Concreto armado Flexão Normal Composta:

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Instituto Brasileiro do Concreto 45º Congresso Brasileiro do Concreto ______________________________________________________________________ Flexão Normal Composta: o melhor é não simplificar o dimensionamento Flávio Mendes Neto Professor Doutor, Instituto Tecnológico de Aeronáutica, ITA Divisão de Engenharia de Infra-Estrutura Aeronáutica, IEI Homepage: http://www.infra.ita.br/~flavio/ email: [email protected] CTA – ITA – IEI Pça. Mal. Eduardo Gomes, 50 12.228-900 São José dos Campos SP Palavras Chaves: Estruturas, Concreto Armado, Dimensionamento Resumo Este trabalho ajuda na disseminação dos resultados de algumas pesquisas científicas que objetivaram “simplificar” o dimensionamento da área de armadura de seções transversais retangulares de concreto armado. Várias abordagens foram empregadas e, consistentemente, chegaram às mesmas conclusões: o assunto é altamente não linear e não admite soluções simplistas. Paralelamente à essa linha de argumentação foram desenvolvidos métodos que permitem a abordagem numérica do problema de forma eficiente e precisa. O dimensionamento pode ser realizado com verificações sucessivas que, por sua vez, utilizam o método de Newton-Raphson, garantindo a obtenção de áreas de armaduras, quando o problema possui solução, dentro de limites práticos previamente estabelecidos (mínimo e máximo). No caso da inexistência física de solução, o processo identifica a situação de forma igualmente rápida. Conclui-se, portanto, pelo dimensionamento numérico sem a utilização de métodos simplificados. 1 Introdução Entende-se por Flexão Normal Composta (FNC) a atuação conjunta de um esforço normal, aplicado ao CG geométrico da seção de concreto, e de um momento fletor (vetor momento no plano da seção transversal e perpendicular ao eixo de simetria vertical da seção). Por convenção o esforço normal positivo é o de compressão (e, consistentemente, os encurtamentos são considerados positivos) e o momento fletor positivo comprime as fibras superiores e traciona as inferiores. A seção transversal deve possuir pelo menos um eixo de simetria (por convenção vertical) considerando, inclusive, a distribuição da armadura.

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Artigo sobre concreto armado Flexão Normal Composta: o melhor é não simplificar o dimensionamento. Este trabalho ajuda na disseminação dos resultados de algumas pesquisascientíficas que objetivaram “simplificar” o dimensionamento da área dearmadura de seções transversais retangulares de concreto armado

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Flexão Normal Composta: o melhor é não simplificar o dimensionamento

Flávio Mendes Neto

Professor Doutor, Instituto Tecnológico de Aeronáutica, ITA Divisão de Engenharia de Infra-Estrutura Aeronáutica, IEI

Homepage: http://www.infra.ita.br/~flavio/ email: [email protected]

CTA – ITA – IEI

Pça. Mal. Eduardo Gomes, 50 12.228-900 São José dos Campos SP

Palavras Chaves: Estruturas, Concreto Armado, Dimensionamento Resumo Este trabalho ajuda na disseminação dos resultados de algumas pesquisas científicas que objetivaram “simplificar” o dimensionamento da área de armadura de seções transversais retangulares de concreto armado. Várias abordagens foram empregadas e, consistentemente, chegaram às mesmas conclusões: o assunto é altamente não linear e não admite soluções simplistas. Paralelamente à essa linha de argumentação foram desenvolvidos métodos que permitem a abordagem numérica do problema de forma eficiente e precisa. O dimensionamento pode ser realizado com verificações sucessivas que, por sua vez, utilizam o método de Newton-Raphson, garantindo a obtenção de áreas de armaduras, quando o problema possui solução, dentro de limites práticos previamente estabelecidos (mínimo e máximo). No caso da inexistência física de solução, o processo identifica a situação de forma igualmente rápida. Conclui-se, portanto, pelo dimensionamento numérico sem a utilização de métodos simplificados. 1 Introdução Entende-se por Flexão Normal Composta (FNC) a atuação conjunta de um esforço normal, aplicado ao CG geométrico da seção de concreto, e de um momento fletor (vetor momento no plano da seção transversal e perpendicular ao eixo de simetria vertical da seção). Por convenção o esforço normal positivo é o de compressão (e, consistentemente, os encurtamentos são considerados positivos) e o momento fletor positivo comprime as fibras superiores e traciona as inferiores. A seção transversal deve possuir pelo menos um eixo de simetria (por convenção vertical) considerando, inclusive, a distribuição da armadura.

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O problema clássico de dimensionamento consiste na determinação da área de armadura necessária para que o equilíbrio da seção transversal (conhecida) com os esforços aplicados (conhecidos) se dê sem que nenhum critério de resistência seja ultrapassado. O dimensionamento normalmente é feito no ELU, Estado Limite Último de Ruptura [NBR-6118, 2000], e os critérios de resistência são os pólos de ruína (ou, ainda, Diagramas de Domínios) [MENDES NETO & PIMENTA, 2000(b)]. Além da armadura, usualmente representada de forma monoparamétrica (basta o conhecimento da área total As para caracterizar completamente toda a distribuição da armadura), a incógnita de trabalho usual é a distribuição de deformações da seção transversal que equilibra os esforços aplicados que, dependendo da formulação, pode ser caracterizada por até duas incógnitas algébricas: (1) profundidade da linha neutra (x) ou, ainda, (2) deformação na no CG da seção (εo) e rotação específica da seção (k), usualmente confundida com a curvatura da seção (1/r). No primeiro caso busca-se o equilíbrio já com os pólos de ruína sendo obedecidos e, no segundo, a verificação do ELU é feita posteriormente, como ainda será discutido com mais detalhes. A FNC apresenta duas equações de equilíbrio (equilíbrio de forças e de momentos da seção transversal) e o dimensionamento tem abordagens distintas conforme o tipo de formulação. No caso (1) anterior há duas incógnitas: As e x. Trata-se, portanto, de um sistema não linear de duas equações a duas incógnitas. A abordagem usual consiste em isolar uma das incógnitas (em geral As) de uma das equações e substituir na outra, ficando com apenas uma incógnita (em geral x) nessa nova equação, que será resolvida numericamente. Obtida a solução utiliza-se uma das equações para o cálculo da outra incógnita (em geral As). O caso (2) anterior será melhor explorado no item Dimensionamento Rigoroso. O ponto central dessa discussão é que a resolução do sistema de equações anterior é normalmente considerada “trabalhosa” e, por isso, há uma tendência de simplificação (desnecessária) do problema. Várias pesquisas científicas realizadas indicam, claramente, que as simplificações estudadas (e até algumas propostas) não são satisfatórias sob o ponto de vista da segurança ou da economia. Considerando a filosofia do dimensionamento, as simplificações só prejudicam o entendimento do assunto uma vez que são altamente específicas e de aplicação limitada, embora esses fatos muitas vezes não sejam esclarecidos de forma adequada. Não há, ainda, justificativas práticas para a simplificação do dimensionamento: hoje em dia são raros os dimensionamentos “manuais” que seriam beneficiados pela álgebra mais modesta.

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Pontos de discussão mais delicados, que não serão abordados nesse texto embora de grande importância, necessariamente incluem as justificativas da apresentação em norma de métodos de cálculo que os engenheiros deveriam ter em sua base de conhecimento ou, ainda, da real necessidade da apresentação em norma de métodos simplificados de cálculo uma vez que, espera-se, os engenheiros conhecem e são capazes de aplicar métodos ditos rigorosos. 2 Dimensionamentos simplificados Deve-se salientar que qualquer simplificação que se pretenda recomendar deveria ser exaustivamente avaliada antes de qualquer julgamento de valor. Na era do computador não faz sentido “achar” que uma simplificação, ainda que teoricamente consistente, realmente forneça resultados adequados, tanto sob o ponto de vista da economia quanto o da segurança. O diagrama retangular simplificado do concreto [NBR-6118, 2000], quando utilizado para a Flexão Normal Simples e comparado com o diagrama parabólico-retangular, é um exemplo típico: ainda que a resultante de compressão seja bem aproximada, o resultado do dimensionamento da área de armadura está sempre (um pouco) contra a segurança [MENDES NETO, 1993]. Enfatiza-se, assim, que nenhum método simplificado deva ser aceito automaticamente, sem verificação, por mais consistentes que pareçam suas premissas. É obrigação dos proponentes de simplificações provar que os erros cometidos, em termos de segurança e economia, são aceitáveis. Há que se conhecer, com precisão, as restrições de aplicação do método simplificado e, igualmente importante, os erros esperados com a sua utilização. Em termos leigos pode-se dizer que é imperativo que o método simplificado seja acompanhado de bula onde, claramente, sejam listadas prescrições, restrições de uso e efeitos colaterais. 2.1 Simplificação proposta em Norma Um primeiro passo em direção à erradicação das simplificações foi o trabalho [ALVES, 2000] realizado sob nossa orientação. Foram feitos mais de 45.000 (quarenta e cinco mil) dimensionamentos utilizando a simplificação sugerida na revisão da norma [NBR-6118, 2000] e, ainda, com a metodologia “rigorosa”. Além disso ainda houve a avaliação de outras 6 (seis) fórmulas originais de dimensionamento simplificado, várias delas obtidas com regressão não-linear. A conclusão geral, tanto com a fórmula da norma, quanto com as alternativas propostas é a mesma: os resultados de dimensionamento com esses métodos simplificados não são satisfatórios. Há muitos casos contra a segurança (alguns excessivamente contra a segurança) e, também, muitos dimensionamentos contra a economia.

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2.2 Parametrização das curvas de interação A observação de alguns poucos diagramas de interação para a FNC sugere, fortemente, que deve haver uma lei para a formação das curvas de interação. Seria muito interessante que essa lei tivesse forma parabólica. Se, realmente, houvesse uma lei seria possível simplificar o dimensionamento com a equação dessa lei. Com esses princípios houve a realização do trabalho [SOUZA, 2000], também sob nossa orientação (e de forma completamente independente do trabalho citado anteriormente). É interessante observar que esse trabalho teve duas fases: (1) encontrar, por mínimos quadrados, equações das parábolas que melhor aproximam algumas curvas de interação e (2) proceder a um ajuste linear dos coeficientes das parábolas com a taxa de armadura, tentando explicitar essa aparente dependência (quanto maior a área de armadura mais “alta” é a curva de interação). Na primeira parte do trabalho que, na verdade, fez tentativas com três tipos distintos de parábolas, o sucesso foi relativamente bem alcançado (cerca de 1.000 casos analisados, cada curva aproximada por 50 pontos). As curvas de interação, para o universo testado, podem ser bem aproximadas por parábolas. Graficamente é possível observar pequenas diferenças que, em geral, não chegam a comprometer essa conclusão. Obviamente existem curvas muito mal aproximadas por parábolas, principalmente quando o arranjo de armadura tem poucas camadas de barras e a área de armadura é alta. Na segunda parte, também em geral, os resultados foram satisfatórios, ou seja, é possível correlacionar os termos das equações das parábolas com a área de armadura, como se as parábolas fossem transformadas com o aumento da área de armadura. O problema se deu quando houve a inversão da equação da parábola com o objetivo do dimensionamento. Ainda que a parametrização, obtida por regressão linear, fosse adequada, os dimensionamentos (cerca de cinqüenta mil casos) com essa equação apresentaram os mesmos defeitos das simplificações discutidos anteriormente: muitos erros contra a segurança (alguns erros muito contra a segurança) e muitos erros contra a economia. Houve, ainda, uma tentativa de melhoria de resultados diminuindo o número de casos cobertos pelas fórmulas. Para condições muito específicas foi possível melhorar um pouco o desempenho da fórmula a custa de maior processamento “manual” e computacional (para encontrar a fórmula) e mais especificidade da validade da fórmula. O trabalho para isso, entretanto, não vale a pena já que o dimensionamento “rigoroso” teria sido executado com menos esforço computacional e para casos absolutamente gerais.

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2.3 Redes Neurais Artificiais A última tentativa de simplificação científica foi com a orientação do trabalho [DEVRAIGNES, 2002] que utilizou uma Rede Neural Artificial (RNA) para aproximar os resultados de mais de 210.000 (duzentos e dez mil) casos de dimensionamento, sempre para a seção retangular. Os parâmetros considerados para os casos de dimensionamento foram: esforço normal, momento fletor, tipo de aço (CA25, CA50 e CA60) e arranjo (sempre duplamente simétrico): número de camadas, posicionamento e distribuição de áreas da armadura. A rede utilizada foi do tipo feedforward, com uma camada de quatro neurônios escondida, unidade computacional do tipo sigmóide e aprendizado do tipo backpropagation. A única saída da rede é a área de armadura (de fato a saída é a taxa mecânica de armadura já que todo o tratamento dos dados foi feito com adimensionais). A base de casos original foi dividida em 7 outras bases para fins de treinamento da rede (cada base com cerca de 30.000 casos). Foram feitos alguns estudos de sensibilidade com o número de iterações, taxa de aprendizado, critérios de paradas (convergência) e utilização das outras bases. Os resultados obtidos com essa tentativa não foram, da mesma maneira que nas outras simplificações, satisfatórios. Como a ferramenta RNA é bastante poderosa obteve-se um procedimento que fornece resultados sempre a favor da segurança. Isso, de certa forma, é um progresso em termos de métodos simplificados que, quase ao acaso, fornecem resultados contra ou a favor da segurança. O problema do modelo proposto é que os erros podem ser exageradamente contra a economia (não raro chegando a 300% de acréscimo de área de armadura), inviabilizando sua utilização prática. Ressalte-se que dado o grande número de valores para os parâmetros possíveis para a definição da topologia de uma rede neural artificial, não se está criticando a ferramenta mas, simplesmente, uma aplicação a um problema potencialmente complexo e não linear. A vantagem da utilização da rede neural seria a simplicidade algébrica para a obtenção do dimensionamento da área de armadura: enquanto normalmente são necessárias várias iterações para o dimensionamento tradicional, a RNA forneceria a área de armadura em um número fixo (e pequeno) de operações aritméticas, o que agilizaria enormemente o processo de dimensionamento. Mas, infelizmente, os resultados obtidos não foram aceitáveis do ponto de vista da economia. Conclui-se, assim, que a simplificação do dimensionamento da área de armadura de seções retangulares submetidas a FNC não deve ser mais investigada. Por extensão parece ser razoável incluir nessa conclusão outras seções transversais e outras solicitações (Flexão Normal Simples e Oblíqua).

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3 Dimensionamento rigoroso O dimensionamento rigoroso pode ser feito de várias formas. A forma tradicional foi descrita na Introdução desse texto e pode ser apreciada com detalhes em vários livros, por exemplo [SANTOS, 1994 ou 1981]. Um método que se mostra numericamente robusto e eficiente foi desenvolvido originalmente em nossa tese de doutorado [MENDES NETO, 2000] e publicado em alguns eventos. A formulação original foi feita para a Flexão Oblíqua mas, posteriormente, foi adaptada para a FNC. O processo de dimensionamento é feito com a consideração de alguns pontos fundamentais: (1) a verificação de uma seção transversal é feita (inicialmente) fora do ELU, com o método de Newton-Raphson (NR), (2) a solução obtida (distribuição de deformações) é verificada quanto ao ELU, e (3) o dimensionamento propriamente dito é feito com verificações sucessivas (repetições do primeiro e segundo passos) com áreas de armadura entre limites (usuais) máximos e mínimos (As,máx e As,mín). A grande eficiência numérica observada nos itens (1) e (2) faz com que as verificações sucessivas do item (3) ainda sejam interessantes sob o ponto de vista numérico. Por vezes o processo de NR encontra uma matriz singular ao longo de suas iterações para descobrir o equilíbrio da seção. Se o processo de verificação partiu da solução trivial (seção transversal indeformada) pode-se garantir que a singularidade da matriz implica em uma incapacidade “mecânica” de equilíbrio. Outra opção de não conformidade, naturalmente, é o equilíbrio encontrado estar além das hipóteses do ELU, ou seja, o critério de resistência ter sido ultrapassado. 3.1 Verificação com Newton-Raphson O processo de verificação pressupõe o equilíbrio entre esforços aplicados (de cálculo, índice d de design) e esforços resistentes, ou seja, Nd = Nr e Md = Mr para uma seção transversal conhecida (inclusive armadura). Elegendo como variáveis independentes da distribuição de deformações o encurtamento no CG da seção εo e a rotação específica da seção k (“curvatura”) pode-se montar a equação de recorrência do método de NR como εo ← εo + (1/J). [ EI . ( Nd – Nr ) – ES . ( Md – Mr ) ] (Equação 1)

k ← k + (1/J). [–ES . ( Nd – Nr ) + EA . ( Md – Mr ) ] (Equação 2)

onde J = EI . EA – (ES)2. Deve-se salientar que os esforços resistentes e as rigidezes são referentes à toda seção de concreto armado, ou seja, são resultado da soma das parcelas do concreto e da armadura. Para maiores detalhes ver, por exemplo, [MENDES NETO & PIMENTA, 2000(a)]. As rigidezes são definidas por

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Rm(n) = ∫Dm(ε) yn dx.dy (Equação 3)

onde o índice m referencia o material (concreto ou armadura), Dm(ε) é a derivada do diagrama tensão-deformação do material m (dσ/dε) e a seção é colocada no sistema de coordenadas xy, com origem no CG da seção de concreto, por conveniência. As diferentes rigidezes são obtidas com a variação do expoente n, à saber: EA = Rm(0), ES = Rm(1) e EI = Rm(2). O processo de verificação começa com a solução trivial εo = k = 0 e, iterativamente, com a utilização das equações (1) e (2) podem ocorrer duas situações: a) O processo converge, ou seja, os valores das variáveis independentes (εo e

k) não são alterados durante duas iterações consecutivas ou, de outra forma, os esforços resistentes são praticamente iguais aos aplicados.

b) A seção não suporta os esforços aplicados, ou seja, a quantidade J definida pela equação (3) é aproximadamente nula. Essa situação é definida como falta de resistência mecânica da seção.

3.2 Verificação do Estado Limite Último O processo anterior, verificação “mecânica” da seção transversal, pode terminar com a convergência da distribuição de deformações (caracterizada pelo par εo e k), como já comentado, indicando que há um equilíbrio possível da seção transversal entre os esforços aplicados e resistentes. Não há, entretanto, garantias de que essa distribuição de deformações não ultrapasse uma das hipóteses do ELU, que não foi considerado previamente na formulação do problema. A Figura 1 ilustra a “Região Viável” para o ELU.

3,5

3,5

2

-10

10/β1 27/(2 )β1θ

εc

(a)

(b) (c)

(d) Figura 1 – Região viável do ELU [MENDES NETO & PIMENTA, 2000(b)]

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Na Figura 1 há uma leve alteração de notação que pode ser transformada para a utilizada nesse texto considerando uma seção transversal de altura unitária e, ainda, com θ = | k |, εc = εo + θ / 2 e β1 sendo a distância entre a fibra superior da seção e o CG da camada de barras inferior. Pares (εc, θ) internos ao polígono (a)-(b)-(c)-(d) não causam ELU. Na aresta (a)-(b) tem-se o Domínio 5, na aresta (b)-(c) os Domínios 4a, 4 e 3 e na aresta (c)-(d) os Domínios 2 e 1. Pontos externos ao polígono ultrapassam pelo menos um (e no máximo dois) pólos de ruína, não sendo aceitáveis. A verificação da distribuição de deformações com relação ao ELU é, portanto, imediata. 3.3 Dimensionamento da área de armadura O dimensionamento da área de armadura pode ser realizado com verificações sucessivas, conforme apresentado anteriormente, pelo método de Newton-Raphson. Normalmente métodos com tentativas são ineficientes, e, por isso, devem ser tomados alguns cuidados para melhorar o desempenho do processo como um todo. A primeira importante consideração é a de que os dimensionamentos práticos não são aceitáveis com qualquer valor de área de armadura. Obviamente áreas negativas não têm sentido mas, ainda mais, áreas abaixo de valores mínimos, recomendados por norma, são, igualmente, desprovidas de utilidade prática. Analogamente há prescrições de ordem prática (e inclusas em norma) sobre a área máxima de armadura aceitável. Não é, portanto, razoável dimensionar com a área de armadura podendo ser um número real qualquer. Só há sentido em áreas de armadura entre esses limites máximo e mínimo, que serão chamados de As,máx e As,mín. Outra consideração diz respeito ao processo das tentativas. Pode-se tentar ao acaso obter a área de armadura do equilíbrio entre os limites anteriores. Mais interessante, entretanto, parece ser a “otimização” da área de armadura (qual o valor mínimo?) dentro dos limites estabelecidos. É claro que esse valor mínimo será obtido numericamente dentro de uma certa precisão preestabelecida. Um método adequado para a resolução desse problema parece ser o da bissecção, como mostrado no algoritmo seguinte. Algoritmo de dimensionamento: (a) Verificar a seção com (As)1 = As,mín. Se estiver OK terminar avisando (As)1. (b) Verificar a seção com (As)2 = As,máx. Se não estiver OK terminar avisando

que a seção não suporta os esforços aplicados. (c) Verificar a seção com As = [ (As)1 + (As)2 ] / 2. Se estiver OK vá para o

passo (d), caso contrário (não OK) vá para o passo (e). (d) Se | (As)1 – (As)2 | < tolerância terminar avisando As. Caso contrário faça

(As)2 = As e volte para o passo (c). (e) Faça (As)1 = As e volte para o passo (c).

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A tolerância citada no passo (d) deve ser escolhida adequadamente frente à precisão desejada e ao sistema de unidades escolhido. Um exemplo de “grande” precisão seria uma tolerância de 10-2 quando se consideram áreas de armadura em cm2. Havendo solução física para o problema, será obtida, ao final desse processo, a mínima área de armadura necessária (considerando, obviamente, a tolerância arbitrada). 4 Conclusões e comentários Foram comentadas várias análises científicas de diversas tentativas de simplificação (“fórmulas”, ajuste de curvas e redes neurais artificiais) do dimensionamento da área de armadura de seções retangulares de concreto armado submetidas a Flexão Normal Composta, que levaram à mesma conclusão: os métodos simplificados analisados foram sempre inadequados por problemas de segurança ou economia. Há, ainda, que se ressaltar que a metodologia “rigorosa” de dimensionamento pode ter tratamento numérico simples, não sendo necessária nenhuma simplificação algébrica por conta da utilização corriqueira de programas de computador. Não há, ainda, necessidade teórica de simplificações uma vez que a abordagem rigorosa é mais natural e direta. Uma eventual utilização de métodos simplificados em sala de aula pode até ser benéfica mas, definitivamente, a introdução de erros, por menores que sejam, em projetos reais, é inaceitável. Os programas de computador, ferramentas mais utilizadas para o cálculo, deveriam ser proibidos de utilizarem simplificações. Uma interessante discussão sobre o tema ocorreu na revista Ibracon, com os artigos [MENDES NETO, 2001] [VASCONCELOS, 2001] [MENDES NETO, 2002]. Há, por fim, que se refletir sobre o papel da normalização na Engenharia nacional. Até que ponto ela deve ser paternalista, “ensinando” o engenheiro a calcular ou, por outro lado, deve fornecer diretrizes, parâmetros e limites. A recomendação de métodos simplificados em norma tira toda e qualquer importância dos métodos “rigorosos”, além de abonar o uso das simplificações que, aparentemente, não funcionam a contento. 5 Referências ABNT, Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR-6118 Projeto de Estruturas de Concreto. ABNT, São Paulo, 2000. ALVES, GUILHERME TAVARES MALIZIA. Avaliação do Processo Aproximado para o Dimensionamento da Área de Armadura de Seções Transversais Retangulares de Concreto Armado Submetidas à Flexão Normal Composta (Trabalho de Graduação). Instituto Tecnológico de Aeronáutica, São José dos Campos, 2000.

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DEVRAIGNES, DANIEL. Dimensionamento de Seções Transversais de Concreto Armado com a Utilização de Redes Neurais Artificiais (RNA) (Trabalho de Graduação). Instituto Tecnológico de Aeronáutica, São José dos Campos, 2002. MENDES NETO, FLÁVIO. Sobre a Flexão Normal Simples. III Simpósio EPUSP sobre Estruturas de Concreto, pp. 433-443, EPUSP, São Paulo, 1993. MENDES NETO, FLÁVIO. Tópicos sobre a Análise Não-Linear de Pórticos Planos de Concreto Armado (Tese de Doutorado), EPUSP, São Paulo, 2000. MENDES NETO, FLÁVIO. Simplificar Complica! Revista Ibracon. Instituto Brasileiro do Concreto, São Paulo, No 26, Ano IX, pp. 11-16, Julho-Agosto 2001. MENDES NETO, FLÁVIO. Simplificação das Simplificações. Revista Ibracon, Instituto Brasileiro do Concreto, São Paulo, No 29, Ano X, pp. 27-31, Abril-Junho 2002, São Paulo . MENDES NETO, FLÁVIO & PIMENTA, PAULO DE MATTOS. Análise Eficiente de Seções Transversais Retangulares de Concreto Armado submetidas a Flexão Normal Composta. IV Simpósio EPUSP sobre Estruturas de Concreto, EPUSP, São Paulo, 2000. MENDES NETO, FLÁVIO & PIMENTA, PAULO DE MATTOS. Considerações sobre o Diagrama de Domínios para o Dimensionamento e a Verificação de Seções Transversais de Concreto Armado. IV Simpósio EPUSP sobre Estruturas de Concreto, EPUSP, São Paulo, 2000. SANTOS, LAURO MODESTO. Cálculo de Concreto Armado Segundo a Nova NB-1 e o CEB, Vol 2. LMS, São Paulo, 1981. SANTOS, LAURO MODESTO. Sub-rotinas Básicas do Dimensionamento de Concreto Armado, Vol 1. THOT, São Paulo, 1994. SOUZA, TÁRIK PEREIRA. Estudo Paramétrico das Curvas de Interação para Dimensionamento de Seções Transversais de Concreto Armado (Trabalho de Graduação). Instituto Tecnológico de Aeronáutica, São José dos Campos, 2000. VASCONCELOS, AUGUSTO CARLOS. Simplificar Não Complica: Ajuda. Revista Ibracon. Instituto Brasileiro do Concreto, São Paulo, No 27, Ano IX, pp. 25-32, Novembro-Dezembro 2001 .