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CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO RUY CÉSAR DE FREITAS EVANGELISTA ANÁLISE DA PROTEÇÃO SOCIAL PREVIDENCIÁRIA DO TRABALHADOR RURAL João Pessoa 2009

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CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

RUY CÉSAR DE FREITAS EVANGELISTA

ANÁLISE DA PROTEÇÃO SOCIAL PREVIDENCIÁRIA DO

TRABALHADOR RURAL

João Pessoa

2009

RUY CÉSAR DE FREITAS EVANGELISTA

ANÁLISE DA PROTEÇÃO SOCIAL PREVIDENCIÁRIA DO

TRABALHADOR RURAL

Monografia apresentada ao Curso de

Direito da Faculdade de Ensino

Superior da Paraíba - FESP, como

requisito parcial para obtenção do título

de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Ms. José Antônio

Coelho Cavalcanti.

João Pessoa

2009

RUY CÉSAR DE FREITAS EVANGELISTA

ANÁLISE DA PROTEÇÃO SOCIAL PREVIDENCIÁRIA DO

TRABALHADOR RURAL

Monografia submetida à Comissão Examinadora designada pelo Colegiado do Curso de Graduação em Direito como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito.

Data da aprovação: 02/12/2009

BANCA EXAMINADORA

Nome: Prof. Ms. José Antônio Coelho Cavalcanti (Orientador)

Assinatura:

Nome: Prof. Bianor Arruda Bezerra Neto

Assinatura:

Nome: Prof. Sérgio José Vieira Lopes

Assinatura:

Aos meus pais, Henrique (in memoriem) e Lindete, fontes inesgotáveis de inspiração.

A Simone, minha esposa, exemplo de dedicação à família e companheira de todas as horas.

Aos meus filhos, Silvino Henrique e Ruy César, merecedores de todo o meu amor.

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus.

A meu irmão Márcio Evangelista, operador exemplar da área jurídica e

inspiração maior para o estudo do Direito.

A minha família pelo carinho e incentivo contínuo.

Agradeço profundamente àquele que viabilizou e incentivou os meus

primeiros passos na área do Direito Previdenciário, Prof. José Antônio Coelho

Cavalcanti.

A todos os professores do Curso de Direito da FESP

Aos meus queridos companheiros de curso.

“Faz o que for justo. O resto virá por si só.”

Johan Wolfgang Von Goethe

RESUMO

EVANGELISTA, Ruy César de Freitas. Análise da proteção social previdenciária do trabalhador rural. João Pessoa, 2009. Monografia (Curso de Graduação em Direito) – Faculdade de Ensino Superior da Paraíba - FESP, João Pessoa. O presente estudo tem por objetivo a análise da evolução do sistema previdenciário brasileiro com ênfase na proteção social do trabalhador rural, no custeio e impacto financeiro da previdência rural. A seguridade social é um sistema de proteção social constituído por três vertentes, a saúde, a previdência e a assistência social. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no seu art. 194, definiu entre os princípios da seguridade social, a uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais como princípios a serem observados pelas vertentes integrantes da seguridade social. A previdência social, diferentemente da saúde e da assistência social, é de filiação compulsória e constitui-se em um sistema de cobertura dos efeitos de contingências associadas ao trabalho, resultante de imposição legal e lastreado nas contribuições dos afiliados para seu custeio. A inclusão da previdência rural como subsistema da política de previdência social provocou transformações legais e institucionais, que, indiscutivelmente, aumentaram o alcance social da proteção ao trabalhador rural, porém produziram forte impacto para o financiamento da previdência social brasileira contribuindo para o desequilíbrio atuarial do sistema previdenciário. Palavras-chave: trabalhador rural, proteção social, previdência social.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

BPC Benefício de Prestação Continuada

CEME Central de Medicamentos

CF1988 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

DATAPREV Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social

FAP Fator Previdenciário de Prevenção

FUNABEM Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor

FUNAI Fundação Nacional do Índio

FUNRURAL Fundo de Assistência e Previdência do Trabalhador Rural

IAPAS Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência

Social

IAPI Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Industriários

IN Instrução Normativa

INAMPS Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social

INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

INPS Instituto Nacional de Previdência Social

INSS Instituto Nacional do Seguro Social

ISSB Instituto de Serviços Sociais do Brasil

LBA Legião Brasileira de Assistência

LOPS Lei Orgânica da Previdência Social

MPS Ministério da Previdência Social

NTEP Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário

OIT Organização Internacional do Trabalho

RGPS Regime Geral de Previdência Social

RPPS Regimes Próprios de Previdência Social

SAT Seguro de Acidentes de Trabalho

SUPRA Superintendência de Política Agrária

SINPAS Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 09 1.1 Tema e justificativa ..................................................................................... 11 1.2 Objetivos .................................................................................................... 11 1.2.1 Objetivo geral .......................................................................................... 11 1.2.2 Objetivos específicos............................................................................... 12 1.3 Procedimentos metodológicos ................................................................... 12 1.3.1 Tipo de estudo ......................................................................................... 12 1.3.2 Área de estudo ........................................................................................ 12 1.3.3 Sujeitos e critérios de seleção da amostra .............................................. 12 1.3.4 Métodos e técnicas de coleta dos dados................................................. 13 1.3.5 Tratamento e análise dos dados ............................................................. 13 1.4 Estrutura do trabalho .................................................................................. 13 2 A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E A PROTEÇÃO SOCIAL ............ 15 3 A SEGURIDADE SOCIAL ............................................................................ 18 3.1 Princípios constitucionais ........................................................................... 19 3.1.1 Princípios gerais ...................................................................................... 19 3.1.2 Princípios específicos .............................................................................. 19 3.2 Financiamento ............................................................................................ 21 3.3 A saúde ...................................................................................................... 22 3.4 A assistência social .................................................................................... 22 4 A PREVIDÊNCIA SOCIAL ........................................................................... 24 4.1 O Regime Geral de Previdência Social ...................................................... 26 4.1.1 Os beneficiários ....................................................................................... 27 4.1.2 Filiação e inscrição .................................................................................. 28 4.1.3 Contribuições previdenciárias ................................................................. 28 4.1.3.1 Contribuições dos trabalhadores .......................................................... 29 4.1.3.2 Contribuições dos empregadores ......................................................... 30 4.1.3.3 Das instituições financeiras .................................................................. 31 4.1.3.4 O seguro de acidentes no trabalho ...................................................... 32 4.1.4 Os benefícios .......................................................................................... 33 5 A PREVIDÊNCIA SOCIAL RURAL .............................................................. 37 5.1 Histórico ..................................................................................................... 37 5.2 O trabalhador rural no RGPS ..................................................................... 41 5.2.1 O trabalhador rural e o empregado rural ................................................. 41 5.2.2 O segurado especial................................................................................ 41 5.2.3 A comprovação de atividade rural ........................................................... 44 5.3 Financiamento ............................................................................................ 45 6 CONCLUSÕES ............................................................................................. 49 REFERÊNCIAS ................................................................................................ 51

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1 INTRODUÇÃO

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF1988) instituiu um

sistema de proteção social denominado seguridade social que é constituído por três

vertentes, a saúde, a previdência e a assistência social. A referida Carta Magna no seu

art. 194 definiu entre os princípios da seguridade social, a uniformidade e equivalência

dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais como princípios a serem

observados pelas vertentes integrantes da seguridade social.

Segundo Wladimir Novaes Martinez (1992, p. 57):

Seguridade Social é uma técnica de proteção social, custeada solidariamente por toda a sociedade segundo a capacidade de cada um, que propicia universalmente a todos o bem-estar das ações de saúde e dos serviços assistenciários em nível mutável, conforme a realidade sócio-econômica, e os das prestações previdenciárias, estas últimas quando do nascimento, incapacidade ou invalidez, idade avançada, ou tempo de serviço, prisão ou morte, em função das necessidades e não da capacidade dos destinatários.

A expressão seguridade social foi adotada pelo constituinte de 1988 e sofreu

restrição por parte de alguns que alegavam sua impropriedade, já que o termo mais

adequado da língua portuguesa seria segurança. É uma rede protetiva formada pelo

Estado e por particulares com contribuição de todos incluindo parte dos beneficiários

dos direitos.

A definição legal de seguridade social tem um significado distinto da definição de

previdência social, a primeira com abrangência social ampla incluindo em seu bojo,

inclusive, o aspecto previdenciário contido na segunda.

Assim, a seguridade é um sistema de cobertura de contingências sociais

destinado a todos os que se encontram em estado de necessidade, não restringindo os

benefícios nem aos contribuintes nem à perda da capacidade laboral. Programas de

distribuição de renda, pensões não-contributivas, benefícios de prestação continuada

para idosos e deficientes constituem benefícios de seguridade que não resultam de

perda ou redução da capacidade laboral e não têm caráter contributivo.

A previdência social é de filiação compulsória. De fato a previdência social é um

sistema de cobertura dos efeitos de contingências associadas ao trabalho, resultante de

imposição legal e lastreado nas contribuições dos afiliados para seu custeio; tem por

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objetivo ofertar benefícios aos contribuintes que sejam vitimados por perda ou redução

da capacidade laboral.

Baseado nesse entendimento, a previdência social, por meio das Leis de Custeio

e Benefício, preceituou normas observando referida disposição constitucional, bem

como as demais especificidades estabelecidas pela CF1988, em especial o § 8º do art.

195 que determina base de cálculo diferenciada para pequenos agricultores que

exerçam suas atividades em regime de economia familiar; o inciso II do §7º do art. 201

estabelece a redução da idade para fins de aposentadoria por idade para os

trabalhadores rurais; e o §9º, também do art. 201 que possibilita a contagem recíproca

entre os regimes geral e dos servidores públicos.

A previdência rural brasileira está fortemente vinculada e determinada pela

condição de direito social à qual foi elevada na Carta Magna de 1988. A inclusão da

previdência rural no sistema de seguridade social, como subsistema da política de

previdência social, que até então era concebida como garantidora de direitos baseados

na lógica de seguros contributivos, provocou, desde então, transformações legais e

institucionais, que trouxeram forte impacto para o financiamento da previdência social

brasileira.

Na verdade a CF1988 mudou a situação dos trabalhadores rurais, sobretudo

aqueles que exerciam suas atividades em regime de economia familiar, que por força

do art. 201, §2º, passaram a receber benefícios de pelo menos um salário mínimo e a

integrar a classe de segurados obrigatórios do sistema previdenciário, passando a

constituir o grupo de beneficiários definidos com segurados especiais.

A previdência rural brasileira passou por uma reorganização em seus benefícios,

ampliação dos beneficiários e aumento nos mecanismos de financiamento e de gestão

político-institucional. E por outro lado ao ser instituída no interior da previdência social

passou a fazer parte desse sistema público de proteção social, de modo que sua

articulação com as demais políticas previdenciárias torna-se obrigatória e indispensável,

sendo condicionada, mas também as condicionando (DELGADO E CASTRO, 2003, p.

7).

O sistema previdenciário brasileiro é constituído por três regimes, o Regime

Geral de Previdência Social (RGPS), os Regimes Próprios de Previdência de

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Servidores Públicos e Militares e os Regimes Complementares de Previdência. O

RGPS é o responsável pela proteção da grande massa de trabalhadores brasileiros, é

organizado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), autarquia vinculada ao

Ministério da Previdência Social (MPS).

1.1 Tema e justificativa

A seguridade social assegura a proteção ao trabalhador rural através de medidas

legais e institucionais que provocam impacto no financiamento previdenciário estatal.

Na tentativa de demonstrar a repercussão da ampliação de benefícios previdenciários

ao trabalhador rural prevista na CF1988 e a necessária cobertura financeira é que este

trabalho revisa o sistema previdenciário brasileiro com realce no aspecto jurídico-

institucional.

1.2 Objetivos

1.2.1 Objetivo geral

Analisar a evolução do sistema previdenciário brasileiro, com ênfase aos

aspectos jurídico-institucionais relacionados ao trabalhador rural.

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1.2.2 Objetivos específicos

Identificar os requisitos para filiação dos trabalhadores rurais ao regime

previdenciário estatal.

Avaliar a forma de custeio do sistema previdenciário brasileiro prevista para o

trabalhador rural.

Determinar o impacto financeiro do subsistema de previdência rural dentro do

contexto da previdência social.

1.3 Procedimentos metodológicos

1.3.1 Tipo de estudo

Foi realizada uma pesquisa científica, de caráter exploratório, com base em

documentos já elaborados.

1.3.2 Área de estudo

A seguridade social quanto ao aspecto previdenciário de proteção ao trabalhador

rural.

1.3.3 Sujeitos e critérios de seleção da amostra

O trabalhador rural vinculado ao Regime Geral de Previdência Social, que exerce

suas atividades em regime de economia familiar.

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1.3.4 Métodos e técnicas de coleta de dados

Utilizou-se o método dedutivo com suas fases principais evidência, análise,

síntese e enumeração. Na pesquisa bibliográfica será utilizada documentação indireta,

livros, artigos (revistas, boletins, jornais), pesquisas, monografias e sites da internet.

Após a realização da pesquisa bibliográfica, proceder-se-á a leitura e o fichamento dos

textos.

1.3.5 Tratamento e análise dos dados

Procedeu-se a exposição do pensamento de vários autores sobre o tema, com

opinião no mesmo sentido e sentido contrário, além da colocação da própria opinião.

Os aspectos abordados serão organizados de maneira lógica e sistemática.

1.4 Estrutura do trabalho

Este trabalho está disposto em capítulos os quais apresentam os seguintes

conteúdos.

O Capítulo 1 refere-se aos aspectos introdutórios sobre o objeto do estudo, ou

seja, a seguridade social e o trabalhador rural; são definidos os objetivos e a

metodologia utilizada no estudo.

O Capítulo 2 refere-se aos aspectos teóricos estudados e revisados sobre a

proteção social prevista pela CF1988.

No Capítulo 3 são pontuados elementos importantes e fundamentais sobre a

seguridade social com abordagem dos princípios constitucionais, financiamento e

vertentes.

14

No Capítulo 4 são discutidos os aspectos relevantes da previdência social, no

que tange ao RGPS, considerando os beneficiários, contribuições previdenciárias,

benefícios, entre outros.

O Capítulo 5 apresenta uma análise na previdência social rural brasileira,

sobretudo no que concerne a evolução história, ao segurado especial e ao

financiamento.

E, por fim, o Capítulo 6 traz as conclusões advindas do estudo.

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2 A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E APROTEÇÃO SOCIAL

A Constituição Federal de 1988, que mereceu o título de Constituição Cidadã,

trouxe conquistas sociais e estabeleceu novo balizamento legal, ampliando

sobremaneira a proteção social e consolidando o estado democrático de direito. Após a

sua promulgação em outubro de 1988, as mudanças no ordenamento jurídico brasileiro

foram especialmente significativas em relação aos direitos fundamentais.

No plano da proteção aos trabalhadores, a Carta de 1988 consagra o valor do

trabalho, da justiça social e da dignidade humana, cabendo ao Estado promover um

conjunto de ações normativas de proteção ao ser humano, por força de sua dignidade

própria, no tocante a sua participação na riqueza social.

A dignidade da pessoa humana assenta-se no postulado de ser o homem fim em

si mesmo. Assim sendo deve o Estado assegurar a pessoa uma existência digna,

deferindo-lhe proteção para que tanto individualmente quanto socialmente goze

condições de vida, nas quais possa efetivar a liberdade. Deflui ainda da dignidade da

pessoa humana, analisada no plano da sua inserção social, o princípio das garantias

mínimas, ao enunciar que deve ser assegurado aos cidadãos um rol de direitos

fundamentais, isto é, “prerrogativas da pessoa humana, necessárias para a vida

satisfatória e digna, garantidas nas Constituições” (SALGADO, 1996, p. 17).

As alterações promovidas têm impacto importante na proteção social, que se

traduz em direitos econômicos e sociais. O art. 6° da CF1988 destaca os direitos a

saúde, a previdência social e a assistência social. Os direitos dos trabalhadores

urbanos e rurais são contemplados no art. 7° com a imposição de limites as relações de

trabalho e assegurando outras medidas protetivas como o seguro-desemprego (inciso

II), o fundo de garantia do tempo de serviço (inciso III), salário-família para o trabalhador

de baixa renda (inciso XII), aposentadoria (inciso XXIV) e seguro contra acidentes de

trabalho (inciso XXVIII).

A seguridade social foi disciplinada no título VIII da CF1988 que cuida da ordem

social, nos artigos 194 a 204. Não sendo regrada conjuntamente aos outros direitos

sociais elencados. O objetivo do constituinte foi o de provavelmente dar ênfase ao

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disciplinamento da seguridade social em título apartado dos demais benefícios sociais,

realçando os interesses da sociedade brasileira em especial os relacionados com o

trabalho, o bem estar e a justiça social.

As normas constitucionais refletem uma nítida repartição de competência dentro

da organização do Estado no que tange a seguridade social definida no art. 194, caput,

como um “conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da

sociedade”, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à

assistência social.

As medidas de proteção são de competência administrativa comum concorrente

da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Como determina o artigo

23, incisos II relativo à saúde, à assistência pública e à proteção e garantia das pessoas

portadoras de deficiência, IX referente ao saneamento básico e X pertinente ao

combate das causas de pobreza e dos fatores de marginalização, bem como da

promoção da integração social dos setores desfavorecidos. Estas tarefas devem ser

compartilhadas pelos poderes públicos como forma de preservação do federalismo

cooperativo.

A proteção social prevista na CF1988 traduzida pelos diversos direitos sociais e

econômicos e pelo sistema de seguridade social tem com aspecto fundamental a

proclamação da responsabilidade do Estado pelos riscos dos seus cidadãos,

trabalhadores ou não, na dicção dos artigos 6° e 7°. Ressalta-se a importância dos

direitos subjetivos públicos de caráter social que objetivam assegurar condições dignas

de vida e consciência, indispensáveis para o pleno exercício das liberdades

fundamentais.

É importante ainda frisar neste momento que vários dispositivos da CF1988, que

se detém sobre a organização da seguridade social em cada uma das suas subdivisões

(saúde, previdência e assistência social), têm eficácia limitada, precisando, portanto, de

regulamentação infraconstitucional. Pode-se realçar o art. 194, parágrafo único, que

dispõe que compete ao poder público, nos termos da lei, organizar a seguridade social.

E, ainda, os artigos 197 e 201 da CF1988, sem eficácia plena, bem como o art. 203

com eficácia contida. O que explicita o conteúdo programático da CF1988 ficando clara

a necessidade de regulamentação de vários dos seus dispositivos.

17

Em 24 de julho de 1991, foram promulgadas a Lei nº 8.212, Plano de Custeio e

Organização da Seguridade Social, e a Lei nº 8.213, Plano de Benefícios da

Previdência Social, que revogaram totalmente a Lei Orgânica da Previdência Social

(LOPS). A LOPS continuou a vigorar desde a CF1988, apesar de não ter sido

recepcionada em grande parte pela referida Carta Magna, por falta de outro diploma

legal.

Em 19 de setembro de 1990, foi promulgada a Lei nº 8.080, Lei Orgânica da

Saúde e, ulteriormente, em 07 de dezembro de 1993, a Lei nº 8.742, Lei Orgânica da

Assistência Social, e estabelecido o regime prefigurado das entidades de previdência

privada, por meio das Leis Complementares nº 108 e 109, ambas de 29 de maio de

2001.

O Brasil, extemporaneamente, implantou um sistema de proteção universalista,

em contradição com a maioria dos sistemas adotados por outros países, que já haviam

mitigado seu campo subjetivo e objetivo de proteção social, o que configurou o

protecionismo social mais abrangente de sua história. O retardo do Brasil em adotar

esta abordagem constitucional é explicado por Adriana Zawada Melo (2008, p. 17):

É bem verdade que as condições em que foi gestada a Constituição de 1988 foram muito específicas, pois o país estava saindo de um longo período de regime autoritário, e a assembléia constituinte assumiu para si mesma um compromisso de resgatar várias dívidas do Estado para com o povo, inclusive na ordem social. Daí que a adoção da técnica da seguridade social como principal instrumento de proteção social foi praticamente inevitável, além de ter sido simbólica do ponto de vista político.

Sob a égide desta perspectiva histórica foi possível colmatar os princípios

norteadores da seguridade social, art. 194, parágrafo único da CF1988, some-se ainda

as Emendas Constitucionais nº 20/1998, nº 41/2003 e nº 47/2005, que promoveram o

rearranjo do sistema de proteção social, sobretudo quanto à previdência social,

restringindo o espectro objetivo e subjetivo de amparo e aproximando, por conseguinte,

os regimes dos servidores públicos e dos trabalhadores autônomos e subordinados da

iniciativa privada.

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3 A SEGURIDADE SOCIAL

O Brasil tem um amplo e complexo sistema de seguridade social, organizado em

um conjunto de ações integradas que compõem uma rede de proteção social. Os

componentes da seguridade são a assistência social, a saúde e a previdência social.

A Carta Magna de 1988 instituiu um sistema de proteção social que tem como

marco principal a universalidade, estabelecendo, dessa forma, a garantia de condições

mínimas de vida a toda a população.

O art. 194 da CF1988 estabelece que a seguridade social compreende um

conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade,

destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência

social. Em seu parágrafo único estabelece princípios aplicáveis à seguridade social.

A seguridade social é conceituada por Fábio Zambitte Ibrahim (2008, p. 4):

como a rede protetiva formada pelo Estado e por particulares, com contribuições de todos, incluindo parte dos beneficiários dos direitos, no sentido de estabelecer ações positivas no sustento de pessoas carentes, trabalhadores em geral e seus dependentes, providenciando a manutenção de um padrão mínimo de vida.

Cada uma das vertentes da seguridade tem seu objetivo e diretrizes fixados na

Constituição em seções próprias, dentro do capítulo II do Título VIII. Todas, porém,

devem em tese ter por fundamento os princípios (ou objetivos, na dicção do

constituinte) arrolados no parágrafo único do artigo 194.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT), em sua Convenção 102 de 1952,

definiu a seguridade social nos seguintes termos:

a proteção que a sociedade oferece aos seus membros mediante uma série de medidas públicas contra as privações econômicas e sociais que, de outra forma, derivam do desaparecimento ou em forte redução de sua subsistência, como conseqüência de enfermidade, maternidade, acidente de trabalho ou enfermidade profissional, desemprego, invalidez, velhice e também a proteção em forma de assistência médica e ajuda às famílias com filhos.

19

3.1 Princípios constitucionais

3.1.1 Princípios gerais

Os princípios gerais que se aplicam não só a seguridade social são o da

igualdade, o da legalidade e o do direito adquirido, como bem explicita o Prof. José

Antônio Coelho Cavalcanti, na sua esteira, chama-se atenção ao que reza o caput do

art. 5º da CF que “todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza...”

e ainda dispõe o inciso II do referido artigo constitucional que “ninguém será obrigado a

fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. O respeito ao direito

adquirido, ao ato jurídico perfeito e a coisa julgada é cláusula pétrea de nossa

Constituição, que não pode ser modificada por emenda constitucional, como se verifica

do inciso IV do § 4º do art. 60 da Lei Maior.

3.1.2 Princípios específicos

O texto constitucional define os princípios como objetivos da seguridade social,

que devem ser observados pelo Poder Público na organização do sistema, percebe-se

que nem todos os princípios são aplicáveis aos seus três ramos: saúde, previdência

social e assistência social.

São princípios específicos da seguridade social: solidariedade, universalidade da

cobertura e do atendimento, uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços

entre populações urbanas e rurais, seletividade e distributividade na prestação dos

benefícios e serviços, irredutibilidade do valor dos benefícios, equidade na forma de

participação do custeio, diversidade da base de financiamento, caráter democrático e

descentralizado da administração, tríplice forma de custeio e preexistência do custeio

em relação aos benefícios e serviços (KERTZMAN, 2006, p. 24-32).

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O princípio da solidariedade é o pilar de sustentação do regime previdenciário e

obriga contribuintes a verterem parte do seu patrimônio para o sustento do regime

protetivo, mesmo que nunca tenham a oportunidade de usufruir dos benefícios e

serviços oferecidos. Percebe-se que a solidariedade aplica-se apenas à previdência

social, pois é o único dos ramos da seguridade que é essencialmente contributivo.

O princípio da universalidade do atendimento prega que todos devem ser

cobertos pela proteção social, a saúde e a assistência social estão disponíveis a todos

que necessitem dos seus serviços, já a previdência é regime contributivo de filiação

obrigatória para os que exercem atividade remunerada lícita. A universalidade da

cobertura significa que a proteção da seguridade deve abranger todos os riscos sociais,

princípio aplicável a todos os ramos da seguridade social.

A CF1988 igualou os direitos das populações urbanas e rurais, com o princípio

de uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços, porém o acréscimo no valor

dos benefícios dos rurais foi incluído no orçamento securitário, dentro das contas da

previdência social, contribuindo para o déficit previdenciário.

A seletividade na prestação dos benefícios e serviços implica que tais prestações

sejam fornecidas a quem realmente necessitar desde que se enquadre nas situações

que a lei definir. O princípio da distributividade é melhor aplicável à previdência e à

assistência social. O Poder Público vale-se da seguridade social para distribuir renda

entre a população, pois as contribuições são cobradas de acordo com a capacidade

econômica dos contribuintes. Assim, uma vez nos cofres previdenciários, os recursos

captados são distribuídos para quem precise de proteção.

O princípio constitucional da irredutibilidade do valor dos benefícios assegura o

seu reajuste, preservando, em caráter permanente, o seu valor real.

Para de definir a participação no custeio da seguridade social, levar-se-á em

consideração a capacidade de cada contribuinte. Cobrar-se-á mais contribuições de

quem tem maior capacidade de pagamento para beneficiar os que não possuem as

mesmas condições.

Os legisladores devem buscar diversas bases do financiamento ao instituir as

contribuições para a seguridade social para diminuir o risco financeiro do sistema

protetivo.

21

A CF1988 estabelece o “caráter democrático e descentralizado da administração,

mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores,

dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados”.

O princípio da tríplice forma de custeio está presente na Carta Maior desde a

Constituição de 1934 e a atual Constituição Federal ordena que a seguridade social

seja financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, mediante recursos

provenientes do Governo, das empresas e dos trabalhadores.

A preexistência do custeio em relação aos benefícios e serviços significa que

para ser possível a criação ou ampliação de qualquer benefício ou serviço, deve haver,

anteriormente, previsão de fonte de recursos que financiará a nova prestação.

3.2 Financiamento

A seguridade social é financiada basicamente por meio das contribuições sociais

previstas no art. 195 da CF1988, bem como pelos recursos provenientes dos

orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Vale lembrar que as contribuições sociais do empregador, da empresa e da

entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre a folha de salários e demais

rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe

preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício, bem como as contribuições do

trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não poderão ser gastas em

despesas distintas do pagamento de benefícios do RGPS, e assim nominadas

contribuições sociais previdenciárias.

As demais contribuições sociais, ou seja, das empresas sobre a receita,

faturamento e ou lucro, da receita de concursos de prognósticos e do importador de

bens e serviços do exterior, não se destinam só a previdência social sendo

direcionadas a saúde e a assistência social.

Todas as contribuições sociais, previdenciárias ou não, são arrecadadas,

fiscalizadas e cobradas pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.

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3.3 A Saúde

Os artigos 196 a 200 da CF1988 prevêem o direito subjetivo público à saúde,

devendo o Estado atuar de forma preventiva e curativa. A Lei nº 8.080, de 19 de

setembro de 1990, Lei Orgânica da Saúde, instituiu um sistema único, regionalizado e

hierarquizado, sendo admitida a atuação da iniciativa privada de forma complementar,

mediante convênios.

A CF1988, no art. 196, definiu a saúde, enquanto vertente da seguridade social, como:

direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

O grande alcance deste conceito é traduzido na universalidade do direito à

saúde sem a necessidade da contraprestação pecuniária ou de qualquer outra natureza

e nem mesmo discriminação de ordem social, denotado no atendimento aqueles

situados no topo da pirâmide social, ainda, quando detenham plano privado de

assistência à saúde.

A previsão legal e a descrição do sistema único de saúde estão no art. 198 da

CF1988, que o define como uma rede regionalizada e hierarquizada das ações e

serviços públicos de saúde, regida por três diretrizes: descentralização com direção

única em cada esfera de governo, atendimento integral com prioridade para as

atividades preventivas e participação da comunidade. O custeio do sistema é amplo,

reunindo recursos do orçamento da seguridade social e dos orçamentos da União, dos

estados, do Distrito Federal e dos municípios, além de outras fontes.

3.4 A Assistência Social

Os artigos 203 e 204 da CF1988, contidos na Seção IV, definem a assistência

social, ressaltando o seu caráter não contributivo e custeio pelos impostos em geral. O

23

caput do art. 203 prevê: “A assistência social será prestada a quem dela necessitar,

independentemente de contribuição à seguridade social...”.

A pedra angular a determinar o direito à prestação assistencial está na

necessidade e preenchimento de requisitos previstos nos dispositivos legais, em

especial na Lei nº 8.742, de 07 de dezembro de 1993, conhecida como Lei Orgânica da

Assistência Social.

O amparo conferido no campo da assistência social previsto na CF1988, art. 203,

tem como objetivos a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à

velhice (inciso I), o amparo às crianças e adolescentes carentes (inciso II), a promoção

da integração ao mercado de trabalho (inciso III). Inclui-se ainda a habilitação e

reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à

vida comunitária (inciso IV), a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à

pessoa portadora de deficiência e ao idoso, que devem comprovar não possuir meio de

prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei

(inciso V).

O Benefício de Prestação Continuada (BPC) devido à pessoa com deficiência e

ao idoso e previsto no art. 20 da Lei nº 8.742/93 é regulamentado pelo Decreto nº

6.214, de 26 de setembro de 2007, foi instituído pelo Ministério do Desenvolvimento

Social e Combate à Fome e é operacionalizado pelo INSS.

24

4 A PREVIDÊNCIA SOCIAL

A Seção III da CF1988, nos seus artigos 201 e 202 estabelece o delineamento

da previdência social, evidenciando a natureza contributiva da mesma, aspecto este

fundamental para sua base securitária. A Lei nº 8.212/91 cuida da organização e

custeio da seguridade social e a Lei nº 8.213/91 detém-se no plano de benefícios da

previdência social.

A proteção social é a finalidade precípua da previdência social.

Nas explicações de Wladimir Novaes Martinez as expressões “proteção social” e

“protetivo” enfatizam o objetivo primordial da previdência social, que é a proteção social

ou, em outras palavras, dar segurança à sociedade para que ela se mantenha em

harmonia, pacífica, prodigiosa e em desenvolvimento.

A previdência social, técnica de proteção social... desfruta de variadas particularidades, muitas delas próprias de sua natureza. Instrumento estatal de largo espectro, apresenta-se com elementos essenciais diferenciados, revelando sua verdadeira essência de instrumento protetivo. (MARTINEZ, 1998, p. 101)

Os riscos inerentes a existência humana carecem de uma abordagem solidária

para o enfrentamento dos infortúnios previsíveis ou não, neste contexto, a previdência

social assume papel imprescindível na minimização do impacto dos eventos adversos

decorrentes da ocupação profissional, da invalidez real ou presumida e de outros com

previsão legal.

Na esteira de Wladimir Novaes Martinez (1998, p. 84) a Previdência Social:

é o principal instrumento da Seguridade Social, que tem como objetivo propiciar os meios indispensáveis à subsistência da pessoa humana – quando esta não pode obtê-los ou não é desejável auferi-los pessoalmente através do trabalho, por motivo de maternidade, nascimento, incapacidade, invalidez, desemprego, prisão, idade avançada, tempo de serviço ou morte - mediante contribuição, proveniente da sociedade e de cada um dos participantes.

A contribuição compulsória que emana de qualquer forma de atividade laboral no

Brasil é o substrato indispensável na consecução dos objetivos protetivos do sistema

previdenciário, o que em última análise compõe o respaldo financeiro para garantia de

recursos nas situações em que não poderão ser obtidos pelos próprios trabalhadores,

em virtude de incapacidade laboral.

25

A previdência brasileira subdivide-se nos regimes básicos, que são o RGPS e o

Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS), este último para ocupantes de cargos

efetivos (incluindo vitalícios) e militares. Além dos regimes descritos existe um terceiro

grupo de natureza complementar.

A CF1988 dispôs, ainda, no seu artigo 201, que a previdência social, ou seja, a

previdência de caráter público seria organizada sob a forma de um regime geral, o

Regime Geral de Previdência Social, e estabelece os preceitos relativos que são

aplicados, obrigatoriamente, a todos os trabalhadores, excetuando-se os servidores

públicos titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios. A Previdência dirigida aos servidores públicos possui disposições

específicas no art. 40 da CF1988.

A previdência apresenta proteção obrigatória a todos os trabalhadores que estão

vinculados ao Regime Geral ou aos Regimes Próprios. O RGPS é abrangente e

residual e tem por finalidade proteger todos os trabalhadores, excetuando apenas

aqueles vinculados aos RPPS, os quais são instituídos pelos respectivos entes

federativos para dar proteção previdenciária aos seus servidores titulares de cargos

efetivos. Por meio dos dois regimes o Estado viabiliza a todos os trabalhadores o

acesso à previdência social e, com isso, o trabalhador estará protegido das

contingências geradoras de necessidades, uma vez que será garantido recurso quando

ele, em virtude de sua incapacidade laboral, não obtém recursos com o fruto de seu

trabalho.

Como visto anteriormente, dentre os vértices da seguridade social, a previdência

social é a única de caráter contributivo e de filiação compulsória, o que denota a

solidariedade social com custeio advindo de contribuições dos segurados, dos

empregadores e do Estado.

Já a obrigatoriedade de filiação ou participação significa que todos os que

exercerem uma atividade remunerada devem ser necessariamente filiados ao RGPS,

exceção feita, pelo art. 40 da CF1988, aos servidores públicos titulares de cargos

efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como de

suas autarquias e fundações, filiados obrigatoriamente a outro regime.

26

É o Estado que usando do seu Poder de Império obriga aqueles previstos em lei

a contribuírem de forma a viabilizar financeiramente a previdência social, que se traduz

na solidariedade social. A repartição é feita de maneira simples, onde alguns acabam

contribuindo em favor de outros, não existindo uma cotização específica, o que fica

explicitado na possibilidade de um trabalhador vinculado ao RGPS nunca tenha a

oportunidade de usufruir dos benefícios e serviços oferecidos.

É o que mostra Pereira Netto (apud MELO, 2008, p. 26) ao descrever situações

em que a solidariedade se expressa:

na contribuição daqueles que não serão diretamente beneficiados por qualquer prestação (as empresas e os tomadores de serviços, em geral), ou quando, apesar de ter contribuído por toda a vida, um segurado recebe benefícios por muito menos tempo do que outro que contribuiu por um período muito reduzido, mas que se acidentou ou adoeceu precocemente. Há ainda a hipótese dos benefícios para os quais não se exige carência, e a daqueles beneficiários que são contemplados sem nunca terem contribuído, como é o caso dos dependentes.

4.1 O Regime Geral de Previdência Social

A previsão legal do RGPS encontra-se no art. 9° da Lei nº 8.213/91 e no art. 6º

do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99.

O RGPS atende aos beneficiários em todas as situações previstas no art. 1º da

mesma lei:

a Previdência Social, mediante contribuição, tem por fim assegurar aos beneficiários meios indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente.

O RGPS é administrado por uma autarquia federal, componente da

administração indireta federal, denominada INSS.

Na condição de autarquia, o INSS é dotado de personalidade jurídica de direito

público, vinculada ao MPS. A princípio, o INSS tem como incumbência precípua a

organização da previdência social, ficando de fora a assistência social e a saúde.

27

Entretanto, por questões de ordem prática, ainda que atualmente as ações de

previdência e assistência social não mais estejam vinculadas ao mesmo ministério, é

comum observar-se o INSS administrando prestações de natureza assistencial, como o

BPC.

O RGPS é o regime básico de previdência social, sendo de aplicação

compulsória a todos aqueles que exerçam algum tipo de atividade remunerada, exceto

se esta atividade já gera filiação a determinado regime próprio de previdência.

4.1.1 Os beneficiários

Na esfera do RGPS constituem-se beneficiários aqueles que são segurados da

previdência social, obrigatórios e facultativos, e os que dele dependem. Os que são

filiados a partir do momento que exerçam atividade remunerada recebem a

denominação de obrigatórios. Quanto aos facultativos, embora não exerçam atividade

remunerada, optam por integrar o sistema previdenciário (IBRAHIM, 2008, p. 144).

Os maiores de 16 anos, excetuando-se os que se encontram na situação de

aprendiz, a quem é permitido o ingresso aos 14 anos, desde que exerçam atividade

remunerada e lícita, o empregado e o trabalhador avulso, o empregado doméstico, o

contribuinte individual e o segurado especial incluem-se na categoria de segurados

obrigatórios (KERTZMAN, 2006, p. 53).

O segurado facultativo tem filiação vinculada exclusivamente à vontade do

interessado e surgiu obedecendo ao princípio da universalidade de participação no

RGPS. Para uma pessoa filiar-se, como segurado facultativo, basta atender a dois

requisitos: não ser segurado obrigatório e ser maior de 16 anos. Caso o segurado

facultativo venha exercer alguma atividade remunerada, automaticamente converter-se-

á em segurado obrigatório.

Os dependentes, apesar de não contribuírem, são beneficiários do RGPS. Nesta

categoria de beneficiários estão primariamente o cônjuge, companheiro (a) e o filho não

emancipado de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido e o equiparado a filho,

28

secundariamente os pais e terciariamente o irmão menor de 21 anos ou inválido.

Observa-se que para as duas últimas classes há necessidade de comprovação de

dependência econômica (KERTZMAN, 2006, p. 242 e 243).

4.1.2 Filiação e inscrição

O sistema previdenciário brasileiro é de natureza compulsória, de modo que os

trabalhadores são a ele vinculados, independentemente de suas vontades. Assim, a

filiação é o vínculo jurídico que se estabelece entre o segurado e o RGPS, decorre de

atividade remunerada, ou seja, ao iniciar atividade remunerada o trabalhador estará

filiado à previdência social. Todos os filiados ao RGPS devem contribuir com o sistema

conforme reza o caput do art. 201 da CF.

A inscrição é o ato formal, pelo qual o segurado fornece dados necessários para

sua identificação no INSS para cadastro no RGPS. No geral a filiação antecede a

inscrição, exceção feita para o segurado facultativo, cuja inscrição ocorre antes da

filiação, já para os segurados obrigatórios a inscrição pressupõe a filiação.

4.1.3 Contribuições previdenciárias

A Constituição determina que o financiamento da seguridade social é

responsabilidade de toda a sociedade, sendo que suas fontes são receitas oriundas do

Poder Público e as contribuições sociais.

As contribuições previdenciárias são as contribuições sociais dos trabalhadores e

das empresas, incidentes sobre a folha de pagamento e destinadas exclusivamente ao

custeio dos benefícios do RGPS (art. 167, XI da CF1988).

29

4.1.3.1 Contribuições dos trabalhadores

A cobrança de contribuição social do próprio beneficiado pelo regime

previdenciário é consectário da natureza contributiva do sistema, além de expresso

mandamento constitucional. A lei determina que a incidência recaia sobre o chamado

salário-de-contribuição do trabalhador, que corresponde à remuneração do trabalhador,

ou seja, aos valores percebidos em virtude do labor.

Há três formas básicas de cálculo da contribuição dos trabalhadores.

A incidência da contribuição para o empregado, trabalhador avulso e empregado

doméstico é progressiva, ou seja, à medida que é aumentado o salário-de-contribuição,

incrementa-se a alíquota, para 8, 9 ou 11%, dependendo da faixa de remuneração. Há

teto para a contribuição. Como os benefícios do RGPS possuem teto, ou seja, não

podem ser superiores a determinado valor, a contribuição segue limite idêntico, pois o

salário-de-contribuição não ultrapassa o valor fixado em lei.

Já para o contribuinte individual e para o segurado facultativo, a contribuição não

é progressiva, mas sim proporcional. Em regra geral a base de cálculo também é sobre

o salário-de-contribuição com alíquota constante equivalente a 20%.

Em virtude de mandamento constitucional, art. 195 § 8º da CF1988, o segurado

especial contribui com percentual incidente sobre o valor da comercialização de sua

produção rural. Para o segurado especial, não há salário-de-contribuição, aqui a base

cálculo é simplesmente o valor de venda da produção rural e pesqueira. Assim, ao

contrário dos demais segurados, a contribuição do segurado especial não é mensal,

pois somente existe quando há venda de produto rural, embora o mesmo continue

sendo segurado obrigatório do RGPS, com plena cobertura previdenciária. A alíquota

de contribuição do segurado especial é de 2% da receita bruta proveniente da

comercialização da sua produção, conforme art. 25, da Lei nº 8.212/91, acrescido o

percentual de 0,1% para custeio das prestações por acidente do trabalho.

30

4.1.3.2 Contribuições dos empregadores

A contribuição previdenciária da empresa é definida na Constituição no art. 195:

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, e das seguintes contribuições sociais: I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: a) A folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe presta serviço, mesmo sem vínculo empregatício.

O prazo para recolhimento das contribuições da empresa é até o dia dez do mês

seguinte ao da competência; a exceção é em relação às cooperativas de trabalho cujo

recolhimento é no décimo quinto dia do mês seguinte ao da competência.

A contribuição incidente sobre as remunerações de empregados e avulsos é de

20% sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título,

durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que prestem

serviços a determinada empresa, destinadas a retribuir o trabalho. Ao contrário da

contribuição dos segurados, a qual incide sobre o salário-de-contribuição, a cota

patronal incide sobre a remuneração e assim a base de incidência da contribuição

patronal não possui limite máximo, como a dos segurados.

A empresa deve contribuir com 20% sobre o total das remunerações pagas ou

creditadas a qualquer título aos contribuintes individuais que lhe prestem serviços. Já a

cobrança do seguro de acidente de trabalho (SAT) é devida sobre as remunerações de

empregados e avulsos, mas indevida em relação aos contribuintes individuais. Assim

como no caso anterior a contribuição da empresa não possui limite máximo, pois incide

sobre a totalidade das remunerações de seus contribuintes individuais.

A contribuição da empresa é de 15% sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura

de prestação de serviços que lhe sejam prestados por cooperados, por intermédio de

cooperativas de trabalho. Desta forma, a cooperativa não terá de efetuar recolhimento

algum em razão de valores creditados aos seus cooperados, já que tal obrigação foi

substituída pelo recolhimento a cargo da empresa tomadora de serviço. Caso a

cooperativa tenha empregados ou contrate outros contribuintes individuais, distintos de

31

seus cooperados, estará sujeita a todas as contribuições previstas em lei, como

qualquer empresa.

O empregador doméstico deve efetuar o recolhimento de contribuição relativa a

12% sobre o salário-de-contribuição do empregado doméstico. A contribuição do

empregador doméstico não traz qualquer benefício a este.

As associações desportivas que mantêm equipe de futebol profissional

contribuem com 5% da receita bruta, decorrente de espetáculos desportivos de que

participem em todo território nacional, e de recebimentos sob a forma de patrocínio,

licenciamento de uso de marcas e símbolos, publicidade, propaganda e de transmissão

de espetáculos desportivos.

A contribuição do produtor rural pessoa física e jurídica, na condição de

equiparado à empresa, é de 2% e de 2,5%, respectivamente, da receita bruta

proveniente da comercialização da sua produção, mais 0,1% da receita bruta

proveniente da comercialização da sua produção, para financiamento das prestações

por acidente do trabalho.

4.1.3.3 Das instituições financeiras

Instituições financeiras, além da alíquota básica de 20%, devem a contribuição

de 2,5% sobre os pagamentos a todos os segurados, isto é, sobre as remunerações de

empregados, avulsos e contribuintes individuais.

Para o legislador, a função precípua deste incremento, respalda-se no princípio

da isonomia, uma vez que, face ao alto grau de informatização, reduzem a arrecadação

previdenciária pela diminuição dos postos de trabalho (IBRAHIM, 2008, p. 205).

32

4.1.3.4 O seguro de acidente de trabalho

A CF1988, no art. 7º, XXVIII, assegura aos trabalhadores “seguro contra

acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este

está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa”. São abrangidos pelo SAT os

segurados empregados e avulsos, além do segurado especial, previsto na Lei nº

8.213/91.

A contribuição ao SAT insere-se na previsão do art. 195, I da CF1988, que trata

de custeio dos benefícios concedidos pelo RGPS e que inclui as prestações

acidentárias. Assim, sobre a remuneração de empregados e avulsos, além da cotização

das empresas de 20%, existe um acréscimo de 1, 2 ou 3% para o custeio do seguro de

acidente do trabalho. Tais alíquotas consideram o grau de risco de acidentes do

trabalho de acordo com a atividade preponderante da empresa e classificados em leve,

médio e grave respectivamente. O Decreto nº 3.048/99 no art. 202, §3º, define como

preponderante a atividade que ocupa, na empresa, o maior número de segurados

empregados e trabalhadores avulsos.

A cotização dos segurados especiais incide sobre a receita bruta da

comercialização da produção rural, na alíquota de 0,1%. Para estes segurados, a base

de contribuição é diferenciada, a alíquota é única, e o próprio segurado que arca com a

contribuição.

De acordo com a Lei nº 10.666, de 08 de maio de 2003, o Poder Executivo

poderá aumentar o SAT, caso a empresa não venha atender as expectativas de

investimentos em prevenção e controle de acidentes de trabalho, as alíquotas poderão

ser aumentadas para 2, 4 e 6%. Porém a regulamentação da matéria só foi feita pelo

Decreto nº 6.042/07 com inserção do art. 202-A no RPS e fixação da variação do SAT a

partir do Fator Previdenciário de Prevenção (FAP). O FAP é um índice variável a ser

aplicado à alíquota do SAT, aumentado ou reduzindo o referido seguro de acordo com

as condições efetivas de cada empresa. O FAP é fixado a partir da quantificação dos

benefícios acidentários gerados na empresa, considerando freqüência, gravidade e

custo gerados por estes benefícios.

33

A Lei nº 11.430/06 ao acrescentar o art. 21-A a Lei nº 8.213/91permitiu o nexo da

doença como decorrente do trabalho, a partir da vinculação de determinadas doenças a

certas atividades econômicas e com base na análise técnica da perícia médica

previdenciária, independente da emissão da CAT, é o Nexo Técnico Epidemiológico

Previdenciário, o NTEP (IBRAHIM, 2008, p. 217).

O Ministério da Previdência Social, com base no Decreto nº 6.257/07, fixou o

início do FAP em janeiro de 2009.

Em relação ao financiamento da aposentadoria especial foi criado adicional do

SAT, por meio da Lei nº 9.732/98, com o objetivo de subsidiar a aposentadoria dos

segurados expostos a agentes nocivos. O adicional ao SAT será de 12, 9 e 6%,

conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a

concessão de aposentadoria especial após 15, 20 ou 25 anos de contribuição

respectivamente.

4.1.4 Os benefícios

As prestações pagas em dinheiro aos trabalhadores ou dependentes,

denominam-se benefícios previdenciários. Os benefícios podem substituir a

remuneração, complementá-la ou não ter relação com a atividade laboral a depender

da natureza do impedimento e do beneficiário.

Para fazer jus a qualquer benefício previdenciário, é necessário que o requerente

seja filiado ao sistema e, ao mesmo tempo, efetue as contribuições, já que o RGPS é

um sistema previdenciário essencialmente contributivo. Para se ter direito a usufruir de

alguns benefícios previdenciários é necessário um determinado número de

contribuições mensais, ou seja, ter completado a carência.

A carência é contada mês a mês e tem o objetivo de evitar que os segurados

comecem a contribuir para o sistema de proteção social com o objetivo de obter

determinado benefício. A carência é dispensada nos casos de acidentes de qualquer

natureza, doença profissional ou do trabalho e de certas doenças que por certas

34

especificidades e ou por gravidade merecem tratamento particularizado determinadas

Portaria Interministerial elaborada pelos Ministérios da Saúde e da Previdência Social.

O RGPS compreende prestações, devidas inclusive em razão de eventos

decorrentes de acidentes do trabalho, expressas em benefícios e serviços. Podem ser

exclusivas para o segurado (aposentadoria por invalidez, aposentadoria por idade,

aposentadoria por tempo de contribuição, aposentadoria especial, auxílio-doença,

salário-maternidade e auxílio-acidente), para o dependente (pensão por morte, auxílio-

reclusão) e tanto para o segurado quanto para o dependente (serviço social e

reabilitação profissional).

A aposentadoria por invalidez será devida ao segurado que, estando ou não em

gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insuscetível de

reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo-lhe

paga enquanto permanecer nessa condição.

A aposentadoria por idade será devida ao segurado que completar 65 anos de

idade, se homem, ou 60, se mulher, reduzidos esses limites para 60 e 55 anos de

idade, para os trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres. A redução de

cinco anos para os trabalhadores rurais abrange todas as categorias de segurados,

bastando, para isso, exercer atividade tipicamente rural. Desta forma, estão incluídos os

empregados rurais, avulsos rurais, contribuintes individuais rurais e o garimpeiro.

A aposentadoria por tempo de contribuição é o benefício devido a todos os

segurados, que contribuírem durante 35 anos, se homem, ou 30 anos, se mulher;

excetuando-se o especial, pois este não contribui mensalmente para o custeio do

RGPS. O professor que comprove exclusivamente tempo de exercício das funções de

magistério na educação infantil e no ensino fundamental fará jus à aposentadoria após

30 anos de contribuição, se homem, ou 25 anos, se mulher.

A aposentadoria especial será devida ao segurado empregado, trabalhador

avulso e contribuinte individual, este somente quando cooperado filiado à cooperativa

de trabalho ou de produção, que tenha trabalhado durante 15, 20 ou 25 anos sujeito a

condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. As empresas e as

cooperativas de produção recolhem adicional para custeio das suas aposentadorias

especiais de seus trabalhadores e associados respectivamente.

35

A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo

segurado, perante o INSS, do tempo de trabalho habitual e permanente, não ocasional

nem intermitente, exercido em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a

integridade física. O segurado deverá comprovar a efetiva exposição aos agentes

nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou

à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício.

O salário-família é o benefício devido ao segurado empregado e ao trabalhador

avulso de baixa-renda, na proporção de respectivo número de filhos ou equiparados,

menores de 14 anos, ou inválidos, de qualquer idade.

O salário-maternidade é o benefício devido a todas as seguradas, durante 120

dias, com início 28 dias antes e término 91 dias depois do parto. Somente é exigida

carência para concessão do salário-maternidade para a segurada contribuinte

individual, especial e facultativa, equivalente a 10 contribuições mensais. A segurada

especial deverá comprovar exercício de atividade rural por pelo menos 10 meses antes

do requerimento do benefício.

O auxílio-doença é o benefício devido ao segurado que ficar incapacitado para o

trabalho ou para atividade habitual, por mais de quinze dias consecutivos. A verificação

da incapacidade é feita mediante exame médico pericial a cargo do INSS. O auxílio-

doença pode ser de dois tipos: acidentário, decorrente de acidente do trabalho e

equiparados e de doenças ocupacionais, e ordinário, de origem não-ocupacional.

O auxílio-acidente é o benefício concedido, como forma de indenização, ao

segurado empregado, exceto o doméstico, ao trabalhador avulso e ao segurado

especial quando, após a consolidação das lesões decorrentes de acidentes de qualquer

natureza, resultar seqüela definitiva que implique em redução da capacidade ou

impossibilidade de desempenho da atividade que habitualmente exercia, mas permitam

o desempenho da mesma ou de outra atividade, respectivamente.

A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes de todas as

categorias de segurados que falecerem, aposentados ou não, não havendo carência

para obtenção do benefício.

Da mesma forma que a pensão por morte, o auxílio-reclusão é o benefício devido

aos dependentes dos segurados de baixa renda recolhido à prisão que não receber

36

remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, aposentado ou

abono de permanência em serviço. É devido apenas durante o período em que o

segurado estiver recolhido à prisão sob regime fechado ou semi-aberto e não há

exigência de carência.

37

5 A PREVIDÊNCIA SOCIAL RURAL

5.1 Histórico

O Presidente Getúlio Vargas assinou, em 7 de maio de 1945, o Decreto-Lei nº

7.526 – Lei Orgânica dos Serviços Sociais, que criou o Instituto de Serviços Sociais do

Brasil (ISSB) e permitiu a unificação de todas as instituições previdenciárias então

existentes e os benefícios do seguro social seriam estendidos a toda a população ativa

do país, sendo a primeira tentativa de inclusão do trabalhador rural entre os

beneficiários da previdência social. No entanto o governo empossado em 1946 não

implementou o ISSB.

Em 23 de setembro de 1955, pela Lei nº 2.613, foi criado o Serviço Social Rural

destinado à prestação de assistência às populações rurais e com previsão de custeio

pelas empresas industriais urbanas. O Serviço Social Rural, por força da Lei Delegada

nº 11, de 11 de outubro de 1962, passou a integrar a Superintendência de Política

Agrária (SUPRA).

A partir da Lei nº 4.214, de 2 de março de 1963, com a aprovação do Estatuto do

Trabalhador Rural houve a inclusão concreta do trabalhador rural no campo da

legislação previdenciária materializada com a criação do Fundo de Assistência e

Previdência do Trabalhador Rural (FUNRURAL). O custeio do FUNRURAL era extraído

da contribuição de 1% do valor da primeira comercialização do produto rural. A

arrecadação era repassada para o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos

Industriários (IAPI), que após um ano de contribuição iniciava a prestação dos

seguintes benefícios: aposentadoria por invalidez, aposentadoria por velhice, pensão

por morte, assistência à maternidade, auxílio-doença, auxílio-funeral e assistência

médica.

A escassez de recursos financeiros limitou a abrangência do Estatuto do

Trabalhador Rural, o que gerou a sua reformulação pelo Decreto-Lei nº 276, de 28 de

fevereiro de 1967. A partir deste Decreto as contribuições passaram a ser gerenciadas

38

pelo Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) e a cobertura ficou limitada às

assistências médica e social. Além disso, a contribuição percentual sobre a primeira

comercialização do produto rural passou a ser de responsabilidade do adquirente,

exceto nos casos em que o produtor processasse a transformação do próprio produto.

O intuito de tal medida era o de facilitar a fiscalização da arrecadação das contribuições

previdenciárias.

Em 10 de maio de 1969 foi criado pelo Decreto-Lei nº 564 o Plano Básico da

Previdência Social com o objetivo de contemplar diretamente os trabalhadores rurais

com serviços previdenciários. Inicialmente amparava exclusivamente os trabalhadores

rurais da agroindústria canavieira e era custeado pelas contribuições de empregados e

empregadores. Com este plano foi acrescentado o benefício de auxílio-reclusão.

Mesmo com ampliação da cobertura previdenciária para outras atividades rurais pelo

Decreto-Lei 704, de 14 de julho de 1969, os objetivos do Plano Básico da Previdência

Social não foram atingidos o que levou o governo a tomar outras medidas no campo da

previdência social rural.

Assim, o Plano Básico da Previdência Social foi extinto em 25 de maio de 1971

pela Lei Complementar nº 11 e substituído pelo Programa de Assistência ao

Trabalhador Rural (Pró-Rural). O Pró-Rural destinava-se à prestação de aposentadoria

por velhice, aposentadoria por invalidez, pensão, auxílio-funeral, serviço social e serviço

de saúde aos trabalhadores rurais e aos seus dependentes e equiparou ao trabalhador

rural o produtor que trabalha na atividade rural sem nenhum empregado. O programa

era executado pelo FUNRURAL que passou a constituir personalidade jurídica de

natureza autárquica. Os pescadores e garimpeiros foram incluídos entre os

beneficiários do Pró-Rural pelos Decretos nº 71.498, de 5 de dezembro de 1972, e nº

75.208, de 10 de janeiro de 1975.

A Lei nº 6.179, de 11 de dezembro de 1974, mesmo sem existir previsão legal de

custeio, criou o amparo previdenciário para os maiores de 70 anos e inválidos

definitivamente incapacitados para o trabalho, que não tivessem outra fonte de renda.

Em 19 de dezembro de 1974 foi criado o Seguro Acidentes do Trabalho Rural.

A partir de 6 de novembro de 1975, pela Lei nº 6.260, os empregadores rurais

foram incluídos entre os beneficiários do FUNRURAL e passaram a ter direito dos

39

seguintes benefícios: aposentadoria por invalidez, aposentadoria por velhice, pensão,

auxílio-funeral, serviços de saúde, readaptação profissional e serviço social.

Os beneficiários rural e urbano eram assistidos pelo FUNRURAL e pelo INPS,

respectivamente, sendo responsáveis pela prestação de benefícios, assistência médica,

assistência social e por toda a estrutura administrativa e financeira de seus respectivos

programas.

Em 1º de setembro de 1977, com a Lei nº 6.439, foi criado o Sistema Nacional

de Previdência e Assistência Social (SINPAS), abrangia várias entidades com

competências específicas. Ao INPS coube a manutenção e concessão de benefícios

aos segurados do próprio INPS e aos beneficiários do FUNRURAL.

O Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS)

respondia pela prestação de assistência médica, tanto aos trabalhadores urbanos

quanto aos trabalhadores e empregadores rurais.

A gestão administrativa, financeira e patrimonial do sistema ficou a cargo do

Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social (IAPAS),

outra autarquia do SINPAS.

A Fundação Legião Brasileira de Assistência (LBA) ficou incumbida da

assistência social às populações carentes.

Integravam ainda o SINPAS, a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor

(FUNABEM), a Empresa de Processamento de Dados da Previdência Social

(DATAPREV) e a Central de Medicamentos (CEME).

A criação do SINPAS marca o início de uma nova etapa, a da universalização do

seguro social no Brasil. A cobertura de aposentadoria por idade para o trabalhador rural

era definida em 65 anos limitada ao homem, os valores das aposentadorias eram de

meio salário mínimo e para a aposentadoria por invalidez era de três quartos do salário

mínimo. Para o custeio, além da alíquota de 2,5% sobre o valor da primeira

comercialização do produto rural, foi criada a de 2,4% sobre a folha de salários urbana.

A população rural que não comprovava atividade foi contemplada pela criação dos

benefícios assistenciais, rendas mensais vitalícias por idade (elegibilidade aos 70 anos)

e por invalidez, com valor também de meio salário mínimo.

40

A partir CF1988 novos parâmetros foram estabelecidos para a população rural:

idade para elegibilidade do benefício aos 60 anos para os homens e 55 anos para as

mulheres (cinco anos a menos do que para os trabalhadores urbanos) e um piso de

benefício igual a um salário mínimo (inclusive para a pensão), além de na prática

universalizar o benefício para toda a população rural. Homens e mulheres tiveram

igualdade de acesso.

O art. 194, parágrafo único, II, da atual Carta Magna, estabelece como um dos

princípios da seguridade social, a uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços

às populações urbanas e rurais. Pretendeu, assim, dar tratamento equivalente, em

matéria de seguridade social, às populações urbanas e rurais. Dessa forma,

considerando que a previdência é uma das áreas da seguridade; considerando, ainda,

que a referida área visa proteger os trabalhadores e seus dependentes quando diante

de incapacidade laboral a previdência deve ser criada e interpretada no sentido de dar

efetividade ao citado princípio. Referido princípio deve ser interpretado em conjunto

com as demais normas constitucionais relacionas aos trabalhadores rurais (PIERDONÁ,

2008, p. 5316).

A Carta Magna de 1988 previu a incorporação dos agricultores em regime de

economia familiar, pescadores e garimpeiros artesanais à previdência social de forma

integral, criando um subsistema especial, processo que ficou conhecido como a

universalização da previdência social rural.

O produtor, o meeiro, o parceiro e o arrendatário rurais, bem como seus

cônjuges, que exercem suas atividades em regime de economia familiar, sem

empregados permanentes, contribuirão para a seguridade social, mediante a aplicação

de uma alíquota sobre o resultado da comercialização da produção, nos termos do § 8º

do art. 195 da CF1988. O pequeno produtor rural, assim definido no texto

constitucional, é considerado segurado especial nos moldes do inciso VII do art. 12 da

Lei n° 8.212/91 (MARTINS, 2005, p. 130 e 131).

41

5.2 O trabalhador rural no RGPS

5.2.1 O trabalhador rural e o empregado rural

O termo trabalhador rural era empregado para denominar tanto o

empregado como o trabalhador rural em regime de subsistência, na dicção do Estatuto

do Trabalhador Rural (Lei nº 4.214, de 02/03/1963). Com o advento da Lei nº 5.889/73,

no seu art. 2º, ficou consagrada a definição do empregado rural, como aquele que

presta serviços de natureza não eventual a empregador rural, sob a dependência deste

e mediante salário.

Como registra Daniela Muradas (ZIBETTI, 2009, p. 201):

O trabalhador rural é o gênero do universo de trabalhadores rurais que prestam serviços a um empregador rural, não importa se este seja uma pessoa física ou uma pessoa jurídica (empresa). Já o empregado rural é uma espécie de trabalhador rural, o empregado tem sempre uma dependência econômica e jurídica com seu empregador, que caracteriza o vínculo empregatício. Enquanto que o trabalhador rural, que não é empregado, presta serviço de natureza rural, sem o vínculo empregatício, pode ser, um empreiteiro, arrendatário ou parceiro.

5.2.2 O segurado especial

O segurado especial enquadra-se no rol dos segurados obrigatórios da

Previdência Social, como está previsto no artigo 195, § 8º da Constituição Federal e no

artigo 11, VII da Lei nº 8.213/91, alterado pela Lei nº 11.718, de 20 de junho de 2008:

Art. 11. São segurados obrigatórios da previdência social as seguintes pessoas físicas: [...] VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de: a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade: 1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;

42

2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2o da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida; b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo.

É segurado na categoria de segurado especial, conforme o inciso VII do art. 9º do

RPS, aprovado pelo Decreto nº 3.048/1999 e a Instrução Normativa INSS/PRES nº 40

de 17 de julho de 2009, a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado

urbano ou rural próximo que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda

que com o auxílio eventual de terceiros.

Assim, segurado especial é o produtor, o parceiro, o meeiro, o arrendatário rural,

o comodatário, o usufrutuário, os assentados, os acampados, os posseiros, os

extrativistas, os foreiros, os ribeirinhos, os remanescentes de quilombos, o índio, o

pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou

em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio de terceiros. (VIANNA, 2005,

p. 148).

A atividade agrícola desenvolvida pelos membros da família em condição de

mútua dependência e colaboração e indispensável à própria subsistência, sem ajuda de

terceiros de forma permanente e independente do valor arrecadado com a transação

comercial é interpretada como regime de economia familiar.

A Lei nº 11.718/2008 reza que, para serem considerados segurados especiais, o

cônjuge ou companheiro e os filhos maiores de dezesseis anos ou os a estes

equiparados deverão ter participação ativa nas atividades rurais do grupo familiar. O

legislador estabeleceu, ainda, que grupo familiar poderá utilizar-se de empregados

contratados por prazo determinado ou trabalhador, em épocas de safra, à razão de, no

máximo, cento e vinte pessoas/dia no ano civil, em períodos corridos ou intercalados ou,

ainda, por tempo equivalente em horas de trabalho.

Para que possamos compreender melhor quem é o segurado especial,

passamos a definir cada atividade acima mencionada e descrita na Instrução Normativa

INSS/PRES nº 40, de 17/07/2009:

43

a) produtor: aquele que, proprietário ou não, desenvolve atividade agrícola, pastoril

ou hortifrutigranjeira, por conta própria, individualmente ou em regime de

economia familiar;

b) parceiro: aquele que tem contrato, escrito ou verbal, de parceria com o

proprietário da terra ou detentor da posse e desenvolve atividade agrícola, pastoril

ou hortifrutigranjeira, partilhando lucros ou prejuízos;

c) meeiro: aquele que tem contrato, escrito ou verbal, com o proprietário da terra ou

detentor da posse e da mesma forma exerce atividade agrícola, pastoril ou

hortifrutigranjeira, partilhando rendimentos ou custos;

d) arrendatário: aquele que comprovadamente, utiliza a terra, mediante pagamento

de aluguel, em espécie ou in natura, ao proprietário do imóvel rural, para

desenvolver atividade agrícola, pastoril ou hortifrutigranjeira, individualmente ou

em regime de economia familiar, sem utilização de mão-de-obra assalariada de

qualquer espécie;

e) comodatário: aquele que, por meio de contrato, escrito ou verbal, explora a terra

pertencente à outra pessoa, por empréstimo gratuito, por tempo determinado ou

não, para desenvolver atividade agrícola, pastoril ou hortifrutigranjeira;

f) condômino: aquele que explora imóvel rural, com delimitação de área ou não,

sendo a propriedade um bem comum, pertencente a várias pessoas;

g) pescador artesanal: aquele que, individualmente ou em regime de economia

familiar, faz da pesca sua profissão habitual ou meio principal de vida, desde que

não utilize embarcação; ou utilize embarcação de até seis toneladas de

arqueação bruta, ainda que com auxílio de parceiro; ou, na condição exclusiva de

parceiro outorgado, utilize embarcação de até dez toneladas de arqueação bruta.

h) mariscador: aquele que, sem utilizar embarcação pesqueira, exerce atividade de

captura ou de extração de elementos animais ou vegetais que tenham na água

seu meio normal ou mais freqüente de vida, na beira do mar, no rio ou na lagoa;

i) usufrutuário - aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural, tem direito à

posse, ao uso, à administração ou à percepção dos frutos, podendo usufruir o

bem em pessoa ou mediante contrato de arrendamento, comodato, parceria ou

meação.

44

Não são segurados especiais aqueles que exploram a atividade agropecuária ou

pesqueira, com o auxílio de empregados, os filhos menores de 21 anos, cujo pai e mãe

perderam a condição de segurados especiais, salvo se comprovarem o exercício da

atividade rural individualmente e o arrendador de imóvel rural, salvo recebimento de

rendimentos decorrentes de exercício de mandato de vereador do município onde

desenvolve a atividade rural, ou de dirigente de cooperativa rural constituída

exclusivamente por segurados especiais

5.2.3 A comprovação de atividade rural

A comprovação do exercício de atividade rural do segurado especial, bem como

de seu respectivo grupo familiar será feita mediante a apresentação junto ao INSS de

um dos seguintes documentos:

a) contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;

b) declaração fundamentada de sindicato que represente o trabalhador rural ou,

quando for o caso, de sindicato ou colônia de pescadores, desde que homologada pelo

INSS;

c) comprovante de cadastro do Instituto Nacional de Colonização e Reforma

Agrária (INCRA);

d) bloco de notas do produtor rural;

e) notas fiscais de entrada de mercadorias;

f) documentos fiscais relativos à entrega de produção rural a cooperativa agrícola,

entreposto de pescado ou outros;

g) comprovantes de recolhimento de contribuição à Previdência Social,

decorrentes da comercialização da produção;

h) cópia da declaração de imposto de renda, com indicação de renda proveniente

da comercialização de produção rural;

45

i) licença de ocupação ou permissão outorgada pelo INCRA ou certidão fornecida

pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI), certificando a condição do índio como

trabalhador rural.

A entrevista constitui-se em elemento indispensável à comprovação do exercício

da atividade rural, a forma em que ela é ou foi exercida, e para confirmação dos dados

contidos em declarações emitidas pelo sindicato que represente os trabalhadores rurais,

sindicato ou colônia de pescadores, com vistas ao reconhecimento ou não do direito ao

benefício pleiteado, sendo obrigatória a sua realização, independente dos documentos

apresentados e sempre que a concessão depender da homologação da declaração do

sindicato.

As bases legais para cobrança de contribuição sindical remontam a Constituição

Federal de 1937 e sua eficácia permanece até os dias atuais por força do art. 8º, inciso

IV da Carta Magna de 1988, neste contexto a contribuição sindical do trabalhador rural

em regime de economia familiar suscita questionamento como posto no entendimento

de Berwanger e Dillenburg:

A cobrança da contribuição sindical rural vem sendo, nos últimos anos, tema de inúmeras discussões e ações judiciais, além de causar transtornos a muitos trabalhadores rurais que, embora pequenos, pois com mão-de-obra própria e familiar, labutam objetivando um resultado econômico indispensável para o sustento familiar e, quando possível, aperfeiçoar a propriedade e melhorar a qualidade de vida (ZIBETTI, 2009; p. 277).

5.3 Financiamento

O segurado especial deve contribuir com 2% da receita bruta oriunda da

comercialização da sua produção (art. 25, I, Lei nº 8.212/91), acrescido de 0,1% para o

custeio das prestações por acidente do trabalho.

É importante ressaltar que para o segurado especial não há salário-de-

contribuição, a base de cálculo é o valor da venda da produção rural, não sendo

obrigatória a contribuição mensal, pois, na maioria das vezes, está comercialização se

dá de forma sazonal.

46

A Carta Magna 1988 universalizou o acesso à seguridade social. A previdência

social foi organizada em três grandes sistemas previdenciários no âmbito federal e

revestiu-se de aspectos protecionistas, “contrapondo-se à tendência global de revisão

dos sistemas previdenciários, com a imposição de regras mais estritas, em busca de

maior equilíbrio atuarial intertemporal” (TAFNER e GIAMBIAGI, 2008, p. 329).

As novas regras instituídas pela CF1988 e demais comandos infraconstitucionais

oneraram o sistema previdenciário brasileiro, face ao aumento do número de potenciais

beneficiários e elevação do piso dos benefícios, resultado de mudanças na previdência

rural, com o aumento do piso para a um salário mínimo, o direito ao benefício a mais de

um membro grupo familiar, além de redução de cinco anos na idade mínima para

aposentadoria por idade.

O desequilíbrio atuarial imposto pelo incremento dos gastos advindos da maior

cobertura de benefícios rurais decorre da não equivalência no custeio dos referidos

benefícios, distanciando o modelo de previdência social brasileiro do perfil de seguro.

Como exposto, a previdência rural brasileira não pode ser considerada

assistencialista; contudo, grande parte dos seus benefícios não apresenta correlação

com rendimentos da fase ativa ou com a base da contribuição.

Sistemas previdenciários podem ser considerados ainda sob duas óticas. Na

primeira, a questão financeira é o aspecto central; nesta, o pagamento de benefícios a

determinado indivíduo deve ter correlação com as contribuições, a outra ótica chama a

atenção para o papel social da previdência, salientando que a busca pelo equilíbrio

financeiro não pode desconsiderar esse aspecto.

Na Constituição de 1988, a previdência foi instituída como direito de todos os

brasileiros, a ser garantido por meio da seguridade social. Com esse intuito a

previdência rural foi beneficiada, considerando os aspectos sociais, com a criação da

possibilidade de aposentadoria, desde que comprovada característica de economia

familiar. Dada a possibilidade de a previdência possuir características que se

contrapõem, pois de um lado tem-se a questão do equilíbrio financeiro e do outro a

política de distribuição de renda, vários autores vêm questionando os efeitos que essas

características possuem na economia.

47

De acordo com Kageyama e Silva (apud TOSTA, 2007, p. 108), o grande

problema da previdência rural está no contraste entre os grupos e regiões que

apresentam o maior número de beneficiários potenciais e aqueles que poderiam ser os

novos contribuintes.

Os maiores grupos de beneficiários potenciais se localizam entre os segurados

especiais em regime de economia familiar da região Nordeste, e os contribuintes

potenciais, passíveis de fiscalização, são categorias que têm contrato de trabalho

formalizado, os quais se concentram nos Estados das regiões Sul e Sudeste. Esse fato

dificulta o aumento da arrecadação da previdência, uma vez que o número de

beneficiários potenciais é relativamente maior que o de contribuintes.

Para Delgado e Castro (2003, p. 6), a forma de financiamento da previdência

rural provoca:

equívoco distributivo, o de trabalhadores pobres do setor urbano financiando trabalhadores mais pobres do setor rural, como também um problema de conflito potencial entre as representações dos trabalhadores urbanos e rurais no Sistema da Previdência Social.

Giambiagi (2007, p. 227) consideram um erro utilizar o sistema previdenciário

com a finalidade de realizar política assistencial, principalmente considerando o valor do

benefício igual ao salário mínimo. Segundo esses autores, uma coisa é retirar pessoas

da pobreza extrema, outra é elevar o valor de seus rendimentos por meio de políticas

de correção real do valor do salário. Além disso, o autor apresenta quatro razões para

considerar esta política um erro:

Primeiro, porque cria um problema fiscal considerável, dada à magnitude dos números envolvidos. Segundo, porque não gera maiores benefícios sociais, contrariamente ao que o país obtém quanto tira de debaixo da linha de pobreza alguém que até então freqüentava a relação dos indigentes. Terceiro, porque limita a oferta de recursos públicos para outras áreas, inclusive sociais: como a bolsa família por exemplo. E quarto, porque instala os incentivos errados na mente das pessoas: o progresso individual sob esta ótica depende mais e mais da suposta benevolência do governo e não do mérito, do trabalho e esforço próprio.

Segundo Beltrão et al. (2000, p. 8), no período de 1988 a 1996 houve

crescimento real na renda das famílias rurais brasileiras, em face do aumento da

participação do idoso na renda familiar, principalmente as mulheres. Segundo esses

autores, é inegável o papel que a previdência rural tem desempenhado na elevação da

renda no campo e, nesse sentido, colaborado com a erradicação da pobreza.

48

De acordo com Schwarzer e Querino (2002, p. 8), os programas de

aposentadorias e pensões não-contributivos, benefícios da assistência social e

previdência rural, têm sido ferramentas extremamente importantes na extensão da

cobertura para amplos setores da sociedade brasileira. Esses benefícios vêm repondo

a renda dos segurados e protegendo-os contra o risco de pobreza.

Além de mostrar a importância da Previdência para a população rural, Schwarzer

e Querino (2002, p. 44) ressaltam que os benefícios previdenciários são focalizados em

um dos grupos mais pobres da sociedade, sendo natural que eles sejam

estruturalmente deficitários quanto ao seu financiamento. De acordo com esses

autores, o uso de impostos é justificado pela teoria dos bens públicos, já que o alívio da

pobreza em grande escala, a redistribuição de renda e a dinamização da economia

como conseqüência do programa previdenciário rural beneficiam a sociedade. Assim,

torna-se necessário aceitar o fato de esse déficit ser financiado pelo Tesouro Nacional,

considerando que este melhora substantivamente as condições de vida de mais de

12% da população, representando, assim, baixo custo, tendo em vista seus bons

resultados.

Afonso e Fernandes (2005, p. 322) analisaram a previdência social e concluíram

que o sistema apresenta características distributivas. Segundo eles, os grupos mais

pobres da população estão obtendo remunerações mais elevadas por suas

contribuições. Estudando as distintas regiões do País, esses autores mostraram que a

previdência funciona como um mecanismo de transferência de renda das regiões mais

ricas para as mais pobres, sendo a região Nordeste a mais beneficiada.

Outra conclusão apontada foi de que a previdência apresenta aspectos

distributivos entre gerações, possibilitando inferir que ela é uma forma de contrato social

vantajosa, sobretudo para os grupos mais jovens e mais pobres.

49

6 CONCLUSÕES

O déficit do RGPS vem aumentando progressivamente após a CF1988, com

impacto negativo para a economia brasileira. O INSS é financiado principalmente pelas

arrecadações, insuficientes no momento para suprir todo o custeio, sendo necessárias

transferências cada vez maiores por parte da União para que o INSS possa honrar seus

compromissos financeiros.

A previdência rural possui características muito peculiares em cada país, e em

sua grande maioria necessita de recursos advindos da sociedade, não sendo capaz de

financiar seu próprio sistema. Dessa forma, fica claro o papel de transferência de renda

da população urbana para a população rural quando se trata da previdência.

A previdência rural brasileira desempenha papel importante nas dificuldades

enfrentadas pelo INSS, isso se deve a sua incapacidade de autofinanciamento. Apesar

das reformas aprovadas com intuito de minimizar o problema de financiamento do

regime, a previdência continua deficitária.

Diante do exposto pode-se concluir que previdência rural brasileira, de um lado,

é utilizada para redistribuir renda a grande parte da população necessitada e, de outro,

ela o faz de forma inadequada, visto que cria um déficit crescente nas contas do

sistema.

Com relação à proteção social, constata-se que a CF1988 não discrimina as

atividades exercidas na área urbana e rural, prevendo equivalência e uniformidade em

seu tratamento. É importante frisar que, a contribuição de forma diferente por parte do

trabalhador rural em regime de economia familiar não fere este princípio, pois a idéia

posta anteriormente não implica em igualdade de tratamento, como se pode perceber

pela forma de contribuição e custeio diferenciada.

Neste contexto de um lado está o sistema de previdência urbana atrelado ao

contrato formal de trabalho a semelhança de um seguro social contratual, isto é, o

financiamento é oriundo das contribuições sociais do empregador, da empresa ou da

entidade a ela equiparada na forma da lei. Do outro o trabalhador rural que exerce suas

atividades em regime de economia familiar, contribui sobre o resultado da

50

comercialização da produção e tem cobertura previdenciária na forma da lei, mesmo

diante da irrelevância ou inexistência da comercialização. Some-se a esta fonte, após a

CF1988, a contribuição urbana como recurso suplementar de financiamento da

previdência rural, sem olvidar as contribuições para fiscais da seguridade social,

sobretudo o Programa de Integração Social (PIS), a Contribuição para o Financiamento

da Seguridade Social (COFINS) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

Existe um equilíbrio significativo no autofinanciamento urbano, concentrando-se

a insuficiência do RGPS na previdência rural. Em 2006 o financiamento da área rural

representou 67,86% da necessidade do financiamento total do regime, contra 32,14%

da urbana. Anteriormente a 2006 a desproporção foi ainda mais marcante (TOSTA,

2007, p. 10).

No que tange à questão trabalhista, na zona rural, é comum se encontrar

trabalhadores rurais com exercício de atividade rural habitual, sob remuneração e em

relação de hierarquia com o proprietário rural, mas vinculados ao RGPS como

segurados especiais. Outros trabalhadores do mercado informal ou desempregados

diante de infortúnios relacionados à incapacidade laboral comprovam atividade rural

junto ao INSS e ingressam no RGPS como segurados especiais. Tais fatos comprovam

que se faz necessário um maior controle, por parte das autoridades, em relação ao

cumprimento das leis trabalhistas e previdenciárias na zona rural e também redefinição

dos critérios para comprovação de atividade rural, sobretudo no que tange a

fiscalização das entidades sindicais.

É indiscutível o alcance social da proteção ao trabalhador rural como forma de

reconhecer igual merecimento frente ao trabalhador urbano, dando dignidade para que

ele possa exercer o seu labor com orgulho, contribuindo para o engrandecimento do

nosso país e permitindo a fixação deste homem a terra, evitando-se o descompasso

social urbano decorrente do êxodo rural. Para que tudo isso aconteça é indispensável

um zelo extremo pela seguridade social inibindo-se as constantes fraudes desferidas

contra a previdência social e buscando-se soluções que promovam um equilíbrio

atuarial e desonere, por conseguinte o trabalhador urbano.

51

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