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CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATU SENSO EM TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL MARIANA FILIPPELLI PRATA RAMOS MANZZUTI MODOS ESQUEMÁTICOS E SUA RELEVÂNCIA NO TRATAMENTO DE INDIVÍDUOS COM TRANSTORNO DE PERSONALIDADE QUE COMETEM ATOS DELITIVOS SÃO PAULO 2016

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CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATU SENSO EM TERAPIA

COGNITIVO-COMPORTAMENTAL

MARIANA FILIPPELLI PRATA RAMOS MANZZUTI

MODOS ESQUEMÁTICOS E SUA RELEVÂNCIA NO

TRATAMENTO DE INDIVÍDUOS COM TRANSTORNO DE

PERSONALIDADE QUE COMETEM ATOS DELITIVOS

SÃO PAULO

2016

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MARIANA FILIPPELLI PRATA RAMOS MANZZUTI

MODOS ESQUEMÁTICOS E SUA RELEVÂNCIA NO

TRATAMENTO DE INDIVÍDUOS COM TRANSTORNO DE

PERSONALIDADE QUE COMETEM ATOS DELITIVOS

Trabalho de conclusão de curso latu sensu Área de concentração: Terapia Cognitivo-Comportamental Orientadora: Prof.ª Dra. Renata Trigueirinho Alarcon Coorientadora: Profª Msc. Eliana Melcher Martins

SÃO PAULO

2016

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Fica autorizada a reprodução e divulgação deste trabalho, desde que citada a fonte.

Manzzuti, Mariana F. P. R.

Modos esquemáticos e sua relevância no tratamento de indivíduos com transtorno de personalidade que cometem atos delitivos. Mariana Filippelli Prata Ramos Manzzuti, Renata Trigueirinho Alarcon – São Paulo, 2016. 37f. + CD ROM Trabalho de Conclusão de Curso (especialização) – Centro de Estudos em Terapia Cognitivo-Comportamental (CETCC)

Orientação: Profª Renata Trigueirinho Alarcon

1. Terapia do Esquema, 2. Modos Esquemáticos, 3. Transtorno de Personalidade, 4. Crime. I Manzzuti, Mariana Filippelli Prata Ramos. II Alarcon, Renata Trigueirinho. III Martins, Eliana Melcher

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Mariana Filippelli Prata Ramos Manzzuti

Modos esquemáticos e sua relevância no tratamento de indivíduos com

transtorno de personalidade que cometem atos delitivos

Monografia apresentada no Centro de Estudos em Terapia Cognitivo-

Comportamental como parte das exigências para obtenção do título

de Especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental.

BANCA EXAMINADORA

Parecer: ___________________________________________________

Prof. Título:_________________________________________________

Parecer: ___________________________________________________

Prof. Título:_________________________________________________

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Àquela que preencheu minha vida de

sentido, Giovanna

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AGRADECIMENTO

Ao meu bem mais precioso, minha filha Giovanna Filippelli Manzzuti, que ao vir ao

mundo despertou em mim a vontade de ir além em todos os aspectos de minha vida,

inclusive o acadêmico e profissional.

À minha mãe, Elisabete Filippelli Prata Ramos, pelo exemplo de força, dedicação,

apoio e amor incondicional. Além do fato de ter me apresentado à psicologia, sua

formação.

Ao meu esposo, Rafael Manzzuti Teixeira, pelo incentivo para crescimento e

aperfeiçoamento constante, embora a psicologia lhe seja um campo desconhecido.

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RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo apresentar a Terapia do Esquema (TE),

ainda pouco divulgada no Brasil, bem como pesquisar como o trabalho com Modos

Esquemáticos (MEs), que é um dos conceitos centrais desta terapia, pode auxiliar

no tratamento de pessoas com transtorno de personalidade que cometeram atos

delitivos. De forma geral, a criminalidade presente em nossa sociedade representa

um problema grave e, portanto, demanda um olhar atento aos sujeitos que adotam

práticas criminosas. A revisão bibliográfica feita demonstrou que a TE tem se

mostrado eficaz no atendimento de variadas demandas e o trabalho específico com

ME auxiliado na redução de recidivas bem como de comportamentos agressivos

daqueles que praticaram crimes. No entanto, no Brasil ainda há pouco conteúdo

divulgado acerca do tema e faz-se necessário salientar a relevância do

desenvolvimento de novos estudos que apontem dados específicos da população

brasileira para que assim seja possível abrir um leque de futuras intervenções.

Palavras-Chave: Terapia do Esquema, Esquemas Iniciais Desadaptativos, Estilos de

Enfrentamento, Modos Esquemáticos, Transtorno de Personalidade, Crime.

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ABSTRACT

This study aims to present the Schema Therapy (ST), still little known in Brazil, as

well research how to work with Schema Modes (SM) , which is one of the central

concepts of this therapy, can help treat people with personality disorder who have

committed criminal acts. In general, criminality is a serious problem in our society and

therefore demands a special attention to they that adopt criminal practices. The

literature review showed that the ST has been proven effective to treat varied

demands and the specific work with SM aided in reducing recurrence and aggressive

behavior of those who committed crimes. However, in Brazil there is still little content

published about it and it is necessary to stress the importance of developing new

studies that point specific data of the population so that can open up a range of future

interventions .

Keywords: Schema therapy, Initial Maladaptive Schemas, Coping Styles, Schematics Modes, Personality Disorder, Crime

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................11

2. OBJETIVOS ....................................................................................................13

3. METODOLOGIA .............................................................................................14

4. RESULTADOS ...............................................................................................15

4.1. TEORIA DO ESQUEMA ...........................................................................15

4.2. DOMÍNIOS ESQUEMÁTICOS E ESQUEMAS INICIAIS

DESADAPTATIVOS .................................................................................17

4.3. ESTILOS DE ENFRENTAMENTO ...........................................................19

4.4. MODOS ESQUEMÁTICOS ......................................................................20

4.5. TRANSTORNO DE PERSONALIDADE ...................................................26

4.6. MODOS ESQUEMÁTICOS NA CLÍNICA FORENSE ...............................29

5. DISCUSSÃO ...................................................................................................32

6. CONCLUSÃO .................................................................................................34

REFERÊNCIAS...............................................................................................35

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LISTA DE TABELAS Tabela 1. Descrição dos modos esquemáticos e suas condutas características.

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1 INTRODUÇÃO

A partir da década de 90, abordagens consideradas como sendo da “terceira

onda” foram desenvolvidas, dentre elas a Terapia do Esquema (TE). Tais

abordagens fundamentam seu entendimento em teorias como a evolucionista ou até

mesmo a psicanálise, além das ciências cognitivas, neurociência e análise do

comportamento. A característica em comum destas é, portanto, o perfil integrativo,

que busca unificar escolas tanto no que diz respeito à fundamentação teórica quanto

às técnicas. (FBTC, 2014)

Jeffrey Young, desenvolvedor da TE, apontou a necessidade de integrar

fundamentos e técnicas para tratar pacientes com Transtornos de Personalidade,

bem como aqueles com problemáticas crônicas, já que não respondiam de maneira

eficaz ao tratamento proposto pela TCC. (YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR, 2008)

Considerando que aproximadamente 13% da população apresentam

transtorno de personalidade, é possível entender a relevância de uma abordagem

que possa atender esta demanda. (APA, 2014)

Hoje, a TE é uma das abordagens da “terceira onda” com maior projeção.

Embora em um primeiro momento tenha sido desenvolvida para trabalhar os

transtornos de personalidade, rompeu barreiras e hoje atende diferentes

problemáticas. Uma das principais diferenças dela com a TCC é que, além de ajudar

o paciente a se conscientizar da origem de seus problemas, dá maior ênfase às

estratégias vivenciais. (FBTC, 2014).

Beck (2013) pontua que esquema é uma estrutura que filtra, codifica e avalia

os estímulos. Sendo assim, cada indivíduo interpretará suas vivências mais

significativas com base em seus esquemas.

Ao desenvolver sua teoria, Jeffrey Young amplia o conceito de esquemas e

apresenta o termo “esquemas iniciais desadaptativos” para se referir ao nível mais

profundo de cognição. Neste, estão contidos os afetos, crenças e memórias que

cada pessoa tem de si, do outro e do mundo. (YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR,

2008)

O trabalho com modos esquemáticos é posterior a TE, e surge com a

intenção de atender a população ainda mais comprometida que, embora fossem

psicoeducadas e tivessem intervenção terapêutica nesta teoria, tinham dificuldade

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em absorver todo o conhecimento acerca de seu funcionamento visto que muitas

são as emoções e comportamentos desencadeados pelos vários esquemas

ativados. (WAINER; WAINER, 2016)

Estudos recentes têm apontado a contribuição do trabalho com modos de

esquema no tratamento terapêutico de pacientes com Transtorno de Personalidade

no campo forense, cujo objetivo é diminuir a probabilidade de recidivas de crimes

bem como do comportamento violento, muito presente nesta população. Desta

forma, o presente trabalho, através de revisão bibliográfica, pretende apontar quais

são estas contribuições.

No decorrer da monografia, o leitor será apresentado de forma geral à teoria

de Jeffrey Young, aos esquemas iniciais desadaptativos e ao estudo que vem sendo

realizado com modos esquemáticos.

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2 OBJETIVOS

O objetivo do trabalho é apresentar ao leitor os conceitos da Terapia do

Esquema. Este foca também em apontar as contribuições e vantagens do trabalho

com Modos em Terapia do Esquema no tratamento de pacientes com Transtorno de

Personalidade e que cometem atos delitivos.

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3 METODOLOGIA

Tanto livros de referência quanto artigos científicos foram utilizados para

desenvolvimento do trabalho.

Os livros que fundamentam a teoria foram escritos pelo próprio desenvolvedor

da mesma, ou por autores que dedicam-se a pesquisas acerca do tema.

Os artigos científicos foram pesquisados nas seguintes bases de dados:

Scielo, Pubmed, Google Acadêmico e Researchgate. As expressões utilizadas

foram: “terapia do esquema” (ou “Schema Therapy”), Modos Esquemáticos (ou

“Schema Modes”), “Scheme in Forensic Settings”, “Coping Styles” e “Personality

Disorderers”.

Visto a pequena quantidade de conteúdo escrito acerca do tema até os dias

atuais, foram utilizados artigos dos últimos 10 anos. Artigos cuja metodologia era

revisão bibliográfica também não foram utilizados no presente estudo.

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4 RESULTADOS

1.1. TERAPIA DO ESQUEMA

Antes de desenvolver a Terapia do Esquema, Jeffrey Young passou por uma

jornada de descobertas em sua passagem por outras linhas psicoterápicas.

Durante a universidade em 1975, aproximadamente, estudou a abordagem

não diretiva de Carl Rogers e incomodou-se por ter que se colocar na posição

exclusiva de ouvinte, parafraseando as frases do paciente para que ele próprio

chegasse as suas conclusões. Considerava que o tempo gasto para que resultados

fossem percebidos era demasiado longo. Interessou-se então pela Teoria

Comportamental (TC) e, posteriormente, após notar que manter um foco exclusivo

no comportamento dos indivíduos acabava ignorando seus pensamentos e

emoções, pela Teoria Cognitivo-Comportamental (TCC) de Aaron Beck. Tendo

aderido a esta linha psicoterápica, com o passar do tempo reuniu um leque de

pacientes que não respondiam adequadamente ao breve tratamento. (YOUNG;

KLOSKLO, 1994)

Considerando as barreiras que teve na aplicação da TCC em uma série de

pacientes, Jeffrey Young reuniu as características comuns a estes e, objetivando

atender de forma efetiva esta população, notou que integrar os componentes de

variadas abordagens era mais significativo do que utilizar cada um separadamente.

Em meados da década de 90, então, a TE foi desenvolvida. (YOUNG; KLOSKLO,

1994).

A TE reúne elementos provenientes da Gestalt, Psicanálise, Construtivismo,

Teoria do Apego e das Relações Objetais, além da TCC, neurociência e análise do

comportamento. Com a proposta integrativa típica das abordagens da “terceira

onda”, Jeffrey Young e colaboradores unem os elementos necessários para propor

um tratamento adequado aos pacientes com Transtorno de Personalidade e àqueles

com demandas difíceis ou refratárias. (WAINER; RIJO, 2016; YOUNG; KLOSKO;

WEISHAAR, 2008)

Os conceitos da TCC tradicional são ampliados no sentido de dar maior

ênfase à investigação das origens infantis e adolescentes dos problemas

psicológicos, às técnicas emotivas (ou vivenciais), à relação terapeuta-paciente, bem

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como aos estilos desadaptativos de enfrentamento. Além disso, a TE busca focar

nas questões caracterológicas do transtorno, ao invés de manter seu olhar voltado

para os sintomas psiquiátricos agudos (por exemplo: depressão, ansiedade, ataques

de pânico, etc). (YOUNG; KLOSKO; WEISHAAR, 2008)

Na visão de Young (2003), a terapia cognitiva tradicional de curto prazo se

mostra limitada no tratamento de certas demandas visto que estes pacientes não

conseguem atender os pressupostos básicos da teoria, tais como: acessar, a partir

de breve treinamento, seus pensamentos, emoções e imagens mentais; ter

condições para identificar e delimitar problemas; ter motivação para aprender

estratégias de autocontrole bem como realizar as tarefas; ter engajamento na

relação colaborativa com o terapeuta, entre outros.

Os conceitos teóricos da TE que mais se destacam são os Esquemas Iniciais

Desadaptativos (EIDs), os Domínios Esquemáticos (DEs), os Estilos de

Enfrentamento e os Modos Esquemáticos (MEs). O modelo tem auxiliado no

entendimento da relação entre as vivências infantis e as disfunções e/ou

psicopatologias e acaba, portanto, por considerar um nível ainda mais profundo de

cognição. (WAINER; RIJO, 2016)

Durante o processo de avaliação, ocorre a identificação dos esquemas iniciais

desadaptativos que estão ativados no paciente. Este processo contempla, além de

relatos e observações, a aplicação de questionários: questionário de esquemas,

questionários de estilos de enfrentamento (evitação e hipercompensação) e

questionário de identificação de modos esquemáticos. Após psicoeducação sobre

seus esquemas, o terapeuta inicia o trabalho com técnicas cognitivas, vivenciais e

comportamentais visando que o paciente desenvolva uma forma diferente de

encarar, interpretar e reagir aos estímulos. (YOUNG; KLOSKO; WEISHAAR, 2008).

Recentemente, o Questionário de Esquemas (YSQ-S2) passou por um estudo de

validação para a população brasileira. Este apresentou resultados satisfatórios de

fidedignidade e de capacidade de discriminação. (CAZASSA; OLIVEIRA, 2012)

Importante ressaltar que formas alternativas de trabalho com a TE estão

sendo criadas objetivando complementá-la, principalmente com foco na população

cuja habilidade verbal seja prejudicada, tais como drama, arte, movimento, música e

versões de terapia em grupo – todas com base nos conceitos da TE. (BERNSTEIN;

ARNTZ; DE VOS,2007)

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1.2. DOMÍNIOS ESQUEMÁTICOS E ESQUEMAS INICIAIS

DESADAPTATIVOS

Os esquemas iniciais desadaptativos (EIDs) são definidos como “padrões

emocionais e cognitivos autoderrotistas iniciados em nosso desenvolvimento desde

cedo e repetidos ao longo da vida” (YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR, 2008, p. 22) e,

assim como nos esquemas mentais da TCC tradicional, os EIDs são estruturas que

armazenam crenças, suposições, regras, sensações corporais e memórias diversas

(WAINER; RIJO, 2016). São, portanto, estruturas estáveis e duradouras que se

desenvolvem e se cristalizam na personalidade do sujeito desde a remota infância

até os dias atuais. (YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR, 2008). Propõe-se que os EIDs,

geralmente se desenvolvem a partir das primeiras experiências com as figuras

significativas e, na maior parte das vezes, são frutos de experiências traumáticas

que impedem a satisfação das necessidades emocionais básicas que são: os

vínculos seguros com pessoas (incluindo proteção, estabilidade e segurança);

autonomia, competência e senso de identidade; liberdade de expressão

(necessidades, pensamentos e emoções); espontaneidade e lazer; limites realistas e

autocontrole. (YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR, 2008)

Além dos fatores externos, o temperamento da pessoa também tem grande

influência no desenvolvimento dos esquemas desadaptativos, pois este pode tanto

potencializar quanto minimizar os estímulos favoráveis ou tóxicos do ambiente e, em

alguns casos, sobrepujar o ambiente, fazendo com que o indivíduo desenvolva

patologias aparentemente inexplicáveis em seu contexto familiar. (YOUNG,

KLOSKO, WEISHAAR, 2008)

Considera-se então, que os EIDs são gerados por uma interação entre três

fatores: temperamento, vivências infantis com figuras de afeto e o grau de satisfação

das necessidades emocionais básicas. (WAINER; RIJO. 2016)

Os esquemas do sujeito podem ser identificados por algumas características

marcantes, tais como: por serem padrões autoperpetuadores, resistentes a

mudança, disfuncionais em nível significativo e por estarem ligados a alto grau de

afeto. O terapeuta deverá, portanto, estar atento a tais características para que

possa encontrar a melhor forma de intervenção. (YOUNG, 2003)

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Jeffrey Young e colaboradores esquematizaram uma compreensão dinâmica

dos esquemas e os agruparam em cinco categorias chamadas de Domínios

Esquemáticos (DEs). Atualmente, falam-se em 19 esquemas identificados pela TE.

(WAINER; RIJO. 2016)

O DE de desconexão e rejeição relaciona-se com a incapacidade de formar

vínculos seguros e satisfatórios. Neste domínio encontram-se os esquemas de

abandono/instabilidade, desconfiança e abuso, privação emocional,

defectividade/vergonha, isolamento social/alienação e indesejabilidade social. Por

ser possível dizer que as negligencias, abusos e traumas são as principais fontes

dos esquemas desse DE, o afeto é a necessidade emocional básica a ser suprida no

trabalho terapêutico (WAINER; RIJO, 2016; YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR, 2008).

O segundo DE, de autonomia e desempenho prejudicados, compreende

sentimento de incapacidade de moldar seu próprio senso de identidade, de

estabelecer objetivos pessoais e dominar habilidades para tal. Os esquemas deste

domínio são dependência/incompetência, vulnerabilidade a dano/doença,

emaranhamento e fracasso. Referente a estes esquemas, o terapeuta deverá focar

em dar oportunidade ao sujeito de desenvolver sua autonomia e de explorar seu

ambiente, visto que foram superprotegidas ou criticadas em excesso quando

crianças. (WAINER; RIJO, 2016; YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR, 2008).

Quando se fala no DE de limites prejudicados, o indivíduo não desenvolveu

limites internos adequados com relação a reciprocidade e autodisciplina. Sendo

assim, podem apresentar dificuldade em respeitar os direitos de outras pessoas,

cooperar, bem como cumprir metas e objetivos. Fazem parte deste DE os esquemas

de merecimento/grandiosidade, autocontrole e autodisciplina insuficientes. Neste DE

deve-se considerar tanto uma origem familiar excessivamente permissiva, quanto

uma com comportamentos de superioridade, que recusa-se a colaborar e enxergar

as necessidades do outro. O terapeuta deverá trabalhar no sentido de desenvolver

diretrizes para a vida em sociedade. (WAINER; RIJO, 2016; YOUNG, KLOSKO,

WEISHAAR, 2008).

O quarto DE é chamado de orientação para o outro. Objetivando obter

aprovação, manter conexão emocional e evitar conflito, as pessoas nesse domínio

focam em demasiado na necessidade do outro em detrimento de suas próprias.

Aqui, englobam-se os esquemas de subjugação, autossacrifício e busca de

aprovação/busca de reconhecimento. Os indivíduos nesse domínio geralmente

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suprimem tanto a raiva e as necessidades naturais que não as reconhecem. O

terapeuta ajudará o paciente a identificar e validar sentimentos e necessidades.

(WAINER; RIJO, 2016; YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR, 2008).

O quinto e último DE, supervigilância e inibição, caracteriza-se pela supressão

dos sentimentos e impulsos. Os indivíduos mantêm-se firmes em suas regras rígidas

e inflexíveis internalizadas que dizem respeito a um ótimo desempenho em

detrimento da felicidade, relaxamento, auto-expressão, boa saúde e

relacionamentos íntimos. A este domínio, pertencem os seguintes esquemas:

negativismo/pessimismo, inibição emocional, padrões inflexíveis/postura crítica

exagerada, postura punitiva. Aqui, o terapeuta ajudará o paciente a predizer o futuro

objetivamente, auxiliá-los a se tornar mais expressivos e espontâneos

emocionalmente e a reduzir seus padrões inflexíveis e postura hipercrítica.

(WAINER; RIJO, 2016; YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR, 2008).

1.3. ESTILOS DE ENFRENTAMENTO

Os EIDs são mantidos basicamente por três razões: os pacientes evitam

situações que poderiam corrigi-los; buscam pessoas e situações que os confirmarão;

ou estão incapazes de enxergar as nuances dos mesmos. (GENDEREN;

RIJKEBOER; ARNTZ, 2012).

Estas formas de lidar com os esquemas foram aprendidas na infância para

que fosse possível sobreviver diante de situações difíceis e, embora muitas vezes

tivessem sido funcionais no passado, hoje servem somente para perpetuar EIDs

(GENDEREN; RIJKEBOER; ARNTZ, 2012).

Young, Klosko, Weishaar (2008) aponta que de maneira crônica e

generalizada, pacientes caracterológicos desenvolvem pensamentos, emoções e

comportamentos que perpetuam esquemas, ou seja, recriam constantemente, de

forma involuntária, situações adversas da infância nos contextos atuais.

Estilos de enfrentamento são, portanto, processos que ocorrem em três

grandes esferas: cognitiva, afetiva e comportamental de longo prazo. Dentro de cada

uma destas esferas, poderá haver um processo de manutenção, evitação ou

hipercompensação de um ou mais esquemas desadaptativos. (YOUNG, 2003)

No processo de manutenção, os EIDs são reforçados. Na esfera cognitiva,

esta manutenção acontece quando o indivíduo supervaloriza informações que

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confirmem seu esquema e desvaloriza as que o contradigam. No que tange os

comportamentos, os padrões costumam ser autoderrotistas. Considera-se a idéia de

que na manutenção esquemática, os pacientes frequentemente sentem-se

desesperançados a mudar seus padrões, mesmo depois de tê-los reconhecido e

aprendido a monitorá-los. (YOUNG, 2003)

Na evitação, quando esquemas são ativados diante de afetos desagradáveis,

a pessoa cria mecanismos de defesa para evitar tanto o acionamento do esquema

quanto o sentimento a ele conectado. Assim como na manutenção, a evitação

também ocorre em diferentes campos. No cognitivo, o indivíduo buscará recursos

para bloquear pensamentos e imagens que venham a acionar o esquema. Já no

afetivo, há foco em interromper sentimentos desencadeados pelos esquemas,

diferente do comportamental onde a pessoa evitará situações e circunstâncias da

vida real que possam desencadear conteúdos dolorosos. No geral, o ônus da

evitação esquemática consiste na não questionalização deste esquema/padrão de

vida, que impede que os conteúdos sejam trabalhados e de fato percam a

intensidade. Desta forma, a demanda real continua latente visto que momentos

propícios para validar ou refutar esquemas são repelidos. (YOUNG, 2003)

Por último, na compensação, o indivíduo adota estilos cognitivos, afetivos e

comportamentais que aparentam ser o oposto do que se prediria a partir do

conhecimento de seu esquema. Sendo assim, o paciente pode se tornar incapaz de

reconhecer a vulnerabilidade subjacente que o torna despreparado para lidar com a

grande dor emocional que o invadirá caso a compensação falhe. (YOUNG, 2003)

O trabalho psicoterápico objetiva psicoeducar o paciente acerca de seus

estilos de enfrentamento disfuncionais a fim de gerar maior adaptabilidade à vida

atual e aos novos relacionamentos. (WAINER; RIJO, 2016)

1.4. MODOS ESQUEMÁTICOS

O surgimento do trabalho com modos esquemáticos é posterior ao

desenvolvimento da Terapia do Esquema. Wainer; Wainer (2016) aponta que,

embora resultados positivos fossem obtidos através do enfoque na psicoeducação e

intervenção nos esquemas, observou-se que pacientes mais comprometidos tinham

dificuldade em absorver todo o conhecimento acerca da estrutura e funcionamento

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de sua personalidade, uma vez que era grande a quantidade de emoções e

comportamentos desencadeados pelos vários esquemas ativados.

Mas afinal, o que seriam modos esquemáticos? “É um conjunto de esquemas

ou operações de esquemas – adaptativos ou desadaptativos – que estão ativados

no indivíduo em um dado momento” (YOUNG; KLOSKO; WEISHAAR, 2008, p. 239).

Também são definidos como “padrões característicos de funcionamento do indivíduo

(principalmente nas relações interpessoais) que agrupam em si certo número de

esquemas iniciais desadaptativos e processos esquemáticos” (WAINER; RIJO,

2016, p. 52 e 53).

De forma geral, os modos esquemáticos representam um estilo global de

funcionamento da pessoa, em determinadas situações, onde ocorrem ativações

emocionais relacionadas aos esquemas. (WAINER; RIJO, 2016)

A princípio, o trabalho com modos foi desenvolvido para tratar o grupo de

pacientes com Transtorno de Personalidade Borderline ou Narcisista. Atualmente,

este se tornou parte integrante da TE. No entanto, há diferença no foco: enquanto

para pacientes com melhor funcionamento este método é secundário e configura um

componente avançado do tratamento, nos pacientes com transtorno de

personalidade o método é básico. (YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR, 2008)

Podendo ser utilizado com várias demandas, os modos (assim como os

esquemas), portanto, estão presentes em todos os indivíduos, não somente

naqueles com questão crônica e/ou difícil. Em cada um, há variação no grau que os

modos operam. As pessoas mais saudáveis são menos dominadas pelos modos

desadaptativos, ou seja, são mais independentes deles. Isso não impede, porém,

que o indivíduo não sinta, por exemplo, raiva, tristeza ou frustração, mas é capaz de

controlar suas emoções e comportamentos para dar uma resposta assertiva.

(GENDEREN; RIJKEBOER; ARNTZ, 2012)

Como dito anteriormente, há uma grande quantidade de emoções e

comportamentos desencadeados pelos muitos esquemas ativados e isto dificulta o

entendimento do funcionamento do paciente caracterológico. A linguagem de modos

pode ser uma facilitadora, pois o paciente pode compreender melhor sua maneira de

agir e, por consequência, adquirir a capacidade de se auto monitorar, além de

facilitar também a compreensão dos objetivos terapêuticos (WAINER; WAINER,

2016).

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“Enquanto os esquemas mentais, entre eles os esquemas iniciais

desadaptativos, são traços da personalidade, os modos esquemáticos são como

‘estados’ ativados em situações momentâneas” (WAINER; WAINER, 2016, p. 148).

Sendo eles estados ativados em determinadas situações, pode-se constatar que um

modo é proeminente na pessoa com alguns modos desadaptativos, porém

importante observar que há outros atuando em segundo plano (GENDEREN;

RIJKEBOER; ARNTZ, 2012). A transição de um modo adaptativo para um

desadaptativo pode acontecer quando as necessidades emocionais básicas não

atendidas daquele sujeito são revividas através do acionamento de um esquema.

(WAINER; RIJO, 2016)

Além das situações apresentadas, existem outras em que o terapeuta pode

cambiar da abordagem de esquemas para a de modos, tais como: quando a terapia

aparenta estar estagnada e o terapeuta não consegue ultrapassar a barreira dos

estilos de enfrentamento de evitação e hipercompensação relacionados aos

esquemas subjacentes; quando o paciente é demasiado autopunitivo e autocrítico;

ou quando o paciente tiver um conflito que aparente ser insolúvel. (YOUNG,

KLOSKO, WEISHAAR, 2008)

Após ser desenvolvido um modelo de modos voltado para os Transtornos de

Personalidade Borderline e Narcisista, um similar vem sendo desenvolvido e

abrange outros distúrbios da personalidade. (GENDEREN; RIJKEBOER; ARNTZ,

2012). Os modos utilizados hoje estão apresentados na tabela 1.

Tabela 1. Descrição dos modos esquemáticos e suas condutas características

MODOS CRIANÇA

MODO DESCRIÇÃO CONDUTA CARACTERÍSTICA

Criança vulnerável

A pessoa tem crenças de que

ninguém suprirá suas necessidades

emocionais. Tende a acreditar que os

outros a abandonarão ou mesmo

abusarão dela. Sente-se excluída e

rejeitada

Busca desesperadamente a ajuda

do terapeuta, de forma infantil e

totalmente vulnerável. Demonstra

estar em situação de risco e que o

ambiente é perigoso.

Criança zangada

O sujeito sente-se injustiçado por

suas necessidades não estarem

sendo atendidas. Demonstra raiva e

até mesmo fúria. Suas percepções

podem incluir traição, abandono e

rebaixamento.

Expressão verbal e física da raiva e

solicitação hostil de seus direitos

(i.e, necessidades emocionais

básicas). Pode ter expressões não

verbais de indignação como uma

criança de tenra idade.

Criança impulsiva

A pessoa age impulsivamente,

buscando satisfazer desejos (não

centrais) de forma egoísta e

descontrolada. Pode se tornar

Demonstra comportamentos

irrefletidos e, até mesmo de risco

para si e para os outros na busca

de sua satisfação. Pode parecer

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enraivecida caso não se sinta

realizada.

como uma criança mimada na

insistência para com os seus

desejos.

Criança indisciplinada

Demonstração de total falta de

tolerância à frustração, não

suportando qualquer desconforto em

tarefas de rotina ou aborrecidas.

Nenhuma tolerância ao menor grau de

dor, conflito ou persistência.

Demonstra todo o seu desagrado

em realizar suas rotinas ou aquelas

atividades que considere

enfadonhas. A birra pode aparecer

na fuga de atividades e/ou

compromissos assumidos.

Criança feliz Sente-se amada, conectada,

compreendida, validada e satisfeita.

Mostra-se autoconfiante e

encorajada a agir de forma

autônoma e competente. Expressa

espontaneidade no contato e

otimismo, assim como uma criança

feliz no brincar ou jogar.

MODOS PAIS DISFUNCIONAIS INTERNALIZADOS

MODO DESCRIÇÃO CONDUTA CARACTERÍSTICA

Pai/mãe punitivo

O paciente mostra-se agressivo,

intolerante e crítico consigo mesmo.

Está sempre se criticando e se

culpando. Seus julgamentos

demonstram intolerância para com os

erros e considera que estes devem

ser punidos.

O paciente age como uma "réplica"

do cuidador internalizado. Tende a

modificar seu tom de voz, e suas

expressões são muito semelhantes

às que seu pai/mãe tinha quando o

criticava/punia.

Pai/mãe exigente

O paciente sente que precisa agir de

acordo com as regras e padrões

rígidos elevados. A busca por

competência e eficiência é central

quando da ativação deste ME. O

indivíduo nunca se sente satisfeito

com seu desempenho, pois há

sempre algo a melhorar.

O autocriticismo e a insatisfação

consigo mesmo e com os outros ao

seu redor são típicos de seu

funcionamento. Costuma ser

prolixo ao relatar suas falhas e fica

muito focado no que deveria ter

previsto para não ter falhado.

MODOS DE ENFRENTAMENTO DESADAPTATIVO

MODO DESCRIÇÃO CONDUTA CARACTERÍSTICA

Capitulador complacente

A fim de evitar possíveis agressões ou

outras consequências desagradáveis,

o sujeito submete-se aos desejos dos

outros, desconsiderando os seus

próprios. Ele suprime suas

necessidades, bem como emoções,

co medo de represálias

A característica mais marcante é a

obediência cega, que ocorrerá

também em relação ao terapeuta.

O indivíduo busca identificar o que

os outros almejam e age de acordo.

Pode permitir, inclusive, abuso e

maus-tratos.

Protetor desligado

A função principal deste ME é a fuga

de emoções negativas. Para tanto, o

paciente desconecta-se de suas

emoções, agindo de modo robótico ou

de forma completamente desligada da

realidade.

São diversas as condutas

englobadas por este ME. É a forma

mais comum de resistência ao

processo terapêutico. O paciente

pode se sentir vazio, chateado e

desatento. Despersonalização e

desrealização são comuns. Esse

ME pode, ainda, assumir a forma

de atitudes cínicas e pessimistas a

fim de manter os outros afastados.

Protetor autoaliviador

O paciente busca distrações para

evitar sentimentos negativos. Entre

elas são comuns: dormir, abusar de

substâncias, trabalhar em excesso e

apresentar compulsão por jogos,

internet, sexo ou esportes.

A postura do paciente é similar à do

ME do protetor desligado, mas ele

tende a ser mais vinculado no

contato, dando muita ênfase às

suas formas de distração. Justifica-

as de modo insistente e racional.

Hipercompensador O ME hipercompensador é um Cada vez mais formas de

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conjunto de maneiras de lidar com as

situações em que o paciente busca

aliviar o desconforto da ativação de

EIDs por meio de "exageros"

hipercompensação são descritas

para os diversos transtornos da

personalidade. As mais típicas são

o autoengrandecimento e o

provocador e ataque.

MODOS HIPERCOMPENSADORES

MODO DESCRIÇÃO CONDUTA CARACTERÍSTICA

Autoengrandecedor Crença em ser superior e diferente

dos demais, tendo direitos especiais.

Insistência em ter o que deseja e

em ser apto para o desafio a que

se propuser. Mostra-se arrogante,

egoísta e abusador com os outros.

Quando criticado, age de modo

irônico e agressivo, humilhando

aqueles que o ofenderam.

Provocativo e Ataque

O temor de ser controlado ou ferido

pelos outros faz o indivíduo se

antecipar, buscando controlar os

comportamentos dos demais por meio

de ameaças ou agressões.

A relação com o paciente quando

este ME está ativado é difícil, pois

ele se utiliza de ameaças,

intimidações e todos os tipos de

agressão para forçar seu controle.

Pode demonstrar um prazer sádico

em sua posição de dominante.

Obsessivo

Supercontrolador

O indivíduo busca controlar, por meio

da tentativa de predizer e controlar

excessivamente todas as

contingências do ambiente, supostas

ameaças do ambiente

O paciente é prolixo, cheio de

rituais (todos racionalmente

justificados) e usa repetições e

verificações

Paranoide

O paciente tenta proteger-se de

possíveis ameaças por meio da

verificação insistente das intenções

por detrás do comportamento dos

outros.

A desconfiança é o mecanismo

predominante nas relações, o que

faz o sujeito não ser espontâneo e

ter grande dificuldade de falar de

aspectos mais íntimos de sua vida.

Enganador e Manipulador

O objetivo desse ME é evitar

responsabilizações e punições por

meio de intrigas, mentiras e

manipulações.

A conduta tende a ser

exageradamente sedutora,

buscando enganar e vitimizar o

outro na relação. Busca, assim,

atingir seus interesses pessoais.

Predador

ME estudado em pacientes

psicopatas. Caracterizado pela

eliminação de ameaças, rivais,

obstáculos e inimigos.

Age de modo frio e calculado e não

demonstra remorsos ou qualquer

forma de arrependimento.

MODO ADULTO SAUDÁVEL

MODO DESCRIÇÃO CONDUTA CARACTERÍSTICA

Adulto saudável

O sujeito busca relações e atividades

positivas, identificando e buscando

neutralizar pensamentos e

sentimentos negativos a seu respeito.

O paciente consegue identificar

suas necessidades emocionais não

atendidas e, de modo organizado e

racional, busca meios para tentar

supri-las na medida do possível.

Demonstra tolerância à frustração e

capacidade de planejamento.

Fonte: Extraído de Wainer;Wainer (2016)

Pode-se dizer que cada modo corresponde a forma como a pessoa

desenvolveu para lidar com as demandas de sua infância, buscando atender suas

necessidades emocionais básicas. Considerando que cada paciente tem uma

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dinâmica individual, suas características devem ser investigadas, validadas,

psicoeducadas e trabalhadas. Através deste trabalho, o terapeuta torna-se capaz de

adaptar os passos do processo àquela pessoa em especial. Este conhecimento

também ajudará o terapeuta a lidar e psicoeducar (o paciente) acerca das possíveis

armadilhas geradas pelos modos na própria relação terapêutica. (WAINER;

WAINER, 2016).

Um progresso significativo é feito e grande parte da cura é possível quando

terapeuta e paciente conseguem acessar e trabalhar o modo criança vulnerável, pois

quando acessado, permite que o paciente seja acolhido e validado em suas

necessidades emocionais básicas através da reparentalização limitada. O modo

criança vulnerável é significativo, pois acredita-se que a maioria dos esquemas

desadaptativos estejam contidos neste modo. (YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR,

2008)

Existem etapas a serem seguidas quando se trabalha com modos. Tais

etapas contemplam desde a identificação dos modos até a ressignificação das

memórias relacionadas a estes. A seguir a sequência é apresentada com base em

Young; Klosko; Weishaar (2008).

O primeiro passo no trabalho com modos é identificar estes, junto com o

paciente. Este processo tende a surgir de forma natural através das observações

que o terapeuta faz acerca dos pensamentos, emoções e comportamentos do

paciente em variadas situações (além da aplicação do formulário de identificação de

modos). Após se certificar que estas informações são precisas, o terapeuta sugere

que o paciente nomeie seus modos, isso fará com que ele se aproxime dos

mesmos. Alguns pacientes, no entanto, não têm estrutura para aceitar os modos e

esta realidade deverá ser respeitada. (YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR, 2008)

Na sequência, explora-se a origem e o valor adaptativo dos modos. Esta

etapa consiste em descobrir as vivências que originaram cada um e entender a

função destas na vida do paciente. Neste momento, portanto, ele será capaz de

iniciar o entendimento acerca de seu funcionamento para posteriormente relacionar

seus modos desadaptativos aos problemas e sintomas atuais. Afinal, embora

tenham sido originados no passado, há o reflexo disto no funcionamento do paciente

nos dias de hoje. (YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR, 2008)

A partir de então o terapeuta propõe para o paciente que ele comece a

contrabalancear as vantagens e desvantagens em manter, modificar ou abrir mão de

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um modo esquemático. Através das técnicas vivenciais (imagens mentais), o

terapeuta passa a acessar estes modos, um a um, com o objetivo de acessar a

criança vulnerável. Realiza-se então um diálogo entre os modos. Nesta etapa, o

terapeuta orienta que o diálogo entre os modos visa uma “negociação” entre eles,

com o objetivo de fortalecer o modo adulto saudável. (YOUNG, KLOSKO,

WEISHAAR, 2008)

A fase final do trabalho é quando este é generalizado para as situações da

vida do paciente fora do setting terapêutico, ou seja, quando o paciente passa a ter a

capacidade de transpor barreiras e seguir os passos acima descritos por conta

própria. (YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR, 2008)

Alguns modos, quando ativados, são mais danosos para o paciente do que

outros e, portanto, devem ser priorizados no tratamento. Os modos relacionados ao

grupo de pais disfuncionais internalizados e o protetor desligado, respectivamente

acarretam em condutas auto ou heterodestrutivas e levam a um processo de

desconexão com sentimentos e percepções e, portanto, exigem um olhar atento.

(WAINER; WAINER, 2016)

A plasticidade do profissional é essencial para lidar com os diferentes modos e

esquemas. Esta pode impedir ou diminuir a probabilidade de que alterações

patológicas sejam desenvolvidas resultantes de ações do terapeuta. (BERNSTEIN,

ARNTZ E KEULEN-DE VOS, 2007).

1.5. TRANSTORNO DE PERSONALIDADE

Quando se fala em personalidade deve-se ter em mente que esta é constituída

por uma mistura de temperamento (fatores genéticos) e caráter (fatores

psicossociais). É possível considerar a personalidade como sendo “um padrão de

pensamentos, sentimentos e comportamentos característicos que distinguem as

pessoas entre si e que persiste ao longo do tempo e mediante situações” (PHARES,

1988, apud CABALLO, 2008, P.31)

A personalidade é composta, portanto, por traços persistentes de comportamento

e pensamentos, sobre si e o mundo, que tange uma ampla gama de contextos

sociais e pessoais. Estes traços são considerados disfuncionais somente quando

são inflexíveis, desadaptativos e causam certo grau de prejuízo ou sofrimento ao

sujeito. (APA, 2014)

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Caballo (2008) define os transtornos de personalidade como “padrões

desadaptativos de pensamento, sentimentos, percepções e comportamentos que

começam muito cedo na vida e se perpetuam ao longo do tempo por meio de

diferentes situações. ”

APA, (2014) aponta que dados do National Epidemiologic Survey on Alchool

and Related Conditions de 2001-2002 sugerem que aproximadamente 15% dos

adultos dos Estados Unidos apresentam pelo menos um transtorno de

personalidade.

O DSM-V apresenta um quadro descritivo com os critérios diagnósticos do

transtorno de personalidade.

Quadro 1. Critérios diagnósticos do Transtorno de Personalidade

A. Um padrão persistente de experiência interna e comportamento que se desvia acentuadamente das expectativas da cultura do indivíduo. Esse padrão manifesta-se em duas (ou mais) das seguintes áreas: 1. Cognição (i.e., formas de perceber e interpretar a si mesmo, outras pessoas e eventos) 2. Afetividade (i.e., variação, intensidade, labilidade e adequação da resposta emocional) 3. Funcionamento interpessoal 4. Controle de impulsos

B. O padrão persistente é inflexível e abrange uma faixa ampla de situações sociais e pessoais. C. O padrão persistente provoca sofrimento clinicamente significativo e prejuízo no

funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. D. O padrão é estável e de longa duração, e seu surgimento ocorre pelo menos a partir da

adolescência ou do início da fase adulta. E. O padrão existente não é mais bem explicado como uma manifestação ou conseqüência de

outro transtorno mental. F. O padrão persistente não é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex.,

droga de abuso, medicamento) ou outra condição médica (p. ex., traumatismo cranioencefálico)

Fonte: Extraído de APA (2014)

Quando é mencionado o termo transtorno de personalidade, deve-se

considerar que estes costumam constituir desvios significativos dos padrões

considerados normais dentro do grupo sociocultural que o indivíduo está inserido,

especialmente se tratando de comportamentos interpessoais. Diferentemente dos

demais transtornos, o de personalidade estão mais estreitamente ligados as

expectativas culturais, já que por vezes, sentem-se confortáveis com sua forma de

agir que, entretanto, perturba o ambiente. (CABALLO, 2008)

Tais transtornos reúnem-se em três grupos divididos com base em sua

semelhança descritiva. São eles: Grupo A, composto por pessoas que podem ser

consideradas excêntricas. Neste grupo estão inclusos os transtornos de

personalidade paranoide, esquizoide e esquizotípica; Grupo B, formado por

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indivíduos que aparentam ser dramáticos, emotivos ou errádicos. Aqui estão

inclusos os transtornos de personalidade antissocial, borderline, histriônica e

narcisista; Grupo C engloba pessoas que aparentam ser medrosas e ansiosas.

Neste estão inclusos os transtornos de personalidade evitativa, dependente e

obsessiva-compulsiva. (APA, 2014)

Beck (2005) aponta que pessoas que apresentam transtorno de

personalidade têm tendência a apresentar padrões superdesenvolvidos em

determinados campos e subdesenvolvidos em outros. É possível exemplificar

através do transtorno obsessivo compulsivo, que apresenta excesso de controle e

escassez de espontaneidade. Sendo assim, quando há um superinvestimento em

determinada estratégia interpessoal, a outra, compensadora, não consegue se

desenvolver de maneira adequada.

Transtornos de personalidade também são caracterizados por seus estilos

cognitivos, ou seja, refere-se à maneira como a pessoa processa a informação do

ambiente, em oposição ao conteúdo específico desta informação. Nem todos os TP

apresentam estilos cognitivos bem delineados, exceto TP evitativo, apresentam um

estilo de evitação tanto de situações que lhe causem certo grau de desconforto

quanto com relação a sentimentos desagradáveis, caracterizando uma espécie de

evitação interna, TP histriônico, que apresenta um processo de informação global e

impressionista, e TP obsessivo-compulsivo, cujo processamento de informação e

focado demasiadamente nos detalhes a ponto de se perder o padrão global. (BECK,

2005)

Para que um diagnóstico efetivo seja possível, o terapeuta deverá fazer uma

boa avaliação e conceitualização de caso. Esse procedimento objetivará diferenciar

naquele paciente, quais traços são estáveis e quais são transitórios, atribuídos em

determinadas circunstâncias ou em determinados contextos culturais. Para que isso

seja possível, múltiplas ferramentas poderão ser utilizadas, por exemplo, inventários,

observação clínica, anamnese, avaliação comportamental, entre outras. (BECK,

2005)

O tratamento dos transtornos de personalidade é difícil, pois além de ser

pouco frequente que pessoas com TP se submetam ao mesmo, este deve ser

prolongado e, no geral, acaba sendo pouco eficaz, já que a estrutura a ser

enfrentada está profundamente enraizada. (CABALLO, 2008)

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1.6. MODOS ESQUEMÁTICOS NA CLÍNICA FORENSE

Atualmente, estudos vêm sendo realizados mostrando que a TE é uma

abordagem que tem se apresentado eficaz no tratamento de pessoas que

cometeram crimes. Um diferencial desta abordagem é que, por trabalhar com

flutuações de humor através do trabalho com modos esquemáticos, ela pode ser

aplicada nesta população sem a necessidade de grandes adaptações, pois os

terapeutas que atuam nesta linha acabam se familiarizando com a forma como a

demanda se apresenta que, em contrapartida, é menos comum quando falamos em

outras demandas psiquiátricas (BERNSTEIN; ARNTZ; DE VOS, 2007). Na Holanda,

inclusive, o trabalho desenvolvido pela TE já é considerado um dos mais adaptados

especificamente para tratar pacientes forenses com TP do Grupo B (KEULEN-DE

VOS, 2013)

Quando aplicado de forma mais ampla, o trabalho com modos pode, por

exemplo, ajudar a explicar a origem de comportamentos delitivos. Para ilustrar esta

ideia, pesquisas têm sido feitas em diferentes campos do conhecimento para que o

fenômeno criminal possa ser entendido. Um dos múltiplos fatores relevantes para o

entendimento deste é o estudo da personalidade (ROCHA, FORMIGA, LOPES,

2014).

Transtornos de Personalidade são diagnósticos comuns na população

forense, sendo que o Narcisista, Antissocial, Borderline e Paranoide são os mais

prevalentes (OTTOSSON E GRANN, 2003, apud BERNSTEIN; ARNTZ; DE VOS,

2007). No entanto, para trabalhar com esta demanda, foi necessária uma adaptação

da técnica, que representou tanto um desafio quanto um progresso. BERNSTEIN;

ARNTZ; DE VOS (2007) aponta, portanto, algumas recomendações para a

implementação da TE na clínica forense, tais como: trabalhar com modos

esquemáticos quando falamos de indivíduos com transtorno de personalidade

severo; ter um ambiente institucional seguro e comprometido o suficiente para dar

suporte ao tratamento do paciente; experiência, treino e supervisão do terapeuta

objetivando aperfeiçoar seu desempenho no campo forense e consequentemente

diminuir o risco de recidivas; entre outras. A recomendação para trabalhar com a

abordagem de modos se deu porque esta possibilita trabalhar tanto com as

variações de estados emocionais quanto com as respostas de enfrentamento.

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Ao invés de ver os infratores com TP como irrevogavelmente deficientes, cuja

única possibilidade seria ajudá-los a compensar as desvantagens de sua patologia,

a TE tenta melhorar ou alterar aspectos desta patologia buscando alterações em seu

núcleo: a personalidade (KEULEN-DE VOS, 2013).

Um estudo brasileiro buscou apontar quais os esquemas disfuncionais mais

relevantes em indivíduos que praticaram crimes (ROCHA, FORMIGA, LOPES,

2014). Tal estudo, no entanto, não foi conclusivo, pois o esquema de maior destaque

foi o Autossacrificio. Para os autores, a presença de autossacrifício é incoerente com

a descrição apontada por YOUNG, KLOSKO, WEISHAAR (2008) que define tal

esquema como sendo pertinente ao indivíduo que foca excessivamente nas

necessidades alheias, por vezes negligenciando sua própria satisfação. Além disso,

pessoas com este esquema ativado geralmente apresentam alto grau de empatia,

visto que possuem considerável sensibilidade ao sofrimento do outro. KEULEN-DE

VOS (2013) aponta que a avaliação de pacientes forenses é complexa já que os

dados obtidos nas avaliações devem passar pelo crivo da desejabilidade social, visto

que as pessoas podem mascarar os resultados visando maior aceitação. Os

autores do estudo apontam que além deste fator, o estilo de enfrentamento de

hipercompensação também pode estar sendo utilizado para justificar o resultado,

visto que estes podem ir à direção oposta a que está registrada no psiquismo do

sujeito. Apontam, portanto, a necessidade de novas pesquisas acerca do assunto

em questão, visto que além de representar um desafio, pois implica inclusive em

controlar algumas variáveis, como por exemplo, desejabilidade social e estados de

humor, compreender tal fenômeno impactará em significativas mudanças no olhar

para esta população.

Bernstein; Arntz; De vos (2007) foi quem propôs a implementação de quatro

novos modos esquemáticos que comumente aparecem neste público que são modo

provocativo e ataque, modo predador, modo enganador e manipulador e modo

supercontrolador (que apresenta dois subtipos: obsessivo e paranoide), todos

descritos na Tabela 1. Para os autores, esta adição pode auxiliar tanto pacientes

quanto terapeutas a entender que, naqueles com transtorno de personalidade

severo e propensão à violência, uma sequencia de modos padrão daquele indivíduo

relacionados a determinada situação podem contribuir para a ampliação de sua

dimensão até que se culmine na ação criminal.

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Keulen-de vos at al. (2016) testaram a hipótese de que modos esquemáticos

disfuncionais pudessem estar ativados de maneira intensa antes e durante a prática

de crimes, considerando que comportamentos violentos pudessem ser

representações disfuncionais do indivíduo para lidar com a dor e sentimentos

negativos. Os resultados apontam que a amostra analisada apresentou maior índice

de modos dos domínios criança e hipercompensador. Criança vulnerável apresentou

resultado mais significativo (74,8%) como sendo predecessor ao crime, enquanto

Provocativo e Ataque foi o mais representativo durante a prática do mesmo (62,3%).

Completando esta ideia, estudos têm apontado a eficácia da TE em

consonância com a Arte Terapia, em pacientes que já estavam previamente no

tratamento com abordagem em modos. Mostram que juntos, emoções em geral são

desencadeadas, e há possibilidade de aprofundar estas emoções que vêem à tona

através das técnicas vivenciais. Em geral desencadeia-se o modo criança vulnerável

do indivíduo (que possui alto índice de prevalência em situações que precedem o

crime), com sentimentos, por exemplo, de solidão e raiva (KEULEN-DE VOS, 2013)

Desta forma, Bernstein; Arntz; De vos (2007) coloca que através do trabalho

com modos esquemáticos, dentro da abordagem da TE, é possível obter a redução

do risco de recidivas não somente do crime em si, mas também da prática de ações

violentas em geral.

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5 DISCUSSÃO

A Terapia do Esquema tem se mostrado eficiente no tratamento de diversas

demandas. Explorar a origem de conteúdos significativos que geraram um traço em

sua personalidade (esquema) é de grande valia para o entendimento do

funcionamento daquele indivíduo.

O trabalho com esquemas, além de possibilitar um melhor entendimento para

terapeuta e paciente acerca dos conteúdos deste, permite que o paciente olhe para

sua demanda (necessidades emocionais básicas, traumas, vivências) e faça uma

releitura de conteúdo, dando assim vazão a emoções, que por vezes não está

sequer consciente que possui.

Quando se fala em tratamento de público com transtorno de personalidade

severo, focar nos EIDs bem como nos Estilos de Enfrentamento tem uma eficácia

limitada, visto que estes pacientes podem apresentar personalidades não integradas

e consequentemente uma variação rápida em seus estados de humor, dificultando

assim a ação do terapeuta no sentido de segmentar seu tratamento. Desta forma, o

trabalho com modos tem se apresentado como uma alternativa interessante e

eficiente, visto que o foco do terapeuta está em atender a demanda que surge

através do ME ativado naquele dado momento ou diante de alguma situação

específica. Sua linguagem de mais fácil entendimento possibilita àqueles mais

comprometidos um primeiro entendimento e àqueles mais sadios um complemento

para ampliar o conhecimento acerca de si. Neste modelo o acesso as emoções

também é fundamental, visto que nos mais variados transtornos de personalidade o

modo criança vulnerável está presente, porém por vezes mascarado. Sabendo

disso, a teoria embasa o terapeuta para que este olhar seja possível e resultados

apareçam.

No que se refere ao trabalho com modos em indivíduos com comportamentos

delitivos, estudos vem sendo realizados visando entender a relação entre seu

conteúdo esquemático e a prática dos crimes, ou seja, quais esquemas e modos são

mais presentes naquela pessoa tanto durante o crime quanto em todo o contexto

que o precede. Como visto anteriormente, os modos da categoria

Hipercompensadores são os mais presentes nessa população.

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Embora esta demanda represente um desafio aos terapeutas, visto que a

flutuação de humor é frequente, trabalhar tanto com a reparentalização limitada, que

permite que o terapeuta guie e conforte o paciente que se encontra preso em suas

vivencias infantis para que ele possa então enfrentar tanto seus esquemas quanto

modos desadaptativos e assim amadurecer a interação entre seu temperamento

(inato) e as vivências (adquirido), quanto com a confrontação empática, que objetiva

mudar os padrões adotados de forma não ameaçadora, permite que o paciente

tenha um olhar mais crítico sobre si, identificando seus próprios modos tentando

fortalecer o adulto saudável para que uma discussão entre os modos que levam a

comportamentos agressivos, manipulativos ou delitivos percam a intensidade.

O objetivo desta prática consiste na diminuição de recidivas, ou seja, embora

não falemos em cura aos transtornos de personalidade, podemos falar em controle e

diminuição dos sintomas que causem prejuízo a vida do sujeito, e nestes casos,

riscos à população.

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6 CONCLUSÃO

Nota-se que no Brasil, pesquisas relacionadas a TE, bem como ao tratamento de

sujeitos com transtorno de personalidade que praticam atos criminosos ainda têm

um longo caminho a percorrer. Visto que, embora eficaz e com potencial para

trabalhar com uma ampla variedade de público, esta linha psicoterápica ainda é

pouco estudada em nosso país.

Desta forma, é imprescindível que pesquisas sejam feitas e assim conhecimento

nacional possa ser produzido para que os resultados norteiem intervenções com

resultados práticos que auxiliem na redução da criminalidade.

De forma geral, as contribuições teóricas existentes, possibilitam um novo olhar

para os indivíduos, clareando o entendimento desta população.

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TERMO DE RESPONSABILIDADE AUTORAL

Eu, Mariana Filippelli Prata Ramos Manzzuti, afirmo que o presente

trabalho e suas devidas partes são de minha autoria e que fui devidamente

informado da responsabilidade autoral sobre seu conteúdo.

Responsabilizo-me pela monografia apresentada como Trabalho de

Conclusão de Curso de Especialização em Terapia Cognitivo Comportamental, sob

o título “Modos esquemáticos e sua relevância no tratamento de indivíduos com

transtorno de personalidade que cometem atos delitivos”, isentando, mediante o

presente termo, o Centro de Estudos em Terapia Cognitivo-Comportamental

(CETCC), meu orientador e coorientador de quaisquer ônus consequentes de ações

atentatórias à "Propriedade Intelectual", por mim praticadas, assumindo, assim, as

responsabilidades civis e criminais decorrentes das ações realizadas para a

confecção da monografia.

São Paulo, __________de ___________________de______.

___________________________

Assinatura do (a) Aluno (a)