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Das especificidades estruturais das mensagens publicitárias: o conceito de género Eduardo J. M. Camilo 1 1 - Funcionalidades da comunicação pu- blicitária Em 1937, aquando da redacção do Six Lectures on Sound and Meaning 2 , disserta- ção sobre a função poética e em que medida o poema The Raven de Edgar Allan Poe se assume como um exemplo do que é um exercício linguístico de índole poética, Roman Jakobson reflecte sobre a distinção entre a fonética e a fonologia. A primeira possibi- litaria sistematizar e classificar os fenóme- nos fónicos da linguagem; já a segunda permitiria reflectir sobre a funcionalidade dos sons, isto é, o seu valor de significação, a relação entre o som e a produção de sentido. A fonologia concebe os sons enquanto sig- nos verbais: “the task is to investigate speech sounds in relation to the meanings with which they are invested, i.e., sounds viewed as signifiers, and above all throw light on the structure of the relation between sounds and meaning3 E identifica no fonema a unidade mínima que apresenta uma função linguística de sentido verbal. Nesta valorização daquilo no qual radica o núcleo de um processo de comunicação oral, sente-se uma preocupação pelo básico, pelo essencial, uma atitude epistemológica que nos irá ser útil nesta reflexão: é só a partir do estudo das unidades mínimas, dos traços distintivos e da análise das suas interelações segundo determinados princípios, que é possível entender as vari- ações de sentido e a sua especificidade. E uma das formas mais interessantes de as inventariar é precisamente nas situações mais extremas, as que são inerentes à aquisição ou à perda da competência linguística, da capacidade de gerar e gerir sons: é a partir da análise da linguagem das crianças e dos estudos sobre os processos de desintegração da competência linguística – as afasias – que Roman Jakobson procura delimitar estas unidades mínimas 4 . A partir destes fenómenos extremos – extremos porque destacam tudo o aquilo que é de mais essencial nos proces- sos de comunicação verbal – explicam-se os “phonemes, the distinctive features, and their mutual relations, and to get closer to the main principles of this selection and of this interdepedence so as to be in a position to explain the universal laws which underline the fonologic strutures of the world’s languages. É precisamente devido a esta pretensão de encontrar as estruturas fonológicas mais elementares, responsáveis pela singularidade estrutural das linguagens, que nos atraem os estudos de Roman Jakobson. Tal como ele, também estamos interessados em descobrir, mas no âmbito de um processo de comuni- cação singular como é o caso da comuni- cação publicitária, os exercícios linguísticos mais distintivos e essenciais, isto é, aqueles que são responsáveis pela sua originalidade estrutural, pela sua peculiaridade. Continuando com Roman Jakobson: constata-se também a coerência desta posi- ção epistemológica de procurar descobrir e distinguir o fundamental a partir do conceito de ‘função da linguagem’: um exercício linguístico específico que produz um sentido adequado a um dos vários componentes ou factores inerentes a um certo procedimento comunicacional. A função linguística é, na sua especificidade, uma função comunica- cional. Relativamente a este assunto, Roman Jakobson limitou-se a desenvolver os estu- dos de K. Bühler¸ efectuados na década de 30 do século passado, relativos à correlação entre exercício linguístico e processo comunicacional 5 .

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Das especificidades estruturais das mensagens publicitárias:o conceito de género

Eduardo J. M. Camilo1

1 - Funcionalidades da comunicação pu-blicitária

Em 1937, aquando da redacção do SixLectures on Sound and Meaning2, disserta-ção sobre a função poética e em que medidao poema The Raven de Edgar Allan Poe seassume como um exemplo do que é umexercício linguístico de índole poética, RomanJakobson reflecte sobre a distinção entre afonética e a fonologia. A primeira possibi-litaria sistematizar e classificar os fenóme-nos fónicos da linguagem; já a segundapermitiria reflectir sobre a funcionalidade dossons, isto é, o seu valor de significação, arelação entre o som e a produção de sentido.A fonologia concebe os sons enquanto sig-nos verbais:

“the task is to investigate speechsounds in relation to the meaningswith which they are invested, i.e.,sounds viewed as signifiers, and aboveall throw light on the structure of therelation between sounds andmeaning” 3

E identifica no fonema a unidade mínimaque apresenta uma função linguística desentido verbal. Nesta valorização daquilo noqual radica o núcleo de um processo decomunicação oral, sente-se uma preocupaçãopelo básico, pelo essencial, uma atitudeepistemológica que nos irá ser útil nestareflexão: é só a partir do estudo das unidadesmínimas, dos traços distintivos e da análisedas suas interelações segundo determinadosprincípios, que é possível entender as vari-ações de sentido e a sua especificidade. Euma das formas mais interessantes de asinventariar é precisamente nas situações maisextremas, as que são inerentes à aquisiçãoou à perda da competência linguística, dacapacidade de gerar e gerir sons: é a partirda análise da linguagem das crianças e dos

estudos sobre os processos de desintegraçãoda competência linguística – as afasias – queRoman Jakobson procura delimitar estasunidades mínimas4. A partir destes fenómenosextremos – extremos porque destacam tudoo aquilo que é de mais essencial nos proces-sos de comunicação verbal – explicam-se os

“phonemes, the distinctive features,and their mutual relations, and to getcloser to the main principles of thisselection and of this interdepedenceso as to be in a position to explainthe universal laws which underline thefonologic strutures of the world’slanguages.

É precisamente devido a esta pretensãode encontrar as estruturas fonológicas maiselementares, responsáveis pela singularidadeestrutural das linguagens, que nos atraem osestudos de Roman Jakobson. Tal como ele,também estamos interessados em descobrir,mas no âmbito de um processo de comuni-cação singular como é o caso da comuni-cação publicitária, os exercícios linguísticosmais distintivos e essenciais, isto é, aquelesque são responsáveis pela sua originalidadeestrutural, pela sua peculiaridade.

Continuando com Roman Jakobson:constata-se também a coerência desta posi-ção epistemológica de procurar descobrir edistinguir o fundamental a partir do conceitode ‘função da linguagem’: um exercíciolinguístico específico que produz um sentidoadequado a um dos vários componentes oufactores inerentes a um certo procedimentocomunicacional. A função linguística é, nasua especificidade, uma função comunica-cional. Relativamente a este assunto, RomanJakobson limitou-se a desenvolver os estu-dos de K. Bühler¸ efectuados na década de30 do século passado, relativos à correlaçãoentre exercício linguístico e processocomunicacional5.

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Voltamos a descobrir a dimensão estru-tural do raciocínio de Roman Jakobsonquando ele faz depender a especificidadeessencial de um processo de comunicação,a sua singularidade mais básica, de umexercício linguístico que se concretiza pre-dominantemente sobre um determinado com-ponente comunicacional. Será o caso dapoética que estará relacionada com um pro-cesso de comunicação, cuja tipicidade es-trutural recai no exercício linguístico sobrea expressividade da mensagem, a dimensãopalpável dos signos. A poética define-se,então, por esta qualidade estrutural daexpressividade linguística, que é imutávela contextos e a circunstâncias. Não interes-sa averiguar neste estudo, a natureza do exer-cício linguístico tipicamente poético, masreivindicar para ele um valor epistemológicoque é semelhante ao do fonema. Se esteúltimo apresentava uma funcionalidade deíndole fonológica, inerente à estrutura detodas as linguagens do mundo, porque nãoconsiderar na poética um valorcomunicacional? Seria um valor que estariaassociado a uma certa essência estrutural,a uma singularidade que todos os processoscomunicacionais teriam de possuir paraapresentar uma determinada natureza. Apoética remeterá para um procedimento decomunicação cuja especificidade será co-mum em qualquer parte, independentemen-te dos contextos e das circunstâncias.Certamente que estas últimas variáveisintervêm decisivamente na realização e nosucesso desse processo comunicacional, massomente no que respeita a uma dimensãosubstancial e não formal que pode originarvariações inerentes ao próprio reconheci-mento e interpretação da sua essência. Seconsiderarmos a poética como um processocomunicacional típico – que não deverá serconfundido com o da poesia -, será possívelinventariar o que designamos por génerosou por classes de poética, conforme osexercícios linguísticos de natureza estrutu-ral se conjugam conjunturalmente comoutros que se reportam, por sua vez, adistintos componentes do processo de co-municação poética. É este princípio quepossibilitou a Roman Jakobson distinguir apoesia épica da lírica:

“ les particularités des diverses genrespoétiques impliquent la participation,à côté de la fonction poétique pre-dominante, des autres fonctionsverbales, dans un ordre hiérarchiquevariable”6.

Como a função da linguagem poderádeterminar a natureza estrutural dos proces-sos de comunicação, então porque não ha-veremos de formular a hipótese sobre aexistência de um exercício linguístico estru-turalmente predominante, uma função dalinguagem que determinasse a essência de umprocesso de comunicação publicitária? Seriaum exercício linguístico adequado a umaforma de comunicação de especificidadecomercial inerente, por sua vez, ao funcio-namento de um campo social que passare-mos a designar por ‘campo micro-económi-co’.

Na conceptualização do género publici-tário será necessário desenvolver váriasoperações: a) caracterizar a especificidade dosprocessos de comunicação comercial, isto é,publicitária; b) perceber qual é o exercíciolinguístico mais básico, fundamental, a fun-ção da linguagem que determina a singula-ridade do procedimento de comunicaçãopublicitária; e, c), demonstrar como a publi-cidade é afectada por circunstâncias e porcontextos que determinam a emergência deoutros exercícios da linguagem dotados defunções linguísticas complementares, relaci-onadas com a emergência do que designa-mos por ‘género’ publicitário.

São estas operações que caracterizam asegunda parte deste estudo.

2 - Delimitação do conceito de géneropublicitário

a) O processo de comunicação publici-tária

Não é possível conceber a existência deum ou vários géneros de publicidade semperceber as especificidades do processo decomunicação para o qual remetem, da mesmaforma que não é possível ponderar a exis-tência de ‘poesias’ ou de ‘literaturas’ sementender as particularidades da comunicaçãoestética. Se o género tem um valorcomunicacional, então será à luz de uma

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teoria da comunicação que deverá ser ava-liado.

Ao invés de caracterizarmos o modelocomunicacional de Roman Jakobson, consi-deramos mais proveitoso avançar logo parao esboço de um modelo de comunicaçãopublicitária, ao mesmo tempo que estabele-cemos como premissa a existência de certosexercícios linguísticos subjacentes, nãoobstante a particularidade de existir um delesque apresentará um valor básico e essencial.Porquê básico e essencial? Porque é preci-samente o que está inerente a um certocomponente ou factor que determina aespecificidade estrutural do processocomunicacional. Assim, se na comunicaçãopoética existe um exercício linguísticodeterminante, o mesmo se verificará nacomunicação publicitária.

Destinador, destinatário, contexto, men-sagem, contacto e código: eis os componen-tes comunicacionais formalizados por RomanJakobson. O modelo é inspirado no do datransmissão de informação de Shannon e deWeaver, com todos os limites decorrentes deuma concepção linear e nada processual dofenómeno comunicacional7. O motivo paranão abandonarmos à partida estas concepçõesprende-se com a particularidade de o pro-cesso de comunicação publicitária apresentarcaracterísticas que se inscrevem nalgunspressupostos inerentes a estes paradigmas.

Passamos a apresentar as principais:1ª - A comunicação publicitária desen-

volve-se através de canais específicos que nãosão de natureza interpessoal: televisão, rá-dio, jornais, etc.. Os processos de comuni-cação comercial que não se concretizam porestes canais são destituídos de uma naturezapublicitária;

2ª - A comunicação publicitária é deíndole linear: desenvolve-se a partir de umpólo – uma espécie de fonte comunicacionalde índole comercial – para outro - umdestinatário. Esta linearidade não é incom-patível com o facto de os interlocutorespoderem projectar as suas atitudes e pensa-mentos relativamente ao que é transmitido,afectando o modo como o sentido comercialé produzido, recebido e interpretado. Para nós,a linearidade está relacionada, principalmen-te, com a existência de um protagonismocomunicacional da fonte, relativamente à

iniciativa de divulgar e de legitimar/promo-ver uma existência comercial;

3ª - Que a comunicação publicitária éintencional é uma constatação incontestável.A dificuldade está em perceber a naturezadessa intencionalidade, pois ela irá afectarnão só a especificidade dos exercícioslinguísticos como determinar aquele que éestruturalmente predominante. Poderá consi-derar-se que a publicidade existe para, noâmbito da sua dimensão etimológica (dofrancês ‘publicité’), tornar público, fazerconhecer, divulgar uma existência (comerci-al). Concedemos ainda a possibilidade delaser considerada na óptica da promoção. Nestecaso, o sentido subjacente à intencionalidadeserá distinto, na medida em que o maisimportante será a legitimação, a elevação, adignificação de uma existência comercial (dolatim ‘promotio’).

Considerar estas duas disparidades simul-taneamente, implica conceber que a mensa-gem publicitária apresenta uma dimensãoreferencial e, ao mesmo tempo, umaespecificidade subjectiva. Num caso, o exer-cício linguístico remeterá para a afirmaçãode uma realidade, no outro, recairá numaespécie de atribuição de uma personalidadea essa mesma realidade, levando-a a adquirirum cunho subjectivo. Por um lado, apresen-ta-se, por outro, qualifica-se.

Apesar destas duas hipóteses deconceptualização da publicidade comercial,não existirá, mesmo assim, uma que sejaprimordial, aquela que realmente apresentao valor comunicacional porque é a quedetermina essencialmente a especificidade doprocesso publicitário? Se adoptarmos umaposição metodológica de radicalismo estru-tural, semelhante à de Roman Jakobsonaquando dos estudos sobre o estatuto dofonema, então concluiremos que a mensagempublicitária se caracteriza, na sua dimensãomais básica, por uma espécie de‘intencionalidade pedagógica’ relacionadacom a divulgação, com a apresentação, deuma existência comercial. Não existe men-sagem sem o pressuposto de uma oferta;

4ª - A anterior consideração conduz aofacto de a comunicação publicitária apresen-tar uma dimensão contextual incontornável.

Na sua dimensão mais estrutural, a co-municação publicitária existe para divulgar

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uma existência considerada comoinstitucionalmente relevante. Há uma remis-são para objectos (ou para as suas identi-dades) que apresentam, a priori, uma impor-tância, um certo estatuto (funcional, comer-cial, ou simbólico). O facto dos objectosserem cada vez menos relevantes, no sentidode mais semelhantes, mais banais, nãoincompatibiliza o pressuposto de a comuni-cação publicitária estar exclusivamente vira-da para o mundo dos objectos. Na suadimensão mais básica, a publicidade esgota-se na apresentação de uma realidade econó-mica, tal como a retórica é um processocomunicacional que se esgota na persuasão,nos efeitos que consegue produzir no des-tinatário.

A omnipresença de um contextoreferencial não impede, contudo, a existênciade um contexto situacional de índole social,cultural e, até mesmo, estritamentecomunicacional. Este contexto determina aforma como a existência dos objectos écomunicada e interpretada, obrigando a umamultiplicidade de práticas linguísticas com-plementares àquela que apresenta um valorestrutural, determinante para a comunicaçãopublicitária. Paralelamente às actividades quesão típicas da apresentação e da denomina-ção de objectos, a mensagem pode compor-tar outras marcas linguísticas inerentes, porexemplo, a um tipo de relacionamentointersubjectivo, a uma determinada atitudeindividual, ao estabelecimento de um con-junto de relações sociais, etc.. Porém, elasnão existem isoladamente na mensagempublicitária. Estão conjugadas com as queapresentam o tal valor comunicacional pri-mordial. Subjacente a esta interdependênciaexiste uma correlação entre estrutura e con-juntura. Por um lado, a mensagem publici-tária é composta por práticas linguísticas queapresentam um valor funcional inerente aopróprio processo de comunicação publicitá-ria; por outro, é constituída por exercícioslinguísticos com um valor relativo a contex-tos e a circunstâncias de acção económicae comunicacional. A conjugação destas prá-ticas linguísticas originará os géneros publi-citários. Voltaremos a este assunto maisadiante (cf c) – O género publicitário).

Passemos para a apresentação de algu-mas das características inerentes ao processo

de comunicação publicitária que relativizamalguns pressupostos subjacentes ao modelode comunicação postulado por RomanJakobson. Salientamos a indistinção entrefonte e transmissor e entre receptor e des-tinatário, amálgama que curiosamente não severifica no modelo da Teoria Matemática daInformação. De um lado, está o destinador(‘ adresser’), do outro, o destinatário(‘adressee’). Certamente que as razões destaunião estão relacionadas com o facto dadistinção patente no modelo de Shannon eWeaver ser inútil no âmbito dos fenómenosde comunicação interpessoal, nos quais existeuma coincidência entre fonte e transmissor.Este ajuntamento serve, paralelamente, parasalientar a influência das interferências pro-duzidas pelos interlocutores nas situações deconstrução e de interpretação do sentido,interferências essas, que apresentam o seucorrelato numa praxis linguística específica.É, concretamente, o caso dos fenómenosinerentes à função emotiva e conativa. Emrelação à opção por amalgamar as fontes eos emissores e os receptores e os destina-tários, reivindicamos a necessidade de con-tinuar a estabelecer uma separação entre taisentidades. É uma decisão resultante do factoda comunicação publicitária se desenvolverpor canais de comunicação de massa, ondeexistem elementos que transformam asintencionalidades significativas das fontes em‘sinais publicitários’ (os criativos publicitá-rios) e receptores que descodificam essessinais. Reconhecemos o paralelismo queestamos a efectuar com o modelo de Shannone Weaver. Mas logo este termina, quandoatribuímos uma importância essencial aosemissores e aos receptores que não se com-para com a que está subjacente à metáforade Weaver a propósito do estatuto do emis-sor:

“an engineering comunication theoryis just like a very proper and discreetgirl accepting your telegram. She paysno attention to the meaning, wheatherit be sad, or joyous, or embarrasing”8.

Certamente que a posição do criativopublicitário, espécie de emissor de publici-dade, está subordinada à intencionalidadesignificativa da fonte comunicacional (o

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anunciante), ao ponto das marcas linguísti-cas da sua identidade não se encontrarem notexto ou, então, estarem remetidas para asmargens, impondo uma configuraçãoenunciativa relativamente complexa. Nestasituação, verifica-se uma espécie de aliena-ção da subjectividade do emissor no proces-so de comunicação, enquanto sujeito deenunciado. Mas esta alienação pode serenganadora, pois se a identidade do emissorse encontra mais ou menos ocultada, ela podefazer-se metonimicamente evocar através dagestão de signos que concretizam funçõeslinguísticas não publicitárias, apesar de sereportarem a uma existência comercial. Sig-nifica esta ideia que se existem exercícioslinguísticos inerentes à divulgação de umaoferta e até mesmo relativos a umasubjectividade ou a uma intersubjectividadecomercial sobre o que é apresentado, tam-bém pode haver outros exercícios linguísticoscujo valor comunicacional não é publicitá-rio. Em conjugação com uma apresentaçãoe uma qualificação comerciais, constata-se aemergência de práticas linguísticas que têmpor função remeter para outros contextos, paraoutras emotividades complementares aomundo dos produtos. É como se se veri-ficasse a gestão de uma referencialidade, deuma emotividade ou de uma intersubjecti-vidade não comercial, na condição de sedesenvolver em nome de uma existência deíndole económica. Este descentramento entrefonte comercial e emissor (e a forma comotal é gerido) é, pois, útil para entender arelativa perda de importância dareferencialidade do objecto comercial napublicidade contemporânea. A elisão come-ça pela sua transformação em simplesadereço e termina no ponto em que a suaexistência linguística já não é mais neces-sária, adquirindo, cada vez mais, uma di-mensão pressuposta. Nestas situações encon-tramos algumas campanhas da Burberry, daBenetton, ou os anúncios provatórios daPuma (figura 1).

Em publicidades como as anteriormentereferidas, existem mutações estruturais noâmbito das práticas linguísticas: para lá dasfuncionalidades referenciais de índole estri-tamente comercial - responsáveis pela deter-minação da singularidade do processocomunicacional - surgem outras, complemen-

tares à apresentação do objecto e que apre-sentam uma cada vez maior predominâncialinguística. Enquadram a oferta noutras re-alidades não económicas, não integradas nasesferas da produção. É neste enquadramentoque os objectos e as designações comerciaisadquirem um estilo, uma imagem de marca.

A valorização da actividade do emissorno discurso publicitário é, portanto, indiciáticada existência de dois processos de produçãolinguística. O primeiro é estritamenteinstitucional: inscreve-se no âmbito de umpredomínio da fonte sobre o emissor publi-citário e reporta-se sempre à divulgação deuma existência comercial. É esta produçãolinguística que caracteriza a singularidade doprocesso de comunicação publicitária. Emcontrapartida, a outra produção linguísticarelaciona-se com a valorização do estatutodo emissor. É uma produção que, tendo por‘pré-texto’ a divulgação das existênciascomerciais, remete para outras significaçõesque as contextualizam. Os efeitos decorren-tes de tais produções já não incidem sobreas referências comerciais, mas naquelas queenquadram a oferta. Explicando esta ideia demaneira diferente: a publicidade já não incidesobre a gestão de uma actualidade comercial,mas sobre a gestão de outras actualidadesque contextualizam a existência comercial.O anúncio impõe-se pelo choque, pelo es-cândalo, pela surpresa, pelo desconforto, jánão em relação a uma proposta comercial,mas a outras propostas (não comerciais). Ora,estas duas ordens de acção linguística, quepodem estabelecer relações dialógicas deproximidade e de distância entre si, condu-zem, por sua vez, a uma elasticidade daconfiguração da mensagem publicitária. Porexemplo, no seu grau mais absoluto, a sin-gularidade publicitária da mensagem tendea diluir-se. Trata-se de uma situaçãoindiciática da sua transformação estrutural emqualquer coisa que já não é mais reconhecidacomo pertencendo à publicidade.

Para finalizar este assunto, destacamos aparticularidade de que, quando as produçõeslinguísticas são determinadas por uma dimen-são institucional (pela fonte publicitária), oproduto - ou a sua designação - tende a ocuparo núcleo, o eixo da mensagem publicitária.Verifica-se a gestão comunicacional da járeferida actualidade comercial. É a oferta que

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gera o processo de comunicação. Porém, asituação oposta surge quando o valor comer-cial do produto ou da marca é substituídopor outras ordens de importância, assistindo-se à tal diluição da referência comercial, ouentão à sua conjugação com outras referên-cias. Agora constata-se a gestão de umaobjectivação comercial a partir de umaactualidade que não é micro-económica:evoca-se o produto ou a marca a partir daóptica de uma notícia ou de uma história,por exemplo. O texto do produto assume-se, então, como o ponto de intercepção deuma imensa prática textual que o enquadra,o condiciona, impondo-lhe outros valores.

b) Delimitação do exercício linguísticomais básico

Não obstante as configurações que amensagem publicitária pode apresentar, o quea determina estruturalmente é um exercíciolinguístico que remete sempre – explícita ouimplicitamente - para uma existência comer-cial. A comunicação publicitária implica umautilização da linguagem com um valorreferencial que se reporta sempre a umaoferta. Esta particularidade possibilita distin-guir a mensagem publicitária de outro tipode mensagens no âmbito das quais tambémexiste um predomínio da função referencial.É o caso, por exemplo, do jornalismo e daliteratura, cujas referencialidades são maisamplas e genéricas do as que estãosubjacentes à mensagem publicitária. Estareporta-se sempre a uma realidade micro-económica, caso contrário, registará mutaçõesque afectarão a sua singularidade estrutural.Outra diferença entre a literatura, o jorna-lismo e a publicidade remete para as par-ticularidades inerentes aos processoscomunicacionais. Se no jornalismo e naliteratura, a realidade só é noticiada ounarrada na condição de apresentar umapotencialidade inerente a um exercício demediação estritamente comunicacional (umavalidade jornalística ou literária patente numvalor de notícia ou num valor denarratividade), pelo qual se avaliza o quemerece ser reportado ou narrado, na publi-cidade esta condição não se verifica. Aocontrário do jornalismo, tudo é digno, àpartida, de ser publicitado, pois os valoressão de índole extra-comunicacional: relati-

vamente ao anunciante, o criativo publicitá-rio não tem qualquer competência para jul-gar a oferta no sentido de decidir se ela édigna de merecer ser publicitada.

c) O género publicitárioO facto de a mensagem tipicamente

publicitária se caracterizar por um exercíciolinguístico que se reporta a uma realidade(micro-económica), não é impeditivo de nelaexistirem outros usos da linguagem. Sãopráticas linguísticas que não apresentam umanatureza estruturalmente predominante, masconjuntural e contextual, isto é, que podevariar de anúncio para anúncio publicitário.É precisamente a articulação destes exercí-cios linguísticos predominantes de índoleestrutural com os de natureza conjuntural quefundamenta o que designamos por ‘género’publicitário. Como existem vários tipos deexercícios linguísticos de índole conjuntural,então a sua articulação com aquele queapresenta um valor estrutural originará dis-tintas categorias de publicidade ou de ‘gé-neros publicitários’: a Publicidade Informa-tiva, a Publicidade de Marca, a Publicidadede ‘Teasing’, o Manual Publicitário, a Pu-blicidade Apelativa e a Publicidade deImpacto.

No quadro nº 1, sistematizamos cada umdestes tipos de ‘publicidades’, procurandoconcretizá-los com ilustrações significativas.

Passamos, muito sinteticamente para acaracterização de cada um destes géneros.

1.1) Publicidade Informativa (figura nº 2)Os exercícios linguísticos que constituem

a mensagem caracterizam-se por uma meradivulgação comercial. Como a mensagemrecai na publicitação de uma existência, estapoderá ser concretizada de três maneiras:relativamente à funcionalidade dos objectos,ao seu valor comercial e ao seu estatutosimbólico, enfim, tudo o que remete para aafirmação de uma vantagem competitiva.

No seu grau mais básico, os exercícioslinguísticos da publicidade informativa res-tringem-se à denominação do produto ou àsua exibição.

Este género é, indubitavelmente, o maisimportante, pois é aquele cujos exercícioslinguísticos de índole referencial e de natu-reza conjuntural se confundem com os queapresentam um valor estrutural e que deter-

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minam a singularidade do processo de co-municação publicitária.

1.2) Publicidade de Marca (figura nº 3)Constata-se na mensagem publicitária o

exercício de uma subjectividade de índoleinstitucional, pois os signos remetem parasignificações inerentes às atitudes da fontepublicitária (ou de quem a possa substituirna mensagem, como é o caso de um deter-minado actor) relativamente à existênciacomercial. Podem ser eufóricas - quando sereportam a um certo triunfalismo inerente àapresentação de uma oferta - ou disfóricas,quando remetem para a significação dasfrustrações, de um estado de infelicidadeinerente ao protagonismo de problemas as-sociados a estados de carência de produtosou de serviços. Existe, portanto, uma osci-lação entre um triunfalismo e uma depressãocomerciais, que são bem significativos de umpsiquismo publicitário de natureza bi-polar.

Salientamos o facto de poderem surgirparticularidades decorrentes do protagonismodo emissor publicitário (e já não da fonte)no âmbito do processo de comunicação, talcomo anteriormente referimos. Sendo assim,é possível conceber distintos exercícioslinguísticos relativos à afirmação de umasubjectividade de índole especificamenteinstitucional ou de cariz assumidamentecomunicacional.

1.3) Publicidade Apelativa (figura nº 4)Neste género existe, em conjugação com

a divulgação de uma existência comercial,práticas linguísticas que remetem para agestão de uma intersubjectividade.

Se do ponto de vista ilocutório, ela podeapresentar valores negativos ou positivosconforme está adequada aos interesses e àsexpectativas dos ‘consumidores-destinatári-os’, os tópicos reportam-se sempre a umasituação comercial (de existência ou de

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ausência). É assim que, recorrendo a Searle10,se torna possível classificar, no âmbito daPublicidade Apelativa, os convites, as ques-tões, os conselhos, os avisos de naturezacomercial.

Ainda no âmbito da PublicidadeApelativa, integramos os exercícios da lin-guagem que têm por função estabelecer umcontacto com o destinatário comercial, pas-sando inclusivamente pela sua objectivação.Daí que recursos estilísticos como osvocativos, as apóstrofes, os apostos comer-ciais, mas igualmente os olharesdireccionados e os gestos interpelativos,sejam recursos, suportados por palavras,imagens e grafismos, integrados neste género.

1.4) Publicidade de Teasing (figura nº 5)Consideramos ser esta uma prática pu-

blicitária na qual se concretiza umaintersubjectividade estritamente comunica-cional. A linguagem tem por função chamara atenção, seduzir o destinatário para umprocesso comunicacional de índole publici-tária. Daí a exploração de recursoslinguísticos verbais e não verbais, por exem-plo, baseados numa certa ludicidade: é o casoda advinha, mas, igualmente, do jogo, dopuzzle, etc.11. Todos apresentam o mesmoobjectivo: assegurar o interesse do destina-tário relativamente à comunicação de umaexistência comercial.

Nos Ensaios de Linguística Geral, RomanJakobson, baseado nos estudos de Malinowskisobre as linguagens primitivas12, salienta aimportância da dimensão ritual subjacente aocontacto comunicacional. Ora, é nesta dimen-são ritual que reconhecemos a variabilidadeda mensagem publicitária, perpassada não sópor contextos comerciais, mas igualmenteculturais, sociais, políticos e até mesmocomunicacionais (no que respeita a canais ecircunstâncias de comunicação). Originamformas específicas de estabelecer um contac-to publicitário que varia com o sector demercado, o país, o sistema cultural eeducativo, etc...

1.5) O manual de estilo publicitárioEste é o único exercício linguístico que

não se consubstancia explicitamente namensagem. Tal não significa que ametalinguagem publicitária não exista: so-

mente apresenta uma abrangência interna,inerente ao trabalho desenvolvido pelo pu-blicitário. A metalinguagem origina o quedesignámos por ‘manuais de estilo publici-tário’, publicações que, à semelhança do quese verifica no jornalismo, estabelecem regi-mes de expressividade comercial: o que podeser dito sobre uma existência comercial, comopode ser dita, representada, escrita e filmada.

1.6) A publicidade de Impacto (figura nº 6)Este é um interessante género publicitá-

rio caracterizado por uma espécie de ‘poesiapublicitária’. Mais uma vez recorremos às SixLectures on Sound and Meaning para fun-damentar esta ideia.

Na linguagem poética, é como se omistério da ideia também se encontrasseincorporado na própria matéria expressiva.Nesta medida, as oposições fónicas podem,sinestesicamente evocar sensações musicais,olfativas, tácteis cromáticas, etc.13. A poéticaé precisamente um exercício linguístico queincide no trabalho sobre a matéria verbal.

Do ponto de vista publicitário, porque nãoconsiderar que os sentidos evocados pelo taltrabalho expressivo poderão ser de índolemicro-económica, isto é, remeterem para umaexistência comercial e para as suas váriasdimensões: a funcionalidade, o valor de trocae a dimensão simbólica? É na óptica destepressuposto que interpretamos os estudos dePaul Siblot14 que concebe, na dimensãoexpressiva da própria denominação comer-cial, o poder evocativo não só de umaexistência mas igualmente de uma essência:“ le nom assure (...) un predicat dedénomination (Kleiber, 1981) par lequel ilannonce que ce qu’il désigne s’apelle bienansi qu’il le nomme”15. E discrimina algunsrecursos estilísticos inerentes ao que consi-deramos ser uma espécie de poesia do nomepublicitário. É o caso da denominação e daqualificação por onomatopeia, em que o somreflecte matizes inerentes à existência ou àfuncionalidade do produto. Por exemplo, oCrunch da Nestlé evoca os estalidos que sefazem ao mastigar a tablete de chocolate. Étambém o caso do neologismo, como, porexemplo, da palavra Wolkswagen, que resul-ta da aglutinação de monemas possibilitan-do, “comme dans les langues agglutinantes,une qualification explícite”. O que é válido

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para as matérias expressivas de índole verbaltambém o é no que se refere às que são deíndole iconográfica e gráfica. O princípiodesta poesia publicitária é sempre o mesmo:trabalhar a dimensão expressiva destes sig-nos para, através desse mesmo labor, evocaruma existência. É o estilo ao serviço dareferência publicitária.

Conclusão

As características estruturais da mensa-gem publicitária recaem em exercícioslinguísticos de índole referencial adequadosà apresentação e à nomeação de uma ofertacomercial. São essenciais pois apresentam umvalor decisivo: determinam a singularidadedo processo de comunicação publicitária.Complementarmente, o ‘género publicitário’está relacionado com a articulação destesexercícios linguísticos estruturais com prá-ticas que remetem para outros factores doprocesso de comunicação publicitária, mas

sem o determinarem estruturalmente. É estaarticulação que determinou a existência dediferentes tipos de mensagens publicitáriasou géneros publicitários.

Procurámos também explicar a razão quese encontra subjacente a determinadascompanhas no âmbito das quais existem exer-cícios linguísticos que parecem “esticar” atéao limite as configurações estruturais ineren-tes à comunicação publicitária. Esta particu-laridade não põe, porém, em causa a própriaessência estrutural da mensagem, pois o textopublicitário apresenta recursos expressivoscapazes de evocar metonimicamente todas asdimensões de uma existência comercial.Todavia, este fenómeno é indiciático de umavalorização de contextos de produção e deapropriação de enunciados que são determi-nados por valores estritamente comunica-cionais, cujos regimes de funcionamentoconsideramos serem semelhantes aos queestão subjacentes aos da noticiabilidade e danarratividade16.

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Figuras

Figura nº 1:A valorização da actividade do emissor publicitário, relativamente à ‘interferência editorial’da fonte, reflecte-se na emergência de práticas linguísticas que remetem as existências comerciaispara outros contextos destituídos de uma natureza económica, produtiva ou de consumo. Estaparticularidade produz implicações no estatuto linguístico do próprio produto na mensagem:ele é progressivamente remetido para o plano do adereço ou da denominação comercial atéao limite em que se encontrará irremediavelmente elidido no texto publicitário (mas nuncasem deixar de se encontrar pressuposto).

Equipamento Puma/ Campanha da Adolescente. Puma, 2003.Max Chaoul/ Couture Paris. Max Chaoul, 2003

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Figura nº 2:Exemplo de anúncio integrado na categoria inerente à Publicidade Informativa.Oyster Perpetual Yacht-Naster/ Rolex. Torres Joalheiros, 2004.

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Figura nº 3:A Publicidade Marca.Não obstante este anúncio se fundamentar numa relação intersubjectiva, patente na formulaçãode uma questão no headline, são evidentes as marcas inerentes à afirmação de uma atitudepositiva por parte da fonte relativamente ao Mazda3. Desde o recurso à metáfora visual (Manualde culinária / Manual sexual) sugestiva de uma emotividade antitética relativa à oposiçãoentre a existência e a ausência comercial, a uma linguagem adjectivada e hiperbolizada: “atre-va-se a saborear todos os dias um grande prazer de condução, fruto das motorizações e doexcelente comportamento dinâmico”.É neste género que descobrimos a existência de uma espécie de ‘lirismo publicitário’.

Novo Mazda3. Tempera os sentidos. Mazda, 2004.

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Figura nº 4:A Publicidade Apelativa.Não tem cartão de crédito BES? Vire a página. BES, 2003.

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Figura nº 5:Publicidade de Teasing“Quantos cavalos tem um motor de 1.400 cm3 de cilindrada?”[Rover 25, Teasing]. Rover, 2003, 2 p.

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Figura nº 6 :“Think Small”: a famosa campanha de 1962, da autoria de Bill Bernbach, ilustrativa do exercíciode uma ‘poesia publicitária’ exercida através de uma dimensão expressiva exclusivamenteiconográfica. O enquadramento e a composição – despropositados e desequilibrados – sãoevocativos de um atributo inerente a uma vantagem competitiva – o tamanho.Bernbach, Bill- Think Small. Wolkwagen of America, Inc., 1962.

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3 Idem, [p. 10 do endereço da Internet].4 Roman Jakobson - Langage enfantin et aphasie.

Paris, Flammarion, 1980, Col. Champs, (88).5 Roman Jakobson - Essais de Linguistique

Générale – Paris, Ed. Minuit, 1963, p 213 e ss;Daniel Chandler – “Encoding/Decoding”, in: Semioticfor beginners. Endereço da Internet (2004): http://www.aber.ac.uk/media/Documents/S4B/sem08c.html

6 Roman Jakobson – Idem, p. 219.7 Daniel Chandler – “Mediated Communication”,

in: Semiotic for beginners. Endereço da Internet(2004): http://www.aber.ac.uk/media/Modules/MC10020/assignment_03.html

José Rebelo, O discurso do jornal. O comoe o porquê. Lisboa: Editorial Notícias, Col. Media& Sociedade, (9), 2000, p. 58-59.

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8 Weaver, 1949, citado por: Daniel Chandler,“Mediated Communication”, in: Semiotic forbeginners.

9 Eduardo J. M. Camilo, Quando o ‘eu’ setransforma em ‘ele’: da institucionalização àobjectivação publicitária. O caso da Super Bock,Covilhã, Universidade da Beira, 2003.

Endereço da Internet: www.labcom.ubi.pt/jornadas_pubcomunicacao/index.htm

10 John R. Searle - Les actes de langage. Essaide philosophie du langage. Paris, Hermann, 1972,Col. Savoir, p. 108-109.

11 Andreia Galhardo, A sedução no anúnciopublicitário. Expressão lúdica e espectacular damensagem. Porto, Fundação Fernando Pessoa /Edi-ções Universidade Fernando Pessoa; 2002, p. 60-141.

12 Roman Jakobson - Essais de LinguistiqueGénérale, p. 217.

13 Roman Jakobson, Six lectures on sound andmeaning, 1937. (Página 12 do endereço da Internet).

14 Paul Siblot, “Choisir un nom” in: B.Frankael e C. Legris-Desportes – Entreprise etsémiologie. Paris, Dunod, 1999, p.43-44.

15 Idem, p. 43.16 João Maria Gomes Ribeiro Mendes, Por que

tantas histórias. Lisboa, FCSH da Universidade Novade Lisboa, Texto policopiado, Tese de Doutoramentoem Ciência da Comunicação, 1999, p. 344 e ss.