DA JUSTIÇA FISCAL NO ESTADO SOCIAL: VERIFICAÇÕES...

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FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA UNIR CAMPUS PROFESSOR FRANCISCO GONÇALVES QUILES CACOAL DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE DIREITO LAÍSE SOARES RAMOS DE MOURA DA JUSTIÇA FISCAL NO ESTADO SOCIAL: VERIFICAÇÕES ACERCA DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA BRASILEIRO TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO (MONOGRAFIA) CACOAL RO 2015

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FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA – UNIR

CAMPUS PROFESSOR FRANCISCO GONÇALVES QUILES – CACOAL

DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE DIREITO

LAÍSE SOARES RAMOS DE MOURA

DA JUSTIÇA FISCAL NO ESTADO SOCIAL: VERIFICAÇÕES

ACERCA DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA BRASILEIRO

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

(MONOGRAFIA)

CACOAL – RO

2015

LAÍSE SOARES RAMOS DE MOURA

DA JUSTIÇA FISCAL NO ESTADO SOCIAL: VERIFICAÇÕES

ACERCA DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA BRASILEIRO

Monografia apresentada ao curso de Direito da Fundação Universidade Federal de Rondônia – UNIR – Campus Professor Francisco Gonçalves Quiles – Cacoal, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, elaborada sob a orientação do professor Mestre Victor de Almeida Conselvan.

CACOAL - RO

2015

DA JUSTIÇA FISCAL NO ESTADO SOCIAL: VERIFICAÇÕES

ACERCA DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA BRASILEIRO

LAÍSE SOARES RAMOS DE MOURA

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Fundação Universidade

Federal de Rondônia UNIR – Campus Professor Francisco Gonçalves Quiles –

Cacoal, para obtenção do grau de Bacharel em Direito, mediante a Banca

Examinadora formada por:

__________________________________________________

Professor Mestre Victor de Almeida Conselvan - UNIR - Presidente

__________________________________________________

Professor Mestre Bruno Milenkovich Caixeiro - UNIR - Membro

__________________________________________________

Professor Especialista Jônathas Sivieiro - UNIR - Membro

Conceito: __________________

Cacoal, 03 de julho de 2015.

Dedico este trabalho de conclusão de curso à minha família: meu pai, minha mãe e minha irmã, pois sem o apoio incondicional deles não teria chegado até aqui. É com grande alegria que compartilho com vocês mais essa vitória.

AGRADECIMENTOS

Inicialmente, agradeço a Deus, o Grande Arquiteto do Universo, por todas as

bênçãos que me concedeu, como a sabedoria, a saúde e a paciência para concluir

este curso, mesmo com todos os percalços desta jornada.

Agradeço, e não me canso de agradecer a minha família, meu alicerce, meu

tesouro, meus exemplos, meus amores. São vocês, Darcylio, Marise e Rosilene, que

me animam quando desanimo e que iluminam meu caminho quando, sozinha, não

enxergo a melhor saída. Saibam que sou grata por tudo e mais um pouco. Graças a

vocês tive forças para continuar, e finalmente, pude vencer. Eu amo vocês.

Agradeço aos meus amigos pela paciência, quando precisei me ausentar

para estudar. Agradeço também por se alegrarem quando eu, depois de tanto

esforço, obtenho sucesso. Também me alegro sinceramente pelas vitórias de cada

um de vocês. Estarei aqui se precisarem de mim.

Agradeço aos meus professores, mestres que dedicam seu tempo e seu

esforço neste nobre trabalho que é função primordial a esta sociedade, a este país,

tão calejado mas que em breve sairá desta crise.

Agradecimentos especiais ao meu professor Sérgio Nunes de Jesus, que

desde a minha época da escola me ensinou a gostar de Língua Portuguesa e dos

clássicos da literatura brasileira, e, recentemente, aceitou meu convite para

participar também da vida acadêmica, auxiliando neste trabalho de conclusão de

curso, muito obrigada!

Ao mestre Silvério dos Santos Oliveira, agradeço pelo empenho com a Unir

e os alunos, com a sua dedicação pelo curso de Direito, que já passou por inúmeros

entraves, e pôde contar com o professor para continuar em funcionamento; acredito

que seus esforços já geraram bons frutos (juízes, promotores, advogados) e com

certeza continuarão gerando bons profissionais.

Ao meu orientador, professor Victor de Almeida Conselvan por sua paciência

quando eu o procurava via internet ou pelo campus em busca de orientação e sua

maneira didática de explicar os institutos complexos que tratamos ao longo deste

trabalho, pelas contribuições valiosas, obrigada!

A professora Daeane Zulian Dorst por estar sempre de bom humor quando

eu a procurava para tratarmos dos assuntos ligados à Universidade, por sempre se

prestar a me ajudar com seu conhecimento jurídico, e pelos valiosos conselhos que

recebi, encorajando-me a não desistir e a não sucumbir à pressão dos prazos e da

complexidade que é o final do curso de Direito, agradeço de coração!

É uma pena não poder citar todos meus queridos mestres, portanto dedico,

a vocês professores todo o meu respeito e gratidão, caso contrário, eu não teria

adquirido esse conhecimento, nem teria chegado neste nível, nos meus estudos.

Agradeço aos meus anjos da guarda Doutora Gracileny Freitas Magalhães e

ao Doutor Lourenço Marques Pereira pelo apoio, pela compreensão e pelo

profissionalismo.

Por fim, mas não menos importante, agradeço aos meus colegas de sala,

cada um com sua personalidade me ensinou a conviver com as diferenças, aceitar o

próximo como é, e contribuir, à minha maneira para o sucesso em conjunto. Fico

feliz em ter estudado em uma sala cheia de gente inteligente e bonita!

“Julgue seu sucesso pelas coisas que você teve que renunciar para conseguir”. (Dalai Lama) "No momento que você pensar em desistir, lembre-se de todos os motivos que levaram você aguentar firme por tanto tempo." (Autor Desconhecido)

RESUMO

O Princípio da Isonomia Tributária requer que a carga tributária seja igualmente distribuída entre os cidadãos. Enquanto isso, o Princípio da Capacidade Contributiva atua como um critério, um componente social de justiça que exige que os pobres paguem proporcionalmente menos tributos que os ricos. E assim atuam os Princípios Constitucionais Tributários em direção à Justiça Fiscal. O principal objetivo deste trabalho é demonstrar a influência jurídica do Princípio da Isonomia Tributária no Sistema Tributário como paradigma de construção da Justiça Fiscal no Estado Social brasileiro. Como objetivos específicos o texto buscou sintetizar as características imanentes ao Estado Liberal e ao Estado Social, demonstrar breves considerações acerca dos Princípios da Isonomia, Capacidade Contributiva e pontos que os relacionam com a Justiça Fiscal. Justifica-se a pesquisa, portanto, para fomentar a discussão acerca de uma melhor distribuição da carga tributária no Sistema Tributário Nacional, de forma justa e eficiente. Para tanto, a pesquisa utilizou-se da vertente jurídico-dogmática, para, com uma avaliação crítica das estruturas do ordenamento jurídico investigar sua efetividade no plano social e fático. A técnica predominantemente utilizada foi a da análise bibliográfica, e os resultados foram dispostos logicamente a seguir. Palavras-chave: 1. Princípio da Igualdade. 2. Isonomia Tributária. 3. Capacidade Contributiva. 4. Justiça Fiscal.

ABSTRACT

The Principle of Tax Isonomy requires that the tax burden is distributed equally among citizens. Meanwhile, the Contributory Capacity principle acts as a criterion, a social justice component that requires that the poor pay proportionately less tax than the rich. In this way act Principles Constitutional Tax in order to Tax Justice. The main objective of this work is to demonstrate the influence of the legal principle of tax equality within the Tax System as the Tax Justice building paradigm in the Brazilian welfare state. The specific objectives, the text sought to summarize the characteristics inherent to the Liberal State and the Social State, demonstrate brief remarks about the principles of Isonomy, Contributory Capacity and points that relate to the Tax Justice. The research is justified, therefore, to encourage discussion about a better distribution of the tax burden in the National Tax System, fairly and efficiently. Therefore, the research used the juridical and dogmatic aspect, for, with a critical assessment of the legal system structures investigate its effectiveness in social and factual plan. The predominantly used technique was the literature review, and the results were logically arranged. Keywords: 1. Principle of Equality. 2. Tax Isonomy. 3. Contributory capacity. 4. Tax Justice.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 9 1 DO ESTADO LIBERAL AO ESTADO SOCIAL - UM ESCORÇO HISTÓRICO .... 10 2 FUNDAMENTO PRINCIPIOLÓGICO DA IGUALDADE ENQUANTO VETOR AXIOLÓGICO ........................................................................................................... 24 2.1 PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA ........................................................... 31 2.2 PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA ................................................ 38 2.3 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE ........................................................... 42 3 JUSTIÇA FISCAL SINÔNIMO DE TRIBUTAÇÃO JUSTA? .................................. 46 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 53 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 56

INTRODUÇÃO

O Estado Social, que influencia a organização política do Brasil e pauta-se no

preceito da Igualdade e da Justiça Social, requer uma ação intervencionista do

Estado na manutenção do necessário para a qualidade de vida da população ali

inserida.

O que se busca, por meio desta pesquisa, é demonstrar o Princípio da

Isonomia Tributária como paradigma de construção da Justiça Fiscal no Estado

Social. Objetiva, uma reflexão sobre os Princípios da Isonomia Tributária, da

Capacidade Contributiva e da Proporcionalidade, enquanto proteção do

cidadão/contribuinte em relação ao fisco, evitando possíveis abusos, e de forma que

esses valores possam fazer com que se imponha ao Estado competências para a

realização de determinadas condutas, em consonância à legalidade, no que tange

ao Direito Tributário, rumo à mitigação (ou erradicação) das desigualdades sociais,

culturais e econômicas, preconizadas pelo Estado Social e pela Justiça Fiscal.

Para isso, foram delineados três capítulos que possibilitam a compreensão

do tema. Inicialmente, será abordada a contextualização histórica acerca do Estado

Social. Então, serão expostos os fundamentos dos Princípios da Isonomia Tributária,

sua relação com o Princípio da Capacidade Contributiva e o Princípio da

Proporcionalidade. Por fim, busca-se tratar da Justiça Fiscal propriamente dita, para

que se compreenda seus benefícios, sua viabilidade, e sua relação com o Estado

Social, por meio da Isonomia Tributária. Assim, demonstram-se as considerações

dos doutrinadores da área acerca do tema, e explicita-se o aspecto teleológico do

Direito Tributário no Estado Social, em contraponto ao contexto histórico liberal,

defronte aos princípios supracitados, bem como sua contribuição para a realização

da mitigação das desigualdades sociais, almejadas pela Justiça Fiscal.

1 DO ESTADO LIBERAL AO ESTADO SOCIAL - UM ESBOÇO HISTÓRICO

Como um primeiro capítulo desta monografia optou-se por situar o leitor

acerca de um contexto histórico breve para que perceba as mudanças pelas quais o

Estado passou, e vem passando. Como a pesquisa objetiva avaliar o encontro das

teorias e das normas jurídicas no ordenamento jurídico pátrio, é de suma

importância compreender o Sistema Tributário Nacional no Estado Social Brasileiro.

Partindo de uma perspectiva da evolução estatal, o Estado, conforme ensina

a doutrina moderna, é composto por três elementos essenciais, a saber, população,

território e poder soberano. Nesse sentido, interfere diretamente na vida das

pessoas que se inserem em seu espaço geográfico por meio de ações interventivas

que se justificam pelo poder dado aos governantes, pelos administrados. Entretanto,

para que se chegasse a esse Estado Moderno, houveram diversos períodos

históricos importantes no desenvolvimento do pensamento estatal. Inicialmente,

deve-se analisar a sua relação com o Direito, conforme Dallari (1998, p. 43) observa:

O minucioso exame das características do poder do Estado, de sua origem, de seu modo de funcionamento e de suas fontes leva à conclusão de que, assim como não se pode admiti-lo como estritamente político, não há também como sustentar que seja exclusivamente um poder jurídico. Isso foi muito bem demonstrado por MIGUEL REALE, através da análise das várias posições sobre o assunto e considerando a estreita relação, mantida através dos séculos e nos mais diversos estágios de cultura, entre poder e direito. A observação de qualquer sociedade humana revela sempre, mesmo nas formas mais rudimentares, a presença de uma ordem jurídica e de um poder. Organizar-se, portanto, é constituir-se com um poder, diz REALE, assinalando que, assim como não há organização sem presença do direito, não há poder que não seja jurídico, ou seja, não há poder insuscetível de qualificação jurídica.

Assim, o Direito atua em colaboração com o Estado, que por sua vez, justifica

a existência da ordem jurídica, conforme pode-se observar na lição de Maluf (2013,

P.15) explica que:

O Estado é uma organização destinada a manter, pela aplicação do Direito, as condições universais de ordem social. E o Direito é o conjunto das condições existenciais da sociedade, que ao Estado cumpre assegurar. Para o estudo do fenômeno estatal, tanto quanto

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para a iniciação na ciência jurídica, o primeiro problema a ser enfrentado é o das relações entre Estado e Direito. Representam ambos uma realidade única? São duas realidades distintas e independentes?

E, conforme são aprofundados os estudos na ‘Teoria Geral do Estado’, as

opiniões dos doutrinadores se dividem em três grupos: a) Teoria Monista; b)

Paralelista; c) e Pluralista. Sendo assim, Maluf (2013, p. 17) especifica que:

A teoria do paralelismo completa a teoria pluralista, e ambas se contrapõem com vantagem à teoria monista. Efetivamente, Estado e Direito são duas realidades distintas que se completam na interdependência. Como demonstra o prof. Miguel Reale, a teoria do sábio mestre da Universidade de Roma coloca em termos racionais e objetivos o problema das relações entre o Estado e o Direito, que se apresenta como um dos pontos de partida para o desenvolvimento atual do Culturalismo (...).

Assim, é válido ressaltar que o estudo do Direito só se torna legítimo e é

respeitado pelos seus administrados quando também carrega legitimidade, sentido e

acompanha as transformações da sociedade. Rousseau (1999, p. 108) já em 1762

afirmava essa ideia em sua obra O Contrato Social, pois, não tendo outra força além

do poder legislativo, o soberano ou o encarregado só age por meio das leis; e, não

sendo estas mais que atos autênticos da vontade geral, o soberano só pode agir

quando o povo se encontra de acordo com o que está descrito nas leis.

A Legitimidade, de acordo com Silva (2010, p. 483), nas ciências políticas

refere-se à necessária qualidade para tornar válida a sua atuação em face dos

demais cidadãos. O autor cita, como exemplo, o artigo 70 da Constituição Federal, a

atribuição ao Tribunal de Contas o poder de perquirir a legitimidade das despesas

públicas, isto é, perquirir se o ato atende aos requisitos de satisfação do interesse

público. O Estado, nesse sentido, tem o seu ordenamento jurídico dotado de

legitimidade somente quando este atende aos interesses da coletividade e é dotado

de coercitividade.

Partindo dessa ideia, busca-se compreender, brevemente o surgimento do

Estado. Dentro dessa perspectiva apontada acima, Maluf (2013, p. 83) coaduna que:

Numerosas e variadas teorias tentam explicar a origem do Estado, e todas elas se contradizem nas suas premissas e nas suas conclusões. O problema é dos mais difíceis, porquanto a ciência não

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dispõe de elementos seguros para reconstruir a história e os meios de vida das primeiras associações humanas. Basta ter em vista que o homem apareceu na face da terra há cem mil anos, pelo menos, enquanto os mais antigos elementos históricos de que dispomos remontam apenas a seis mil anos.

Entretanto, pelo que se sabe, a organização das primeiras civilizações era

basicamente comunista, em que todos produziam, sem maiores excedentes, apenas

para a subsistência das tribos ou comunidades, não havia ainda de certa maneira

um conjunto bem delineado de normas, e por isso, inicialmente, todos decidiam

quando necessário. Este tipo de sociedade não possuía classes sociais definidas.

Naturalmente, com o tempo, nasce a palavra, a memória, a moral, e o

resultado dessa agregação é a natural dominação dos mais astutos sobre os mais

fracos, legalizando um estado de fato, por um contrato social, onde uma parcela

concede segurança, e a outra concede obediência. Essa dominação passa a ser

assim o certo, torna-se verdade, o natural.

As cidades se organizam hierárquica e administrativamente, e o que surge

desse contrato social estabelecido até aqui, é o Direito. E a lei, objeto da ciência

jurídica, deve se ajustar à razão, ou aos anseios da sociedade em que se insere

para se tornar legítima e devidamente aplicável. Disto, até hoje, não podem se

esquecer os legisladores.

Corroborando com a ideia de Direito afeto à relação do cidadão com o

Estado, Mello (2014, p. 1085) diz que:

As ideias jurídicas vigentes em um dado período sofrem inevitável influência do ambiente cultural em que estejam imersas. Com efeito, o mundo do Direito não vive em suspensão, alheio ao contexto socioeconômico que lhe serve de engaste. Pelo contrário, as concepções dominantes em uma sociedade são as que ofertam a matéria-prima trabalhada pelos legisladores e depois pelos intérpretes das regras por ele produzidas.

Sendo assim, existem teorias que se encarregam de explicar o modo de

socialização do homem. De acordo com a Teoria Familiar do Estado, na concepção

de Azambuja (1997, p. 5), como primeiras organizações sociais humanas, as

famílias, sociedades naturais por excelência, são responsáveis pela proteção,

alimentação e educação dos indivíduos que nelas se encontram inseridos. Mesmo

nas famílias primitivas, os historiadores afirmam haver a figura de um líder,

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geralmente uma figura mais velha, que decidiria as questões controversas e ditaria

as regras daquela família.

Essas famílias se encontram em conjuntos sociais maiores que, por sua vez,

vão constituindo a sociedade, que mais tarde ao se organizar melhor, culminarão

num conjunto maior, que decorre da proeminência da obrigatoriedade de laços dos

indivíduos, que será a sociedade política, ou seja, o Estado. Dessa origem familiar

também se justificam algumas características do Estado nas suas primeiras

manifestações, como o direito a primogenitura, a unidade do poder e a

inalienabilidade do território da família, entre outros.

Pela Teoria Patrimonial, conforme relata Maluf (2013, p.85), o Estado teria

originado da união das profissões econômicas, para proteger a propriedade e

regulamentar as relações de ordem patrimonial. Decorre desta teoria, a afirmação,

de certo modo, de que a propriedade seria um direito anterior a organização do

Estado.

Há duas outras grandes teorias, a saber, a teoria da origem Contratualista e

da Origem Violenta do Estado.

Ainda para Maluf (2013, p. 86), a Teoria da força, ou a teoria da origem

violenta do Estado afirma que a organização política resultou do poder de

dominação dos mais fortes sobre os mais fracos, mas essa força, não poderia ser,

em tese, somente a força bruta, mas também a força que promove a unidade e

estabelece o direito, bem como realiza a justiça social.

Uma das obras que contribuíram para a literatura política, do lado

Contratualista da doutrina foi o Contrato Social de 1762, escrito por Rousseau, que

auxilia na compreensão deste tema, a justificação do poder, da autoridade suprema

que se impõe aos membros da coletividade. Em sua obra, o autor descreve um

"estado de natureza", onde o homem, vivendo sozinho, acaba ficando limitado, e

precisa de outros homens para se desenvolver.

Essas duas teorias são, de acordo com Azambuja (1997, p. 100)

contemporâneas, mas segundo o autor, somente a teoria da Origem Violenta do

Estado possui evidências científicas comprovadas.

Quase todos os sociólogos, inspirados nas ideias de Darwin, veem na sociedade política o produto da luta pela vida, nos governantes a sobrevivência dos mais aptos, na estrutura jurídica dos Estados a

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organização da concorrência. O darwinismo político seria a expressão científica do maquiavelismo, pois insensivelmente inclui no conceito de força não só violência mas também a astúcia (AZAMBUJA, 1997, p. 100).

O Estado, aqui, historicamente começando a se organizar seja pela força,

seja pelo contrato social ou pela união das famílias, pressupõe uma finalidade

comum, de segurança, manutenção da subsistência, e um conjunto organizacional

de normas, direitos e deveres. Para ser reconhecido, seus elementos básicos são o

território, o povo e a soberania.

Segundo Bonavides (2007, p. 40) "a Sociedade representava historicamente,

e depois racionalmente, com Kant, a ambiência onde o homem fruía de plena

liberdade. O Estado e a soberania implicavam antítese, restringiam a liberdade

primitiva".

O que se questiona, entretanto, de acordo com Dallari (1998, p. 8) é o porquê

desse fato de agrupamento social, e até certo ponto, limitação da liberdade humana:

A vida em sociedade traz evidentes benefícios ao homem mas, por outro lado, favorece a criação de uma série de limitações que, em certos momentos e em determinados lugares, são de tal modo numerosas e frequentes que chegam a afetar seriamente a própria liberdade humana. E, apesar disso, o homem continua vivendo em sociedade. Como se explica este fato? [...] Tanto a posição favorável à ideia da sociedade natural, fruto da própria natureza humana, quanto a que sustenta que a sociedade é, tão só, a consequência de um ato de escolha, vêm tendo, através dos séculos, adeptos respeitáveis, que procuram demonstrar, com farta argumentação, o acerto de sua posição. Impõe-se, portanto, que se faça o estudo de ambas as posições e dos respectivos argumentos, uma vez que esse é o dado inicial do qual dependerão conclusões fundamentais, relativas à posição do indivíduo na sociedade e no Estado, com repercussões muito sérias sobre as diretrizes a respeito da organização, do funcionamento e da própria existência do Estado.

E o autor prossegue, afirmando que, em suma, só na convivência e com a

cooperação dos semelhantes o homem pode beneficiar-se das energias, dos

conhecimentos, da produção e da experiência dos outros, acumuladas através de

gerações, obtendo assim os meios necessários para que possa atingir os fins de sua

existência, desenvolvendo todo o seu potencial de aperfeiçoamento, no campo

intelectual, moral ou técnico.

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Esses, em linhas gerais, os argumentos que sustentam a conclusão de que a

sociedade é um fato natural, determinado pela necessidade que o homem tem da

cooperação de seus semelhantes para a consecução dos fins de sua existência.

Essa necessidade não é apenas de ordem material, uma vez que, mesmo provido

de todos os bens materiais suficientes à sua sobrevivência, o ser humano continua a

necessitar do convívio com os semelhantes (DALLARI, 1998, p. 09).

E, na tarefa de conceituar o Estado, Azambuja (1997, p. 06) procura o definir

da seguinte maneira:

A autoridade é intrínseca ao Estado, é o seu modo de ser, e o poder é um de seus elementos essenciais. Sem dúvida, em outras formas de sociedade também existe a autoridade e o poder. Mas, o poder do Estado é o mais alto dentro do seu território, e o Estado tem o monopólio da força para tornar efetiva sua autoridade. As normas que organizam o Estado e determinam as condições sociais necessárias para realizar o bem público, constituem o Direito, que ao Estado incumbe cumprir e fazer cumprir. Do que até aqui foi dito, podemos inferir uma noção preliminar: Estado é a organização político-jurídica de uma sociedade para realizar o bem público, com governo próprio e território determinado. (grifos originais)

Após o período supracitado, já entre 4000 a.C. e 400 d.C. houve um período

classificado como Escravismo, onde uma parcela da população encontrou um meio

violento de dominar a outra parcela, restando duas classes sociais bem definidas, os

senhores e os escravos, onde as decisões eram tomadas somente pelos senhores

de escravos. Havendo, porém a figura do imperador, figura militar, que comandava

os anseios de expansão da época. A organização das normas não era bem

delineada, e dependia basicamente dos costumes, da vontade dos senhores e do

imperador.

Seguindo na lição de Maluf (2013, p. 123):

O primeiro traço comum que devemos colocar em relevo é o que se refere à estrutura heterogênea daqueles Estados: eram formados e mantidos pela força das armas. Os povos viviam constantemente em guerra. O imperador que triunfasse em maior número de batalhas anexava os territórios conquistados e escravizava as populações vencidas,formando um grande império com plena hegemonia sobre vastas e determinadas regiões.

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Existem diversas teorias sobre o surgimento do Estado, como a demonstrada

por Dalmo Dallari (1998, p. 8):

O antecedente mais remoto da afirmação clara e precisa de que o homem é um ser social por natureza encontra-se no século IV a.C., com a conclusão de ARISTÓTELES de que "o homem é naturalmente um animal político". Para o filósofo grego, só um indivíduo de natureza vil ou superior ao homem procuraria viver isolado dos outros homens sem que a isso fosse constrangido. Quanto aos irracionais, que também vivem em permanente associação, diz ARISTÓTELES que eles constituem meros agrupamentos formados pelo instinto, pois o homem, entre todos os animais, é o único que possui a razão, o sentimento do bem e do mal, do justo e do injusto. Na mesma ordem de ideias e, sem dúvida, por influência de ARISTÓTELES, vamos encontrar em ROMA no século I a.C., a afirmação de CÍCERO de que "a primeira causa da agregação de uns homens a outros é menos a sua debilidade do que um certo instinto de sociabilidade em todos inato; a espécie humana não nasceu para o isolamento e para a vida errante, mas com uma disposição que, mesmo na abundância de todos os bens, a leva a procurar o apoio comum".

O império romano, que focalizava-se na ideia de Cidades-Estado ou "Polis",

foi o último dos grandes impérios da antiguidade. O seu declínio se deu em razão

das invasões bárbaras, assinalando o fim da idade antiga e início da Idade Média.

O Estado romano tinha a sua origem, efetivamente, na ampliação da família. A família era constituída pelo pater, seus parentes agnados, os parentes destes, os escravos (servus) e mais os estranhos que se associavam ao grupo (famulus). A autoridade do pater familia era absoluta: pontífice, censor dos costumes, juiz e senhor, com poder de vida e morte sobre todos os componentes do grupo (jus vitae et necis). (MALUF, 2013, p. 131)

Estima-se que de 400 d. c. a aproximadamente 1450 d.c., fim do império

Romano, o modo de produção dominante foi o Feudalismo, que consistia em uma

economia agrária e de subsistência.

De acordo com Maluf (2013, p. 138), a descentralização feudal foi uma das

mais notáveis características do Estado na Idade Média. Para alguns autores, foi

uma continuação da fase de desaparecimento ou quase desaparecimento do

Estado. Com isso, a riqueza estava na posse da terra, assim, quanto mais terras ou

maior a extensão de terra possuísse, mais rico era o senhor. Inicialmente, os nobres

eram os detentores das maiores porções de terra. Nos feudos se produziam cereais,

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verduras, mel e frutas. Outra atividade importante era a pecuária, criavam-se cabras,

ovelhas, porcos e outros animais, embora não se abatiam, afinal a conservação da

carne era difícil.

Nessa época, existia a figura dos reis, que davam grandes porções de terras

aos senhores feudais que se encarregavam de organizar os feudos, em troca

ajudariam o rei sempre que necessário. Esses senhores feudais viviam da coleta de

impostos e da produção dos servos que habitavam suas terras. Os servos, nesse

momento não possuíam direitos, e trabalhavam para os senhores feudais. Existia

outra classe, próxima ao rei e aos nobres que era o clero, representantes religiosos

que também recolhiam o dízimo. A maior parte das decisões eram tomadas pelos

senhores feudais.

Os reis bárbaros, francos, godos, lombardos e vândalos, uma vez completada a dominação dos vastos territórios que integravam a órbita de hegemonia do extinto império cesarista, passaram a distribuir cargos, vantagens e privilégios aos seus chefes guerreiros, resultando daí a fragmentação do poder. (...) Em compensação, tais concessionários se comprometiam a defender o território, prestar ajuda militar, pagar tributos e manter o princípio da fidelidade de todos os súditos ao Rei. (MALUF, 2013, p. 139)

Esse sistema teve seu declínio quando os feudos não foram mais aptos a

abastecer as populações locais, devido a peste, más colheitas e ao nascimento do

comércio, com o consequente aparecimento da classe da burguesia. Termina-se

assim, a Idade Média, e institui-se a transição para tempos modernos. Surgem as

monarquias absolutistas com fortes tradições católicas. Na lição de Maluf (2013, p.

149):

A Monarquia absoluta assentava-se sobre o fundamento teórico do direito divino dos reis, com evidentes resquícios das concepções monárquicas assírias e hebraicas. A autoridade do soberano era considerada como de natureza divina e proveniente de Deus. O poder de imperium era exercido exclusivamente pelo Rei, cuja pessoa era sagrada e desligada de qualquer liame de sujeição pessoal(...).

Em contraponto aos ideais absolutistas, com o passar do tempo e o avanço

do pensamento da população e dos pensadores da época, desenvolveu-se a

concepção de um Estado no qual o poder não seria mais concentrado na figura de

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um monarca, em razão de dons divinos, e sim pela vontade e necessidade do povo

de que o Estado seja organizado e administrado. Assim, como demonstra Dallari

(1998 p. 54):

O Estado Democrático moderno nasceu das lutas contra o absolutismo, sobretudo através da afirmação dos direitos naturais da pessoa humana. Daí a grande influência dos jusnaturalistas, como LOCKE e ROUSSEAU, embora estes não tivessem chegado a propor a adoção de governos democráticos, tendo mesmo ROUSSEAU externado seu descrédito neles. De fato, após admitir que o governo democrático pudesse convir aos pequenos Estados, mas apenas a estes, diz que "um povo que governar sempre bem não necessitará de ser governado", acrescentando que jamais existiu verdadeira democracia, nem existirá nunca. E sua conclusão é fulminante: "Se existisse um povo de deuses, ele se governaria democraticamente. Tão perfeito governo não convém aos homens". Apesar disso tudo, foi considerável a influência de ROUSSEAU para o desenvolvimento da ideia de Estado Democrático, podendo-se mesmo dizer que estão em sua obra, claramente expressos, os princípios que iriam ser consagrados como inerentes a qualquer Estado que se pretenda democrático.

E o autor prossegue, afirmando que o Estado Democrático fora influenciado

por três movimentos político-sociais, sendo eles a Revolução Inglesa que teve sua

expressão mais significativa em 1689, A Revolução Americana cujos princípio foram

expressos na Declaração de Independência em 1776 e a Declaração dos Direitos do

Homem e do Cidadão em 1789 (DALLARI, 1998, p.55).

Nesse caminho, para a correta avaliação do tema, se faz necessário saber

breves considerações acerca do Estado Liberal e Social, bem como suas principais

semelhanças e diferenças.

O Liberalismo foi idealizado na segunda metade do século XVIII,

contemporâneo ao Capitalismo, na Europa. Influenciado pelo Iluminismo, este

consagrou a aspiração burguesa de liberdade, igualdade e fraternidade. Assim,

surgiu o Estado liberal de Direito, que assegurava liberdades individuais aos

cidadãos, e permitiu a separação dos poderes.

O Estado Liberal de Direito surge, com influências da Revolução Francesa de

1789, contrapondo as ideias que pregavam os defensores do Absolutismo, e trouxe

às discussões concepções filosóficas novas, racionalista consagrando a influência

da Burguesia no pensamento político.

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Bonavides (2007, p.63) ao tratar justamente do Estado Liberal em transição

ao Estado social traz reflexões importantes para a sua compreensão:

Esteio sagrado do liberalismo foi, por sem dúvida, o dogma da separação de poderes. O célebre art. 16 da Declaração dos Direitos do Homem, contida na Constituição francesa de 3 de setembro de 1791, assim rezava: "Toda sociedade que não assegura a garantia dos direitos nem a separação dos poderes não possui constituição". Até onde esse princípio conserva no moderno Estado social sua valoração e quais as vicissitudes históricas e doutrinárias por que passou, em ordem a afiançar-lhe a sobrevivência na esfera do constitucionalismo contemporâneo, eis o que passamos a indagar, com a recapitulação da influência política que alcançou nas diversas fases da evolução constitucional do século XVIII, aos nossos dias.

Dessa forma, o Estado Liberal, fundando-se em novas ideias para à época,

rompe com o antigo regime, permitindo o desenvolvimento do Estado de Direito, e a

afirmação da separação dos poderes, quista por Montesquieu (2000) em sua obra o

Espírito das Leis.

A partir dessas ideias liberais, legitimou-se o regime democrático, que,

baseando-se no poder popular, onde o povo escolhia o seu representante político,

para assumir a chefia do Estado de Direito, no qual os poderes de administração

deveriam ser minimamente intervencionistas e ser exercidos com obediência de

normas pré-estabelecidas.

Suas principais características, na lição de Sundfeld (2006, p. 126), são:

intervenção mínima do Estado na economia, vigência do princípio da igualdade

formal, tripartição dos poderes de acordo com Montesquieu, supremacia da

Constituição como limitadora do poder governamental e garantia de direitos

individuais fundamentais de primeira geração.

Contribuindo com essa ideia, Melo (2014, p. 1091), ao considerar o

liberalismo mais recente, em meio ao progresso tecnológico afirma que:

[...] O progresso tecnológico tornou a "globalização" inevitável e irreversível; de que é inerente a ela a abertura dos mercados de todos os países ao ingresso do capitalismo internacional, com a natural presença das empresas multinacionais. Seu consectário natural e incontestável seria a necessidade de redução do papel do Estado a um mínimo (O Estado-Mínimo), cumprindo, então, privatizar as empresas estatais. O Estado deveria se limitar à "regulação", deixando a presença ativa no meio socioeconômico à ação das empresas e do livre mercado, o qual por si mesmo provocará o

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equilíbrio e o bem-estar social, pelo que, para ensejar o máximo de eficiência deste mercado, deve-se também "desregulamentar" o quanto possível, flexibilizando diversas relações, como as de trabalho por exemplo.

Ao governo, restou a missão de não intervenção ou intervenção mínima, para

garantir o mercado e a livre iniciativa. Direitos, como a vida, a liberdade e a

propriedade foram, finalmente considerados fundamentais.

Por outro lado, como aponta Tomazeli (1999, p 09), o Estado Liberal

apresentou certas falhas como mecanismo administração estatal:

O liberalismo, ao apoiar-se em demasia na propriedade com seu poder dominante, coloca em segundo plano o valor efetivo da democracia. Essa situação resulta na fragilidade da própria democracia liberal, acabando por produzir guetos sociais, favelas e miséria humana, onde o Estado formal não atua e onde não se relaciona com o cidadão, e portanto não se realiza. (...) Essas questões colocam o problema da efetivação do Estado Liberal como sistema de gestão política dominante com grandes dificuldades para promover um desenvolvimento com equidade.

Nesse período, em razão da maior difusão de informação, e do Iluminismo,

tem-se o registro de diversos pensadores que influenciaram a população da época.

Os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade da Revolução Francesa, a própria

Revolução Industrial e o fim da Segunda Guerra Mundial tiveram papel de destaque

nos motivos de desaceleração do capitalismo e transição para um chamado Estado

Social.

Assim, conforme Martinez (2005, online):

O Estado Social vem sendo gestado desde as revoltas e tentativas de revolução européias dos anos 1848 e ganhou um empuxo ainda maior com a Comuna de Paris, em 1871. Depois, já no século XX, afirmou-se com a Revolução Mexicana, de 1910, e com a Revolução Russa, de 1917. Portanto, o chamado New Deal (plano econômico de restauração da economia americana, abalada com a grave crise de 29) é apenas um marco econômico posterior do Estado Social. Isto é, de meados do século XIX até os anos de 1930, o Estado Social esteve consolidando suas bases históricas e matrizes ideológicas.

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Neste modo de produção, o Estado, seguindo leis pré-estabelecidas e

legítimas para a população na qual se insere, em acordo com os trabalhadores, com

os partidos, associações, sindicatos, cooperativas, e com os princípios gerais de

Direito deve pautar-se sempre na justiça, buscar a qualidade de vida da população,

a dignidade da pessoa humana, o bem-estar social, e outros valores conquistados

após anos de evolução histórica. Martinez (2005, online) prossegue,

contextualizando o Estado Social:

O Estado Social é um Estado quase-socialista, pois afirma direitos e políticas socializantes (a maioria das conquistas da classe trabalhadora), a exemplo dos próprios direitos sociais e trabalhistas. Ocorre que o Estado Social não foi capaz de romper os limites e as barreiras do capitalismo, uma vez que se desenvolveu em países de economia capitalista. De qualquer forma, no entanto, tratava-se de um processo de intensas lutas operárias e sindicais anarquistas e socialistas que se iniciou nos anos 1848-1850, em países como França, Alemanha e Inglaterra e formou a base ideológica do Estado Social. Já o Estado do Bem Estar Social é uma resposta eminentemente capitalista ao desenvolvimento e avanço do socialismo que vinha do Leste Europeu (a Revolução Russa foi apenas o primeiro passo). Portanto, o núcleo do Welfare State sempre esteve permeado por um posicionamento conservador diante das propostas socialistas testadas na prática desde o início do século XX. Trata-se da articulação Constituição-Povo que tornará as Constituições Sociais/Socialistas mais do que Constituições de papel, de acordo com a acepção pejorativa de Lassalle. Essas Constituições irão orientar legislações especializadas em direitos trabalhistas, em diversos países, a exemplo da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) no Brasil, em 1942.

Dessa maneira, para garantir os novos Direitos, e os que os cidadãos exigiam

do Estado, este se viu obrigado a intervir cada vez mais na vida dos governados, a

fim de combater a centralização das riquezas e a desigualdade desenfreada, por

exemplo nas relações de trabalho, e na economia.

Assim, com a Revolução Industrial em 1917, na qual o trabalhador,

reivindicando melhores condições de trabalho, o ideal liberal encontrou-se

ameaçado, abrindo margem à divulgação das ideias do Estado Social, que pregava

a igualdade material e realização de justiça. Defendia-se o intervencionismo estatal,

e a melhoria no bem-estar social.

O Estado Social se fundamenta na ideia de um mínimo padrão de vida que

deve ser garantido à todos, baseado no mercado, mas com larga interferência

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estatal, ensejando não só o crescimento, mas também o desenvolvimento. Assim,

conforme ensina Mello (2014, p. 1092):

O fato é que já em 1917, pela primeira vez na História, uma Constituição, a Mexicana, consagrava direitos sociais, que apareceriam novamente, em 1919, na Constituição de Weimar; e desde então, se alastraram pelo mundo, representando um visível progresso da humanidade. Além de optar, quando de sua promulgação, por um decidido apoio ao genuinamente nacional, de que é exemplo, a norma que qualifica o mercado interno como patrimônio nacional ou o revogado conceito de empresa brasileira de capital nacional e sua correlata proteção, a Constituição brasileira de 1988, à toda evidência, inclui-se na linha do Estado Providência, do Estado Social de Direito, que pressupõe uma presença ativa do Poder Público para promover o bem-estar dos administrados, notadamente dos que se encontram na base da pirâmide social.

O Estado Social de Direito, dessa forma, é aquele no qual se fixam

obrigações positivas ao Estado, os chamados direitos de segunda geração, ou

direitos sociais, que melhoram as condições de vida e de trabalho da população,

como saúde, lazer, educação, e moradia digna. E, naturalmente evoluindo, conforme

a lição de Martinez (2005, online) para a Democracia, não se afasta da ideia social

de bem estar:

É possível estabelecer alguma conexão histórica ou principiológica entre o Estado Social e o Estado Democrático? Sim, pois o Estado Democrático é uma modalidade de Estado de Bem Estar. A democracia e a República deveriam propiciar o maior bem-estar social possível, e suas legislações não definem outro caminho. Veremos que, nesse sentido, o não-cumprimento das promessas democráticas é um problema ou fato social e político ou, então, de natureza econômica, mas não propriamente um obstáculo de ordem e natureza jurídica – não se diz facilmente que o Direito prejudica a democracia. Pode-se dizer que o Estado Democrático é uma espécie de segunda fase do Estado Social, que adveio das principais constituições do período entre 1940 e 1950. Para a Constituição Alemã de 1949, a chamada Lei Fundamental, por exemplo, o indivíduo será um sujeito de direitos, mas também um sujeito responsável pela participação social e política. (...) Assim, visto que o Estado Social e o Estado Democrático devem ser agrupados, tratados como um conjunto orgânico, alguns de seus atributos também serão comuns ou compartilhados, como ocorre com esse princípio de humanização do Estado e do Direito. Para o Estado Social, o princípio da dignidade da pessoa humana é basilar, pois que a humanização do Estado, desde as revoltas e revoluções

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do início do século XX, significa respeitar os direitos dos trabalhadores e assistir os pobres. Pois bem, esse também será o primeiro princípio do Estado Democrático, que o tomará de empréstimo do Estado Social, para figurar dali em diante em todas as Constituições: na CF de 88, por exemplo, corresponde perfeitamente ao artigo 3º, III. Portanto, como princípio fundamental do Estado Social, o princípio da dignidade da pessoa humana será um importante princípio do Estado Democrático. Mas o Estado Democrático ainda terá mais dois princípios, agora genuínos e essenciais ao nascedouro da atual democracia representativa, uma vez que só foram proclamados constitucionalmente entre as décadas de 1940 e 1950.

O Estado Social foi assentado, historicamente em dois documentos jurídicos

principais, a Constituição Mexicana de 1917, a Constituição Alemã de 1919. Assim,

é um Estado que já nasceu com ideais jurídicos, com garantias legais, onde os

direitos sociais, trabalhistas e difusos estavam previstos nas Constituições. Na lição

de Velasco (2010, p. 93):

O Estado social é denominado, por assim dizer, como sendo uma nova fase do chamado Estado constitucional. Tendo este em sua primeira fase ‘as primeiras requisições pelos direitos individuais (da Magna Carta, em 1215, ao Bill Of Rights ‘projeto de lei dos direitos’, de 1689)’; em sua segunda fase, com as revoluções Americana e Francesa, o Estado pôde conhecer uma nova estrutura jurídica diferenciada, tendo a preocupação de resguardar o próprio direito à revolução e com características constitucionais próprias (os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade); já em sua terceira fase, o Estado constitucional passa a se pautar pelos direitos sociais e trabalhistas, mas agora como garantias irrenunciáveis do trabalhador.Por isso, o Estado Social pode ser tratado como a terceira fase do chamado Estado Constitucional.

Neste contexto, a Constituição Federal de 1988 consolidou boa parte desses

direitos sociais, e avançou muito em direção à democracia moderna, com a

mentalidade de seguridade social, definida na Constituição Federal, no artigo 194,

como um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da

sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à

assistência social.

Importante dizer que a Constituição brasileira de 1988 aliou os ideais do

Estado Social com os fundamentos do Estado Democrático de Direito, que cria os

direitos de terceira e quarta geração, como os difusos e coletivos, direito à

informação, pluralismo político, entre outros.

2 FUNDAMENTO PRINCIPIOLÓGICO DA IGUALDADE ENQUANTO VETOR

AXIOLÓGICO

Todo trabalho científico deve apresentar de maneira clara os conceitos aos

quais se refere de maneira clara e delineada. Por isso, é importante que se

compreenda, inicialmente a interpretação do que se entende por norma. Nessa

missão, Humberto Ávila (2005, p. 22) afirma que:

Normas não são textos nem o conjunto deles, mas os sentidos construídos a partir da interpretação sistemática de textos normativos. Daí se afirmar que os dispositivos se constituem no objeto da interpretação; e as normas, no seu resultado. O importante é que não existe correspondência entre norma e seu dispositivo, no sentido de que sempre que houver um dispositivo haverá uma norma, ou sempre que houver uma norma deverá haver um dispositivo que lhe sirva de suporte.

Assim, as normas podem ser apresentadas por princípios, enunciados, leis e

outros métodos utilizados pela ciência jurídica. Para o estudo do Princípio Igualdade

Tributária, e seus desdobramentos, mister se faz a compreensão do sentido das

palavras que compõem a expressão, bem como os sentidos que carregam. Nas

palavras de Ávila (2009, p. 133):

Diferentes sujeitos podem utilizar-se da palavra Igualdade conferindo-lhe sentidos completamente diversos uns dos outros. Alguns autores se referem à Igualdade como pertencendo à categoria de "princípio", outros como se ela fosse uma "regra", e outros ainda, como se fosse um "direito". Alguns a adjetivam com o qualificativo de "formal", ao passo que outros atribuem-lhe a característica de "material", quando não a qualificam de "vazia" ou "meramente formal". (...) É preciso compreender, antes de tudo, que a palavra "Igualdade" é um signo e, como tal, suscetível de ser dotado de diferentes sentidos, conferidos de variadas formas e com vários propósitos.

Como a proposta do trabalho é avaliar o Princípio da Isonomia Tributária

como paradigma de construção da Justiça Fiscal no Estado Social Brasileiro,

cumpre entender a terminologia utilizada, sem, no entanto, ter a pretensão de definir

ou esgotar o tema, a saber, princípio. Afinal, o que é, em síntese, um princípio?

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Há diversos autores na ciência jurídica que se dedicam a dissertar sobre o

tema. A verdade é que a doutrina majoritária classifica a Igualdade ou Isonomia

como um princípio. Silva (2010, p. 606) buscou definir princípio da seguinte forma:

Derivado do latim principium (origem, começo), em sentido vulgar quer exprimir o começo de vida ou o primeiro instante em que as pessoas ou as coisas começam a existir. É, amplamente, indicativo do começo ou da origem de qualquer coisa. Princípio é também a expressão que designa a espécie de norma jurídica cujo conteúdo é genérico, contrapondo-se à regra ou do preceito, que é a norma mais individualizada. Constitui princípio jurídico normas genéricas como, por exemplo "todos são iguais perante a lei", enquanto preceito ou regra é a norma específica, como, por exemplo, o idoso tem o direito à assistência de sua família.

Assim, isso se torna um preceito, de forma geral, e se aceito na ciência

jurídica, essa norma, genérica, se torna um princípio. Como uma segunda definição,

tem-se Sundfeld (1992, p. 137):

Os princípios são ideias centrais de um sistema, ao qual dão sentido lógico harmonioso, racional, permitindo a compreensão de seu modo de organizar-se. Tomando como exemplo de sistema certa guarnição militar, composta de soldados, suboficiais e oficiais, com facilidade descobrimos a ideia geral que explica seu funcionamento: 'os subordinados devem cumprir as determinações dos superiores'. Sem captar essa ideia é totalmente impossível entender o que se passa dentro da guarnição a maneira como funciona. A enunciação dos princípios de um sistema tem, portanto, uma primeira utilidade evidente: ajuda no ato de conhecimento.

Como orientações hermenêuticas, Ávila (2005, p. 22) ao tratar das normas, no

sentido amplo, que também englobam os princípios, os enunciados e as regras,

afirma que nem sempre a norma precisa estar positivada para ser um dever e ter

imperativismo, executividade como se observa adiante:

Em alguns casos há norma, mas não há dispositivo. Quais são os dispositivos que preveem os princípios da segurança jurídica e da certeza do Direito? Nenhum. Então há normas, mesmo sem dispositivos específicos que lhes deem suporte físico. Em outros casos há dispositivo mas não há norma. Qual norma pode ser construída a partir do enunciado constitucional que prevê a proteção de Deus? Nenhuma. Então, há dispositivos a partir dos quais não é construída norma alguma.

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(...) E o que isso quer dizer? Significa que não há correspondência bi-unívoca entre dispositivo e norma - isto é, onde houver um, não terá obrigatoriamente de haver o outro. (grifos originais do autor)

Os princípios, dessa forma, auxiliam na produção, perpetuação e divulgação

do conhecimento, de maneira clara, sucinta e eficiente, dotada de conteúdo didático,

e coercitivo, muito embora seja um enunciado genérico.

Por sua vez, o princípio da Igualdade deve ser estudado com a devida

precaução. Como se define, nesse contexto principiológico, a Igualdade? Nas

palavras de Silva (2010, p. 409) a Igualdade vem:

Do latim aequalitas, de aequalis (igual, semelhante), é indicativo da semelhança de caracteres ou elementos componentes de duas coisas. Assim, a igualdade é a uniformidade de grandeza, de razão, de proporção, de extensão, de peso, de altura, enfim, de tudo que possa haver entre duas ou mais coisas. (...) É a designação dada ao princípio jurídico instituído constitucionalmente, em virtude do qual todas as pessoas, sem distinção de sexo ou nacionalidade, de classe ou posição, de religião ou de fortuna, têm perante a lei os mesmos direitos e as mesmas obrigações. Mas pela instituição do princípio, não dita o Direito uma Igualdade absoluta. A Igualdade redunda na igual proteção a todos, na Igualdade das coisas que sejam iguais e na proscrição dos privilégios, isenções pessoais e regalias de classe, que se mostrariam desigualdades. Desse modo a Igualdade é perante a lei e perante a justiça, para a proteção ou castigo, para a segurança de direitos ou imposição de normas coercitivas.

Silva (2010, p. 457) também trata de definir isonomia, para que não restem

dúvidas, sendo que esta, na terminologia jurídica, exprime a Igualdade legal para

todos. E, assim, assinala o regime que institui o princípio de que 'todos são iguais

perante a lei' (art. 5º, CF/88), em virtude do que, indistintamente e em Igualdade de

condições todos serão submetidos às mesmas regras jurídicas.

Trata-se, portanto, de um tratamento isonômico que o Estado deve dispensar

aos seus administrados, ou seja, a mesma lei deve ser aplicada da mesma forma

para quem lhe couber aplicá-la. O que já se mencionou, entretanto, é que essa

Igualdade existe para evitar abusos ou discricionariedades injustas que possam

surgir por parte do agente público, e não se trata de uma Igualdade absoluta, uma

vez que dois sujeitos iguais se assemelham, mas não se confundem em um só.

É o que afirma Dutra (2010, p. 18):

27

A igualdade é um conceito através do qual o ser humano procura alcançar a verdadeira justiça. Derivada deste sobreprincípio, a isonomia é um ideal que sempre motivou o homem na estipulação de suas regras sociais. Contudo, a interpretação que se deu a esse princípio evoluiu de acordo com as alterações sociais, culturais e políticas pelas quais passou a humanidade. Não é novidade que os seres humanos são únicos, não se encontrando em todo o mundo duas pessoas completamente iguais; sempre haverá diferenças. Por conseguinte, a ideia de igualdade inata é absolutamente teórica, pois é inalcançável na prática, o que foi percebido pelos homens desde a Era Clássica. Pensadores como Platão, São Tomás de Aquino, Rousseau, Larenz, Kelsen, Bobbio, Habermas, dentre outros, ao abordarem o tema, partiam, sempre, do pressuposto de que os homens são naturalmente desiguais entre si. Portanto, a aplicação do referido princípio se dá a partir da identificação das efetivas diferenças existentes entre as pessoas, para que se possa chegar a uma solução adequada para a situação em que se encontram; tratando de forma igual as que estão em uma mesma posição, e de forma desigual as que se diferenciam por se alocarem em condições diversas.

Assim, cada um possui particularidades que, se possível, podem e devem ser

levadas em consideração, de maneira razoável pelo legislador. Nesse tom, deve-se

tratar os iguais na medida de suas desigualdades.

Em alguns Estados, como ocorre no Brasil, os princípios mais importantes, ou

fundamentais, se encontram exprimidos na Constituição Federal. Araújo e Nunes

Júnior (2005, p. 66) ao tratarem sobre os princípios constitucionais os apresentam

como sendo regras-mestras dentro do sistema positivo. Devem ser identificados

dentro da Constituição de cada Estado as estruturas básicas, os fundamentos e os

alicerces desse sistema. Fazendo isso estar-se-á identificando os princípios

constitucionais.

A Constituição brasileira inicia com o Título I, dedicado aos "princípios

fundamentais". Segundo Pinho (2003, p. 57), esse destaque realça a importância

dada às regras informadoras da organização do Estado brasileiro. A valorização dos

princípios tem sido uma das tendências do atual direito constitucional.

Sobre essas proposições foi elaborada a Constituição brasileira. São regras que contêm os mais importantes valores que informam a elaboração da Constituição da República Federativa do Brasil. Os

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princípios são dotados de normatividade, ou seja, possuem efeito vinculante e constituem regras jurídicas efetivas. (...) Conforme ensina Paulo Bonavides, os princípios constitucionais possuem três funções extremamente relevantes na ordem jurídica: a) fundamentadora; b) interpretativa; c) supletiva. (PINHO, 2003, p. 57)

Como se observa, no ordenamento jurídico de um país, não se pode

desrespeitar o que é preconizado nos princípios constitucionais em razão de suas

diversas funções. Entre eles está a Igualdade, e para prosseguir com a pesquisa,

cumpre observar o que diz Bastos (1992, p. 143):

Os princípios constitucionais são aqueles que guardam os valores fundamentais da ordem jurídica. Isto só é possível na medida em que estes não objetivam regular situações específicas, mas sim desejam lançar a sua força sobre todo o mundo jurídico. Alcançam os princípios esta meta à proporção que perdem o seu caráter de precisão de conteúdo, isto é, conforme vão perdendo densidade semântica, eles ascendem a uma posição que lhes permite sobressair, pairando sobre uma área muito mais ampla do que uma norma estabelecedora de preceitos. Portanto, o que o princípio perde em carga normativa ganha como força valorativa a espraiar-se por cima de um sem-número de outras normas.

Assim, os princípios constitucionais possuem força vinculante e são de

observância obrigatória, em qualquer situação, sob pena de invalidade por vício de

inconstitucionalidade. Devem informar a atividade legislativa, os atos administrativos,

as sentenças judiciais, e a atuação de todos os agentes do Estado.

Como se trata neste trabalho do princípio da Isonomia, segue-se confirmando

que a Igualdade é um princípio constitucional, previsto no artigo 5º da Constituição

Federal. Assim afirmam Araújo e Nunes Júnior (2005, p. 119) sobre o Princípio da

Isonomia:

A Constituição da República instituiu o princípio da Igualdade como um dos seus pilares estruturais. Por outras palavras, aponta que o legislador e o aplicador da lei devem dispensar tratamento igualitário a todos os indivíduos, sem distinção de qualquer natureza. Assim, o princípio da isonomia deve constituir preocupação tanto do legislador como do aplicador da lei.

Ainda, conforme Pinho (2003, p. 59), a Igualdade é um princípio constitucional

informador:

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A Constituição abre sua introdução com uma série de princípios informadores do Estado brasileiro: republicano, federativo e democrático (art. 1º, caput); soberania nacional, cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e pluralismo político (incisos do art. 1º); separação de poderes (art. 2º); liberdade, justiça social e solidariedade, desenvolvimento nacional, erradicação da pobreza e da marginalização e redução das desigualdades e regionais; Igualdade (art. 3º).

E segue, falando sobre a isonomia material, que consiste em tratar

igualmente os iguais, com os mesmos direitos e obrigações, e desigualmente os

desiguais. Tratar igualmente os desiguais seria aumentar a desigualdade existente.

Nem todo tratamento desigual é inconstitucional, somente o tratamento desigual que

aumenta a desigualdade naturalmente já existente. Não teria sentido conceder

benefícios de forma igual para os que necessitam e para os que não necessitam da

assistência do Poder Público.

Há duas espécies de Igualdade: formal e material. A formal, dentro da concepção clássica do Estado Liberal, é aquela em que todos são iguais perante a lei. Existe também a material, denominada de efetiva, real, concreta ou situada. Trata-se da busca da Igualdade de fato, na vida econômica e social,. Em diversos dispositivos o constituinte revela sua preocupação com a profunda desigualdade em nosso país, com a criação de mecanismos que assegurem uma Igualdade real entre os indivíduos. Não basta a Igualdade formal. O Estado deve buscar que todos efetivamente possam gozar dos mesmos direitos e obrigações. (PINHO, 2003, p. 97)

O Princípio da Igualdade é um princípio de Estado Social, o mais amplo dos

princípios constitucionais presentes no ordenamento jurídico brasileiro moderno,

abarcando diversas situações não servindo apenas para o texto constitucional, mas

possuindo plena eficácia, sob pena de inconstitucionalidade.

O art. 5.º, caput, consagra serem todos iguais perante a lei, sem distinção de

qualquer natureza. Deve-se, contudo, buscar não somente essa aparente igualdade

formal (consagrada no liberalismo clássico), mas, principalmente, a igualdade

material.

Isso porque, no Estado Social ativo, efetivador dos direitos humanos, imagina-

se uma igualdade mais real perante os bens da vida, diversa daquela apenas

formalizada perante a lei.

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Essa busca por uma igualdade substancial, muitas vezes idealista,

reconheça-se, eterniza-se na sempre lembrada, com emoção, Oração aos Moços,

de Rui Barbosa, inspirado na lição secular de Aristóteles, devendo-se tratar

igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de suas

desigualdades.

Dessa forma, conforme assinala Dalla-Rosa (2014, p. 5):

O princípio da igualdade pode ser visto sob dois ângulos. Num primeiro aspecto, a igualdade refere-se à aplicação da lei, e acaba se confundindo com o princípio da certeza do Direito e da segurança jurídica. Não pode haver discriminação (tratamento desigual) no momento da aplicação da lei. A lei é a mesma para todos e aplicada da mesma forma em relação a todos. Não se cria desigualdades no momento da aplicação, mas o princípio da igualdade não pode se resumir a isso. Significa dizer que o princípio da igualdade assegura a todos o direito de que a lei lhes seja aplicada tal como á aplicada em relação a todos os outros, ainda que na realidade isso não ocorra e nem sempre a lei seja aplicada da mesma forma. Para tanto, assevera Marçal Justen Filho, que dizer, juridicamente, que todos têm direito de que a lei lhes seja aplicada tal qual a generalidade das pessoas, não significa nada ou nada que já não se extraia do princípio da segurança jurídica. Já num segundo aspecto, que aborda de forma totalmente diversa, refere-se à ideia de igualdade na lei, na construção da lei. A norma jurídica, quando é construída através do estabelecimento de uma hipótese de vinculação a sua admissão como pressuposto da aplicação do mandamento, deve ser construída de modo tal que não contemple privilégios nem discriminações.

Igualdade consiste em afirmar que "todos são iguais perante a lei, sem

distinção de qualquer natureza" (CF, art. 5º, caput). Não se admite discriminação de

qualquer natureza em relação aos seres humanos. Esse princípio vem repetido em

diversos dispositivos constitucionais, realçando a preocupação do constituinte com a

questão da busca da Igualdade no Brasil.

O preâmbulo já traz a Igualdade como um dos valores supremos do Estado

brasileiro. O art. 3º estabelece entre as metas do Brasil a erradicação da pobreza e

da marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais e a promoção

do "bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer

outras formas de discriminação".

Apesar de relevante o estudo da aplicação do princípio da Igualdade entre

particulares, essa perspectiva de análise será abordada no presente trabalho

31

porque, o direito tributário se ocupa das relações entre Estado e Contribuinte.

Contudo, fica a menção de que há estudos desenvolvidos acerca da aplicação

destes princípios e direitos fundamentais nas relações entre particulares.

2.1 PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA

Conforme visto anteriormente, o princípio da Igualdade possui grande valor no

sistema jurídico brasileiro, e ainda que de forma geral previsto no artigo 5º da

Constituição Federal, o legislador resolveu reafirmá-lo no artigo 150, inciso II, que

trata das Limitações ao Poder de Tributar. Não se trata de dois princípios diferentes,

mas apenas uma reafirmação da ideia.

Na lição de Dala-Rosa (2014, p. 2):

O princípio da isonomia não é um princípio criado para o Direito Tributário mas é um dos princípios constitucionais gerais, que encontram no direito Tributário uma especialização. Alguns autores chegam a afirmar que, mesmo não existindo essas especializações do princípio da isonomia no Direito Tributário, que estão no art. 145, § 1º e 150, II, ter-se-ia exatamente a mesma conformação do Direito Tributário. Bastaria a previsão genérica de igualdade que está contida no art. 5º, ou mesmo se não houvesse essa previsão do art. 5º, bastaria a ideia de que o Brasil é uma República, para que todos os efeitos que se produzem no Direito Tributário já existissem. Essas especializações contidas no princípio da isonomia servem apenas para que os efeitos do princípio da isonomia fiquem mais práticos

Dessa forma, mesmo que não houvesse sua previsão no artigo 150, II, da

CF/88, já seria suficiente para que este fosse imposto também em matéria tributária,

uma vez que os princípios constitucionais devem informar todo o ordenamento

jurídico. Mas, se fosse observar alguma diferença entre as previsões constitucionais

do mesmo princípio, na Igualdade tributária, o legislador constituinte cuidou de dar

uma abordagem para a atividade legislativa, e na Igualdade de maneira geral do

artigo 5º cuidou de dar enfoque na aplicação desta.

Dito de outra forma, o constituinte se preocupou com a atividade legislativa

tributária, proibindo a instituição de tratamento desigual entre contribuintes em

situação equivalente.

32

Isso não significa que, a Igualdade Tributária se apoia no sentido formal da

isonomia, mas significa que precisa avaliar e dar o mesmo tratamento jurídico aos

contribuintes que se encontrarem em situações idênticas. Ou seja, se apregoa, do

mesmo modo, a Igualdade material supracitada.

Confirmando esta ideia, Pinho (2003, p.99) afirma que:

A atual Constituição veda a instituição de "tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente" (art. 150, II), mas admite a graduação dos impostos "segundo a capacidade econômica do contribuinte" (art. 145, §1º). Estabelece tratamento igual entre os iguais e desigual entre os desiguais: quem ganha mais, paga mais; quem ganha menos, paga menos; quem não ganha nada, não paga nada.

O que se objetiva, ao efetivar o uso da Isonomia Tributária nos procedimentos

tributários e na legislação fiscal, é a distribuição correta e justa da carga tributária,

com a melhor forma de arrecadação de fundos para o Estado, que legitimaria a

necessidade de tributar e de pagar impostos, que se encontra enfraquecida na

sociedade, que questiona a contrapartida do alto percentual de tributos que paga e

não vê aplicado em serviços públicos de qualidade.

A justa repartição da carga tributária total entre os cidadãos é imperativo ético para todo Estado de Direito. Num Estado de Direito merecedor deste nome o Direito positivado em leis fiscais deve ser Ética aplicada. A moral da tributação correspondente à ética fiscal, é o pressuposto para a moral fiscal dos cidadãos. Política fiscal tem de ser política de justiça, e não mera política de interesses. A tributação seria um procedimento sem dignidade ética se impostos pudessem ser arrecadados de qualquer maneira, se o legislador pudesse ditar as leis fiscais de qualquer maneira. (TIPKE, YAMASHITA, 2002, p. 27)

Isto, em matéria tributária deve ser feito seguindo roteiros sistemáticos, que

deveriam vir previstos nas leis que estabelecem as regras-matrizes dos tributos,

avaliando qual o elemento de discriminação utilizado pela norma analisada,

verificando se há relação entre este elemento pretendido e o que de fato será

procedido, e por fim avaliar se está de acordo com os valores constitucionais.

Neste ponto, faz-se necessário estabelecer uma breve conceituação da regra-

matriz no Direito Tributário, uma vez que é um conceito chave para esta ciência e

33

para a compreensão de qualquer tema que se relacione com os tributos. Desta

forma, na lição de Carvalho (2012, p. 106):

A "norma tributária em sentido estrito" será a que prescreve a incidência. Sua construção é obra do intérprete, enquanto órgão do sistema ou na condição de um interessado qualquer, mas sempre a partir dos estímulos sensoriais do texto legislado (reduzindo o direito à forma escrita).

Mas, para que seja completa, a norma tributária precisa trazer todos os

elementos de validade, os critérios dos tributos para que seus sujeitos (contribuintes

e fisco) possam estabelecer as relações tributárias sem qualquer violação à

legalidade ou à segurança jurídica. Sendo assim, prossegue Carvalho (2012, p.

106):

Ao mesmo tempo, a regra-matriz de incidência, como anunciamos anteriormente, se inscreve entre as normas gerais e abstratas, havendo nela condicionalidade. O antecedente é posto em formulação hipotética: "se ocorrer o fato F". Além disso, integra o quadro das regras de conduta, pois define por inteiro a situação de fato, sobre qualificar deonticamente os comportamentos inter-humanos por ela alcançados. No descritor da norma (hipótese, suposto, antecedente), teremos diretrizes para a identificação de eventos portadores de expressão econômica. Haverá um critério material (comportamento de alguma pessoa), condicionado no tempo (critério temporal) e no espaço (critério espacial). Já na consequência (prescritor), toparemos com um critério pessoal (sujeito ativo e sujeito passivo) e um critério quantitativo (base de cálculo e alíquota). A conjunção desses dados indicativos nos oferece a possibilidade de exibir , na plenitude, o núcleo lógico-estrutural da norma-padrão, preenchido com os requisitos significativos necessários e suficientes para o impacto jurídico da exação.

E, para que não restem dúvidas, e possa ser a lição mais didática possível, o

autor ainda exemplifica sua explicação, com a regra-matriz de incidência do IPTU,

explicando cada um dos seus critérios.

Sirvamo-nos de uma referência empírica, cogitada no quadro dos impostos atualmente existentes no Brasil. A regra-matriz do IPTU (...) é a seguinte: Hipótese: 1) critério material - ser (verbo) proprietário de bem imóvel (complemento predicativo); 2) critério espacial - no perímetro urbano

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no Município; 3) critério temporal - computado o acontecimento no dia 1º de janeiro do ano civil. Consequência: 1) critério pessoal - o sujeito ativo será o Município e o sujeito passivo será o proprietário; 2) critério quantitativo - a base de cálculo é o valor venal do bem imóvel, sobre que se aplicará a alíquota de 1%. (CARVALHO, 2012, p.106)

Conhecendo, enfim o conceito de regra-matriz, é possível compreender que

para a aplicação da Isonomia Tributária, o critério mais adequado para tal efetivação

é o critério pessoal, uma vez que diz respeito ao sujeito a ser atingido pela norma

tributária. Aquele que deve ser tratado de forma a avaliar sua Capacidade

Contributiva, e com Isonomia.

Colaborando para essa ideia, o professor Dalla-Rosa (2014, p. 16) leciona:

Existe, assim, alguns tributos que têm caráter pessoal (imposto sobre a renda) e outros que têm caráter real (IPTU, IPVA), em que as características pessoais do sujeito passivo são relativamente irrelevantes. Essa cláusula sempre que possível diz exatamente que a lei deve levar em conta as características pessoais do sujeito passivo sempre que possível e essa característica pessoal não será passível de ser desconsiderada em relação a esses tributos que têm uma conformação mais pessoal do que real. Isso não significa que não se aplica o princípio da capacidade contributiva relativa a todos os tributos, portanto mesmo em relação ao IPTU, IPVA, etc., o tributo deve ser direcionado de acordo com a capacidade econômica do sujeito passivo, de acordo com a dimensão da riqueza manifestada pelo sujeito passivo.

Assim, ao levar em consideração a Isonomia e a Capacidade Contributiva, o

legislador tem o dever de, quando for prever o critério pessoal da hipótese de

incidência, estabelecer um tratamento que atenda à esses princípios e a esses fins

sociais.

Dessa forma, para que os princípios não restem letra fria, não aplicável no

mundo jurídico fático, é preciso viabilizar com normas procedimentais e ações

afirmativas seus mandamentos. É o que afirmam Tipke e Yamashita (2002, p. 25):

No entanto, não é suficiente que as leis tributárias cuidem de uma repartição isonômica da lei tributária. Que "todos são iguais perante a lei" significa também que as leis fiscais devem ser aplicadas isonomicamente. Para tanto é necessário que os dispositivos procedimentais possibilitem uma aplicação isonômica, especialmente uma verificação isonômica dos fatos, e que os fiscais da

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Administração Fazendária sejam suficientes para assegurar essa aplicação isonômica. Portanto, deve-se ver o direito material e o direito procedimental como uma unidade.

Assim, o princípio da Isonomia Tributária se relaciona com o Princípio da

Capacidade Contributiva, que viabiliza a efetividade dessa discriminação de maneira

justa, sob os valores constitucionais, de acordo com as Igualdades e na medida das

desigualdades possíveis, de maneira objetiva, evitando abusos por parte do fisco, e

injustiças para os contribuintes.

Entretanto, antes de prosseguir, é necessário fazer uma distinção entre o

Princípio da Capacidade Contributiva e o Princípio da Capacidade Econômica, em

razão da locução utilizada pelo constituinte no artigo 150, II da Constituição Federal.

De acordo com Costa (2006, p. 86), a capacidade econômica de um indivíduo

é pressuposto para sua capacidade contributiva. Isso, porque a capacidade

econômica da pessoa se exprime através da sua potencialidade econômica de

pagar (auferir renda, realizar uma operação financeira ou comercial, etc.).

A Capacidade Contributiva, por sua vez, é a obrigação tributária em razão de

ato representativo de sua potencialidade econômica de arcar com este ônus, qual

seja, contribuir, na proporcionalidade de sua renda e suas capacidades pessoais.

Assim, Mota Filho (2006, p. 81) leciona que a capacidade econômica seria o critério

informativo da capacidade contributiva na comunidade política democrática e

decorrência da aplicação do princípio da igualdade e da justiça no campo do direito

tributário.

O professor italiano Franchesco Mosquete faz uma diferença entre capacidade econômica e capacidade contributiva. Ele diz que a capacidade econômica é estritamente relacionada com a manifestação de riqueza e a contributiva seria a capacidade econômica, mas colorida por esses outros fatores e valores que a Constituição pretende que sejam considerados e protegidos. Portanto, no caso do exemplo citado do cigarro e do leite, duas situações podem revelar a mesma riqueza, a mesma capacidade econômica. O vendedor do leite e o do cigarro têm o mesmo dinheiro para realizar o pagamento de tributo, ou seja, a mesma capacidade econômica, mas têm capacidade contributiva diferente, porque no caso da venda de embalagem de leite há uma melhor realização do interesse público do que no caso da venda de cigarro. Portanto a capacidade contributiva seria a capacidade econômica somada a todos esses valores de proteção do interesse público garantidos pela

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Constituição (seria igual a capacidade econômica qualificada pelos valores da Constituição). (DALLA-ROSA, 2014, p.14, grifo do autor)

Assim, a doutrina do Direito Tributário deduz, corretamente, a intenção do

legislador em positivar o princípio da capacidade contributiva ao utilizar a expressão

"capacidade econômica do contribuinte", abrangendo não somente a necessidade

da potencialidade econômica, mas também a obrigação da existência do vínculo do

contribuinte e o Estado e sua capacidade de contribuir, efetivamente.

Assim, os contribuintes deverão ser tratados com Igualdade de acordo com

sua capacidade de contribuir. É justo que quem tem, em termos econômicos, mais

condições, pague proporcionalmente mais do que quem tem pouco, uma vez que

tributar riqueza significa realizar a busca da Igualdade material.

Note que, ao mencionar justiça, o objetivo é referir-se ao critério formal, mais

amplo de justiça, aquele que pode ser efetivado por meio de princípios, como

prosseguem Tipke e Yamashita (2002, p. 19):

Como a justiça é o conceito mais fundamental do Direito, ele também é o mais abstrato. Como conceito valorativo altamente indeterminado, ele é uma constante tentação para os amantes de pomposa retórica e de formas vazias de expressão. No debate político tributário, especialmente na época das eleições, a expressão de efeito "justiça fiscal" é muito usada. Na ciência, contudo, deve haver afirmações o mais precisas possível. Direito justo pressupõe princípios (regras, critérios, padrões). Tais princípios são especialmente necessários quando direitos e obrigações, cargas e reivindicações devem ser repartidos entre membros de uma comunidade. Repartição sem princípios é repartição arbitrária. Isso é pacífico, tanto na filosofia moral como na filosofia do Direito. A orientação por princípios cuida de generalidade e consequência.

A Justiça é correlata aos princípios constitucionais já tratados, e os princípios,

por sua vez, estão interligados, como a Isonomia está ligada à Capacidade

Contributiva, por isso, não se pode esquecer destes conceitos ao estudar qualquer

ramo do Direito.

Se não houvesse critério adequado de comparação o princípio da Igualdade não poderia ser um produto da justiça. Contudo, é amplamente aceito que o princípio da Igualdade seja um produto da justiça. Não existe um critério de justiça uniforme para todo o Direito. Muito mais correto é que cada ramo do Direito tenha seu próprio

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critério. Em outras palavras, deve ser decidido qual princípio ou qual critério é adequado para o particular ramo do Direito, tal como o Direito Tributário. Na Alemanha fala-se, portanto, em justiça adequada à matéria. (TIPKE, YAMASHITA, 2002, p. 21)

Para realizar o Princípio da Capacidade Contributiva, o legislador deve

considerar as desigualdades econômicas e sociais dos contribuintes, e a partir

desse critério, distribuir a carga tributária proporcionalmente àqueles que podem

contribuir mais. É por meio desse critério de diferenciação que o legislador efetiva a

Igualdade material. Assim, prosseguem os mestres Tipke e Yamashita (2002, p. 29):

O princípio da capacidade contributiva está difundido por todo o mundo e está fundamentando uma série de Constituições. Evidentemente, ele corresponde aos princípios do Estado Social de Direito e à consciência jurídica. (...) O princípio da capacidade contributiva também é realista; pois devem pagar apenas aqueles que podem pagar. (...) O princípio da capacidade contributiva não fere direito fundamental nenhum.

Também, como observado, nada adianta o Estado cobrar tributos de quem

sabidamente não pode pagar, ou onerar excessivamente aquele que ao procurar

adimplir com o fisco virá a adquirir dívidas de outras naturezas. Isto estaria ferindo

outros princípios como o da Moralidade ou da Razoabilidade, que também devem

reger todos os atos dos Administradores Estatais. Tipke e Yamashita (2002, p. 30)

buscam uma definição desse princípio para uma melhor compreensão:

O art. 145 da Constituição Brasileira prende-se - assim como o art. 31 da Constituição Espanhola de 1978 - à "capacidade econômica do contribuinte". E, de fato, os economistas costumam equiparar a capacidade contributiva tributária à capacidade econômica. Eles deduzem disso, por exemplo, que a renda econômica, tudo aquilo que é apropriado para satisfação de necessidades, deve estar sujeita ao imposto de renda. (...) Diversamente, os tributaristas alemães definem a capacidade contributiva como a capacidade de pagar impostos. É certo que eles partem do princípio de que a capacidade contributiva pressupõe capacidade econômica, mas não consideram a capacidade econômica na medida em que o contribuinte tem de sustentar a si mesmo e a outros, tem de cuidar e prover para si mesmo e para outros. Nessa medida, reduzem a base de cálculo do imposto de renda, vendo nisso uma medida de justiça fiscal, e não uma medida do Estado Social.

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Assim, ao seguir os princípios norteadores da atividade administrativa estatal,

garante-se a lisura do procedimento, assegura-se a Segurança Jurídica, a

Legalidade, e torna-se possível a aplicação da Isonomia Tributária, Capacidade

Contributiva ou, se for o caso, Proporcionalidade que será tratada a seguir.

2.2 PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

Em síntese, o Princípio da Capacidade Contributiva se relaciona com o

Princípio da Isonomia Tributária. De acordo com essa relação principiológica, os

contribuintes que tiverem igual capacidade contributiva devem ser tratados

igualmente e os que tiverem riquezas diferentes devem ser tratados desigualmente.

Assim, na lição de Eduardo Sabbag (2014, p. 143):

O princípio da capacidade contributiva, embora vinculado ao postulado da isonomia, em mútua implicação, com este não se confunde. A capacidade contributiva evidencia uma das dimensões da isonomia, a saber, a igualdade na lei, quando se busca tratar de forma distinta situações diversas, conforme se estudou em ponto anterior. Nesse sentido, diz-se que o princípio da capacidade contributiva está profundamente ligado ao da igualdade, mas neste não se esgota. Enquanto a isonomia avoca um caráter relacional, no bojo do confronto entre situações jurídicas, o princípio da capacidade contributiva, longe de servir apenas para coibir discriminações arbitrárias, abre-se para a consecução de um efetivo ideal de justiça para o Direito Tributário. A busca da justiça avoca a noção de “equidade” na tributação. Esta, na visão dos economistas, liga-se ao modo como os recursos são distribuídos pela sociedade, desdobrando-se em duas dimensões: (I) na equidade horizontal, em que deve haver o tratamento igual dos indivíduos considerados iguais, e (II) na equidade vertical, com o tratamento desigual aos indivíduos considerados desiguais.

O parágrafo primeiro do artigo 145 da Constituição Federal afirma que os

impostos devem ter caráter pessoal e observar sempre que possível a capacidade

econômica do contribuinte ou simplesmente a capacidade contributiva, utilizada

como um critério para mensurar a isonomia entre os diferentes rendimentos.

Assim, ensina Dalla-Rosa (2014, p. 10):

O princípio da capacidade contributiva não é só um desdobramento do princípio da isonomia, é algo que envolve critérios de outros fatores, outras ideias e princípios da Constituição. A generalidade da

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doutrina alude ao princípio da capacidade contributiva como sendo derivado do princípio da igualdade.

Sobre o Princípio da Capacidade Contributiva Tipke e Yamashita (2002, p. 31)

lecionam que:

Aliás uma definição da capacidade contributiva tem de considerar que impostos - não importa o nome que tenham, ou como o objeto do imposto seja designado - apenas podem ser pagos da renda auferida ou da renda acumulada como patrimônio. Em outras palavras, existe apenas uma fonte de impostos: a renda. Os princípios da justiça fiscal social precisam dar, assim, uma resposta para qual parte da renda cada contribuinte deve recolher como imposto. Essa questão deve ser respondida por meio de bases de cálculo e alíquotas.

Importante mencionar que o Princípio da Capacidade Contributiva não se

confunde com o Princípio da Capacidade Colaborativa. Na lição de Leandro Paulsen

(2014, p.77):

O princípio da capacidade de colaboração está para a instituição de obrigações acessórias assim como o princípio da capacidade contributiva está para a instituição de tributos: lhes dá suporte, justificativa e medida. A capacidade de colaboração é requisito para a instituição de deveres de colaboração, enquanto a capacidade contributiva o é quanto à instituição de tributos. O paralelo é pertinente e esclarecedor. Só faz sentido impor a alguém prestações positivas ou negativas no interesse da arrecadação ou da fiscalização de tributos se tais prestações forem úteis. Para tanto, faz-se necessário que o respectivo sujeito passivo dessas obrigações acessórias guarde alguma relação com o fato gerador ou com o contribuinte, de modo que essa proximidade lhe permita um agir que facilite a fiscalização ou a arrecadação, induza o pagamento dos tributos, restrinja a sonegação, etc. As obrigações tributárias acessórias são autônomas relativamente às obrigações principais, mas só se justificam porque é necessário fiscalizar e assegurar a arrecadação. Assim, invariavelmente, guardam relação com os fatos geradores.

No entanto, como se observa, na previsão legal do Princípio da Capacidade

Contributiva (art. 145, §1º CF) uso expressão “sempre que possível” introduz a

possibilidade de exceções a este princípio. Estas podem acontecer dependendo das

características de cada imposto, ou da necessidade de utilizar o imposto com

finalidades extrafiscais. É o que afirmam Tipke e Yamashita (2002, p. 31):

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Com base no princípio da capacidade contributiva são julgados, porém, apenas os dispositivos que têm a finalidade primária de arrecadar recursos para o Tesouro Nacional. Ele não vale para normas de finalidade extrafiscal.

Aqui se faz importante diferenciar duas das possíveis finalidades da

instituição dos tributos no Sistema Tributário Brasileiro: Finalidade Fiscal e

Finalidade Extrafiscal. Na lição de Carvalho. (2012-a, p.230):

Os signos fiscalidade e extrafiscalidade são termos usualmente empregados no discurso da Ciência do Direito, para representar valores finalísticos que o legislador imprime na lei tributária, manipulando as categorias jurídicas postas à sua disposição. (...) Fala-se, assim, em fiscalidade sempre que a organização jurídica do tributo denuncie que os objetivos que presidiram sua instituição, ou que governam certos aspectos de sua estrutura, estejam voltados ao fim exclusivo de abastecer os cofres públicos, sem que outros interesses - sociais, políticos ou econômicos - interfiram no direcionamento da atividade impositiva. A experiência jurídica nos mostra, porém que vezes sem conta a compostura da legislação de um tributo vem pontilhada de inequívocas providências no sentido de prestigiar certas situações, tidas como social, política ou economicamente valiosas, às quais o legislador dispensa tratamento mais confortável ou menos gravoso. A essa forma de manejar elementos jurídicos usados na configuração dos tributos, perseguindo objetivos alheios ao meramente arrecadatórios, dá-se o nome de extrafiscalidade.

E prosseguindo nessa ideia, é o que afirmam Tipke e Yamashita (2002, p. 61)

sobre a relação da fiscalidade e a capacidade contributiva:

Nisso reside a finalidade primeira de todo tributo: obtenção de recursos financeiros para cobrir as despesas gerais do Estado ou mais especificamente, por exemplo, da Seguridade Social. É o que se chama de tributo ou norma com finalidade fiscal. Neste caso, se a finalidade precípua de determinados tributos é a arrecadação de recursos financeiros, já vimos que a justiça tributária realiza-se pela distribuição isonômica da carga tributária segundo a capacidade contributiva, ou seja, pela aplicação do princípio da capacidade contributiva.

A aplicação prática do princípio da capacidade contributiva, especialmente no

que diz respeito aos impostos diretos incidentes sobre a renda do contribuinte,

implica em aceitar os seguintes preceitos, conforme leciona Dalla-Rosa (2014, p.12):

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Qualquer tributo deve ser relacionado a uma situação econômica. Especificamente em relação aos impostos, o mesmo deve ser vinculado a uma situação que revele a existência de riqueza. A vinculação de um comando “recolher determinado valor” a um pressuposto de fato que não seja manifestação de riqueza, não corresponderá à tributo, mas à penalidade ou a outro encargo de natureza diversa do tributo. Portanto, o que se deve ter presente é que o tributo está necessariamente vinculado a uma situação que tenha tradução econômica e especialmente vinculado a uma situação que revele riqueza. Esse aspecto da capacidade contributiva é chamado capacidade contributiva absoluta, o que indica que a lei tributária deve eleger um pressuposto, deve mencionar na hipótese de incidência tributária um fato que tenha expressão econômica. Mas a capacidade contributiva tem, ainda, um outro aspecto que é o da capacidade contributiva relativa, a qual é vinculada à manifestação pessoal de riqueza do contribuinte, ou seja, o encargo tributário deve ter uma dimensão relacionada à manifestação de riqueza de cada contribuinte. A capacidade contributiva absoluta se relaciona com a presunção da hipótese de incidência, enquanto que a relativa se relaciona com a definição do mandamento da norma tributária, do comando (quanto tributo deve ser pago ?). A absoluta ordena que o Estado eleja como fato sujeito à tributação um fato que tenha expressão econômica, a relativa determina que a quantificação do tributo deve levar em conta a dimensão da riqueza revelada pela situação tributária.

Levando em consideração o que ensina Dalla-Rosa (2014, p. 18):

A capacidade contributiva não pode ser compreendida de forma isolada, contempla um princípio constitucional que é conjugado com todos os outros, inclusive com o da legalidade, a injustiça tributária não conduz por si só a imputação, ela conduz eventualmente ao reconhecimento da inconstitucionalidade da omissão legislativa em tributar determinados fatos. Não se pode, sem a ocorrência da lei, tributar fatos que por omissão legislativa não o foram; essa omissão somente poderá ser suprida pelo legislador. Esse aspecto da generalidade da tributação, às vezes, é deixado meio de lado, mas deve-se perceber que a capacidade contributiva tem essas duas faces, e não só protege o contribuinte individual contra o avanço do Estado em seu patrimônio, mas também protege cada um dos contribuintes individualmente, no sentido em que se obriga o Estado a buscar recursos perante todos os contribuintes, na medida da capacidade contributiva de cada um. O princípio da capacidade contributiva demonstra que existem limites abaixo dos quais não há capacidade contributiva; nestes casos essas manifestações de riqueza, que são meramente suficientes para a sobrevivência, são manifestações de riquezas que não são manifestações de capacidade contributiva, por isso podem não ser tributados sem que haja ofensa ao princípio da isonomia.

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Os tributos devem ser graduados em função da renda de cada contribuinte:

quem ganha mais deve pagar mais; Quanto maior for a base de cálculo de um

tributo, maior deve ser a sua alíquota; A renda mínima consagrada à sobrevivência

deve ser minimamente tributada ou, em última instância, deve ser livre de tributação.

Por este último preceito não se trata de questionar onde se inicia a

capacidade contributiva do contribuinte. Ela se inicia após a dedução dos gastos

necessários à aquisição do mínimo indispensável a uma existência digna para ele e

sua família.

O contribuinte não adquire, com este princípio, o direito de reivindicar que um

certo imposto seja adequado às suas condições econômicas. Ele é um alerta ao

poder tributante, o qual não deverá atuar em sentido contrário ao propor as normas

instituidoras dos tributos, suas alíquotas e bases de cálculo.

2.3 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

Ocorre que com o avanço da economia, e dos fatos financeiros, a finalidade

dos impostos deixou de ser meramente arrecadatória, e percebeu-se que os tributos

poderiam contribuir para a economia e para o custeio de serviços públicos. Dessa

forma, com a intenção de correção de desigualdades sociais, redistribuição de

renda, e objetivos extrafiscais, mudou-se a finalidade dos tributos, como já

mencionado acima. Conforme a lição de Dalla-Rosa (2014, p.13):

O Estado tem um interesse na tributação que é o de arrecadar dinheiro para a manutenção de seus gastos, mas tem também outros interesses que devem ser atendidos e, eventualmente, a tributação mais elevada ou mais branda pode atender algum outro interesse protegido pelo Estado além do interesse arrecadatório. Assim o Estado pode pretender tributar determinadas situações com expressão econômica, mas de forma mais ou menos intensa tendo em vista outros objetivos que não só o arrecadatório. É o caso da tributação de bebidas, cigarros, que tem altos índices enquanto que outras coisas podem até vir a ter índice zero (embalagem de leite, por exemplo). A diferença nessas duas situações não é uma diferença apenas de manifestação de riqueza mesmo porque a manifestação de riqueza é a mesma - o vendedor do cigarro e o vendedor da embalagem de leite vão, tanto num caso como no outro, receber o valor correspondente que é o preço. Há, pois, outros valores que devem ser protegidos pela Constituição, e o consumo e vendas de cigarros, por exemplo, contraria alguns desses valores, enquanto que o consumo e venda de embalagem de leite é protegido

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por alguns desses valores. Existem, portanto, razões de interesse público que podem permitir uma tributação mais elevada do cigarro e uma mais branda das embalagens de leite, sem que nenhuma dessa situações estejam sendo discriminadas de forma inconstitucional. Essa ideia de realização de objetivo não arrecadatório através da tributação é justamente a ideia de extrafiscalidade. (grifo do autor)

Nas palavras de Tipke e Yamashita (2002, p. 62)

(...) Assim, se a finalidade extrafiscal de certos tributos ou normas tributárias consiste em equilibrar a balança comercial, penalizar o poluidor, desincentivar o fumo ou o alcoolismo ou incentivar a contratação de deficientes físicos, tais tributos deixam em parte a seara do Direito Tributário para invadir o Direito Econômico, o Direito Ambiental, o Direito Previdenciário, o Direito Trabalhista, nos quais não faz sentido falar em justiça fiscal e de princípio da capacidade contributiva. Nestes casos trata-se de outra espécie de justiça: a justiça social.

Portanto o princípio da capacidade contributiva quando constatada a

finalidade extrafiscal, pode não ser aplicado a esses tributos, no entanto, sua

constitucionalidade será controlada pelo princípio da proporcionalidade.

Como afirmam Tipke e Yamashita (2002, p. 39):

Em todos os lugares do mundo certamente encontram-se normas extrafiscais (intervencionistas, dirigistas, regulatórias, instrumentais) em leis tributárias. Elas violam o princípio da capacidade contributiva, especialmente por motivos de política econômica, cultural, sanitária, ambiental. A maioria dessas normas beneficia grupos específicos de contribuintes; por isso são chamadas de incentivos fiscais ou subvenções fiscais.

Isso se justifica pois a Administração Pública, ao representar os interesses

estatais deve-se pautar pela Proporcionalidade, Razoabilidade, Moralidade, entre

outros princípios gerais que garantem além da Segurança Jurídica, asseguram a

ordem no Estado de Direito. Deve atender, para isso, o objetivo do Princípio da

Proporcionalidade, de acordo com Silva, (2002, p. 25):

O objetivo da aplicação da regra da proporcionalidade, como o próprio nome indica, é fazer com que nenhuma restrição a direitos fundamentais tome dimensões desproporcionais. É, para usar uma expressão consagrada, uma restrição às restrições. Para alcançar esse objetivo, o ato estatal deve passar pelos exames da adequação, da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito. Esses três

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exames são, por isso, considerados como sub-regras da regra da proporcionalidade.

É importante, desse modo, entender como se aplica o princípio da

Proporcionalidade, para que, em colaboração ao Princípio da Capacidade

Contributiva e da Isonomia Tributária possam efetivar a Justiça Fiscal. Dessa

maneira, prossegue Silva (2002, p. 34):

A subdivisão da regra da proporcionalidade em três sub-regras, adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito (...).Se simplesmente as enumeramos, independente de qualquer ordem, pode-se ter a impressão de que tanto faz, por exemplo, se a necessidade do ato estatal é, no caso concreto, questionada antes ou depois da análise da adequação ou da proporcionalidade em sentido estrito. Não é o caso. A análise da adequação precede a da necessidade, que, por sua vez, precede a da proporcionalidade em sentido estrito.

Entretanto, é importante ressaltar que há posicionamentos doutrinários

divergentes conforme registra Dutra (2010, p. 105)

Perquire-se se tal conceito é compatível ou não com o princípio da capacidade contributiva. E a resposta, obviamente, dependerá da corrente a que cada um pretenda se filiar, pois há quem entenda haver compatibilidade (...), e existem aqueles que reputam serem conceitos incompatíveis. Sacha Calmon Navarro Coêlho é um dos doutrinadores que considera ser a extrafiscalidade incompatível com o princípio da capacidade contributiva. (...) José Marcos Domingues de Oliveira, Regina Helena Costa, Gisele Lemke, dentre outros, entendem que a capacidade contributiva pode ser observada na tributação extrafiscal.

Dessa maneira, quando se verificar inviável o uso da Capacidade Contributiva

aos tributos extrafiscais, ainda assim há viabilidade para a Justiça Fiscal, aplicando-

se o Princípio da Proporcionalidade. Ambos são princípios e ambos devem ser

aplicados, por serem princípios gerais de direitos, terem caráter normativo e

aplicabilidade direta. Nesse sentido, prossegue Silva (2002, p. 45):

Como visto, a Constituição não prevê a aplicação da regra da proporcionalidade. E, por uma razão lógica, se não a prevê, também não pode abrir exceções e dizer quando ela não é aplicável. Se se entende, no entanto, que a regra da proporcionalidade decorre logicamente do fato de os direitos fundamentais, em sua maioria,

45

serem princípios, e não regras, não há como tentar afastar a aplicação da regra da proporcionalidade, sob o argumento de que não há previsão constitucional a respeito. Isso não significa, contudo, que, necessariamente, uma aplicação da proporcionalidade poderá autorizar a admissão de provas obtidas por meios ilícitos.

Como se percebe, a complementaridade dos princípios garante a

aplicabilidade da Isonomia Tributária e a garantia dos direitos do contribuinte, como

limitações aos possíveis excessos do fisco, como medida de Justiça Fiscal.

3 JUSTIÇA FISCAL SINÔNIMO DE TRIBUTAÇÃO JUSTA?

Como se observa ao longo desde trabalho, a Isonomia Tributária é um dos

institutos jurídicos existentes, em conformidade com o Estado Social, para a

efetivação da Justiça Fiscal. Para tanto, é importante compreender, ainda que de

forma sucinta, alguns fundamentos sobre a justiça, conforme demonstra Dutra,

(2010, p.17):

A justiça tem sido buscada pelo homem desde os seus primórdios. A raça humana é eminentemente social, e a vida em comunidade acaba levando sempre o indivíduo a estabelecer comparações entre a sua vida e a dos demais. Portanto, o conceito de justiça nasce sempre dentro de uma sociedade, e, antes de jurídico, será, inevitavelmente, social. (...) Marcelo Elias Sanches explica muito bem o conceito de justiça, deixando fixado que: “Objetivamente, a Justiça é tida como ordenação da convivência humana com finalidade harmônica, estruturada em seus valores fundantes: igualdade, liberdade e fraternidade”. Ressalte-se que, para o referido autor, a igualdade, a alteridade e a proporcionalidade são apontadas como elementos da justiça, que lhe conferem maior precisão e clareza.

Dessa maneira, a tributação justa é um direito fundamental do contribuinte e

pode ser efetivada por meio da aplicação do Princípio da Isonomia Tributária e do

Princípio da Capacidade Contributiva, objetivando a melhoria na distribuição da

carga tributária e na diminuição da desigualdade social, objetivos do Estado Social.

Dito isto, conforme ensina Mello (2013, p. 40), existe diferença entre o que

muitas pessoas afirmam ser justiça tributária e tributação justa, e para que não

restem dúvidas, optou-se por mencioná-la nesta monografia:

Quando se menciona Justiça Tributária imagina-se logo um órgão do Poder Judiciário para resolver uma lide. (...) A Tributação Justa refere-se à forma pela qual se vem tributando, como os entes Federativos, a União, os Estados-membros, o Distrito Federal e os Municípios, aplicam as técnicas de tributação, seja progressividade, diferimento, pagamento na fonte ou qualquer outra técnica com o fim de implementar, viabilizar e conjugar a quantidade com a qualidade dos tributos. Pode-se concluir que a diferença entre Justiça Tributária e Tributação Justa está na eleição de um elemento em comum para poder distingui-las, qual seja, o agente responsável para tratar do Direito Tributário. Na Justiça Tributária o agente eleito de forma

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predominante, atuando na sua função típica é o Poder Judiciário, enquanto na Tributação Justa é o Poder Executivo, por meio dos entes Federativos.

Cumpre mencionar, portanto, que na nomenclatura utilizada neste trabalho de

conclusão de curso, a Tributação Justa e a Justiça Fiscal são sinônimos, e tratam da

proporcionalidade, da efetividade da Justiça Social na distribuição da Carga

Tributária, enquanto a Justiça Tributária, embora não seja uma justiça especial

existente no Brasil, seria a nomenclatura utilizada para o órgão do Poder Judiciário.

Ainda, nessa linha dos diversos sentidos da expressão Justiça Fiscal,

Sanches (2010, p. 13) afirma:

O conceito de justiça fiscal pode ter diversos significados: o primeiro é o da justiça fiscal no sentido de justiça tributária, que se limita a proceder a uma avaliação quantitativa do modo como são distribuídos os encargos tributários entre os cidadãos e as empresas, ou melhor, entre várias categorias de contribuintes. Perante uma dada carga fiscal, trata-se de saber como é que ela é partilhada entre todos, particularmente na perspectiva da sua incidência entre os contribuintes com maiores e menores rendimentos.

Entretanto, é necessário compreender, de fato, em que consiste a Justiça

Fiscal, e de que maneira esta pode contribuir para o desenvolvimento do Brasil. Na

lição de Tipke e Yamashita (2002, p. 19), a Justiça que aqui se trata é uma justiça

formal no sentido amplo da palavra, que se desenvolve por meio de princípios, e

dessa forma:

Como a justiça é o conceito mais fundamental do Direito, ele também é o mais abstrato. Como conceito valorativo altamente indeterminado, ele é uma constante tentação para os amantes de pomposa retórica e de formas vazias de expressão. No debate político tributário, especialmente na época das eleições, a expressão de efeito "justiça fiscal" é muito usada. Na ciência, contudo, deve haver afirmações o mais precisas possível. Direito justo pressupõe princípios (regras, critérios, padrões). Tais princípios são especialmente necessários quando direitos e obrigações, cargas e reivindicações devem ser repartidos entre membros de uma comunidade. Repartição sem princípios é repartição arbitrária. Isso é pacífico, tanto na filosofia moral como na filosofia do Direito. A orientação por princípios cuida de generalidade e consequência.

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Então, deve-se estudar o tema com o devido cuidado para não utilizar mais

uma vez a retórica, sem significado. A Justiça, componente da expressão Justiça

fiscal objeto deste trabalho é a mesma que Mello (2013, p.37) aponta:

Pelas palavras de Hans Kelsen entende-se que a Justiça é "felicidade social" e a obtenção desta felicidade será realizada por meio da satisfação de certas necessidades reconhecidas também pelo legislador. Até mesmo pode ser concebida pelo legislador tributário quando ao instituir tributos, por detrás de cada roupagem ou titulação, está o intuito de arrecadar valores na medida em que possam suprir as necessidades sociais; nem mais, nem menos, porque tributando desta forma sobrará para o contribuinte valores para suas despesas pessoais, o que poderá lhe proporcionar mais felicidade.

Sem esquecer que Justiça fiscal implica também em aceitar que o Estado crie

um sistema que assegure que os contribuintes paguem tributos em conformidade

com suas rendas e possibilidades. Assim, o Estado deve evitar sistemas fiscais que,

além de regressivos, tributem diferentemente rendas semelhantes.

Assim, como demonstram Tipke e Yamashita (2002, p. 18), a justiça caminha

lado a lado com o princípio da igualdade, que por sua vez configura uma limitação

ao poder-dever do Estado de tributar:

A questão da justiça coloca-se antes de tudo quando uma maioria das pessoas depende da distribuição das cargas e pretensões, que estão ligadas à vida da comunidade. A justiça fiscal é o valor supremo do Estado de Direito dependente de impostos e, ao mesmo tempo, o valor supremo da comunidade de contribuintes. Apenas à violação de um Direito Tributário justo podem ser impostas sanções justas. (...) O princípio da igualdade exige que a carga tributária total seja igualmente distribuída entre os cidadãos. O componente social da justiça exige que ricos contribuam proporcionalmente mais que os mais pobres. O princípio da liberdade põe limites à oneração fiscal do contribuinte.

E prosseguem os autores, afirmando que o Princípio da Igualdade, já tratado,

somente se relaciona com a Justiça por dele subsistir critérios, e por restarem, para

cada ramo do Direito, um princípio ou critério adequado.

Se não houvesse critério adequado de comparação o princípio da igualdade não poderia ser um produto da justiça. Contudo, é amplamente aceito que o princípio da igualdade seja um produto da

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justiça. Não existe um critério de justiça uniforme para todo o Direito. Muito mais correto é que cada ramo do Direito tenha seu próprio critério. Em outras palavras, deve ser decidido qual princípio ou qual critério é adequado para o particular ramo do Direito, tal como o Direito Tributário. Na Alemanha fala-se, portanto, em justiça adequada à matéria. (...) Por isso se fala em princípio da necessidade e princípio do mérito. Para o Direito Tributário é amplamente reconhecido que este deve ser orientado pelo princípio da capacidade contributiva. (TIPKE; YAMASHITA; 2002, p. 21)

Os princípios tratados neste trabalho são um meio de compreensão e até

mesmo de efetivação da justiça. Sua relação, de acordo com Mello (2013, p. 43) se

dá da seguinte forma:

Os princípios dão suporte à Justiça Tributária e à Tributação Justa. Por meio de princípios, em determinadas situações, poder-se-á afastar o rigor da lei e aplicar a Justiça a cada caso, seja na esfera judicial ou administrativa, daí por que ser necessário o estudo das funções dos princípios. Isto não significa que a lei não deva ser aplicada, pelo contrário, deve ser aplicada conjuntamente com os princípios, os quais a complementam, e somente em casos específicos deve ser afastada.

Também há o dever de reflexão acerca dos princípios à luz do que traz

Beltrão (2014, p. 98):

Na evolução do positivismo alemão e como um refluxo das ideias do pós-guerra surgem as ideias de Karl Larenz (2005) com seu ideário da jurisprudência dos valores e o resgate do valor da justiça e uma tentativa científica da união dos dois grandes pilares do ordenamento jurídico: segurança e justiça. De fato, além das meras normas fruto da positivação do legislador, existem diversos valores que não estão necessariamente refletivos no direito escrito - ou, pelo menos, explicitamente, conceituados- , mas que alicerçam o ordenamento jurídico de qualquer nação, tais como segurança, justiça, equidade, solidariedade. Entre as normas e os valores - como cediço -, surgem os princípios que conectam e integram todas as normas de um determinado sistema jurídico, conferindo unidade a tal sistematização. Servirão os princípios para iluminar o legislador quanto à elaboração de regras com observância a tais valores e interesses. Nesse prisma, os diversos princípios informadores do sistema tributário podem influenciar a interpretação e aplicação de várias normas e, por sua vez, um mesmo valor pode influenciar vários princípios. O valor da justiça vai se traduzir em alguns deles: no campo tributário, o da capacidade contributiva, da igualdade; os

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quais devem ensejar normas, conferindo efetividade aos princípios e aos valores.

Assim, para reflexão, optou-se pela apresentação da citação do trabalho de

ÁVILA (2009, p. 17) que ilustra bem a situação que se encontra a tributação

brasileira:

É comum escutar, por parte do contribuinte, a alegação de que a norma tributária é injusta, por desigual, na medida em que deixa de atentar parte das particularidades do seu caso ou dele próprio. "O meu caso é diferente", exclama o contribuinte individual, reclamando, por exemplo, por não poder deduzir, da base de cálculo do imposto sobre a renda, a totalidade das despesas com educação ou com tratamentos médicos, sendo obrigado a obedecer a um padrão legal que permite a dedução somente até um determinado limite, aplicável a todos os contribuintes, indistintamente. (...) Diante dessa situação, o contribuinte alega a violação ao princípio da igualdade, pelo fato de a norma não ter tratado de modo diferente o seu caso na medida em que ele supostamente se diferencia dos demais. Assim, a norma tributária é acusada de injusta por não levar em conta as particularidades do caso ou do destinatário. A sua injustiça reside no fato de tratar todos igualmente, apesar de suas diferenças. O contribuinte, em outras palavras, reclama da sua padronização, quando, em seu entendimento, deveria primar pela individualização; sua simplicidade, quando preferia sua complexidade.

Em consonância a esse pensamento, Beltrão (2014, p. 110) prossegue:

Resta patente que as definições tributárias não podem ser decorrentes de puro exercício de legalismo, devendo ser claramente insertas na percepção maior da política fiscal e financeira, numa perseguição dos valores sociais dentro da unidade constitucional. Já não mais se mostra aceitável, para os fins de legitimação da tributação, a simples determinação dos elementos que compõe, cada uma das exações, sendo imperiosa a verificação sistêmica dos institutos, sobretudo para recuperar os predicados da capacidade contributiva e da justiça fiscal. Para que a justiça fiscal, por outro lado, seja realizada de modo efetivo, o conteúdo da economicidade deve lhe emprestar os predicados para que todas as tomadas de decisões tributárias - inclusive na fase legislativa - sejam dadas a partir da avaliação dos meios empregados diante das finalidades a serem atingidas. Hodiernamente, essa perspectiva tem sido cada vez mais postulada, inclusive sob forma de clamor público e questionamento exarcebado. Os movimentos sociais registrados em junho e julho de 2013 nas principais cidades nacionais demonstram, de modo hialino, essa demanda coletiva. A voz encontrada nas ruas, com o grande somatório das insatisfações individuais, evidencia que tal discussão

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não se limita a um debate técnico orçamentário ou jurídico, mas trata-se de um verdadeiro tema social, um importante debate político.

Por isso, boa parte da doutrina tributária já se encontra preocupada com o

uso do Princípio da Igualdade como mecanismo de obtenção de uma Justiça Fiscal,

protegendo assim, o contribuinte das possíveis arbitrariedades do Estado. Nesse

sentido, prossegue ÁVILA (2009, p. 21):

Esses casos, e os argumentos neles envolvidos, remetem à seguinte indagação: a norma tributária deve tratar todos os contribuintes diferentemente, apesar das suas diferenças, ou todos os contribuintes diferentemente, apesar da sua igualdade? Este trabalho propõe-se a buscar respostas para essa intrincada pergunta, impulsionado, especialmente, pela alegação de que o Direito Tributário justo é aquele que sempre leva em consideração as particularidades dos casos concretos e dos contribuintes neles envolvidos; é aquele que privilegia o denominado princípio da capacidade contributiva subjetiva acima de tudo, em suposto detrimento da legalidade.

Para a efetivação da chamada Justiça Fiscal, entretanto, busca-se o uso de

mecanismos de limitação e comparação eficientes e justos, a garantia dos direitos

fundamentais e segurança jurídica, além de estar em conformidade com a

Constituição Federal, obviamente. Neste sentido, ainda analisando a obra de ÁVILA

(2009, p. 23):

A relevância da investigação deve-se ao aumento da aplicação indistinta das leis tributárias pelo Poder Judiciário, sob a alegação de que ele nada pode fazer a não ser aplicar de modo uniforme a lei, tal como foi posta pelo poder competente - o Poder Legislativo.

Nesse sentido, sugere-se, em acordo com o autor supracitado, o uso do

Princípio da Capacidade contributiva como parâmetro principal para efetivação da

Tributação Justa. Entretanto, como se sabe, no Direito Tributário, existem outras

sugestões de critérios para obtenção da justiça fiscal, acarretando certas

divergências, conforme ilustra ÁVILA (2009, p. 33):

Com efeito, enquanto a doutrina, em geral, entende haver uma contraposição entre igualdade e eficiência, examina-se aqui a eficiência como forma de realização da própria igualdade, Ao passo que a doutrina sustenta que a padronização permite o abandono do

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critério da capacidade contributiva, sustenta-se, aqui, que a capacidade contributiva é parâmetro permanente para o cotejo da própria validade das generalizações no Direito Tributário.

Quanto à tributação justa esta é um dos objetivos da Justiça Fiscal, e o

princípio da Igualdade deve ser utilizado como limitador ao uso abusivo de poder

pelo Estado, preservando a isonomia entre os cidadãos, evitando o uso desta com

intuito meramente arrecadatório, desconstituindo seu ideal, a saber, meio de

diminuição das desigualdades fáticas existentes da sociedade. Nesse sentido, a

isonomia tributária encontra operatividade nos sistemas jurídicos atuais por meio da

capacidade contributiva, que visa garantir a diminuição das desigualdades,

legitimando a atuação do Estado, enquanto Fisco.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Estado Social demonstra clara distinção das demais formas de Estado que

o precederam em razão da sua base jurídica nas Constituições Mexicana de 1917 e

Alemã de 1919 que se preocupavam com os direitos sociais, econômicos e culturais,

ligados aos indivíduos e à cidadania.

No Estado Social, estão fortemente presentes os ideais de justiça distributiva,

direitos sociais, qualidade de vida e dignidade da pessoa humana. Ocorre que esses

ideais podem ser alcançados com a utilização de institutos jurídicos como a Justiça

Fiscal, por meio do Princípio da Isonomia Tributária.

Enquanto a tributação deve ser preferencialmente direta, de caráter pessoal e

progressivo, o contribuinte deve receber, em razão do Princípio da Isonomia

Tributária, tratamento igualitário.

Dessa forma, pode-se considerar a partir da nossa pesquisa que:

1. O Estado como forma de organização social surge da necessidade

administrar os interesses comum da coletividade na qual se insere, e dessa maneira,

se reúnem, legitimando a constituição do poder na figura de seus representantes.

Como visto, por exemplo, na Monarquia, o representante máximo desse poder é o

Rei, que chega ao poder de maneira não democrática, e na Democracia, os

representantes são eleitos pelo povo.

2. Enquanto o Estado Liberal preconiza a liberdade e intervenção mínima por

parte do governo, pautando-se na legalidade e na segurança jurídica, o Estado

Social, prevê uma maior participação estatal na vida dos administrados,

possibilitando a efetivação dos institutos principiológicos como os citados nesta

pesquisa monográfica, da Isonomia Tributária, Capacidade Contributiva e

Progressividade, sem, entretanto, inclinar-se à ilegalidade ou insegurança jurídica.

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3. O Princípio da Isonomia Tributária, se devidamente aplicado, desde a

instituição até a cobrança dos tributos, é um instrumento eficaz para a efetivação de

direitos do contribuinte, garantia de Justiça Fiscal, evitando possíveis excessos por

parte do Estado.

4. O Princípio da Capacidade Contributiva consiste em respeitar a disposição

patrimonial e econômica efetiva do contribuinte em pagar seus tributos, utilizando,

no critério pessoal da regra-matriz, o Princípio da Isonomia Tributária, de maneira

que aquele que aufere maior renda pagará proporcionalmente mais que aquele

contribuinte que possua renda menor.

5. A Capacidade Contributiva não se confunde com Capacidade Econômica,

uma vez que a Capacidade Contributiva se refere à capacidade efetiva que o

indivíduo possui para contribuir, arcar com suas obrigações tributárias, enquanto a

Capacidade Econômica diz respeito à potencialidade, à sua disposição patrimonial,

que não corresponde à renda tributável, propriamente dita.

6. O Princípio da Capacidade Contributiva não se assemelha ao Princípio da

Capacidade Colaborativa, pois enquanto a Capacidade Contributiva diz respeito à

aptidão de cumprir com as obrigações principais decorrentes da tributação, como

por exemplo, o pagamento do valor devido de Imposto de Renda, a Capacidade

Colaborativa se refere ás obrigações acessórias, que lhes dão suporte, como a

obrigação de enviar a declaração anual de Imposto de Renda.

7. A Justiça Fiscal, tratada pelo viés do Princípio da Isonomia Tributária não

se confunde com a Justiça Tributária, uma possível especialização do Poder

Judiciário para tratar especificamente de lides em Direito Tributário.

8. Os tributos são instituídos com finalidade precipuamente fiscal, a saber,

arrecadatória, pois é fonte de renda para o Estado. Assim, existem tributos que

possuem finalidade extrafiscal, ou seja, não objetivam meramente arrecadar dinheiro

para os cofres públicos, de maneira que podem vir a intervir no comportamento dos

contribuintes e da economia, de acordo com a utilidade daquilo que for tributado.

9. O Princípio da Proporcionalidade visa evitar o uso da máquina pública, ou

da tributação com desproporção, por meio da análise da adequação, necessidade e

proporcionalidade em sentido estrito. Pode ser aplicado em tributos aos quais não

seja possível a aplicação do Princípio da Capacidade Contributiva, ou seja, tributos

com finalidade extrafiscal, como anteriormente exposto.

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10. A Justiça Fiscal objetiva a justiça distributiva, a mitigação das

desigualdades sociais e a garantia da arrecadação dos tributos de uma maneira

eficaz e equitativa. Dessa maneira, pode proporcionar o uso do Direito Tributário

para garantir os ideais preconizados pelo Estado Social de Direito, bem como a

efetivação dos direitos e garantias fundamentais.

11. A Justiça Fiscal, aplicada enquanto norma ou princípio tributário se

coaduna com a segurança jurídica, uma vez que esta pressupõe a expressão da

legalidade nos termos do artigo 3º da Constituição Federal, e demanda que se

assegure e se cumpra a tributação justa, que tem como característica a segurança

jurídica e a expectativa de uma ordem jurídica justa e não apenas legal.

12. O Estado Social, que tem por objetivo a manutenção de direitos sociais

básicos na qualidade de vida dos cidadãos, como a saúde, alimentação, moradia,

educação, lazer e segurança, pode ser mais bem efetivado por meio da aplicação

dos princípios correlatos à Justiça Fiscal, como a Isonomia Tributária, a

Progressividade e a Capacidade Contributiva.

Sendo assim, corroborando cada vez mais com a Justiça Fiscal em nossos

municípios, Estados e Federação como auxílio à sociedade brasileira.

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