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CONSUMISMO, MEIO AMBIENTE E LOGÍSTICA REVERSA

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Consumismo, meio Ambiente e LogístiCA ReveRsA

Consumismo, meio Ambiente e LogístiCA ReveRsA

GABRIELLA DE CASTRO VIEIRAMestre em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável pela

Escola Superior Dom Helder CâmaraPesquisadora do CEBID – Centro de Estudos em Biodireito

Professora do curso de Direito da Faculdade PitágorasMembro da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB/MG

Graduada em Direito pela Faculdade Milton Campos

Belo Horizonte2017

341.347 Vieira, Gabriella de CastroV658c Consumismo, meio ambiente e logística reversa / Gabriella2017 de Castro Vieira. Belo Horizonte: Arraes Editores, 2017. p.153

ISBN: 978-85-8238-309-4

1. Direito ambiental. 2. Meio ambiente. 3. Desenvolvimento sustentável. 4. Mercado de consumo. 5. Consumismo. 6. Logística reversa. I. Título.

CDD(23.ed.) – 344.046 CDDir – 341.347

Belo Horizonte2017

CONSELHO EDITORIAL

Elaborada por: Fátima Falci CRB/6-700

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V

Dedico à minha mãe e ao meu marido, pelo apoio incondicional e o constante incentivo. O amparo de ambos é o meu maior alicerce! Amo vocês!

VI

AgRAdeCimentos

Agradeço a Deus, por me capacitar e por ter colocado no meu caminho pessoas iluminadas, sem as quais esta conquista não seria possível;

Aos meus queridos e amados pais, Delma e Caetano, pela paciência, pela compreensão nas minhas ausências, pelo apoio, pela motivação constante e pelo diferenciado encorajamento;

Aos meus irmãos, Tiago e Isabella, meu sobrinho e afilhado Luiz Felipe, e ao meu cunhado, Fábio, e aos demais membros da minha família, pela torcida, pelo apoio e por entenderem as minhas ausências;

Ao meu espetacular marido, Renato, presente de Deus na minha vida, meu grande companheiro e maior incentivador para o investimento na docên-cia. Agradeço, imensamente, por não ter medido esforços para realizarmos este objetivo e por sempre acreditar em mim;

Ao meu orientador, Dr. Bruno Torquato de Oliveira Naves, pessoa sin-gular, especialmente pela ética e a retidão. Agradeço a confiança a mim depo-sitada, assim como os exemplos, os ensinamentos, os conselhos e a pontual, dedicada e diferenciada orientação;

Aos professores Elcio, Kiwonghi, Beatriz, Luiz Gustavo e Émilien, a que tive a feliz oportunidade de conhecer nesta caminhada;

Aos funcionários e aos colegas da ESDH, especialmente a Ana Valéria, Isabel, Gianno, Simone e Fabíola, que sempre estiveram dispostos a ajudar;

Aos meus amigos e parceiros Ana Maria Varela, Carol, Carlos Frederico e Fabiana, por estarem sempre presentes, com diversas contribuições e muito apoio, especialmente nos momentos mais angustiantes;

Aos meus especiais amigos, que a vida me brindou, Fa, Ana Carol, Jô, Emerson, Gustavo, Carlos Barbosa, Pedro, Joyce, Day e Jorginho, pelo incenti-vo, torcida e compreensão pelas ausências;

A todos os membros do Movimento das Donas de Casa e Consumidores de Minas Gerais – MDC/MG, especialmente à fundadora e Presidente, D. Lúcia Pa-cífico, pela confiança, a credibilidade e a oportunidade de formação profissional;

Aos meus queridos alunos, por terem me despertado o desejo de buscar aperfeiçoamento e aprimoramento.

VII

Enquanto Deus nos dê um resto de alento, não há que desesperar da sorte do bem. A injustiça pode irritar-se, porque é precária. A verdade não se im-pacienta; porque é eterna. Quando praticamos uma ação boa, não sabemos se é para hoje, ou para quan-do. O caso é que os seus frutos podem ser tardios, mas são certos. Uns plantam a semente da couve para o prato de amanhã, outros a semente do car-valho para o abrigo ao futuro. Aqueles cavam para si mesmos. Estes lavram para o seu país, para a fe-licidade dos seus descendentes, para o benefício do gênero humano.

(BARBOSA, 1910, p. 32)

VIII

ListA de AbReviAtuRAs e sigLAs

Abal Associação Brasileira do Alumínio

ABECSAssociação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços

AbralatasAssociação Brasileira de Fabricantes de Latas de Alta Recicla-bilidade

AbrelpeAssociação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Re-síduos Especiais

ADCT Ato das Disposições Constitucionais Transitórias

ADPF Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental

Art. Artigo

BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

CC Código Civil

CDC Código de Defesa do Consumidor

Cempre Compromisso Empresarial para a Reciclagem

Conama Conselho Nacional do Meio Ambiente

ECO-92Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e De-senvolvimento

FGV Fundação Getúlio Vargas

IDEC Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor

MDC/MG Movimento das Donas de Casa e Consumidores de Minas Gerais

MMA Ministério do Meio Ambiente

MP Ministério Público

MPF Ministério Público Federal

ONU Organização das Nações Unidas

IX

ONUBR Organização das Nações Unidas no Brasil

p. Página

Peic Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor

PLS Projeto de Lei do Senado

PNAD Pesquisa Nacional de Amostragem por Domicílio

PPCS Plano de Ação para Produção e Consumo Sustentáveis

PNRS Política Nacional de Resíduos Sólidos

PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

Rio + 10 Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável

Rio + 20Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável

STF Supremo Tribunal Federal

STJ Superior Tribunal de Justiça

UP UNIVERSIDADE POTIGUAR

URV Unidade Real de Valor

USP Universidade de São Paulo

X

ListA de FiguRAs

FIGURA 1 – Processo de Marrakech ..................................................................... 27

FIGURA 2 – Uma década de elevada inflação ..................................................... 51

FIGURA 3 – A transformação econômica da sociedade brasileira .................. 54

FIGURA 4 – A expansão do mercado de cartão de crédito .............................. 73

FIGURA 5 – O progressivo aumento do número de habitantes do planeta Terra ...................................................................................... 84

FIGURA 6 – Coleta de pilhas do programa do Banco Santander ................... 110

FIGURA 7 – Importância da proteção e do cuidado com o meio ambiente .... 115

FIGURA 8 – Posto de coleta em Shopping Pátio Savassi em Belo Horizonte .. 118

XI

ListA de tAbeLAs

TABELA 1 – A durabilidade dos bens de consumo ................................................ 81

TABELA 2 – Exemplo de Tabela Ambiental, Natura .............................................. 112

TABELA 3 – Atitudes cotidianas para ajudar na proteção do meio ambiente .. 116

XII

sumáRio

PREFÁCIO ................................................................................................................. XV

APRESENTAÇÃO .................................................................................................... XVII

CAPíTulO 1INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 1

CAPíTulO 2O DIREITO AMBIENTAL: EVOLUÇÃO, REGULAÇÃO E TRANSDISCIPLINARIDADE ............................................................................... 62.1. O surgimento do Direito Ambiental ............................................................. 72.2. A responsabilidade perante o meio ambiente .............................................. 92.3. A positivação do bem ambiental na Constituição de Portugal ................ 112.4. O Direito Ambiental no ordenamento jurídico brasileiro ........................ 13

2.4.1. As relevantes leis infraconstitucionais da década de 1980 para tutela do meio ambiente: Lei 6.938/1981 e Lei 7.347/1985 ....................... 142.4.2. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: sua importância para a construção e a consolidação da tutela do meio ambiente ..................................................................................................... 21

2.5. Os encontros internacionais sobre meio ambiente e o desenvolvimento sustentável: A Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável – Rio + 10 25

2.5.1. O Processo de Marrakech e o Plano de Ação para Produção e Consumo Sustentáveis (PPCS) do Estado brasileiro.................................... 26

2.6. O meio ambiente e o consumo: uma relação transdisciplinar ................. 29

CAPíTulO 3O SURGIMENTO E A CONSOLIDAÇÃO DA SOCIEDADE DE CONSUMIDORES, A NORMATIZAÇÃO E AS TRANSFORMAÇÕES DA RELAÇÃO CONSUMERISTA ....................................................................... 323.1. O surgimento do mercado de consumo ocidental: o pioneirismo inglês 363.2. A construção do cenário de proteção jurídica do consumidor................. 39

3.2.1. O consumo de massa no Brasil e a respectiva regulação no ordenamento jurídico ........................................................................................ 41

XIII

3.2.1.1. O consumidor na esfera constitucional ........................................... 443.2.1.2. A Lei 8.078/1990 – Código de Defesa do Consumidor ................ 453.2.1.3. Princípios do consumo sustentável ................................................... 48

3.3. O crescimento do mercado consumerista brasileiro ................................... 493.3.1. Da estagnação econômica à expansão da sociedade de consumo .. 503.3.1.1. A estabilidade monetária e o surgimento de uma sociedade de consumo ............................................................................................................... 53

3.4. A Sociedade de Risco......................................................................................... 57

CAPíTulO 4O CONSUMISMO: DAS ESTRATÉGIAS PARA AUMENTAR O CONSUMO AOS IMPACTOS AMBIENTAIS .................................................. 674.1. O papel da publicidade na sociedade consumista ....................................... 664.2. A concessão facilitada de crédito: o seu papel como grande incentivador da prática consumista ....................................................................... 70

4.2.1. O crescimento do setor de cartão de crédito e sua expressiva contribuição para o desenvolvimento do consumismo brasileiro ............ 724.2.1.1. Crediário facilitado, consumismo e superendividamento: o comprometimento da adoção de programas em prol do desenvolvimento sustentável ............................................................................ 75

4.3. A obsolescência programada e a sua contribuição para a majoração da crise ambiental ...................................................................................................... 794.4. Os resíduos sólidos e suas consequências para o meio ambiente ............. 82

4.4.1. Os impactos ambientais resultantes do pós-consumo ...................... 85

CAPíTulO 5A LOGÍSTICA REVERSA COMO UM IMPORTANTE INSTRUMENTO PARA EFETIVAÇÃO DE UM CONSUMO CONSCIENTE E SUSTENTÁVEL ........................................................................ 905.1. A importância da normatização da produção dos resíduos sólidos ........ 91

5.1.1. O princípio da responsabilidade compartilhada ............................... 945.1.2. ADPF 101/DF: a vedação da importação dos pneus usados ........... 96

5.2. A adoção do instituto da logística reversa .................................................... 995.2.1. A responsabilidade do setor empresarial perante o mecanismo da logística reversa .............................................................................................. 1035.2.1.1. O progresso do mercado de reciclagem dos resíduos resultantes do pós-consumo .................................................................................................. 1045.2.1.1.1. A importância da atuação dos catadores de resíduos recicláveis .. 1055.2.1.2. A mobilização da iniciativa privada em prol da efetivação do fluxo reverso ........................................................................................................ 1075.2.1.2.1. Acordo Setorial celebrado com o Ministério do Meio Ambiente 1075.2.1.2.2. Cempre: O engajamento das empresas no tratamento dos resíduos ................................................................................................................. 108

XIV

5.2.1.2.3. Descarte Legal: uma plataforma em busca de tratamento dos resíduos sólidos ........................................................................................... 1095.2.1.2.4. Programa Papa-Pilhas do Banco Santander .................................. 1105.2.1.2.5. Programa de sustentabilidade da Natura ...................................... 1115.2.2. O papel do consumidor no canal de distribuição reverso............... 1125.2.2.1. A educação ambiental como ferramenta para a operacionalização da logística reversa .................................................................................................... 113

CONCLUSÃO ........................................................................................................... 120

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 125

XV

PReFáCio

[...] o spiritusmovens da atividade consumista não é mais o conjunto men-surável de necessidades articuladas, mas o desejo – entidade muito mais vo-látil e efêmera, evasiva e caprichosa, e essencialmente não-referencial que as “necessidades”, um motivo autogerado e autopropelido que não precisa de outra justificação ou “causa”.1

É incrível como o ritmo das mudanças tem se acelerado. Hoje é simples e ordinário ter a sensação – ao menos algumas vezes na vida – de que já somos “velhos” para muitas novidades, mesmo aos 30 ou 40 anos, ainda que estas, na essência, sejam velhas novidades.

É como se os tempos, para usar uma imagem de Bauman, escorressem liquidamente. Talvez, para completar a composição pictórica, a liquidez dos temposescorra por entre os dedos fugazes e compulsivos de um jovem que se comunica digitalmente. É a rápida comunicação nos demonstrando que não somos rápidos o suficiente, nem para utilizá-la o quanto precisamos nem para absorvermos novas formas e novos instrumentos de comunicação.

Ah... os instrumentos de comunicação. Há poucos anos, telefone era o apa-relho que transmitia à distância o som, em especial a fala humana. Hoje, isso é o que menos importa nos “modernos” (ou seriam pós-modernos?) telefones celulares.

O mercado de telefones celulares é uma boa vitrine para compreender como tudo se transforma em instrumento de desejo e status e como o Direito assume a funçãode ora fomentar ora regular o desejo.

Desde 2007, por ano são comercializados mais de um bilhão de celulares, o que representa mais de 11 mil toneladas de cobre e 300 toneladas de prata. Seria um grande equívoco desprezar a matéria-prima adquirida e que substitui o valor de um obsoleto e descartável produto, apesar de ainda valoroso, mas antigo nos seus 3 ou 4 anos de uso.

Seguindo o estímulo de ter sempre o mais novo e avançado, na troca de celulares, o que fazer com o aparelho antigo?

1 BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Tradução de Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Zahar, 2001, p. 88.

XVI

A Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos – Lei n. 12.305/2010 –,no art. 33, estabeleceu a obrigatoriedade da logística reversa para determinados produtos, dentre eles os eletroeletrônicos.

A logística reversa é o instrumento legal que visa a coleta e o retorno dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento ou outra destina-ção ambientalmente adequada.

Trata-se de um meio importante para o equilíbrio ambiental e para a consciência social, mas que nem sempre é conhecido do grande público. Rea-proveitar materiais de aparelhos eletroeletrônicos não é mais que o óbvio em um mundo de responsabilidades.

Mas a logística reversa é suficiente? Como pensar os impactos ambientais pós-consumo?

Esse o grande mérito do trabalho que tenho a honra de prefaciar: ele faz, di-daticamente, todo o percurso do consumo ao consumismo, contextualizando-o nas sociedades pós-industriais, que sobrelevaram os riscos e os globalizaram. Demons-tra, ainda, como as técnicas de publicidade e obsolescência contribuem para o veloz ritmo de vida, do ser humano e dos produtos que elabora, com sua programada escassez de vida útil. E, por fim, enfrenta o problema dos resíduos sólidos e da im-plantação da logística reversa como instrumento gestor dos resíduos pós-consumo.

A autora, Gabriella de Castro Vieira, professora e advogada especialista em relações de consumo, consegue dar vida e sabor à árida e insossa legislação sobre resíduos sólidos, que é distante para o leigo, em virtude de seu tecnicismo e especialização.

A reflexão valoriza os objetivos da boa regulação jurídica consumerista e ambiental, mas é crítica o suficiente para afastar ingenuidades e falsos cami-nhos fáceis. A Bioética Ambiental exige mesmo a postura da autora, voltada para o futuro, para o impensado e para as gerações do porvir. Considera-os como referenciais éticos e propõe mudanças profundas, que vão do consumo ao pós-consumo, pois consumir com consciência é descartar com consciência.

Que o texto se revele na objetividade, leveza e perspicácia, que só grandes textos podem despertar. E que ele se complete em cada indivíduo, em sua subje-tividade e singularidade, pois só assim a educação para a continuidade da vida humana na Terra terá esperanças.

Belo Horizonte, abril de 2017.

BRUNO TORQUATO DE OLIVEIRA NAVESDoutor e Mestre em Direito pela PUC Minas. Advogado. Professor do Mestrado em Di-reito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável da Escola Superior Dom Helder Câmara. Professor nos Cursos de Graduação e Especialização em Direito da PUC Minas e da Escola Superior Dom Helder Câmara. Coordenador do Curso de Especialização em Direito Ur-banístico e Ambiental da PUC Minas Virtual. Pesquisador do CEBID – Centro de Estudos em Biodireito (cebid.com.br). Currículo Lattes: <http://lattes.cnpq.br/8884028178197094>.

XVII

APResentAção

“Não é um cidadão quem não está disposto a respeitar as leis e obedecer ao magistrado civil; e certamente não é um bom cidadão quem não deseja pro-mover, por todos os meios sob seu poder, o bem-estar de toda a sociedade e de seus concidadãos” (Adam Smith).

De acordo com o estágio civilizatório de cada sociedade, a responsabilidade civil é chamada a exercitar uma ou várias funções. Infelizmente, o Brasil é vítima do monopólio da função compensatória da obrigação de indenizar. O ordena-mento só é chamado a intervir diante do evento patológico de um dano patri-monial ou moral. Nesse momento, o Judiciário se presta ao papel de transferir os danos do ofendido ao ofensor, conduzindo a vítima à situação jurídica mais próxima ao momento imediatamente anterior à lesão pela “restitutio in integro”.

Aos poucos, a doutrina brasileira se abre para outras relevantes funções da responsabilidade civil. Fala-se de uma ‘função punitiva’, cujo objetivo é o de sancionar o autor do ilícito pela imposição de uma pena civil face à extrema reprovabilidade de seu comportamento ou desprezo pela sorte da vítima, inde-pendentemente da extensão dos danos. Cogita-se, mais recentemente, de uma ‘função precaucional’, visando impedir a prática ou a reiteração de comporta-mentos antijurídicos, evitando-se a ocorrência de danos que ofendam interesses transindividuais. Mesmo que um dia possamos estabelecer uma harmoniosa convivência entre as funções compensatória, punitiva e precaucional, o fato é que a responsabilidade civil continuará a desempenhar um papel de desestímu-lo a comportamentos antissociais ou atividades que imponham riscos anormais a uma coletividade. O receio de uma sanção negativa impele o ser humano a adotar condutas cautelosas no sentido de não violar a esfera econômica ou existencial de um terceiro. Desde Roma o “neminem laedere” traduz a eficaz imposição de um dever geral de abstenção.

E por qual razão a responsabilidade civil é e sempre foi assim? A resposta reside no senso comum de moralidade humana. É um fato básico que é mais fá-cil prejudicar os outros do que beneficiá-los. Nossa responsabilidade é baseada na causalidade, assim, sentimo-nos responsáveis por um resultado, conforme

XVIII

a nossa contribuição ativa para ele. Intuitivamente, cremos que somos muito mais responsáveis pelo mal que causamos por nossos atos do que pelos males cotidianos derivados de nossas omissões. Por isso, todos os deveres morais e obrigações nos impelem a não ofender a incolumidade de terceiros, sem que existam deveres positivos que estimulem os indivíduos ao altruísmo. Tudo isso explica a enorme aversão que temos diante de perdas, sem que haja uma inver-sa atração pelos ganhos sociais de comportamentos beneméritos, que possam irradiar esperança e solidariedade.

Quando não há um prévio vínculo entre seres humanos, o que encorajaria alguém a transcender o dever moral e jurídico de não ofender a órbita alheia, a ponto de ser empático e se disponibilizar ao engajamento na cooperação recí-proca com pessoas de culturas e nações distintas, ou até mesmo para beneficiar as gerações futuras? Será que o nosso senso de justiça sempre será limitado ao pequeno número de pessoas a quem devotamos a nossa afeição?

Nessa tensão entre a sociedade que temos e aquela que queremos, insere-se a obra apresentada por Gabriella de Castro Vieira, com o título “Consumismo, Meio Ambiente e Logística Reversa”.

O cerne da obra é a imbricação entre as questões ambiental e consumeirista, em um cenário emergencial no qual o ato do consumo se desconecta do conceito real de uma simples operação econômica e se converte em um estilo de vida - o “hiperconsumo” - seja pelas técnicas de marketing agressivo que moldam o com-portamento das sociedades atuais (convertendo o superficial em essencial), ou pela fratura entre o limite do patrimônio e a oferta ilimitada de crédito, visível no fenômeno do superendividamento com todas as suas perversas consequências no campo existencial da pessoa excluída da engrenagem do mercado.

A glorificação do consumo como modus vivendi e o correspondente re-baixamento da cidadania nos países emergentes é ilustrado pela “obsolescência programada”, que mitiga a funcionalidade e durabilidade dos bens de consumo e banaliza o conceito do “descarte”, ao mesmo tempo em que coletividades pouco educadas e esclarecidas não percebem a aceleração da crise ambiental decorrente da exorbitante proliferação de resíduos sólidos, genericamente de-nominados de “lixo”.

Na sequência, Gabriella de Castro bem evidencia os impactos ambientais resultantes do pós-consumo, evidenciado a necessidade do descarte adequado como via de proteção do direito fundamental à saúde e, simultaneamente, tute-la ao direito difuso ao meio ambiente. Daí a importância da aferição do impac-to ambiental como resultado de atividades econômicas e a adoção de medidas de caráter preventiva que lidem eficazmente com essa realidade devastadora.

Para tanto, faz-se uma abordagem da Lei n. 12.305/10, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), instituindo instrumentos aptos a edificar um novo paradigma socioambiental, pautados na conscientização e

XIX

cooperação, mediante a regulamentação da responsabilidade compartilhada e a criação do instituto da logística reversa, por excelência destinado à internali-zação das externalidades produtivas. O que se pretende é a gestão de resíduos sólidos consequente ao descarte de produtos, com o envolvimento de todos os agentes, em um sistema articulado de mitigação de danos pós-consumo, que implemente a sustentabilidade.

Com o retorno dos resíduos ao ponto de origem da cadeia produtiva, todos os protagonistas serão beneficiados: por um ângulo, materialize um ver-dadeiro “Estado sustentável”, cuja intervenção responsável atue em prol das próximas gerações; por outro, empresas reduzem custos, funcionalizam a pro-priedade de bens antes vistos como “consumidos”, investindo em uma imagem corporativa positiva; mais importante, o consumidor ambientalmente educado se converte em partícipe decisivo do processo de distribuição do fluxo reverso, responsabilizando-se pelo descarte e reaproveitamento de produtos.

Enfim, o trabalho está pronto e acabado e merece a cuidadosa leitura não apenas por parte do estudioso do direito, mas por toda e qualquer pessoa que queira compreender que ser um cidadão informado e solidário, é precondição para a aquisição do status de consumidor, hoje e no futuro.

NELSON ROSENVALDPós-Doutor em Direito Civil pela Universidade Roma-Tre (IT). Visiting Academic na Universidade de Oxford (UK). Professor Investigador na Universidade de Coimbra (PO). Doutor e Mestre em Direito Civil pela PUC/SP. Procurador de Justiça do Ministério Público de minas Gerais.