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l ANTIQUALHAS B MBMORIAS DO RIO DE JANEIRO 329 nbora directa, bem como os que lá possuem o dominio util. Desle modo, salvo êrro, repito, a Prefeitura podia m.nnJar collocar, quantas vezes quizesse, as armas da nossa $ebas- t ianopolis . Não sei si o meu amavel consulente ficarã safüfcilo. Cada um enterra seu pae como póde. Corre-me, porém, ao findar estas mal tracada!I ag1·auecer ao benevolente missivista as expressões de genti- il'za. com que me lionrou em sua carta de 10 do andante Jnl'7.. Domingo, 15 de Ouwbro de f9l t. CONVENTO DA AJUDA I l\h1ifo soffrcu a ·velha casa claustral da Ajuda rom a rernlta do parle da Armada - em i 893. Para exercer mistéres da minha profissã-0 entrei pela primeira vez no interior da Ajuda e pude observar os e!'- h agos feitos por uma bala no tecto do templo '!m outras dependenclas do Convento. Apresentava e;;te o as- pecto de imrrumso casarão dos tempos coloniaes: grande, feio, pesado e forte. Tempos depois voltei, a convite ainda de mon!':cnhor Frluardo. para substituir o dr. Sicioso, medico das religio:-;a". o qual se achava enfermo. Pasmosa hansformacão se ha\ ia np<'rado, gracas á actividadc daquelle digno e exemplar rPrtlote. a cuja memoria as religiosas da ,\juda votam prr- pelua <' justa gratidão. Por toda parte: o conforto. luz " ar. corredores amplos, illuminacão a gaz. cellas 111'm niohi- lia<las. e as grossas grades de cadeia substitui<las por outras mais elegantes e não menos fortes . PPlas columnas d'A Noticia publiquei então a dcscripção do notavel chafariz das "Saracuras", obra artislica. construida rom material das nossas pedreiras e ornatos de bronze fun- 1Jidos no Arsenal do Guerra. Esta fonte foi erS1uida pela gratidão de uma abbadPssa ao conde de Resende. Este vice-rei concedera ás 1Jma p<'nna d'agua derivada dos encanamentos da Carioca. O prPcioso liquido era conduzido do morro dr. Sancto A11Ln11io por um cano, que ao alto atravessava a rua dos Barhnnn.:

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ANTIQUALHAS B MBMORIAS DO RIO DE JANEIRO 329

nbora directa, bem como os que lá possuem o dominio util. Desle modo, salvo êrro, repito, a Prefeitura podia m.nnJar collocar, quantas vezes quizesse, as armas da nossa $ebas­t ianopolis .

Não sei si o meu amavel consulente ficarã safüfcilo. Cada um enterra seu pae como póde.

Corre-me, porém, ao findar estas mal tracada!I regra~,

ag1·auecer ao benevolente missivista as expressões de genti­il'za. com que me lionrou em sua carta de 10 do andante Jnl'7..

Domingo, 15 de Ouwbro de f9l t.

CONVENTO DA AJUDA I

l\h1ifo soffrcu a ·velha casa claustral da Ajuda rom a rernlta do parle da Armada - em i 893.

Para exercer mistéres da minha profissã-0 entrei pela primeira vez no interior da Ajuda e pude observar os e!'­h agos feitos por uma bala no tecto do templo ~ '!m varia~ outras dependenclas do Convento. Apresentava e;;te o as­pecto tri~tonho de imrrumso casarão dos tempos coloniaes: grande, feio, pesado e forte.

Tempos depois lá voltei, a convite ainda de mon!':cnhor Frluardo. para substituir o dr. Sicioso, medico das religio:-;a". o qual se achava enfermo. Pasmosa hansformacão se ha\ ia np<'rado, gracas á actividadc daquelle digno e exemplar ~a­rPrtlote. a cuja memoria as religiosas da ,\juda votam prr­pelua <' justa gratidão . Por toda parte: o conforto. luz " ar. corredores amplos, illuminacão a gaz. cellas 111'm niohi­lia<las. e as grossas grades de cadeia substitui<las por outras mais elegantes e não menos fortes .

PPlas columnas d'A Noticia publiquei então a dcscripção do notavel chafariz das "Saracuras", obra artislica. construida rom material das nossas pedreiras e ornatos de bronze fun-1Jidos no Arsenal do Guerra.

Esta fonte foi erS1uida pela gratidão de uma abbadPssa ao conde de Resende. Este vice-rei concedera ás r<'li.tdo~as 1Jma p<'nna d'agua derivada dos encanamentos da Carioca. O prPcioso liquido era conduzido do morro dr. Sancto A11Ln11io por um cano, que ao alto atravessava a rua dos Barhnnn.:

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330 HEV!STA DO INSTlTÚTO IUSTORICO

e ia tcL·minar no interior da cbacara do Convento. Bem sn­bido é que este logradouro foi muil.-0 mais amplo do que na aclualidade . As religiosas foram forçadas a uma desapro­priação, que deu em 1·esultado a aberLura da rua Senador Dantas, i10 sitio em que existiam oufr'ora casinhas com­pradas pelo bispo d. João da Cruz, e terrenos dos frades do Carmo adquiridos em 1750 pelo bispo d. Antonio do Tu>s­Lrrro, tudo para maior extensão da chacara conventual .

Som querer repetir tudo quanto tenho cscripto sôbre a Ajuda, em largos tracos lembrarei o pássado deste cenobio. Convém, porém, recordar a entrada solenno das primeiras freiras vindas da Bahia para a instiLuição da noYa casa re­ligiosa, a;; Jestas havidas por occasião de se faaugurar o conYeillo, nas C}lllaes tomaram parte a nobreza, clero e pOYO

desta cidade, lendo á frente Gomes Freire de A.ndrada, go­' ernudor e chefe supremo da Capitania do Rio de ,Janeiro .

Com a invocação a Nossa. Senhora da Ajudà. figura em nossos annaes r·eligiosos pequena capella. com frenle para o antigo caminho do Desterro (hoje Evaristo da Veiga) . Si­tuada nas proximidades das lagõas uc Hauclo Antonio e do Boqueirão (hoje Passeio Publico) e da ladeira do Po1;0 do Porleiro. Esta arm~da fôra reconslruida em 1600 .

Zelava o culto da Senhora uma Irmandade, a que per­tuiciam as pessôas mais gradas da nossa então embryonaria cidade. n este sodalicio foram juízes e protectores vario.s governadores. Por esmolas adquirira pens paLl'imoniaes, e entre elles fazendas e ourraes de gado, no districlo de Campos dos Goitar,ás, conhecido outr'ora. pelo nome de capitania de S . Thomé.

Em meiados do seoulo XVIII o povo desta cidade dese­java ardentemente possuir um convento de religiosas .

Traclou-se, por meio de esmolas, de levantar edificio adequado. A idéa não foi por deante. Sendo prelado eccle­siastico Francisco <la Silveira Dias, elle e seu ermão frei ChrisloYão da )ladre de Deus Luz, franciscano, reviveram o projecto e resolveram crear um simples Recol11imento.

D. Cr.cilia Barbalho desejava retirar-se do bulicio ilo mundo. · ·•

Era esta senh-õra proxima parenta do illustre Luiz Bar­halho Jfozerra. distincto Pernambucano, ciujo nome foi ainda hontem recordado no Instituto Historico. Depois de no :Xorte ai::signalar-se Dl)r muitos e reloYantes serviços, veio governar o Rio ele .Janeiro. Aqui falleceu e foi sepultado na egt'P,ia. <lo Collcgio dos Jesuitas. Pois bem, para accolhcr d. Cecilin. dnas filhas e algiumas mocas foi construido um clormitorio junclo da ermida da .Ajuda.

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ANTJQUALRAS E MEMORIAS DO nIO DE JANEll\O 331

Crcado o necolhimcnlo, lracluram aqucllcs dons sacrr­doles ue ergurr edificio uc maiores accommodaç:ões, cuja pedra fundnmrnlal foi laneada cm 9 de Julho de iti78. .\ concessão pela mctropolc só foi dada cm 30 de Outubro d..: 1694.

Pararam porém as obras, por embaraços croados pelo Conselho Ultramarino. Lembro-me agora do voto contrario dado scmp1•c nas reuniões dos conselheiros, por Salvador Be­nevides q.ue por tres vezes governou a capitania do Rio do Janefro. Era preciso, dizia clle um eerto palrimonio para mantença das religiosas. Para não acontecer como na Bahia, que por falla de meios foi o Governo forçado n. p1·over á subsislcncia das religiosas.

:'{ão descansa1•am os devotos, e por inLermedio do bispo S. Jeronymo e da Gamara dirigiram nova súpplica ao Go­verno portuguez. Em 1705, foi permitlida a erecção de uma convento para 50 freiras . Começaram as obras, mas ainda em 1741 estavam ellas em muito atrazo.

O bispo d. João da Cruz abandonou o que estava frito e lractou de levantar novo e mais amplo edifício, segundo e risco do sargento-mór Alpoim. Com effeito, só foi a noYa pedra fundamental lançada em 1745.

Abro aqni 1t1m parenthese. Custou a dissipar-se a pri­meira impressão por mim recebida ao penetrai• pela primeira ,·cz no parlatorio do antigo convento. Não podia compre­llcnder então como uma senhora para fugir do mundo se niettesse em uma casa cheia de grades, soturna e melan­cholica como a cadeia do Aljuhe, no principio <la ladeira da Conceição.

Eu (ainda menino) em companhia dos meus fui visitai· na Ajuda rospeilavel matrona já entrada em annos. Moça e bclla accolhera-se ao Convento para iiugir ao marido, seu tio, homem de máo procedimento. Alli viveu ella por mais cll' trinta annos, e só sa'iu quando soube ter fallccido o es­poso. Exquecida <lo passado e perdoando tudo quanto sof­frera. prestou ao marido todas as homenagens, como si st mpre tivesse sido a mais feliz e amada das mulheres.

Tinha o ConvPnto esta Yantagcm. Servia tambem. de abrigo a infelizes. E estas na solidão do desamparo e nos Pxcessos da afflicção não careciam de lançar mão do suicídio ou :;p prestarem a scenas de tragedias ou de vcrgonheiras agora tão rm moda. A esta. proteci:ão prestada pelas reli­glosag da .\,iuda decorrem para. ellas justos cncomios.

Continúo. Foi o bispo Desterro q.ucm Pm menos d quatro annos concluiu a parle principal do convento, a qual

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332 REVISTA DO INSTITUTO HISTORICO

é a que póde ser visitada. A planta primitiva nunca foi exccut.ada. Este prelado mandou vir da llahia qualro f1·l'i1·as JH·ofessas para o inicio do noviciado, as quat>s aqui che­garam ás 3 horas da tarde de 21 de i'iovembro de 1i rn.

Houve alvoroço na cidade. Salvaram as fortalezas da barra. O governador interino 'lathias Coei ho de ~' •u:;a munclou o filho capitão Paiulo Caetano cumvr1mcnla-las e111 c11111panbin cio militar Jo~ó Per<' ira Pinto Alpoim e tio ,;u iz dt> fora Luiz Antonio Rosado da Cunha.

Eslava d. Antonio do Destel'ro cm ..;cu palucio <lo lho Comprido. !<'oi avisado. Ordenou o clt•somlJarqut' das reli­giosas, o qual teve togar cm um cács c'Xislenle no fundo da Casa dos Governadores, na rua Direita, no local cm que r~tá hlljc o edificio da terceira Praça do Commercio.

Seguem as professas, á noite para o Hospício da Terra: Saneia, no latlo impar da nctual rua E,·aristo da Yeiga (an­ti~n dos .Barbonos). Ia a. abbadcssa de cadeirinha e ai; oulras emr seges. As escravas em número de 30 seguiam a pé aecompanbadas por soldados. muminaram :i:, casa<: das ruas Direita, :mscricordia, S. José, Ajuda e Bal'bonos.

Em alg1Uns p1·cdios, na. saln de visitas improvisou-se 01cheslra dr amadores, que execularam harmonias durante o trajcclo elas reccm-vindas. Chronica manusc1·ipta quf' li ha nnnos menciona entro estes virtuosi os parentes do fu­lu1·0 I1is110 ti. Josc1 Joaquim Jusliniano Ca,tcllo }franco, ru,ia rr·si1Íc·ncia. rumo P sabido, C'ra juncto do actual templo an­glknno. CllPgadas ao f ermo da Y ing-Pm fol'am saudadas pPlns 1w1 iol'es personagens da. terra.

Em 3 ele :itaw il<' 1;;;0 cow•·co11 o 11oviciado .. Em 28 de Maio de 51 teve Iogar a. prinirirn eleii;füi.

J:'cwnm clPila~: abl.Jadcssa, a mad1'l' ~larin Lro1101· do :.\a,ci­menl.,; \ i~aria. a madre i'llarianna da Penha cfc F1·a n•:a; mestra. de no\'iças, a madl'O Catha1·inn dos Anjo:;, e portcirn, a rnadre l•'rancisc1i Custodia das Chagas.

Esperou-'e IJarn a inn.ugurac,:üo do convento a chegada <1P Gomrs F1·circ. O que se segue é resumo dr duas e ilro­n icas manusrriplas e de um artigo da. ffo:etci de Lis/1da numero de Outubro de 1i50. ~arram as pomposas fl'slas do sal1hado, 30 de .Maio de 50. Desde a manhã engalanou-se a cid1ule: colchas nas jnnellas, areia e foi has de 111angueil·a e etmPlla nas 111as, bandeirns, foguetorio, Pie. Formaram "m alas Iodas ª" tropas da guarnição, cxlcndc•ndo-sr prlas r1.;1,.,

l"ll' omlc clPvia paRi1a1· a pl'ocissiio. A esta, 11n·ida dP H. Bc>11ln1

acrompa11ilaY11m todos as Ji.mandadc>s P Ordens ll'l't'<'it•:is, cl1•1·0 regular e secular, o Cabido e o bispo.

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AN'l'!QUALHAS E ME..\10RIAS DO RlO DE JA.NEUl.O 333

A Ordem da Penitencia apresentou dous g1•andes andores liudamenle ornados. .l\a esquma da rua de ::>. Pedro e 1>1-rcila, onde llavia o oralorio de !\ . ::;. do .\lllparo, parou o preslilo. ..:\Ili appareceraru meninos \ eslidos de aDJO, que espargit'am flores sõbre as freil"as, o bispo e o govemador . Houve lambem a:; compelente::. trcs descargas festivas ao sair e ao recolher do immeu:;o e luzido prc::.lilo.

:-:>egum-se um triduo, em que foram celci.Jraut.es Jesuita:;, Heuedrclmos, Cam1elilas e Franciscanos, sendo ponh11cante d. .\ntonio do Desterro, que permaneceu no ::,erninar10 de ::>. José, onde houve mesa franca. para. gente, já se salie, de gravata laYada. Bm uma das noites, foi · em grando lalJlatlo representada por ordem de Gomes Freire uma comedia 1lc l\lelastaslo. A parte não oooupada. pelas Jreiras esle\·e, bem como a egreja, em exposição durante muitos dias.

Ou isLo, ou a sa1da das religiosas cl"Ajuda na madnu­gada de 19 do corrente, atravessando em automoveis as ruas ua cidade ainda não de todo despertada !

Foram para longe. Não verão mais as Icslas do ~Ionrüe. -~ :;cus ouvidos ·não chegarão os ruídos de uma grande ci­dade cm movimento, nem as scena:; sutanicas do Carna' al ou as fanfarras de manifestações do mais puro chaleil•ismu !

Para compensa-las da falla de seu antigo ubi, lnão o :;ilencio das maltas da 'rijuca, o murmurio sonoro dos re­galos ltUe por alli serpeiam, ou o cantar das aves a sau­úarcm o sol no horizonte. Que sitias mais proprios e pro­picios a llll'l.lila<;õe:;, ás preces e á penitencia ! Lucraram, voi:;, cento por cento 1 1

Domingo, 22 de Outubro de 1911.

n

Freiras e o vetusto casarão l?difica<.lo em terras com~ pradas ao célebre demandisla Manuel Fernandes da Costa e aos frades do Carmo, constituem pl'l':;l'nlrmenle o prato do dia.

Assim como em 1750 chamaram as re ligiosas a aLleni,:üo rio nos~os antepassados com uma entrada principesca, estão rllus agora cn1 fóco por haverem deixado a antiga resiclcnria occupada por espaco de cenlo e sessen la e um annos.

Muito se tem escripo, nestes dias, a respeito des::e 1•xol10, que lanlo lem excitado a curiosidade do clero. nolH"Pzn o llO' o desta hProica o maravilhosa cidade. :-tihn· as a11I i~u 1-

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33'1 RJ::\"ll:l'f.\ DO INS'l'ITUTO lllS'fOR!CO

dade:s tia Ajuda Lcm vindo á baila o que escreveram Piza1·1·0, Moreira de Azevedo, l\Iello :Moracs, o padre Perel'eca e pri­meiro de lodos frei AgosLinho de canela l\faria.

Nada dislo porém deve ser novidade para os meus ki­Lorcs, os quaes por meu humilde intcrmedio conhecem dcsúu 1902, além do 9ue escreveram aquelles mostres, as :sesma­rias de 1573, a compra de terrenos, a <lemanda a 60 anno$ c:om os herdeiros do ermitão da Gloria (bôa l)essôa que soube levar agiua a seu moinho), a historia das saracuras e kagados, do escandalo de um hortelão que lá cnlrou com c l1ave falsa, e das tres freiras deportadas pelo conde da Cunha, etc., etc.

Yollar ou repetir Ludo isto seria. Yercladeira salJbatiua . Tenho ainda horror ás do meu tempo. Faziam a g<mlo pc1·der o somno e ter colicas.

l\lais modesta é minha mis:)ào: confiar á 1rnl.Jlicíúatlc documentos que vem ao pintar da faneca. Parece ser cor­rcspondencia dirigida desta cidade e reza assim: - " (Rio de J::meiro - l:l. Scbastiam - 30 de Janeiro) . Esta citlatlc, que no anno de i720 contava mais de 102 familias sem meter nesle numero as do seu reconcavo, se tem feito láo por>u­losa que se estende perto de uma lcgoa ao longo da rilJeira a sua povoa~ão; e havendo nella .Mosteiros de yarias Reli­gjões Claustraes e Mendica:ites carecia muito de hum de re­ligiosas em que se pudessem asylar offerecidas a Deus as filhas de seus habitantes, que merecessem ao céo esta vo­caçãnu e se vissem precisadas a ir buscai· o da Bahia 01U os do Reyno, coro o perigo de padecerem a escravidão dos Bar­baros, que com seu corso infestam os mares.

"Su1n·io esta falta o grande zelo do nosso grande prr­lado o l!!xccllcntissimo Senhor D. Frei Antonio do Destcl'ru, me1·eccdor das mais eminentes dignidades, que á sua custa (:1ic) mandou edificar em distancia de hum quarto de IC'goa desta cidade hum convento, que dedicou â puríssima Con­ceição de 1'\ossa Senhora e depois de primorosamrnlc aca­bado proe;urou para fundadoras algumas religiosas mais br­nemeritas deste credito no 1\iosteiro do Desterro da cidade tio SalYador da Bahia, donde com effeito chegaram e inteira­mente se recolhc11am no Hospicio intilnJarlo de .Jerusalém. onde habilaram alé n dia 30 de Maio clesl" auno, cm que a:) foram buscar nas suas caruuagens os ministros da Justiça, dignidades e <>rficiaes ccclesiaslicos com .!Juro riquissimo cocho lindo por seis soberbos cavallos e mettidas nclle as Madres fundadoras, as conduziram para a igrrja de S. Rrnln fa­zcudu-Jhcs retaguarda o Governador com todos os Sl'l.ts offi-

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ANTIQUALllt\S E l\tE1\IOR!.\~ Do RlO DE JA .. 'IEIRO 335

ciaes maio1·es, montados em formosos cavallo-s prccio~amente ajaezados.

"Chegando á poria da i·cferida igreja, acharam da parlo exterior do mesmo, o Excellcnlissimo Bispo, que as espe­r~,va, acompanhado de loda a communidade dos monge~ da­quelle Convento.

·'Entrai·am a fazer ora~ão e assistiram ao Te Deum. lfUC

se cantou cnm dois córos de ~llllsica e. revestindo-,;e Sua Excrllencia com os paramentos pontificaes se deu principio a uma gl'ande procissão, em que tiveram primeiro Jogar a~ Irmandades e Çonfrnrias, todas as Communidades Religio:ms, l<'1go o Clero e depois o Cabido, entre o qual hiam a~ ~la­dres fundadoras com os rostos cohertos e d~z no' i\:as ri<Jui,;­simamentc tra,iadas, mas todas com imagens do Sanlis:-1in10 Sacramento irns mãos como rell'alos do Esposo. a quem con­sagravam a sua virgindade.

"•Seguia-se Sua Excellencia Reverendissima com l\Hlra <' Baculo e logo o Ciovcmador, o Senado da Camarn e a mai!'l nobreza da terra.

"'l'odo o caminho desde S. Bento até o novo i\Ioslcfro (que bem medido he cm quarto de legoa como acima ,;1•

Lfüsc 1 estava bordado de soldados de infanleria r de e a­valio r rrlinindo nellc a. ham10nia festiva do<; in<;frumcntos bclico~, han•ndo lc\'ado cada me~tre tle campo uns !.lei uu mais prelos 'esticlos todos á tragica ma5 ue differenlcs cures.

"Chegados ao :\loslciro enlregoa sua Excellencia a~ da clausura á Re\'erendissima Mad1·e Abbadessa. com um dis­cm~n hl'l'\'I' mas cheio <le ternura, recommendando-lhe o 1:11111 gnvcroo de :;uas subdita". - ··E.;l;\\·a a Igreja armada com to<la a ~ua 111agnific1•ntia. Crlt>hrou-:;e nclla hum triduo que principiou no dia. irnml'­dialo cm qu~ fez t.lc Ponlificial o ~f. R"verrndo .\bbad<' do S. Brnlo e pregou nm i\lonire •Mestre na. sua religião dl' m.nnhã, porque d<> tarde fez hum <;t>tlmão hum Religioso Capueihinho Italiano.

"Cantou no i:H•gnndo dia n missa, o Revercnclissimo padl'(' Grn11·lliiío do 8. Francisco. O prt>gador foi nm religioso da mesma Ot'dem e de tarde hum da inclyta Ordem Carmcli­tana.

"l\"o lct'<'Piro crlcbrou J>onti ficai 8ua Exccllencia llt>YC'­rrnclisi\ima, prt·izou .o :'\Jui Rcvrrrndo DDulor thesoul'f'iro­mór ria Sl- e cor·oou e:;l:i. f<'sl i \' itlnclc. com lm1 <'lrg:anl" " l'l'll­

dilo sermão hum padre da Sagrada Companhia ele Je;;u;;.

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336 nEv1s·rA 00 INSl'ITUTO HlSTORICO

"J:'oram estes tres dias de Jubilo para os moradurc:. desta cidade pelo grande bem que se lhe segue dPsln fun­tla<;ão, manifestando todos o seu contentamento c1>111 n;; in­m:111e1·aveis luminarias com que desmentiram a t1:1wlm1-i­dadc das noites e com as discrelissimas PoPsias qur sí' r~­

citaram nos Outeiros Apollineos." Gazeta de Us/J6(J, 11. !iO, de lcrça-feira, 1º de Dezembro de 1750 (9117-!J!i!l ) .

:'\o livro do Tombo do Convento d'.\ju<la cslãu rllpiadas \a rias noticias ac~rca da inaugura«_:ão: 11ma <IP Jt'1·anc·isrn <lc .\lmeida Jordão e outra inC"ompleta ti•' fre i \fa111u•I .i., .\'o:.<sa Senhora do M<mle do Carmo. ·

<:om esta corrc:-pondoncia da Ga:cJa </.: Lisf1ô11 fil'am ª" Heligiosas com mais um documento para ccmsc1•\ ar nu "CU velho .\rchivo. E isto de mão beijada.

Domingo, 29 de Outubro tlc 1911 .

' CONDE :DA OUNHA

(1763 -1767)

Jla1·cam estes dia:; de >'ioYembro a prilncira etn1m da ful111·a importancia política •) administrativa da cidade do llio de Janeiro.

De facto, pol' decreto cfo 1763 fõra ella elevada no gnio de capital das tc1·ras a11H!1·ica11as, pertencentes ao velho reino de Portugal.

Para sulJsliluir o condP dt• Bobaclella é nomeado p'cla rnt'lropole d .. \nlonio \lvat•t•s dti Cunha (conde da Gunha). •' 15 de Outubl'o tio 1763 aqui chegou o novo vice- rei. A 1!1 tomava posse do cargo na egreja do Rosario, perante a Gamara incorporada, alto:> funccionarios civis e mililat'e:.<, recel.Jend1J o bastão do govcmo interino, i·cp1·e;;entndo pelo hi..,pu c.J. Antonio do Desterro, brigadeiro .\lpoim e cbanceller da Relação desem­bargador Caslello Branco.

Hisloriographos pouco juslos, copiando-se uns aos outros, pintam est!l vice-rei como t1m Pllergumeno, dPspola irascivel, ::;cmpre promplo á lH'ácl ica dos maiores ai lentados contra a L1•anqu illidadc e 1.Jcm eslar do povo da colonia.

Enlrolanlo w ístcr sP foz ronflos:;ar lei· ::;ido cJIP l.10111 adm í • 11isln1dor. não pcrrniltindo qw• ugiolas e csprculadorcs quizes­s1•111 lraficar com as nt•ccssidadrs da classe pobre, augrneu­lanclo os preços dos genc1·os alimcnlicios e com a carestia delle::; fazendo soffrer as cJa,se::. ~ociaes meno:S ravorccidas da fortuna. Em reria rpoclm hou,·e falia d~ farinha; os nego-