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BRUNO ZAVATARO DEMOCRACIA E PARTICIPAÇÃO NOS CONSELHOS COMUNITÁRIOS DE SEGURANÇA DE CURITIBA: UMA NOVA GESTÃO DA SEGURANÇA PÚBLICA? CURITIBA 2006

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BRUNO ZAVATARO

DEMOCRACIA E PARTICIPAÇÃO NOS CONSELHOS COMUNITÁRIOS DE

SEGURANÇA DE CURITIBA: UMA NOVA GESTÃO DA SEGURANÇA

PÚBLICA?

CURITIBA

2006

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BRUNO ZAVATARO

DEMOCRACIA E PARTICIPAÇÃO NOS CONSELHOS COMUNITÁRIOS DE

SEGURANÇA DE CURITIBA: UMA NOVA GESTÃO DA SEGURANÇA

PÚBLICA?

Monografia apresentada como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em Ciências Sociais, Universidade Federal do Paraná.

Orientador: Professor Doutor Renato Monseff Perissinotto

CURITIBA

2006

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À Carol, fonte de inspiração eterna e de amor incondicional.

Ao professor Renato M. Perrissinotto, pela orientação deste trabalho e por servir de exemplo de dedicação à ciência.

Ao amigo Marcelo Bordin, Soldado da Polícia Militar, pelas

contribuições intelectuais para a realização deste trabalho.

À Coordenadoria Estadual dos Conselhos Comunitários do Paraná, pelo apoio à realização desta pesquisa.

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SUMÁRIO

RESUMO.................................................................................................................. v ABSTRACT.............................................................................................................. vi INTRODUÇÃO........................................................................................................ 1 CAPÍTULO 1 – SEGURANÇA PARTICIPATIVA: EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS. ASPECTOS HISTÓRICOS E ATUAIS...........................

7

1.1 ASPECTOS HISTÓRICOS................................................................................. 7 1.2. A DÉCADA DE 90 E A EXPANSÃO DA PARTICIPAÇÃO EM SEGURANÇA PÚBLICA.........................................................................................

12

1.2.1. Chicago’s Alternative Policing Strategy......................................................... 12 1.2.2. Neighbourhood Policing: a experiência inglesa atual..................................... 15 1.2.3. A experiência francesa..................................................................................... 17 1.2.4. Alguns exemplos na América Latina............................................................... 20 CAPÍTULO 2 – SEGURANÇA PARTICIPATIVA: EXPERIÊNCIAS NACIONAIS. ASPECTOS JURÍDICOS DOS CONSELHOS COMUNITÁRIOS DE SEGURANÇA DO PARANÁ.........................................

23 CAPÍTULO 3 – A DINÂMICA POLÍTICA DOS CONSELHOS COMUNITÁRIOS DE SEGURANÇA DE CURITIBA: RECURSOS INDIVIDUAIS E SUBJETIVOS, RECURSOS ORGANIZACIONAIS E O PROCESSO DECISÓRIO......................................................................................

32 3.1. RECURSOS INDIVIDUAIS......................................................................................... 34 3.2. RECURSOS SUBJETIVOS.......................................................................................... 38 3.3. RECURSOS ORGANIZACIONAIS DOS CONSEGS................................................ 46 3.4. O PROCESSO DECISÓRIO NO INTERIOR DOS CONSEGS.................................. 49 CONCLUSÕES........................................................................................................ 55 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................... 59

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v

RESUMO

Os problemas da violência e da criminalidade em geral, bem como das formas de condução das políticas de segurança pública, tornaram-se nos últimos anos da maior relevância política. Verifica-se, neste contexto, o aumento das taxas gerais de criminalidade, ao mesmo tempo em que se dá o recrudescimento da violência policial. Em alguns países, sobretudo a partir de crises sociais e institucionais, as últimas décadas têm presenciado a implementação de programas de reforma das polícias, com a criação do policiamento comunitário e com o incentivo ao surgimento de espaços de participação da sociedade civil nos assuntos relativos à segurança pública, fazendo com que a cooperação conjunta seja a resposta mais eficaz para o problema da criminalidade, tendo, além disso, o importante benefício de servir para o controle externo e para a accountability das instituições policiais. No Brasil, o período de redemocratização brasileira vai coincidir com a emergência de novos movimentos sociais e com demandas de uma participação política mais ampliada, dentre os quais se destaca a criação de Conselhos Comunitários de Segurança. Embora seu surgimento tenha se dado já na década de 80, somente na década de 90 é que eles vão receber incentivos por parte do Estado, culminando com a publicação, no Estado do Paraná, do Decreto 2332/03, que vem regulamentar os Consegs. Com efeito, o presente trabalho monográfico tem por objetivo apresentar os resultados de uma pesquisa levada a efeito no âmbito dos Conselhos Comunitários de Segurança de Curitiba dos bairros do Guabirotuba, Tarumã e Boqueirão. Para tanto, a partir de questionários aplicados aos conselheiros, da análise de documentos mantidos junto à Coordenadoria Estadual dos Conselhos Comunitários de Segurança da SESP, da observação participante e da análise das reuniões dos Consegs, objetivamos pesquisar a dinâmica política interna dos Consegs, tendo por fio condutor saber o que se discute e qual papel estes espaços públicos de participação política desempenham nas políticas de segurança pública do Estado do Paraná.

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vi

ABSTRACT

Violence and criminality in general, as well as the ways of conducting public safety policies have become, in the past few years, problems of great political relevance. In this context, a raise in the general rates of criminality is being observed, whereas police violence increases. In some countries, especially because of social and institutional crises, the last decades have witnessed the implementation of police reform programmes, such as the advent of community policing and the incentive to the development of spaces of civil society participation regarding matters concerning public safety, which reveals that joint cooperation is the most effective response to the criminality problem. As a benefit, it favours the external control and the accountability of police institutions. In Brazil, the period of redemocratization coincided with the development of new social movements and with demands of further political participation, which led to the creation of Security Community Councils (SCC). Even though they had already appeared in the 80´s, only in the 90´s did they get any incentive from the State, culminating with the publication, in the State of Paraná, of the Decree 2332/03, which regulates the SCC. In fact, the goal of the present monographic work is to reveal the results of a research conducted in the Curitiba´s SCC of the Guabirotuba, Tarumã and Boqueirão neighbourhoods. For this purpose, through the analysis of questionnaires applied to the counsellors and of documents kept in the State Coordination of the Community Councils of the State Secretary of Public Safety, the participating observation and the analysis of the SCC´s meetings, the aim was to research the internal political dynamics of the SCC, in order to discover what is discussed and which is the role that those public spaces of political participation play in the public safety policies in the State of Paraná.

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INTRODUÇÃO

O período de redemocratização brasileira vai coincidir com a emergência de

novos movimentos sociais. Ao mesmo tempo, vai representar o aumento de demandas

por uma participação política mais ampliada, inclusive no que concerne às políticas de

segurança pública no Brasil. Neste aspecto, no início da década de 80 surgem espaços

locais de discussão em torno dos problemas de segurança pública que afetam a

comunidade, hoje conhecidos como Conselhos Comunitários de Segurança (Conseg).

Trata-se de um novo paradigma de segurança pública, entendido como uma tendência

de se romper com a centralização político-administrativa e operacional que imperou ao

longo de todo o século XX.

Ao mesmo tempo, estes novos espaços que emergiram a partir do início do

período democrático no Brasil vão representar a revalorização do local enquanto

espaço portador de interesses gerais, o que a doutrina mais atualizada vai denominar

como a constituição moderna da concepção de “interesse geral local”, não mais

entendido como monopólio do Estado (RANGEON, 2005). Neste aspecto, a

Constituição Federal de 1988 vai, além de conferir aos municípios a autonomia

político-administrativa, assinalar em seu caput que a segurança pública é “dever do

Estado, direito e responsabilidade de todos”, denotando o novo espírito norteador do

sistema de segurança pública, depondo o Estado de sua posição anterior de único

garantidor da tranqüilidade pública.

Apresentou-se, entretanto, o desafio de coadunar instituições policiais

historicamente autoritárias com estas novas demandas por participação política.

Questiona-se a capacidade de estas instâncias participativas se erigirem como

verdadeiros atores sociais em prol do desenvolvimento da democracia e da co-gestão

das políticas de segurança pública no Brasil.

Quando se analisam as instituições policiais, verifica-se que ainda

prepondera uma cultura organizacional autoritária, tanto no que tange ao autoritarismo

interno e hierárquico, quanto no que tange ao autoritarismo institucional vis-à-vis a

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sociedade civil. Assim, a implementação da abertura organizacional para a

participação da sociedade civil tem a significativa vantagem de aumentar o grau de

legitimidade e de eficácia das instituições policiais, podendo melhorar a qualidade do

serviço por elas prestado, sobretudo porque a cidadania ativa produz e reforça a

accountability e os instrumentos de controle social das instituições públicas. Este

aspecto se torna ainda mais importante em face de instituições policiais historicamente

marcadas por um flagrante e freqüente desrespeito aos direitos humanos,

principalmente diante de grupos socialmente vitimizados.

Por esta razão, os Conselhos Comunitários podem se constituir –

principalmente diante da maior proximidade com a polícia – em poderosos

instrumentos de controle informal da atividade policial, noticiando abusos cometidos

por policiais e procurando os canais apropriados para a formulação de denúncias

contra maus policiais. Do mesmo modo, sob o olhar vigilante da comunidade ativa e

implicada nos negócios públicos, a qualidade do serviço prestado poderá estar

constantemente sob controle e fiscalização.

O período atual convive com uma forte descrença em relação às instituições

públicas e policiais, e o incentivo à participação comunitária tem o importante condão

de melhorar a percepção e o grau de confiança que as pessoas têm nos aparelhos

policiais. A presença da polícia, inserida no tecido social e nos problemas cotidianos

que afetam uma comunidade, é um elemento que pode aumentar o grau de confiança

nas forças de ordem e melhorar a percepção que as pessoas têm destas instituições, ao

mesmo tempo em que pode aumentar a sensação subjetiva de segurança, mesmo que

isso não se reflita nos níveis reais de segurança objetiva.

Este trabalho se inscreve, portanto, na lógica dos autores defensores da

participação política democrática (participacionistas), tendo em vista que a

democracia, no sentido que queremos empregar, não se resume apenas e tão-somente

ao aspecto formal e procedimental – focado no processo eleitoral e na escolha de

líderes políticos –, mas implica o incentivo à participação ativa das pessoas nos

negócios públicos e no poder de decidir e influir nas questões que lhes dizem respeito,

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não sendo, neste caso, de atribuição exclusiva de agentes técnicos, como entendiam

certos autores (elitismo)1.

Todas essas qualidades da organização comunal, pautadas pela igualdade e

pela participação, já estavam inscritas nas obras de Tocqueville (1864). Muito embora

este autor tenha dado uma forte ênfase à gênese de uma nação e ao seu

desenvolvimento posterior a partir dos traços culturais, religiosos e sociais de seu

povo, vai também demonstrar o benefício que o processo de participação gera em si,

pois tem o importante papel de socializar os indivíduos dentro do espírito

participativo. Assim, tanto o indivíduo tem o poder de exercer forte influência sobre as

instituições, como estas também acabam por exercer o papel de agências

socializadoras dos indivíduos. As instituições, neste sentido, receberam por parte de

Tocqueville as mesmas qualidades educativas que os costumes. Como liberal, a grande

preocupação deste autor dizia respeito à necessidade de se assegurar a liberdade face

ao Estado.

Um aspecto de suma importância nesta linha de análise e sobre o qual

teremos a oportunidade de discorrer melhor no Capítulo 3 deste trabalho, refere-se à

capacidade de aumentar nos indivíduos seu senso de eficácia e competência política

pessoal diante da possibilidade de espaços efetivos de participação política. Percebe-

se, com efeito, que a própria participação pode gerar a auto-percepção dos indivíduos

quanto à sua capacidade de influir nas decisões públicas, alterando com isso suas

próprias atitudes e seus comportamentos, bem como das instituições políticas. Muito

embora a aprendizagem política adquirida na infância e na escola sejam instâncias por

excelência de aprendizagem política democrática, este entendimento parte do ponto de

vista de que mesmo na fase adulta os indivíduos estão constantemente sofrendo

processos de socialização, sobretudo pelas instituições e pelo ambiente do trabalho

(ALMOND e VERBA, 1965; FUKS, PERISSIONTTO e SOUZA, 2004; PATEMAN,

1992).

1 Cf. Schumpeter (1961) e Dahl (1997).

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Este estudo se funda, portanto, em pesquisas conduzidas em três Conselhos

Comunitários de Curitiba com o intuito de analisar a dinâmica política destes espaços

de participação da comunidade local nos assuntos que tocam a segurança pública2.

Com efeito, estes novos espaços representam uma ruptura, tendo em vista que

traduzem uma nova concepção da gestão da segurança pública, e trazem consigo a

promessa de uma verdadeira transformação nas atitudes e práticas das instituições

policiais. Necessário, então, analisar no plano empírico o quão efetivas estas instâncias

se apresentam e a sua importância atual na agenda pública. Para este fim, foram

estudados os Conselhos Comunitários dos bairros do Tarumã, Guabirotuba e

Boqueirão.

No Estado do Paraná, os Consegs foram objeto de regulamentação por parte

do atual governo de Roberto Requião, a qual previu o mandato de dois anos para cada

gestão dos Conselhos. Para esta pesquisa, objetivava-se a priori analisar quatro

conselhos que estavam concluindo suas gestões, de modo que fosse possível estudar,

além dos recursos subjetivos dos conselheiros e os recursos organizacionais dos

Conselhos, o próprio processo decisório e a sua dinâmica durante o curso destes dois

anos. Com efeito, a leitura das atas de reunião das gestões que se findavam se fazia

imprescindível.

Entretanto, problemas apareceram quando da busca de Conselhos com carta

constitutiva de dois anos e que estavam concluindo suas gestões. Primeiramente, entre

aqueles Conselhos com gestões de dois anos, a pesquisa esbarrou no problema da

formação das suas diretorias que, muitas vezes, contavam com a presença e

participação exclusiva do presidente, sem que os outros membros efetivamente

participassem3. Em segundo lugar, tivemos que desconsiderar na pesquisa os

2 Existem atualmente no Estado do Paraná 114 Conselhos Comunitários regulamentados e 40 Conselhos ainda não regulamentados ou em processo de regulamentação.

3 Foi o caso, por exemplo, do Conselho Comunitário do bairro do Jardim das Américas, que não estava com sua diretoria completa, impossibilitando assim a aplicação do questionário e a observação participante das reuniões.

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Conselhos que não tinham por hábito a confecção das atas das reuniões ou que nem

realizavam reuniões com freqüência, como previsto no Decreto Regulamentador do

Estado do Paraná4. Ademais, tivemos que descartar da presente pesquisa os Conselhos

Comunitários que não estavam com sua situação regularizada perante a Secretaria de

Estado da Segurança Pública nos moldes do já referido Decreto Regulamentador e

sobre o qual falaremos adiante. Esta medida se fez necessária porque pretendíamos

analisar na pesquisa a percepção dos atores quanto à medida regulamentadora, embora

devamos salientar que isso nada representa com relação à atuação comunitária destes

Conselhos. Resta a frisar, por fim, que alguns Conselhos se mostraram demasiado

hostis e simplesmente não permitiram a realização da pesquisa.

Desse modo, perante os obstáculos encontrados, analisou-se: a) Conselho

Comunitário do Bairro do Boqueirão: Carta Constitutiva de 19 de dezembro de 2005;

b) Conselho Comunitário do Bairro do Guabirotuba: Carta constitutiva de 22 de junho

de 2004; c) Conselho Comunitário do Bairro do Tarumã: Carta Constitutiva de 10 de

novembro de 2004.

Levando-se em conta a limitação espacial desta pesquisa, não podíamos nos

estender num universo maior de Conselhos, embora pretendamos realizar um estudo

mais amplo num trabalho posterior em nível de pós-graduação stricto sensu. Nossa

ambição, ao contrário foi modesta, mas nem por isso destituída de desafios. Como não

se trata nesta pesquisa de um universo maior, os resultados obtidos não refletem a

realidade em seu todo, de modo que não podemos generalizar as conclusões a que

chegamos como representativas do universo em questão.

Neste sentido, no Capítulo 1 serão analisadas as experiências internacionais

de participação comunitária nos assuntos concernentes à segurança pública, hoje uma

realidade presente em vários países e percebida como fruto do aumento da

4 É o caso, por exemplo, do Conselho do bairro do Batel. Contudo, referências deste Conselho serão dadas, tendo em vista ser ele representativo do peso do poder econômico na condução de políticas de segurança pública, como veremos mais adiante.

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criminalidade em geral e da busca de legitimidade das instituições democráticas.

Pretende-se, com isso, demonstrar alguns modelos implementados em outros países, os

avanços em uns e os desafios em outros. Não há no Brasil bibliografias e estudos

históricos dessas experiências, de modo que o conhecimento da realidade exterior

poderá servir muitas vezes como parâmetro e compreensão do fenômeno em questão.

O Capítulo 2 será dedicado aos aspectos históricos e jurídicos dos

Conselhos Comunitários no Brasil e no Estado do Paraná. Com efeito, a análise da

legislação atual que regula os Conselhos Comunitários de Segurança se mostra de

extrema importância, tendo em vista que permite traçar seus contornos, seus limites e

suas formas de atuação e formação.

Por fim, o Capítulo 3 vai apresentar os resultados da pesquisa realizada junto

aos Conselhos Comunitários dos bairros do Boqueirão, Tarumã, e Guabirotuba. Neste

sentido, objetivou-se analisar, não apenas os recursos individuais e subjetivos dos

Conselheiros (cultura política, preferências partidárias, capital social, econômico e

cultural) e os recursos organizacionais dos Conselhos (formas de participação, busca

de apoios materiais e políticos e infra-estrutura organizacional), como também o

processo decisório e sua dinâmica (formas de atuação, posição de cada autor no

processo, peso político dos atores, existência de debates e contestação, assuntos

deliberados etc.).

Esperamos, assim, que este trabalho venha a contribuir para a dinâmica do

processo político e que não se restrinja tão-somente à leitura acadêmica, mas que seja

lido como uma tentativa de avaliação, embora parcial, dos resultados até agora

alcançados na mudança da política de segurança pública do Estado do Paraná.

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CAPÍTULO 1 – SEGURANÇA PARTICIPATIVA: EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS. ASPECTOS HISTÓRICOS E ATUAIS

1.1. ASPECTOS HISTÓRICOS

Não há, no âmbito das atuais políticas de reforma da segurança pública, um

modelo único de implementação, e as propostas variam enormemente de um a outro

país ou mesmo dentro de regiões de um mesmo país. Isso depende, em grande medida,

de outras variáveis, tendo como as mais importantes: o grau de sedimentação da

sociedade civil em associações, movimentos locais, regionais e/ou nacionais; e os

aspectos culturais, tanto em relação à sociedade civil, quanto em relação ao Estado,

tais como o nível de cultura cívica historicamente construída, entre outros fatores. Em

outras palavras: dependerá em muito dos contextos institucional e político específicos

de cada país.

Desse modo, a cultura cívica adquire neste estudo um aspecto central de

análise, pois parte do pressuposto de que os atores da sociedade civil implicados nas

políticas de segurança pública devem se perceber como capazes de atuar e de influir

nas decisões públicas e nas questões que lhes tocam diretamente (GUERRERO, 2006),

propondo assim soluções, cobrando resultados e servindo como instrumentos de

controle e de melhoria das atividades policiais (accountability e police oversight).

Este tópico se dedica, assim, a fazer um breve inventário das experiências

internacionais da participação popular nos assuntos relativos à segurança pública,

desde as suas origens até as experiências que se mostram bem sucedidas neste âmbito.

Pode-se afirmar que as tentativas de implementação de espaços como estes podem ser

encontradas atualmente em quase todos os países ocidentais, mas optamos por

desconsiderar grande parte deles nesta análise, pois do contrário estaríamos fugindo do

objeto que nos propusemos a abordar. Entretanto, todas essas experiências nascem

dentro do espírito de cooperação conjunta e da percepção de que a polícia, sozinha, é

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incapaz de resolver os problemas do crime e da segurança (SPARROW, MOORE e

KENNEDY, 1990, pp. 172-173).

Embora seja difícil dissociar polícia e comunidade, sobretudo antes do

período de tecnização da função policial e do recurso aos meios de transporte

automotivos no policiamento urbano, pode-se datar o surgimento de espaços de

participação política em segurança pública na década de 1970 em Los Angeles/EUA,

com o início de encontros comunitários entre polícia e comunidade, principalmente a

partir dos conflitos raciais que marcaram os Estados Unidos da América em fins da

década de 60 e início da década de 70.

Além disso, surgem a partir da compreensão de que os avanços tecnológicos,

as táticas tradicionais de enfrentamento da criminalidade e o modelo burocrático não

apresentavam resultados satisfatórios e levavam ao maior distanciamento da

comunidade e dos cidadãos frente à própria polícia, muitas vezes agravando ainda

mais o problema da violência. Como destaca Neild (1999, p. 5).

O policiamento comunitário emergiu nos anos 1970 e 1980 na medida em que a polícia reconheceu que as suas táticas não apenas estavam fracassando na abordagem do crime como também estavam, em alguns casos, aumentando os níveis de medo e contribuindo para distúrbios civis (motins no final dos anos 1960 em cidades por todos os Estados Unidos e em Los Angeles em 1992 após o julgamento de Rodney King foram deflagrados por abuso policial). (Police Foundation 1993).

Com isso, a década de 70 vai representar o início de uma nova abordagem na

maneira de se pensar a segurança pública. Este período vai significar também a

emergência de movimentos sociais de contestação, principalmente de movimentos

reivindicatórios de grupos minoritários, tais como afro-descendentes, latinos e

mulheres. Com efeito, as instituições policiais se viam diante de uma profunda crise de

legitimidade, marcadas que estavam (e ainda estão) por práticas autoritárias frente a

grupos minoritários. Ao mesmo tempo, a crise de legitimidade dos aparelhos policiais

vem acompanhada pari passu com o aumento dos índices gerais de criminalidade,

fazendo com que a própria polícia percebesse que agindo só muito pouco seria objeto

de transformação na maneira de se conduzir a política de segurança pública.

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Mas a forma com se deu a abertura e o programa implementado na sua

origem fazia com que muitas vezes a comunidade local fizesse as vezes da polícia,

instituindo a vigilância comunitária e o policiamento de um vizinho sobre outro para

fazer frente ao aumento da criminalidade na década de 70 (Neighborhood Watch)5. Tal

resposta comunitária ao problema da criminalidade chega, assim, a ser aprovada em

1972 pela National Sheriffs Association, percebida como um bom método de

prevenção à criminalidade (BENNETT, 1990).

Em termos teóricos, esta nova concepção pode ser considerada importante

para a mudança tanto da sociedade civil quanto do Estado na forma de condução da

segurança pública. Em termos práticos, entretanto, não se tratou de uma reestruturação

das polícias na gestão da segurança pública, haja vista que o projeto em si tinha por

objetivo a colaboração da comunidade local sob um ponto de vista mais pró-ativo e

preventivo, sem que a polícia em si alterasse sua forma de atuação.

Tratou-se, com efeito, de um programa eminentemente da classe média

(middle-class Americans) e, como tal, incapaz de conduzir a grandes transformações

nas estruturas policiais vis-à-vis os grupos vitimizados.

Atualmente, sobretudo com a criação do National Crime Prevention Council

(NCPC) – organização sem fins lucrativos –, grande incentivo é dado à criação de

neighborhood watches. Entre os principais objetivos6:

• Vigiar e noticiar pessoas suspeitas, veículos, atividades e barulhos

suspeitos;

• Noticiar crimes e atividades criminosas;

• Praticar e promover várias medidas de prevenção ao crime e à

segurança do lar;

• Organizar e coordenar esforços de cidadãos preocupados e

5 Existem hoje mais de 20.000 grupos organizados nestes moldes.

6 Cf. www.ncpc.org.

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comprometidos com a redução do crime em suas vizinhanças;

• Cooperar com o Departamento de Polícia Local;

• Organizar atividades de solução de problemas e eventos sociais;

• Ofertar treinamento em primeiros socorros, desastres e programas de

prevenção;

• Prestar serviços de voluntariado à polícia local, entre outros.

Embora restrito à classe média americana e sem trazer grandes

transformações na atuação dos aparelhos policiais e na sua autonomia operacional, não

deixa de re-significar a posição da sociedade civil na segurança pública, passando de

uma posição passiva para uma mais pró-ativa (mesmo que seja self-defender).

Na Inglaterra, por sua vez, a reorientação do trabalho policial teve como

marco histórico os piores tumultos e motins anti-polícia que Londres jamais havia

visto, ocorridos no ano de 1981 em Brixton, também conhecidos como Swamp ´81.

Brixton era um dos bairros mais pobres, com maiores índices de desemprego, marcado

pela heterogeneidade racial e étnica, problemas com drogas e um relacionamento

distante entre polícia e comunidade. Nesta área, a presença do Grupo de Patrulhamento

Especial (Special Patrol Group – SPG) marcava-se por uma forma de atuação

claramente autoritária e em contraste com a imagem popular que a Polícia

Metropolitana de Londres ou Scotland Yard e seus policiais tinham. Neste sentido,

substituiu-se o policiamento a pé pelo motorizado, bem como se adotou a forma de

esquadrões especializados, com ênfase no atendimento de chamadas via rádio,

seguindo o modelo de profissionalização das polícias americanas (SPARROW,

MOORE e KENNEDY, op. cit., pp. 82-83).

Foi neste contexto que Kenneth Newman assumiu como Comissário da

Polícia Metropolitana (London Met). Newman decidiu que a polícia londrina precisaria

de uma reorientação fundamental, abrindo-se para a comunidade e fazendo com que o

público se mobilizasse para os assuntos públicos. Com isso, esperava que houvesse

uma profunda mudança de prioridade das operações de patrulha. Com efeito, Newman

estava convencido de que a polícia sozinha não poderia fazer muito (Op. cit., p. 85).

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Embora, de um lado, a solução encontrada tenha sido a criação de

neighbourhood watches, do ponto de vista da polícia uma nova mudança gerencial foi

objeto de implementação. Neste sentido, a polícia deveria estar mais sensível às

aspirações da comunidade e mais responsiva às suas ações.

Logo após os tumultos de Brixton, o Parlamento decretou que a Polícia

Metropolitana organizasse Comitês Consultivos de Vizinhança (Neighbourhood

‘Consultative Committees’), com o fim de promover “envolvimento comunitário no

planejamento e operações da polícia”. Com isso, a polícia deveria estabelecer planos

anuais em cooperação com estes comitês, além de encontros regulares para discutir as

atividades da polícia (Op. cit., p. 86).

Do mesmo modo, surveys foram aplicados na comunidade visando a levantar

quais os problemas que mais lhe afetavam e quais eram suas maiores preocupações em

relação à segurança pública, e formas de avaliação da atividade policial foram

impostas. Por fim, medidas visando a aumentar o poder das divisões e sua autonomia

foram decretadas: “máximo controle prático sobre os recursos necessários para

coordenar o policiamento dentro destes limites e disponibilização de um serviço

compreensivo responsivo às necessidades da comunidade” (Op. cit., p. 87).

Como podemos perceber, experiências como estas foram implementadas a

partir de crises institucionais e sociais, resultando na percepção de que a polícia

sozinha seria incapaz de conduzir e manter níveis “normais” de violência.

Como analisam os autores acima, a adoção de programas voltados para a

comunidade não se fez sem problemas, tanto que em algumas divisões a re-orientação

foi abandonada, por falta de recursos e de pessoal, em prol do atendimento a chamadas

e ocorrências – “response-oriented style” (Op. cit., p. 89). Entretanto, isso não

compromete o nível de análise no que tange à reorientação das políticas de segurança

pública a partir destas primeiras experiências.

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1.2. A DÉCADA DE 90 E A EXPANSÃO DA PARTICIPAÇÃO EM SEGURANÇA

PÚBLICA

A década anterior presenciou a proliferação de espaços de participação em

políticas de segurança pública e a tentativa de reformas das instituições policiais. De

um lado, os países da Europa Ocidental e América do Norte iniciaram, a partir deste

período, programas mais amplos de policiamento comunitário e, de outro lado, os

países da América Latina, Europa do Leste e África saíam de regimes autoritários e

colonizados e iniciavam o processo de transição política democrática, o que se fez num

ambiente já marcado por crises econômicas e por profundas desigualdades sociais.

Este tópico dedicar-se-á a analisar alguns programas de participação popular

nas políticas de segurança pública, enfocando a forma como se deu e ainda se dá em

algumas cidades e países a interação e relação entre polícia e comunidade.

1.2.1. Chicago’s Alternative Policing Strategy7

Tendo em vista existir quase 17.000 serviços de polícia independentes nos

EUA, cada qual dotado de autonomia organizacional, torna-se impossível abordar as

estratégias utilizadas como se fossem homogêneas e como se representassem as

políticas de segurança e policiamento norte-americanas (SKOGAN 2004a, p. 41).

Por esta razão, não nos resta neste momento outra solução senão analisar os

programas mais importantes adotados neste país e em outros, tanto no que tange à

extensão do programa em si quanto no que tange às mudanças introduzidas nas

instituições policiais e na segurança pública. Dedicar-nos-emos neste momento ao

programa instituído na cidade de Chicago no ano de 19938.

7 Em 1991, policiais de Los Angeles são filmados agredindo brutalmente um afro-descendente. Conhecido como o incidente Rodney King, as imagens vão ao ar, causando grande repercussão e deteriorando ainda mais a imagem da polícia.

8 Tendo em vista a limitação espacial deste trabalho, não é possível neste momento analisar outros programas norte-americanos de policiamento comunitário e de participação popular. A título de

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13

O programa Chicago’s Alternative Policing Strategy, também conhecido

por CAPS, foi inaugurado em 1993 na cidade de Chicago/EUA. Inicialmente criado

em cinco distritos testes da cidade, o programa foi se expandindo, chegando

atualmente a englobar toda a cidade. Como ressalta Skogan (2004b) o projeto

implantado em Chicago não foi apenas e tão-somente um programa do departamento

de polícia, mas ao contrário, um programa da cidade como um todo (city’s program),

haja vista se tratar de uma parceria entre as várias agências da municipalidade, com a

participação de amplos setores da sociedade, não restrita assim ao seu aspecto policial.

Conjuntamente à implementação do programa, uma grande campanha

publicitária do programa em curso foi levada a cabo ao longo dos anos 90, visando a

chamar a atenção dos cidadãos para a participação nas reuniões e o engajamento

popular nas políticas de segurança pública. Desse modo, entre os anos de 1998 e 1999,

o orçamento destinado à propaganda se elevava a mais de 1,6 milhões de dólares e

englobava campanhas no rádio, na televisão (incluindo a televisão a cabo e canais de

esporte, sendo a televisão o meio que apresentou melhores resultados), na internet, em

folhetos explicativos distribuídos em locais públicos da comunidade, tanto em língua

inglesa quanto em língua espanhola, em eventos públicos destinados a fazer a

publicidade do programa e em objetos publicitários como canetas, adesivos, camisetas

etc.9 (SKOGAN, 2004a, pp. 53-54). Desse modo, o programa de polícia comunitária

da cidade de Chicago pôde ser difundido, a tal ponto que, numa sondagem realizada

em 2003, 80% da população já havia ouvido falar do programa em questão, 89% entre

a população afro-americana. (SKOGAN, 2004b, p. 3). Neste sentido, a participação de

organizações da sociedade civil como clubes, igrejas e escolas, exerce um papel

informação, outros programas igualmente relevantes estão em curso atualmente, em especial: Indianapolis Violence Reduction Partnership (IVRP), Boston Ceasefire Program etc (DUFFEE, RENAUER et. alli, 2006).

9 Veremos mais adiante que no âmbito dos Conselhos Comunitários de Segurança de Curitiba o grande desafio diz respeito ao engajamento da comunidade local nas reuniões. Contudo, poucos são os canais de informação e de publicidade desses encontros e muitas vezes os Conselhos se vêem diante da falta recursos para tal finalidade.

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14

fundamental no sentido de divulgar reuniões e ações do CAPS.

Dois elementos-chave estão circunscritos no êxito do CAPS em Chicago: de

um lado, os encontros comunitários (Beat Meetings)10 e, de outro, o Comitês Distritais

de Aconselhamento (District Advisory Committees). A partir do ano de 2000, o CAPS

instituiu um novo processo de planejamento e gerenciamento, com a utilização do

programa Compstat, utilizado em Nova Iorque, e que tem por objetivo mapear a

criminalidade na cidade, possibilitar o gerenciamento adequado das ações policiais e

planejar ações futuras, além de avaliar o que se tem feito em termos de políticas de

segurança pública (Idem., p. 01).

Com efeito, a mudança pode ser vista no aspecto mais importante do

programa, que trata da gestão conjunta dos esforços de melhoria da segurança pública

nos âmbitos locais, através da participação da comunidade nos projetos de solução de

problemas, na identificação de prioridades e nos planos de ação.

Os planejadores do CAPS tinham uma visão clara de como as reuniões comunitárias deveriam ser conduzidas e o que deveria acontecer nelas. As reuniões deveriam facilitar a interação e ajudar a construir a confiança entre os residentes da vizinhança e os policiais que trabalhavam na região. Elas deveriam propiciar um fórum para compartilhar informações, identificar problemas e criar planos de ação. Tanto a polícia quanto os cidadãos deveriam se responsabilizar por projetos de solução de problemas, e as reuniões se prestavam a proporcionar um ponto de encontro para que todos periodicamente revissem os esforços e avaliassem o quão bons eles estavam. (Idem., p. 17).

Por fim, verifica-se, desde o advento do programa, o declínio das taxas

gerais de criminalidade: redução em 49% dos crimes violentos e de 36 % dos crimes

contra a propriedade (Idem, p. 52). Não vem ao caso nos estendermos em outros

10 Em 2002, como mostra Skogan (2004b, p. 7), mais de 67.300 pessoas freqüentaram um total de 2.916 reuniões. Ponto interessante no que tange à participação e que não deve ser desprezado da análise, diz respeito às camadas sociais que mais freqüentaram as reuniões ao longo dos anos de implementação do programa em Chicago. Neste aspecto, foram regiões com maiores níveis de pobreza, menores níveis de educação e locais marcados por uma população predominantemente afro-americana e por altos níveis de desemprego (Op. cit., p. 10), ou seja, grupos socialmente vitimizados e contra os quais a polícia geralmente comete abusos e violências. Entretanto, o mesmo não pode ser dito relativamente aos grupos latinos, sejam aqueles de língua inglesa (13%) sejam aqueles de língua espanhola (9%), que não apresentaram freqüente participação nos encontros e, relativamente à idade, é maior a participação entre os mais velhos (Op.cit., p. 15).

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15

aspectos do programa em tela, mas tão-somente delinear a forma como se deu, os

desafios da participação de amplos setores sociais, inclusive de grupos vitimizados e

os resultados alcançados ao longo do tempo11.

1.2.2. Neighbourhood Policing: a experiência inglesa atual

Como vimos acima, os conflitos que marcaram a Inglaterra no início dos

anos 80 levaram ao repensar da atividade policial e das formas de relacionamento e

interação entre polícia e comunidade, com o fim de tornar aquela mais efetiva e

responsiva. Entretanto, experiências como estas se viam localizadas neste ou naquele

departamento e, geralmente, fruto da inspiração, concepção e esforços de alguns

oficiais superiores.

Em 2003 o Ministério do Interior (Home Office) inicia o programa

Neighbourhood Policing em algumas áreas piloto da Inglaterra e País de Gales, tendo

por meta alcançar todas as comunidades até o ano de 200812. O objetivo expresso do

programa é fazer com que a polícia tenha maior visibilidade e seja acessível às

demandas do público. Em outras palavras: visa, acima de tudo, a realizar uma

mudança cultural e organizacional no que concerne à relação entre polícia e

comunidade (HOME OFFICE, 2005).

Entre as principais medidas do programa britânico, encontram-se:

a) Parceria entre governo, polícia e sociedade civil;

b) Aumento do efetivo policial na linha de frente e dos recursos, com a

contratação de policiais de ambos os sexos, de várias etnias e faixas etárias;

c) Aumento do efetivo e dos poderes dos policiais de apoio à comunidade –

11 Remetemos o leitor para a leitura do relatório em questão face à limitação deste trabalho. Ver também SKOGAN e HARTNETT (1997).

12 Durante o ano de 2003, visando a levantar os anseios da população quanto à reforma da polícia, pesquisas de opinião foram levadas a efeito, demonstrando, assim, que o maior desejo dizia respeito a um policiamento mais visível, acessível e responsivo (HOME OFFICE, 2005, p. 03).

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16

PCSOs (police community support officers);

d) Criação de voluntários que trabalhariam como policiais especiais (special

constables);

e) Criação de vigias da vizinhança (neighbourhood wardens), empregados

pelas autoridades locais, associações de moradores e grupos comunitários;

f) Ampla divulgação dos meios de contato com a polícia, seja por telefone

seja por meios eletrônicos;

g) Possibilitar às pessoas identificar prioridades e buscar soluções para

problemas específicos da sua comunidade;

h) Criação de um número nacional de três dígitos para ocorrências de

natureza não emergencial;

i) Melhoria da qualidade tecnológica da polícia;

j) Criação de um fundo de policiamento comunitário (Neighbourhood

Policing Fund)13;

l) Criação de uma Agência Nacional de Melhoria da Polícia (National

Policing Improvement Agency).

Como se pode perceber pelas medidas acima enunciadas, vigora em muito a

forma de vigilância comunitária já analisada acima e que dá pouca atenção aos

aspectos gerenciais e participativos das políticas de segurança pública (Neighbourhood

Watch). Neste caso, é visível que o programa britânico enfatiza mais o papel do

cidadão enquanto agente ativo do policiamento, através de amplo incentivo ao

voluntariado, ao invés uma participação mais deliberativa em torno das políticas

adotadas14.

13 O governo britânico está investindo, em 2006, 220 milhões de libras para o policiamento comunitário e a previsão para o ano de 2007 é de 385 milhões de libras (HOME OFFICE, 2006).

14 Exemplo disso é a previsão do pagamento, pelo comércio local, por serviços especiais prestados pela polícia, tal como patrulhas em centros comerciais. Assim: “Business Improvement

Districts provide a means for businesses in a local area to decide together what they want and how to

pay for it” (HOME OFFICE, idem., p. 10).

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17

Não vem ao caso neste trabalho apresentar os resultados até então obtidos

pela implantação do programa Neighbourhood Policing na Grã-Bretanha. Resta a

sublinhar que, conforme relatório recente, já se apresenta redução nos números gerais

de criminalidade, além de aumento da sensação de segurança por parte da população e

de confiança na polícia (HOME OFFICE, 2006).

1.2.3. A experiência francesa15

A França, como outros países da Europa, experimentou a partir da segunda

metade do século XX um forte crescimento da criminalidade em geral. O Estado e as

forças de ordem passam a ser vistos como incapazes de garantir a segurança, sobretudo

com os problemas dos subúrbios franceses (les banlieues), tidos por “zonas de não

direito”. Com efeito, a partir dos anos 70, a insegurança se torna, mais do que nunca,

um problema político, principalmente pelo discurso da direita (Roché, 1999, 288-390).

Até os anos 80, como demonstra Roché, a esquerda ainda relutava em aceitar

a insegurança como um problema político, sob o pretexto de que se referia a um

discurso ideológico e eleitoreiro. Neste sentido, os prefeitos socialistas das grandes

cidades foram os atores que fizeram com que a esquerda saísse de seu silêncio.

Em 1997 tem lugar o colóquio de Villepinte (Des villes sûres pour des

citoyens libres), momento em que ministros socialistas exprimem em uníssono a

preocupação com a segurança (Op. cit. 390-391).

O anos 80 vão significar, ao mesmo tempo, a tentativa de colocação em

prática de medidas comunais e intercomunais de prevenção à criminalidade e de novas

cooperações e reestruturações do Estado, a partir principalmente de relações

interministeriais e ministeriais com a implementação de uma “política das cidades”,

como se convencionou chamar.

15 Agradeço a colaboração do professor Sebastin Roché que gentilmente esclareceu aspectos históricos da experiência francesa, fornecendo artigos, indicando bibliografias e esclarecendo outras dúvidas que existiram durante a elaboração do trabalho.

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18

Do mesmo modo, durante este período, percebeu-se que de pouco adiantam

medidas preventivas, quando se está diante de administrações isoladas entre si e sem

que diálogos permanentes e trabalhos conjuntos sejam realizados a fim de reduzir o

sentimento de insegurança. Entretanto, muito pouco, em razão de problemas políticos

enfrentados pela esquerda a partir de 1981, foi levado a efeito.

Com os problemas urbanos de repercussão nacional que a periferia de Lyon

enfrentou no início dos anos 80, um relatório16 encomendado à Comissão de Prefeitos

pela Segurança, presidido por Gilbert Bonnemaison, confere papel de destaque à

criação de parcerias para resolver o problema da violência. Assim, enfatizam-se, de

preferência, a prevenção e a parceria como meios de “lutar” contra a insegurança

(ROCHÉ, op. cit., p. 393-394). Surgem, assim, em torno dos eleitos locais, os

Conselhos Comunais de Prevenção da Delinqüência – CCPD (Conseils Communaux

de Prévention de la Délinquance17), completados pelo Conselho Nacional de

Prevenção da Delinqüência – CNPD (Conseil National de Prévention de la

Délinquance) (ROCHÉ, op. cit., p. 394).

Do mesmo modo, sobretudo com o advento dos “contratos de ação e de

prevenção” – CAP (Contrats d’Action et de Prévention) a partir de 1985, como o

próprio nome sugere, uma relação contratual entre governos locais, regionais e

nacionais tem lugar, de modo que tanto a comuna quanto o Estado, dividindo o custo

de novos projetos, poderiam trabalhar conjuntamente na redução do sentimento de

insegurança e na implementação de projetos visando preferencialmente à prevenção18

(ROCHÉ, op. cit., 395).

16 Relatório denominado: « Face à la délinquance: prévention, répression, solidarité ».

17 Pelo Decreto 2002-999 de 17 de julho de 2002 estes conselhos foram substituídos pelos Conselhos Locais de Segurança e de Prevenção da Delinqüência – CLSPD (Conseils Locaux de

Sécurité et de Prévention de la Délinquance).

18 A reforma à qual estamos nos referindo abrangeu outros setores como o educacional. Entretanto, restamos neste trabalho adstritos aos aspectos da prevenção e da parceria entre polícia e comunidade, com a criação destes Conselhos.

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19

Contudo, os problemas nos subúrbios persistiram e fizeram com que a

“política das cidades” e o papel de Conselhos Locais perdessem muito de sua

credibilidade.

Novos programas, ao longo dos anos 90, foram objeto de implementação,

dentre os quais: a) os Planos Locais de Segurança em 1992 – PLS (Plans Locaux de

Sécurité); b) os Planos Departamentais de Segurança em 1993 – PDS (Plans

Départementaux de Sécurité); c) os Planos Departamentais de Prevenção da

Delinqüência em 1996 – PDPD (Plans Départementaux de Prévention de la

Déliquance); d) os Contratos Locais de Segurança em 1997 – CLS (Contrats Locaux

de Sécurité), ainda em vigor.

Como se pode perceber, tratam-se mais de programas governamentais, tendo

os agentes estatais e políticos o papel central a exercer na lógica da prevenção.

Como vimos, até então o modelo francês ainda apresentava reticências para a

participação popular. Os contratos, embora tenham enfatizado em muito o papel das

municipalidades na qualidade de garantidoras da segurança, ainda não passavam,

grosso modo, de contratos interministeriais e institucionais, em nada modificando as

formas de gestão até então vigentes. Embora o colóquio de Villepinte tenha sido o

marco do partido socialista na nova maneira de se conceber a segurança pública e o

papel da polícia para fazer frente à crescente sensação de insegurança, em termos

operacionais muito pouco havia sido objeto de mudança, principalmente em face da

hesitação do próprio ministro do interior, Jean-Pierre Chevènement, do mesmo modo

que a adesão pela assinatura de contratos locais de segurança também apresentava

desafios e resistências (ROCHÉ, 2005).

Mas é entre os anos de 1999 e 2000 que se inicia “a maior reforma da polícia

nacional desde os últimos cinqüenta anos”, conhecida como doutrina “357”, e que

visava acima de tudo a estender e consolidar a polícia de proximidade, enfatizando-se

essencialmente a prevenção no lugar da repressão (ROCHÉ, 2005, p. 72). Em outras

palavras, visava a uma verdadeira “révolution culturelle”, estendendo o programa de

polícia de proximidade a todo o território nacional francês e, tudo isso, em apenas

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20

dezoito meses (Op. cit., p. 75). Assim, não surpreende o fato de que em termos

objetivos não se tenha presenciado uma diminuição nos números da criminalidade em

geral19.

Assim, permanecem na França a hegemonia e a centralização administrativa

e operacional do governo central vis-à-vis as políticas de segurança pública.

1.2.4. Alguns exemplos na América Latina

A América Latina tem uma história de transições recentes à democracia e de

declínios de regimes militares e ditatoriais.

Diante da infinidade de modelos de participação popular na gestão policial,

preferimos neste âmbito assinalar alguns programas que se desenrolam em alguns

países da América Latina espanhola, já que vamos dedicar um espaço à parte aos

aspectos históricos dos Conselhos Comunitários no Brasil no próximo capítulo.

Na Argentina, neste sentido, a experiência de Conselhos Comunitários,

conhecidos como Conselhos de Segurança e Prevenção do Delito e da Violência

(Consejos de Seguridad y Prevención del Delito y la Violência), foi promovida pelo

Programa de Segurança Cidadã (Programa de Seguridad Ciudadana) criado pelo

Decreto 1740/98. Estes Conselhos, vistos como experiências concretas, deram vazão à

implementação em 2000 do Plano Nacional de Prevenção do Delito (Plan Nacional de

Prevención del Delito- PNDP) e desde então foram constituídos alguns planos-piloto

em regiões vulneráveis e programas de atendimento a jovens (“Comunidades

Vulnerables”). Como analisam Hener e Acosta (2004, p. 05), a política de segurança

na Argentina se pautou por três tecnologias de governo no âmbito da prevenção ao

19 Como na França a Gendarmerie, instituição de caráter militar encarregada do policiamento nas zonas rurais, não participou das reformas de proximidade, foi possível, assim, comparar os resultados alcançados pela colocação em prática da polícia de proximidade levada a efeito pela polícia nacional, sendo possível atestar os pífios resultados da reforma policial na França. Remetemos o leitor que queira se aprofundar na política de reforma policial na França aos trabalhos do professor Roché (2005) e de Le Goff (2004).

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delito: descentralização, participação e focalização.

Outros exemplos poderiam ser citados na Argentina, tais como o Conselho

de Segurança Cidadã (Consejo de Seguridad Ciudadana) criado em 1999 na Província

de Córdoba (DAMMERT, 2005); as Juntas de Bairro de Segurança Comunitária

(Juntas Barriales de Seguridad Comunitaria) e a Juntas Comunais de Segurança

Comunitária (Juntas Comunales de Seguridad Comunitaria) na Província de Santa Fé

(GONZÁLEZ, 2006).

Não obstante, até o presente momento ainda não se deu a efetiva participação

de atores da sociedade civil na gestão administrativa, financeira e operacional da

segurança pública, sobretudo face às formas tradicionais arraigadas (DAMMERT, op.

cit., p. 18).

Face ao discurso de reforma policial20 e de criação de espaços comunitários

de participação existentes atualmente na América Latina, como nos países da América

do Norte e Europa Ocidental, desenha-se um novo ambiente, muito embora os desafios

de consolidação destes espaços ainda sejam grandes e os governos ainda relutem em

aceitar a participação de agentes alheios aos quadros técnicos e burocráticos do

Estado.

Outras experiências emergiram na América Latina, com destaque especial à

criação dos Conselhos Comunais de Segurança (Consejos Comunales de Seguridad) e

dos Comitês de Proteção Cidadã (Comites de Protección Ciudadana) no Chile,

impulsionados pela publicação em 2001 do Plano Comuna Segura – Compromisso 100

(Plan Comuna Segura – Compromiso 100) de cunho nitidamente preventivo no que

20 É interessante notar que na Argentina, ao lado do incentivo à criação de novos espaços públicos de discussão, deu-se a reforma da polícia. Desse modo, procedeu-se à “unificação da carreira policial, deixando de lado a separação entre oficiais e suboficiais; o alargamento do período de capacitação de seus membros; a consolidação da patrulha a pé, motorizada e em veículos; e o desenvolvimento de atividades com a comunidade” (DAMMERT, op. cit., p. 10). No Brasil, como teremos a oportunidade de analisar, não houve, no âmbito das instituições policiais, reformas nos seus quadros administrativos e hierárquicos.

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tange ao delito21 (DAMMERT, op. cit., p. 27).

Ressalte-se o fato de que estamos tratando aqui diante de dois países que,

como o Brasil, passaram recentemente por processos de transição política, mas que ao

mesmo tempo, enfrentam o importante desafio de romper com padrões anteriores de

gestão e de adotar uma nova racionalidade governamental a partir de novas interações

e relacionamentos entre polícia e comunidade.

A partir dos diversos modelos delineados neste capítulo, foi possível

perceber que o desafio está presente seja naqueles sistemas de policiamento com

caráter municipal, como são os casos dos EUA e da Inglaterra, seja naqueles países de

tendência mais centralizadora, como são os casos da França e da América Latina.

Neste sentido, o policiamento voltado para a comunidade enfatiza o

envolvimento de membros da comunidade no trabalho policial, fazendo com que a

polícia se torne responsiva frente aos anseios e às prioridades da comunidade. “Ao

invés de afirmar que as decisões operacionais da polícia são assunto de polícia, a nova

abordagem do policiamento deixa claro que a polícia deve ser responsável pela

comunidade que ela serve” (CHAN, 1997, p. 123).

Diante dos modelos acima expostos, é possível verificar que os programas

mais amplos de participação democrática nos assuntos de segurança pública têm por

objetivo: a) trabalhar conjuntamente com os aparelhos policiais; b) resolver problemas

locais; c) tomar decisões em conjunto; d) identificar prioridades e objetivos; e)

enfatizar mais a prevenção do que a repressão.

21 Este plano, como assinala Dammert (Op. cit., p. 31): “tem como objetivo ‘organizar legal e administrativamente os Conselhos Comunais de Segurança Cidadã em zonas urbanas com maiores problemas de delinqüência’ (Paz Ciudadana, 2000). Assim, o plano busca consolidar um sistema de financiamento para projetos comunais apresentados pelos moradores e relacionados com a prevenção do delito”.

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23

CAPÍTULO 2 - SEGURANÇA PARTICIPATIVA: EXPERIÊNCIAS NACIONAIS. ASPECTOS JURÍDICOS DOS CONSELHOS COMUNITÁRIOS DE SEGURANÇA DO PARANÁ

A década de 80 no Brasil representou a emergência de espaços públicos de

discussão em torno de aspectos e problemas de segurança pública. Assim, durante o

período de transição democrática, emergiram espaços públicos que visavam a instituir

uma nova racionalidade pública, em contraposição à hegemonia de espaços

governamentais até então existentes22.

Embora o marco dos novos princípios tenha sido a promulgação da

Constituição Federal de 1988, a qual previu a participação da sociedade civil em

diversos setores que antes se apresentavam como de prerrogativas exclusivas do

Estado, pode-se dizer que a emergência dos primeiros espaços públicos em políticas de

segurança pública se deu ainda sob a égide do período ditatorial ou, mais

precisamente, durante o processo de transição política democrática.

O Estado do Paraná vê surgir, já no ano de 1982, na cidade de Londrina, o

primeiro Conselho Comunitário de Segurança, seguido do Conselho Comunitário na

cidade de Maringá no ano de 1983. Entretanto, essas primeiras experiências na área da

segurança pública no Estado do Paraná somente vão receber o incentivo por parte do

Estado na década de 90, quando ocorreu a expansão do programa23.

Embora estas tenham sido as primeiras experiências em segurança

participativa, foi no Estado de São Paulo, durante o governo de André Franco Montoro

(1983-1987), que o objeto da participação democrática em segurança pública e em

outros setores, ou seja, a temática da governança democrática, vai se transformar em

22 Não vem ao caso neste momento analisar as diversas feições da participação democrática em outros setores ao longo dos anos 80 e 90. Cf. neste sentido TATAGIBA (2002) e DAGNINO, OLIVEIRA e PANFICHI (2006).

23 Voltaremos a tratar especificamente dos Conselhos de Segurança no Estado do Paraná mais adiante.

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24

programa de governo e, como tal, vai receber incentivos para a expansão do programa

em todo o Estado (FRANCO MONTORO, 1990). Com efeito, os Conselhos

Comunitários de Segurança (CONSEGs) foram criados pelo Decreto Estadual n.º

23.455, de 10 de maio de 1985, regulamentado pela Resolução SSP-37 da mesma data.

É, assim, neste espírito de governança democrática, que o governo de Franco

Montoro dá início à descentralização do poder estatal e, para tanto, incentiva a criação

de Conselhos municipais dos mais diversos matizes (saúde, orçamento, habitação,

segurança etc.).

Atualmente existem no Estado de São Paulo mais de 780 CONSEGs

homologados pela Secretaria de Segurança Pública, distribuídos entre a Capital,

Região Metropolitana, Interior e Litoral (Site oficial do Estado de São Paulo).

Na década de 90, contudo, as experiências dos Conselhos Comunitários de

Segurança vão se expandir aos outros Estados, ao mesmo tempo em que se dão a

consolidação e a regulamentação dos Conselhos nos Estados em que já existiam.

Necessário frisar que tais iniciativas foram impulsionadas, na maioria dos casos, pela

Polícia Militar.

Com efeito, no Estado do Rio de Janeiro, os Conselhos de Segurança foram

criados pela Secretaria de Segurança Pública no ano de 1999. Entretanto, e

diferentemente de outros Estados, a criação dos Conselhos se deu pela Resolução SSP

– 263, sendo regulamentados pela Resolução SSP – 781, e não por lei. Do mesmo

modo, não há no âmbito destes conselhos espaços próprios, de modo que as reuniões

se dão primordialmente nos Batalhões da Polícia Militar do Estado24 (TEIXEIRA,

2006).

No Estado de Minas Gerais, para citar mais um exemplo, 25 Conselhos

24 Em relação às reuniões, adverte Teixeira (2006, p. 15): “Em diversas regiões a realização das reuniões dos Conselhos nos batalhões dificulta a participação de alguns moradores, sobretudo pelo medo de ser visto como informante. Os discursos dos participantes apontam para a necessidade de um rodízio dos locais de realização dos encontros, utilizando-se de espaços públicos como escolas e igrejas. Entretanto, consideram importante a iniciativa da abertura dos Batalhões à comunidade em diferentes ocasiões, assim a ‘polícia passa a imagem de ser amiga’”.

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25

Comunitários de Segurança (Conseps) foram criados pela Polícia Militar no ano de

2000, a partir da implementação do programa de policiamento comunitário25.

Em Minas Gerais, ao lado do incentivo à criação de Conselhos

Comunitários, o programa de policiamento comunitário e de “polícia de resultados”

também visou à utilização do geoprocessamento da violência (mapeamento das

ocorrências criminais) que, neste caso, seria compartilhado com os conselheiros a fim

de buscar soluções em conjunto26 (BEATO, 2002, p. 06).

No Estado do Paraná, como já mencionamos, os primeiros Conselhos

Comunitários de Segurança coincidiram com o período de redemocratização brasileira,

sendo o primeiro na cidade de Londrina e o segundo, no ano consecutivo, na cidade de

Maringá27. Desde a sua origem, os Conselhos foram movimentos de associações de

bairro, comerciais, religiosas e de clubes (Rotary, Lions, etc.)28. Embora os governos

de transição da década tenham objetivado incentivar a criação de alguns Conselhos

Comunitários de Segurança e reativar os já existentes (BRESSAN e FAVERO, 1996,

p. 13), isso somente vai se dar na década de 90.

Com efeito, os governos de Jaime Lerner (1995/2002) empreenderam nova

reestruturação dos Conselhos Comunitários29, na época denominados CCS,

25 Atualmente existem mais de 373 Conseps em todo o Estado, os quais são regidos juridicamente pela Resolução 734/2003 da Secretaria de Defesa Social (Curso Nacional de Polícia Comunitária, 2006, p. 51).

26 O mesmo procedimento começa atualmente a ser adotado no Estado de São Paulo onde os membros dos CONSEGs têm acesso ao mapeamento da criminalidade. Este, como teremos a oportunidade de ver, ainda não é o caso do Estado do Paraná, onde o acesso é vedado.

27 “O Conselho Comunitário de Segurança de Londrina foi fundado em 11 de janeiro de 1982 e o Conselho Comunitário de Maringá no ano seguinte em 03 de junho” (SEGURANÇA EM FOCO, 2005, p. 07).

28 Não há estudos no Paraná relativos ao surgimento de Conselhos Comunitários de Segurança. O pouco que conseguimos foi resultado de conversas com ex-conselheiros e com conselheiros atuais que fizeram parte do início destes movimentos.

29 No ano de 1999, o governo federal, através da Lei n° 9.790, de 23 de março, criou uma nova qualificação às pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos, a “Organização da

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26

uniformizando seus estatutos constitutivos, ao lado da tentativa de criação do

programa de “Polícia Solidária”. Entretanto, o referido governo não pôs fim às práticas

antigas, tal como a emissão de credenciais30. Ao mesmo tempo, verifica-se neste

período a prática de irregularidades por parte dos membros e de assessores que

atuavam junto aos Conselhos Comunitários de Segurança31.

Ligada diretamente à Secretaria de Estado da Segurança Pública, é criada em

1996 a Coordenadoria dos Conselhos Comunitários de Segurança, visando a servir de

canal de incentivo, capacitação, organização e acesso aos Conselhos Comunitários.

Paralelamente aos Programas de “Polícia Solidária” e aos Conselhos Comunitários são

criados, também durante o governo de Lerner, os programas “Voluntário do Trânsito”,

“Inspetor de Quarteirão” e “Guarda da Família” (BRESSAN e FAVERO, op. cit.), os

quais, grosso modo, não significam outra coisa senão o programa Neighbourhood

Watch, já falado no capítulo anterior.

Do mesmo modo, talvez a dimensão mais importante a ressaltar diga respeito

ao papel que estes Conselhos acabavam desempenhando no tocante à segurança

pública. Seguindo a lógica adotada nos anos 90 de reforma do Estado, privatizações,

enxugamento da máquina pública e corte de gastos públicos, os Conselhos

Comunitários acabavam por substituir a falta de investimento e reaparelhamento das

corporações policiais. O Estado minimalista dos anos 90, neste sentido, vai se servir da

Sociedade Civil de Interesse Público” (Art. 1°), e regulou, ao mesmo tempo, o Termo de Parceria. Às pessoas jurídicas enquadradas na referida lei, mediante o cumprimento dos requisitos legais, poderia ser outorgada esta qualificação, possibilitando o recebimento de recursos físicos, humanos e financeiros (§ único do art. 3°). Os Conselhos Comunitários de Segurança, neste contexto, podem se enquadrar nestes requisitos e possuir esta qualificação.

30 O objetivo de tal medida foi: “identificar com credencial os membros dos CCS, garantindo-lhes tratamento especial no desempenho do mandato” (PROJETO 2000 da Assessoria Comunitária da Secretária de Segurança do Paraná). (grifos nossos).

31 Durante o governo Jaime Lerner, não foram poucas as denúncias de irregularidades praticadas por conselheiros dos CCS e assessores ligados à Secretaria de Estado da Segurança Pública do Estado do Paraná, dentre as quais denúncias contra a revista oficial de divulgação dos Conselhos, notadamente no que tangia à venda de espaços publicitários. Em virtude destes fatos, a revista perdeu a qualidade de veículo oficial de divulgação dos Conselhos.

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27

alocação dos investimentos privados para a manutenção e custeio das Polícias, seja no

que tange aos consertos e manutenção de viaturas policiais, seja no que tange à

manutenção de unidades policiais e de materiais de expediente (papel, cartuchos de

impressão, móveis e alimentação de presos e de funcionários)32. Entre os diversos

exemplos encontrados durante a pesquisa, podemos citar o CCS/ Foz do Iguaçu, dentre

cujas atividades 1998/199933 estão:

Cadeia Pública de Foz do Iguaçu:

Combustível para transporte de detentos até o Fórum Local; conserto da viatura; elaboração de projeto para reforma da cadeia, enviando à Secretaria de Estado da Segurança Pública para aprovação. Delegacia da Mulher:

Conserto de equipamentos de escritório; aquisição de material de expediente; manutenção da viatura. Delegacia Central:

Material de limpeza; material de expediente.

O CCS/Cascavel consiste em outro exemplo do que estamos expondo,

conforme podemos verificar do seu relatório, no qual constam as seguintes

atividades34:

15ª SDP:

32 Esta mesma lógica está inscrita também nos Conselhos Comunitários de outros Estados. Assim, assinala relatório de atividades – CONSEGs – 1999/2001 do Estado de São Paulo: “A participação comunitária é essencial na captação e operação de recursos. Os CONSEGs melhor estruturados têm alcançado êxito na captação de recursos suficientes até mesmo para arcarem com custos de manutenção de sede própria, contratação de funcionários em período integral, terceirização de serviços (pesquisas de opinião, assessoria de imprensa). Vários CONSEGs possuem sua própria linha telefônica, página na internet e apóiam a Polícia Estadual na construção e reforma de imóveis, destinados ao uso policial, recuperação e manutenção de frota policial e dotação de recursos materiais (informática, telecomunicações etc.) das unidades de Polícia da correspondente área de atuação”. (Grifo nosso).

33 In: PARANÁSEG: Revista Oficial dos Conselhos Comunitários de Segurança do Estado do Paraná, 1999, p. 33.

34 PARANÁSEG, 1999, p. 35.

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Ampliação dos portões de fundo, dando acesso ao estacionamento; doação de arroz e óleo para a cadeia pública; doação de 1000 capas de inquérito; doação de resmas de papel; manutenção de uma estagiária para atendimento ao público; manutenção de duas estagiárias para atendimento na delegacia da mulher.

Instituto de Criminalística:

Intermediação de doação de 3 cartuchos de tinta HP pelo Sinduscon; Intermediação de doação de um equipamento fotográfico pelo Secovi; intermediação de doação de uma computador pelo AMOP; doação de 2 mesas de reuniões.

Outros exemplos poderiam ser citados, como o mutirão realizado pelo CCS/

Pontal do Paraná para a construção de uma nova delegacia, a cessão de uma área pelo

CCS/Mercês em Curitiba para o funcionamento da 2ª Cia da Polícia Militar etc. Esta é,

assim, a lógica subjacente ao incentivo por parte do Estado aos Conselhos

Comunitários nos moldes como é pensado no Estado do Paraná, não obstante as

reestruturações pelas quais vêm passando no atual governo de Roberto Requião35.

Em 2003, assume no Estado do Paraná o governador Roberto Requião e, tal

como objetivado pelo governo anterior, os Conselhos Comunitários de Segurança se

vêem novamente sendo reestruturados. Entretanto, pela primeira vez os Conselhos são

objeto de regulamentação jurídica (Decreto de criação nº. 1790, de 5 de setembro de

2003 e regulamentado pelo Decreto n.º 2332, de 10 de dezembro de 2003). Dentre as

principais e importantes medidas constantes do referido Decreto de regulamentação se

destacam o fim da emissão de credenciais aos conselheiros e a obrigatoriedade de

comprovação de bons antecedentes como requisito essencial à homologação da chapa

vitoriosa (Art. 30, IV). Além do mais, este Decreto vai prescrever as normas relativas à

formação (Seção II), à estrutura (Seção IV), à competência de cada membro (Seção

V), ao processo eleitoral nos Conselhos (Seção VIII), às funções, direitos e obrigações

dos seus membros (Seção VII), aos requisitos para a candidatura (Seção VII, Subseção

35 Esta prática está presente nos dias de hoje. Conforme as palavras de um conselheiro que entrevistamos quando da realização desta pesquisa: “Os Consegs não têm outra escolha senão investir nas polícias. Uma viatura que estraga, por exemplo, demora, por causa da burocracia, um mês para voltar para a comunidade, e como já não têm muitas, preferimos nós mesmos consertá-la”.

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I) e para a homologação da chapa vitoriosa, aos limites da atuação, às normas

concernentes às reuniões (Seção IX) e prescreve outras providências36.

Assim, dispõe o artigo 2º do referido Decreto:

Art. 2º: “Os CONSEGS são instituições jurídicas de Direito Privado sem fins lucrativos com o objetivo principal de organizar as comunidades e fazê-las interagir com a Polícia Estadual, e se vinculam, por adesão, às diretrizes emanadas da Secretaria da Segurança Pública, por intermédio do Coordenador Estadual e pelo Conselho Permanente para Assuntos dos Conselhos Comunitários de Segurança”.

Quanto à estrutura dos Conselhos, dispõe o artigo 15 que a diretoria

executiva, além dos membros natos, é composta por: “I- Presidência; II- Vice-

Presidência; III- 1ª Secretária; IV- 2ª Secretária; V- 1ª Tesouraria; VI- 2ª Tesouraria;

VII- Conselho Fiscal; VIII- Conselho Deliberativo; IX- Conselho de Ética e

Disciplina”.

Estes são os atores da sociedade civil relevantes na lógica da participação

comunitária no âmbito dos Conselhos Comunitários. Contudo, a própria lei (art. 16)

vai especificar o rol dos membros natos, como sendo: “I- o Delegado de Polícia, titular

do Distrito Policial que circunscreve a área do CONSEG; II- o Comandante da

Unidade Policial Militar que circunscreve a área do CONSEG”. Em razão da

autonomia administrativa dos entes da federação e da separação de poderes no sistema

político brasileiro, a lei instituiu como membros natos facultativos (art. 17): “I- um

representante da Prefeitura do Município; II- um representante do Poder Judiciário;

III- um representante do Ministério Público; IV- um representante da Associação

Comercial e Industrial do Município”37.

36 Entre os conselheiros pesquisados, 46,7% entendem que a regulamentação dos Consegs pelo atual governo foi regular em termos de benefícios, enquanto que 53,3 % percebem isso como bom ou ótimo.

37 Embora o espírito da norma seja estabelecer uma parceria interinstitucional tal como objetivado em outros países, como por exemplo a França, a pesquisa mostrou que, além da diretoria executiva, as reuniões são freqüentadas por representantes da Polícia Militar com a ausência de representantes da Polícia Civil. Teremos a oportunidade de tocar novamente neste assunto quando falarmos do grau de confiança dos conselheiros vis-à-vis as polícias. Do mesmo modo, no Brasil a administração local ainda não se estabeleceu como ator relevante no papel de garantir a segurança

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30

A própria lei (art. 41) vai também fixar o mandato de dois anos para cada

gestão, com eleições realizadas sempre no mês de julho e com a posse da chapa

vitoriosa no mês de agosto.

Um dos aspectos mais importantes no que diz respeito à natureza jurídica dos

Conselhos Comunitários de Segurança são as formas de obtenção de recursos para a

realização de seus programas e para o cumprimento de suas finalidades legais38. Como

pudemos observar acima, não há no âmbito legal previsão para que os Conselhos

Comunitários sejam atores na gestão e na forma de distribuição do orçamento

destinado à segurança pública. Ao contrário, estes espaços acabam muitas vezes

substituindo o investimento público pela alocação de recursos privados, intermediados

junto ao empresariado local, para a manutenção dos serviços básicos das instituições

policiais. Como se trata de um serviço entendido como de voluntariado, os

conselheiros também não auferem nenhuma forma de pagamento pelos serviços

prestados durante seus mandatos.

Destarte, os Consegs, seja em razão do dispositivo legal ora em comento,

seja a partir da observação participante e da análise da atas de reunião de alguns

Conselhos pesquisados neste trabalho, não se constituem como instâncias de

deliberação em torno da destinação dos recursos públicos em segurança pública, do

mesmo modo que não recebem por parte do Estado recursos para a implementação de

programas e para a divulgação de cartilhas, folhetos e reuniões regulares39. O mesmo

pública. As guardas municipais ainda encontram barreiras e limites constitucionais de atuação. Contudo, verifica-se que o modelo de policiamento e organização que esta corporação tem adotado em algumas cidades é aquele existente nas Polícias Militares (ZAVATARO, 2006).

38 Com a publicação da Lei n. 14.683, de 04 de maio de 2005, a Companhia Paranaense de Energia Elétrica (COPEL) fica autorizada a “efetuar o recebimento de contribuições espontâneas, de quaisquer quantias, destinadas aos Conselhos Comunitários de Segurança” (Art. 1º), desde que legalmente constituídas e desde que portadoras de registro junto ao Conselho Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) (art. 2º). Entretanto, até o presente momento esta lei não foi objeto de regulamentação, de modo que seu cumprimento resta dependente desta medida.

39 Como já foi observado, na cidade de Chicago o programa de policiamento comunitário visava, acima de tudo, a atrair o maior número possível de participantes e, para tanto, o orçamento destinado à publicidade do programa chegou à cifra de 1,6 milhão de dólares. Em suma, o programa

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pode ser dito com relação aos recursos federais já que o governo federal, através do

Fundo Nacional de Segurança Pública, não previu qualquer participação da sociedade

civil na destinação da verba e na escolha da prioridade do gasto governamental, cujas

decisões sobre quando, onde e como serão destinadas as verbas permanecem de

exclusividade dos governos estaduais40.

Por fim, cabe destacar que paralelamente à reestruturação dos Conselhos

Comunitários de Segurança, o governo de Requião deu inicio à implementação do

programa de policiamento comunitário, denominado Projeto Povo (Policiamento

Ostensivo Volante). Uma das exigências do Estado para que um bairro fosse

“beneficiado” com uma viatura policial complementar seria a regularização do seu

Conselho Comunitário, nos moldes do já citado decreto de regulamentação.

O próprio Decreto Regulamentador estabeleceu quais são os atores na

dinâmica política dos Consegs do Paraná, priorizando assim o papel da sociedade civil.

Contudo, é ela um verdadeiro ator na dinâmica do processo decisório?

de policiamento comunitário, para ser implementado, demanda o investimento público e não a substituição deste pelo investimento privado.

40 Tal como existente nos setores da saúde e assistência social, a remessa de recursos federais poderia estar diretamente ligada à existência de Conselhos Comunitários ou de um Conselho Estadual de segurança pública que, juntamente com os agentes públicos, decidiriam as prioridades nas políticas públicas. Defendemos a tese segundo a qual o serviço prestado pelos aparelhos policiais é política pública e, como tal, deveria ser pensado a partir da lógica da co-gestão. Mas já dissemos antes, as organizações policiais e o próprio Estado ainda relutam em aceitar agentes alheios aos quadros burocráticos no processo decisório em segurança pública.

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CAPÍTULO 3 – A DINÂMICA POLÍTICA DOS CONSELHOS COMUNITÁRIOS DE SEGURANÇA DE CURITIBA: RECURSOS INDIVIDUAIS E SUBJETIVOS, RECURSOS ORGANIZACIONAIS E O PROCESSO DECISÓRIO41

Este capítulo se destina a apresentar os resultados da pesquisa realizada no

âmbito dos Conselhos Comunitários dos Bairros do Boqueirão, Guabirotuba e Tarumã,

tendo por objetivo analisar o seu funcionamento a partir, sobretudo, dos recursos

existentes nestas instituições, sejam eles de natureza organizacional e institucional,

sejam eles de natureza individual e subjetiva. Com isso, será possível avaliar o quão

efetivos são esses recursos no âmbito da dinâmica interna do processo decisório.

Para este fim, adotamos como procedimentos metodológicos a aplicação de

questionários aos conselheiros42, a análise das atas e a observação participante das

reuniões (etnografia descritiva)43.

41 Este capítulo, bem como o procedimento do trabalho, foi inspirado na pesquisa “Democracia e Políticas Sociais”, disponível em Fuks, Perissionotto e Souza (Op. cit). Agradeço particularmente ao professor Renato Perissinotto, sem cuja orientação este trabalho não poderia ter sido realizado.

42 Durante a realização do projeto de pesquisa, tendo em mãos os telefones dos diversos Conselhos Comunitários de Segurança de Curitiba, entramos em contato com os presidentes dos Conselhos cujas gestões estavam sendo encerradas. Pretendíamos, a priori, analisar aqueles Conselhos que preenchiam os requisitos aventados nesta pesquisa, quais sejam: diretoria completa, reuniões periódicas, atas das reuniões e regularização face ao Decreto n.º 2332/2003. Não obstante, fomos obrigados a desconsiderar alguns Conselhos que preenchiam os requisitos acima, mas cujos horários de reunião impossibilitavam a realização da pesquisa. Por esta razão, o presente trabalho não tem por intuito representar o universo dos Conselhos Comunitários de Segurança de Curitiba, sendo tão-somente um experimento estatístico a partir de um conjunto limitado de dados. Mister dizer, no mais, que embora a realização da pesquisa tenha sido aprovada pelo Presidente do Conselho Comunitário de Segurança do bairro do Batel, e não obstante se tratar de um espaço público e aberto a todos os interessados, a falta de reuniões regulares de sua diretoria inviabilizou a aplicação do questionário, bem como a observação participante das suas reuniões que, atualmente, se restringem a um café com as autoridades. Mesmo assim, referências serão feitas em relação a este Conselho na presente pesquisa, haja vista a análise da sua documentação e das atas de antigas reuniões da atual gestão, bem como em virtude do peso político que ele detém, como explicaremos melhor adiante.

43 Durante os meses de junho e julho freqüentamos algumas reuniões dos Conselhos Comunitários de Segurança dos bairros do Guabirotuba, Boqueirão e Tarumã. Tal procedimento metodológico tem seu valor científico, pois permite perceber a dinâmica interna do processo decisório

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33

Com efeito, a compreensão dos atores da sociedade civil que atuam no

âmbito dos Conselhos Comunitários de Segurança se revela uma via importante para o

entendimento das dinâmicas política e decisória no que concerne à segurança pública,

pois a “qualidade” democrática dos seus atores, suas preferências políticas, seus

valores e a sua auto-avaliação quanto à capacidade de influir na política e nas decisões

que são tomadas pelas instituições públicas pode se revelar um poderoso instrumento

da mudança gerencial das políticas de segurança pública, além, é claro, de servir como

instrumento da accountability e do controle externo da polícia (police oversight).

Neste sentido, quem são esses atores? Do ponto de vista da cultura cívica, quais são

seus valores políticos e sociais?

Tendo em vista se tratar de Conselhos Comunitários de Segurança, nos

moldes do já citado Decreto regulamentador, cuja participação se faz a partir do

voluntariado44 e da formação da sua diretoria através de uma disputa eleitoral

composta por chapas previamente inscritas, não estamos diante de atores da sociedade

civil com interesses díspares e conflitantes, tal como ocorre, por exemplo, no interior

do Conselho Municipal de Assistência Social de Curitiba (CMAS), formado por

segmentos representativos dos usuários, dos trabalhadores do setor, dos prestadores de

serviço e dos gestores (PERISSINOTTO, op. cit.). Ao contrário, no âmbito de cada

diretoria dos Consegs, há o predomínio do papel do Presidente, embora disputas em

torno dos encaminhamentos possam ocorrer. Se há conflito, este se faz principalmente

face aos membros natos (representantes da polícia).

A aplicação das entrevistas foi dirigida à diretoria dos Conselhos de

e o papel de cada ator, o que muitas vezes não é possível pela simples leitura fria das atas das reuniões, sobretudo no âmbito de alguns Consegs que, freqüentemente, têm por hábito a elaboração posterior das atas. No mais, os registros das atas, quando existentes, revelam-se como instrumentos limitados e formais do processo decisório e dos conflitos subjacentes às políticas públicas.

44 As motivações para a participação são as mais diversas, passando por interesses econômicos no bairro ao engajamento por melhorias de segurança. Foi o caso de uma conselheira entrevistada que se engajou após procurar a prefeitura de Curitiba para resolver um problema num campo de futebol próximo a sua casa, que nos fins de semana era espaço para bagunças e uso de drogas, mas que encontrava resistência por não representar nenhuma entidade ou associação de bairro.

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Segurança, assim definida: I- Presidência; II- Vice-Presidência; III- 1ª Secretaria; IV-

2ª Secretaria; V- 1ª Tesouraria; VI- 2ª Tesouraria. Mesmo assim, em cada Conselho

pudemos aplicar entrevistas a apenas cinco de seus membros, num total de quinze

conselheiros, já que, muitas vezes, a 2ª Secretaria divide suas funções com a 1ª

Secretaria. São estes, na realidade, os atores da sociedade civil que conduzem a

dinâmica interna dos Consegs. Por fim, a pesquisa se restringiu a uma única gestão

destes Conselhos45.

Este capítulo se divide, com efeito, numa análise descritiva dos recursos

disponíveis nos Conselhos Comunitários de Segurança, entendidos como recursos

individuais e subjetivos dos conselheiros e os organizacionais dos Conselhos. No fim,

apresentaremos uma análise descritiva da dinâmica do processo decisório nos Consegs

pesquisados, visando com isso a determinar como se produzem as decisões das

políticas de segurança pública, o papel que cada ator desempenha, o tipo de

deliberação produzida e em que medida há co-gestão no planejamento financeiro e

operacional da política adotada e dos resultados apresentados.

3.1. RECURSOS INDIVIDUAIS

Este tópico se dedica a analisar os atores da sociedade civil e conselheiros

dos Consegs, a partir de um olhar voltado para seus perfis sócio-econômico e escolar,

tendo assim por preocupação central perceber quem eles são e qual lugar esses atores

ocupam no espaço social e simbólico. Tal abordagem se faz necessária posto que

permite saber até que ponto os Conselhos Comunitários de Segurança Pública são

apropriados por uma única camada social ou se, ao contrário, são espaços ocupados

por vários setores sociais. Isso se torna ainda mais relevante face ao problema da

45 Como já foi dito no capítulo precedente, cada gestão dos Conselhos Comunitários de Segurança é de 2 anos, com eleições sempre no mês de julho. Diante de dificuldades na realização da pesquisa – o que demonstra, por si só, que a institucionalização dos Conselhos Comunitários de Segurança ainda apresenta constrangimentos –, analisamos também neste trabalho o Conselho Comunitário do bairro do Boqueirão, cuja carta constitutiva data de dezembro de 2005.

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violência policial, historicamente voltada contra populações vulneráveis. Desse modo,

esta análise permite identificar quais são os interesses representados no âmbito dos

Conselhos Comunitários e quais modelos de policiamento e de gestão estão em disputa

nestes ambientes de discussão em torno da segurança pública.

Com efeito, pela tabela 1 verifica-se que 80% dos conselheiros têm mais de

40 anos de idade, sendo muito pouca a participação de jovens nos Conselhos

Comunitários de Segurança. Do total pesquisado, chama atenção o fato de que 60%

dos seus conselheiros são de mulheres e de que no Conseg/Boqueirão a Presidência é

exercida por uma mulher46. Dos conselheiros, mais da metade (53,4%) de seus

membros é de pessoas cujo estado civil é casado ou que convive em união estável,

seguido de 40,1% daqueles que se encontram separados, divorciados ou na viuvez.

Desse modo, da correlação entre pessoas jovens e solteiras, percebe-se que é uma

minoria que participa dos Conselhos de Segurança.

Relativamente ao ramo de atividade profissional dos conselheiros, percebe-

se um predomínio daqueles que se inserem no serviço público, seja na qualidade de

servidor da ativa, seja na qualidade de servidor inativo, atingindo assim 60 % dos seus

membros (Tabela 1).

46 É interessante notar que as mulheres têm, cada vez mais, assumido uma postura ativa nas políticas de segurança pública e nos postos-chave das instituições policiais, rompendo, com isso, padrões históricos em um ambiente que até bem recentemente era dominado exclusivamente por homens.

Tabela 1 - Ramo de atividade

4 26,7

2 13,3

2 13,3

5 33,3

1 6,7

1 6,7 15 100,0

Público

Privado Autônomo

Aposentado(a) do serviço público

Aposentado(a) do serviço privado NR

Total

Freqüência %

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36

Mais significativos ainda são os níveis de renda e escolaridade dos

conselheiros e que, in fine, denota bem o perfil de “elite” dos Conselhos Comunitários

de Segurança pesquisados. Através dos dados referentes à renda e à escolaridade dos

conselheiros, verifica-se que os membros da gestão 2004/2006 dos Consegs analisados

se enquadram no que se denomina uma classe média, que percebe uma remuneração

acima da média nacional, não sendo, desse modo, um espaço de representatividade do

diversos setores sociais existentes num mesmo bairro e localidade, o que sugere ser em

razão da baixa divulgação dos Conselhos e de suas finalidades institucionais47.

Pela tabela 2, verifica-se que os membros que percebem uma remuneração

acima de 6 salários mínimos perfazem um total de 67,7 %, do que se pode concluir que

os Consegs representam um espaço apropriado por uma determinada classe social sob

o ponto de vista econômico. No que concerne à escolaridade, não se verificam

alterações substanciais, haja vista que um total de 53,3% conselheiros são titulares de

47 Tivemos a oportunidade de apresentar sucintamente alguns programas adotados em outros países e que visavam, entre outras coisas, a fazer com que um maior número de pessoas participasse das reuniões com a administração pública, destacando em especial o programa implementado em Chicago/EUA através de uma forte campanha publicitária nos diversos meios de comunicação. No Paraná, ao contrário, ainda são precários os meios de divulgação das reuniões dos Consegs, muitas vezes se resumindo ao jornal local do bairro cuja tiragem nem sempre atinge ou corresponde ao total dos habitantes do bairro. Do mesmo modo, sobretudo com o predomínio das formas de difusão via rádio e televisão, acreditamos serem estas as formas mais eficazes de divulgação das reuniões, o que não se deu até o momento, atingindo um público muito restrito e com a participação quase exclusiva da diretoria do Consegs nas reuniões, sendo pouco freqüentadas por visitantes. A partir da observação participante que empreendemos entre os meses de junho e julho do corrente ano, verificamos que entre os conselheiros e entre os poucos visitantes das reuniões, há a exclusividade da participação de pessoas de cor branca, tudo levando a crer que os Conselhos Comunitários ainda não se instituíram enquanto espaço representativo dos diversos setores do bairro, principalmente de grupos marginalizados.

Tabela 2 - Renda

3 20,0

6 40,0

3 20,0

1 6,7

2 13,3

15 100,0

De 1 a 5 SM

De 6 a 10 SM

De 11 a 20 SM

De 21 a 40 SM

NR Total

Freqüência %

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37

um diploma de curso superior ou de pós-graduação completos48, segundo tabela 3.

De uma maneira geral, os Conselhos Comunitários não participam da gestão

conjunta nas políticas de segurança pública, participando mais como colaboradores na

solução dos problemas materiais do que como gestores dos recursos públicos e do

planejamento em segurança pública. Mesmo assim, participam com programas

próprios de segurança pública, tentando motivar a vizinhança a agir pró-ativamente no

resguardo da integridade uns dos outros, numa espécie de rede social e nos moldes de

já citado programa de Neighbourhood Policing, bem como a partir de

encaminhamentos de problemas no bairro que muitas vezes extrapolam a questão da

segurança pública. Para esse fim, verificamos que os Conselhos existentes em bairros

de alta renda dispõem de mais recursos para a implementação de programas próprios,

do mesmo modo que para a reivindicação de melhorias, já que dotados de maior

capital social, econômico e político49.

48 Embora seja um universo muito pequeno de pesquisa, quando desagregamos os dados para cada Conselho pesquisado, podemos verificar que dentre os três Conselhos Comunitários de Segurança, o Conseg/Tarumã é aquele cujos membros detêm mais capital escolar e econômico, já que 100% dos seus membros possuem curso superior completo ou pós-graduação completa e em que 80% dos seus membros percebem um rendimento superior a 6 salários mínimos. Isto sugere que a desigualdade está presente entre os próprios Conselhos Comunitários no que tange aos recursos individuais de seus conselheiros.

49 É o caso, por exemplo, do Conseg/Batel, que tem como colaboradores e financiadores uma gama de empresas de grande porte e de pessoas com alto poder político, econômico e social. Pela análise das atas e pela observação participante, pudemos observar uma reivindicação constante de todos os Conselhos relacionada ao problema do efetivo policial posto à disposição do bairro. O Conseg/Batel, neste sentido, pôde financiar a mudança da 2ª Cia da Polícia Militar do Bairro do Barigüi para o bairro do Batel, fornecendo assim o prédio onde esta seria instalada, bem como o pagamento da manutenção das instalações. Neste mesmo imóvel se encontra a sede do Conselho

Tabela 3 - Escolaridade

2 13,3

1 6,7

4 26,7

3 20,0

5 33,3

15 100,0

Fundamental incompleto

Fundamental completo

Médio completo

Superior completo

Pós completa

Total

Freqüência %

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38

Mas para se pensar nos conselheiros como atores conscientes e relevantes,

necessário se faz que eles sejam dotados de motivações para a participação política, as

quais se traduzem muitas vezes no aprendizado político adquirido ao longo da vida,

incluindo a fase adulta, implicando, em última ratio, na percepção que este ator vai ter

de si mesmo, dos instrumentos e do papel que pode desempenhar no processo

decisório. Como afirma PERISSINOTTO (Op. cit., p. 53): “Em termos gerais, supõe-

se que, ao se associarem, os homens, de um lado, podem resistir ao despotismo e, de

outro lado, podem interessar-se mais pelos assuntos públicos. Como parece óbvio,

ambas as condições são fundamentais para o bom governo democrático”.

3.2. RECURSOS SUBJETIVOS

No que tange ao associativismo em outras organizações coletivas – uma das

vias pelas quais se dá o engajamento político e a socialização política participativa –

percebe-se pela tabela 4 que entre os conselheiros não há uniformidade. Pela análise

individual da participação em outras associações, é significativo o fato de que, entre os

conselheiros entrevistados, todos participam de pelo menos uma associação, sendo

comum a participação em mais de uma associação concomitantemente. Isto sugere, na

linha dos teóricos da democracia participativa, que a participação em si gera o

processo de participação, razão pela qual é perfeitamente passível a cumulação de

participações em instâncias diferentes.

Tabela 4 – Participação em outras associações

2 2 3 12 5 9

13 13 11 3 9 5

1 1 1

15 15 15 15 15 15

Sim

Não

NR

Total

Participação

em ONGs

Participação

em sindicatos

Participação

em

movimentos

religiosos

Participação

em

associação

de bairro

Participação

em

associações

profissionais

Participação

em outras

associações

Comunitário do bairro do Batel. As reuniões deste Conselho, hoje substituídos por um “café da manhã com as autoridades”, realizavam-se anteriormente no Shopping Crystal.

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39

Neste contexto, o maior número de respostas positivas foi encontrado com

relação às associações de bairro (80%). Por outro lado, o mesmo não se pode dizer

com relação à participação, por parte dos conselheiros entrevistados, em partidos

políticos, a qual atinge tão-somente 13,4 % de seus membros, sendo um conselheiro

filiado ao PT e outro ao PMDB.

Pelos dados acima, percebe-se que os atores da sociedade civil analisados

possuem uma vida altamente associativa com um comportamento político participativo

em relação a outras instâncias alheias aos Conselhos Comunitários de Segurança. Com

efeito, chama a atenção que, entre os entrevistados, o ativismo político não se

manifesta pela forma tradicional de participação político-partidária, mas ao contrário,

seu engajamento político se manifesta mais em instâncias locais como igrejas,

associações comerciais, clubes, associação de moradores etc.

Partindo do pressuposto de que há importante participação política dos

conselheiros, importava analisar a qualidade da participação que, no mais, deve ser

reforçada pela busca constante de informação política nos meios de comunicação.

Assim é que, perguntados sobre o modo de informação política, verifica-se que 66,7 %

dos conselheiros buscam informação através de mais de uma fonte (jornal impresso,

televisão, rádio, internet revista e livros), ao passo que 20% dos conselheiros têm o

hábito da leitura como fonte exclusiva de informação e apenas 13,3 % recorrem

exclusivamente à televisão.

Ao mesmo tempo, a freqüência com que se dá a busca da informação política

é um dado que não pode ser desprezado na análise do comportamento político dos

atores da sociedade civil. Verificou-se que 93,3% dos membros dos Consegs se

informam com uma freqüência diária através dos canais acima descritos.

Como vimos até o presente momento, sob o ponto de vista dos recursos

subjetivos, os membros dos Conselhos Comunitários de Segurança pesquisados neste

trabalho apresentam um comportamento político associativo e se caracterizam pela

busca constante e freqüente de informação política, de modo que é possível afirmar,

nesta ótica, o engajamento político dos conselheiros em comento.

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40

Todavia, resta saber se esse comportamento político resulta numa atitude

positiva em relação ao sentimento de competência política que os conselheiros têm de

si mesmos, enquanto atores que se percebem como capazes de influenciar a política.

Neste sentido, perguntado se o conselheiro se via como alguém capaz de influenciar a

política, a maioria, ou seja, 53,3% se viam com sujeitos capazes de fazê-lo. Mesmo

assim, chama a atenção o dado de que 40% deles não se percebiam como tais (Tabela

5).

Com efeito, não se trata de consagrar o desempenho político às instituições

formais e representativas do sistema político, mas ao papel que os cidadãos podem

exercer no sentido de agir face às instituições formais, deslocando assim padrões de

autoridade existentes. Para tanto, o comportamento e as percepções que estes agentes

têm de si mesmos se revelam variáveis imprescindíveis. A crença de si como agente

capaz, por fim, pode não representar uma atitude concreta frente ao sistema político e

às decisões governamentais, mas significa por si só a possibilidade de que a vontade e

a auto-avaliação sejam a passagem ao ato (ALMOND e VERBA, op. cit., p. 139).

Assim sendo, a percepção que cada ator tem de sua própria competência

política pode afetar seu comportamento político, fazendo com que ele seja, ao mesmo

tempo, mais engajado nos assuntos públicos e mais capaz de deliberar e de exercer o

controle social do sistema político, incluindo no nosso estudo as decisões nas políticas

de segurança pública.

Complementando os dados acima, perguntamos aos conselheiros, a fim de

saber se o senso de competência política se traduz, no fim das contas, num

comportamento político ativo, se eles acompanhavam as propostas e encaminhamentos

dirigidos aos representantes estatais. É sugestivo o fato de que 60% dos conselheiros

Tabela 5 – Auto-percepção política

8 53,3 6 40,0 1 6,7

15 100,0

Sim

Não

NR

Total

Freqüência %

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41

afirmaram acompanhar o desenrolar dos encaminhamentos propostos aos

representantes governamentais.

O mesmo, contudo, não se pode dizer quanto à percepção que os

conselheiros têm do comportamento dos agentes estatais, o que pode minar o esforço

de participação e a própria sobrevivência destes espaços participativos. Perguntando,

neste caso, se o conselheiro encontrava resistência por parte dos representantes estatais

nas propostas elaboradas pelo Conselho, 60% dos entrevistados responderam que sim.

Tal situação é devida, em parte, à cultura organizacional existente no âmbito das

instituições estatais, principalmente das instituições policiais50.

Uma das formas para que os atores da sociedade civil possam desempenhar,

conjuntamente com o Estado, um papel importante no planejamento estratégico das

ações da polícia e na co-gestão da segurança pública, se dá pela via do conhecimento

das ocorrências criminais do bairro, objeto da circunscrição dos Consegs. Entretanto,

não é o que se passa no Estado do Paraná, onde os conselheiros não recebem

informações estatísticas sobre os problemas criminais no bairro, dos locais e da

natureza das ocorrências mais freqüentes. Com efeito, parte-se do pressuposto de que a

participação implica a busca constante de informação e a participação em arenas

decisórias de políticas públicas exige, do mesmo modo, informações específicas nas

áreas de atuação sobre os quais se delibera. Assim, 80% dos conselheiros pesquisados

afirmaram não receber quaisquer informações sobre o número e a natureza das

50 Pretendemos, numa pesquisa posterior, estender o âmbito deste trabalho analisando melhor os membros natos dos Conselhos Comunitários de Segurança, suas percepções quanto ao policiamento comunitário e à participação da sociedade civil. Evidências sugerem, contudo, que os policiais não admitem a presença de agentes alheios aos quadros policiais interferindo em sua autonomia operacional e no planejamento das suas ações, de modo que o papel atribuído à sociedade civil nesta seara é aquele da colaboração harmônica e limitada. Em linhas gerais, podemos dizer que na polícia civil predomina uma cultura judiciária/dogmática processual enquanto que na polícia militar predomina uma cultura militar, um ethos militar que, no fim, vão levar à exclusão da sociedade civil enquanto partícipe das tomadas de decisão (KANT DE LIMA, 2003).

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42

ocorrências policiais e criminais no bairro51.

Como queremos deixar claro pelos dados até agora apresentados ao leitor

neste trabalho, a pesquisa sugere que ainda são falhos os instrumentos de participação

política nas políticas de segurança pública. Como podemos ver, ainda há resistência

por parte do Estado na participação pró-ativa da sociedade civil, seja pelo viés da

resistência às propostas formuladas pelos Consegs, seja pela falta de informação e

disponibilização das estatísticas de ocorrências criminais nos bairros de Curitiba.

Mesmo que os dados apresentados neste momento sugiram um

comportamento político ativo dos conselheiros comunitários de segurança, pela

participação em associações e pela auto-avaliação política de si mesmo, a análise da

dimensão axiológica se mostra importante, pois os valores que detêm os conselheiros

acabam por motivar e orientar a própria participação política.

Com efeito, a análise do que os atores da sociedade civil acreditam sobre o

respeito aos direitos humanos, do que eles esperam da polícia de seu bairro, do grau de

confiança no sistema político brasileiro e das instituições policiais, enfim, dos seus

valores sociais e políticos e dos limites das mudanças que esperam, merece algumas

linhas à parte de considerações.

A fim de saber alguns aspectos dos seus valores sociais, perguntamos aos

conselheiros sua adesão ou não ao respeito aos direitos humanos. A maioria, 66,7%, se

diz favorável. Esses dados se mostram importantes, pois permitem avaliar até que

ponto a adesão aos valores democráticos se manifesta em questões práticas.

O mesmo percentual de 66,7% é encontrado quando perguntamos aos

conselheiros sua opinião a respeito da pena de morte, tema altamente controvertido na

literatura brasileira, mas que denota bem a adesão a valores humanitários ou

51 Vimos que alguns estados como MG e SP têm dado o primeiro passo para o compartilhamento da estatística criminal com os Conselhos Comunitários de Segurança, o que ainda não é o caso do Paraná onde, não obstante a criação da Coordenadoria de Ação Policial Estratégica da Secretaria de Estado da Segurança Pública, responsável pelo mapeamento das ocorrências criminais, aos dados produzidos não é dada publicidade.

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43

autoritários.

Contudo, quando desmembramos os dados, verificamos que entre os

conselheiros do Conseg/Boqueirão, 60% disseram ser favoráveis ao respeito aos

direitos humanos, mas ao mesmo tempo, 60% afirmaram ser favoráveis à pena de

morte52.

Os dados relativos ao respeito aos direitos humanos e à pena capital são

importantes, tendo em vista que demonstram os valores sociais dos conselheiros ao

mesmo tempo em que nos sugere o que os conselheiros esperam da atuação da polícia

nos seus bairros. Como já dissemos no capítulo precedente, as polícias brasileiras

ainda agem pautadas na prática constante de desrespeito aos direitos humanos e de

violência letal, não obstante as reformulações na formação policial, a inserção no

ordenamento jurídico brasileiro de um conjunto de leis estabelecendo os critérios de

atuação dos aparelhos policiais e o surgimento de associações protetoras dos direitos

humanos, as quais têm exercido a função de controle externo das polícias, noticiando

os abusos por elas cometidos. Neste caso, uma instituição participativa, como é o caso

dos Consegs, poderia ser afetada por estes valores autoritários.

Neste sentido, perguntamos se os conselheiros tinham conhecimento da

prática de abusos policiais em seu bairro, sendo que 73,3% afirmaram que não. Se dos

dados relativos ao perfil socioeconômico dos conselheiros dos três Consegs analisados

nesta pesquisa concluímos que se trata de um perfil de “elite” – já que dotados de altos

capitais econômico e escolar – podemos supor que o desconhecimento da prática de

abusos policiais por parte dos conselheiros entrevistados se deve ao fato de que os

Consegs ainda não se instituíram como espaços representativos dos diversos setores

sociais existentes no bairro, sobretudo daqueles contra os quais a polícia geralmente

52 Isso pode ser percebido pela fala do presidente de um dos Consegs estudados que afirmou ser sim favorável ao respeito aos direitos humanos “desde que não seja para bandidos”.

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exerce sua violência, ou seja, contra pessoas pobres, jovens e negras53. Como vimos

acima, os Consegs, em sua maioria, são formados por pessoas cuja idade ultrapassa os

40 anos, sendo muito pouca a participação de jovens nestes espaços.

Relativamente à avaliação da polícia, encontramos entre os conselheiros

pesquisados 46,7% que entendem que a polícia é ótima ou boa e os mesmos 46,7%

que entendem que a polícia é regular ou péssima.

Em seguida, perguntamos aos conselheiros sobre o grau de confiança na

Polícia Civil e na Polícia Militar. Pelos dados obtidos, verifica-se que há maior

confiança na Polícia Militar do que na Polícia Civil. Assim, entre aqueles que confiam

muito ou apenas confiam na Polícia Militar, encontramos a significativa porcentagem

de 80%, ao passo que na Polícia Civil a distribuição de freqüências nos mostrou que

46,7 % confiam nesta instituição, não havendo nenhum conselheiro que confie muito54

(Tabelas 6).

Tabela 6 - Grau de Confiança nas instituições policiais

4 26,7%

8 53,3% 7 46,7%

2 13,3% 6 40,0%

1 6,7%

1 6,7% 1 6,7%

15 100,0% 15 100,0%

Confia muito

Confia

Confia pouco

Não confia

NR

Total

%

Grau de confiança na

Polícia Militar

%

Grau de confiança na

Polícia Civil

A avaliação até certo ponto negativa das polícias em geral, já que 46,7% as

vêem como regulares ou péssimas parece, a um olhar mais desatento, contrastar com o

53 Mesmo assim, encontramos pela análise da documentação mantida junto à Coordenadoria Estadual dos Conselhos Comunitários de Segurança da Secretaria de Estado da Segurança Pública do Paraná alguns registros e ofícios dos Consegs comunicando a prática de abusos policiais em seus bairros e denunciando alguns policiais. Pela natureza mesma da denúncia, tal medida se dá freqüentemente através do envio de ofícios dirigidos à SESP.

54 Somos levados a crer que tal fato se deve, pelos registros na atas das reuniões, à ausência da Polícia Civil na maior parte das reuniões dos Conselhos Comunitários de Segurança.

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45

alto grau de confiança nas polícias. Contudo, isso pode ser fruto da maior aproximação

dos conselheiros com os problemas cotidianos enfrentados pelos policiais, como falta

de recursos, de efetivo etc.

Este grau de confiança que os atores da sociedade civil e conselheiros dos

Consegs têm nas instituições policiais, principalmente na Polícia Militar, não vai,

contudo, refletir na mesma medida no grau de confiança nas outras instituições

democráticas. Como podemos observar pelos dados abaixo (Tabela 7), nenhum

conselheiro confia muito em nenhum dos três poderes, mas é ao Congresso Nacional

que se atribui o menor grau de confiança (86,7% dos que confiam pouco ou não

confiam).

Tabela 7 – Grau de Confiança nos três Poderes

1 6,7% 4 26,7% 7 46,7%

6 40,0% 9 60,0% 5 33,3%

7 46,7% 1 6,7% 2 13,3%

1 6,7% 1 6,7% 1 6,7%

15 100,0% 15 100,0% 15 100,0%

Confia

Confia pouco

Não confia

NR

Total

%

Grau de confiança no

Congresso Nacional

%

Grau de confiança no

Poder Executivo

%

Grau de confiança no

Poder Judiciário

Ora, como podemos, nesta linha de análise, acreditar na democracia

enquanto melhor modelo se não acreditamos nem confiamos nas instituições políticas

representativas? Ao mesmo tempo, talvez seja esta a motivação para o surgimento e o

fortalecimento, durante a década de 90, de novos espaços de participação, os quais

teriam o importante condão de melhorar a percepção que os cidadãos têm do sistema

político e das instituições políticas.

Após a análise dos recursos individuais e subjetivos dos conselheiros,

dedicar-nos-emos no próximo tópico à análise descritiva dos recursos organizacionais

dos Conselhos, deslocando assim o campo de abordagem dos personagens da

sociedade civil para a entidade participativa ao qual estão vinculados e a qual

representam.

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46

3.3. RECURSOS ORGANIZACIONAIS DOS CONSEGS

Neste momento empreenderemos, então, a análise descritiva dos

recursos materiais dos Conselhos Comunitários de Segurança dos bairros do

Guabirotuba, Tarumã e Boqueirão, compreendendo aqui seus recursos materiais e

políticos. Neste caso, além dos recursos materiais, humanos e financeiros existentes

nos Consegs, abordaremos as estratégias utilizadas pelos conselheiros para angariar

apoio de outras instituições a fim de tornar suas entidades mais fortes do ponto de vista

político.

No que concerne aos recursos financeiros, como já tivemos a oportunidade

de mencionar, os Consegs estudados não recebem recursos públicos para a

implementação de projetos de prevenção nos bairros nos quais atuam. Ao contrário, as

formas de obtenção de recursos se fazem por intermédio do comércio e do

empresariado local que apóia estas instituições55. Como nos relatou um conselheiro do

Conseg/Boqueirão: “O Estado não deu os meios; fica tudo por conta do cidadão. São

os membros da comunidade que têm que arcar com as despesas. Na sua missão [o

Conseg] é interessante, mas não tem como arcar com as despesas administrativas”.

Dos três Consegs pesquisados, apenas o Conseg do Guabirotuba possui sede

55 Uma das formas encontradas pelos Consegs para a obtenção de recursos é a associação a empresas locais que participam e apóiam financeiramente a entidade para a consecução de seus fins. Mais uma vez, dependendo do caráter comercial ou industrial do bairro, os recursos organizacionais acabam sendo formas de desigualdade entre os próprios Conselhos. É o caso, por exemplo, do Conseg/Batel que tem entre seus colaboradores o Banco ABN Amro Real S/A, o Colégio Dom Bosco Ltda, a Crystal Administradora de Shopping Centers Ltda, a Hotelaria Accor Brasil S/A, a Servopa S/A Com. e Ind., a Sociedade Educacional Positivo Ltda, entre outros casos que totalizam 38 empresas e estabelecimentos comerciais. Do aporte financeiro obtido junto a estes estabelecimentos, foi possível ao Conseg/Batel o patrocínio da mudança da 2ª Cia da Polícia Militar para o bairro do Batel, mesmo lugar onde funciona a sede do Conselho, a qual possui internet, um funcionário em período integral, computador etc. (site do Conseg/Batel). Podemos também citar o caso do Conseg/CIC que recebeu, a título de doação, três veículos que hoje fazem a vigia do bairro e, muitas vezes, fazendo as vezes da própria polícia. Por fim, os recursos financeiros são obtidos através do recebimento de porcentagem dos lucros de publicidade do jornal local (caso do Conseg/Tarumã) ou mediante a participação em eventos comunitários, como foi o caso da participação do Conseg/Boqueirão na festa junina realizada no bairro, em que esta entidade ficou responsável pela barraca de bebidas alcoólicas. Além do mais, a doação de dinheiro e de serviços pelos comerciantes locais são muito comuns.

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47

própria, mas mesmo assim se encontra desativada e sem infra-estrutura. Em todos eles,

as reuniões se dão em colégios públicos e privados, centros esportivos ou ruas da

cidadania existentes nos bairros.

Desmembrando os dados por Conseg, verificamos que entre os conselheiros

do Conseg/Boqueirão, todos declaram que suas entidades não possuem telefone, fax,

computador, internet ou veículo próprio ou qualquer um destes itens separadamente.

Com relação aos outros dois Conselhos, 80% declaram não haver também qualquer

destes itens acima nominados. Disso resulta um alto custo da participação em espaços

como estes, pois demanda, muitas vezes, recursos próprios dos conselheiros para o

exercício de suas atividades nestas entidades.

Como já foi dito anteriormente, os Conselhos Comunitários não possuem

canais próprios de publicidade, sendo comumente utilizado o jornal do bairro para

divulgar suas atividades, prestar contas e dar “dicas de segurança”. Nenhum dos três

Consegs possui também páginas na internet, embora o Conseg/Guabirotuba, até o

momento da realização da pesquisa, estivesse em fase de construção de um sítio desta

natureza.

Vejamos, contudo, se os poucos recursos materiais destas entidades são

compensados pelos recursos políticos porventura existentes. Neste caso, estávamos

interessados em saber se os Conselhos Comunitários de Segurança obtinham apoio de

outras entidades governamentais ou não-governamentais. Perguntamos, assim, aos

conselheiros se o Conseg ao qual pertenciam teria o apoio de instituições não-estatais.

Neste caso, 60% dos conselheiros dos Consegs dos bairros do Guabirotuba e do

Tarumã afirmaram ter sim o apoio de instituições não-estatais, ao passo que este

percentual cai para 40 % com relação ao Conseg/Boqueirão.

Trata-se, neste caso, do apoio de associações comerciais, clubes e igrejas do

bairro onde se localiza o Conselho, destacando-se aqui o Rotary Club, Associação

Comercial do Bairro e o Lions Club, onde existem, e de outros Conselhos apoiadores.

Quando analisamos a busca de apoio através do recurso a membros dos três

poderes e Ministério Público, verificamos que entre os membros do

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Conseg/Boqueirão, 60% já recorreram alguma vez a membros do Poder Legislativo

(federal, estadual ou municipal); 40% já recorreram alguma vez a membros do Poder

Executivo (federal, estadual ou municipal) e apenas 20% recorreram alguma vez a

membros do Poder Judiciário ou Ministério Público. No caso do Conseg/Guabirotuba,

80% disseram já ter recorrido alguma vez a membros do Poder Legislativo e do Poder

Executivo; 60% afirmaram já ter recorrido alguma vez a membros do Ministério

Público e 40% a membros do Poder Judiciário. Por fim, no Conseg/Tarumã, apenas

20% declararam já ter recorrido alguma vez a membros do Poder Legislativo, do

Executivo e do Ministério Público e 40% afirmaram já ter recorrido a membros do

Poder Judiciário. Vemos assim, que a desigualdade entre os três Consegs pesquisados

vai se manifestar na busca por apoio vis-à-vis outras entidades e membros dos três

poderes e Ministério Público. Neste caso, parece ser o Conselho Comunitário do bairro

do Guabirotuba aquele que mais ativamente busca recursos políticos para sua entidade

e aquele que apresenta melhores condições em termos de recursos materiais. Chama a

atenção também o fato de que os três Conselhos estudados dizem contar com o apoio

da Prefeitura de Curitiba, através de seus administradores regionais.

O ponto relativo aos recursos dos conselheiros e das entidades em si se

mostra relevante na medida em que permite analisar o peso de cada ator e de cada

conselho na arena decisória. Neste aspecto, é importante analisar até que ponto os

recursos disponíveis no âmbito dos Conselhos Comunitários de Segurança vão se

manifestar na dinâmica interna do processo decisório, salientando que nosso objeto é a

gestão conjunta da política de segurança pública e as atividades voltadas para a

prevenção ao delito, tendo por atores relevantes a sociedade civil organizada.

No próximo tópico, tentaremos abordar, desse modo, o processo decisório

dos Conselhos Comunitários. Até que ponto há deliberação, fruto de debates e de

discussões, muitas vezes permeada pelo conflito? Quais são os atores que se fazem

presentes nas reuniões e o que se discute nelas? Há co-gestão nas políticas de

segurança pública? São estas as questões que tentaremos responder a seguir.

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3.4. O PROCESSO DECISÓRIO NO INTERIOR DOS CONSEGS

Para analisar em sua amplitude a dinâmica política dos Conselhos

Comunitários de Segurança seria necessária a participação freqüente nas reuniões

durante uma gestão. Entretanto, um empreendimento como este resultaria num alto

custo, de modo que as atas das reuniões servem, neste caso, como boa medida para os

fins a que nos propusemos. Necessário dizer, contudo, que embora tenhamos

conseguido acesso às atas das reuniões dos Consegs estudados, pareceu-nos, muitas

vezes, que algumas delas apresentavam grande imprecisão quanto ao seu conteúdo,

não havendo ao menos menção do ator que iniciava o debate, do ator que prosseguia

com a palavra e da agenda pública, objeto da reunião.

Mesmo assim, entendemos que as atas, enquanto registro das reuniões,

servem como indicador do processo decisório nestas instâncias de participação, não

obstante os limites que elas apresentam.

Com efeito, analisando o ator que inicia os debates, verificamos que em

60,8% dos casos é o Presidente quem dá início e protagoniza a reunião, seguido de

31,4% de casos em que não há menção, pela leitura das atas, do ator que inicia os

debates, mas que sugere, pela freqüência com que encaminha a reunião e pela

observação participante que empreendemos, ser o Presidente. Somente em 7,8 % dos

casos um outro conselheiro deu início às reuniões.

Verificamos, ainda, que em apenas 41,2% das reuniões houve debates56, ao

passo que em 58,8% apenas um ator inicia a reunião e a conduz até seu término. Se

analisarmos, todavia, cada conselho separadamente, constatamos que entre os três

Consegs pesquisados, apenas o Conseg/Boqueirão apresenta alta porcentagem de

debates, muito embora seja o Conselho cuja gestão tenha perdurado por menos de 1

56 Entendemos que houve debate quando, pela análise da ata de reunião, mais de um ator toma a palavra, mesmo que seja sem discordar de algum aspecto levantado anteriormente. Isso, entretanto, não significa que não tenha havido intervenção de outros atores, mas tão-somente que pela análise formal da ata não há qualquer referência a este aspecto.

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50

ano (Tabela 8).

Tabela 8 – Existência de debates

8 88,9% 7 31,8% 6 30,0%

1 11,1% 15 68,2% 14 70,0%

9 100,0% 22 100,0% 20 100,0%

Sim

Não

Total

%

Existência de debates

Boqueirão

%

Existência de debates

Guabirotuba

%

Existência de debates

Tarumã

Bairros do Conseg

Isso se torna relevante na medida em que permite saber se as reuniões nos

Conselhos Comunitários são permeadas pela discussão em torno de assuntos

previamente acordados ou surgidos durante sua realização e, para tanto, necessário se

faz que seja um espaço de deliberação. Entretanto, em 56,9 % dos casos houve pauta

de discussão.

Seria, então, o caso de saber se as reuniões dos Consegs eram

predominantemente marcadas pelo consenso e harmonia ou se, ao contrário, conflitos

estiveram presentes. Neste aspecto, estávamos interessados em saber e quantificar até

que ponto houve contestação no âmbito das reuniões57. Assim sendo, pela

quantificação dos dados, somente em 7,8% das reuniões (quatro registros) houve

efetivamente a existência de contestação em que um ator discorda da fala do outro.

Isso demonstra que as gestões 2004/2006 pesquisadas foram marcadas por um espírito

de harmonia, sugerindo, no mais, que os Consegs não foram espaços de interesses

antagônicos dos diversos setores sociais do bairro, mas que, talvez pela

homogeneidade social, etária e econômica, um mesmo grupo com interesses comuns

dominou as gestões em tela. Quando desmembramos os dados por Conseg,

verificamos que novamente é no Conseg/Boqueirão onde encontramos o maior número

de registros onde ocorreram contestações (22,2% dos casos), chegando a nenhum caso

57 Podemos dizer que uma reunião é marcada pela contestação quando após a fala de um ator, aquele que se pronuncia posteriormente o faz sob um ponto de vista discordante. Tendo em vista se tratar de um espaço de representação comunitária, a contestação sugere que interesses antagônicos são representados e tutelados nestes espaços.

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51

no Conseg/Guabirotuba (tabela 9).

Tabela 9 – Existência de Contestação

2 22,2% 2 10,0%

7 77,8% 22 100,0% 18 90,0%

9 100,0% 22 100,0% 20 100,0%

Sim

Não

Total

%

Existência de

Contestação

Boqueirão

%

Existência de

Contestação

Guabirotuba

%

Existência de

Contestação

Tarumã

Bairros do Conseg

Como se trata de um espaço que tem como atores principais a sociedade civil

e os representantes da Polícia Civil e Polícia Militar, a deliberação em torno das

políticas de segurança pública somente teria sentido com a presença destes.

Novamente, este não foi o caso dos Conselhos pesquisados cuja presença de

representantes da Polícia Militar no cômputo geral foi de 27,5% e da Polícia Civil de

apenas 11,8 %. Desmembrando uma vez mais, tem-se o seguinte dado constante das

tabelas 10 e 11.

Tabela 10 – Presença da PM nas reuniões

6 66,7% 5 22,7% 3 15,0%

3 33,3% 17 77,3% 17 85,0%

9 100,0% 22 100,0% 20 100,0%

Sim

Não

Total

%

Presença da PM nas

reuniões

Boqueirão

%

Presença da PM nas

reuniões

Guabirotuba

%

Presença da PM nas

reuniões

Tarumã

Bairros do Conseg

Tabela 11 – Presença da PC nas reuniões

Desagregando os dados, percebemos que a Polícia Civil esteve presente

7 77,8%

2 22,2% 22 100,0% 20 100,0% 9 100,0% 22 100,0% 20 100,0%

Sim Não

Total

%

Presença da PC nas

reuniões

Boqueirão

%

Presença da PC nas

reuniões

Guabirotuba

%

Presença da PC nas

reuniões

Tarumã Bairros do Conseg

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apenas nas reuniões do Conseg/Boqueirão58, mas como vimos, sem que muitas vezes

tivessem ocorrido debates e contestações59.

Cabe ressaltar que em 11,8% das reuniões estiveram presentes representantes

da Prefeitura. Desmembrando novamente, verificamos que 33,3% das reuniões do

Conseg/Boqueirão contaram com a presença de representantes da Prefeitura, seguido

de 9,1% no Conseg/Guabirotuba e 5,0% no Conseg/Tarumã.

Por fim, cabe indagar a respeito do que se delibera no interior destes espaços.

Verificamos que entre os 51 registros, correspondendo a 51 reuniões dos Conselhos

Comunitários, mais de um assunto era objeto de discussão e de deliberação. Para fins

metodológicos, empreendemos então, a escolha de dois dos principais assuntos de

cada registro, obtendo assim um total de 102.

Tabela 12 – Principais assuntos de deliberação

Assunto Freqüência % Encaminhamentos 9 8,8%

Finanças 9 8,8%

Participação 10 9,8%

Diagnósticos de Problemas no bairro 12 11,8%

Eleições Internas 6 5,9%

Divulgação das ações 10 9,8%

Propostas e Projetos 19 18,6%

Prestação de Contas dos membros natos 5 4,9%

Problemas de efetivo e de viatura policial 5 4,9%

Controle Social 2 1,9%

Outros asuntos de menor relevancia 15 14,7%

Total 102 100%

Como podemos verificar, uma gama de assuntos é tratada no âmbito dos

Consegs, com destaque especial ao tempo dedicado em discussões em torno dos

58 Na análise das atas, abordamos indistintamente as reuniões ordinárias, realizadas de 90 em 90 dias, e as reuniões da diretoria.

59 Esses dados sugerem que talvez seja por esta razão que a Polícia Civil não possui o mesmo grau de confiança obtido pela Polícia Militar por parte dos Conselheiros pesquisados. Cumpre assinalar que em razão da distribuição geográfica e administrativa das Delegacias de Polícia e Cias. da Polícia Militar, os polícias são responsáveis por mais de um bairro e, conseqüentemente, por mais de um Conselho Comunitário de Segurança. Desse ponto de vista, os custos da participação dos membros natos também são grandes se cada unidade freqüentar todas as reuniões dos diversos Consegs dos quais fazem parte. Eis a razão pela qual se fala em setorização geográfica para o bom funcionamento do policiamento comunitário.

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projetos e propostas dos Conselhos Comunitários60 (18,6%).

Entretanto, é significativo o baixo percentual de encaminhamentos por parte

dos Conselhos, os quais em sua grande maioria se destinavam aos representantes da

Prefeitura de Curitiba e não à Secretaria de Segurança Pública, e o baixo percentual de

prestações de contas e controle social exercido pelos Conselhos face aos membros

natos.

Como pudemos ver, a partir de um ponto de vista geral, os Conselhos

Comunitários, embora tenham um relativo capital econômico, político e social, ainda

apresentam um fraco desempenho no que tange ao processo decisório em todos os seus

aspectos. Por esta razão, fez-se importante mostrar o que se discute nestes espaços de

públicos de participação.

As diferenças, como observamos ao longo destas páginas, surgem quando

desmembramos a análise a partir de cada Conselho per se. Mesmo assim, verifica-se

que os Conselhos diferem em termos de recursos, um tendo mais recursos do que o

outro em certo aspecto e menos em outro, mas todos se assemelham pela atuação

limitada no planejamento da segurança pública face às instituições policiais, à gestão

conjunta dos recursos destinados à segurança pública e à análise dos resultados

alcançados por determinada política adotada ou pelo seu conjunto.

Mesmo assim, perguntamos aos conselheiros suas percepções sobre a

atuação dos Conselhos ao quais pertencem e se esta era vista por eles como atuante.

Neste caso, 86,7% responderam que sim. Com isso, nas percepções destes atores, os

Consegs são espaços efetivos e atuantes. Mas de qual efetividade falamos?

Pelos dados expostos, ainda estamos longe de ver a sociedade civil

trabalhando conjuntamente com o Estado para a resolução de seus problemas mútuos.

Se, de um lado, a qualidade dos atores da sociedade civil e os recursos dos quais

60 Trata-se de projetos específicos de cada Conselho como, por exemplo, o projeto “Vizinho de Olho” do Conseg/Guabirotuba e o projeto “Vizinho Solidário” do Conseg/Boqueirão, entre outros.

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dispõem são imprescindíveis para a condução e institucionalização dos Conselhos

Comunitários de Segurança, de outro lado o Estado tem diante de si o desafio de

romper com os padrões atuais de atuação e, para tal fim, a abertura de espaços de

participação política é o caminho a ser seguido nos próximos anos. Contudo, para que

os Conselhos não sofram o processo de esvaziamento político, o Estado deverá

perceber que a participação comunitária na gestão é condição sine qua non na

otimização das políticas de segurança pública, melhorando assim a percepção e o grau

de confiança nas instituições policiais e na sensação de segurança, além de conduzir a

atuação dos aparelhos policiais para a resolução dos problemas, focando prioridades

conjuntamente estabelecidas e planejadas.

A ausência de policiais nas reuniões é indicativa de que uma reforma

administrativa e geográfica deve ser levada a efeito no âmbito interno das corporações

policiais, visando com isso a adequar a proposta de policiamento comunitário à

proposta de participação política comunitária, alterando-se, por conseqüência os

padrões atuais de policiamento, as práticas predominantemente repressivas e o modelo

de policiamento pautado na resposta às chamadas encaminhadas via rádio, até hoje

vigentes. Mas para isso, é imprescindível que reformas nos aparelhos policiais sejam

realizadas e que o processo decisório em políticas públicas de segurança seja

descentralizado.

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CONCLUSÕES

À guisa de conclusões, pode-se afirmar que são infindáveis os benefícios da

abertura dos assuntos públicos à sociedade civil, principalmente no tocante à

segurança pública. Se de um lado tal medida permite a união de esforços entre o

Estado e a sociedade civil para a resolução dos problemas da delinqüência e da

criminalidade, de outro lado é um poderoso instrumento de aumento da sensação geral

de segurança e do fortalecimento do grau de satisfação quanto ao serviço público

policial e da confiança das pessoas na instituição policial. Além disso, pode servir

como instrumento do controle social e da accountability das instituições policiais.

Se em alguns países, como pudemos ver ao longo deste trabalho, a reforma

da polícia, com a implementação do policiamento comunitário e o surgimento de

espaços de participação comunitários nas questões relativas à segurança pública

surgiram após crises, muitas vezes geradas pelas práticas de abuso policial, no Brasil a

emergência dos Conselhos Comunitários de Segurança coincidiu com o advento do

período democrático brasileiro.

Contudo, a institucionalização de programas mais ampliados de participação

popular nas políticas de segurança pública somente vai ter lugar na década de 90,

sobretudo diante da crescente criminalidade e da baixa legitimidade das instituições

policiais, marcadas que estavam – e ainda estão – por práticas autoritárias, sobretudo

diante de grupos minoritários. No mais, o estudo comparativo apresentado neste

trabalho bem demonstra que não há apenas um modelo de participação comunitária

nos assuntos relativos à segurança, sendo que uns enfocam mais o aspecto

interinstitucional enquanto outros dão mais atenção à participação popular. Em todos,

contudo, os obstáculos para a efetiva participação comunitária na gestão e no

planejamento das políticas de segurança estão presentes e impõem o (re)pensar do

modelo até então adotado de gestão policial, independentemente da configuração

político-administrativa vigente, seja com uma força policial municipal seja diante de

forças policiais eminentemente nacionais ou regionais.

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No Brasil, neste sentido, os problemas existentes não diferem daqueles

observados em outros países. Diante de uma cultura organizacional autoritária vigente

nas forças policiais – legado do regime anterior – e da centralização administrativa nas

políticas de segurança pública, a participação da sociedade civil no que concerne a

estas últimas ainda encontra barreiras que precisam ser superadas para que possamos,

efetivamente, falar numa governança democrática neste âmbito. Muito embora estes

tenham sido o espírito e a mens legis da Constituição Federal de 1988, não se previu

expressamente a criação de Conselhos Comunitários de Segurança. Estes resultaram

do esforço local da sociedade civil e somente na década de 90 vão receber a atenção de

parte dos governos estaduais, que vão incentivar e regular estas entidades, nascendo,

por conseguinte, Conselhos nos mais diversos Estados da federação brasileira.

No Estado do Paraná, embora os Conselhos Comunitários de Segurança

tenham sido normatizados durante o governo de Jaime Lerner, somente no governo de

Roberto Requião vão eles receber a regulamentação jurídica (Decrete 2332/03),

extinguindo-se, por sua vez, práticas antigas. Contudo, isso não significou que a

participação comunitária, através dos Consegs, tenha recebido incentivos financeiros e

materiais para a difusão de programas de prevenção, nem tampouco que eles tenham

se instituído como espaços de co-gestão das políticas de segurança pública. Ao

contrário, vão representar, no âmbito das políticas de reforma do Estado, a substituição

de investimentos públicos pelos investimentos privados, obtidos junto ao empresariado

local para a manutenção e conservação da infra-estrutura policial.

Entretanto, a compreensão dos atores da sociedade civil envolvidos neste

estudo – os conselheiros –, através dos recursos dos quais dispõem para a realização

das suas funções institucionais, torna-se uma via importante de análise, já que permite

compreender o peso político das suas entidades enquanto espaços representativos da

sociedade civil nas políticas de segurança pública. Procuramos, destarte, analisar os

Conselhos Comunitários de Segurança através dos recursos individuais e subjetivos

dos conselheiros e dos recursos organizacionais dos Conselhos, a fim de mensurar o

quão efetivos estes recursos se manifestam na dinâmica interna do processo decisório.

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Com efeito, os Conselhos Comunitários dos bairros do Guabirotuba,

Boqueirão e Tarumã são marcados por um perfil de “elite”, já que seus conselheiros

são dotados de altos capitais econômico e escolar. Ao mesmo tempo, verificamos que

os conselheiros são marcados em sua grande maioria por valores pautados no respeito

aos direitos humanos, requisito indispensável para o controle externo da atividade

policial. Sob o ponto de vista dos recursos subjetivos, viu-se neste trabalho que os

conselheiros pesquisados possuem uma intensa vida associativa, sobretudo em

associações de bairro, que alinhada à busca crescente por informação política, faz com

que os membros dos Consegs se percebam enquanto atores relevantes e capazes de

influenciar a política. Contudo, as resistências por parte dos atores governamentais é

um elemento que pode minar a auto-avaliação política e a existência mesma dos

Conselhos Comunitários de Segurança.

Quanto aos recursos organizacionais, os Conselhos Comunitários de

Segurança não dispõem de recursos financeiros públicos, nem de infra-estrutura para a

realização das suas atividades, sendo muitas vezes, compensados pela busca de apoio

de outras entidades privadas e do Estado, por intermédio dos Poderes Executivo,

Legislativo, Judiciário e do Ministério Público, muito embora, neste quesito, a

desigualdade esteja presente entre os próprios Conselhos per se.

Mas quando se analisa o processo decisório, conclui-se que ainda são falhos

os instrumentos de efetiva participação nas políticas de segurança pública, haja vista

que ele é marcado predominantemente pelo consenso nas políticas públicas e pela

ausência freqüente dos membros natos dos Consegs (Polícias Civil e Militar). Neste

sentido, os recursos individuais, subjetivos e organizacionais não vão se manifestar na

arena decisória dos Consegs, no sentido de ser um espaço de deliberação pautado pelo

debate e, muitas vezes, pela contestação, o que parece decorrer, entre outros fatores, da

centralidade decisória dos agentes policiais e do papel deixado pelo Estado a essas

entidades. No mesmo sentido, pela análise dos assuntos deliberados no âmbito dos

Consegs, a ênfase na discussão em torno de projetos próprios e a fraca atuação no

tocante ao controle social e nos encaminhamentos fazem com que estas entidades

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ainda não sejam atores relevantes nas tomadas de decisão em políticas de segurança

pública.

Para que haja uma mudança profunda na atual concepção de políticas de

segurança pública no âmbito das organizações policiais, é necessário que sejam

rompidos os atuais padrões de autoridade e de gerência autoritária, fazendo com que

estas organizações estejam mais próximas das demandas de participação democrática,

orientando seu trabalho em direção à solução de problemas e às prioridades locais,

percebendo, por conseguinte, que agindo sós, muito pouco será objeto de reforma e de

melhoria. Para tanto, a co-gestão, o planejamento e a análise conjunta dos resultados

alcançados já é um primeiro e importante passo.

Aos Consegs, por sua vez, cabem se instituir como espaços representativos

dos diversos setores sociais existentes nos bairros, sobretudo de minorias étnicas e

raciais, vítimas freqüentes da violência social e institucional/policial. Os desafios são

grandes, mas se compartilhados por todos vão se tornar, no fim das contas, pequenos.

Trata-se, como se vê, de um processo constante de construção democrática e da

cidadania.

Não se pode esperar, destarte, que crises institucionais e sociais sejam o

estopim da reorientação da segurança pública no Brasil e no Paraná. Tal medida deve

ser implementada pelo gradual e lento processo de amadurecimento político da

sociedade civil e do Estado, através da criação de espaços participativos de

planejamento e de gestão.

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