos podem se prestar produo de subjetividades tanto criadoras como ligadas aos

    interesses do capital.

    a) encontros urbanos Sair pelas ruas se aventurar a esbarrar com estranhos e se deixar modificar por

    eles. Cruzar a cidade em direo lugares alheios ao nosso crculo familiar estar sujeito

    aos fluxos, aos encontros que se do ao acaso.

    Caiafa mostra que a experincia da alteridade um importante fator de

    subjetivao, pois a diferena pode assumir uma fora criadora. O contato com a

    heterogeneidade possibilitada pela mistura que se processa nas ruas expe os indivduos

    a alteridades. Segundo ela, a disperso e a circulao tornadas possveis pela ocupao

    coletiva dos espaos pblicos ao mesmo tempo em que nos retira dos meios seguros e

    conhecidos do confinamento familiar, nos expe ao risco do contato com o estranho e

    desconhecido, que pode assumir um carter positivo ao dissolver cristalizaes e nos

    fazer vislumbrar outros mundos, virtuais mas passveis de atualizao.

    Nesse sentido, ela explica que outrem, figura dessa alteridade, no

    simplesmente um outro com quem falo ou que me influencia, um personagem do campo

    perceptivo, da relao de comunicao ou da interao social, mas um princpio, um

    operador e que expressa um mundo possvel 24. No se trata de um objeto ou de um

    outro sujeito. Outrem , antes de tudo, um operador de diferenciao, uma instncia

    que nos distra de nos mesmos ao acenar com mundos estranhos, que no so o nosso e

    que podemos vir a conhecer25.

    Citando Deleuze, Caiafa mostra que, para este autor, outrem introduz o signo do

    no percebido no que eu percebo26, organizando um mundo marginal, um arco de

    fundo em que se inscrevem outros objetos, outras idias, formando todo um campo de

    23 Ibidem. 24 CAIAFA, 2002b, p.97. 25 Ibidem, p.96. 26 DELEUZE apud CAIAFA 2002b.

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    virtualidades e de potencialidades27. Dentro dessa concepo possvel admitir que a

    presena de outrem pode dissolver identidades e as desterritorializar, conclui.

    No entanto, h situaes em que a experincia da alteridade pode no ser positiva.

    Trata-se das ocasies em que o encontro pode ser ameaador ou violento, o que faz com

    que, por excesso de proximidade, no se produzam afetos criadores, explica Caiafa.

    Nestas circunstncias, prevalecem o medo e a desconfiana em relao ao outro e a

    diferena, em vez de representar possibilidades criadoras, traz insegurana. Em outro

    extremo, a segregao e o trancafiamento em lugares seguros e familiares que impede

    a ocorrncia de encontros deflagradores de subjetividades interessantes. Nesses casos,

    de acordo com Caiafa, a distncia que impede o contgio urbano e as possibilidades

    de comunicao.

    b) o espao construdo

    Como vimos, os edifcios e construes so engrenagens urbanas que possibilitam

    experincias subjetivas capazes de constituir memrias afetivas tanto individuais como

    coletivas , evocar circunstncias j vividas e at mesmo modificar os afetos ligados a elas.

    A respeito da constituio de memrias afetivas a partir da relao com o espao,

    Canevacci escreve que a cidade marcada pela presena mutvel de uma srie de

    eventos dos quais participamos como atores ou como espectadores, e que nos fizeram

    vivenciar aquele determinado fragmento urbano de uma certa maneira. Dessa forma,

    quando reatravessamos esse espao, as lembranas relacionadas a ele so reativadas.

    Uma cidade se constitui tambm pelo conjunto de recordaes que dela emergem assim que nosso relacionamento com ela restabelecido. O que faz com que a cidade se anime com nossas recordaes. E que ela seja tambm agida por ns, que no somos unicamente espectadores urbanos, mas sim tambm atores que continuamente dialogamos com os seus muros, com as caladas de mosaicos ondulados, com uma seringueira que sobreviveu com majestade monumental no meio de uma rua...28

    Outra indicao de Caiafa quanto s relaes subjetivas que se estabelecem com o

    espao construdo diz respeito ao modo como as diferentes configuraes espaciais, com

    suas particularidades tanto estticas como funcionais, nos convidam habitao. Podemos

    ser acolhidos de diversas formas pelas construes, seus elementos constitutivos podem

    nos interpelar de maneiras distintas e provocar sensaes variadas. A hospitalidade que

    nos oferecida pelos espaos que ocupamos se revela, aos olhos desta autora, como

    elemento deflagrador de experincias subjetivas, que podem ou no ser positivas.

    27 Ibidem. 28 CANEVACCI, op. cit, p.22.

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    c) publicidade: anexao pelo desejo

    A nova estratgia do capitalismo dominar pelo desejo. De forma sutil e no

    declarada a dominao se generaliza nas sociedades de controle29. Isso acontece atravs

    dos meios de comunicao, da cultura do consumo, da expanso onipresente de uma

    imensa rede de informaes que esquadrinha e registra movimentos, aes e posses dos

    indivduos. Controla-se ao ar livre atravs de cmeras ocultas que gravam o ir e vir dos

    cidados, bancos de dados que armazenam seus gostos e dados pessoais sem pedir

    permisso e reclames publicitrios que, sem que se tenha conscincia disso, lembram

    aos observadores muitas vezes involuntrios quais so as tendncias a serem

    seguidas. Esta forma de controle, que tem a dominao subjetiva como um de seus

    recursos, , segundo Caiafa, ao mesmo tempo mais generalizada e mais ampla.30

    Cada vez mais, ao longo de suas transformaes mais recentes, o capitalismo precisa tomar posse no s de uma fora de trabalho, mas tambm de uma fora de desejo. Portanto, ele se envolve cada vez mais com a produo de subjetividade, trabalhando com as faculdades psquicas diretamente. Antes mesmo de assujeitar certas categorias ou segmentos sociais, ele os prepara ou reengendra.31

    Uma estratgia que tem sido utilizada com eficincia pelo poder para investir no

    campo do desejo e produzir os assujeitados de dentro32 a publicidade. O marketing

    tornou-se instrumento de controle social33.

    Os discursos, a esttica, as imagens e os padres de vida e beleza proclamados pelos

    anncios que proliferam no apenas na paisagem urbana, como tambm no interior dos

    lares (via televiso, internet, mdia impressa ou mala direta) reafirmam os valores nos

    quais se apia a ordem dominante e legitimam as relaes de poder que a sustentam.

    No h nada de novo nas mensagens publicitrias que se apossam dos espaos

    pblicos, ao contrrio, elas s fazem reproduzir e confirmar os discursos cantados por

    jingles e repetidos exaustivamente por garotos propaganda. As imagens e idias que

    encontramos a so as mesmas repetidas diariamente durante o intervalo dos telejornais

    ou pela mocinha da novela. um jogo de ecos34, como constata Canclini.

    29 Em Post-Scriptum Sobre as Sociedades de Controle, Deleuze descreve o modo de organizao social que substitui do modelo disciplinar que imperou dos sculos XVIII ao XX (proposto por Foucault). De acordo com Deleuze, no momento atual, o poder modula continuamente o indivduo atravs de uma formao permanente, segundo seus interesses. Nas sociedades de controle o poder no est concentrado em instit uies disciplinadoras, mas difuso, disperso como um gs. o controle ao ar livre. Cf. DELEUZE, 1992. 30 CAIAFA, 2002a , p. 29 e 34. 31 Ibidem, p. 34. 32 Ibidem,p. 31 e 32. 33 DELEUZE, 1992, p. 224. 34 CANCLINI, 2003, p.290.

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    Ao contrrio da arte criadora dos grafites e da experincia positiva que pode ser

    provocada pela alteridade, a publicidade se presta a generalizar e a confirmar o j dito

    pelo poder, a reforar sutilmente sobre as mentes o controle que j se exerce sobre os

    corpos e sobre os bolsos.

    c) a arte dos grafites

    Caiafa aposta na arte como sendo capaz de deflagrar uma experimentao

    subjetiva em larga escala35. Guatttari aponta na mesma direo ao afirmar que nas

    trincheiras da arte que se encontram os ncleos de resistncia dos mais conseqentes ao

    rolo compressor da subjetividade capitalstica36. Caiafa explica que as mquinas

    estticas em seu trabalho criador com a expresso, podem abrir brechas nas

    subjetividades padronizadas (que s desenvolvem aquilo que serve axiomtica

    capitalista), fazendo brotar singularidades37.

    A arte , portanto, vista como um campo criador que no se restringe somente

    existncia de artistas patenteados mas abarca tambm toda uma criatividade

    subjetiva que atravessa os povo e as geraes oprimidas, os guetos, as minorias...38.

    Caiafa esclarece o sentido da palavra criao nesse contexto. De acordo com ela,

    entende-se o ato de criar no apenas ou sobretudo como inovao num certo campo,

    produto pessoal de um certo autor. Num sentido forte, a criao comea quando h

    resistncia39.

    H uma experimentao subjetiva que acontece nos grupos marginalizados ou oprimidos que, por manterem uma distncia ao mesmo tempo desejada e forada em relao aos focos de poder, se deslocam mais facilmente da subjetividade normalizada.40

    Nesse sentido, acreditamos que seria possvel considerar o trabalho de alguns

    grafiteiros como brechas no sistema, possveis pontas de desterritorializao. No se

    trata aqui de fazer um louvor apropriao marginal e criminosa dos espaos pblicos,

    mas de valorizar o trabalho contestador e inovador de alguns artistas que elegem muros

    como telas e escolhem para receptores da sua arte toda a populao urbana.

    Acreditamos que o grafite, em algum grau, democratiza a arte ao transferi- la dos

    espaos fechados e seletivos dos museus para as ruas, alm de oferecer aos transeuntes

    35 CAIAFA,2000, p. 66. 36 GUATTARI apud CAIAFA 2000. 37 CAIAFA, op. cit., p. 66. 38 GUATTARI apud CAIAFA 2000. 39 CAIAFA, op. cit., p. 59. 40 Ibidem, p.68.

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    uma visualidade diferente daquela generalizada pelos meios de comunicao oficiais.

    A percepo de uma possvel resistncia no trabalho de alguns grafiteiros se torna mais

    clara ao considerarmos que a esttica e o contedo de muitos grafites coincide com uma

    postura questionadora dos valores e prticas capitalistas. A esttica desta forma de arte

    nasce nas ruas trazendo algo de transgressor, de novo em relao s imagens e

    mensagens banalizadas e difundidas pela mdia.

    Considerando essa dimenso contestadora e esteticamente no domesticada das

    imagens que compem alguns grafites, admitimos a possibilidade de que em

    determinadas situaes especficas possam ocorrer mutaes subjetivas, rompendo

    com um campo significacional dominante e provocando o desencadeamento de

    processos de singularizao41 . Segundo Caiafa

    Uma estranheza, uma alteridade que arte provoque em relao a uma forma padro, ou a uma repetio no criadora na vida, introduzida e vai atrair todo um conjunto. H uma ruptura com uma situao subjetiva paralisante e acontece toda uma mutao42

    4. Consideraes finais Deixamos aqui no concluses prontas e fechadas, mas indicaes do caminho

    que nossa pesquisa em curso dever percorrer, bem como idias para serem

    reapropriadas e pensadas pelos possveis leitores.

    Fica, em primeiro lugar, a indicao da importncia dos processos de

    comunicao que se desenrolam nos espaos coletivamente habitados das cidades e a

    sugesto dos encontros com a alteridade e dos signos comunicacionais enumerados e

    brevemente descritos acima como apenas um recorte dentre os muitos possveis no

    estudo de um universo simblico to abundante e heterogneo como o urbano.

    Deixamos tambm, como proposta de reflexo, a idia de que os processos sociais

    e comunicativos que tm lugar nas cidades carregam potencialmente transformaes

    subjetivas capazes de romper com a estagnao do desejo atravs do qual o capitalismo

    domina. Convidamos nossos possveis leitores a desenvolver um novo olhar sobre a

    cidade, a vivenci-la e experiment- la de modo um pouco mais atento na tentativa de

    verificar essa nossa hiptese.

    Vimos que possvel que a apropriao do espao pblico obedea aos interesses

    de um pequeno grupo preocupado em se manter no poder e que os signos de

    comunicao encontrados nas ruas se prestem a reforar e a reafirmar os valores e 41 Ibidem, p.66 42 Ibidem, p. 67

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    padres dominantes. Assim, a publicidade externa e o aumento de espaos cuja

    hospitalidades gere experincias subjetivas pobres trabalham em prol de subjetividades

    limitadas, empobrecidas e em consonncia com os interesses de capital.

    Por outro lado, acreditamos que os encontros com a alteridade, a vivncia densa e

    perceptivamente rica dos espaos construdos e a possibilidade de abrigar criaes

    artsticas que se configuram como alternativas aos padres dominantes, fazem do

    espao urbano um front de resistncia s subjetividades generalizadas pelo capitalismo.

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