Conteúdo gerado pelos utilizadores: desafios para as bibliotecas

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  • 7/31/2019 Contedo gerado pelos utilizadores: desafios para as bibliotecas

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    Contedo gerado pelos utilizadores: desafios para as bibliotecas

    Leito, Paulo Jorge OliveiraBiblioteca de Arte Fundao Calouste Gulbenkian

    CIDHEUS Universidade de vora

    Av. de Berna, 45-A, 1067-001 [email protected]

    Resumo

    A democratizao do acesso s tecnologias da informao e comunicao e a emergncia de

    plataformas que privilegiam a publicao de contedos e a socializao dos indivduos, fez nascer um

    novo tipo de consumidor de informao, agora tambm produtor. O resultado deste novo papel,

    normalmente designado por Contedo Gerado pelos Utilizadores um fenmeno relativamente

    recente, mas que, graas ubiquidade da tecnologia, se tem vindo a espalhar, apesar de o

    comportamento da maioria dos indivduos na Web ser orientado por outras motivaes,nomeadamente a da comunicao.

    O contedo produzido multiforme, apresenta diversos nveis de granularidade, pode ser original,

    derivado ou resultar de uma remistura, produzido individualmente ou de forma cooperativa em

    plataformas que apelam socializao, e nas quais poucos indivduos so grandes produtores e a

    grande maioria contribuintes espordicos. A utilizao destes contedos pela comunidade parece

    obedecer tambm a uma constante que se traduz no consumo dos mesmos, poucos, contedos por

    um grande nmero e numa popularidade diminuta de muitos, o que, apesar disso, no deixa de

    constituir uma nova possibilidade de atingir um nmero diversificado de pequenos nichos. Osproblemas da originalidade, privacidade e qualidade so os que mais recorrentemente ocorrem na

    discusso da outra face desta moeda.

    As bibliotecas tm vindo timidamente a aceitar estes novos produtores, abrindo mesmo sua

    participao os instrumentos de organizao e recuperao de informao que, historicamente, eram

    s seus, mas demonstrando alguma dificuldade na assumpo do papel de produtoras, em

    cooperao, de novos contedos, que no os do domnio tradicional da meta-informao. A

    discusso volta de questes como da organizao, recuperao e preservao destes contedos

    d os primeiros passos, bem como a da gesto destas comunidades de utilizadores/produtores. No

    entanto, esta uma realidade que no possvel ignorar e espera-se que este contributo possa servir

    para lanar a discusso e a investigao na comunidade das bibliotecas portuguesas.

    Descritores: Contedo gerado pelos utilizadores, CGU, Folksonomias, Metadados sociais, Wikis,Bibliotecas, Catlogo 2.0

    Abstract

    The democratization of access to ICT and the emergence of platforms that focus on publishing content

    and the socialization of individuals gave birth to a new kind of information consumer, now also a

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    recent phenomenon, but, thanks to the ubiquity of technology; it has spread, although the behavior of

    most individuals on the web is guided by other motivations, namely communication.

    The content produced is manifold, provides multiple levels of granularity, may be original, derivative or

    the result of a remix, is produced individually or cooperatively on platforms calling for the socialization,

    and in which few individuals are major producers and most sporadic contributors. The use of such

    content by the community also seems to follow a constant that translates into the consumption of a

    large number of content by few people and in a small popularity of many, which nevertheless does not

    cease to be a new possibility to achieve a diverse number of small niches. The problems of originality,

    privacy and quality are the most recurrently occur in the discussion of the other side of this coin.

    Libraries have been tentatively to accept these new producers, even opening their participation

    instruments of organization and information retrieval that historically were only his, but showing somedifficulty in taking the role of producing, in co-operation, new content, than the traditional domain of

    meta-information. The discussion around issues such as organization, retrieval and preservation of

    this content is first started, and the management of these communities of users / producers. However,

    this is a reality that cannot be ignored and it is expected that this contribution will serve to launch the

    discussion and research library community in Portugal.

    Keywords: User generated content, UGC, Folksonomy, Social metadata, Wikis, Libraries, Catalogue2.0

    Introduo e abordagem metodolgica

    Possvel atravs de uma arquitectura de participao que caracteriza a maioria das

    plataformas da Web 2.0, o contedo gerado pelos utilizadores tem vindo a assumir uma importncia e

    uma centralidade cada vez maior. Ao pr em causa o modelo tradicional de produo e distribuio

    da informao, a exploso de contedos criados por qualquer indivduo fora das suas rotinas

    profissionais levanta mltiplas questes, desde a compreenso das formas de produo e consumo

    at da qualidade, passando pelos impactos scio-culturais e econmicos.

    A existncia deste tipo de contedos e destes novos produtores no pode ser ignorada pelas

    bibliotecas, do ponto de vista dos contedos em si mesmos, mas tambm pela possibilidade de fazerintervir os utilizadores na produo cooperativa de servios e contedos, que deixam de poder ser

    percepcionados como algo que se d, mas algo que pode ser construdo em conjunto. O que fazer

    com estes contedos? Como enquadrar a participao dos utilizadores nos sistemas de informao

    das bibliotecas? Como criar e gerir um servio que resulta desta participao? So algumas das

    questes que imediatamente se levantam.

    Na tentativa de compreender este fenmeno, mas sobretudo as suas implicaes para as

    bibliotecas, este trabalho apresenta uma reviso da literatura que levanta o estado da questo,

    sobretudo no que respeita ao segundo aspecto, na dupla vertente da informao e da

    metainformao.

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    No que diz respeito produo de metainformao social no contexto das bibliotecas ser

    privilegiada apenas uma forma, a da atribuio de palavras-chave. O privilgio dado a esta forma de

    participao justifica-se pelas seguintes razes: um dos aspectos mais estudados neste domnio; as

    bibliotecas comeam a possibilitar, cada vez mais, este tipo de participao quer no ambiente

    tradicional quer no ambiente das novas plataformas de redes sociais onde publicam contedos e, porltimo, significa a abertura participao de no especialistas de um domnio maioritariamente da

    exclusividade dos profissionais.

    Embora considerando que, como alerta Karen Smith-Yoshimura, social media and social

    metadata overlap; you cannot have social metadata without the social media functions that create it

    (SMITH-YOSHIMURA, 2010, 5), o que igualmente vlido para a informao, as funcionalidades que

    permitem a produo e partilha deste tipo de contedo s sero referenciadas quando tal se torna

    essencial compreenso do problema.

    A pesquisa foi realizada maioritariamente na LISTA (Library and Information Science

    Technology Abstracts), Google Scholar, Google Books e Google, utilizando as seguintes expresses:

    user-generated content, user-created content, consumer-generated media, posteriormente

    conjugadas com a palavra library. Dos resultados privilegiaram-se os textos publicados em contexto

    cientfico, quer em revistas com arbitragem, quer em actas de reunies cientficas, quer ainda o

    resultado de provas acadmicas. S marginalmente foram considerados estudos que analisam este

    fenmeno do ponto de vista econmico.

    Os resultados da anlise do corpus de textos seleccionados so apresentados,

    genericamente, em duas partes. Na primeira, apresenta-se a sntese e a problemtica que resulta da

    investigao sobre o contedo gerado pelos utilizadores e na segunda, quer os resultados da

    investigao, quer casos significativos de utilizao do contedo gerado pelos utilizadores no

    contexto das bibliotecas.

    I- O conceito e o fenmeno

    1.1. Contedo gerados por utilizadores

    No momento actual, no existe uma nica definio deste conceito. A questo levanta-se, desde

    logo, ao nvel da sua denominao. Na literatura em lngua inglesa foi possvel recensear trs

    designaes alternativas: user-generated content, user-createdcontente consumer generated media

    (WIKIPEDIA; OCHOA, 2008). No caso portugus, os ltimos estudos sobre a utilizao da Internet

    parecem ter fixado a denominao contedo gerado pelos utilizadores (CARDOSO, 2010).

    As primeiras referncias a este termo datam de 1995, tornando-se muito utilizado em

    2005/2006 com o desenvolvimento da Web 2.0. A esta popularidade correspondeu, tambm, uma

    evoluo das atitudes medida que as suas mltiplas formas de expresso e utilizao se foram

    difundindo na Web, bem como as tecnologias e os modelos de negcio (HALBERT, 2009).

    Qualquer que seja a denominao usada, esta terminologia deixa antever dois aspectos

    essenciais do conceito: a criao de contedos, onde aparentemente cabe toda a diversidade detipos que resultam de um determinado esforo criativo; e o utilizador, denotando o termo o estatuto

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    mais genrico de qualquer indivduo face informao, suas ferramentas e sistemas, por contraste

    com o de especialista. A definio presente na Wikipedia refora claramente este aspecto ao

    designar os utilizadores por "end-users" acrescentando "as opposed to traditional media producers

    such as professional writers, publishers, journalists, licensed broadcasters and production companies"

    (WIKIPEDIA).Ultrapassando esta abordagem muito incipiente, a OCDE (OECD, 2007), apresenta uma

    proposta de definio, largamente utilizada na literatura (WIKIPEDIA; LIMONARD, 2007; OCHOA,

    2008; LE-BORGNE- BACHSCHMIDT, 2008) que distingue este tipo de contedo por: a) ser objecto

    de uma qualquer forma de publicao que o torne disponvel comunidade; b) resultar de algum

    esforo criativo, seja atravs de criaes originais ou resultado de adaptao de criaes j

    existentes; c) ser criado fora das rotinas e prticas profissionais.

    O prprio relatrio admite duas dificuldades nesta caracterizao: a primeira de natureza

    conceptual e a segunda de tipo circunstancial. No primeiro caso est a dificuldade em definir, com

    relativa exactido, como se aplica o conceito de esforo criativo neste contexto. No segundo caso,

    tem vindo a assistir-se a uma tendncia para a comercializao do contedo gerado por utilizadores,

    quer pela aquisio de plataformas incialmente orginrias na comunidade, quer pela utilizao e

    explorao deste tipo de contedo em plataformas comerciais.

    A abrangncia desta definio de CGU apresenta a vantagem de dar conta da grande

    diversidade de tipologias de contedos, desde textuais a visuais, passando pelos multimdia e

    hipermdia, que os utilizadores podem e efectivamente produzem para e na Web. No entanto, tem

    vindo a ser posta em causa por alguns autores com diferentes abordagens que densificam o conceito.

    Uma das tendncias mais relevantes passa por tentar classificar estes contedos de acordo

    com vrios critrios, como o caso da categorizao que definida no relatrio sobre este tema

    encomendado pela Comisso Europeia (LE BORGNE-BACHSCHMIDT, 2008). Utilizando trs

    critrios: tipo de contedo, aspecto social e aspecto econmico, conclui por uma espcie de

    taxonomia que apresenta seis possibilidades: contedo de natureza pessoal (que o estudo define

    como aquele que no objecto de tratamento editorial pelo produtor), sem remunerao e de difuso

    restrita (amigos, por exemplo); contedo de natureza pessoal, sem remunerao e de difuso

    alargada; contedo editado (na expresso do relatrio aquele que conta uma histria story telling),

    sem remunerao e de difuso restrita; contedo editado, sem remunerao e de difuso alargada;

    contedo editado, remunerado e de difuso restrita, e, finalmente, contedo editado comremunerao e de difuso alargada. O aspecto mais inovador desta classificao o de considerar

    como critrio no a plataforma onde o contedo criado, j que existem, quer muitas plataformas do

    mesmo tipo, quer plataformas multi-contedo, nem a natureza do contedo (udio, vdeo, textual,

    etc.), visto que a produo multifacetada, mas sim o tratamento que o utilizador d a esse contedo

    em termos do valor que acrescenta, o que pode ser uma forma de ultrapassar a dificuldade que a

    definio da OCDE, que este relatrio tambm utiliza, tem, como se viu, de definir esforo criativo.

    Nenhuma destas definies, maioritariamente originrias do campo de estudos dos media,

    distingue as dimenses da informao e da metainformao. Considerando esta ltima, a produo

    de contedos pelos utilizadores recebe a designao, para alguns autores, de metadados sociais,

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    qual corresponde o conceito definido como additional information about the resource resulting from

    user contribution and online activity such as tagging, comments, reviews, images, videos, ratings,

    recommendations that helps people find, understand, or evaluate the content (SMITH-

    YOSHIMURA, 2010, 14). Outros autores designam esta realidade, destacando o aspecto mais

    especfico da atribuio de palavras-chave, como atribuio colaborativa de palavras-chave(collaborative tagging) (GOLDER, 2006; MACGREGOR, 2006) ou palavras-chave sociais (social

    tagging) (TENNIS, 2006). O conjunto de palavras-chave usadas pelos utilizadores em cada

    plataforma , normalmente, designado por folksonomia (PETERS, 2009).

    1.2. Produtor / Consumidor

    O modelo praticamente exclusivo de produo e distribuio da informao que se baseia na

    dicotomia entre produtor e consumidor, a fim de garantir a mercantilizao do seu produto final,

    assiste, no contexto da web 2.0, exploso de um modelo alternativo, no qual essa dicotomia se

    esbate para fazer nascer o produtor que , ao mesmo tempo, consumidor. No entanto, este diferente

    modelo est longe de ser predominante, visto que a percentagem de criadores muito menor que a

    percentagem de consumidores (LE BORGNE-BACHSCHMIDT, 2008), e mesmo nos primeiros

    existem diferentes tipos de comportamentos.

    A emergncia de um novo tipo de consumidor foi considerada muito antes do aparecimento

    da Web. Nos anos 70 do sculo XX, Alvin Toffler utilizava pela primeira vez o termo prosumerpara

    designar um novo tipo de consumidor de bens que requeria uma maior customizao e

    individualizao dos produtos. No entanto, estas e outras concepes semelhantes maintain a

    traditional industrial value production chain: they retain a producer

    distributor

    consumer trichotomy(BRUNS, 2007).

    Numa economia dominada pela informao, este modelo industrial de produo/consumo,

    mesmo considerando um papel menos passivo do consumidor, no adequado para descrever a

    realidade, j que, the production of ideas takes place in a collaborative, participatory environment

    which breaks down the boundaries between producers and consumers and instead enables all

    participants to be users as well as producers of information and knowledge frequently in an

    inherently and inextricably hybrid role where usage is necessarily also productive (BRUNS, 2007).

    Este acento tnico sobre as formas colaborativas de produo leva Bruns a designar os seus agentes

    como produserse o processo de produo/consumo como produsage, que caracteriza destacando os

    seguintes aspectos: gerao de contedo distribuda por comunidades alargadas; a diversidade de

    papis que um indivduo, sendo profissional ou amador, pode desempenhar, desde leader a mero

    utilizador; a caracterstica evolutiva, iterativa a palimpsstica dos artefactos produzidos e, finalmente,

    o facto de os contedos serem disponibilizados de forma a, embora reconhecendo a autoria, poderem

    ser utilizados por outros. (BRUNS, 2007).

    Esta e outras abordagens na mesma linha (NING, 2009), apesar de destacarem importantes

    aspectos da realidade caracterizando-os de forma a realar as mudanas de paradigma na produo

    e no consumo da informao, deixam de lado o universo de CGU produzido individualmente. Se, aos

    conceitos de Bruns imediatamente se pode associar, por exemplo, a Wikipedia e a grande maioria da

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    informao produzida em ambientes que sobrevivem com base na colaborao no acto produtivo, o

    facto que publicar uma fotografia no Flickr ou um vdeo no YouTube dificilmente se rev nesta

    abordagem. O que parece estar ausente nestas vises da questo , por um lado, a distino entre

    criao e difuso e, por outro, a necessidade de distinguir os diferentes modelos de produo,

    individual ou colectiva.Uma abordagem complementar anterior parte do princpio de que o CGU, tal como o

    contedo profissional, se desenvolve ao longo de uma cadeia de operaes que vo acrescentando

    valor. Nesta cadeia de operaes, que vai desde a produo at utilizao, o utilizador acrescenta

    valor nas diversas etapas, j que: produz contedo, publica, avalia ou classifica, recomenda e utiliza

    (LIMONARD, 2007). A principal distino em relao a uma cadeia de valor mais tradicional que a

    utilizao deixou de ser apenas passiva, ela pode passar por uma apropriao desse contedo para a

    gerao de nova informao.

    O produtor deste tipo de contedos muitas vezes caracterizado como amador no sentido

    em que, como se verificou na anlise da definio da OCDE, o contedo criado, em princpio, fora

    das rotinas e prticas profissionais. Mas, nem todo o contedo criado fora deste ambiente

    necessariamente contedo amador. Ento, como distinguir contedo amador de contedo

    profissional? Um dos critrios pode ser a qualidade. No entanto, quando contedo com qualidade

    distribudo por profissionais fora das suas rotinas de trabalho, esta distino deixa de fazer sentido.

    Um outro critrio pode encontrar-se na adeso a standards, que, no entanto, podem ser

    ultrapassados pelas fronteiras cada vez menos precisas entre profisses, como o caso do

    jornalismo e dos blogues na difuso de notcias. O critrio mais adequado parece ser, segundo Elkin

    Koren (ELKIN-KOREN, 2009) o de natureza financeira, o que permite distinguir actividades

    profissionais, como aquelas que o indivduo pratica remuneradamente, e as actividades de lazer.

    Assim, este exerccio de tentar distinguir claramente contedo amador de contedo profissional pode

    ter cada vez menos sentido, j que as fronteiras so, como se verifica, cada vez menos definidas.

    So os mais jovens que, em termos quantitativos, mais contedo produzem apesar da

    participao dos mais velhos ter vindo a aumentar nos ltimos anos. A exploso da participao

    juvenil e de jovens adultos no ambiente Web 2.0 tem conduzido alguns (TAPSCOTT, 2008) a concluir

    que estas geraes teriam transversalmente um conjunto de competncias tecnolgicas e

    comportamentos que fariam deles a Gerao Internet ou os Nativos Digitais. No entanto, j h alguns

    anos que grupos de investigadores tm vindo a analisar em maior profundidade esta questo pondo oacento tnico no tanto na acessibilidade tecnologia, j que este grupo geracional constitui aquele

    onde o acesso est mais disseminado, mas na questo das prticas. evidente que a qualidade da

    acessibilidade, por exemplo em termos de largura de banda, especialmente relevante para este tipo

    de actividades de produo e partilha de contedos. No entanto, vrios estudos tm demonstrado

    que o aproveitamento das oportunidades proporcionadas por uma melhor acessibilidade est

    relacionado com diferentes nveis de conhecimento e competncias no ambiente em linha. A

    aquisio e expresso destas competncias e conhecimentos diferenciada nesta gerao, o que

    alguns autores designam como participation gap, ao qual parecem estar ligadas variveis

    sociogrficas clssicas (HARGITTAI, 2007).

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    O que move os indivduos a produzir contedos e disponibiliz-los nestes novos contextos?

    Os resultados das investigaes realizadas sobre esta questo referem com mais frequncia trs

    tipos de motivaes: informao, entretenimento e expresso individual (STOECKL, 2007; STRUBE,

    2009), portanto, motivaes intrnsecas, ou seja, aquelas em que a recompensa se encontra na

    prpria actividade e no em factores externos. A dimenso entretenimento parece ser a maistransversal em todos os tipos de contedo. Na dimenso informao podem estar presentes

    motivaes como partilhar informao, documentao e aprendizagem; na dimenso identidade

    encontram-se motivaes como auto-expresso e auto-representao, reputao e ideologia. Strube

    e outros acrescentam ainda a dimenso da integrao/interaco social, que se pode traduzir em

    motivaes como pertena social e comunicao com os outros (STRUBE, 2009).

    Alguns autores (OECD, 2007; ELKIN-KOREN, 2009) chamam a ateno para o aumento da

    presso contextual junto dos produtores para explorao econmica dos contedos. Esta presso

    claramente explicada por Elkin-Koren ao escrever: Users are facing rising cost of establishing an

    online reputation and managing their online presence in different social media platforms. This may

    require large investments in search enhancement, website optimizing, and viral promotion. The fact

    that individual creators are put at the forefront of culture creation further increases the commercial

    pressures (ELKIN-KOREN, 2009, 31).

    1.3. O fenmeno: caractersticas e evoluo

    Mesmo na fase anterior da Web e apesar da menor diversidade de tecnologias empregues,

    de facto the fundamental ingredients which reshuffled the production and distribution of creative

    works where already there: the means of producing and communicating content to the mass become

    available to every userto the Net, at low cost (ELKIN-KOREN, 2009, 17). As diferenas em relao

    situao actual esto certamente ligadas escala, mas tambm ao mediaonde se desenvolvem, s

    diminutas barreiras de entrada para os cidados escolarizados do sculo XXI, s facilidades em

    coordenar esforos permitindo o nascimento mais fcil de obras colaborativas e alterao da cadeia

    de produo, que permite uma fcil reutilizao do contedo.

    medida que estas prticas se tm vindo, quer a diversificar, quer a espalhar pelo universo

    Web, o seu impacto tem vindo a ser discutido, nomeadamente, a potencialidade para democratizar o

    discurso pblico e torn-lo mais participado. Ao tornarem-se menos dependentes dos intermedirios

    tradicionais para produo e distribuio, o paradigma de um para muitos transforma-se no

    paradigma de muitos para muitos, o que evidentemente pode afectar a qualidade do resultado final,

    mas proporciona um extraordinrio alargamento de perspectivas e pontos de vista. Mas esta

    alterao no apenas quantitativa, a natureza da participao e envolvimento na produo e

    distribuio diferente. Assim, a esfera pblica proporcionada pelo contedo gerado pelos

    utilizadores mais diversificada, reflecte um maior nmero e diversidade de vozes, alinhada com

    preocupaes mais universais.

    No entanto, embora os intermedirios sejam diferentes, a produo e partilha de contedos

    grandemente dependente dos vrios tipos de plataformas, que desempenham diversas funesdesde proporcionarem uma grande facilidade no uso da tecnologia at promoo da sociabilidade,

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    passando pelo armazenamento dos contedos e pela sua disponibilizao, sendo que estas parecem

    partilhar de males semelhantes aos dos media tradicionais. Em primeiro lugar, a tendncia para a

    concentrao, motivada por vrias foras. Por outro lado, a presena de preocupaes financeiras,

    mesmo excluindo as plataformas que visam deliberadamente o lucro, no pode ser considerada de

    menor importncia, mesmo se tivermos em conta que os custos so, neste ambiente, menores queos que tradicionalmente esto envolvidos nas formas de produo e distribuio dos contedos

    tradicionais. (ELKIN-KOREN, 2009)

    As solues para assegurar a sustentabilidade destas plataformas podem ser de diversos

    tipos, mas um dos mais recorrentes modelos de negcio o da publicidade que depende claramente

    da potencialidade de atrair utilizadores, o que faz com que new platforms, like old intermediaries,

    monetize on users attention (ELKIN-KOREN, 2009, 22), embora com uma diferena significativa:

    so os utilizadores que produzem os contedos.

    Do ponto de vista dos contedos efectivamente produzidos, o CGU apresenta uma grande

    diversidade de tipologias em termos de media utilizados, uma diferente granularidade, desde

    contedos estruturados at micro-contedos e um diverso nvel de qualidade. Estas vrias tipologias

    podem traduzir-se na criao de uma obra original ou de uma obra derivada adaptando e

    remisturando contedos originais, o que leva alguns a criticar esta forma de produo que apenas

    explora as obras efectivamente originais. Alis, na definio de contedo gerado por utilizadores

    parece estar implcita a ideia de falta de originalidade. No entanto, para outros autores como Elkin-

    Koren, no s este tipo de contedo derivado est alinhado com os direitos de autor do ponto de vista

    uso justo, como ele faz cada vez mais parte do fluxo cultural contemporneo.

    Uma perspectiva mais generativa, que aponta para a compreenso dos aspectos intrnsecos

    da produo e partilha, e utiliza a noo de ciclo de vida dos contedos revela-se uma das mais

    profcuas, por diversas ordens de razes: em primeiro lugar considera o fenmeno de produo de

    contedo como uma totalidade que inclui genericamente todas as fases desde a produo

    propriamente dita at partilha e utilizao; em segundo, trata-se de um conceito utilizado e testado

    anteriormente para ambientes de produo anteriores a Web e igualmente aplicado a este contexto

    muito antes da designada Web 2.0 (BELIMPASAKIS, 2009).

    O CGU tem conhecido um significativo crescimento, pelo menos desde 2005 (OECD, 2007;

    LE BORGNE-BACHSCHMIDT, 2008, UNIVERSAL MACCAN, 2009; UNIVERSAL MACCAN, 2010),

    embora no seja possvel determinar com exactido o seu volume, devido possibilidade de omesmo contedo estar publicado em diversas plataformas e dificuldade em distinguir exactamente

    contedo profissional de amador, que, no raro, aparecem juntos no mesmo contexto. Apesar disto,

    alguns dados quantitativos permitem uma primeira aproximao sua importncia e difuso na

    actualidade: em Novembro de 2010, existiam 150.610.000 blogues com um crescimento de 78.000

    por dia e eram publicados quotidianamente 90 milhes de tweets (TROSOW, 2010). De acordo com

    dados referentes a esse mesmo ano, 2.5 bilies de fotos so publicadas no Facebook por ms,

    enquanto os membros do Flickr carregam 3.000 em cada minuto. No YouTube, todos os minutos so

    carregadas 24 horas de vdeos (TROSOW, 2010).

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    De entre as actividades que se incluem no conceito de CGU, as que mais cresceram nos

    anos mais recentes foram, por ordem de frequncia: ver clips de vdeo em linha, seguida da leitura de

    blogues e blogues pessoais, visitar um stio de partilha de fotografias, gerir um perfil numa rede

    social, deixar um comentrio num blogue, carregar fotografias num stio de partilha deste tipo de

    contedos (UNIVERSAL MACCAN, 2009, 2010). Pode, assim, concluir-se que the communicationusages in general hold a major place on the Internet (emails, social networking sites, instant

    messaging, sharing thoughts on forum), but the main dynamic activities are clearly linked to

    entertainment content either professional or amateur (LE BORGNE-BACHSCHMIDT, 2008, 50).

    A ubiquidade cada vez mais crescente da tecnologia permite, por outro lado, que o CGU se

    espalhe de forma cada vez mais transversal e se produza por processos cada vez mais simples. No

    entanto, o efectivo crescimento deste tipo de actividade est claramente ligado alterao das

    condies de acesso tecnologia, bem como s competncias para o seu uso (OECD, 2007; LE

    BORGNE-BACHSCHMIDT, 2008).

    Por outro lado, para uma compreenso mais profunda deste fenmeno necessrio ter em

    linha de conta algumas das caractersticas das redes sociais que directamente influenciam os

    comportamentos dos indivduos nesse ambiente e mais especificamente a produo de contedos.

    Em primeiro lugar, o esforo reduzido necessrio utilizao e adeso rede (BRUNS, 2009). Em

    segundo lugar, uma grande granularidade das tarefas permite aos utilizadores contribuir com

    contedo em diferentes nveis de extenso, complexidade e profundidade medida que vo

    adquirindo o conhecimento e as competncias necessrias utilizao das funcionalidades que esto

    disponveis e evoluo da rede de relaes que vo estabelecendo. Por ltimo, uma j extensa

    linha de estudos sobre comunidades, offlineou online, demonstra que estas tendem a construir uma

    estrutura com claras distines de papis, desde os que meramente observam at emergncia de

    lideres. No entanto, como assinala Bruns, estas estruturas devem ser flexveis e dotadas de

    mecanismos que possam garantir uma equipotencialidade, ou seja, a possibilidade de todos

    evolurem dentro da comunidade (BURNS, 2009). Por outro lado, no s se assiste a uma definio

    relativamente hierarquizada de papis, como tambm gerao de normas sociais atravs da

    definio de boas prticas. Assim, como afirma Trosow, users themselves determine acceptable

    behavior in these environments (TROSOW, 2010, 26).

    1.4. Apoiantes VS CrticosO fenmeno do contedo gerado pelos utilizadores tem vindo a ser perspectivado, no que diz respeito

    aos seus impactos civilizacionais, das mais diversas formas: desde os que so claramente

    entusiastas e consideram que este, sendo um dos principais traos do fenmeno Web 2.0, tem

    potencialidade para democratizar o espao pblico e alterar a forma como compreendemos o mundo

    e os outros; at aos mais ferozmente crticos que, pelo contrrio, preferem destacar aspectos como,

    por exemplo, o da proliferao de contedos de baixa qualidade, o que conjugado com a grande

    visibilidade que lhe dada pelas plataformas de publicao/socializao pode contribuir para o

    colapso da cultura ocidental tal como a conhecemos hoje.

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    grandes plataformas, quer ainda da sua comparao com formas profissionais de produo. A

    abordagem metodolgica da grande maioria destes estudos de tipo quantitativo, com particular

    incidncia na anlise das distribuies de produo ou utilizao.

    Analisando a produo e consumo em vrias plataformas especficas (LE BORGNE-

    BACHSCHMIDT, 2008), verifica-se que no caso dos blogues, a leitura tornou-se uma actividadecomum e o seu crescimento tem sido constante (2006-2008). Em termos de frequncia parece ter-se

    tornado uma actividade regular. Relativamente criao do seu blogue pessoal verifica-se um

    crescimento constante, mas um decrscimo na criao e n de blogues activos em geral (LE

    BORGNE-BACHSCHMIDT, 2008). Os indivduos criam posts sobre os mais variados temas, mas

    predominantemente sobre notcias e assuntos correntes, e em seguida negcios; outros tpicos com

    algum destaque so: cincia, desporto, tecnologia, msica, jogos, filmes, TV, ao mesmo tempo que

    crescem os blogues com contedo multimdia. Assim, pode concluir-se que, blogs are thus fare

    more than just the online version of the previous personal diaries. They also give opportunity to

    share ones knowledge, ones know-how or ones passion (LE BORGNE-BACHSCHMIDT, 2008, 63).

    No domnio das plataformas de redes sociais (LE BORGNE-BACHSCHMIDT, 2008), verifica-

    se que a participao uma actividade muito popular, sendo que quase 60% dos utilizadores activos

    da Internet criaram um perfil numa rede social. Visitar as plataformas sociais e actualizar os seus

    perfis/pginas tornou-se uma actividade regular e frequente num curto espao de tempo. Os tipos de

    contedos mais disponibilizados so, por ordem de importncia em termos quantitativos, fotos, vdeos

    e aplicaes. Os que no participam invocam razes como a falta de relevncia destes servios e as

    questes da privacidade.

    Analisando mais profundamente as caractersticas da produo, alguns estudos,

    particularmente o de Ochoa e Durval (OCHOA, 2008) revelam que, em termos gerais, o nmero de

    itens produzido por cada utilizador tem uma distribuio assimtrica, que toma a forma de uma cauda

    longa, o que significa que um pequeno nmero de produtores publica um elevado nmero de itens e

    um grande nmero de produtores um pequeno nmero. Comparando estas formas de produo com

    ambientes de produo profissional, os mesmos autores concluem que "amateur users contribute

    online material in a similar manner (same type of size frequency distribution) than traditional authors

    contribute more establish forms as scientific papers or books, even if the barriers and publishing

    channels are completely different." (OCHOA, 2008).

    Desta anlise parece poder concluir-se que:1. No existe um utilizador mdio. Muitos utilizadores contribuem com pouco contedo e poucos com

    muito;

    2. Embora semelhante, a produo de diversos tipos de contedo no exactamente igual;

    3. Todas as plataformas parecem ser sensveis aos extremos da variedade de contribuies;

    4. O esforo necessrio para contribuir em cada uma das plataformas no parece ter efeito sobre a

    distribuio das contribuies;

    5. A quantidade de itens publicados no parece ter efeito na distribuio das contribuies, j que

    mesmo que a quantidade aumente o tipo de distribuio mantm-se;

    6. As diferentes formas da curva de distribuies, se bem que dentro do paradigma da cauda longa,

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    revelam a necessidade de estar mais ou menos atento aos maiores contribuintes, j que eles podem

    ter um papel extraordinariamente decisivo na continuidade do processo.

    Um dos aspectos que tem sido assumido que o contedo gerado pelos utilizadores tem

    uma forte incidncia local, nomeadamente no que respeita a informao de carcter geogrfico. Os

    resultados do estudo de Hecht e Gergle que pretendiam medir a distncia mdia de contribuio nocaso do Flickr e cinco diferentes edies lingusticas da Wikipedia, sugerem a existncia de diferentes

    modelos de produo de contedo espacial. A Wikipedia corresponderia a um modelo "terra plana",

    ou seja, dadas as facilidades de editar e acrescentar informao sobre virtualmente todos os locais

    do mundo, os utilizadores podem contribuir com informao sobre um local onde, por exemplo, nunca

    estiveram. No caso do Flickr, a ideia de publicar fotos produzidas pelos indivduos sugere a sua

    efectiva presena no local. Isto cria um padro de distncia mdia de contribuio que se assemelha

    ao comportamento espacial no mundo real, criando um repositrio no qual a participao local

    muito maior. Em relao ainda ao Flickr, estes resultados tambm destroem a ideia de que este

    servio seria essencialmente uma base de dados de fotografias tursticas (HECHT, 2010).

    Um tipo de contedo especfico, mas que tem conhecido um crescimento significativo e onde

    o esforo criativo genericamente maior, o contedo aplicacional. Este contedo pode traduzir-se

    na criao de programas aplicacionais (APP) que so pequenas aplicaes desenhadas para

    executar uma tarefa simples num dado contexto de hardware ou software com o objectivo de,

    maioritariamente, no contexto Web, possibilitarem o acesso a dados para posterior reutilizao.

    Normalmente desenvolvidas por programadores profissionais, existe, no entanto, a growing

    movement to support user-generated apps that often take the forma of data mashups (TROSOW,

    2010, 17).

    Do lado do consumo, a actividade predominante a visualizao de vdeos. A actividade de

    descarregar um podcast parece ter tido dificuldade em se difundir, mas conheceu recentemente

    algum crescimento e a sua taxa de penetrao alargou-se decisivamente. Subscrever RSS no tem

    sido uma actividade com sucesso, embora os que usam sejam utilizadores frequentes, mas as

    tendncias evolutivas so encorajadoras nos ltimos anos (LEITO, 2010c). No que respeita

    atribuio de palavras-chave tem-se verificado um crescimento explosivo no mbito dos blogues, de

    acordo com o servio de indexao de blogues Technorati. No existem dados para esta actividade

    fora do universo dos blogues, o que no permite ter uma noo, ainda que aproximada, da sua

    importncia (LE BORGNE-BACHSCHMIDT, 2008).

    1.6. Tagging e Folksonomias

    O termo folksonomia, que resulta da juno das palavras folk(popular) e taxonomia, foi criado

    por Vander Wall em 2004 (CONRADI, 2009). Pode ser definida como uma taxonomia criada pelos

    utilizadores. Compe-se do conjunto de palavras-chave (tag's) atribudas por estes, dependendo das

    possibilidades postas sua disposio pelas plataformas onde interagem. A atribuio ,

    normalmente, livre no sentido em que os utilizadores podem atribuir qualquer palavra ou conjunto de

    palavras directamente da linguagem natural, no pressupe, portanto, a existncia de uma linguagem

    controlada e regulada por um conjunto mnimo de regras dentro de cada plataforma (por exemplo, a

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    regra relativa a criao de termos compostos). O conjunto de palavras-chave atribudas por um

    determinado utilizador configura um universo pessoal de identificao de recursos de informao que

    pode ser designado por pessonomia (personomy) (PETERS, 2009). Neste sentido, uma

    folksonomia um conjunto de pessonomias, com menor incidncia no caso das folksonomias

    genricas, nas quais os utilizadores atribuem em conjunto palavras-chave ao mesmo recurso.Uma folksonomia pode tambm ser entendida como um hiper-grafo tripartido, que junta

    palavras-chave, utilizadores e recursos, no qual os dois ltimos elementos so conectados entre si

    numa rede social, desempenhando as palavras-chave a funo de caminho /ligao. Estas conexes

    definem uma relao implicita entre recursos atravs dos utilizadores que Ihes atribuem palavras-

    chave; da mesma forma os utilizadores so conectados pelos recursos aos quais atribuem essas

    palavras-chave (SMITH, 2008; PETERS, 2009)

    No domnio das unidades de informao e considerando que este processo tem bvias

    semelhanas e diferenas com a forma tradicional de anlise e representao do assunto, alguns

    autores, maioritariamente originrios do campo das cincias da informao, definem a atribuio de

    palavras-chave pelos utilizadores por relao com o mesmo tipo de processo desenvolvido pelos

    profissionais. Furner, baseando-se em literatura anterior, faz a sntese desta abordagem,

    caracterizando o processo como: orientado ao utilizador, democrtico, barato, colaborativo,

    distribudo, dinmico, instrutivo e como atribuindo poder aos utilizadores (FURNER, 2007). Por esta

    caracterizao perpassam duas ideias fundamentais: a coincidncia entre o utilizador da informao

    e o indivduo que atribui as palavras-chave posta em prtica em ambiente colaborativo aproxima as

    linguagens de representao de assunto e de pesquisa num processo que partilhado por uma

    comunidade; por outro lado, a liberdade de interveno e participao tornam o processo democrtico

    e dinmico.

    Um dos aspectos, sempre referido, que distingue as folksonomias em relao a outras

    linguagens de tipo formal a sua facilidade de utilizao, implicando um esforo cognitivo reduzido.

    No entanto, a comparao entre o esforo cognitivo exigido no processo de categorizao e de

    atribuio de palavras-chave, se bem que apresentando diferenas, revela uma maior aproximao

    do que a que se esperaria partida (PETERS, 2009).

    A literatura, j extensa, que analisa o comportamento dos utilizadores neste domnio aponta

    para algumas constantes e tendncias comportamentais na atribuio de palavras-chave nos vrios

    tipos de plataformas, sobretudo no caso de folksonomias genricas aquelas em que vriosutilizadores atribuem palavras-chave ao mesmo recurso -, cuja distribuio tende a seguir a Lei de

    Poder. Conradi, citando Quintarelli, destaca que este tipo de folksonomias so particularmente

    adequadas para ajudar a revelar tendncias de atribuio de palavras-chave por grandes grupos de

    indivduos que chegam a um determinado nvel de consenso na descrio dos recursos. Para alguns

    autores, este tipo de consenso designado por semntica emergente, no sentido em que representa

    a viso de um determinado grupo de indivduos cujo comportamento se expressa de forma

    semelhante na atribuio de sentido (CONRADI, 2009).

    As vantagens e desvantagens das folksonomias podem ser perspectivadas de dois pontos de

    vista: o da representao do contedo e o da sua recuperao. Do ponto de vista da representao,

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    as folksonomias apresentam vantagens, em primeiro lugar, ao nvel do vocabulrio utilizado, visto que

    este reflecte de forma autntica a linguagem dos utilizadores contribuindo para resolver o problema

    vocabular das linguagens controladas, ao mesmo tempo que permitem diversas interpretaes, o que

    possibilita ultrapassar a distncia semntica entre linguagem natural e linguagem controlada. O papel

    do utilizador estende-se, assim, tambm ao controlo de qualidade sobre os recursos informativos. Obaixo custo e o processo colaborativo de produo fazem com que este seja, no momento actual, o

    nico mtodo que permite a indexao de quantidades verdadeiramente significativas de recursos

    disponveis na Web. A existncia deste tipo de contedo possibilita, por outro lado, a identificao de

    comunidades e de nichos de interesses - o efeito cauda longa -, e pode servir de base para a

    definio de um sistema de recomendao e formas especficas de pesquisa e navegao. Por

    ltimo, o conjunto das palavras-chave pode servir para o desenvolvimento e manuteno de

    vocabulrios controlados (PETERS, 2009, 212-218).

    As desvantagens podem ser sintetizadas, por um lado, na ausncia de controlo vocabular, e,

    por outro, nas formas de atribuio que misturam diferentes nveis de representao (generalidade

    VS especificidade), diferentes tipos de palavras-chave (desde palavras-chave que representam o

    contedo at palavras-chave de tarefa ou sentimentais), diferente granularidade na indexao do

    recurso com tendncia para considerar apenas a totalidade (PETERS, 2009, 218-228). Estas

    desvantagens podem ser ultrapassadas basicamente de duas formas: educando o utilizador no que

    alguns designam por literacia das palavras-chave ou melhorando retrospectivamente a

    ambiguidade, nomeadamente atravs da utilizao de vocabulrios controlados (PETERS, 2009, 235-

    247). No entanto, como sintetizam Guy e Tonkin still, possibly the real problem with folk sonomies is

    not their chaotic tags but that they are trying to serve two masters at once; the personal collection, and

    the collective collection (citado por PETERS, 2009, 336).

    A condio essencial para retirar vantagens das folksonomias em termos de recuperao

    que uma massa crtica de contedos e utilizadores esteja presente (PETERS, 2009). Por outro lado,

    vrias abordagens podem ser postas em prtica para implementar formas mais eficazes de utilizar as

    palavras-chave, nomeadamente atravs de diversos algoritmos para o clculo do ranking dos

    resultados.

    II. Contedo gerado pelos utilizadores e bibliotecas

    A literatura que analisa as concepes e percepes das bibliotecas relativamente ao CGU

    fornece evidncias que permitem afirmar que os profissionais tm vindo a evoluir desde atitudes de

    rejeio ou indiferena at aceitao da importncia do fenmeno e a sua integrao no campo de

    trabalho das bibliotecas.

    Em 2007, uma investigao conduzida pela OCLC revelava que os responsveis norte-

    americanos pelas bibliotecas consideravam claramente que as redes sociais eram um assunto com

    pouco interesse para estas (OCLC, 2007). Apesar destas consideraes pouco favorveis, tal no

    impediu que as bibliotecas comeassem a utilizar estas plataformas e a encarar o CGU nos diversos

    mbitos das suas aces.

    A situao parece ser, em 2010, claramente diversa, levando mesmo alguns autores a afirmar

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    que its critical for twenty-first-century libraries to embrace the opportunities that user-contributed

    content offers, for they can give us more than we could ever create ourselves (NEI BURGER, 2010,

    23). Vrios factos indicam a assumpo da importncia do CGU pelas bibliotecas. Do lado das

    bibliotecas nacionais verifica-se uma preocupao pela recolha e preservao deste tipo de

    contedos. Por exemplo, a British Library define, na sua viso estratgica para 2020, ser seuobjectivo collect, store and preserve user-generated content that provides insight into 21st century

    life, such as personal digital archives, institutional repositories, blogs, wikis and new forms of content

    that may emerge. (BL, 2010, 7).

    Em Dezembro de 2010, a Biblioteca do Congresso anunciava o incio da recolha e

    preservao do resultado da participao nas redes sociais dos membros do Congresso Norte-

    Americano (LOC, 2010c). Pouco meses antes, a 15 de Abril, a mesma biblioteca protagonizava um

    acontecimento que, pelo seu ineditismo, chamou a ateno dos media, mas que revela sobretudo

    uma nova forma de encarar o contedo gerado pelos utilizadores: a doao, pela empresa Twitter, de

    todos os tweets pblicos desde 2006. James Billington, director da Biblioteca do Congresso,

    justificava esta opo, destacando a importncia do contedo informativo para a compreenso actual

    e futura das sociedades (LOC, 2010b).

    Outros indicadores revelam igualmente esta mudana de atitude, nomeadamente a incluso

    da participao dos utilizadores nos catlogos atravs de palavras-chave ou comentrios,

    particularmente posta em prtica pelas bibliotecas pblicas, ou ainda a divulgao de coleces em

    plataformas de redes sociais e a reutilizao do CGU gerado nesses contextos.

    Como seria de esperar, nem esta mudana de atitude significa uma adeso sem

    questionamento, nem as vises mais negativistas sobre CGU deixaram de estar presentes.

    Considere-se porm uma ou outra perspectiva, o papel das bibliotecas relativamente ao CGU

    tem tambm vindo a ser perspectivado do ponto vista, por um lado, da intermediao na seleco e

    avaliao da informao, e, por outro, do papel destas organizaes em diminuir a fractura digital

    atravs da promoo de competncias e saberes no domnio da literacia da informao (NEWMAN,

    2008).

    No entanto, o papel destas organizaes est ainda longe de ser claramente compreendido e

    definido, surgindo vrias questes que passam pela adaptao dos servios e eventualmente dos

    mecanismos de recuperao da informao a este tipo de utilizadores/consumidores e, por ltimo,

    pela funo mais global da biblioteca como recurso para os novos criadores. Como afirma Trosow,esta ltima questo pe-se particularmente nas bibliotecas pblicas e pode ser formulada da seguinte

    forma: to what extent should public libraries undertake to act as a resources for patrons interested in

    developing UGC, what demands would these services place on institutional resources, and how could

    these be supported? (TROSOW, 2010, 45).

    2.1. Uma coutada que se abre: metainformao e catlogos

    O catlogo 2.0 ou catlogo social ou ainda o catlogo de nova gerao constitui um novo modelo de

    catlogo que se traduz, por um lado, na reformulao das lgicas e formas de acessibilidade

    tradicionais, aspectos que caiem fora do mbito deste artigo. No entanto, este conceito encerra uma

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    vertente social, que se traduz na participao dos utilizadores, nomeadamente atravs da atribuio

    de palavras-chave. Ao abrir o catlogo a este tipo de participao levantam-se questes relevantes

    que as bibliotecas devem considerar de forma a entender melhor as motivaes, o processo e os

    resultados e, desta forma, agir adequadamente perante esta realidade. Que vantagens e

    desvantagens pode trazer este contedo gerado por utilizadores para o catlogo, nomeadamentequal o seu papel na melhoria e enriquecimento da experincia de acesso e utilizao da informao

    pelos utilizadores? Substituiro as palavras-chave atribudas as tradicionais linguagens de

    classificao e indexao utilizadas pelas bibliotecas? Podero, ao contrrio, coexistir os dois tipos

    de linguagens e, nesse caso, como se harmonizam? De que forma as palavras-chave dos

    utilizadores finais contribuem para filtrar a informao para outros e podem ser utilizadas por estes

    para concretizar as tarefas de descrio e recuperao da informao?

    Os estudos sobre a utilizao de palavras-chave atribudas por utilizadores e das

    folksonomias no contexto dos produtos biblioteconmicos tais como stios Web, mas com mais

    incidncia sobre os catlogos, abordam, em primeiro lugar, a questo da sua validade intrnseca,

    destacando as respectivas vantagens e desvantagens e, numa outra perspectiva, a sua comparao

    com as linguagens de indexao utilizadas tradicionalmente pelas bibliotecas.

    A adopo de palavras-chave pelos catlogos apresenta, segundo Spiteri, aproximando-se

    das vantagens assinaladas por Peters (ver ponto 2.2.), uma mais-valia na medida em que permite ao

    utilizador:

    a) Organizar o seu espao informativo individual;

    b) Suplementar os vocabulrios controlados, contribuindo para ultrapassar, por um lado, a distncia

    entre o termo controlado e a linguagem natural mais prxima dos utilizadores, e, por outro, uma certa

    dificuldade de actualizao das taxonomias. A perspectiva da autora no , portanto, a da

    substituio, mas sim a da complementaridade, o que a leva a afirmar LCSH should contin ue to be

    used for searching purposes, and it could certainly be used to organize personal information spaces if

    the vocabulary meets the users needs, but folksonomies would allow users to complement LCSH in

    their personal information spaces (SPITERI, 2006, 76);

    c) Criar comunidades de interesse, atravs da partilha de palavras-chave publicamente.

    Apesar de identificar, por outro lado, as desvantagens que se traduzem nos conhecidos

    problemas de utilizao da linguagem natural, tais como ambiguidade, polissemia, sinonmia e a

    variabilidade generalidade / especificidade na atribuio do assunto, Spiteri, bem como Fichter(FICHTER, 2006 appud ROLLA, 2009), sugerem que os utilizadores estaro disponveis para tolerar

    estes problemas na medida em que o esforo criativo envolvido menor.

    Esta abordagem mais conceptual tem vindo a ser complementada pela comparao entre as

    palavras-chave dos utilizadores e as normas ou instrumentos de organizao da informao das

    bibliotecas em ordem a analisar semelhanas e diferenas e a discutir a eventual complementaridade

    entre as folksonomias e os vocabulrios controlados no contexto dos catlogos.

    Spiteri faz o exerccio de comparar as palavras-chave atribudas em Delicious, Furl e

    Technorati com as directrizes da NISO para a construo de tesauros e conclui que as primeiras

    seguem de perto estas ltimas no que respeita estrutura dos termos, especificamente no tipo de

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    conceitos expressos pelas palavras-chave, na predominncia dos termos simples, de substantivos,

    no uso de ortografia reconhecida e maioritariamente de caracteres alfabticos. Os problemas

    revelam-se na utilizao inconsistente do singular e do plural, na ambiguidade como resultado do

    fenmeno da homografia e da utilizao desqualificada de abreviaturas e acrnimos. No entanto, a

    percentagem reduzida de palavras-chave ambguas (menos de um quarto) diminui a incidncia doproblema. Estes resultados levam a autora a concluirque the structure of tags in all three sites is well

    within the standards established and recognized for the construction of controlled vocabularies

    (SPITERI, 2007).

    A comparao com instrumentos especficos de indexao, nomeadamente as LCSH (Library

    of Congress Subject Headings), foi posta em prtica por vrios autores (WETTERSTROM, 2008;

    ROLLA, 2009; LAWSON, 2009; LU, 2010) que tm vindo a conduzir investigaes utilizando o

    contedo atribudo pelos utilizadores em vrias plataformas, mas sobretudo em LibraryThing (LT) e

    comparando-o com os termos atribudos por profissionais.

    O estudo mais recente que compara as palavras-chave dos utilizadores em LT e os termos

    atribudos por bibliotecrios usando a LCSH, numa abordagem quantitativa, para um mesmo conjunto

    de livros (8.562) (LU, 2010) quer ao nvel de todo o conjunto quer ao nvel de cada livro individual

    conclui, em primeiro lugar e no surpreendentemente, que o nmero de palavras-chave atribudas

    largamente superior ao dos profissionais. A comparao dos dois conjuntos permite concluir que

    apenas 2.2% das palavras-chave est igualmente presente na LCSH, o que parece indicar a

    utilizao de um diferente vocabulrio, caracterizado por uma maioria de termos simples nas

    palavras-chave e a existncia de palavras-chave no descritivas do contedo da obra. Este tipo de

    palavras-chave tem sido analisado, como j foi referido, por vrias investigaes que as categorizam

    como palavras-chave afectivas e palavras-chave de tempo e tarefa, demonstrando esta utilizao que

    os participantes as atribuem tambm com objectivos de gesto da coleco de recursos e vem este

    processo de forma holstica relacionado consigo prprio e com o seu trabalho (LU, 2010, 10). No

    entanto, os termos coincidentes representam 50.1% dos descritores utilizados usando a LCSH e

    verifica-se que estas palavras-chave so utilizadas em mdia mais frequentemente pelos utilizadores.

    Considerando a atribuio de palavras-chave e descritores da LCSH ao mesmo livro, verifica-

    se que utilizadores e especialistas concordam em, pelo menos, um termo para descrever o assunto.

    No entanto, alguns termos so utilizados com um sentido diferente por estes dois grupos, j que so

    aplicados, pelos utilizadores, para representar o assunto de diferentes obras.No que diz respeito utilizao de qualificadores geogrficos e cronolgicos, verifica-se uma

    baixa representatividade dos ltimos nas palavras-chave, ao contrrio dos primeiros, o que pode

    indicar uma probabilidade de concordncia entre utilizadores e especialistas no que diz respeito a

    representao de conceitos geogrficos.

    O nmero de palavras-chave em LT por cada obra parece seguir a Lei de Poder, o que se fica

    a dever ao facto de o nmero de palavras-chave atribudas em cada livro reflectir, at um

    determinado ponto, a popularidade da obra. Consideradas apenas as palavras-chave nicas verifica-

    se uma distribuio mais uniforme, com uma atribuio mdia de 7 a 8 palavras-chave por livro.

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    Em sntese, este estudo alinha com outros resultados que concluem pela complementaridade

    entre as duas abordagens representao do contedo, proporcionando as palavras-chave um

    conjunto de termos mais prximos da linguagem dos utilizadores melhorando, por isso, o processo de

    descoberta e que podem servir como, por um lado, fonte para o desenvolvimento dos vocabulrios

    controlados e por outro como oportunidade para as bibliotecas melhor compreenderem asnecessidades e interesses de informao dos utilizadores. Um obstculo que este estudo tambm

    identifica diz respeito inadequao das palavras-chave atribudas com propsitos no descritivos do

    contedo.

    Se os estudos que temos vindo a referir so teis para abalar o mito da desadequao da

    participao dos utilizadores no contexto das formas de organizao tradicionais das bibliotecas e

    para definir, pelo menos, uma primeira aproximao ao uso destes contedos, no tm em conta, por

    outro lado, o contexto em que esta participao se d, nem a eventual especificidade que servios

    deste tipo deveriam ter no contexto, ou seja, nas bibliotecas. Furner o nico autor a tentar uma

    caracterizao mais alargada. Comeando por identificar vrios critrios possveis para caracterizar

    estes servios, sugere que os mais adequados seriam: as funcionalidades de atribuio de palavras-

    chave; as caractersticas dos servios de pesquisa definidos a partir destes contedos; os objectivos

    do servio e, finalmente, as motivaes dos possveis utilizadores (FURNER, 2007).

    Em termos de solues de implementao, alguma literatura, embora ainda pouco

    desenvolvida, tem sugerido formas de aplicao das palavras-chave atribudas pelos utilizadores.

    Hayman e Lothian descrevem, a partir do caso do servio Education Networked Australia, um modelo

    que designam Taxonomy Direct Folksonomy e cujo objectivo o de capitalizar a contribuio da

    comunidade para a gesto dos recursos e da informao. Neste modelo, uma taxonomia do sector

    educativo sugere termos aos utilizadores e estes podem igualmente sugerir novas palavras. Por seu

    lado, a folksonomia alimenta a taxonomia mostrando falhas de cobertura temtica e ajudando os

    profissionais a monitorizar a utilizao de novos termos para melhorar e desenvolver a taxonomia.

    Como afirmam os autores this tagged catalog is an open catalog, a customized, user-centered

    catalog. It is library science at is best (LU, 2010, 6).

    Outros autores sugerem a utilizao de contedo gerado pelos utilizadores j existente

    noutras plataformas, como em LT, dada a sua semelhana com um catlogo. Por exemplo, Pera e

    outros propem um catlogo exclusivamente baseado, no que representao de contedo diz

    respeito, em palavras-chave atribudas pelos utilizadores em LT. Avaliaes da performance destesistema demonstram, segundo os autores, que as pesquisas com zero resultados descem

    significativamente e que se verifica uma melhoria na preciso, mantendo um tempo aceitvel de

    resposta.

    Do ponto de vista das bibliotecas, a Biblioteca do Congresso dos EUA parece ter sido uma

    das primeiras a discutir a incluso do contedo gerado pelos utilizadores nos catlogos. No contexto

    de uma reflexo mais vasta sobre o futuro do controlo bibliogrfico, o Grupo de Trabalho responsvel

    elabora um conjunto extenso de recomendaes. No que diz respeito ao contedo gerado pelos

    utilizadores, estas recomendaes estabelecem claramente a integrao destes na produo da

    informao bibliogrfica, sugerindo uma forma de implementao que a distinga da informao

  • 7/31/2019 Contedo gerado pelos utilizadores: desafios para as bibliotecas

    19/34

    especializada, que ajude o utilizador na atribuio de palavras, e que permita conhecer os autores

    dessa informao, sem pr em causa a sua privacidade (WGFBC, 2008).

    No mesmo ano, a Biblioteca do Congresso responde a este relatrio, afirmando suportar as

    recomendaes quanto ao contedo gerado por utilizadores, embora a justificao para apoiar a

    primeira recomendao se revele mais preocupada com a preservao da integridade da informaobibliogrfica do que com o contedo gerado pelos utilizadores. Todas as dvidas se esclarecem

    quando se l a este propsito: In general, LC feels that the library community has higher priorities

    than this in seeking enhancements to ILS systems (MARCUM, 2008, 55). Parece, assim, existir por

    parte da Biblioteca do Congresso uma aceitao da possibilidade de interveno dos utilizadores no

    universo da informao bibliogrfica, mas alguma resistncia em termos da sua implementao,

    nomeadamente no que diz respeito a uma soluo de integrao dessa participao no ambiente

    tradicional dos sistemas de gesto biblioteconmicos (LOC, 2010a).

    Algumas bibliotecas tm vindo efectivamente a implementar esta possibilidade de os

    utilizadores atriburem palavras-chave no contexto dos instrumentos de recuperao de informao j

    existentes, fundamentalmente de duas formas: desenvolvendo solues locais que contam com a

    participao exclusiva dos seus utilizadores ou integrando contedos existentes em outras

    plataformas no seu catlogo.

    A ttulo de exemplo refira-se o produto BiblioCommons1, especialmente desenvolvido a

    pensar em bibliotecas pblicas, que se configura num sistema de pesquisa e descoberta de

    informao bibliogrfica que pe no centro os aspectos da participao e socializao dos

    utilizadores (ODER, 2008; BREEDING, 2010). Estes tm sua disposio funcionalidades como

    comentar, classificar, atribuir palavras-chave ou elaborar listas de sugestes. Toda a informao

    gerada pela utilizao destas possibilidades est disponvel aos outros utilizadores com a vantagem

    de identificao do produtor, o que permite o estabelecimento de conexes entre utilizadores. Esta

    possibilidade encontra-se expandida na medida em que todas as bibliotecas que usam este sistema

    podem partilhar a informao.

    No modelo de aproveitamento de folksonomias j existentes, o exemplo de LTFL

    (LibraryThing for Libraries) especialmente relevante neste contexto, j que se trata de uma

    plataforma de catalogao social (LEITO, 2010a) na qual os utilizadores classificam e comentam as

    suas leituras e que desenvolveu este servio especialmente a pensar nas bibliotecas. Atravs de uma

    subscrio deste servio, as bibliotecas podem importar para os seus catlogos as palavras chavedos utilizadores de LT, bem como obter informao gerada pelo sistema de recomendao da

    plataforma, nomeadamente Livros e Palavras-Chave relacionadas de acordo com vrios critrios

    (LIBRARYTHING). Actualmente, 238 bibliotecas em todo o mundo, maioritariamente originrias dos

    USA, usam os servios de LibraryThing for Libraries (LIBRARYTHING, 2010).

    No mbito do que podemos designar por contedos digitais, algumas instituies tm

    experimentado abri-los participao dos utilizadores, quer implementando estas funcionalidades no

    ambiente local de publicao digital, quer publicando esses contedos em plataformas Web 2.0 onde

    as potencialidades de interveno dos utilizadores se apresentam relevantes.

    1http://www.bibliocommons.com/

    http://www.bibliocommons.com/http://www.bibliocommons.com/http://www.bibliocommons.com/http://www.bibliocommons.com/
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    De entre os vrios exemplos possveis de identificar na primeira modalidade, o caso da

    coleco patrimonial de jornais disponibilizados pela Biblioteca Nacional da Austrlia, quer porque

    um projecto inovador, quer porque permite aos utilizadores vrias formas de interveno como

    atribuio de palavras-chave, comentrios e correco de OCR (Optical Caracter Recognition)

    particularmente relevante.Ao final do primeiro ano (2008-2009) e com mais de 5 milhes de artigos disponibilizados,

    um estudo conclui pelo sucesso da iniciativa na medida em que a opo de atribuir palavras-chave

    foi muito utilizada, os termos atribudos contriburam para aumentar a qualidade dos dados e foram

    teis para outros utilizadores e a taxa de incorreces foi reduzida (HOLLEY, 2010).

    Na segunda modalidade de disponibilizao de contedos referida, o projecto COMMONS 2

    no mbito da plataforma FLICKR, da iniciativa da Biblioteca do Congresso, constitui um exemplo

    relevante, quer por ser um projecto particularmente pensado para a disponibilizao de coleces

    fotogrficas de bibliotecas, arquivos e museus, quer porque um dos seus objectivos exactamente o

    de incentivar o contributo dos utilizadores para a identificao e descrio dessas coleces

    (LEITO, 2010a).

    O estudo de Vaughan, o nico que aborda o projecto na sua globalidade, e inquire todas as

    instituies participantes conclui relativamente ao contedo gerado pelos utilizadores que:

    a) aproximadamente 66% da coleco de fotografias de cada membro recebeu, pelo menos, uma

    palavra-chave;

    b) cerca de 46% da coleco de fotografias de cada membro recebeu, pelo menos, um comentrio

    (VAUGHAN, 2010).

    Outros estudos sobre o mesmo projecto tm vindo a analisar de forma mais aprofundada as diversas

    formas de participao dos utilizadores e recorrendo a abordagens mais qualitativas do que

    quantitativas, chegam a resultados que permitem compreender em maior profundidade o fenmeno

    (LEITAO, 2010b, STIVILIA e JORGENSEN, 2010)

    Stivilia e Jorgensen (2010), que analisam a galeria da Biblioteca do Congresso, concluem

    que as actividades que os utilizadores desenvolvem a propsito das fotografias, sobretudo atravs

    da actividade de comentar, podem ser categorizadas em sete tipos sendo a mais frequente a que

    designam por resoluo da ambiguidade e incerteza relativamente ao contedo das fotos,

    identificando pessoas, objectos, eventos locais e datas ou compreendendo o contedo e contexto

    genrico da fotografia. Estas actividades parecem estar, muitas vezes, relacionadas entre si, umasdesencadeando outras. Por exemplo, uma das formas mais utilizadas para determinar os

    componentes do contedo das fotos a ligao com recursos internos plataforma (outras fotos) ou

    externos (enciclopdias, livros, pginas web, etc.). Por outro lado, os participantes so

    particularmente activos na identificao de problemas com a metainformao sobre as fotografias.

    A qualidade da folksonomia analisada quer do ponto de vista intrnseco quer na relao

    com instrumentos de organizao da informao, especificamente o TGM (Thesaurus of Graphic

    Materials) e a LCSH, revelando alguma coincidncia mais frequente no caso da LCSH. Os termos

    no coincidentes dizem respeito a nomes prprios e descrio da realidade atravs de um maior

    2http://www.flickr.com/commons/

    http://www.flickr.com/commons/http://www.flickr.com/commons/http://www.flickr.com/commons/http://www.flickr.com/commons/
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    nmero de substantivos bsicos. Desta anlise, as autoras retiram algumas concluses mais

    relevantes:

    a) A importncia de criar oportunidade e apoiar este tipo de actividades do utilizador, e o papel que

    as bibliotecas, arquivos e museus podem ter neste contexto, e recolher conhecimento a partir delas;

    b) A eventual adequao dos instrumentos de organizao da informao usados pelas bibliotecascomo apoio s actividades de criao e avaliao de metainformao pelos utilizadores;

    c) A folksonomia gerada pelos utilizadores no Flickr pode ser uma boa fonte em termos de

    substantivos bsicos e nomes de entidades quer para o TGM quer para a LCSH (STVILIA, 2010).

    Apesar das j referidas resistncias da Biblioteca do Congresso na incorporao directa da

    participao dos utilizadores no seu catlogo, esta tem vindo a acrescentar contedo aos registos

    bibliogrficos das fotografias a partir dos contributos dos utilizadores na plataforma (SPRINGER,

    2008; LOC, 2010).

    Numa tentativa de compreender de forma mais abrangente o fenmeno, quer do ponto de

    vista das prticas quer das concepes dos profissionais, alargando o campo de anlise, para alm

    das bibliotecas, aos arquivos e museus, a OCLC e o Research Libraries Group desenvolvem um

    estudo (SMITH-YOSHIMURA, 2010), entre 2009-2010, que encara esta questo no tanto do ponto

    de vista da participao das bibliotecas nas plataformas das redes sociais, nem particularmente dos

    catlogos, mas sim dos stios Web das bibliotecas, cuja anlise revelou, em primeiro lugar que, a

    questo do tamanho relevante, identificando a dificuldade de atingir a massa crtica necessria de

    contribuies. Um outro aspecto que parece influenciar o desenvolvimento da participao a

    moderao: stios web com maior nvel de moderao atraem menos participaes.

    As formas de participao mais populares so, em primeiro lugar, os comentrios e em

    seguida a atribuio de palavras-chave, que parecem ser mais teis quando no existe outro tipo de

    metainformao, ou quando as palavras-chave podem ser agregadas atravs de vrias coleces.

    No entanto, verifica-se que mais de metade das contribuies dos utilizadores enriquecem, de facto,

    a metainformao j existente. A construo de comunidade, atravs da possibilidade de avaliar a

    autoria das contribuies, a caracterstica menos presente.

    Do ponto de vista das concepes dos gestores destes stios web conclui-se que:

    a) Os principais objectivos so: aumentar o trfego para expor o contedo do stio e construir

    comunidades de utilizadores;

    b) As principais formas de possibilitar a participao dos utilizadores so: comentrios e palavras-chave;

    c) Apenas metade dos respondentes refere que tornam visveis as plavras-chave dos utilizadores.

    Um tero combina as palavras-chave dos utilizadores com termos controlados;

    d) A maioria dos respondentes indexa os metadados sociais e mais de metade corrige esses

    contedos. No entanto, a minority incorporates metadata into their own description workflows and

    incorporates user-contributed content into their own sites (SMITH-YOSHIMURA, 2010, 3)

    e) A maioria dos stios web modera as contribuies dos utilizadores e metade edita regularmente o

    contedo antes de disponibiliz-lo. No entanto, fenmenos como spame comportamento abusivo dosutilizadores so pouco frequentes e facilmente gerveis;

  • 7/31/2019 Contedo gerado pelos utilizadores: desafios para as bibliotecas

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    f) A maioria destes casos tem definido polticas relativamente ao comportamento dos utilizadores,

    direitos de edio e remoo de contedos e salvaguarda da participao destes.

    A abrangncia e o nvel de especificidade destas polticas varivel, mas pode concluir-se que estas

    instituies are making efforts to maintain a safe environment for users, with particular attention to

    under-aged users, and upholding professional ethics and laws to provide equal access and protectintelectual property rights (SMITH-YOSHIMURA, 2010, 4);

    g) Do ponto de vista da avaliao, a maioria dos respondentes considera que os seus stios web

    obtm sucesso, sendo esse sucesso avaliado sobretudo pela capacidade para envolver as

    audincias j existentes ou novas, e mais pela qualidade do que pela quantidade.

    A medio do sucesso destas iniciativas, quer dizer a sua avaliao, recomendada

    definindo a autora um conjunto de medidas de tipo quantitativo e um outro conjunto designado por

    medidas subjectivas que apontam para duas reas: avaliao do impacto dos metadados sociais para

    a melhoria da qualidade da metainformao e para um melhor entendimento do recurso e seu

    contexto, e as referncias ao stio web nas redes sociais na web ou fora dela. Este conjunto de

    mtricas, que representam uma tentativa de ultrapassar o mero nvel quantitativo, no configuram

    exactamente uma avaliao de tipo qualitativo j que, embora impossveis de quantificar num padro

    universalizante, apontam claramente para um resultado numrico. Este tipo de medidas quantitativas

    ignoram, no entanto, quase completamente as formas de interaco entre utilizadores, o que parece

    traduzir, apesar do teor de recomendaes anteriores, uma viso excessivamente centrada na

    organizao. A adopo de qualquer uma destas mtricas ou outras , como reconhece a autora,

    dependente dos objectivos e da audincia.

    Estes sistemas baseados ou que incorporam a participao dos utilizadores podem ser

    avaliados ainda do ponto de vista da recuperao da informao. No entanto, como assinala Furner,

    estamos ainda num momento onde remains far from clear that such a directed evaluation focusing

    on retrieval effectiveness as the most important criterion against which tagging services should be

    judgedwould be appropriate (FURNER, 2007, 9).

    A possibilidade de utilizar plataformas de redes sociais em vez de stios web prprios

    igualmente considerada, sendo definidos os prs e contras de uma opo deste tipo, que constituem

    uma identificao relativamente adequada dos aspectos positivos e negativos, embora considere

    apenas duas das variveis deste processo: a organizao e os seus contedos.

    Os aspectos positivos referidos so:a) Aumento da visibilidade das coleces em plataformas de redes sociais onde a comunidade que a

    organizao pretende servir j activa;

    b) A possibilidade de agregar contedos com os de outras organizaes permite economias de

    escala;

    c) Aproveitamento de funcionalidades de tipo social j existentes;

    d) Familiaridade dos utilizadores nestas plataformas;

    e) Rapidez de implementao;

    f) Baixos custos em termos de conhecimento exigido para operar na plataforma.

    Os aspectos negativos considerados, passam por:

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    a) Risco de confiar, no longo prazo, num servio externo;

    b) Impossibilidade de controlar a forma como os recursos so apresentados;

    c) Dependncia da alterao de polticas de utilizao nas plataformas;

    d) Necessidade de desenvolver um mecanismo de reutilizao da metainformao social nos

    produtos especficos das organizaes, por exemplo, os catlogos das bibliotecas;e) Possibilidade de problemas de copyright e privacidade relativamente aos contedos

    disponibilizados pela organizao.

    2.2. Servios e produtos de informao em cooperao

    Motivar os utilizadores e criar oportunidades para a sua participao atravs da produo de

    contedos pode ser capitalizado pelas bibliotecas das mais variadas formas, para alm do campo

    especfico da informao bibliogrfica. A criao colaborativa de produtos de informao constitui,

    sem dvida, uma das vias atravs das quais a participao dos utilizadores pode resultar em novos

    contedos informativos.

    Mais do que os blogues ou as plataformas tpicas de redes sociais, a verdadeira ferramenta

    para a produo colaborativa de contedos mais estruturados so as Wikis, donde o interesse em

    analisar este tipo de ferramentas e os usos que as bibliotecas lhe tm dado nos ltimos anos.

    Uma Wiki um sistema de gesto de contedos, que permite a todos (ou apenas aos que

    sejam autorizados) desenvolver colaborativamente qualquer projecto. Trata-se, de facto, de um stio

    Web composto de ficheiros e documentos inter-relacionados, sendo acessveis e editveis via um

    navegador Web. Em teoria, todos os membros de uma dada comunidade podem adicionar contedo

    ou editar contedos de outros (KOBLAS, 2006; PRESSELY, 2010).Enquanto soluo para criao e disponibilizao de informao criada, em princpio, por uma

    comunidade, as wikis apresentam vrios aspectos positivos, mas so tambm objecto de vrias

    crticas. Passamos brevemente em revista as duas perspectivas.

    Em termos de vantagens podem elencar-se as seguintes :

    1. Fcil utilizao;

    2. Baseado na plataforma Web, o que significa que no h necessidade de descarregar qualquer

    aplicao;

    3. Qualquer membro da comunidade pode contribuir;

    4. possvel controlar as vrias verses de um contedo;

    5. Flexibilidade e escalabilidade;

    6. Facilidade de gesto, dependendo do nvel de abertura comunidade.

    As principais crticas apontadas so, genericamente:

    1. A facilidade em editar uma qualquer entrada, pode conduzir a alteraes ruinosas num texto

    original. Como afirma Koblas, esta constitui a principal objeco, traduzvel na assero de que if

    anybody can edit my text, then anybody can ruin my text. (KOBLAS, 2006, 18);

    2. A menos que o gestor da wiki ou a comunidade entendam ir fechando entradas, o contedo ter

    sempre a natureza de work in progress, podendo nunca o leitor encontrar uma verso final de um

    contedo;

  • 7/31/2019 Contedo gerado pelos utilizadores: desafios para as bibliotecas

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    3. Quanto maiores forem as permisses de edio, alterao, criao, mais exigncias de gesto tem

    uma wiki, sob pena de o resultado comear a apresentar-se catico. A ttulo de exemplo refira-se a

    possibilidade de qualquer utilizador registado poder adicionar uma pgina; uma vez esta operao

    realizada, o gestor da wiki deve assegurar-se que ela se encontra correctamente posicionada na

    estrutura e que o seu contedo pesquisvel;5. A questo da propriedade intelectual dos contedos, sobretudo se utilizados os critrios clssicos

    de definio de propriedade intelectual.

    Como se pode verificar, as crticas enunciadas esto maioritariamente relacionadas com um

    dos aspectos centrais que caracterizam uma wiki e que constitui tambm a sua razo de ser na

    perspectiva dos mais entusiastas: a edio colaborativa, que permite reunir os contributos de todos e

    assim criar conhecimento que facilmente pode ser partilhado. No entanto, com as possibilidades

    dadas pelas diversas aplicaes que permitem criar wikis, estes aspectos podem ser

    operacionalmente ultrapassados. possvel definir uma wiki onde, por exemplo, todos podem ler,

    mas s alguns podem editar e acrescentar contedos; possvel definir uma wiki onde todos podem

    ler e editar, mas as alteraes esto sujeitas validao do administrador, etc. Numa verso,

    digamos, mais restritiva de wiki, ganha-se em controlo, o que assegurar maior qualidade dos

    contedos, mais estabilidade e ser menos exigente em termos de gesto; mas perde-se em

    participao, em troca de informao e conhecimento. Em sntese, como afirma Farkas, wikis arent

    for everyone. If control is a major issue with the site youre developing, then a wiki might not be right

    for your project (FARKAS: 2007, 96)

    As bibliotecas tm vindo a utilizar esta ferramenta de vrias formas possveis, das quais se

    salientam as seguintes por mais directamente relacionadas com o objecto deste trabalho:

    a) Como forma de construir colaborativamente contedos sobre as mais diversas temticas, desde a

    hitria local at ao aconselhamento de leitura, passando por contedos de informao comunidade;

    b) Como forma de disponibilizar informao tematicamente seleccionada pela biblioteca: um guia de

    referncias de informao; um guia contedos, etc.

    Na segunda categoria, veja-se o exemplo de uma wiki que se afirma como um instrumento de

    referncia. Trata-se da BizWiki, especializada em informao econmica, (mantida pelas bibliotecas

    universitrias de Ohio), cuja interveno na produo de contedos sobretudo dos profissionais da

    biblioteca, j que a participao de terceiros submetida a aprovao (BIZWIKI). Um exemplo

    semelhante o que posto em prtica pela biblioteca da Universidade de Huddersfiled (UK) atravsda sua Electronic Resources Wiki3.

    As bibliotecas pblicas tm vindo a utilizar estas ferramentas para a criao de vrios

    produtos de informao, nomeadamente nas seguintes reas:

    a) Informao comunidade, como o caso de LoundonPedia4, uma wiki colaborativa gerida pela

    biblioteca pblica do Condado de Loundon, EUA;

    3http://library.hud.ac.uk/wiki/Main_Page4http://www.loudounpedia.org/w/page/19189392/FrontPage

    http://library.hud.ac.uk/wiki/Main_Pagehttp://library.hud.ac.uk/wiki/Main_Pagehttp://library.hud.ac.uk/wiki/Main_Pagehttp://www.loudounpedia.org/w/page/19189392/FrontPagehttp://www.loudounpedia.org/w/page/19189392/FrontPagehttp://www.loudounpedia.org/w/page/19189392/FrontPagehttp://www.loudounpedia.org/w/page/19189392/FrontPagehttp://library.hud.ac.uk/wiki/Main_Page
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    b) Aconselhamento de leitura, como o caso da wiki colaborativa JMRL reads: a wiki for sharing

    information about books for readers of all ages5, gerida pela biblioteca pblica regional Jefferson

    Madison, dos EUA;

    c) Histria local, como o caso de Wagga Wagga Local History 6da Biblioteca Pblica da cidade de

    Wagga Wagga (Austrlia) e de Our Brant da Biblioteca Pblica do Condado de Brant (Austrlia). Estaltima apresenta uma abordagem relativamente inovadora ao conceito de histria local que pe o

    acento tnico na recolha de contedos relacionados com a vivncia individual dos cidados na

    localidade. Assim, os utilizadores so motivados participao partilhando contedos sobre

    memories of growing up, [] places and people you knew (COUNTY OF BRANT PUBLIC

    LIBRARY).

    No mbito da histria local merece ainda referncia o caso da wiki de Histria Local

    Norueguesa7 de mbito nacional, gerido pelo Norwegian Institute of Local History (SVEUM, 2010),

    que conta com a participao de historiadores, bibliotecrios e arquivistas de vrias insituties, mas

    cujo objectivo no substituir-se a outros recursos de informao criados por biliotecas e arquivos,

    mas sim o de suscitar a produo/divulgao de unique material and especially user generated

    materials and memorabilia, linked to places and local events, irrespective of format (SVEUM, 2010,

    239).

    Todos os exemplos referidos, apesar de abertos colaborao de todos, implementam

    diversas formas de controlo de qualidade dos contedos, bem como formas de garantir que aspectos

    legais ligados aos direitos de autor e direitos conexos so respeitados.

    A literatura claramente omissa na anlise destes casos de wikis implementadas por

    bibliotecas, impedindo por isso a compreenso de alguns problemas que se levantam na gesto

    destas plataformas, nomeadamente: quantidade e qualidade das participaes, gesto de problemas

    como spamou contedos inapropriados, ou ainda o impacto em termos de utilizao ou na relao

    dos indivduos com a biblioteca.

    2.3. Recolha, organizao e preservao de CGU

    As questes da recolha, organizao e preservao de CGU relacionados com bibliotecas

    esto praticamente ausentes da literatura. Estas questes pem-se de forma diversa, em primeiro

    lugar, ao nvel do contexto em que o utilizador participa. Na situao em que esta participao

    integrada nos produtos de informao detidos pela biblioteca, pode considerar-se que esses

    contedos sero preservados e organizados dentro das lgicas que presidem ao funcionamento

    desses sistemas de informao. Um dos principais problemas que aqui se levanta o da seleco

    dos contedos que vale a pena manter e preservar. As concepes e os critrios que as bibliotecas

    tm vindo a criar e definir para a seleco de informao com vista a organizar as suas coleces

    dificilmente se aplicam a este caso e no existe ainda suficiente investigao, reflexo e prtica para

    poder surgir uma alternativa adequada.

    5http://hera.jmrl.org/wiki/Main_Page6http://waggalocalhistory.wetpaint.com/7http://lokalhistoriewiki.no/index.php/lokalhistoriewiki.no:Hovedside

    http://hera.jmrl.org/wiki/Main_Pagehttp://hera.jmrl.org/wiki/Main_Pagehttp://hera.jmrl.org/wiki/Main_Pagehttp://waggalocalhistory.wetpaint.com/http://waggalocalhistory.wetpaint.com/http://waggalocalhistory.wetpaint.com/http://lokalhistoriewiki.no/index.php/lokalhistoriewiki.no:Hovedsidehttp://lokalhistoriewiki.no/index.php/lokalhistoriewiki.no:Hovedsidehttp://lokalhistoriewiki.no/index.php/lokalhistoriewiki.no:Hovedsidehttp://lokalhistoriewiki.no/index.php/lokalhistoriewiki.no:Hovedsidehttp://waggalocalhistory.wetpaint.com/http://hera.jmrl.org/wiki/Main_Page
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    A complexidade destes problemas aumenta quando se trata de servios desenvolvidos com

    base em plataformas externas biblioteca. Se no que diz respeito organizao e recuperao da

    informao, as bibliotecas devem conformar-se basicamente com as lgicas, processos e

    funcionalidades das plataformas onde interagem com os utilizadores, muito pode ser feito em dois

    aspectos: a explorao adequada das funcionalidades de organizao e recuperao da informaodisponveis na plataforma, a reutilizao dos contedos em outros ambientes de informao,

    particularmente os que so da responsabilidade das bibliotecas.

    A preservao dos contedos gerados pelos utilizadores levanta, por outro lado, mltiplos

    problemas, longe de estarem suficientemente investigados e discutidos. Do ponto de vista das

    bibliotecas cujo objectivo a preservao da memria do editado e a sua acessibilidade s geraes

    futuras, as bibliotecas nacionais, a questo da recolha, acesso e preservao do CGU comeou,

    como j foi referido, a ser equacionada. No entanto, no existem ainda casos com suficiente nvel de

    implementao para se poder entender avaliar solues e implicaes de um processo desta

    natureza.

    O caso com maior impacto neste domnio foi, como j referido, a doao dos tweets

    Biblioteca do Congresso em 2010. Esta doao inclui todos os tweets pblicos desde 2006 e a

    transferncia da produo ao longo do tempo, com uma diferena de seis meses. O volume de

    informao atinge propores verdadeiramente extraordinrias se pensarmos que de 2006 a 2010

    foram produzidos 5TB. O principal objectivo assumido pela biblioteca o da preservao, e, neste

    sentido, a doao total exime-a de resolver o problema da seleco, assumindo como clara a

    dificuldade de, neste momento, disponibilizar uma soluo de acesso, j que remete a resoluo

    desta questo para posterior investigao com parceiros universitrios (RAYMOND, 2010). Este

    acontecimento gerou uma onde de comentrios que levantam algumas questes pertinentes,

    nomeadamente a da privacidade e do armazenamento da totalidade da produo, sem qualquer

    seleco, circunstncia que configura uma novidade relativamente s opes que bibliotecas e

    arquivos tomaram historicamente quanto preservao da memria. Como se verifica, este

    acontecimento, em muitos sentidos exemplar de um certo papel das bibliotecas quanto ao CGU,

    deixa ainda muitas questes em aberto e, como afirma, em entrevista, Jos Afonso Furtado, a real

    importncia da transferncia do arquivo do Twitter para a Biblioteca do Congresso depender em

    grande medida das respostas que o tempo der a estas questes, particularmente as que concernem

    ao copyright e direito vida privada. Delas se poder concluir, do mesmo modo, o acerto deiniciativas semelhantes em relao a outras ferramentas da Web 2.0 (QUERIDO, 2010).

    2.4. Gesto da participao e dos contedos

    A gesto da participao dos utilizadores e do seu resultado, os contedos, levanta vrias

    questes, das quais se destacam como mais relevantes as seguintes: suscitar e