Contratos e títulos de crédito - Diferença entre fiança e aval

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CONTRATOS E TÍTULOS DE CRÉDITO – Diferença entre Fiança e Aval. André Felipe Silva Torres Outubro de 2009 Juazeiro do Norte – CE 1. DOS CONTRATOS. FIANÇA E AVAL. Os contratos talvez sejam inerentes à natureza do homem, de ser racional, que vive em sociedade e precisa de “acordos” para manter a sua sobrevivência. Por isso, os contratos são tão antigos, (por exemplo, o contrato social) e a sua origem vem com o desenvolvimento das primeiras civilizações da História. Podemos conceituar contrato, utilizando o conceito individualista proposto por Clóvis Beviláqua como o acordo de vontades com a finalidade de adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos. Enfim, o contrato pressupõe pelo menos duas pessoas capazes que convencionam entre si, utilizando-se da livre manifestação da vontade, e por esta manifestação, obrigam-se. E esta obrigação deve ser cumprida (pacta sunt servanda), sob pena da atuação coercitiva do Direito. O conceito de contrato vem a ser parecido com o de ato jurídico. De acordo com o art. 104 do Código Civil, o ato jurídico perfeito requer agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não proibida por lei. O contrato também requer esses três elementos, adicionado ainda um quarto: o do acordo de vontades. Em regra, o contrato pressupõe interesses antagônicos, que através do acordo se compõem. Por exemplo, o contrato de compra e venda, na qual a um interessa a transferência do domínio da coisa, e a outro, o recebimento do preço. Mas também existem interesses

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Diferenciação entre fiança e aval, bem como disposições pertinentes à disciplina jurídica dos contratos e dos títulos de crédito.

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CONTRATOS E TÍTULOS DE CRÉDITO – Diferença entre Fiança e Aval.

André Felipe Silva TorresOutubro de 2009

Juazeiro do Norte – CE

1. DOS CONTRATOS. FIANÇA E AVAL.

Os contratos talvez sejam inerentes à natureza do homem, de ser racional, que vive em sociedade e precisa de “acordos” para manter a sua sobrevivência. Por isso, os contratos são tão antigos, (por exemplo, o contrato social) e a sua origem vem com o desenvolvimento das primeiras civilizações da História.

Podemos conceituar contrato, utilizando o conceito individualista proposto por Clóvis Beviláqua como o acordo de vontades com a finalidade de adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos. Enfim, o contrato pressupõe pelo menos duas pessoas capazes que convencionam entre si, utilizando-se da livre manifestação da vontade, e por esta manifestação, obrigam-se. E esta obrigação deve ser cumprida (pacta sunt servanda), sob pena da atuação coercitiva do Direito.

O conceito de contrato vem a ser parecido com o de ato jurídico. De acordo com o art. 104 do Código Civil, o ato jurídico perfeito requer agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não proibida por lei. O contrato também requer esses três elementos, adicionado ainda um quarto: o do acordo de vontades. Em regra, o contrato pressupõe interesses antagônicos, que através do acordo se compõem. Por exemplo, o contrato de compra e venda, na qual a um interessa a transferência do domínio da coisa, e a outro, o recebimento do preço. Mas também existem interesses paralelos, como ocorre no contrato social/de sociedade – as partes acordam manter esforços, bens e capital para o desenvolvimento do objeto social.

O Código Civil de 2002 discorre sobre os contratos típicos, previstos em lei, mas não exclui os contratos atípicos, que não estão previstos no Código, mas podem vir a serem criados pelas partes contratantes, desde que estejam em consonância com o art. 104, CC, mantenham função social relevante e não derroguem preceitos de ordem pública.

Entre os contratos relevantes para o comércio em geral, destacamos:A. Contrato de Compra e Venda: este contrato está arraigado em nossa cultura, desde os primórdios da civilização. Por este contrato, o comprador se obriga a entregar o preço para o vendedor, a fim de que este se obrigue a transferir-lhe o domínio da coisa, que é o objeto do contrato. A compra e venda é contrato consensual, sinalagmático, oneroso, em alguns casos sujeito à forma prescrita em lei, mas, geralmente, independe de formalidade, podendo ser verbal.

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Para que o contrato se repute perfeito, as partes devem entrar em consenso no que se refere a objeto e preço. Caso o vendedor não entregue o objeto, o comprador poderá entrar com uma ação de obrigação de dar coisa certa ou incerta, a fim de compelir o vendedor a cumprir com a sua obrigação.

B. Contrato de Empréstimo: o empréstimo é gênero na qual são espécies o mútuo e o comodato. O mútuo é o empréstimo de coisa fungível, no qual destacamos o dinheiro. Já o comodato é empréstimo de coisa infungível.

Ambos os contratos são de natureza real (que se perfaz com a entrega do objeto). O comodato deve ser gratuito, pois se assim não fosse, seria locação. Já o contrato de mútuo pode ser gratuito e oneroso (no mais das vezes), sendo a grande fonte de receitas das instituições financeiras.

C. Contrato de Prestação de Serviços de Administração de Cartão de Crédito: este contrato não está previsto no Código Civil de 2002, portanto, faz parte dos contratos atípicos, ou seja, que pode ser acordado livremente pelas partes. Não há legislação específica sobre este tipo de contrato, ele apenas deverá se deter aos princípios do Código de Defesa do Consumidor. Por este contrato, o emissor (geralmente, um banco) abre um crédito rotativo para o titular, a fim de que este adquira bens e serviços em estabelecimentos credenciados, por meio de um cartão. Sobre este crédito rotativo, incidirá encargos, podendo ser juros remuneratórios, tarifas, tributos, e ainda, juros de mora, multa e despesas de cobrança. Observe que se parece com o contrato de mútuo, mas possui elementos singulares que o diferenciam.

D. Contrato de Fiança: Nesta parte do trabalho, faremos a diferenciação entre fiança e aval. Primeiramente, ambos são espécies do gênero garantia. O aval e a fiança são institutos previstos em lei, pelos quais o avalista ou fiador se compromete a satisfazer a obrigação, no todo ou parte, caso o devedor principal não a cumpra, ou seja, um terceiro estranho ao negócio ingressa nele, com a finalidade de garantir a obrigação assumida pelo devedor originário. A fiança é um contrato acessório, ou seja, uma obrigação acessória que pressupõe um contrato principal. Por exemplo, no contrato de mútuo o devedor é obrigado a restituir, no advento do termo, o que dele recebeu, em igual gênero, qualidade e quantidade. O credor poderá firmar ainda um contrato com um terceiro, denominado fiador, que se compromete a adimplir a obrigação caso o devedor não a cumpra, que independe inclusive do consentimento do devedor. Essa obrigação é acessória, só podendo ser demandada com a condição de que o devedor principal não cumpra com a sua obrigação. Caso o devedor cumpra sua obrigação, o contrato principal se extingue, perecendo a fiança (o acessório segue o principal).

O Aval é um ato cambiário no qual um terceiro também garante a dívida representada no título de crédito. Assim sendo, não há de que se falar em avalizar um contrato, pois o mesmo somente é aplicável aos títulos de crédito. A característica mais

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importante do aval é de que se constitui em uma obrigação autônoma, desvinculada do negócio originário. Assim sendo, o avalista poderá ser demandado diretamente pelo credor para o pagamento do título, antes mesmo do devedor principal. O avalista não pode opor exceções pessoais do avalizado, enquanto que o fiador, em geral, pode alegar exceções pessoais do afiançado. Outra diferença é que no aval não existe o benefício de ordem, ou seja, a exoneração do garantidor da obrigação face a prova da solvência do devedor principal, enquanto que o fiador, em regra, pode invocá-lo. (No entanto, na fiança, o credor costuma condicionar a aceitação da fiança à renúncia, pelo fiador, do benefício de ordem.

2. TÍTULOS DE CRÉDITO

O título de crédito representa um direito de ser credor, consubstanciado em um documento, ao portador deste. A origem dos títulos de crédito está localizada no contexto da Baixa Idade Média, na Europa, quando do renascimento do comércio e das aglomerações urbanas, contrastando com o sistema econômico feudal. De fato, as feiras, o aparecimento dos primeiros banqueiros e das bolsas de valores, enfim, o comércio em geral deu ensejo a um documento que enseja relações jurídicas comerciais bem peculiares.

Os títulos de crédito, no direito brasileiro, são extensivamente disciplinados por normas específicas. O Código Civil de 2002 também trata do assunto, mas deixa expresso que esta normatização é de caráter subsidiário, na falta de disposição de lei específica (art. 903, CC).

Em regra, o título de crédito possui três características ou princípios: literalidade, cartularidade e autonomia. Pela literalidade, o título de crédito vale quanto o valor nele contido, não podendo ser aditado, nem fazer interpretação extensiva. Pela cartularidade, o portador do documento original presume-se titular do crédito, do direito nele previsto. Pela autonomia, que o título de crédito ao circular, desvincula-se completamente do negócio que lhe deu origem, não podendo o devedor alegar exceções pessoais relativas ao endossante quanto ao endossatário. Por fim, o documento é título executivo extrajudicial. O seu inadimplemento ensejará diretamente a ação de execução. No inadimplemento de um contrato, ao contrário, o credor deverá provar, por meio de uma ação de conhecimento, a existência da relação jurídica e a constituição da mora do devedor, para depois, executá-lo.

Quanto às espécies de títulos de crédito, destacamos:1) Letra de câmbio: é o título de crédito por excelência, o primeiro a ser criado. No entanto, quase não é utilizado no Brasil. Existem três figuras primitivas: o sacador, que é o emitente da letra, o sacado, que, quando dá o aceite torna-se o devedor principal e o tomador, beneficiário do crédito. Configura-se como ordem de pagamento: o sacador dirige uma ordem para que o sacado pague determinada quantia ao tomador ou à ordem deste.

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2) Nota promissória: Configura-se promessa de pagamento. Pela nota promissória, o sacado (devedor) promete em determinado dia e lugar pagar certa quantia ao beneficiário da nota, ou à ordem deste. È muito utilizado no cotidiano, mas o uso do cheque ainda é a preferência nacional.

3) Cheque: O fato de ser considerado título de crédito ainda representa muita divergência na doutrina. De fato, a legislação se refere ao cheque como ordem de pagamento à vista, na qual o sacador dirige uma ordem ao banco (sacado) que efetue o pagamento ao beneficiário do cheque, ou à ordem deste. Este pagamento é realizado com os recursos disponíveis em conta de depósitos que o sacador mantém junto à instituição financeira sacada. No entanto, o brasileiro criou, com a omissão da lei, o cheque “pós-datado” (impropriamente denominado “pré-datado”). Com o lançamento de uma data futura, o sacador faz uma promessa de pagamento ao beneficiário, e este pode, por meio do endosso, transferi-lo para outrem com caráter especulativo. Os bancos criaram até uma linha de crédito denominada Desconto de cheques, na qual o beneficiário da obrigação materializada no cheque realiza o endosso para a instituição financeira, obtendo a antecipação de recursos. A instituição financeira ganha com a diferença do valor de face (nominal) e o valor concedido ao cliente.

4) Duplicata: este título de crédito foi invenção brasileira. A duplicata é extraída da fatura, ou seja, um documento que contém a relação de mercadorias vendidas. Com a fatura, o vendedor (credor) extrai a duplicata, no qual o comprador (devedor) deverá pagar em data futura. A duplicata, evidentemente, poderá ser transferida mediante endosso.

5) Cédula de crédito rural/comercial/industrial/bancário: Várias leis tratam de títulos de crédito que não se sujeitam à disciplina integral do Direito Cambiário. Estas cédulas são denominadas títulos de financiamento, ou seja, por meio delas o devedor obtém junto ao credor (geralmente um banco) um crédito a ser pago em data futura, de uma só vez ou parcelas. A garantia é constituída diretamente na cédula, qual seja, o penhor, a hipoteca ou ainda garantia pessoal.

REFERÊNCIASRODRIGUES, Sílvio. Direito Civil – Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade. Vol. 03, Saraiva, 3. ed.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial – Direito de Empresa. Vol. 01, Saraiva. 12. ed.

Mário Cerveira Filho. Aval e Fiança. Disponível em http://www.cerveiraedornellas.com.br/aval_financa.htm

Lei nº 10.406/02 – Código Civil

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