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Dificuldades Encontradas ao Mudar de Representação Semiótica: da Atividade de Laboratório à Construção de Tabelas e Gráficos
Gilberto Franzoni - Prof. PDE – gilfranzoni@ibest. com.br Carlos Eduardo Laburú – UEL – [email protected]
Resumo
Este artigo descreve como foi realizada a implementação da Produção Pedagógica de
Física intitulada: Desvendando o Segredo do Relógio Movido a Água Salgada,
desenvolvida no Colégio Estadual Olavo Bilac – Ensino Fundamental, Médio e Normal
no período de março a junho de 2009. O estudo teve como objetivo caracterizar as
dificuldades dos alunos ao mudar de representação semiótica envolvendo atividades de
laboratório, construção de tabelas e gráficos. O processo de implementação ocorreu
por meio de três ações distintas: 1) Construção de cinco pilhas eletroquímicas com
materiais de fácil acesso: fios de cobre, folhas de zinco, água e sal comum. Montagem
de um vídeo descrevendo passo a passo esta construção e em seguida caracterizando
grandezas elétricas como voltagem e corrente elétrica por meio de tabelas e gráficos. 2)
Acompanhamento dos alunos da 3ª série do Ensino Médio ao laboratório e
apresentação dos equipamentos utilizados na experiência com a pilha eletroquímica.
Os alunos obtiveram as medidas de voltagem e corrente elétrica utilizando o multímetro
em pilhas comuns carregadas e descarregadas. Em seguida observaram e anotaram as
medidas de voltagem e corrente elétrica da pilha eletroquímica. 3) Usou-se tabelas
para construção de gráficos i(mA) x t(s), onde foi verificado como a pilha eletroquímica
tem sua corrente elétrica alterada ao longo do tempo de funcionamento. Seguiu-se a
esta ação uma analise das dificuldades encontradas pelos alunos na montagem das
tabelas e gráficos. As conclusões do estudo indicam uma maior dificuldade na
construção dos gráficos do que das tabelas.
Palavras-Chave: representação semiótica, gráficos e tabelas, corrente elétrica.
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Abstract
This article describes as the implementation of the Pedagogical Production of entitled
Physics was carried through: Unmasking the Secret of the Moved Clock the Salty Water,
developed in the State College Olavo Bilac - Basic, Average and Normal Education in
the period of March the June of 2009. The study it had as objective to characterize the
difficulties of the pupils when moving of representation semiotics being involved
activities of laboratory, table construction and graphs. The implementation process
occurred by means of three distinct actions: 1) Construction of five electrochemical
stacks with materials of easy access: copper wires, zinc leaves, water and common salt.
Assembly of a video describing step by step this construction and after that
characterizing electric largesse as voltage and electric chain by means of tables and
graphs. 2) Accompaniment of the pupils of 3ª series of Average Teaching to the
laboratory and presentation of the equipment used in the experience with the
electrochemical stack. The pupils had gotten the measures of voltage and electric chain
having used the multimeter in loaded and unloaded common stacks. After that they had
observed and they written down the measures of voltage and electric chain of the
electrochemical stack. 3) One used tables for construction of graphs i(mA) x t(s), where
he was verified as the electrochemical stack has its modified electric chain throughout
the functioning time. It was followed this action one analyzes of the difficulties found for
the pupils in the assembly of tables and graphs. The conclusions of the study indicate a
bigger difficulty in the construction of the graphs of what of tables.
Keywords: semiotic representation, graphs and tables, electrical current.
Introdução
Saber ler e interpretar dados e informações representadas graficamente vêm
tomando um lugar de destaque na educação de ciências e matemática. Isso porque a
quantificação da diversidade de informações é cada vez mais necessária na sociedade
atual. Os gráficos são ferramentas essenciais para a descrição precisa e quantitativa de
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inúmeros fenômenos naturais, utilizados em várias formas de comunicação, tais como:
jornais impressos, revistas, noticiário televisivo e, também, no meio escolar. A
linguagem dos gráficos cartesianos é sofisticada e tem vantagens sobre a linguagem
algébrica – sendo às vezes, inclusive, vista com simpatia por alunos e professores por
causa disso. Contudo, sua aparente simplicidade oculta um sem número de
convenções e simplificações, nem sempre explícitas, e um enorme potencial para
inferências ou teorizações. Verifica-se na literatura relatos de pesquisa sobre este tema,
no entanto ele ainda pode ser melhor explorado na área de ensino de ciências,
privilegiando mais a interpretação que a construção de gráficos (ABERG-BENGTSSON;
OTTOSSON, 2006; AGRELLO; VEIT; MOREIRA, 2004; ROTH; HAN, 2006;
LEINHARDT et al, 1990; WU; KRAJCIK, 2006 MCDERMOTT et al, 1987).
Leinhardt et al (1990) julgam as atividades de construção de gráficos
qualitativamente distintas das atividades de leitura e interpretação, pois construir
demanda criar algo novo. Por exemplo, exige a seleção de escalas, escolha de eixos,
identificação da unidade e inserção de pontos. Enquanto interpretar não requer
construção, construir implica em algum tipo de interpretação. Para os autores a forma e
o contexto em que os problemas são apresentados interferem diretamente na
compreensão dos alunos sobre o fenômeno estudado. Estudos atuais concluem que as
tarefas e o ambiente de aprendizagem são fatores determinantes na aquisição de
habilidades de leitura e construção de gráficos, especialmente em atividades de
investigação (WU & KRAJCIK, 2006a; 2006b).
O interesse de pesquisadores da área de ensino pelo entendimento dos alunos
sobre os conceitos de construção de gráficos para representar a realidade é desejável,
mas ainda é pouco explorado. (AGRELLO; ARAUJO; VEIT; MOREIRA, 2004;
BORGES, 2007; MCDERMOTT et al, 1987). Estas pesquisas ora se detêm nos
resultados (gráficos prontos), ora se desenvolvem por meio de testes e modelagem
computacional.
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As funções das representações na aprendizagem
Sob o ponto de vista de Raymond Duval, ensinar é antes de tudo possibilitar o
desenvolvimento geral das capacidades de raciocínio, de análise e de visualização. A
atividade em questão, neste caso, é caracterizada pela dependência das
representações semióticas, bem como pela grande variedade destas representações.
Isso porque as representações semióticas assumem um papel considerável já que os
objetos matemáticos utilizado no ensino de física, não sendo acessíveis pela
percepção, só podem sê-lo por suas representações, lembrando que um mesmo objeto
poderá ter representações diferentes, dependendo da necessidade e do uso. Há,
portanto, uma diversidade de representações semióticas que DUVAL (2003) agrupa em
quatro grandes registros: a língua natural, as escritas algébricas e formais, as figuras
geométricas e as representações gráficas.
O interesse pelo conhecimento da existência deste mundo das representações
semióticas não se dá, tão somente, pela possibilidade de entendimento cognitivo para a
aprendizagem, mas pelas funções cognitivas que estas representações preenchem e
que, portanto, auxiliam no processo do ensino de ciências.
Segundo DUVAL (1998) são quatro as funções que as representações podem
preencher: função de comunicação, função de tratamento, função de objetivação e
função de identificação. A primeira é a função de transmissão de uma mensagem ou de
uma informação entre indivíduos, ela requer a utilização de um código comum aos
indivíduos. A segunda, é a função que transforma uma representação em uma outra,
utilizando unicamente as possibilidades de funcionamento do sistema de representação
mobilizado. A terceira é a função que permite a um sujeito de tomar consciência daquilo
que até então ainda não o tinha feito. É o trabalho de exteriorização. Esta função é, às
vezes, confundida com a função de comunicação porque ela dá lugar a uma produção
de modo vocal ou gráfico, quando se trata de uma produção que é por si e não por
outra. De uma certa maneira, a objetivação corresponde a um uso estritamente privado
de um registro de representação, mesmo se a produção é materialmente acessível a
outra e pode parecer em uma produção para fins de comunicação ou às vezes de
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tratamento. Estas três primeiras funções são, para Duval, fundamentais para o
funcionamento cognitivo.
Enfim, a função de identificação que permite encontrar, ou reencontrar, um dado
ou uma informação dentre muitas outras. A identificação é, portanto, o trabalho
cognitivo que permite a recuperação da memória, seja ela humana ou de um sistema
informático, ou seja, é concernente a organização das informações da memória. Esta
função se faz importante, aqui, por ser imediatamente solicitada quando é preciso ler e
analisar um quadro de dados, por exemplo. Dentre os muitos dados, e informações,
contidos num quadro é preciso identificar, ou encontrar, aquele que é o solicitado na
análise de um problema envolvendo dados estatísticos.
A representação gráfica constitui-se num importante recurso para a análise de
dados e tratamento da informação. Basta olharmos os meios de comunicação, sejam
eles virtuais ou impressos, para vermos a impregnação de quadros, tabelas, gráficos,
ou seja, de uma linguagem semiotizada que permite a comunicação de dados e
informações. Porém, lidar com tais noções significa, antes de tudo, lidar com tabelas,
gráficos, diagramas, para organizar e comunicar dados e informações, o que implica
numa análise do funcionamento representacional destes modos de representação.
Assim, para além de um estudo das possibilidades de aprendizagem e das formas
metodológicas de ensino de ciências é preciso verificar as diversas formas de
representação gráfica que constituem o suporte representacional para tais noções, ou
melhor, é preciso uma análise das características visuais, representacionais e
cognitivas que acarretam cada uma das representações gráficas.
Faz-se importante ressaltar o fato de que as representações gráficas preenchem
as quatro funções cognitivas do pensamento. A identificação, como já foi dito aqui, é
uma função fundamental para o tratamento destas representações. Em relação,
particularmente, à comunicação basta abrirmos um jornal qualquer para sentirmos essa
importância. Não menos importante, percebemos o papel de destaque que é dado à
representação gráfica nos livros didáticos, uma vez que há um interesse crescente pelo
recurso às novas tecnologias da informação. Há, portanto, uma inserção, no cotidiano
do aluno, de representações gráficas tais como, quadros, tabelas, gráficos cartesianos,
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gráficos de barras, gráficos com três dimensões, diagramas circulares. Nesse caso, a
representação deverá preencher não só o papel de comunicação, como é o caso
principalmente dos jornais, mas de objetivação e tratamento. Para o aluno, não é
suficiente que ele saiba “ler” um gráfico, é necessário também que ele saiba organizar e
operar de forma objetiva sobre os dados contidos neste modo de representação.
Há uma forma de representação gráfica que parece simples e direta. Por isso, o
recurso a ela é comum e freqüente no ensino de ciências. Trata-se das representações
gráficas do tipo tabelas, ou seja, daqueles cuja disposição é feita sobre linhas e
colunas; do tipo gráficos cartesianos; ou ainda, dos gráficos de barras. Porém, esta
simplicidade de acesso às informações, a homogeneidade visual e a forma organizada
de distribuição de dados, só são aparentes. Fatores diversos como, por exemplo,
aqueles requeridos na organização representacional e visual, bem como aqueles
ligados aos processos cognitivos, podem interferir tanto na leitura e análise dos dados
dispostos neste tipo de representação, como na própria construção e organização dos
dados.
Particularmente, para as representações gráficas do tipo tabela, devemos
considerar que elas possuem determinadas vantagens, como por exemplo, o fato de
que permitem a visualização dos dados de forma separada preenchendo assim,
explicitamente, a função cognitiva de identificação. Segundo DUVAL (2002), para
analisar a contribuição cognitiva das tabelas, e suas diferentes utilizações, é preciso
distinguir dois importantes pontos: a própria organização representacional, ou seja, a
composição semiótica das tabelas, e as funções cognitivas que elas preenchem.
No que diz respeito a organização representacional das tabelas é visível a
disposição dos dados, ou informações, em linhas e em colunas. Porém, esta não é uma
característica exclusiva das tabelas, a utilização de uma forma quadriculada aparece,
igualmente, nas representações cartesianas, e histogramas-gráficos de barra. Portanto,
tal característica, diz DUVAL (2002), não é suficiente para descrever o funcionamento
representacional das tabelas, sendo necessário discernir a especificidade das tabelas
em relação as outras representações gráficas.
Neste estudo analisamos as mudanças de representação semióticas realizadas
pelos alunos da atividade de laboratório, caracterizada pela observação de
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instrumentos e obtenção de dados, para tabela e na seqüência da tabela para os
gráficos, tendo como principal objetivo evidenciar quais as principais dificuldades
encontradas por eles desde o processo de aquisição dos dados em laboratório até a
montagem de tabelas e gráficos na sala de aula.
Procedimentos Metodológicos
Baseado no artigo “Construção de uma Pilha Didática de Baixo Custo” de
Alessandro Gerson M. I. de Oliveira e Isaac Toshikazu Pires de Oliveira, publicado no
Caderno Catarinense de Ensino de Física em 2001, montou-se um vídeo como
produção pedagógica para o PDE 2008 no quesito material multimídia. O vídeo
descreve a construção de pilhas eletroquímicas simples, constituídas de materiais de
fácil acesso (zinco, cobre e água salgada) que proporciona corrente elétrica e voltagem
suficiente para fazer funcionar o relógio movido a água salgada divulgado na Revista
Superinteressante de outubro de 2008, edição 257 na seção “Bacanas do Mês”, página
113.
Além da construção das pilhas eletroquímicas, o vídeo mostra como foram feitas
as medidas da corrente elétrica e da voltagem em um determinado tempo pré-
estabelecido. Estes valores estão presentes na tabela (figura 01) que mostra os dados
das pilhas construídas com fio de cobre de espessura 1,5 mm2 e 2,5 mm2. Na
seqüência, usando um software de computador para tratamento dos dados, encontrou-
se a curva de decaimento da corrente elétrica no tempo (figura 02).
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Medidas de corrente elétrica e voltagem das pilhas eletroquímicas Pilha 1 corresponde a pilha com fio de cobre 1,5 mm2 Pilha 2 corresponde a pilha com fio de cobre 2,5 mm2
Medida Tempo em
segundos
Corrente elétrica pilha 1
em mA (miliamperes)
Corrente elétrica pilha 2
em mA (miliamperes)
Voltagem pilha 1
em Volts
Voltagem pilha 2
em volts
01 0 18 13,5 0,79 0,79 02 30 12 7,8 0,79 0,79 03 60 9,7 5,8 0,79 0,79 04 90 8,0 4,9 0,79 0,79 05 120 6,5 4,3 0,79 0,79 06 150 5,4 3,8 0,79 0,79 07 180 4,5 3,6 0,79 0,79 08 210 3,9 3,3 0,79 0,79 09 240 3,5 3,2 0,79 0,78 10 270 3,0 3,1 0,79 0,78 11 300 2,7 3,0 0,79 0,78 12 330 2,5 2,9 0,79 0,78 13 360 2,3 2,8 0,79 0,78 14 390 2,8 2,8 0,79 0,78 15 420 2,8 2,7 0,79 0,78 16 450 2,1 2,7 0,79 0,78 17 480 2,1 2,7 0,79 0,79 18 510 2,3 2,6 0,79 0,79 19 540 2,3 2,6 0,79 0,79 20 570 2,2 2,6 0,79 0,79 21 600 2,2 2,6 0,79 0,79 22 630 2,1 2,6 0,79 0,79 23 660 2,0 2,6 0,79 0,79 24 690 1,9 2,5 0,78 0,79 25 720 1,9 2,5 0,78 0,79 26 750 1,8 2,5 0,78 0,79 27 780 1,8 2,5 0,78 0,79 28 810 1,8 2,5 0,78 0,79 29 840 1,8 2,5 0,78 0,79 30 870 1,8 2,5 0,78 0,79
Figura 01 – Tabela com os dados das pilhas eletroquímicas
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Figura 02 – Gráfico que representa o decaimento da corrente elétrica da pilha 1 e 2
O segundo passo foi levar os alunos da 3ª série do Ensino Médio ao laboratório
e apresentar os equipamentos utilizados na experiência com a pilha eletroquímica.
Para isso foi necessário formar grupos de 10 alunos permitindo, assim, que para cada
dois alunos estivesse disponível uma pilha eletroquímica. Como as turmas eram
grandes, de aproximadamente 30 alunos, foi necessário estabelecer um rodízio no uso
do laboratório. Devido ao fato da biblioteca estar localizada ao lado do laboratório,
optou-se por direcionar 20 alunos para a mesma com o objetivo de realizar trabalhos
de pesquisa sobre o assunto de corrente elétrica sob a supervisão do bibliotecário e, ao
mesmo tempo, outros 10 alunos foram para o laboratório sob a supervisão do professor
de Física para realizar as medidas de voltagem e corrente elétrica na pilha
eletroquímica.
No laboratório os dez alunos foram dispostos em cinco bancadas, estabelecendo
desta forma que um kit de experiência ficaria disponível para cada dois alunos. O Kit de
experiência (figura 03) se configura dos seguintes elementos: pilhas comuns
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carregadas e descarregadas, pilha eletroquímica (feita com fios de cobre, folha de
zinco, água, sal e um pote de plástico) e um multímetro.
Figura 03 - Kit para experiência
Após a distribuição dos kits de experiência os alunos foram orientados como
fazer medidas de voltagem e corrente elétrica utilizando o multímetro em pilhas comuns
carregadas e descarregadas. Este procedimento teve como objetivo entender o
funcionamento do multímetro e em seguida utilizá-lo para as medidas de voltagem e
corrente elétrica na pilha eletroquímica. Os educandos, portanto, foram orientados a
colocar o multímetro na posição DCV 20 que serve para medir voltagem até 20 volts e
em seguida colocar os ponteiros de contato do multímetro nos pólos das pilhas
comuns.
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Figura 04 – Medida da voltagem de pilhas comuns
Os discentes puderam evidenciar quais pilhas estavam carregadas e quais
estavam descarregadas ao observarem que as pilhas Golden de cor amarela forneciam
ao multímetro uma leitura de voltagem inferior a 1,5 V, demonstrando estar
descarregadas, enquanto as pilha pretas Eveready forneciam uma leitura sempre
superior a 1,6V indicam que estas estavam carregadas (figura 04).
De posse do conhecimento de como funciona o multímetro e de como ele é
utilizado para medir a voltagem e corrente elétricas os alunos foram convidados a
encher os potes de plástico da pilha eletroquímica com água e acrescentar 3 colher de
sopa de sal. Em seguida eles fecharam a pilha eletroquímica com a tampa de plástico
verde que sustentava o fio de cobre enrolado e a folha de zinco contendo os contatos
externos para as medidas. Com a pilha eletroquímica pronta para uso os alunos
fizeram medidas da voltagem inicial, verificando que em média se aproximava de 0,8V,
valor já esperado considerando as medidas preliminares feitas no momento da
montagem do vídeo, citado no início deste artigo. O próximo passo foi fazer medidas de
corrente elétrica com variação do tempo. O objetivo desta atividade foi a verificação de
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como a corrente elétrica estabelecida na pilha eletroquímica se modificava ao longo de
15 minutos estando ligada em série com o multímetro.
Após a montagem das tabelas com dados das cinco pilhas eletroquímicas os
educandos foram instruídos para o fato de que estando o multímetro conectado a pilha
de zinco e cobre ele funcionava como uma resistência que consumia energia elétrica
da pilha fazendo-a descarregar por meio da passagem da corrente elétrica em seu
circuito interno. Este era, portanto, o motivo pelo qual eles observavam os valores de
corrente elétrica decrescerem no multímetro. Também se observou que depois da série
de medidas de corrente elétrica (entre 10 e 15 minutos) o valor da voltagem final era
sempre um pouco menor que o inicial.
Nesta etapa observamos que apenas duas alunas anotaram os dados de
maneira incompleta. Elas fizeram a anotação das medidas sem considerar as casas
decimais mostradas no multímetro (figura 05).
Figura 05 - Tabela com dados incompletos (sem as casas decimais)
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Observou-se que não houve dificuldades em obter as medidas dos multímetros e
transcrevê-las nas tabelas, dos 67 alunos que participaram desta primeira etapa,
apenas dois não usaram casas decimais em suas tabelas o que demonstra que a
passagem da representação do experimento real para tabelas é de certa forma mais
simples, sendo, portanto, uma atividade considerada mecânica que envolve
essencialmente atenção e observação aos números apresentados pelo multímetro e
pelo cronômetro.
Figura 06 – Kit de pilhas eletroquímicas e Multímetros utilizados
Figura 07 – Alunos fazendo medidas iniciais de Voltagem
Já a terceira etapa, que consistiu em transferir os dados da tabela para o gráfico,
foi mais exigente e alguns alunos demonstraram ter dificuldades na construção dos
gráficos, além de, aparentemente, não entender que o aspecto do gráfico, sua curva no
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caso, tem que representar fielmente o que esta ocorrendo no experimento. Estes erros
de interpretação e construção de gráficos ficaram evidentes, como mostra claramente a
figura 10 e 11.
Por opção metodológica e com o objetivo de fazer comparação entre os gráficos
produzidos pelos alunos, decidiu-se por oferecer à eles os mesmos dados já obtidos no
momento da construção as pilhas eletroquímicas (descrito no início do artigo). Desta
forma, todos os alunos deveriam, a princípio, construir gráficos similares. Assim
forneceu-se os dados iniciais por meio das tabelas abaixo:
Figura 08 – Tabelas com dados obtidos logo após a construção das pilhas eletroquímicas
Os gráficos construídos pelos alunos a partir destas tabelas, por suposição,
deveriam ser idênticos aos apresentados na figura 1, onde esta demonstrado o
decaimento da corrente elétrica da pilha 1 e 2, construídas inicialmente para a
realização do vídeo que explicava o relógio movido a água salgada descrito no inicio do
artigo.
No total 32 alunos participaram desta terceira etapa com 2 gráficos
apresentando erros sérios o que indica pouca ou nenhuma noção da construção do
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mesmo (figura 10 e 11) ; 5 gráficos feitos na forma de colunas indicando dificuldade de
interpretação dos dados da tabela, pois as medidas do multímetro decresciam de forma
seqüencial (figura 09); 7 gráficos com pontos soltos indicando que os alunos sabiam
confeccionar gráfico, mas não associaram aos pontos a forma seqüencial de
decréscimo das medidas (figura 12) e 18 gráficos de linhas contínuas tais como
apresentado na figura 1 (figura 13). Estes últimos são consideramos adequados e
corretos para representar as medidas elencadas nas tabelas (figura 08).
Para facilitar a construção dos gráficos pelos discentes as tabelas da figura 08
foram separadas e cada aluno recebeu apenas um conjunto de dados (uma tabela), ou
seja, o gráfico construído por ele apresentou apenas uma curva que corresponde
apenas a uma pilha. O objetivo aqui foi verificar qualitativamente como o aluno constrói
gráficos, portanto os dados, seja da pilha 1 ou da pilha 2, não interferem neste foco.
A suposição inicial de que os gráficos fossem criados conforme demonstrado na
figura 1 não se realizou totalmente. Apenas em 56% dos alunos chegaram ao objetivo
de apresentar gráficos coerentes com os dados da tabela. Outros 44% apresentaram
desde erros leves como construir o gráfico na forma de colunas até erros sérios como
os apresentados na figura 10 e 11 que indicam um total desconhecimento das regras
básicas de criação de gráficos cartesianos.
A tabela abaixo resume os resultados obtidos:
Número de alunos Percentagem
Gráficos em forma de colunas 5 15,6 %
Gráficos em forma de pontos soltos 7 21,9 %
Gráficos com erros sérios de construção 2 6,3 %
Gráficos coerentes com os dados do experimento 18 56,2 %
Total 32 100 %
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Abaixo colocamos alguns exemplos de gráficos criados pelos alunos:
Figura 09 – Gráfico em forma de colunas
Figura 10 – Gráfico em forma de colunas, mas com sérios erros de interpretação e construção.
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Figura 11 – Gráfico em forma de linha, mas com erros na construção
Figura 12 – Gráfico com pontos soltos
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Figura 13 – Gráfico feito de forma adequada aos dados e compatível
com a figura 1.
Figura 14 – Gráfico feito de forma correta apresentando os dados de
forma coerente e bem organizados.
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Considerações Finais
As conclusões, baseadas neste estudo, indicam que a maior parte dos
alunos pesquisados sabe construir gráficos cartesianos, por outro lado, uma
parcela significativa de alunos apresentou desde erros leves de interpretação até
sérios problemas na construção de gráficos. Os educandos conseguiram
completar as atividades relacionadas à transcrição dos dados do multímetro para
as tabelas com certa facilidade, pode-se supor que isto se deve ao fato de que
este é um processo mecânico e de pouca exigência cognitiva do aluno. Na
mudança de representação do experimento real para a tabela foi necessário que
o aluno tivesse atenção aos dados apresentados pelo multímetro e os
representasse na forma escrita.
Já a confecção de gráficos se mostrou uma atividade bem mais complexa
e muito mais exigente dos processos cognitivos dos discentes. Eles sentiram a
necessidade de interpretar os dados obtidos nas medidas para que a sua
representação nos gráficos fizesse sentido. No processo de mudança de
representação de tabela para gráficos exigiu-se dos alunos, além da atenção aos
dados, um conhecimento inicial de construção de gráficos, ou seja, os processos
cognitivos envolvidos são mais complexos que na etapa anterior. A primeira
etapa, do experimento para tabela, pode ser considerada apenas uma
transcrição, enquanto que na segunda etapa é claramente necessário
interpretação dos dados, bem como, domínio prévio dos conhecimentos de
construção gráfica.
Dos 67 participantes da etapa de construção das tabelas apenas 2
cometeram algum tipo de erro, mesmos assim não grave, apenas
desconsideraram as casas decimais. Agora na confecção dos gráficos dos 32
participantes 14 cometeram algum tipo de erro, o que indica dificuldade em se
traduzir os dados das tabelas para a forma gráfica, ou seja, 44% dos alunos
apresentam algum grau de dificuldade em fazer a tradução de dados
representados em tabelas para a representação gráfica.
Ficou evidente, neste trabalho, que os alunos tiveram maiores dificuldades
na mudança de representação de tabelas para gráficos. Avaliando esta mudança
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representacional, conclui-se que os fatores envolvidos podem ser: do tipo
interpretativo o aluno não consegue interpretar os dados da tabela e associá-los
ao experimento real gerando gráficos que não representam fielmente os dados e
que podem acarretar dúvidas em sua leitura (pontos soltos); também encaixam,
neste tipo, os gráficos com interpretações equivocadas (gráfico em forma de
colunas) que sugerem saltos quantitativos nas medidas aparentando uma
descontinuidade nos dados; do tipo operacional: que significa basicamente que o
aluno não conhece as regras para construção de gráficos. Este último tipo gerou
gráficos errados e incoerentes com os dados das tabelas.
As investigações neste sentido poderiam avançar em futuros trabalhos por
meio de entrevistas com os alunos. Como sugestão de continuidade de trabalho,
utilizando o recurso metodológico da entrevista clínica, pode-se fazer um
aprofundamento em pesquisas de mudança representacional buscando
evidenciar outros fatores que interferem e geram dificuldades ao passar de um
modo de representação para outro.
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Referências
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