Delmiro Gouveia

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DELMIRO GOUVEIA Q uem diria que um rapazote que ficou órfão aos 15 anos de ida- de e sozinho numa cidade es- tranha, viria a se tornar um dos maiores empresários brasileiros do século XIX? Delmiro, brilhante empresário e nego- ciante visionário, carrega em seu nome grande obras executadas no Nordeste, a saber, nos estados de Pernambuco, Alagos e Bahia, como o famoso merca- do do derby (que poderia ser conside- rado um protótipo dos atuais shopping centers) e as várias empresas e indús- trias de fabricação e exportação de pe- les (“courinhos”, como era popularmen- te conhecido). Mas, além da fama de exímio empre- endedor, Delmiro também carregava o título de D. Juan, talvez herdado de seu pai, o chamado Belo de Farias que, no auge dos seus 34 anos, já casado, se apaixona perdidamente por uma moçoi- la de 14 aninhos, a qual é raptada por Belo. Desse ato resulta o nascimento de Delmiro Gouveia, mas não antes de sua irmã, Maria Augusta. Algum tempo depois do rapto, Belo se alista no exército para lutar na guerra do Paraguai, e, algumas elevações de patente depois, o capitão falece. Fica viúva a “curica de Belo de Farias”. Passados sete anos desde o episódio da fuga, a moça volta para suas terras de origem contanto 21 anos de idade e com duas crianças pequenas, órfãs de pai. A situação da curica piora quando dá-se conta de que só a esposa legítima do garanhão teve direito à herança e pen- são de Belo de Farias. Sem muitas opções, o pequeno Delmi- ro e família mudam-se para Goiana-PE, logo após, seguem para a capital. O problema é que mal o retirantes es- quenta lugar em Recife, a mãe, acome- tida por problemas cardíacos, morre, deixando o adolescente órfão e sozinho (Já que sua irmã já havia se casado e estava morando com seu esposo). Trágico... Mas Delmiro não fica muito tempo se lamentando. Com ajuda de um amigo da falecida mãe, o jovem Del- miro arranja um emprego de bilheteiro na maxambomba em Olinda (primeiro emprego que, mais tarde, Delmiro virá a se orgulhar). Algum tempo depois, agora maior de idade, Delmiro torna-se caixeiro despa- chante e foi nessa função que ele co- nheceu sua primeira esposa. É que de- pois de um tempo trabalhando no porto do Recife, Delmiro adoece e vai se tra- tar na cidade de Pesqueira, onde co- nhece uma moça de 13 anos. A menina era bem apessoada e de boa família... O casamento aconteceu ali mesmo. De volta ao Recife com sua esposa, Delmiro nota que o negócio de despa- chante não estava mais tão lucrativo e, agora casado, a responsabilidade aumentava. É aí que o jovem entra no ramo de “courinhos”, onde teve enorme ascenção profissional. Foi nesse ramo que ele conseguiu um emprego no ar- mazém de couro de Hermann Lundgren & Cia. Daí em diante, o comerciante só tende a crescer. Passa a trabalhar em Keen Sutterly e co. Ltda com um ótimo salário que lhe deu condições de abrir o seu próprio armazém, iniciando sua brilhante carreira comercial. Em 1890, Delmiro vai para Nova York propondo-se ao emprego de gerente no Recife, pela metade da remuneração então paga. No ano seguinte, em socie- dade com Clemente Levy, Delmiro abre um negócio de courinhos e especiarias. A fama de D. Juan surge quando Delmi- ro e esposa, já ricos, se mudam para o galante bairro de Poço da Panela, onde Delmiro inicia um namoro com uma vi- zinha com quem, inclusive, chegou a ter uma filha (Essa informção permanece imprecisa). Além de várias aventuras amorosas com as artistas européias que vinham se apresentar no Teatro de Santa Isabel, algumas, inclusive, ele hospedava em sua própria casa. Somando essas “puladas de cerca” de Delmiro com o desdém de sua espo- sa que não gostava muito de passear, contrariando o espírito bandoleiro do marido, temos como resultado o fim do casamento. Após a separação Delmiro passa a mo- rar no bairro da Boa Vista e é lá que co- nhece a ruivinha de 15 anos que virou sua cabeça. Carmela Eulina...mal sabia ele que a menina era filha do desembargador Si- gismundo Gonçalves. Filha bastarda... mas, filha. A diferença brusca de idade (Delmiro já estava na casa dos quarenta) não foi empecilho ao namorico dos dois. E esse namoro se sustentou durante mui- to tempo, pela troca de bilhetes amoro- sos entre o casal: O tempo dos bilhetes aqueceu muito a paixão dos dois, mas, obviamente, o relacionamento entre uma garota de 15 anos e um homem separado de 40, nunca seria aceito... Exceto pela mãe da menina, que via no rico e bem estru- turado Delmiro, tudo que havia sonhado para sua filha. Com a complacência da sogra, Delmiro rapta Eulina, isso em 1902. A penumbra daquela noite foi corta- da pelo vulto da garota que adentrou apressadamente a bela carruagem que a esperava na frente da casa. Os aman- tes fogem para uma residência impro- visada na usina Beltrão (onde hoje se situa a fábrica Tacaruna). Logo, a cidade inteira já estava comen- tando o fato e um intervenção policial vai atrás da moça menor de idade, Del- miro é processado por rapto e sedução e foge para Alagoas. Eulina é encontra- da e entregue aos cuidados de um tutor e Delmiro permanece incógnito até a anulação do processo. REFERÊNCIA ROCHA, Tadeu. Delmiro Gouveia: O pioneiro de Paulo Afonso. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 1970. Texto e Diagramação: Alynne Cavalcante http://construcaodesaberes. blogspot.com Carmela Eulina aos 16 anos Delmiro Gouveia em trajes finos “[...] beija aqui a onde eu ponho o meu nome que eu tenho feito o mesmo. Teu Delmiro”.

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Artigo sobre a vida pessoal.

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DELMIROGOUVEIA

Quem diria que um rapazote que ficou órfão aos 15 anos de ida-de e sozinho numa cidade es-

tranha, viria a se tornar um dos maiores empresários brasileiros do século XIX? Delmiro, brilhante empresário e nego-ciante visionário, carrega em seu nome grande obras executadas no Nordeste, a saber, nos estados de Pernambuco, Alagos e Bahia, como o famoso merca-do do derby (que poderia ser conside-rado um protótipo dos atuais shopping centers) e as várias empresas e indús-trias de fabricação e exportação de pe-les (“courinhos”, como era popularmen-te conhecido).Mas, além da fama de exímio empre-endedor, Delmiro também carregava o título de D. Juan, talvez herdado de seu pai, o chamado Belo de Farias que, no auge dos seus 34 anos, já casado, se apaixona perdidamente por uma moçoi-la de 14 aninhos, a qual é raptada por Belo. Desse ato resulta o nascimento de Delmiro Gouveia, mas não antes de sua irmã, Maria Augusta.Algum tempo depois do rapto, Belo se alista no exército para lutar na guerra do Paraguai, e, algumas elevações de patente depois, o capitão falece. Fica viúva a “curica de Belo de Farias”.Passados sete anos desde o episódio da fuga, a moça volta para suas terras de origem contanto 21 anos de idade e com duas crianças pequenas, órfãs de pai.A situação da curica piora quando dá-se conta de que só a esposa legítima do garanhão teve direito à herança e pen-são de Belo de Farias.Sem muitas opções, o pequeno Delmi-ro e família mudam-se para Goiana-PE, logo após, seguem para a capital.O problema é que mal o retirantes es-quenta lugar em Recife, a mãe, acome-tida por problemas cardíacos, morre, deixando o adolescente órfão e sozinho (Já que sua irmã já havia se casado e estava morando com seu esposo).Trágico... Mas Delmiro não fica muito tempo se lamentando. Com ajuda de um amigo da falecida mãe, o jovem Del-miro arranja um emprego de bilheteiro na maxambomba em Olinda (primeiro emprego que, mais tarde, Delmiro virá a se orgulhar).Algum tempo depois, agora maior de idade, Delmiro torna-se caixeiro despa-chante e foi nessa função que ele co-nheceu sua primeira esposa. É que de-

pois de um tempo trabalhando no porto do Recife, Delmiro adoece e vai se tra-tar na cidade de Pesqueira, onde co-nhece uma moça de 13 anos. A menina era bem apessoada e de boa família... O casamento aconteceu ali mesmo.De volta ao Recife com sua esposa, Delmiro nota que o negócio de despa-chante não estava mais tão lucrativo e, agora casado, a responsabilidade aumentava. É aí que o jovem entra no ramo de “courinhos”, onde teve enorme ascenção profissional. Foi nesse ramo que ele conseguiu um emprego no ar-mazém de couro de Hermann Lundgren & Cia. Daí em diante, o comerciante só tende a crescer. Passa a trabalhar em Keen Sutterly e co. Ltda com um ótimo salário que lhe deu condições de abrir o seu próprio armazém, iniciando sua brilhante carreira comercial. Em 1890, Delmiro vai para Nova York propondo-se ao emprego de gerente no Recife, pela metade da remuneração então paga. No ano seguinte, em socie-dade com Clemente Levy, Delmiro abre um negócio de courinhos e especiarias.A fama de D. Juan surge quando Delmi-ro e esposa, já ricos, se mudam para o galante bairro de Poço da Panela, onde Delmiro inicia um namoro com uma vi-zinha com quem, inclusive, chegou a ter uma filha (Essa informção permanece imprecisa). Além de várias aventuras amorosas com as artistas européias que vinham se apresentar no Teatro de Santa Isabel, algumas, inclusive, ele hospedava em sua própria casa.Somando essas “puladas de cerca” de Delmiro com o desdém de sua espo-sa que não gostava muito de passear, contrariando o espírito bandoleiro do marido, temos como resultado o fim do casamento.Após a separação Delmiro passa a mo-rar no bairro da Boa Vista e é lá que co-nhece a ruivinha de 15 anos que virou sua cabeça.Carmela Eulina...mal sabia ele que a menina era filha do desembargador Si-gismundo Gonçalves. Filha bastarda... mas, filha.A diferença brusca de idade (Delmiro já estava na casa dos quarenta) não foi empecilho ao namorico dos dois. E esse namoro se sustentou durante mui-

to tempo, pela troca de bilhetes amoro-sos entre o casal:

O tempo dos bilhetes aqueceu muito a paixão dos dois, mas, obviamente, o relacionamento entre uma garota de 15 anos e um homem separado de 40, nunca seria aceito... Exceto pela mãe da menina, que via no rico e bem estru-turado Delmiro, tudo que havia sonhado para sua filha.Com a complacência da sogra, Delmiro rapta Eulina, isso em 1902. A penumbra daquela noite foi corta-da pelo vulto da garota que adentrou apressadamente a bela carruagem que a esperava na frente da casa. Os aman-tes fogem para uma residência impro-visada na usina Beltrão (onde hoje se situa a fábrica Tacaruna).Logo, a cidade inteira já estava comen-tando o fato e um intervenção policial vai atrás da moça menor de idade, Del-miro é processado por rapto e sedução e foge para Alagoas. Eulina é encontra-da e entregue aos cuidados de um tutor e Delmiro permanece incógnito até a anulação do processo.

REFERÊNCIA

ROCHA, Tadeu. Delmiro Gouveia: O pioneiro de Paulo Afonso. Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 1970.

Texto e Diagramação:Alynne Cavalcante

http://construcaodesaberes.blogspot.com

Carmela Eulina aos 16 anos

Delmiro Gouveia em trajes finos

“[...] beija aqui a onde eu ponho o meu nome que eu tenho feito

o mesmo. Teu Delmiro”.