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Corpo e corporeidade negra na Educação Física escolar: possibilidades e novas tensões a partir da lei 10.639/03 Bruno Henrique de Paula 1 Trata-se de uma pesquisa mestrado em andamento. Nela busco refletir sobre a prática pedagógica de professores de Educação Física egressos dos cursos de formação continuada em educação para as relações raciais promovidos pela Prefeitura Municipal de Serra/ES. O principal objetivo dessa investigação é analisar se tais professores têm suas práticas ressignificadas após a realização do curso e, de forma específica, propõem articulações com analises dos processos de construção social do corpo e corporeidades. Dessa forma, é possível apontar lacunas e avanços existentes tanto na formação inicial e continuada desses professores no campo das relações raciais. Sua relevância se dá pela necessidade da constante reflexão sobre a prática docente, bem como de discutir pedagogias antirracistas e emancipatórias. Apesar da emergência de estudos que analisam as relações étnico-raciais e educação ainda há muito que se fazer, principalmente quando se trata da Educação Física escolar. Ao buscar compreender como o conceito de raça é operado, tanto como elemento de estratificação social e dominação de grupos definidos como inferiores, quanto demarcador de leituras/ações críticas e politizadas das relações sociais e raciais no contexto brasileiro, estaremos ampliando as possibilidades de análise acerca de sua inserção no campo político, pedagógico e epistemológico da formação docente. Palavras-Chave: formação, educação física, corporeidade, corpo negro. 1 – Introdução Na pesquisa em fase inicial, buscamos compreender se professores e professoras de Educação Física da educação básica têm suas práticas ressignificadas 2 após a realização dos cursos de formação continuada em atenção aos pressupostos da lei 10.639/03 e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais. Pensando no campo específico da disciplina, as análises serão concentradas nas concepções que tais docentes participantes da pesquisa têm acerca dos conceitos de corpo e corporeidade e como estão articulados aos propósitos de uma educação antirracista e amancipatória. Definimos como participantes da pesquisa docentes da rede municipal de ensino de Serra/ES egressos das formações ofertadas pela Secretaria Municipal de Educação 3 . Com vistas à construção de uma sociedade mais justa e igualitária pretende-se aqui reforçar o entendimento de que a escola é um dos espaços privilegiados para a desconstrução daqueles estereótipos historicamente construídos, para a revalorização 1 Mestrando no Programa de Pós-graduação em Educação: Conhecimento e Inclusão Social da Universidade Federal de Minas Gerais (PPGE/FaE/UFMG). 2 Nesse estudo a ressignificação da prática docente é entendida como o processo de mobilização de um conjunto de saberes que pressupõe a revisão crítica e reflexiva tanto da prática pedagógica quanto das bases teórico-epistemológicas que a fundamentam. 3 Desde 2010 a Subsecretaria Pedagógica do município, por meio da Coordenação de Estudos Étnico- raciais e Diversidade, oferece a docentes cursos de formação continuada sobre educação para as relações raciais. No ano de 2018 realizou o curso intitulado “Educação, Relações Étnico-raciais e Diversidade: diálogos necessários”, tendo como público-alvo docentes, pedagogos, coordenadores e diretores concursados ou com contrato temporário. São 50 vagas divididas em duas turmas cujas aulas são realizadas em espaços e horários diferentes. Uma com encontros as quartas e quintas-feiras, das 18h às 22h e outra aos sábados, das 8h às 17h. Ambas as unidades estão situadas no perímetro urbano, sendo a distância entre uma e outra unidade de aproximadamente 17 quilômetros.

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Corpo e corporeidade negra na Educação Física escolar: possibilidades e novas tensões a partir da lei 10.639/03

Bruno Henrique de Paula1 Trata-se de uma pesquisa mestrado em andamento. Nela busco refletir sobre a prática pedagógica de professores de Educação Física egressos dos cursos de formação continuada em educação para as relações raciais promovidos pela Prefeitura Municipal de Serra/ES. O principal objetivo dessa investigação é analisar se tais professores têm suas práticas ressignificadas após a realização do curso e, de forma específica, propõem articulações com analises dos processos de construção social do corpo e corporeidades. Dessa forma, é possível apontar lacunas e avanços existentes tanto na formação inicial e continuada desses professores no campo das relações raciais. Sua relevância se dá pela necessidade da constante reflexão sobre a prática docente, bem como de discutir pedagogias antirracistas e emancipatórias. Apesar da emergência de estudos que analisam as relações étnico-raciais e educação ainda há muito que se fazer, principalmente quando se trata da Educação Física escolar. Ao buscar compreender como o conceito de raça é operado, tanto como elemento de estratificação social e dominação de grupos definidos como inferiores, quanto demarcador de leituras/ações críticas e politizadas das relações sociais e raciais no contexto brasileiro, estaremos ampliando as possibilidades de análise acerca de sua inserção no campo político, pedagógico e epistemológico da formação docente.

Palavras-Chave: formação, educação física, corporeidade, corpo negro.

1 – Introdução

Na pesquisa em fase inicial, buscamos compreender se professores e professoras de Educação Física da educação básica têm suas práticas ressignificadas2 após a realização dos cursos de formação continuada em atenção aos pressupostos da lei 10.639/03 e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais. Pensando no campo específico da disciplina, as análises serão concentradas nas concepções que tais docentes participantes da pesquisa têm acerca dos conceitos de corpo e corporeidade e como estão articulados aos propósitos de uma educação antirracista e amancipatória. Definimos como participantes da pesquisa docentes da rede municipal de ensino de Serra/ES egressos das formações ofertadas pela Secretaria Municipal de Educação3.

Com vistas à construção de uma sociedade mais justa e igualitária pretende-se aqui reforçar o entendimento de que a escola é um dos espaços privilegiados para a desconstrução daqueles estereótipos historicamente construídos, para a revalorização

1 Mestrando no Programa de Pós-graduação em Educação: Conhecimento e Inclusão Social da Universidade Federal de Minas Gerais (PPGE/FaE/UFMG). 2 Nesse estudo a ressignificação da prática docente é entendida como o processo de mobilização de um conjunto de saberes que pressupõe a revisão crítica e reflexiva tanto da prática pedagógica quanto das bases teórico-epistemológicas que a fundamentam. 3 Desde 2010 a Subsecretaria Pedagógica do município, por meio da Coordenação de Estudos Étnico-raciais e Diversidade, oferece a docentes cursos de formação continuada sobre educação para as relações raciais. No ano de 2018 realizou o curso intitulado “Educação, Relações Étnico-raciais e Diversidade: diálogos necessários”, tendo como público-alvo docentes, pedagogos, coordenadores e diretores concursados ou com contrato temporário. São 50 vagas divididas em duas turmas cujas aulas são realizadas em espaços e horários diferentes. Uma com encontros as quartas e quintas-feiras, das 18h às 22h e outra aos sábados, das 8h às 17h. Ambas as unidades estão situadas no perímetro urbano, sendo a distância entre uma e outra unidade de aproximadamente 17 quilômetros.

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da cultura afro-brasileira, efetividade de uma educação antirracista e para que o docente tenha papel central nesse processo. O presente estudo é, antes de tudo, uma ação política no sentido de trazer contribuições não somente ao campo da Educação Física, mas também aos processos de implementação4 da lei 10.639/03, suas diretrizes e, consequentemente, construção de uma sociedade mais justa e democrática. Pensar a respeito das relações étnico-raciais é trazer à tona aspectos extremamente complexos que estão associadas às relações de poder político, econômico e cultural.

Apesar dos avanços legais, ainda há muito que se fazer para a efetivação dos estudos sobre formação docente continuada, aqui mais precisamente no que tange à história e cultura africana, afro-brasileira e indígena. Nossa investigação poderá apresentar lacunas existentes na formação inicial e continuada dos professores e professoras da disciplina Educação Física que atuam na educação básica e, também, avanços a partir da mobilização de saberes e práticas ressignificadas nas experiências de docentes egressos dos cursos realizados pela rede municipal de ensino de Serra/ES. Dessa forma, buscamos contribuir com o debate sobre o papel da escola e, especificamente, da Educação Física quanto ao reconhecimento e valorização das identidades, história e cultura afro-brasileira e promoção de uma educação antirracista.

No que se refere aos aspectos metodológicos, para alcançar os objetivos elencados anteriormente optamos pela realização de uma pesquisa qualitativa com a pretensão de compreender determinado fenômeno em profundidade, como destaca Marli André (2013).

As abordagens qualitativas de pesquisa se fundamentam numa perspectiva que concebe o conhecimento como um processo socialmente construído pelos sujeitos nas suas interações cotidianas, enquanto atuam na realidade, transformando-a e sendo por ela transformados. Assim, o mundo do sujeito, os significados que atribui às suas experiências cotidianas, sua linguagem, suas produções culturais e suas formas de interações sociais constituem os núcleos centrais de preocupação dos pesquisadores (ANDRÉ, 2013, p. 97).

2 – Justificativa e revisão de literatura

A educação e relações raciais tem se mostrado um campo bastante fértil e maduro de produção acadêmica na pós-graduação. Estudos que elaboram o estado da arte no que tange a literatura especializada nas temáticas de currículo (REGIS; BASÍLIO, 2018), prática pedagógica (SILVA et al, 2018) e formação de professores (COELHO, 2018) nos dão o panorama dos temas recorrentes e emergentes em dissertações, teses e artigos elaborados entre os anos de 2003 e 2014.

Ao traçar o perfil das teses, dissertações, artigos, bem como de quem as produziu, como e quando, a professora Wilma de Nazaré Baía Coelho (2018) identifica que se tratam, majoritariamente, de pesquisadoras que desenvolveram seus estudos na região sudeste, tendo como sujeitos da pesquisa docentes e discentes da educação básica ou superior. Os percursos formativos na formação inicial e continuada são

4 Trata-se do processo posterior ao de implantação, que consiste em apresentar determinada de política pública e seus dispositivos legais à sociedade e coloca-la em discussão. Já a implementação se refere à construção de possibilidades para a execução e efetivação da referida legislação (GOMES, 2012a).

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recorrentes e emergentes nas discussões. Dessa forma, a autora destaca importantes recomendações feitas pelas investigadoras que confluem, especialmente, nas incorporações advindas da inserção nas experiências de formação continuada no que tange às práticas, às identidades e subjetividades, na superação dos silenciamento e na formulação de novas referência no que tange à temática (COELHO, 2018, p. 110-111). A seguir, apresentaremos algumas das teses e dissertações elencadas pelo estado da arte que concentram suas atenções na formação docente.

A tese elaborada por Benjamin Xavier de Paula (2013) buscou analisar os impactos da formação docente continuada no tocante à educação para as relações raciais nas práticas e saberes dos sujeitos da pesquisa realizada em Uberlândia, Minas Gerais. Foi possível concluir que os cursos de fato possibilitaram ressignificações e reflexões, entretanto, observou-se a necessidade de ampliar tais formações a todo o corpo docente e à gestão, aliado ao compromisso das instituições públicas com as políticas antirracistas. Entre os entrevistados não havia profissionais da Educação Física.

A dissertação de Maria Fernanda Luiz (2013) também se propõe a compreender possíveis mudanças nas práticas pedagógicas de docentes que concluíram cursos de formação referentes à educação para as relações raciais no município de Araraquara, São Paulo. Diferente de Paula (2013), o estudo indica que os cursos realizados pelas docentes participantes da pesquisa são importantes mecanismos para se pensar uma educação que contemple os anseios da lei 10.639/03 e das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais. Também os consideram essenciais para a mobilização de novos saberes e práticas, colocando em diálogo professores e professoras comprometidas com as discussões acerca da temática. Contudo, tem se mostrado insuficientes na implementação da lei, assim como a superação do racismo até mesmo no contexto escolar. O estudo aponta, inclusive, como o descompromisso de profissionais e da própria gestão podem ser impeditivos. Uma professora de Educação Física foi entrevistada, contudo, sua prática está articulada com o ensino de jogos e brincadeiras sem se aprofundar em aspectos relacionados ao corpo, corporeidade e o racismo em si.

Ao consultarmos o banco de dados da Biblioteca Digital Brasileira de Dissertações e Teses (BDTD) no mês de agosto de 2017, com o descritor “Lei 10.639”, encontramos 221 dissertações e 58 teses elaboradas desde 2005, estudos que buscam analisar, a partir da lei, a relação entra relações étnico-raciais e educação. No mesmo sítio, agora com relação à Educação Física, utilizando os descritores “Educação Física cultura afro-brasileira” e “Educação Física lei 10.639”, o número de estudos ainda é pequeno, limitando-se a dez trabalhos, sendo oito dissertações e duas teses.

Dentre os estudos mencionados acima, podemos destacar alguns deles. Nosso estudo se aproxima da dissertação de mestrado de Gabriela Nobre Bins (2014), que buscou compreender, entre outros aspectos, de que forma professores e professoras de Educação Física são afetados pelas políticas públicas para educação das relações raciais em seus percursos pessoais e profissionais, o que os professores ensinam nas suas aulas e o que orienta as práticas. A autora acompanhou durante seis meses as

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aulas de um professor da rede municipal de ensino de Porto Alegre/RS e pôde constatar que o trabalho a partir de valores civilizatórios das culturas africanas, tais como a filosofia Ubuntu, a roda, musicalidade, oralidade e ancestralidade, guiavam as abordagens acerca do corpo e corporeidade no bojo das relações raciais. Para o professor participante da pesquisa, não se trata a história e cultura afro-brasileira e africana apenas como conteúdos, mas também como metodologias de ensino, uma visão de mundo (BINS, 2017, p. 99).

Outra pesquisa relevante é a dissertação de Marzo Vargas dos Santos (2007), que se propõe a identificar e compreender como estudantes negros da rede municipal de ensino de Porto Alegre (RS) se constituem nas interações sociais e como essas construções se manifestam na cultura estudantil e na educação física escolar (SANTOS, 2007, p. 14). O estudo apontou que a marginalização e ocultamento das discussões acerca das relações étnico-raciais, do ensino da história e cultura afro-brasileira e africana tem fomentado atitudes racistas nas escolas e, inclusive, sentimento de naturalização da invisibilidade pelo próprio discente negro.

Vale mencionar a dissertação de Joice Vigil Lopes Pires (2013), estudo que tratou de analisar o trabalho pedagógico dos professores de Educação Física da rede municipal de ensino em Bagé (RS) no tocante da lei 10.639/03. Constatou-se que os docentes participantes do estudo ainda possuem uma concepção limitada acerca da disciplina, vista pelo prisma da hegemonia dos esportes competitivos, logo, acabam sendo desconsiderados tantos outros elementos que compõem o vasto repertório da cultura corporal, inclusive aqueles ligados a cultura afro-brasileira e africana. Além daqueles professores que desconhecem a lei, há os que consideraram a capoeira como única referência da cultura afro-brasileira e, o mais preocupante, os que acreditam que as questões étnico-raciais devem ser abordadas em projetos a serem executados em datas específicas, como treze de maio e a semana da consciência negra. Isso mostra, segundo a autora, “muito além da falta de conhecimento da lei, mas também de um apoio teórico, ideológico e político” (PIRES, 2013, p. 82).

Por fim, vale mencionar as contribuições da pesquisa coordenada por Nilma Lino Gomes (2012a) intitulada “Práticas pedagógicas de trabalho com relações étnico-raciais na escola na perspectiva da Lei nº 10.639/03”, que buscou realizar um panorama nacional dos seus processos de implementação junto às secretarias estaduais, municipais e Núcleos de Estudos Afro-brasileiros, bem como a análise de práticas realizadas em 36 escolas de cinco regiões do Brasil. Dentre outras constatações, o estudo deixa claro que não há uniformidade nos processos de implementação da lei e que o grau de enraizamento e sustentabilidade5 das práticas envolve o comprometimento do corpo docente, da gestão, bem como dos processos de formação continuada e oferta de condições necessárias para a realização das propostas.

5 Os conceitos de enraizamento e sustentabilidade são compreendidos nesse estudo como possibilidade de o trabalho com a educação das relações étnico-raciais desenvolvido na instituição escolar se tornar parte do cotidiano, do currículo e do PPP, dos projetos interdisciplinares, independentemente da ação de um(a) professor(a) ou de uma gestão específica. A formação docente continuada também é considerada nesse escopo (GOMES, 2012a).

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Apesar da emergência de estudos que analisam as relações étnico-raciais e educação, especialmente aqueles que se referem à formação continuada de professores e professoras, ainda há muito que se fazer em relação à disciplina Educação Física, por isso buscamos compreender as formas com que a Lei 10.639/03 e suas diretrizes são recebidas no contexto escolar, os processos de mobilização de novos saberes e experiências que florescem nas práticas após a realização dos cursos de formação continuada e até que ponto, de forma secundária, mas não menos importante, podem estar diretamente ligadas à implementação, sustentabilidade e enraizamento das práticas.

3 – Perspectivas teóricas

Nos tópicos seguintes, procuramos estabelecer articulações entre conceitos que tomamos como importantes pontos de partida para ampliar as reflexões acerca da noção de corpos reais (ARROYO, 2016). De que corpo e corporeidade está se falando? Trata-se de algo universal? Se sim, como ficam aqueles que fogem a norma? Como a formação docente, inicial e continuada, trata ou poderia tratar tais problematizações?

Os corpos reais a que Miguel Arroyo (2016) se refere são aqueles marginalizados e invisibilizados numa perspectiva curricular e precarizados pelas violências simbólicas tem sua humanidade esfacelada e negada. Os corpos reais são aqueles “que chegam das periferias, dos campos, das florestas, dos territórios indígenas, quilombolas... às escolas” (ARROYO, 2016, p. 23) dotados de saberes, culturas, conhecimentos, identidades, valores e não-cartesianos que, inclusive, corporalmente resistem e lutam.

A colonialidade do ser e do saber em Anibal Quijano (2005) nos aponta para uma leitura crítica das relações dispares de poder tendo o conceito de raça como um dos elementos centrais para a classificação e dominação dos indivíduos, processo que emerge historicamente nos processos coloniais das Américas, no qual se insere o Brasil. Já Nilma Lino Gomes (2012b, 2017) retrata como o Movimento Negro ressignifica a ideia de raça e reeduca Estado e sociedade a partir das tensionando relações sociais, bem como as estruturas que corroboram com a manutenção do status-quo classista, racista, machista e patriarcal.

Ao buscar compreender como o conceito de raça é operado, tanto como elemento de estratificação social e dominação de grupos definidos como inferiores, quanto demarcador de leituras/ações críticas e politizadas das relações sociais e raciais no contexto brasileiro, estaremos ampliando as possibilidades de análise acerca de sua inserção no campo político, pedagógico e epistemológico da formação docente inicial e continuada.

O corpo e o não corpo

Para falarmos de corpo, inicialmente, há necessidade de analisarmos o conceito de raça, pois, podemos afirmar que seu uso está amplamente ligado a aspectos de cunho político-ideológico, tendo seu caráter biológico, ou seja, aquele ligado às características físicas e orgânicas do ser humano alicerce para o que chamamos de

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racialização ampliando ainda mais as bases que fundamentam uma estrutura social de dominação e manutenção das relações de poder. Kabengele Munanga (2004, p.19-22) afirma que foi eleita uma série de características, sobretudo as físicas, para classificar e hierarquizar os sujeitos. Deu-se uma roupa biológica para aquilo que é estritamente político. Tais iniciativas extrapolaram o campo científico e legitimaram discursos ideológicos.

Se os naturalistas dos séculos XVIII-XIX tivessem limitado seus trabalhos somente à classificação dos grupos humanos em função das características físicas, eles não teriam certamente causado nenhum problema à humanidade. Suas classificações teriam sido mantidas ou rejeitadas como sempre aconteceu na história do conhecimento científico. Infelizmente, desde o início, eles se deram o direito de hierarquizar, isto é, de estabelecer uma escala de valores entre as chamadas raças. [...] assim, os indivíduos da raça “branca”, foram decretados coletivamente superiores aos da raça “negra” e “amarela” (MUNANGA, 2004. p. 21).

Ao tratar a raça enquanto categoria mental da modernidade, Anibal Quijano (1992 apud RAMALHO; LEITE; MENDONÇA, 2017, p. 5) afirma que as relações de dominação são mantidas dentro do espectro imaginário em detrimento do colonialismo político. Em outras palavras, a colonialidade se expressa nas formas de perceber e existir no mundo. Tal paradigma, alicerçado numa perspectiva eurocentrada e universalizante, reprime qualquer tipo de representação expressa em símbolos, ideias e conhecimentos a margem dos padrões colonizadores e que colocasse em xeque essa relação hierarquizada de poder. Nesse sentido, no contexto específico da América e mesmo em escala global, “raça e identidade racial foram estabelecidos como instrumentos de classificação social básica da população” (QUIJANO, 2005, p. 107), uma vez que povos dominados e conquistados foram tratados como inferiores. Encontrando refúgio nas subjetividades esse sistema de dominação é naturalizado e opera por si só retroalimentando-se nas próprias relações sociais. A própria noção de humanidade fica atrelada às referencias colonialistas do ser e do poder. É a partir do corpo e da corporeidade que tais marcadores são expressos de forma evidente.

Fazendo paralelo com a noção de experiência humana alicerçada nas relações da colonialidade, Anibal Quijano (2005) trata do “corpo” e o “não-corpo”, resgatando o dualismo razão/alma e corpo/natureza em Descartes, a primeira tida como dotada de racionalidade, a segunda entendida apenas como objeto. Esse corpo dominado ou conquistado, não branco e desprovido de humanidade é, portanto, apenas um corpo e sua significância se dá via exploração da sua força de trabalho ou busca pela assimilação da razão eurocêntrica.

[...] certas raças são condenadas como inferiores por não serem sujeitos “racionais”. São objetos de estudo, “corpo” em consequência, mais próximos da “natureza”. Em certo sentido, isto os converte em domináveis e exploráveis. De acordo com o mito do estado de natureza e da cadeia do processo civilizatório que culmina na civilização europeia, algumas raças – negros (ou africanos), índios, oliváceos, amarelos (ou asiáticos) e nessa sequência – estão mais próximas da “natureza” que os brancos (QUIJANO, 2005, p. 118).

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Corpos, corporeidades reais e educação antirracista

Ao resgatarmos a noção de raça enquanto elemento fundamental do processo de dominação e classificação dos grupos sociais podemos avançar no sentido de compreendermos quais seriam esses corpos reais, resistentes, produtores de culturas, bem como reafirmar as contribuições do Movimento Negro Brasileiro enquanto ator político na ressignificação e politização a raça dentro do processo de emancipação e afirmação da identidade racial.

Como bem destaca Nilma Lino Gomes (2017, p. 21), “o Movimento Negro ressignifica e politiza afirmativamente a ideia de raça, entendendo-a como potência de emancipação”. Tendo o conceito de raça enquanto construção social e categoria de análise, é explicitado como as relações de poder historicamente construídas são manipuladas pelo racismo. Ao indagar e tencionar estereótipos negativos e subalternizados cristalizados a respeito do negro, da cultura afro-brasileira e africana, bem como de sua história, são apresentadas à população negra brasileira perspectivas emancipatórias para a construção de sua própria identidade racial intensificando ainda mais as ações político-emancipatórias para a efetivação de uma educação e sociedade antirracista. Ao ressignificar a raça, o Movimento Negro e a população negra em movimento também ressignificam o corpo negro e esse processo produz saberes, os quais podemos chamá-los de estético-corpóreos (GOMES, 2017), causando reverberações na construção da identidade, bem como na politização de negros e negras.

A estética emerge como símbolo de resistência e afirmação da identidade, especialmente para a mulher negra, frente ao padrão corporal que tem a branquitude como referência. Trata-se de algo que transcende a imagem corporal, pois rompe com uma lógica que coloniza a corporeidade experimentando outras formas de sentir e viver o mundo. É expressão da negritude, entendida aqui enquanto reabilitação dos valores e culturas negadas (MUNANGA, 2009, p. 20 apud GOMES, 2017, p. 82) da reeducação do olhar sobre o seu próprio corpo e o corpo negro que afronta com altivez as tentativas de defini-lo como exótico.

Trazendo a discussão para o campo da educação básica, mais precisamente a formação docente em Educação Física, cabe tomarmos como ponto de partida as seguintes reflexões de Nilma Lino Gomes (2003).

[...] como os educadores negros e brancos pensam o próprio corpo? Como pensam e vêem o corpo negro? Durante os processos de formação docente, os educadores têm contato com reflexões que discutem as representações construídas em nossa sociedade sobre o negro, sua estética, sua ascendência africana e as formas como estas se misturam com situações de racismo, discriminação e preconceito racial? Como os professores lidam com as diferenças étnico-raciais inscritas no seu próprio corpo e no corpo de suas alunas e de seus alunos? (GOMES, 2003, p. 172-173).

Acreditamos que também se faz necessário colocar em questão qual é o corpo do corpo docente e se seu percurso formativo, inicial e/ou continuado, tem dado conta de provocar reflexões até mesmo acerca da própria identidade racial, o que certamente reverbera em práticas que atendam aos anseios de uma educação antirracista. Boa

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parte dos equívocos e resistências a tais práticas estão alicerçadas na crença do mito da democracia racial, de que “somos todos mestiços”, assim como no entendimento de que compete apenas à população negra, nesse caso professores negros e professoras negras, o desenvolvimento de práticas pedagógicas antirracistas no contexto escolar. Tal constatação é preocupante e deve ser problematizada, uma vez que, apesar do tímido aumento do número de docentes que se autodeclaram negros e negras, estudos apontam que a presença de brancos e brancas é maior em todas as etapas e anos de ensino (ALVES; PINTO, 2011; CARVALHO, 2018).

Ao traçar o perfil de docentes que atuam em escolas públicas e privadas tendo como base a analise do Censo Escolar de 2017, Maria Regina Viveiros de Carvalho (2018) traz dados que nos permite perceber ligeira alteração na distribuição de raça/cor de docentes em comparação ao panorama apresentado pelo Censo de 2009. Dos 2.078.910 professores e professoras da educação básica 1.508.537 declararam-se da seguinte forma: 872.435 (57,8%) brancos, 609.012 (40,7%) negros – sendo 84.934 (5,6%) pretos e 524.078 (34,7%) pardos –, 14.352 (0,9%) amarelos e 12.738 (0,8%) indígenas6. É valioso compreender possíveis ressignificações, tensões e dilemas identitários que envolvem trabalho pedagógico de um corpo docente que tem essa característica, especialmente de egressos dos cursos de formação continuada para a educação das relações raciais.

Em se tratando da Educação Física escolar, estamos de acordo com outro questionamento de Arroyo (2016, p. 24): “Esses saberes, culturas corpóreas, identidades, valores serão reconhecidos no trabalho da Educação Física?”. Tal pergunta se faz extremamente pertinente uma vez que é comum, como apontam estudos de Santos (2007), Pires (2013) e Luiz (2013), docentes terem uma concepção limitada acerca da disciplina, vista pelo prisma da hegemonia dos esportes, jogos e brincadeiras. Desta perspectiva, questões relacionadas à educação para as relações raciais, história e cultura afro-brasileira são praticamente inexistentes, superficiais ou distantes dos pressupostos e orientações presentes nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais (BRASIL, 2004).

Apesar dos avanços epistemológicos no diálogo com as ciências sociais e humanas (BRACHT, 1999), especialmente na elaboração das teorias pedagógicas da Educação Física no Brasil, como a cultura corporal7, a área não tem dado conta de subsidiar práticas que extrapolassem perspectivas de corpos e corporeidades racialmente universais. Em face disso, deve aproximar-se da potencia político-epistemológica e emancipatória da lei 10.639/03.

6 De acordo com o Censo Escolar de 2017, 570.373 (37,8%) docentes da educação básica não fizeram autodeclararação. 7 Nesta, o movimento humano é tratado na dimensão da cultura, compreendido enquanto construção histórica e social e objetiva a emancipação social dos alunos. [...] um dos pressupostos básicos para concretização desta proposta é a historicização destes conteúdos, ou seja, compreende-los como construções históricas e sociais, determinadas pelos contextos de diferentes épocas (MELLO, 2002, p. 1).

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A simples realização de projetos e aulas que contemplem práticas corporais, tais como dança afro, capoeira, samba e afins, a partir de uma perspectiva festiva de datas comemorativas ou descolada de reflexões acerca das relações raciais, só tem reforçado o caráter secundário, periférico e folclorizado de elementos da história e cultura afro-brasileira e africana. Logo, ao corpo e à corporeidade negra também é relegado esse lugar. Mauro Cezar Coelho e Wilma de Nazaré Baía Coelho (2018) nos alertam de que a inclusão desses conteúdos não é o ponto de culminância do que se propõe no bojo das ações afirmativas, sendo necessário que estejam em consonância com as perspectivas de uma educação antirracista e emancipatória. Para isso, destacam a importância das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais (BRASIL, 2004).

Os pareceres que as fundamentam e que dão corpo aos dispositivos legais parecem ser desconsiderados. Eles são importantes, no entanto, porque não se limitam à prescrição, pois dimensionam os dispositivos de modo a apontar seus objetivos e impactos, situando as diretrizes como algo mais que ordenações. Os pareceres apontam a trajetória da discussão, indicam suas motivações e as implicações que lhe são relacionadas (COELHO; COELHO, 2018, p. 22).

Não se trata de uma crítica à diversidade de práticas, mas sim reforçar a

necessidade de destacar o eixo comum apontado pelas Diretrizes que contempla certos princípios balizadores para ações individuais e coletivas no contexto da educação básica e superior. São eles: o de consciência política e histórica da diversidade; fortalecimento de identidades e de direitos; efetivação de ações educativas de combate ao racismo e discriminação. Por essa razão, o objetivo central dessa investigação não está alicerçado apenas na dimensão do conteúdo, mas sim nas posturas profissionais e possíveis ressignificações da prática docente de professoras e professores egressos dos cursos de formação continuada para a educação das relações raciais.

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana (BRASIL, 2004) destacam que a escola dever cumprir sua função política e posicionar-se frente toda e qualquer forma de discriminação. Para isso, ressalta que os docentes devem compreender a complexidade da construção da identidade negra ao longo dos anos para a desconstrução de estereótipos conduzindo os estudantes a um terreno mais fértil de reeducação das relações raciais. Dessa forma, o propósito de uma educação antirracista e emancipatória se fazem mais próximos.

Nilma Lino Gomes (2010) reafirma que escola e academia têm papeis importantes no fomento às práticas de combate ao racismo e desigualdades sociais, mas ressalta que tal propósito será efetivado com a mobilização da sociedade. A mesma autora reconhece que “ao discutirmos a relação entre cultura e educação, é sempre bom lembrar que a educação não se reduz à escolarização” (GOMES, 2003, p. 170), logo são múltiplos os espaços e instituições que lapidam nossas identidades e somos educados por todas elas se levarmos em consideração o fato de que educar é transmitir elementos de determinada cultura, como suas regras, valores e percepções de mundo.

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Muitas pessoas afirmam ter o período escolar marcado por situações constrangedoras que explicitavam o pensamento racista e estereotipado do negro suprimindo a livre construção e expressão, inclusive corporal, da sua identidade devido o forte patrulhamento ideológico. Negligenciar esse cenário tanto na formação de professores quanto no cotidiano escolar só faz prosperar representações negativas sobre o negro, sua cultura e história. Para Kabengele Munanga (2010, p. 51-52), questões referentes à memória coletiva, segundo o autor, apagada pelo sistema educativo ou apresentada de forma falsificada e estereotipada, corroboram para a ampliação do abismo presente até mesmo no contexto escolar em se tratando de evasão e reprovação, por exemplo.

Cabe destacar a importância de nos afastar da tendência de responsabilização dos professores e professoras quando nos referimos, especificamente, a implementação da lei 10.639/03 e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Ético-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Precisam ser colocados em questão outros elementos que acarretam tensões e dificuldades na efetividade de práticas emancipatórias, tais como a incompatibilidade entre a organização do trabalho docente e da gestão. Também nos parece indispensável estender a formação aos demais profissionais da educação e, aliado a isso, reconhecer tais agentes enquanto intelectuais críticos, não como meros aplicadores/executores de saberes. Todos e todas carregam consigo saberes e experiências plurais que extrapolam a prática profissional assim como a formação inicial, pois advém das práticas sociais e culturais. Essa gama de saberes deve ser contemplada nos processos de aprimoramento docente. (HERINGER; FIGUEIREDO, 2009; AZEVEDO et al, 2010).

A formação docente inicial e continuada para o trabalho pedagógico com diversidade deve ser entendida como direito indispensável, o que é reforçado tanto pelo Parecer CNE/CP 03/2004 quanto pelas Diretrizes. Nilma Lino Gomes (2008), em texto que reflete sobre a experiência numa proposta de formação continuada para a educação das relações raciais, menciona que as secretarias de educação devem oferecer totais condições para que professores e professoras, bem como demais profissionais da educação possam usufruir dessas possibilidades, compartilhar conhecimentos com demais colegas estimulando práticas políticas e pedagógicas de enfrentamento ao racismo.

4 – Para não concluir

Sem dúvidas a lei 10.639/03 e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Ético-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, frutos de um longo processo de reivindicações do Movimento Negro e aliados, são marcos importantes para a consolidação de uma educação antirracista, um recurso valioso na disputa pelas narrativas, entre outros aspectos. Contudo, cabe destacar que apenas o conteúdo da lei não se traduz como solução imediata para os problemas postos ao longo da história, especialmente na colonialidade do ser, do saber, assim como das bases epistemológicas que norteiam os cursos de formação inicial e continuada em educação, especialmente na Educação Física.

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É de extrema importância, mesmo em âmbito local, acompanhar e analisar os processos de implementação da lei 10.639/03 e suas diretrizes, tendo como ponto de partida a prática docente apontando não só limites e entraves, mas, especialmente, aperfeiçoar aspectos positivos tanto da legislação e seus eixos normativos quanto das ações realizadas no contexto escolar que contemplem de forma satisfatória o propósito da (re)educação para as relações raciais e uma educação escolar verdadeiramente democrática.

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