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danilo arnaldo briskievicz
ENFIM, SIMPLES
1
danilo arnaldo briskievicz
ENFIM, SIMPLES Edição do Autor
Belo Horizonte – 2013
2
La simplicité combine naturellement et sincèrement douceur et sagesse, avec un esprit sans complication. In: http://www.lespasseurs.com/Simplicite.htm
3
Enfim, simples depois de orgulho
depois do monturo
hora de simplicidade
enfim, simplicidade
mesmo aos quarenta anos
4
Música aleatória
a música me veste
de ambiente interior
se deixo no aleatório
o som é ambiente infinito
5
Sem luz
vontade de apagar a luz
da cidade inteira e a lua
ser a única visão iluminada
no céu do interior
6
Tempo
entre a máquina datilográfica
e o teclado do microcomputador
foram tantos versos
mas a simplicidade ainda
me procura por trás
das palavras
7
Filhos
a energia gasta
para alimentar
os filhos
a alegria basta
para sedimentar
os idos
8
O mundo é pequeno
talvez em Bruxelas
o relógio me lembre
da santa rita do Serro
a marca da cidade
primeira é como pele:
dura sempre
9
Rotina
voltar à rotina
declinado humor
voltar à rotina
cansaço anterior
10
Dever
quando o verso
demora: sei bem
é hora de fazer
o que se deve fazer
o dever
11
Torres
a torre Eiffel
me leva
da terra
ao céu
a torre Babel
me deixa
mudo
ao léu
a torre Pisa
de tanto
entortar
escarcéu
12
Gênero
a mulher depila as axilas com gillette
o homem depila as axilas com gillette
ambos
13
Goiabada com queijo
depois da sobremesa
goiabada com queijo
o sono vem
docemente
14
Brotação
a semente
nunca mente
se dá para crescer
aparece
se não dá para ser
carece
e tudo que carece
não brota
15
Inverno
no inverno a chuva
está para além
da montanha
no inverno a nuvem
é um disfarce
do tempo
16
Novos
novos baianos
novos cabanos
novos troianos
novos nós mesmos
17
A nuvem
o vento não leva
pensamento ruim
passa apenas a nuvem
carregada
18
Música
ficar parado
ainda ouvindo
música boa
é agitar-se por dentro
19
Não vejo em preto e branco
a imagem
em preto e branco
revela o preto
e o branco
paisagem pura
20
Jogo
o jogo acabou
o resultado final:
vitória do meu time
dormir em paz
21
Lasanha de domingo
a lasanha do domingo
faz volta em torno da mesa
e gruda todos em seu queijo
22
Peruca de Elza Soares
a peruca de elza soares
os cílios postiços de elza soares
o samba eterno de elza soares
o que é único não se repete
23
Ao meio dia
ao meio dia o sol
deitou-se entre nuvens
e eu respeito a natureza
e fiz o mesmo
24
Lençol
a tarde me abandona
não há outra solução:
cair na noite
entre lençóis
25
O carro
o carro abandonado
no meio do caminho
enferruja no tempo
sem coragem de correr
26
O tempo
o que volta
depois de dias
regressa forte
o tempo volta
sem se preocupar
se eu também passo
27
Sem saída
da vida
inda ou vinda
não importa:
sem saída
28
Para pensar
apesar do domingo
apressar a rotina
da segunda-feira
vejo por entre os dedos
um pouco de tempo
para pensar
29
Como convém
o bicho mais simples
faz apenas o que lhe convém
e se vem seca ou vento ou fartura
tudo lhe faz ser como convém
30
Pinóquio
a vida do cravo
na ponta do nariz
é curta para dizer
a verdade
longa
quando minto
31
Colônia
o dom mira o céu de colônia
de tantas mãos feita: como o céu
32
O coquinho
o coquinho da palmeira
da árvore da praça
tem maritacas
verdes
e os pardais sabem:
os coquinhos não fazem
parte da dieta deles
33
Trinta e três
quando aos trinta e três anos
muitos homens e mulheres
morreram no mundo:
faz parte do tempo
34
Alma de poeta
a alma precisou falar
não tive outro jeito:
poesia
35
Beija-flor
se todas as sementes
da minha jardineira
resolverem vingar
terei muitos beija-flores
na janela em breve
36
Nuvens
enquanto eu buscava
o desenho na nuvem
o vazio tomou conta
de dentro: pude ver
para além das nuvens
37
Nexo
saudade de passado
vem assim: sem nexo
e quando se vê tudo ali
perplexo
38
Raiz
a raiz da árvore
está debaixo
da terra
pior pra ela
se sofre
melhor pra ela
se erra
39
Dia
dia
puro dia na alma
nem parecia: nublado
acontecia
nem flor nascia
nem amor carecia
apenas dia
40
Permito
eu me permito
ficar lindo
quando finjo
41
A rua
a notícia boa
ainda não chegou
espero a lua
conversar com a alma
que hoje resolveu:
sair de madrugada
pela rua
42
Rotina
o corpo sabe a hora
de pedir banho:
quando a rotina
é um outro corpo
no corpo, estranho
43
Nitrato de prata
o tempo da fotografia
no quadro preto na parede
é apenas o tempo passando
entre o nitrato de prata
e meus olhos
44
Ser
só sei uma coisa na vida:
ser
45
Breve
o vento passou rápido
tirou das ventas do homem
fumaça de cigarro
como um pensamento
breve: o dia começou
46
Palavra
a palavra não sabe
da palavra
apenas quando
gravada na alma
do tempo
47
Música
ouvir outra música
(já outro idioma)
me leva para longe
alguns passos da mesmice
48
Árabe
a fração de nota
da música árabe
divide a emoção
49
Escorre
a tarde escorre
feito água em
vaso: e dá flor
50
Raio de sol
o raio de sol
atravessou o espaço
e veio ter comigo
dentro do ônibus
51
Interior de minas
a ave-maria tocou
em mim como em seis
horas da tarde
no interior de minas
52
Boa morte
se a vida esgotasse
no corpo agora: bom
momento de partir
-chove em pleno inverno
53
Plenitude
plenitude é agora
ontem: falta
futuro: nada
54
Vapor
o vapor entrou
pela boca
e fez pensar:
humildade
55
Temperatura
hoje não houve calor
exceto pelo corpo
meu corpo pulsa
temperatura constante
56
Ventania
agosto prossegue
entre vento ruim
e vento bom
há tanta impureza no ar
57
Contra a parede
o osso aponta
por baixo da pele
o tempo encosta
a gente na parede
58
Submerso
a raiz da vida
está funda aqui
difícil falar assim:
submerso
59
Paleta
a clarineta
preta
a pauta
preta
a música
colorida
60
Dessa vez
simples olhar
depois memória
esquecer, talvez:
não foi dessa vez
61
Zeó
a cidade mudou de cor
quando de manhã dona dodô
observou a rua pela janela
e magno zeó viu o dia nascer torto
62
Fui ver
e lá fui ver
o passado
mas quê!
acabado
63
Contas
as contas do mês
chegaram pontualmente
marcando o espaço
entre trabalho e salário
64
Orvalho
que o orvalho
seja forte na madrugada
a bromélia vai precisar
de água para passar
pelo inverno
65
Anjo da guarda
o anjo guarda
e aguarda
alegria de carta
66
Falsa copa
a nuvem passou
por trás da árvore
seca de inverno:
a copa de algodão
67
Final?
até chegue
o ar final
nada em mim
diz adeus
68
Globalization
wellington
leciona francês
jean-marc
leciona inglês
69
Ouvinte
o som da música
na sala insiste
e me acha
o espaço
do apartamento
me ouve
70
Silêncio na pele
após o banho
a pele pede
silêncio
71
Nada a fazer
talvez amanhã cedo
por agora apenas
esse cheiro no ar:
fazer nada
72
De novo
agosto morre, de novo
eu penso na primavera,
de novo
enquanto as coisas mudam
eu fico esperando, apenas
de novo
73
Formiga
a formiga desengonçada
nasceu para ser atropelada
74
Um lugar no mundo
onde a celebridade
sofre?
75
Ogum: orixá da tecnologia
Ogum,
protegei meu Iphone
76
Dia de fera
a volta da terra
não me enterra
antes, encerra
o dia de fera
77
Trocadilho socrático
eu não sei bem
o que eu sei: apenas
sei que bem sei
o que sei
o que eu não sei bem
78
O voo
o voo
dentro
decolo
agora
o voo
fora
embolo
a hora
79
Céu noturno
azul no céu
de noite
alguém já
viu?
eu já
pra completar
havia estrelas
logo, elas...
80
All changing
o sábado
passa em mim
levantando
questões
adormeço
(sentar a poeira
é preciso)
81
Gota possível
tirar poesia da primeira
gota da chuva
de setembro:
possível
82
Sinal verde
verde: passando
em gerúndio
intenso
83
Sinal amarelo
amarelo: parar
ou continuar
andando?
84
Sinal vermelho
vermelho: estacionar
e admirar o fogo da
boca do circense de rua
85
Manta indiana
a manta indiana
não deixa o calor
passar pelos fios
já o pensamento
bem, o pensamento
não obedece a prisões
86
Noite
roubar da noite
o noturno
de chopin
87
Dado
dá
dó
88
Hd do pc
o vídeo musical
está eternizado
no hd do pc:
será?
89
Saldo do dia
o saldo do dia:
vazio
mas necessário
90
Um dia frio
o frio pelo corpo
deixa a alma
congelada
-tempo de pensar
91
Para Sócrates
acreditar na simplicidade
da natureza da alma
como se houvesse
apenas uma lição
a aprender:
aprender
92
Troca
a noite
foi trocada
pela manhã
desajeitada
troca injusta
93
Finito
enfim, se simples
por fim, se simples
bom fim, se simples
94
Fato
o som do corpo
banhado
enche a casa
acanhada
o dia acabou
de fato
95
Sim, sempre
procurei o simples
veio apenas o sim
simplicidade é sim
sempre
96
Fim do dia
como um mantra
a tarde cai
diante dos olhos
sem ferir: gera paz
97
Espirro
entre a cara enrugada
e o espirro de alívio
passou um segundo
em minha vida
98
Lua
a lua
da rua
é outra
a lua
da lua
é mesma
99
Eu não sou a lua
virar o rosto
no travesseiro
mudar de fase
no sono
eu não sou a lua
100
De mim, em mim: simples
depois da prece
acontece
depois da pressa
enfraquece
101
Cisterna
a água da cisterna
oculta e limpa
sobe pela força
de suas mãos
refresca a tarde
102
Estação passada
enquanto a chuva
não vem eu espero
o tempo certo
para plantar
por enquanto vivo
da colheita da
estação passada
103
Final
ao fim
simples
ao sim
feliz
104
DANILO ARNALDO BRISKIEVICZ nasceu em Serro, no ano de 1972. Graduado,
pós-graduado e mestre em filosofia. É professor
do ensino médio e universitário (graduação e
pós-graduação) em Belo Horizonte. Autor de
livros e textos de história, de fotografia, de
filosofia e de poesia. Conserva, na poesia,
ligação umbilical com a cidade natal. Para se
ter com a grande aventura de ser brasileiro,
mineiro e serrano, evoca no seu eu poético um
regionalismo próprio. Todos os livros estão
disponíveis para download gratuito no site
oficial.
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Copyright by Danilo Arnaldo Briskievicz
Todos os direitos reservados. Permitida a cópia/citação, reprodução, distribuição, exibição, criação de obras derivadas desde que lhe sejam
atribuídos os devidos créditos do autor por escrito.
Imagens Capa: São Gonçalo do Rio das Pedras, julho de 2013
Autor: Júlio Alessi
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