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    CORALIZANDO:UM GUIA DECOLABORAO PARA A ECONOMIACRIATIVA

    Verso 1.2

    12/03/2015 - Ambiente coLABOR http://corais.org/colabor

    Aline Satyan

    Ana Laura Gomes

    Carlos Eduardo Falco Luna

    Emilio Velis

    Fernanda Castro de Queiroz

    Frederick van AmstelIsaac Fernando Ferreira Filho

    Jader Gama

    Julio Carraro

    Larissa Carreira

    Leo Guedes

    Luana Vilutis

    Paula Ugalde

    Pedro Henrique Jatob

    Rodrigo Fresse Gonzatto

    Sandro Rodrigues de Barros

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    Tagcloud com as palavras

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    mais frequentemente utilizadas neste livro.

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    ndice

    Glossrio

    Introduo

    Co-criao e cria-atividade

    Aprender fazendo, fazeraprendendo

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    Autogesto eadministrao coletiva

    Currculo d@scolaborador@s

    Consideraes finais

    Trabalho colaborativo eeconomia solidria

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    Glossrio

    @

    Artigo ambguo utilizado ao longo deste livro para evitar asobreposio do gnero masculino sobre o feminino em

    palavras genricas, tais como amig@s, tod@s, outr@s, etc.

    Aprendizado

    Ao, processo, efeito ou resultado do ato de aprender, a

    aprendizagem. Fenmeno que gera novos olhares e

    comportaentos a partir das experincias apreendidas.

    Aberto, aberta

    Qualidade de uma organizao, ferramenta, ou atividade em

    relao ao seu meio ambiente. Se aberta, permite o fluxo de

    substncias, informaes, pessoas, ideias, etc. Se fechado,

    no permite, impedindo este fluxo.

    Atividade criativa ou cria-atividade

    a atividade comprometida com a criao de algo novo, no s

    para uma pessoa, mas para vrias, ou seja, uma atividade que

    produz algum valor para o comum. Quando vrias pessoas

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    criam juntas e para o conjunto, todas se tornam mais criativas

    do que se estivessem criando sozinhas.

    Autoria

    Crdito e responsabilidade pela criao de algo. A autoria o

    contrato social que garante a autoridade de uma autora ou

    autor sobre suas obras. A autoria vincula criao a seu criador

    ou criadora.

    Bens no-rivais

    So os bens intangveis, imateriais. O conhecimento um bemno-rival, pois ao ser compartilhado no rivaliza com outros:

    ganha ainda mais possibilidades de vida, pois pode ser ainda

    mais divulgado, remixado, reinventado, complementado.

    Coautoria

    Autoria compartilhada, resultado de cocriao. Os crditos e

    responsabilidades do que criado so compartilhados entre

    os que participaram diretamente da cocriao.

    Comum ou Commons

    Coisas compartilhadas de livre acesso que as pessoas podem ir

    agregando novas relaes e construindo coletivamente algo

    comum maior que elas.Creative Commons

    Coleo de licenas para liberar alguns direitos de uso sobre

    obras criativas, seguindo restries mnimas determinadas

    pel@ autor@, ou autor@s.

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    GL O S S R I O

    Crowdsourcing

    Terceirizar uma tarefa para uma multido de pessoas

    interessadas, sem vnculos empregatcios. As pessoas

    contribuem ou por uma recompensa na forma de um prmio

    ou pela satisfao de contribuir para uma grande causa (ex:

    Wikipedia).

    Cultura Digital ou Cibercultura

    Em uma definio restrita, mais tcnica, a cultura dos

    dispositivos digitais presentes no cotidiano de nossas vidas. Jem uma viso mais ampla, refere-se ao cultivo de relaes

    sociais em um espao virtual.

    Direito Autoral

    Normas jurdicas que regulam o monoplio comercial para uma

    obra literria ou artstica. Garantem o direito d@s autor@s de

    ser reconhecid@s pela sua autoria e o privilgio de fazer

    cpias e comercializar a obra.

    Economia Criativa

    A economia criativa rene um conjunto de setores culturais cuja

    abrangncia varia entre pases e vises polticas. Para a

    UNESCO, a economia criativa diz respeito economia voltadaao patrimnio natural e cultural, aos espetculos e

    celebraes, s artes visuais e artesanato, aos livros e

    peridicos, ao audiovisual e s mdias interativas e ao design e

    aos servios criativos. Neste mergulho pelo Corais,

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    contemplamos estes setores e tambm aqueles originalmente

    vinculados economia da cultura (msica, dana, teatro,

    circo, etc.) e a produo de infraestrutura tecnolgica, em

    especial, o software livre. A economia criativa tem relao

    direta com a economia do conhecimento, a economia

    movimentada pelo exerccio do direito de expresso criativa, o

    que refora a importncia de manter viva a possibilidade de

    troca livre, direta e aberta entre as culturas.

    Economia SolidriaUma forma de organizao do trabalho e um modo de vida

    baseado na autogesto e na autonomia, na valorizao da

    aprendizagem, na democracia econmica, no cuidado com o

    meio ambiente, na igualdade de gnero e na valorizao da

    diversidade cultural. Alm de envolver a produo e o

    consumo, a economia solidria contempla iniciativas e aes

    pblicas de comercializao, finanas e crdito. So atores da

    economia solidria os empreendimentos econmico-

    solidrios, as entidades de fomento e assessoria e os gestores

    pblicos.

    GNUAcronmio "GNU is not Unix". Uma fundao que se pretendia a

    criar um sistema operacional livre, mas cuja principal

    contribuio acabou sendo a criao de licenas livres para

    software.

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    GNU GPL ou Copyleft

    General Public License, criada para licenciar software livre,

    garantindo que as liberdades fundamentais no sejam feridas

    pela apropriao do cdigo. Trata-se de uma proteo do

    comum, pois exige que todo trabalho derivado seja distribudo

    pela mesma licena, ou seja, aberto.

    Inovao Aberta

    Abre os processos criativos para o pblico, divulgando etapas e

    resultados, convidando as pessoas de fora para participar. Issono s enriquece a possibilidade de novas relaes, como

    tambm promove a instituio como uma cultivadora de

    commons. A inovao aberta se realiza em sua plenitude

    quando existem processos sustentveis de cocriao,

    processos que estabelecem relaes duradouras e vantajosas

    para ambos os criadores.

    Inkscape

    Softwarelivre para edio eletrnica de imagens. Utiliza o mtodo

    vetorial, gerando imagens a partir de um caminho de pontos

    definindo suas coordenadas, de forma transparente ao

    usurio. O Inkscape trabalha nativamente com o SVG.Laboratrios Vivos

    Conceito de inovao aberta para escolas, empresas e outros

    tipos de organizaes. O laboratrio vivo ou living lab,

    promove experimentos de longa durao com participantes de

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    fora da organizao que no esto sob controle dos

    pesquisadores. O resultado destes experimentos so vivncias

    que transformam @s participantes.

    Linux

    Sistema operacional software livre iniciado por Linus Torvalds e

    construido por milhares de pessoas ao redor do globo. Com

    base no Linux, vrias distribuies so desenvolvidas: Ubuntu,

    Slackware, Debian, etc.

    Moedas Sociais DigitaisSistema de troca de bens e servios que ao invs de cdulas e

    moedas fsicas, utiliza um banco de dados eletrnico para

    registrar transferncias, extrato e saldo entre os participantes

    da economia.

    Open Source

    Software com cdigo aberto, ou seja, no compilado. possvel

    no s rodar o programa como tambm ver o cdigo que est

    por trs do programa.

    Outsourcing

    Terceirizar uma tarefa para uma outra organizao.

    Recursos Educacionais Abertos (REA)Insumos como materiais educacionais, de aprendizado e

    pesquisa, fixados em qualquer suporte ou mdia, que estejam

    sob domnio pblico ou licenciados de maneira aberta,

    permitindo que sejam utilizados ou adaptados por terceiros.

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    GL O S S R I O

    Remix

    Consiste em se apropriar de um material cultural e dar a ele um

    novo significado, traz-lo para um outro territrio, desafiando

    as fronteiras estabelecidas entre arte e cincia, jornalismo e

    permacultura, eletricidade e paixo. Trata-se de uma

    combinao de elementos nunca antes combinados,

    utilizando materiais originais quando legalmente possvel. O

    remix uma forma de acessar a conscincia coletiva, onde

    todas as ideias aparecem conectadas entre si.SVG - Scalable Vector Graphics

    Pode ser traduzido do ingls como grficos vetoriais escalveis.

    uma linguagem XML para descrever de forma vetorial,

    desenhos e grficos bidimensionais, de forma esttica,

    dinmica ou animada. O SVG um padro de formato aberto,

    criado pela World Wide Web Consortium, suportado por todos

    os navegadoreswebmodernos de forma nativa ou atravs de

    bibliotecasjava script.

    Software livre

    Um movimento social que vai mais alm de uma simples (ou

    eficaz) alternativa pirataria. Quando falamos em umdeterminadosoftwareele carrega consigo toda uma lgica de

    construo colaborativa e contribuies para o conhecimento

    universal. Nos dias atuais isto bastante importante,

    principalmente com os novos paradigmas impostos sobre a

    propriedade intelectual.

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    Sustentabilidade

    Conceito de equilbrio que se expande para alm da questo

    financeira e considera tambm a relao social, a gerao de

    conhecimentos para os envolvidos, o territrio e os impactos

    ambientais inerentes a uma determinada atividade. Toda

    atividade precisa de um sustento, seja ele financeiro,

    motivacional, afetivo ou material. A sustentabilidade a

    preocupao com esse sustento.

    TagcloudVisualizao das palavras utilizadas com maior frequncia num

    determinado corpus textual. As palavras mais frequentes so

    exibidas em tamanho maximizado e dispostas em ordem

    aleatria.

    Trabalho Colaborativo

    Maior do que a soma dos trabalhos individuais, fortemente

    caracterizado pelo desenvolvimento da criatividade em grupo,

    aproveitando os diversos dons, talentos, vises de mundos,

    repertrios, ideias, saberes e conhecimentos de cada pessoa.

    Pode muitas vezes no resultar em obras que impressionem o

    mundo, mas que satisfazem os desejos comuns aquelacoletividade.

    Trabalho Criativo

    Todo trabalho criativo precisa se basear no resultado da

    criatividade de outr@s para poder existir, e isto pode

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    GL O S S R I O

    funcionar de duas maneiras: a abertura de ideias para a

    criao e a adaptao das ideias ao meio. As duas so

    essenciais para que o trabalho criativo das pessoas ou grupos

    tenha razo de existir. A primeira tem a ver com ideias

    fornecidas por outros como matria prima para a cocriao, e

    pode se dar ao longo da histria. A segunda relacionada com

    a funo da sociedade para valorar as inovaes de outros e

    aplic-las em seu meio, para aceitar a criao como valiosa e

    til.Web 2.0

    Termo que designa a chamada 2 gerao da web, com stios

    eletrnicos com contedo mais dinmico e interativo, como

    blogs,wikis, plataformas de colaborao e redes sociais.

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    Introduo

    Este um livro sobre colaborao escrito de maneira

    colaborativa. Dezesseis pessoas localizadas em trs pases

    Brasil, El Salvador e Holanda se encontraramonlineem um

    laboratrio virtual sobre gesto colaborativa para debater e

    escrever o livro.

    Ao invs de apresentar a opinio de uma pessoa, este livro

    apresenta conversas de uma comunidade de participantesneste ambiente virtual. A comunidade formada por ativistas,

    professor@s, artistas, pesquisador@s e empreendedor@s

    sociais que acreditam na colaborao como um modo de

    produo vivel para a economia criativa. Tod@s envolvidos

    trabalham em projetos prticos para a transformao da

    sociedade, produzindo bens culturais comuns,

    compartilhados e abertos.

    O Laboratrio Virtual de Gesto Colaborativa coLABOR, ligado ao

    Centro Interdisciplinar de Desenvolvimento e Gesto Social

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    C O R A L I Z A N D O : U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    (CIAGS) da Universidade Federal da Bahia abrigou este

    processo de construo coletiva e apenas um dos projetos

    colaborativos existentes na Plataforma Corais.

    A plataforma CORAIS um sistemawebque permite o trabalho

    colaborativo a distncia, favorecendo a construo coletiva do

    conhecimento e a gesto compartilhada de projetos, sem

    depender de um@ chef@ ou de qualquer outra estrutura

    hierrquica. O CORAIS conta com uma srie de ferramentas

    colaborativas baseadas emsoftware livreque ajudam as pessoasa se organizarem com poucos recursos iniciais.

    Desde que foi lanada em 2011, a Plataforma Corais foi utilizada

    para organizar vrios tipos de projetos: universidade livre,

    padronizao de dados, reforma de prdio, produtoras

    culturais colaborativas, televiso inteligente e muitos outros!

    As pessoas entram na plataforma, definem uma srie de

    coisas a fazer e quem pode fazer, faz. Depois outr@s do

    feedback e continuam o trabalho. Assim, as pessoas vo

    colaborando, ou como esta comunidade prefere dizer, vo

    "coralizando".

    Este livro explica os conceitos que esto por trs da prtica de"coralizar". A colaborao no algo que acontece por acaso.

    Existe um pensamento por trs, que ser recuperado ao longo

    de quatro temas: cocriao, aprendizado, economia e gesto.

    Esses temas sero abordados sob diferentes perspectivas.

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    IN T R O D U O

    Diversidade a palavra chave para compreender um recife de

    corais e no poderia ser diferente nesta plataforma online.

    Para manter esse valor, o livro foi escrito desta forma

    colaborativa.

    Ao invs de oferecer uma viso integrada dos assuntos tratados, o

    livro se parece mais com uma colcha de retalhos, com algumas

    ideias desenvolvidas e outras nem tanto A colcha resultado

    de mltiplas colaboraes que no aconteceram ao mesmo

    tempo, nem com as mesmas pessoas. Cada pessoa contribuiucom um pouquinho, sem se preocupar em capturar o livro em

    sua totalidade. Ningum se disps a impor uma viso

    totalizante que desse conta da complexidade aqui

    apresentada. O resultado que o livro no apresenta uma

    narrativa nica nem homognea.

    A edio do livro foi muito cuidadosa em manter essa

    diversidade, removendo apenas as sentenas discriminatrias

    e taxativas deixadas pel@s colaborador@s, bem como as

    frases redundantes.

    Como este livro est organizadoSo quatro captulos, cada um sobre um tema fundamental para

    a colaborao na economia criativa: cocriao, aprendizado,

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    economia e gesto. Por criar algo junt@s, as pessoas

    aprendem algo novo pelo conhecimento que compartilhado,

    de natureza interdisciplinar. A continuidade e

    sustentabilidade desses processos de cocriao e aprendizado

    levam a pensar a microeconomia e as implicaes do trabalho

    colaborativo no sustento da vida. Por fim, surge a questo da

    gesto, ou melhor, da autogesto ou cogesto. O trabalho

    colaborativo no depende de um@ chef@, lder carismtico ou

    qualquer outra estrutura hierrquica. Cada um@ lder de simesm@, porm, trabalhando para cultivar um bem comum.

    A escrita de cada captulo seguiu uma metodologia comum

    dividida em quatro eixos: 1) Conceitos, 2) Tcnicas, 3) Estudos

    de caso e 4) Ferramentas no Corais.

    Na primeira parte discutida uma srie de conceitos, tais como o

    de economia criativa, economia solidria, autogesto,

    coautoria, cocriao, cogesto, processos colaborativos, entre

    outros, com o cuidado de contextualiz-los com as

    transformaes que esto ocorrendo na sociedade atual. Em

    seguida, so apresentados estudos de caso que demonstram

    tcnicas para apoiar as transformaes sociais.Essas tcnicas podem ser aplicadas com diversos tipos de

    ferramenta, porm, neste livro a prioridade foi apresentar as

    ferramentas da Plataforma Corais, pois estas foram criadas

    com base nos conceitos e tcnicas descritos anteriormente,

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    IN T R O D U O

    tendo como premissa a apropriao da tecnologia livre pelos

    grupos e pessoas dispost@s a agir colaborativamente. Cada

    captulo, portanto, explica as razes e os sentimentos por trs

    da Plataforma Corais.

    Por que as pessoas colaboram?

    Os seres humanos racionais necessitam de relaes em

    comunidade para sobreviver. Para fazer com que suas

    estruturas e seus valores perdurem, precisam cotidianamente

    colaborar entre si, pois compartilham do bem comum que

    subsistir em sociedade. No caso dos processos colaborativos,

    seja nas artes, na educao ou na tecnologia, construir um

    bem comum a motivao principal que faz as pessoascolaborarem.

    A perspectiva de que existe controle ou propriedade das ideias

    uma inveno dos ltimos sculos. As pessoas sempre

    precisaram de outr@s para poder criar e desenvolver

    conhecimentos, mas h uma tendncia a fazer com que o

    processo criativo deixe de ser uma forma de participar em

    comunidade e passe a ser um mito de celebrao da

    individualidade. A verdade que tod@s precisam colaborar, e

    mesmo aquel@s que se encantaram com as oportunidades do

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    mundo da indstria e do negcio proprietrio, despertam aos

    poucos para a falta de sustentabilidade que esse modelo

    apresenta no presente e para o futuro.

    Hoje em dia podemos ver as consequncias de fechar os cdigos*

    e as limitaes das ideias protegidas pela cultura

    individualista e proprietria. As pessoas, a organizao

    coletiva, os governos, a indstria, etc., vo gradualmente

    reconhecendo a necessidade de aprender a trabalhar com

    outr@s, e de criar espaos intelectuais e comerciais paragarantir a sustentabilidade cultural. Alm disso, por meio do

    surgimento de tecnologias baseadas no trabalho em rede, a

    colaborao tem tomado um papel importante ao demonstrar

    que a criao sem comunidade o mesmo que cantar sem ter

    ningum para escutar: no possui poder nem impacto.

    O contexto econmico da colaborao

    Novas perspectivas econmicas surgem quando as formas sociais

    de organizao predominantes refletem apenas anseios de

    pequenos grupos oligrquicos. Estas perspectivas so abertas

    por sujeitos sociais que buscam uma forma mais justa de fluir

    suas aes e ideias, partilhando valores e prticas em

    coletividades. Esse processo mobiliza representaes

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    simblicas e identidades, como tambm cria condies para

    expanso da cidadania. Quando as pessoas se empoderam e

    tomam decises, criam agendas que influenciam as polticas

    pblicas a levarem em considerao grupos invisibilizados.

    Disso resulta a ampliao dos espaos pblicos e a expanso

    dos direitos humanos, econmicos, sociais, culturais e

    ambientais. Mas at que ponto essas novas perspectivas

    tambm representam novas oportunidades econmicas? E

    como estas podem ser fomentadas?Na economia em que vivemos, a economia de mercado, a

    valorizao individual, restritiva, acumulativa e de reteno;

    o que importa a produo e venda de mercadorias. Os

    valores humanos de longo prazo tendem a perder a relevncia

    e os nmeros so mais importantes que o processo e ainda

    mais que o resultado final; os objetivos se invertem, e o

    resultado do trabalho de uma pessoa deixa de ser valorizado

    em prol da escassez ou suposta necessidade social. Ainda pior,

    h especulao de bens e necessidades bsicas, o que gera

    riqueza somente para aquel@s que historicamente

    monopolizam os recursos para a produo de bens e servios.Os sistemas macro dominantes no so capazes de responder aos

    anseios de forma imediata, podendo ser modificados a partir

    de pequenas aes locais de longo prazo. No adianta ficar

    apenas esperando por pacotes econmicos ou decises macro-

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    polticas. Os indivduos tambm so capazes de propor

    solues para instituies e outras formas de organizao

    visando atender melhor as demandas de toda a sociedade, e

    no apenas de pequenos grupos detentores do capital

    econmico.

    Acreditamos que a sociedade ainda no esteja condenada e

    precise apenas de uma tomada de conscincia, a fim de gerir a

    si mesma atenta s suas reais necessidades, seus limites e

    possibilidades de criar novas bases comuns.Buscar novas ideias para organizar a sociedade no significa

    necessariamente destruir para reconstruir uma nova forma de

    organizao social. Talvez a ideia que melhor se aproxime

    desta proposta seja a de uma organizao comunitria,

    autogestionria, sem a necessidade da interferncia de

    instituies intermediadoras. O objetivo estabelecer uma

    gesto coletiva que no comprometa a individualidade,

    utilizando ferramentas que permitem acesso a todos os

    debates e participao nas decises. Os modelos polticos

    institucionais nos quais habitualmente estamos inseridos no

    tm permitido este tipo de relaes. So restritas aspossibilidades de manifestar a opinio, a no ser atravs do

    poder de compra e, eventualmente, atravs do voto.

    Temos diversos sinais de que as formas institucionalizadas de

    conhecimentos, prticas e economia no esto conectadas

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    IN T R O D U O

    com os interesses reais das pessoas: pais e comunidade

    educando filh@s para alm da escola; sociedades se unindo

    para buscar solues microrregionais conjuntas; grupos

    minoritrios buscando seus direitos; unio de pessoas por

    interesses e afinidades, buscando organizao atravs de

    aes em menor escala, mas de efetivo resultado e satisfao;

    envolvimento da comunidade atravs de aes locais. So

    diversas as formas de trabalho comunitrio.

    Na medida em que estas pequenas aes vo se unindo, passam aprecisar de uma forma organizada de se propagar. Chegamos

    ento, Economia Criativa, que busca novos sentidos atravs

    de uma economia que desloca seu centro para a produo e

    consumo de bens intelectuais e culturais. Mais alm est a

    Economia Solidria que, atravs de diversas tecnologias

    sociais, prope moedas sociais, que trazem novas formas de

    contabilizar o valor do trabalho de cada pessoa e mediar

    trocas de bens e servios, mais justas e adequadas aos

    objetivos de valorizao de uma comunidade.

    Um exemplo simples: ao invs de esperar que algum venha e

    resolva o problema, um grupo local assume a manuteno deuma praa abandonada. Alm de requerer criatividade,

    necessita da ao direta, do trabalho voluntrio, efetivo e

    engajado, pois deste que surge naturalmente a fora do

    trabalho. Depois disso, o prazer de desfrutar de uma praa

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    passa a ser muito maior, porque todos sabem o valor de

    manter um local pblico em prol de tod@s. Surgem as mais

    diversas interaes sociais e satisfaes pblicas. E h

    responsabilidade social de tod@s, pela relao de

    pertencimento e de propriedade comum que se elabora. O

    esforo coletivo gera tal valor que o prazer de usufruir da

    praa se soma fora das multides unidas pelo trabalho

    colaborativo.

    Seria necessria, ento, uma forma de medir e valorar o trabalhoindividual para que no haja injustia na distribuio do

    retorno da produo? Se fssemos medir o valor do trabalho

    de cada pessoa na recuperao da praa ou esperar que as

    pessoas contribuam motivadas apenas por um valor, talvez a

    espontaneidade se perca. Por outro lado, quando cresce o

    esforo em torno de algo em comum, cresce tambm a

    necessidade de trocar a fora do trabalho por outros bens em

    outras comunidades.

    As ferramentas colaborativas

    As prticas colaborativas atravessam a histria do ser humano.

    Chama a ateno as formas como elas se estabelecem em

    diferentes lugares e momentos histricos. A pintura

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    IN T R O D U O

    renascentista "Escola de Atenas" imagina o ambiente de

    colaborao entre filsof@s e pensador@s gregos, entre os

    quais as ideias floresciam e eram discutidas de forma livre e

    conjunta. As garagens americanas onde se reuniam

    informalmente jovens acadmic@s tambm trouxe tona

    muitas ideias que formaram a computao pessoal antes de se

    tornarem empresas corporativas. O contexto fabril

    impulsionou aes colaborativas e de resistncia operria que

    deram incio economia solidria e, mais recentemente, noBrasil, temos o caso da Usina Catende em Pernambuco, que

    @s agricultor@s assumiram aps falncia da usina, um caso

    magnfico de gesto colaborativa

    Estes casos histricos de estmulo e promoo do trabalho

    colaborativo ajudam a compreender que culturalmente se

    estabeleceu, em diferentes momentos, contextos e setores

    produtivos, a prtica da formao de oficinas colaborativas.

    Por oficinas compreendemos aqui o espao de realizao do

    trabalho colaborativo, o locus da produo colaborativa; o

    termo envolve a dimenso do aprendizado e do trabalho numa

    perspectiva de construo coletiva, de elaboraocompartilhada.

    Na atualidade, para alm da academia e das garagens, a

    colaborao pode ter, como espao de oficina, o ambiente

    digital. Hoje podemos utilizar as novas ferramentas daweb2.0

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    para promover o trabalho coletivo, o que oferece diversos

    benefcios, tais como: quebra da centralizao da autoria

    individual; alternativas para a questo da distncia e do

    tempo; novas formas de se reunir, pesquisar, criar e interagir.

    Com estas possibilidades, o trabalho se mantm contnuo, seja

    por mutires de colaborao em que diversas pessoas se unem

    para rapidamente colaborar e encontrar uma soluo de um

    projeto, ou pela estratgia "devagar e sempre", em que grandes

    projetos so levantados pelo trabalho acumulado de todos,com cada um colaborando pouco a pouco, quando e como

    pode.

    Entretanto, o digital tambm traz algumas contradies.

    Profissionais de reas como as dodesign, arte, programao e

    outros campos criativos, at pouco tempo atrs, possuam

    poucas opes de softwares, que so suas ferramentas de

    trabalho. Mais complicado ainda: a maior parte dos softwares

    precisavam ser comprados, pois eram proprietrios, o que

    implica que, ao comprar osoftware, compra-se apenas o direito

    de us-lo, mas no de t-lo realmente, e poder revend-lo ou

    modific-lo, de aprimorar a ferramenta.Com osoftwareproprietrio, necessrio pagar uma licena ou o

    usurio sempre considerado um criminoso por usar software

    pirata, j que a lei protege a autoria at as ltimas

    consequncias. Esse sistema que protege o autor em

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    IN T R O D U O

    detrimento da coletividade dificulta o estabelecimento de

    prticas colaborativas, pois os meios para o trabalho (as

    ferramentas) no podem ser compartilhados.

    Uma das iniciativas que se ope a esse cerceamento da liberdade

    o Software Livre, especialmente com o sistema operacional

    GNU/Linux e com o trabalho da Free Software Foundation, de

    Richard Stallman, que comeou a reescrever - do zero -

    diversos softwares necessrios para um sistema operacional

    atravs do projeto GNU. Posteriormente ele conheceu LinusTorvalds, da Universidade de Helsink, que tinha feito um

    kernellivre chamadoLinux.

    Para alm de uma simples (ou eficaz) alternativa pirataria, o

    software livre concebido como um movimento social. Seja

    qual for, um software carrega consigo toda uma lgica de

    construo, que pode ser colaborativa e trazer contribuies

    para o conhecimento universal, ou no.

    Hoje, quando trabalhamos com tecnologia paraweb, por exemplo,

    j existem diversas alternativas livres para que @ usuri@ no

    seja considerad@ criminos@ executando o seu trabalho do dia

    a dia. E no estamos falando somente de uma iniciativainformal, mas de legislaes e licenas existentes para

    comprovar a liberdade daquilo que foi criado coletivamente,

    como as licenas GPL, MIT, Creative Commons e todas que

    legalizam e mantm o trabalho e a cultura livres.

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    Sabemos que o protecionismo e a autoria ainda so fortes,

    porque h um temor de que a liberdade total afete a estrutura

    hierrquica e segmentada da distribuio de recursos, bens,

    servios, informaes, pessoas, etc. Ou seja, de uma maneira

    geral, a sociedade na qual vivemos ainda segue a frmula

    "trabalho + esforo individual = dinheiro => sobrevivncia". No

    entanto, a recriao de todas essas ferramentas, liberadas da

    autoria exclusivista e postas como ferramentas livres, permite

    que novas prticas de colaborao sejam sustentadas, criandoespaos de liberdade e colaborao e fomentando a

    experimentao baseada na troca e no trabalho colaborativo.

    Parece que o trabalho coletivo e as ideias que rodeiam esta

    discusso precisam de uma quebra deste paradigma para que

    possam ser levadas aos seus reais benefcios. Sabemos atravs

    da histria que quem fez isto ao extremo, sofreu srias

    represlias, a exemplo da Guerra de Canudos, quando um

    povoado do serto da Bahia se reuniu para suprir suas

    necessidades dentro da prpria comunidade, sofrendo dura

    represlia do governo republicano no final do sculo XIX.

    De fato existem vrios sistemas opressores que dificultam acolaborao, mas eles no so perfeitos nem eficientes.

    Sempre haver brechas, e pelas brechas possvel efetivar a

    transformao do sistema, pouco a pouco, sempre com o

    cuidado para no reconstruir, com um novo formato, a

    mesma estrutura opressora que se deseja superar.

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    IN T R O D U O

    A Plataforma Corais

    A Corais ou tambm chamado de o (website) Corais uma

    plataforma para desenvolvimento de projetos colaborativos.

    Assim como um recife de corais oferece infraestrutura

    propcia para diferentes formas de vida marinha, esta

    plataforma visa a proliferao de projetos colaborativos quecontribuam para o bem comum.

    O Instituto Faber-Ludens criou essa plataforma em 2011 para

    apoiar o desenvolvimento de qualquer classe de projetos

    abertos em outras organizaes, sem necessariamente haver

    vnculos formais com o Instituto, seguindo a estratgia de

    Inovao Aberta. Em 2012, o Corais tornou-se independente

    do Instituto Faber-Ludens e, em 2013, mudou-se para o

    Instituto Ambiente em Movimento. No IAM, a plataforma

    desenvolvida por Frederick van Amstel, com a participao

    aberta a qualquer usurio no projeto Metadesign, que visa o

    desenvolvimento da prpria plataforma.O Corais umLiving Labfiliado Rede Europeia de Living Labs.

    Living Lab um espao de desenvolvimento de projetos

    compartilhado por vrias organizaes pblicas e privadas

    que desejam colaborar para inovar em conjunto. OLiving Lab

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    facilita a troca de conhecimento e oferece infraestrutura para

    cocriao e teste de novos produtos. OLiving Labenfatiza que

    os produtos sejam criados e testados em contextos reais, no

    em laboratrios antisspticos, por isso o nome living(vivo) e

    lab (laboratrio). O Corais , portanto, um ecossistema que

    envolve laboratrios, salas de aula, comunidades estartupsque

    acreditam no aprender fazendo, fazer aprendendo.

    No Corais tudo que postado no sistema fica disponvel para @s

    participantes do projeto e tambm para qualquer pessoa queesteja logada, criando assim uma base de conhecimento para

    futuras consultas, a to aclamada documentao exigida pelos

    gerentes de projetos, que na plataforma gerada

    automaticamente ao longo o desenvolvimento do projeto.

    Alm disso, pessoas fora do projeto podem contribuir com

    comentrios ou se juntar ao projeto e contribuir mais

    ativamente. A cada atualizao no projeto os membros do

    grupo recebem uma notificao por e-mail, mantendo uma

    dinmica colaborativa em que tod@s esto a par do que est

    acontecendo.

    Existem vrias outras ferramentas colaborativas no mercado,mas elas no promovem a formao de comunidades. O

    contedo fica fechado atrs de uma senha, com direitos

    autorais reservados pela empresa que oferece a ferramenta.

    Ningum pode descobrir esse contedo e se tornar

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    IN T R O D U O

    eventualmente um colaborador.

    Atravs da Plataforma Corais possvel conhecer novas pessoas e

    se valer da experincia delas. Alm disso, como o cdigo-fonte

    livre, novas ferramentas so desenvolvidas constantemente.

    Atualmente no existe nenhuma outra plataforma que oferea

    o mesmomixde ferramentas que o Corais:blog, moeda social,

    cursos a distncia, gestor de tarefas, chat, calendrio e muito

    mais, tudo integrado e classificado por taxonomia.

    A plataforma permite que projetos aconteam mesmo que as

    pessoas envolvidas no possam se encontrar pessoalmente e

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    mesmo que no haja recursos financeiros disponveis. Cada

    pessoa participa quando pode, no seu horrio livre. As tarefas

    podem ser geridas horizontalmente, sem que uma pessoa

    tenha que dizer o que precisa ser feito. Quando o projeto

    descobre que pode gerar valor, possvel habilitar a

    ferramenta de moeda social. Em suma, o Corais feito para

    projetos que geram ou que fortalecem uma comunidade.

    O Corais uma combinao de vrios mdulos deDrupalque se

    encontram disponveis para download no site do projeto. Namedida em que outros desenvolvedores forem se juntando

    equipe do Corais, ser possvel evoluir a plataforma numa

    distribuio de Drupal prpria com todos os mdulos e

    customizaes feitas. Se voc tem interesse em ajudar a

    tornar isso realidade, contribua com a plataforma atravs do

    projeto Metadesign. Por enquanto, est disponvel apenas

    uma lista com todos os mdulos utilizados e o cdigo-fonte

    cru noGitHub.

    Neste livro encontram-se possibilidades de como montar um

    grupo, como convidar pessoas, encontrar uma causa

    relevante, alinhar objetivos, apresentar um projeto,compartilhar responsabilidades, selecionar e usar a

    ferramenta mais adequada, diversificar dinmicas de

    apresentao, colaborar com produes criativas e coletivas.

    Este livro voltado a pessoas que gostam de trabalhar

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    IN T R O D U O

    coletivamente e acreditam no desafio da convivncia

    harmoniosa; para grupos que confiam na escuta e no dilogo

    como meios para transformao da realidade; para quem

    valoriza mais o processo do que os produtos; para as pessoas

    que no so apenas leitoras de um livro, mas tambm so

    parte das ideias que aqui esto expostas, seja colocando-as em

    prtica, seja modificando-as e tambm re-escrevendo-as.

    At o fechamento deste livro, a plataforma contava com 198

    projetos pblicos e mais de 2200 membros. Esperamos quevoc torne-se tambm um membro e traga seus projetos

    colaborativos para a plataforma. Seja bem vindo e fique a

    vontade para coralizar!

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    Co-criao e cria-atividade

    O trabalho potencialmente uma atividade criativa, pois visa

    criar algo de valor para uma pessoa ou para uma coletividade.

    Entretanto, quando o trabalho dividido socialmente de

    modo com que cada pessoa crie apenas uma parte de um

    produto, sem contribuir para sua integrao conceitual no

    todo, o seu potencial criativo minimizado. por isso que

    enquanto alguns realizam um trabalho criativo, outr@sapenas executam tarefas. Essa uma estratgia tpica para

    manter a concentrao de propriedade e o poder sobre a

    gerao de valor.

    Quando as pessoas participam da criao de algo, elas se sentem

    donas do que fizeram juntas, o que, para certas organizaes

    hierrquicas, no desejvel, pois de sua cultura a

    centralizao do poder.

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    Estudo de caso: Co-criao da identidade visual dovocabulrio da participao

    O projeto "Vocabulario Comn de Participacin Social" uma iniciativa

    do portal Cidade Democrtica com o apoio da Fundao Avina e visa

    definir padres para dados abertos em aplicativos e websites de ao

    cidad.

    Uma pessoa ou organizao pode iniciar uma ao baseada numa causa

    social, buscando solucionar um problema de interesse pblico. Essa ao

    pode ser ampliada por uma srie de aplicativos e websites integrados pelo

    padro de dados abertos, multiplicando a abrangncia de pessoas

    envolvidas.

    A criao da identidade visual do projeto se deu pela interao de

    comentrios num post de blog. Uma proposta inicial foi desenhada com aferramenta "Adicione um desenho a este comentrio". Comentrios de

    outros participantes do projeto levaram ao refinamento da ideia e a um

    novo desenho. Como o desenho baseado em SVG (Scalable Vector

    Graphics), os participantes puderam copiar o cdigo-fonte e continuar o

    desenho, acrescentando novos elementos.

    O resultado final que sintetiza as discusses foi feito em Inkscape e o

    cdigo-fonte disponibilizado como anexo no comentrio. No total, seis

    pessoas participaram diretamente do projeto de identidade visual.

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    ES TU D O D E C A S O

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    O desafio atual das organizaes que a criatividade est se

    tornando cada vez mais um valor agregado ao produto. No

    caso da economia criativa, a criatividade o nico valor. As

    pessoas buscam a criatividade no que consomem, pois

    esperam que ao consumir se tornem mais criativas.

    Quando as pessoas colaboram para criar algo, elas dinamizam a

    economia pelo estabelecimento de novas relaes e

    habilidades. Ao invs de competir numa escala conhecida, a

    economia criativa colabora para expandir constantemente ouniverso do possvel. A sade da economia criativa no se

    baseia na competio, mas sim na colaborao.

    Inovao fechada e inovao aberta

    Enquanto o trabalho repetitivo, fragmentado e chato perde seu

    valor a ponto de ser substituvel por mquinas, o trabalho

    criativo ganha proeminncia. As primeiras tentativas das

    empresas em se adaptarem a essa realidade foi o investimento

    em inovao, incentivando seus funcionrios a serem mais

    criativos no trabalho. Porm, para manter o controle sobre as

    inovaes, as empresas registram patentes e assinam

    contratos de sigilo com seus funcionrios, obrigando-os a

    ceder os direitos de uso sobre suas ideias.

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    CO-C R I A O E CR I A-A T I V I D A D E

    Ao invs de dinamizar a economia criativa, a inovao fechada

    emperra seu desenvolvimento. O resultado da criatividade

    fica guardado a sete chaves e muitas vezes nem utilizado. A

    grande mentira dentro dos crculos relacionados com a

    economia criativa baseada no capital intelectual que, a fim

    de gerar valor agregado para o resultado, importante manter

    o controle da autoria para garantir o sucesso no

    desenvolvimento. Considerando que a gerao de valor na

    economia criativa se d pelo estabelecimento de novasrelaes, esta prtica de protecionismo prejudica a tod@s em

    longo prazo.

    Qual o futuro de uma economia criativa baseada em patentes e

    outros direitos autorais? Um futuro sombrio onde uma pessoa

    perde a oportunidade de salvar a vida da outra s porque a

    inovao que j existe foi patenteada e no est disponvel, ou

    ironicamente, precisa de muito dinheiro mesmo que os custos

    sejam baixos. No h nada de criativo nisso. Ao contrrio,

    destrutivo.

    A criatividade avana pelo desenvolvimento do comum, coisas

    compartilhadas que as pessoas podem ir agregando novasrelaes e construindo coletivamente algo maior que elas. Se

    algum pe uma cerca em volta do comum, essas

    contribuies param de acontecer. Mesmo que uma empresa

    justifique que vai cuidar bem do comum, no h legislao

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    que garanta isso. Alm do mais, trata-se de um roubo do que

    foi construdo com a boa vontade de muitas pessoas.

    Isto significa que todo trabalho criativo precisa se basear no

    resultado da criatividade de outr@s para poder existir, e isto

    pode funcionar de duas maneiras: a abertura de ideias para a

    criao e a adaptao das ideias ao meio. As duas so

    essenciais para que o trabalho criativo das pessoas ou grupos

    tenha razo de existir. A primeira, tem a ver com ideias

    fornecidas por outros como matria prima para a cocriao, e

    pode se dar ao longo da histria. A segunda, relacionada com

    a funo da sociedade para valorar as inovaes de outr@s e

    aplic-las em seu meio, para aceitar a criao como valiosa e

    til.

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    CO-C R I A O E CR I A-A T I V I D A D E

    A diferena entre os processos de inovao aberta ou fechada so

    fundamentais aqui. A inovao fechada regula a participao e

    precisa de muito dinheiro ou outros meios para poder se

    alimentar de ideias de outr@s, e tambm para convencer (ou

    controlar) as pessoas atravs do marketing. Em vez disso, a

    inovao aberta abre os processos criativos para o pblico,

    divulgando etapas e resultados, convidando as pessoas de fora

    para participar. Isso no s enriquece a possibilidade de novasrelaes, como tambm promove a instituio como uma

    cultivadora do comum.

    Uma das aes mais comuns hoje em inovao aberta a

    organizao de concursos culturais para criao de

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    logomarcas e outros objetos simblicos. Apesar de serem

    pblicos e de permitir a participao externa, estes concursos

    no promovem a colaborao e sim a competio entre @s

    participantes. Eventualmente, podem ser vistos como uma

    forma deoutsourcingmais barato e que gera mdia espontnea,

    o chamado crowdsourcing. A qualidade das peas vencedoras

    demonstra o quo limitada essa modalidade de inovao

    aberta.

    A inovao aberta se realiza em sua plenitude quando existemprocessos sustentveis de cocriao, processos que

    estabelecem relaes duradouras e vantajosas para ambos @s

    criador@s. @s criador@s se juntam para gerar um valor que

    no conseguiriam sozinh@s.

    Cria-atividade

    A criatividade na economia criativa muitas vezes abordada

    como um fim em si mesma, como algo que deve ser feito

    porque est na moda, porque legal. Alm disso, ainda se

    propaga a noo de criatividade como um talento que apenas

    algumas pessoas possuem. Esse mito precisa ser

    desconstrudo para que haja progresso na economia criativa.

    Todos as pessoas so criativas. Resolvem suas questes

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    CO-C R I A O E CR I A-A T I V I D A D E

    cotidianas e inventam suas formas de lidar com os problemas

    do dia-a-dia. O fator limitante que nem todas as atividades

    so cria-atividades. Uma atividade criativa aquela

    comprometida com a criao de algo novo, no s para uma

    pessoa, mas para vrias, ou seja, que produza algum valor

    para o comum. Se uma pessoa cria sozinha, ela pode se sentir

    super-criativa, mas se as demais pessoas ao apreciar o

    trabalho no veem valor no resultado, essa atividade no ser

    considerada uma cria-atividade. O que para uma pessoa novo pode ser velho para outra e assim por diante.

    A maneira mais interessante de explicitar o valor da cria-

    atividade incluir as pessoas no processo criativo. Quando as

    pessoas participam da criao de algo elas entendem os

    desafios, problemas e dificuldades que so enfrentados,

    permitindo assim melhor avaliar as solues encontradas.

    Para que uma atividade seja uma cria-atividade preciso nutrir a

    cocriao. Quando vrias pessoas criam juntas, todas se

    tornam criativas, ainda mais do que se estivessem sozinhas.

    Tal colaborao torna o trabalho muito mais prazeroso, pois o

    feedbacke a apreciao mtua so uma constante.A sociedade, de uma forma ou de outra, se torna parte do

    processo de criao de valor da cria-atividade. Quando outr@s

    leem este livro e recomendam para outr@s, por exemplo, do

    valor s ideias no livro e acrescentam as suas.

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    O trabalho colaborativo, portanto, caracterizado pelo

    desenvolvimento da criatividade coletiva em grupo,

    aproveitando os diversos dons, talentos, vises de mundos,

    ideias, repertrios, saberes e conhecimentos de cada pessoa.

    Pode no resultar em obras que impressionem o mundo, mas

    satisfazem os desejos do comum, representando a tentativa

    do coletivo de se superar.

    A cria-atividade no um momento, ela contnua, afinal de

    contas, nada comea do zero.

    A inviolabilidade do comum

    Outro mito que ameaa a economia criativa que criatividade

    no deve ter limites. Sem regras, uma atividade no se tornauma cria-atividade, pois falta um estmulo de superao. A

    regra ajuda a criar uma referncia para a criao, um

    caminho, uma guia, no necessariamente o ponto de partida

    nem o ponto de chegada. Alm disso, a existncia de uma

    regra no significa que ela no possa ser questionada ou

    alterada. Seu questionamento j uma das coisas que produz

    em si um valor social, pois regras esto por toda a parte e as

    pessoas querem saber como lidar com elas. O que vale a pena

    seguir, o que est desatualizado, o que pode ou precisa ser

    mudado.

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    CO-C R I A O E CR I A-A T I V I D A D E

    As regras ajudam a manter a coeso social, estabelecendo

    critrios explcitos para avaliar a conduta de cada um e de

    tod@s. Se estas regras forem construdas pelo coletivo e

    estiverem sob seu controle, elas iro contribuir para manter as

    pessoas unidas, servindo como uma representao da relao

    de cada um@ com o comum, aquilo que est sendo construdo

    em conjunto.

    O comum tambm precisa de regras para ser protegido, do

    contrrio, eventualmente haver pessoas colhendo mais doque se planta, enfim, abusando da boa vontade de tod@s, a

    famosa tragdia do comum. A tragdia do comum, proposta

    por Garrett Hardin, dita que sem regras para proteger o

    recurso comum e sem conscincia das consequncias de suas

    aes, as pessoas que compartilham o recurso agem sob

    interesses prprios e acabam com todo o recurso disponvel.

    Hardin listou problema com um exemplo chave: os pastores

    na Inglaterra levam ovelhas a um campo sabendo que a

    vegetao um recurso que gera benefcio a tod@s. A medida

    que mais ovelhas so introduzidas ao campo pelos interesses

    egostas dos pastores para gerar mais benefcio individual, orecurso vai ser depletado e ao final, tod@s perdem.

    As regras da cocriao devem estabelecer a inviolabilidade do

    comum. Assim como as florestas e as praias devem ser

    protegidas para garantir que outr@s possam desfrutar delas,

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    o comum deve ser protegido da proteo autoral e de

    atividades que dificultem a cocriao.

    possvel criar, desde que a criao no destrua o que j foi

    construdo anteriormente. A economia capitalista tende a

    destruio criativa, pois o acmulo de capital gera inrcia no

    mercado. preciso que haja crises e guerras - destruio -

    para que haja novos investimentos e inovaes - cria-

    atividade.

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    CO-C R I A O E CR I A-A T I V I D A D E

    A economia criativa desafia tal tendncia pela volatilizao do

    capital, que no consegue mais ser acumulado. O capital

    criativo na verdade escorre pelas brechas da acumulao. As

    patentes, as leis de direito autoral, os sistemas de vigilncia

    do margem para a pirataria, o hackerismo, a resistncia.

    Estas prticas nada mais visam que o restabelecimento do

    comum.

    Outro ponto essencial o respeito mtuo. Quando uma pessoa ou

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    uma organizao se acha no direito de impor uma palavra de

    ordem sobre as demais sem que sua dignidade seja

    preservada, as relaes com o comum se rompem. Uma vez

    quebrada a relao de respeito muito difcil restabelecer a

    igualdade na conversa. Sem respeito, a criatividade d lugar a

    destruio num piscar de olhos.

    A pior das destruies, entretanto, a destruio da esperana.

    Quando uma pessoa prope uma ideia num grupo e essa ideia

    recusada, ridicularizada, omitida ou manipulada, a pessoapode perder a esperana na construo do comum. Mesmo

    que ela continue trabalhando para sua manuteno, ela ser a

    primeira a abandonar o barco quando uma dificuldade surgir.

    Para a longevidade do comum importante que a crena no

    possvel seja preservada a todo custo! Tudo possvel, s no

    se sabe ainda como.

    Tcnicas de cocriao

    A cria-atividade comea quando as ideias so colocadas para fora

    da cabea. Enquanto elas esto sendo matutadas, seu

    desenvolvimento tende ao aperfeioamento, no a criao. A

    cocriao ocorre de fato pela ocorrncia sucessiva de criao

    atrs de criao. Uma coisa nova posta no mundo, e serve

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    CO-C R I A O E CR I A-A T I V I D A D E

    como insumo para pensar, discutir, mexer e recriar a coisa. O

    processo criativo gradual e no se restringe ao momento do

    insight.

    Uma vez que as ideias esto fora da cabea, elas podem ser

    avaliadas, organizadas, priorizadas e modificadas de uma

    forma muito mais avanada do que possvel mentalmente,

    pois a memria cognitiva limitada. Quanto mais crua a ideia

    for expressa, melhor, pois a prpria aparncia dela indicar

    que no est finalizada e precisar de complementao.Nenhuma ideia deve ser jogada fora. Tudo deve ser incorporado

    ao processo criativo; at o que aparentemente no presta pode

    servir de exemplo negativo do que no se deve fazer. Todo

    rejeito, sendo orgnico, sempre um "bom adubo" para o

    processo criativo. Uma ideia a princpio invivel e desajeitada,

    pode servir de insumo para uma ideia muito melhor, que se

    desenvolve pela anttese. Por isso, importante comear cedo

    jogando ideias sem pudor para romper com a inrcia. No h

    nada mais opressor cria-atividade como um papel em

    branco. Contra o branco qualquer rabisco j serve. Tudo tem

    um comeo.Com o tempo, claro, algumas ideias iro ganhar maior adeso

    entre @s participantes, o que tambm ir atrair mais

    contribuies. Estas ideias, mesmo que polmicas e no

    completamente resolvidas, devem receber prioridade pois

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    revelam uma questo pertinente para o grupo. Uma maneira

    prtica de lidar com elas derivar propostas concretas do que

    pode ser feito hoje.

    Se uma pessoa se ope a uma ideia ou no a considera bacana,

    pode sempre fazer um comentrio ou parntese. No se trata

    de rejeitar ou apagar a ideia, mas de complementar e

    apresentar contrapontos.

    Quando se trabalha em grupo, entretanto, preciso atravessar

    fronteiras lingusticas, organizacionais, culturais eeconmicas. @s criador@s precisam ser flexveis e ter a mente

    aberta para perceber que uma fronteira est sendo cruzada e

    que, a partir dali, no estaro mais em ambiente familiar. O

    improviso, a curiosidade e a capacidade de dilogo so

    habilidades essenciais para cruzar fronteiras. Esse percurso,

    embora pedregoso, o mais rico para estabelecer novas

    relaes.

    Uma das prticas de fronteira mais interessantes o remix. Se

    apropriar de um material cultural e dar a ele um novo

    significado, traz-lo para um outro territrio, desafiando as

    fronteiras estabelecidas entre arte e cincia, jornalismo epermacultura, eletricidade e paixo. Trata-se de uma

    combinao de elementos nunca antes combinados,

    utilizando materiais originais quando legalmente possvel. O

    remix uma forma de acessar a conscincia coletiva, onde

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    CO-C R I A O E CR I A-A T I V I D A D E

    todas as ideias aparecem conectadas, parte de um todo maior

    do que qualquer indivduo pode perceber.

    O risco do "esprito de porco" se manifestar na cocriao existe,

    como em todo processo de manuteno de um comum. A

    tcnica mais utilizada para minimizar sua capacidade

    destrutiva a de manter um histrico de verses de um

    documento, que permite que qualquer alterao seja revisada

    e revertida. Se algum apaga tudo o que foi construdo pelo

    grupo, possvel com baixo esforo recuperar de volta e aindabanir a pessoa, retirando suas permisses de acesso aos

    documentos do grupo. Com um eficiente histrico, no h a

    necessidade de fazer filtro prvio de moderao. A moderao

    pode acontecer em carter de ps moderao, atravs da

    anlise coletiva do grupo aps a postagem de uma nova

    contribuio.

    Coautoria

    Quando vrias pessoas trabalham juntas em co-criao, surge

    logo a discusso sobre autoria. Perguntas tais como "Posso

    usar isso depois sozinho?", "Posso modificar?" ou "Quem vai

    ganhar dinheiro com o meu trabalho?"

    O motivo pelo qual a autoria dos projetos colaborativos

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    complicada e confusa porque as leis de propriedade

    intelectual em vigor foram feitas para um propsito diferente

    de projetos colaborativos. Enquanto a propriedade intelectual

    procura gerar valor para o criador e centralizar a criao, os

    projetos colaborativos procuram gerar valor atravs da

    participao da comunidade.

    Os direitos autorais, por exemplo, foram instalados para garantir

    privilgios econmicos para as empresas editoriais e para

    proteger a indstria local da "invaso" da competioestrangeira. Isto implica duas coisas: a primeira que os

    responsveis pela cria-atividade devem incorrer nos custos do

    desenvolvimento do contedo; a segunda que eles tem o

    controle de quem pode desfrutar dos benefcios da criao de

    contedos.

    Esta noo de propriedade, baseada na ideia de que o homem

    deve ser reconhecido e recompensado como produto de seu

    trabalho tem sido discutida pelos ltimos 200 anos. Thomas

    Jefferson comenta em uma famosa carta a Isaac McPherson

    que ideias podem se propagar e ser teis para todos

    igualmente sem medo de que vo se acabar:"Quem recebe uma ideia de mim, recebe instrues sem degradar

    as minhas, como quem acende a sua vela da minha, recebe luz

    sem obscurecer a minha. O fato de que as ideias deveriam ser

    compartilhadas livremente de pessoa a pessoa ao redor do

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    CO-C R I A O E CR I A-A T I V I D A D E

    mundo, para a instruo moral e mtua dos homens e a

    melhora da sua condio, parece ter tido peculiar e

    benevolentemente projetado pela natureza, quando ela os fez

    como o fogo, expansveis pelo espao, sem atenuar sua

    densidade em nenhum ponto, e como o ar que respiramos,

    movemos e temos o nosso ser fsico, incapazes de

    confinamento ou apropriao exclusiva. As invenes no

    podem, na natureza, ser sujeitas de propriedade".

    Lei de direito autoral brasileira

    O Brasil, assim como muitos outros pases do mundo, parte de

    uma rede de acordos internacionais de propriedade

    intelectual que dirigem a proteo de criaes conforme assuas caractersticas. Isto quer dizer que toda criao est

    sujeita aos direitos que atribui as pessoas consideradas

    autor@s.

    O direito autoral brasileiro reconhece autoria de uma obra no

    momento da criao e no precisa do registro (LEI N 9.610, de

    19 de Fevereiro de 1998). Isto quer dizer que a criao

    reconhecida enquanto fixada em um meio como papel ou

    um computador. Uma obra pode ter mais de um@ autor@.

    Um@ autor@ considerad@ como a pessoa que contribui

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    com elementos fixos que podem ser utilizados de maneira

    independente.

    Pela maneira que a lei funciona, as pessoas procuram criar obras

    com a menor quantidade de coautor@s possveis. O trabalho

    colaborativo , portanto, contra-intuitivo em relao com as

    leis de propriedade intelectual, e precisam, a maioria das

    vezes, de licenas especiais para o seu sucesso.

    Licenas livresFalar de um tema to extenso como a propriedade intelectual

    precisaria, sem dvida, de um outro livro para discutir tudo.

    Porm, vale a pena mencionar algumas recomendaes que

    podem ser mencionadas para a preparao de um ambientecolaborativo cujas criaes podem ser livremente

    comunicadas.

    Reconhecer as atribuies dos participantes. Os direitos

    relacionados ao reconhecimento de sua colaborao para a

    cocriao podem se relacionar aos "direitos morais", que so

    direitos bsicos dos indivduos. importante reconhecer o

    trabalho feito por tod@s as pessoas da comunidade,

    especialmente aquelas que participam pouco, com a meta de

    estimular a participao da coletividade. Algumas boas

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    CO-C R I A O E CR I A-A T I V I D A D E

    prticas de atribuio so, por exemplo, gerar e compartilhar

    uma lista dos coautor@s da obra (isto quer dizer, aqueles que

    colaboraram substancialmente e de colaborador@s (as

    pessoas que participam junto aos autor@s na reviso ou

    edio). Tambm importante atribuir as ideias tomadas de

    outr@s autor@s e que foram usadas para a obra.

    Um@ artista no pode ser s artista, precisa ser [email protected]

    uma viso comunitria da criao, toda cria-atividade precisa

    que @s artistas trabalhem como uma equipe. importantetambm a comunicao dentro da comunidade durante a

    tomada de decises em conjunto, gerando documentao em

    toda etapa do processo. O trabalho feito dentro e fora da

    comunidade deve monitorar a criao de obras derivadas

    (extenses da obra, adaptaes, tradues, etc.), buscando

    agreg-las ao empreendimento.

    Desconstruir a expectativa de crditos. No caso dos projetos

    colaborativos, a meta destes o benefcio mesmo da

    comunidade em vez do benefcio direto para @s autor@s ou

    das organizaes que apoiam o projeto. Para garantir o

    interesse genuno por gerar valor a sociedade, muitos projetosde cocriao liberam o contedo para o pblico atravs de

    licenas abertas como, por exemplo, GNU/GPL, copyleft ou

    Creative Commons,para obras literrias ou criaes fsicas. Tais

    licenas garantem as liberdades para copiar, modificar ou

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    comercializar, assim como o direito de atribuio pelas ideias

    contribudas. @s colaborador@s e coautor@s devem sobrepor

    o desejo de criar valor para a comunidade sobre o desejo

    pessoal de ganhar dinheiro ou fama. Estes benefcios podem

    se manifestar posteriormente, mas no so o ponto de

    chegada.

    Quando a gente cria em grupo, o resultado do grupo. Um dos

    benefcios de utilizar licenas abertas, que os cocriadores

    que participam renunciam aos direitos de suas ideias embenefcio da coletividade, e em muitos casos, estas ideias

    podem ser utilizadas por outros como base para a criao de

    obras derivadas.

    Tipos de licenciamento.Para trabalhar em conjunto com outros

    necessrio produzir contedo que seja aberto para a

    comunidade. A melhor maneira de faz-lo atravs de

    licenas que que concedem direitos de uso para que os outr@s

    autor@s e outros usuri@s possam utilizar o contedo sem

    medo. recomendvel que os autor@s sejam advertidos

    previamente da licena da obra da criao. Utilizando uma

    obra textual como exemplo, duas alternativas para apublicao textual so:

    GNU/FDL: Free Documentation License. Limita os direitos dos

    criadores para que todo o contedo possa ser utilizado,

    copiado e modificado sem a possibilidade de reverter a licena

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    CO-C R I A O E CR I A-A T I V I D A D E

    da obra nem dos derivativos, garantindo que a obra fique no

    domnio pblico.

    Creative Commons: Esta uma licena mais flexvel, que permite

    aos criadores decidir as liberdades que quiserem para a suas

    obras, decidindo se os usurios podem compartilh-la, utiliz-

    la comercialmente ou criar derivativos.

    Licenas livres na Plataforma Corais

    A licena "Todos os direitos reservados" no possvel para um

    projeto na Plataforma Corais. Por que isso? A Plataforma

    Corais um servio gratuito e comunitrio. Quando algum

    utiliza esta plataforma, est automaticamente contribuindo

    para a comunidade com contedo licenciado via CreativeCommons. A prxima pessoa pode aprender com os projetos e,

    caso a licena permita obras derivadas, criar novos projetos

    baseados na ideia original. Projetos com direitos reservados

    no permitem esse tipo de interao. Se eles fossem

    permitidos, novos projetos iriam se valer da experincia dos

    projetos anteriores, sem no entanto dar qualquer retorno

    comunidade.

    Na Plataforma Corais, @ criador@ do projeto precisa escolher

    uma das seguintes licenas:

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    Atribuio

    Esta licena permite que outr@s distribuam, remixem, adaptem

    ou criem obras derivadas, mesmo que para uso com fins

    comerciais, contanto que seja dado crdito pela criao

    original.Compartilhamento pela mesma Licena

    Esta licena permite que outr@s remixem, adaptem e criem

    obras derivadas, ainda que para fins comerciais, contanto que

    o crdito seja atribudo ao autor e que essas obras sejam

    licenciadas sob os mesmos termos.

    Atribuio No a Obras Derivadas

    Esta licena permite a redistribuio e o uso para fins comerciais

    e no comerciais, contanto que a obra seja redistribuda sem

    modificaes e completa, e que os crditos sejam atribudos

    ao autor.

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    CO-C R I A O E CR I A-A T I V I D A D E

    Atribuio Uso No Comercial

    Esta licena permite que outr@s remixem, adaptem, e criem

    obras derivadas sobre a obra licenciada, sendo vedado o uso

    com fins comerciais.

    Atribuio Uso No Comercial Compartilhamento pela

    mesma Licena

    Esta licena permite que outr@s remixem, adaptem e criem

    obras derivadas sobre a obra original, desde que com fins no

    comerciais e contanto que atribuam crdito ao autor elicenciem as novas criaes sob os mesmos parmetros.

    Atribuio Uso No Comercial No a Obras Derivadas

    Permite apenas a cpia e a distribuio, sem modificaes e,

    claro, mencionando os crditos.

    Ferramentas para cocriao

    Para que a colaborao seja efetivada preciso no s se

    apropriar do discurso da receptivade para participar, mas

    tambm criar as condies necessrias para que todos osmembros do coletivo consigam de fato co-criar. A Plataforma

    Corais oferece vrias ferramentas para isso.

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    Comentrios

    Os comentrios disponveis em todas as pginas auxiliam

    bastante do ponto de vista da co-criao, pois l que as ideias

    so acrescentadas, alm de permitir contribuies mais

    deslocadas no tempo. Mesmo que a pessoa no esteja presentenuma reunio, pode opinar depois, desde que se registre tudo

    o que se passou nos dias que o usurio no esteve na reunio.

    Chat

    Para encontros informais, corriqueiros e eventuais ochatgeral do

    Corais est sempre disponvel para usurios logados. H uma

    sala pblica, uma sala de reunio e uma sala criada para alm

    de se poder conversar individualmente com as pessoas que

    esto online. Alm disso, existe uma ferramenta avanada de

    videoconferncia, disponibilizada apenas sob demanda.

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    CO-C R I A O E CR I A-A T I V I D A D E

    Texto colaborativo

    A Plataforma Corais dispe de algumas ferramentas que

    viabilizam processos de co-criao online ou offline. A

    ferramenta Texto Colaborativo uma das mais notveis, pois

    no apenas til para produzir materiais textuais

    assincronamente, ou seja, cada pessoa entrando em diferentes

    momentos, mas tambm pode ser utilizada em tempo real,

    por exemplo, como apoio para reunies. Os textos

    colaborativos contm uma sala de bate-papo prpria(separado do chat geral da plataforma). Pode-se fazer uma

    reunio online em que a pauta e o material a ser produzido

    estejam escritos no pad enquanto os participantes se

    articulam nochat. Vrios tipos de texto podem ser produzidos,

    tais como captulos de livros ou artigos cientficos, criao de

    roteiros, formulao de contratos, propostas para editais de

    cultura, e todo tipo de texto que possa se beneficiar de

    cocriao.

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    Galeria de imagens

    Quanto a imagem, pode-se fazer o upload massivo de imagens

    compactadas num arquivo ZIP na ferramenta galeria de

    imagens, disponibilizando juntamente seus arquivos abertos,

    que algum pode abrir e continuar expandindo a ideia.

    muito popular, por exemplo, o compartilhamento de imagens

    em formato PNG juntamente com os arquivos abertos em

    formato SVG, gerados pelo Inkscape, um editor de imagens

    vetoriais avanado.Desenho nos comentrios

    Antes de abrir um software e dispender tempo fazendo um

    desenho detalhado, talvez seja interessante definir melhor o

    conceito com a participao dos envolvidos. Ao invs de ficar

    s nos comentrios textuais, na Plataforma Corais possvel

    fazer comentrios em formato de desenho, um rabisco

    despretensioso que ilustra a ideia. Abaixo de cada desenho

    feito dessa forma tem umlinkpara "Continuar este desenho",

    ou seja, o cdigo replicado e a prxima pessoa pode

    continuar onde a outra pessoa terminou. Assim pode-se ir

    desenhando por vrias mos at que o conceito esteja definidoe possa ser implementado por uma mo mais habilidosa no

    Inkscapeou outrosoftwaregrfico.

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    Mapa mental

    Quando se deseja desenvolver uma ideia de forma estruturada, a

    ferramenta de mapa mental uma boa pedida. Ela permite

    colocar ideias em formato de rvore, com itens e subitens.

    Quando se abre um novo mapa mental, ele j aparece um item

    de exemplo. Para modificar seu contedo, basta clicar duas

    vezes em cima. Para acrescentar um subitem, basta clicar no

    boto + no lado direito do item. Os itens podem ser arrastados

    de um lado para o outro da rvore, mas no possvel deixaritens soltos, sem conexo com a rvore. Esta ferramenta no

    funciona em tempo real, portanto, se dois usurios a editarem

    ao mesmo tempo, conflitos de contedo podem ocorrer. Para

    resolver isso, uma possibilidade os participantes

    combinarem previamente em dado espao - que pode ser o

    dos comentrios e, a cada nova ao de edio, o editor

    registar primeiro, avisando aos demais. Lembre-se de salvar

    depois de fazer o mapa, pois no automtico.

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    CO-C R I A O E CR I A-A T I V I D A D E

    Sugestes

    Uma maneira relaxada de comear um processo de cocriao

    habilitar a ferramenta de cocriao e avisar todo mundo via

    blog que ela est disponvel. Os participantes podem

    apresentar suas ideias como sugesto e os demais podem

    votar "jia" (mo pra cima) ou "no gostei" (mo pra baixo).

    Essa votao rpida usada para criar umrankingde ideias,

    auxiliando na definio de prioridades do grupo. Tambm

    possvel (e recomendvel) enviar comentrios nas sugestespara dar prosseguimento ideia.

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    Aprender fazendo, fazer aprendendo

    Conhecimento a base da economia criativa. Porm, qual tipo de

    conhecimento importante para a economia criativa?

    Existem vrios tipos conhecimento, como o cientfico, filosfico,

    terico, prtico, acadmico, ancestral, cultural, do senso

    comum, que podem ser acumulados e armazenados na

    memria das pessoas, nos objetos que criam e usam, assim

    como em suas prticas e histrias.O conhecimento cientfico, por exemplo, o mais sistematizado.

    complexo, abrangente e as pessoas em geral mantm certo

    distanciamento nos usos prticos. Isso pode ser um empecilho

    para a cocriao se o conhecimento cientfico for o nico a ser

    vlido e priorizado pelo grupo, em detrimento de outros.

    Quem supostamente detm mais leituras e tem acesso as

    informaes cientficas acabaria exercendo a autoridade no

    assunto, favorecendo uma hierarquia nas relaes, que

    colocaria esta pessoa acima d@s demais.

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    CO R A L I Z A N D O: U M G U I A D E C O L A B O R A O P A R A A E C O N O M I A C R I A T I V A

    Se queremos incentivar a colaborao, em diversas formas, de

    modo que tod@s possam se perceber como protagonistas,

    importantes e nic@s no processo, independente dos seus

    tipos de saberes, a prioridade estabelecer o dilogo atravs

    de debates, negociao de ideias e sentidos.

    A diversidade de experincias trocadas no dilogo nos leva a

    perceber que no existe um conhecimento melhor do que o

    outro. Existem conhecimentos diferentes e todos os

    conhecimentos podem ser vlidos. Seu valor depender docontexto histrico-cultural e dos objetivos de uso feitos pelas

    pessoas e grupos.

    Na economia criativa, o valor do conhecimento possui uma

    dinmica diferente, pois nesta, a gerao de valor acontece

    quando o conhecimento criado e aplicado. So dois lados da

    mesma moeda: simultaneamente, o conhecimento criado

    enquanto aplicado, e vice-e-versa. O valor do que se conhece,

    seja qual for o tipo de conhecimento, est em poder aprende-

    lo e compartilh-lo. Sendo assim, a ensinagem e o

    aprendizado so as formas como a economia criativa gera

    valor a partir de um conhecimento que j tem, visando acoconstruo de novos conhecimentos.

    Esse processo extramente difcil de ser gestado em contextos

    tradicionais de educao formal, como nas escolas e nas

    universidades. As instituies educacionais, com suas

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    disciplinas, tempos, contedos, regramentos e avaliaes

    medidoras, vem perdendo sua funo ou utilidade, na

    formao e desenvolvimento integral dos aprendizes neste

    mundo novo que emerge. As escolas que persistem no modelo

    instrucional fabril caminham para a obsolncia. As

    instituies educativas foram criadas para formar

    profissionais para uma economia de produo em massa, na

    qual o trabalhador se concentrava em executar apenas uma

    parte nfima do processo, alienando-se do todo.O modelo industrial foi aplicado nas escolas para condicionar @s

    aprendizes a concentrar-se apenas em passar de ano ou em

    prova de vestibular, como se no tivessem outro papel. Nesse

    contexto, aprendizes so peas de engrenagem, sem

    identidade. O conhecimento introjetado em forma de

    perguntas e respostas com mltiplas alternativas, dadas

    previamente, nas quais no o h sequer um mnimo de

    expresso do que foi apreendido.

    O fortalecimento da economia criativa requer a reinveno da

    educao, abrindo novos horizontes aos futuros profissionais,

    para que estes no apenas armazenem o conhecimento mas,principalmente, o criem.

    Embora esta seja uma causa nobre, no h porque esperar pelo

    dia em que as instituies educacionais percebam que

    precisam mudar para fortalecer o aprendizado na economia

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    criativa. Apesar de existirem esforos - por parte de algumas

    gestes escolares, para atualizar a escola com novas

    tecnologias ex.: (projetores multimdia, salas de informtica,

    lousas interativas, tabletes, netbooks, notebooks para

    professor@s e aprendizes), @s discentes no veem como

    utilizar estes recursos como finalidade educacional, o corpo

    docente no atualizadopara prticas educativas que faam

    uso destes recursos, e tampouco o conhecimento destes

    aproveitado para a atualizao.Mesmo que os currculos escolares mudem, que recursos

    tecnolgicos sejam implantados e que professor@s

    compreendam e comecem a considerar a importncia da

    criatividade, isso no garante necessariamente que as

    pessoas, os aprendizes se tornem mais criativos. A mesma

    crtica de Paulo Freire educao bancria se aplica a

    introduo dessas novas tecnologia: pode entrar por um

    ouvido e sair pelo outro, como muitos contedos despejados

    em cima d@s aprendizes pensados como um final: uma prova

    e uma nota, aprovao e reprovao.

    O modelo tradicional de escola j no atende as demandas deaprendizados, a comear pela designao d@ discente, como

    alun@. Essa designao costuma ser entendida como uma

    posio hierrquica, de professor@s como iluminados pelo

    saber, e alun@s como aqueles que no tem luz, que no tem

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    conhecimento. O objetivo dessa estrutura transmitir o

    conhecimento ausente, sem levar em conta o que @s

    aprendizes j sabem.

    Esse conhecimento tem relaes muito distantes com a realidade

    local dessas pessoas, pois seguem currculos nacionais e

    globais de educao. Para garantir que tal conhecimento seja

    transmitido, toda uma estrutura hierrquica e opressora

    montada, transformando as pessoas em alun@s que precisam

    aprender, nem que seja "na marra". No de estranhar que,neste contexto, os processos de colaborao sejam escassos

    ou, pior, enrustidos, e que a escola seja um local

    desinteressante para a maioria das pessoas.

    Com o objetivo de manter a relevncia da escola na sociedade

    atual, iniciativas de colaborao ampliam a carga de

    trabalhos em grupo, projetos instrucionais com pontos de

    chegada previamente delimitados pelos docentes e

    seminrios, que muitas vezes so apenas cpias

    superficiais de contedos encontrados na internet, realizados

    apenas para simular a colaborao.

    O que acontece que @ professor@ no instiga, no explicacomo trabalhar em grupo, no d suporte, no participa dos

    grupos e no avalia e incentiva a colaborao. Isso fica

    evidente em divergncias e conflitos de ideias, interesses, etc.,

    em atividades grupais, quando @ professor@ decide, se

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    valendo da autoridade. Assim perde-se a oportunidade de

    instigar resolues horizontais, pela coletividade, o que

    fortalece sentimentos de pertena e corresponsabilidade,

    sentimentos potencializadores da colaborao. Toma apenas o

    resultado final do trabalho em grupo como evidncia,

    desconsiderando o processo que pode ser to ou mais

    importante que o produto.

    claro que, ao invs de colaborar, muit@s aprendizes se

    organizam apenas para entregar o resultado final com omnimo de esforo, j que a motivao no vem del@s

    prpri@s. O trabalho fragmentado em partes que depois

    precisam ser juntadas por uma pessoa mais responsvel que

    as outras, que eventualmente perder toda sua boa vontade no

    trabalho colaborativo. Resumindo: alguns aprendem algumas

    partes e um escolhido, que redige um trabalho escrito, tem

    cincia do contexto geral do trabalho entregue.

    Colaborar algo que precisa ser aprendido, mas no possvel

    ensinar a colaborao da maneira tradicional. A colaborao

    tambm precisa ser criada por quem colabora. S possvel

    compreender a colaborao, colaborando.

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    Desafios para a educao contempornea

    Passamos por profundas transformaes societrias, sendo

    impactados fortemente pela cibercultura, a cultura das

    tecnologias digitais presentes no entorno e que, na maioria

    das escolas brasileiras, so subutilizadas pedagogicamente.

    Ainda que inmeras escolas permaneam autoexcludas da

    cultura digital, aprendizes tornam-se interagentes ativos dos

    novos meios de comunicao e tem acesso s informaes,

    antes vindas d@ professor@, que era a figura central do

    processo de ensino e aprendizagem na sociedade de produo

    industrial.

    Na sociedade da informao, vrios questionamentos solevantados. Ser que as escolas podem ser espaos

    democrticos, participativos, colaborativos e

    autogestionados? A escola precisa ser capaz de mediar a

    coconstruo de saberes complexos, teis ao mundo da vida.

    E, para isso, a formao cidad precisa empreender aes e

    criar propostas educativas contextualizadas, significativas,

    instigantes, desafiadoras, interativas, participativas,

    colaborativas, solidrias e coautorais. Desta maneira, pode ser

    criado um ambiente favorecedor de coaprendizagens

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    libertrias e emancipatrias que enriquecem o conhecimento

    coletivo.

    Estas novas prticas requerem novos modos de ensinagem, com

    novas competncias multirreferenciais. @s professor@s

    precisam ser parceir@s de aprendizagens, coaprendizes

    ainda que com mais leituras e conhecimentos. Torna-se

    obsoleto o modelo de formao bancrio e centralizado na

    figura d@ professor@ como detentor do saber, sem ritmo

    para acompanhar novas vivncias e experincias. @sprofessor@s precisam se perceber e se colocar como

    coaprendentes, pois carecem de letramento miditico e

    informacional em maior ou menor escala, bem como da

    reviso das teorias educacionais que sustentam sua prtica,

    para serem mais capazes de mediar a apropriao crtica das

    informaes, transformando as teis, relevantes, em

    conhecimentos.

    Para a escola instigar o pensamento reflexivo, instrumentalizar

    @s aprendizes para o dilogo, para a negociao, e para as

    tomadas de deciso, @ professor@ precisa trabalhar com

    projetos colaborativos, em torno de problemas reais, emlaboratrios vivos, favorecendo que todos aprendam fazendo

    & faam aprendendo.

    Neste novo mundo, tentar prever os saberes necessrios para

    atuar em profisses ainda no inventadas incuo, da a

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    necessidade de uma educao que favorea o

    desenvolvimento de habilidades e competncias voltadas aos 4

    pilares da Educao de Jacques Delors, a saber: o aprender a

    aprender, o aprender a fazer, o aprender a ser e o aprender a

    conviver.

    Mesmo que a escola no oferea uma educao libertria, ou

    menos hierrquica, ou apenas voltada para o vestibular, @s

    professor@s precisam romper com estas lgicas, intervindo e

    hackeandoo seu espao primeiro, a sala de aula e ainda, iremalm, ultrapassando os muros da escola para as ruas, o

    mundo. por isso que @ professor@ deve ser uma figura que

    conecta @ aprendiz ao borboto de informaes da sociedade

    atual, ajudando-@s a absorver, filtrar e transformar as

    informaes em conhecimentos para a vida. @ profess@r

    passa a mediar o pensamento crtico, criativo e colaborativo,

    em meio as informaes e as experincias d@s aprendizes,

    articulando e contextualizando a sala de aula com o mundo da

    vida.

    Repensar o aprendizadoComo vimos, aprendizado no depende de educao formal.

    Existem vrias formas de aprender alm da escola, atravs das

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    tradies familiares, sociais, culturais, religiosas,

    profissionais, etc. Essas formas de aprendizado podem

    implicar tambm algum tipo de educao, mais ou menos

    estruturada, porm, seu objetivo no transmitir um

    conhecimento e sim integrar a pessoa numa prtica, a prtica

    tradicionalizada. Muitas vezes a escola descarta

    completamente este tipo de aprendizado, solapando ricas

    experincias.

    Na resoluo de problemas do cotidiano e nos empreendimentoscriativos, so necessrios vrios tipos de conhecimento que

    uma pessoa s no pode dar conta. preciso ter um corpo

    multidisciplinar composto por pessoas engajadas,

    colaborativas e assim dispostas a compartilhar e aprender

    com @s colegas de trabalho.

    As tecnologias da informao e da comunicao permitem que as

    pessoas se conectem com outras, prximas e distantes,

    compartilhando interesses de aprendizado. As comunidades

    virtuais representam um tipo diferente de aprendizado, em

    rede. Apesar de ser possvel compartilhar o conhecimento

    atravs da troca de informaes nestas comunidades, aestrutura em geral no leva em conta a constituio total da

    pessoa, tudo o que ela . Focam apenas em alguns de seus

    interesses ou aspectos.

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    preciso reinventar a educao com cuidado para no cair na

    armadilha de se criar um ambiente supostamente inovador,

    com tecnologias da informao e comunicao, mas que

    preserve a mesma essncia da escola formal, com todos os

    aspectos deficitrios j discutidos. Um modelo eficiente deve

    buscar enfatizar a distribuio do conhecimento, conectando

    pessoas para que elas troquem conhecimentos que j saibam,

    formando uma rede de troca de experincias, vivncias e

    saberes.Enfim, a educao precisa experienciar novos modelos,

    convergentes com a filosofia de abertura, a aprendizagem

    colaborativa, a cultura do remix, do beta perptuo, da

    cibercultura. O aprendizado em