CONTAMINAÇÃO DAS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS NA REGIÃO ... · Os ensaios com C. elegans evidenciaram...

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CONTAMINAÇÃO DAS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS NA REGIÃO COSTEIRA DO RIO GRANDE DO SUL Acesse www.projetolacos.blogspot.com www.ucs.br/site/lacos2 Patrocínio Realização Elias Z. Michalski;Vanessa Susin; Pedro A. R. Reginato; Rosane Lanzer [email protected] , [email protected]; [email protected]; [email protected] Introdução Material e Métodos Resultados Discussão A planície costeira do estado do Rio Grande do Sul é constituída por uma sequência de camadas de diferentes sedimentos, depositados durante os processos de transgressão e regressão marinha, ocorridos durante o Quaternário. A água subterrânea na região é um recurso de grande importância, pois é utilizada para o abastecimento da população urbana e rural e no incremento de atividades agrícolas. A abertura de poços (Fig. 1) é feita de forma empírica, sem respeitar normas construtivas, próximo à residências e fontes poluidoras, como fossas sépticas, pocilgas ou de áreas de cultivo. No município de Balneário Pinhal foram cadastrados 30 poços, dos quais sete foram selecionados (Fig. 3), sendo um destinado ao abastecimento público (aquífero confinado) e seis de uso domiciliar (aquífero livre). Os poços de aquífero livre apresentaram profundidade entre de 18 a 30 metros, e os confinados, acima de 100 metros. Foram efetuadas medidas físicas, químicas, bacteriológicas e de toxicidade crônica da água. A análise de agroquímicos (glifosato e organoclorados) foi realizada em dois poços. Os ensaios de toxicidade foram feitos conforme a norma DIS 10872 (ISO, 2010) que utiliza o nematódeo Caenorhabditis elegans (Fig. 4) como organismo-teste. A análise dos dados foi feita pela taxa de inibição em relação ao controle. Não foi detectada a presença de agroquímicos nas amostras analisadas. Entre os metais, alumínio, ferro e manganês apresentaram valores acima do recomendado pela Portaria da OMS 2914/2011 nos poços BP2 e BP4, enquanto em BP7 somente os dois últimos metais (Fig. 5). As análises da água mostraram ainda problemas relacionados à alta condutividade e elevado número de coliformes fecais e E. coli (BP6). Os ensaios com C. elegans evidenciaram inibição sobre o crescimento em cinco poços estudados (Fig. 6). Efeito sobre a reprodução foi constatado nos poços BP2 e BP7 em quase todas concentrações, e em 50% para BP4, BP5 e BP6. Com exceção dos poços BP5 e BP6, a água apresentou valores de Fe, Mn e Al acima do limite de potabilidade (Fig. 5). Na maioria dos poços foi observado estímulo sobre o crescimento e sobre a reprodução nas menores diluições. Ausência de toxicidade foi constatada nos poços BP1 e BP3. Figura 5: Concentração de ferro, manganês, cálcio e alumínio (mg/L) nas amostras de água de poços do município de Balneário Pinhal, RS. A linha horizontal indica o limite máximo permitido pela Portaria 2914/2011 do Ministério da Saúde. 1,4 1,38 0,126 0,098 0,761 0 0,2 0,4 0,6 0,8 1 1,2 1,4 1,6 BP 2 BP 4 BP 5 BP 6 BP 7 Ferro (mg/L) Poços Presença de Ferro 0,246 0,095 0,062 0,068 0,105 0 0,05 0,1 0,15 0,2 0,25 0,3 BP 2 BP 4 BP 5 BP 6 BP 7 Manganês (mg/L) Poços Presença de Manganês 0,284 0,255 0,036 0,099 0 0,05 0,1 0,15 0,2 0,25 0,3 BP 2 BP 4 BP 5* BP 6 BP 7 Alumínio (mg/L) Poços Presença de Alumínio *Não detectado A B 0 5 10 15 20 25 30 BP 2 BP 4 BP 5 BP 6 BP 7 Cálcio (mg/L) Poços Presença de Cálcio C D A baixa qualidade da água foi encontrada em poços domiciliares pouco profundos, que não atendem às normas técnicas e possuem maior vulnerabilidade à contaminação por influência antrópica. Somente um dos poços destinados ao abastecimento público apresentou toxicidade a qual pode estar relacionada aos altos teores de Fe ou a elevada condutividade. -13 -10 -7 -4 -1 2 5 8 11 14 17 20 BP1 BP2 BP3 BP4 BP5 BP6 BP7 Taxa de Inibição (%) Poços Taxa de inibição do crescimento 50% 40% 20% 10% Diluições -60 -50 -40 -30 -20 -10 0 10 20 30 40 50 60 BP1 BP2 BP3 BP4 BP5 BP6 BP7 Taxa de Inibição (%) Poços Taxa de inibição da reprodução 50% 40% 20% 10% Diluições Figura 6: Taxas de inibição do crescimento e da reprodução de Caenorhabditis elegans nas amostras de poços de Balneário Pinhal, RS. Os metais Fe, Mn e Al são componentes naturais dos ecossistemas e as concentrações elevadas na região têm origem geológica (Reginato et al., 2008). O ferro em excesso tem potencial para causar danos nas células lipídicas, ácidos nucléicos, proteínas e carboidratos, interferindo na função e na integridade celular (Britton et al., 2010). A contaminação por metais independe do tipo de aquífero explorado. A constatação de toxicidade crônica nos dois diferentes tipos de poços avaliados de aquífero livre e confinado, evidencia a baixa qualidade do abastecimento de água potável do município. O estudo mostra a situação crítica da água subterrânea e evidencia risco à sustentabilidade desse recurso hídrico. Referências Britton, R.S.; Leicester, K.L.; Bacon, B.R. (2002). Iron toxicity and chelation therapy. Int. J. Hematol. 76: 219-228. ISO/DIS 10872. (2010). Water quality Determination of the toxic effect of sediment and soil samples on growth, fertility and reproduction of Caenorhabditis elegans (Nematoda). Fomin, A.; Oehlmann, J.; Markert, B. (2003). Praktikumzur Ökotoxikologie Grundlagen und Anwendungen biologischer Testverfahren. Landsberg: Ecomed. 239p. Reginato, P.A.R. ; Brancher L.; Schafer A. L. ; Lanzer R. M.(2008): Poços como vetores de contaminação: O caso dos aquíferos da planície costeira do Rio Grande do Sul. In: XV Congresso Brasileiro de Águas Subterrâneas. Reginato, P.A.R. (2009). Águas subterrâneas. In: Schäfer, A.; Beltrame, G.T.; Wasum, R.A.; Volpatto, S. Fundamentos ecológicos para educação ambiental: municípios de Mostardas, Tavares, São José do Norte e Santa Vitória do Palmar. Caxias do Sul: Educs. p 109- 114. Esses poços, na sua maioria, são pouco profundos (inferiores a 20 metros), do tipo ponteira e captam água de aquíferos livres (superficiais), que apresentam maior vulnerabilidade a contaminação (Fig. 1). Figura 2: Área de abrangência do Projeto Lagoas Costeiras II Cidreira, Balneário Pinhal e Palmares do Sul. Figura 3: Localização dos poços amostrados no município Balneário Pinhal, RS. C. elegans (Fig. 4), é um nematoda do solo de vida livre, reconhecido a níveis fisiológicos, molecular, e de desenvolvimento, é utilizado como bioindicador para testes de toxicidade, apresentando mudanças na velocidade de reprodução e no ciclo de vida quando exposto a metais tóxicos. Figura 4: Esquema do ensaio de toxicidade crônica com Caenorhabditis elegans (adaptado de Fomin et al., 2003). O presente trabalho avaliou a toxicidade crônica da água de poços localizados no município de Balneário Pinhal, no Litoral Médio do Rio Grande do Sul (Fig. 2). Figura 1: Contaminação da água subterrânea em função da ocupação e do uso do solo no entorno da captação (Adaptado de Reginato, 2009). 1- Infiltração de chorume do aterro 2- Fertilizantes e agrotóxicos 3- Infiltração de efluentes da fossa 4- Vazamentos de tanques 5- Lançamentos de efluentes industriais no solo Aquífero confinado:menor vulnerabilidade à contaminação Aquífero livre: maior risco de contaminação

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CONTAMINAÇÃO DAS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS NA REGIÃO COSTEIRA DO RIO GRANDE DO SUL

Acesse

www.projetolacos.blogspot.com

www.ucs.br/site/lacos2

PatrocínioRealização

Elias Z. Michalski;Vanessa Susin; Pedro A. R. Reginato; Rosane Lanzer

[email protected], [email protected]; [email protected]; [email protected]

Introdução

Material e Métodos

Resultados

Discussão

A planície costeira do estado do Rio Grande do Sul é constituída por uma sequência de

camadas de diferentes sedimentos, depositados durante os processos de transgressão e

regressão marinha, ocorridos durante o Quaternário. A água subterrânea na região é um

recurso de grande importância, pois é utilizada para o abastecimento da população urbana e

rural e no incremento de atividades agrícolas. A abertura de poços (Fig. 1) é feita de forma

empírica, sem respeitar normas construtivas, próximo à residências e fontes poluidoras, como

fossas sépticas, pocilgas ou de áreas de cultivo.

No município de Balneário Pinhal foram cadastrados 30 poços, dos quais sete foram

selecionados (Fig. 3), sendo um destinado ao abastecimento público (aquífero confinado) e

seis de uso domiciliar (aquífero livre). Os poços de aquífero livre apresentaram profundidade

entre de 18 a 30 metros, e os confinados, acima de 100 metros. Foram efetuadas medidas

físicas, químicas, bacteriológicas e de toxicidade crônica da água. A análise de agroquímicos

(glifosato e organoclorados) foi realizada em dois poços. Os ensaios de toxicidade foram

feitos conforme a norma DIS 10872 (ISO, 2010) que utiliza o nematódeo Caenorhabditis

elegans (Fig. 4) como organismo-teste. A análise dos dados foi feita pela taxa de inibição em

relação ao controle.

Não foi detectada a presença de agroquímicos nas amostras analisadas. Entre os

metais, alumínio, ferro e manganês apresentaram valores acima do recomendado pela

Portaria da OMS 2914/2011 nos poços BP2 e BP4, enquanto em BP7 somente os dois

últimos metais (Fig. 5). As análises da água mostraram ainda problemas relacionados à alta

condutividade e elevado número de coliformes fecais e E. coli (BP6).

Os ensaios com C. elegans evidenciaram inibição sobre o crescimento em cinco poços

estudados (Fig. 6). Efeito sobre a reprodução foi constatado nos poços BP2 e BP7 em quase

todas concentrações, e em 50% para BP4, BP5 e BP6. Com exceção dos poços BP5 e BP6, a

água apresentou valores de Fe, Mn e Al acima do limite de potabilidade (Fig. 5). Na maioria

dos poços foi observado estímulo sobre o crescimento e sobre a reprodução nas menores

diluições. Ausência de toxicidade foi constatada nos poços BP1 e BP3.

Figura 5: Concentração de ferro, manganês, cálcio e alumínio (mg/L) nas amostras de água de poços do

município de Balneário Pinhal, RS. A linha horizontal indica o limite máximo permitido pela

Portaria 2914/2011 do Ministério da Saúde.

1,4 1,38

0,126 0,098

0,761

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Poços

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BP 2 BP 4 BP 5 BP 6 BP 7

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Poços

Presença de Cálcio C D

A baixa qualidade da água foi encontrada em poços domiciliares pouco profundos, que não

atendem às normas técnicas e possuem maior vulnerabilidade à contaminação por influência

antrópica. Somente um dos poços destinados ao abastecimento público apresentou

toxicidade a qual pode estar relacionada aos altos teores de Fe ou a elevada condutividade.

-13

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Poços

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50%

40%

20%

10%

Diluições

Figura 6: Taxas de inibição do crescimento e da reprodução de Caenorhabditis elegans nas amostras de poços de

Balneário Pinhal, RS.

Os metais Fe, Mn e Al são componentes naturais dos ecossistemas e as concentrações

elevadas na região têm origem geológica (Reginato et al., 2008). O ferro em excesso tem

potencial para causar danos nas células lipídicas, ácidos nucléicos, proteínas e

carboidratos, interferindo na função e na integridade celular (Britton et al., 2010). A

contaminação por metais independe do tipo de aquífero explorado. A constatação de

toxicidade crônica nos dois diferentes tipos de poços avaliados – de aquífero livre e

confinado, evidencia a baixa qualidade do abastecimento de água potável do município. O

estudo mostra a situação crítica da água subterrânea e evidencia risco à sustentabilidade

desse recurso hídrico.

Referências

Britton, R.S.; Leicester, K.L.; Bacon, B.R. (2002). Iron toxicity and chelation therapy. Int. J. Hematol. 76: 219-228.

ISO/DIS 10872. (2010). Water quality – Determination of the toxic effect of sediment and soil samples on growth, fertility and reproduction of

Caenorhabditis elegans (Nematoda).

Fomin, A.; Oehlmann, J.; Markert, B. (2003). Praktikumzur Ökotoxikologie – Grundlagen und Anwendungen biologischer Testverfahren. Landsberg: Ecomed.239p.

Reginato, P.A.R. ; Brancher L.; Schafer A. L. ; Lanzer R. M.(2008): Poços como vetores de contaminação: O caso dos aquíferos da planície

costeira do Rio Grande do Sul. In: XV Congresso Brasileiro de Águas Subterrâneas.

Reginato, P.A.R. (2009). Águas subterrâneas. In: Schäfer, A.; Beltrame, G.T.; Wasum, R.A.; Volpatto, S. Fundamentos ecológicos para

educação ambiental: municípios de Mostardas, Tavares, São José do Norte e Santa Vitória do Palmar. Caxias do Sul: Educs. p 109-

114.

Esses poços, na sua maioria, são pouco profundos (inferiores a 20 metros), do tipo

ponteira e captam água de aquíferos livres (superficiais), que apresentam maior

vulnerabilidade a contaminação (Fig. 1).

Figura 2: Área de abrangência do Projeto Lagoas Costeiras II –

Cidreira, Balneário Pinhal e Palmares do Sul.

Figura 3: Localização dos poços amostrados no

município Balneário Pinhal, RS.

C. elegans (Fig. 4), é um nematoda do solo de vida livre, reconhecido a níveis

fisiológicos, molecular, e de desenvolvimento, é utilizado como bioindicador para testes de

toxicidade, apresentando mudanças na velocidade de reprodução e no ciclo de vida quando

exposto a metais tóxicos.

Figura 4: Esquema do ensaio de toxicidade crônica com Caenorhabditis elegans (adaptado de Fomin et al., 2003).

O presente trabalho avaliou a toxicidade crônica da água de poços localizados no

município de Balneário Pinhal, no Litoral Médio do Rio Grande do Sul (Fig. 2).

Figura 1: Contaminação da água subterrânea em função da ocupação e do uso do solo no entorno da captação (Adaptado de Reginato, 2009).

1- Infiltração de chorume do aterro

2- Fertilizantes e agrotóxicos

3- Infiltração de efluentes da fossa

4- Vazamentos de tanques

5- Lançamentos de efluentes

industriais no solo

Aquífero confinado:menor

vulnerabilidade à contaminação

Aquífero livre: maior risco de

contaminação