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DESENVOLVIMENTO DE ETIQUETAS EM BRAILLE PARA PERMITIR O USO DE EQUIPAMENTOS ELETRÔNICOS POR PESSOAS COM DEFICIÊNCIA VI- SUAL Ana Camila Rodrigues de Oliveira (UFPB) [email protected] Marcel de Gois Pinto (UFPB) [email protected] Janielle Mayse Guedes de Amorim (UFPB) [email protected] Natanna Glenda Soares Fernandes (UFPB) [email protected] Este artigo tem como finalidade apresentar o resultado da aplicação de um modelo de Processo de Desenvolvimento de um Produto (PDP) que tem como público alvo os portadores de deficiências visuais. O a- vanço da tecnologia com o desenvolvimentto e popularização de teclas sensíveis ao toque utilizados em muitos aparelhos eletroeletrônicos restringiu o uso desses equipamentos. Portanto, para permitir o uso da tecnologia sensível ao toque por toda a população foram analisados métodos para adaptar os comandos dos aparelhos. O estudo foi reali- zado no aparelhos de micro-ondas, visto que este é de grande impor- tância na rotina das pessoas e que a falta de independência dos defici- entes visuais para a realização das atividades diárias é um dos maio- res problemas enfrentados por essas pessoas. Dessa forma, a melhor maneira encontrada de adaptar este equipamento foi a partir do de- senvolvimento de etiquetas com inscrições em Braille. Para a realiza- ção deste trabalho foi necessário levantar dados de pesquisa de mer- cado e pesquisa tecnológica, definir a modelagem funcional, desenvol- ver as possíveis alternativas de solução e, a partir destas escolher a melhor entre aquelas geradas, e por fim, agregar estética, ergonomia e funcionalidade ao produto. Palavras-chaves: Desenvolvimento de Produtos, Portadores de defici- ências visuais, Teclas sensíveis ao toque. XXXII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Desenvolvimento Sustentável e Responsabilidade Social: As Contribuições da Engenharia de Produção Bento Gonçalves, RS, Brasil, 15 a 18 de outubro de 2012.

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DESENVOLVIMENTO DE ETIQUETAS

EM BRAILLE PARA PERMITIR O USO

DE EQUIPAMENTOS ELETRÔNICOS

POR PESSOAS COM DEFICIÊNCIA VI-

SUAL

Ana Camila Rodrigues de Oliveira (UFPB)

[email protected]

Marcel de Gois Pinto (UFPB)

[email protected]

Janielle Mayse Guedes de Amorim (UFPB)

[email protected]

Natanna Glenda Soares Fernandes (UFPB)

[email protected]

Este artigo tem como finalidade apresentar o resultado da aplicação

de um modelo de Processo de Desenvolvimento de um Produto (PDP)

que tem como público alvo os portadores de deficiências visuais. O a-

vanço da tecnologia com o desenvolvimentto e popularização de teclas

sensíveis ao toque utilizados em muitos aparelhos eletroeletrônicos

restringiu o uso desses equipamentos. Portanto, para permitir o uso da

tecnologia sensível ao toque por toda a população foram analisados

métodos para adaptar os comandos dos aparelhos. O estudo foi reali-

zado no aparelhos de micro-ondas, visto que este é de grande impor-

tância na rotina das pessoas e que a falta de independência dos defici-

entes visuais para a realização das atividades diárias é um dos maio-

res problemas enfrentados por essas pessoas. Dessa forma, a melhor

maneira encontrada de adaptar este equipamento foi a partir do de-

senvolvimento de etiquetas com inscrições em Braille. Para a realiza-

ção deste trabalho foi necessário levantar dados de pesquisa de mer-

cado e pesquisa tecnológica, definir a modelagem funcional, desenvol-

ver as possíveis alternativas de solução e, a partir destas escolher a

melhor entre aquelas geradas, e por fim, agregar estética, ergonomia e

funcionalidade ao produto.

Palavras-chaves: Desenvolvimento de Produtos, Portadores de defici-

ências visuais, Teclas sensíveis ao toque.

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1. Introdução

O acelerado avanço tecnológico, que trás diversos produtos para o cotidiano das pessoas, tem

deixando uma parte da população de lado: os deficientes visuais. O desenvolvimento e a po-

pularização das teclas sensíveis ao toque, presentes em muitos aparelhos eletro-

eletroeletrônicos, impedem que cegos e pessoas com visão subnormal utilizem esta tecnologia

por não existir a possibilidade de usar o produto usando outros sentidos além da visão.

Embora a legislação brasileira busque a inclusão dos portadores de necessidades no mercado

de trabalho, os meios para a realização das atividades não estão tendo a mesma ênfase, e em

boa parte estão ficando esquecidos. Contudo, os deficientes necessitam que as empresas pen-

sem um pouco mais na flexibilidade dos produtos de forma simples e econômica permitindo

que as pessoas com deficiência tenham acesso ao avanço tecnológico.

Dados do IBGE (Censo 2000) mostram que aproximadamente que 14,5% da população total

do Brasil, ou seja, 24,6 milhões de pessoas apresentaram algum tipo de incapacidade. Destes

16,6 milhões de pessoas apresentaram algum grau de deficiência visual e quase 150 mil se

declararam cegos. O levantamento anterior mostra as deficiências encontravam-se distribuídas

da seguinte forma: 48,1% apresenta deficiência visual; 22,9% deficiência motora; 16,7% defi-

ciência auditiva; 8,3% deficiência mental e 4,1% deficiência física.

Deste modo, verifica-se que o número de pessoas com deficiência no Brasil é relevante, e

dentre estes, o maior grupo é o de deficientes visuais. Com o objetivo de desenvolver um pro-

duto que permite a acessibilidade e que possa atingir um mercado mais amplo, optou-se por

trabalhar com esse grupo de pessoas.

Os produtos desenvolvidos especificamente para o público deficiente são denominados de

Tecnologias Assistivas (TA). Ou, de acordo com Cook e Hussey (1995), TA é uma ampla

gama de equipamentos, serviços, estratégias e práticas concebidas e aplicadas para minorar os

problemas funcionais encontrados pelos indivíduos com deficiências.

Para desenvolver o produto de que trata esse trabalho foram realizadas visitas à FUNAD

(Fundação de Apoio ao Deficiente), ASPADEF (Associação Paraibana de Deficientes) e ao

Instituto dos Cegos da Paraíba Adalgisa Cunha, ambas em João Pessoa-PB. Nestas oportuni-

dades, foi possível conhecer alguns utensílios já utilizados por essas pessoas para reduzir a

sua dependência nas atividades diárias, e identificar outras que ainda poderiam ser mais bem

trabalhadas por novos produtos de TA.

Com as informações obtidas, o trabalho de desenvolvimento foi direcionado para o ambiente

doméstico, com foco na necessidade dos deficientes visuais em executar as atividades diárias

sem precisar do auxílio de outra pessoa. Com a popularidade das telas sensíveis a toques, pro-

dutos que costumavam ser simples de serem manipulados pelos deficientes visuais, como te-

levisores e aparelhos de som, se tornaram difíceis, porque muitas vezes requerem navegação

por múltiplos menus que precisam ser vistos para que se possa usá-los de maneira efetiva.

Dentre as referidas telas sensíveis, podem-se encontrar aquelas em que é utilizado um painel

liso de controle sob o produto. Tais painéis geralmente têm de conteúdo estático, ou seja, seus

botões não mudam de função à medida que são feitas opções pelo usuário. Ao contrário disso,

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existem pelas de conteúdo dinâmico, onde cada decisão do usuário leva a uma nova configu-

ração de tela, como é o caso de telefones celulares ou caixas eletrônicos de banco.

Considerando essa natureza das telas interativas, esse trabalho visou desenvolver um produto

que tornasse acessível aos Deficientes Visuais as telas ou painéis de conteúdo estático a partir

do tato e a utilização do Braille, particularmente adaptado aos painéis de aparelhos de micro-

ondas para o aquecimento e preparo de alimentos.

2. Tecnologia Assistiva (TA)

O número de tecnologias utilizadas para ampliar a capacidade das pessoas com alguma defici-

ência vem crescendo muito nos últimos anos, de modo que é possível encontrar alguns catálo-

gos eletrônicos nacionais e internacionais com acervo muito vasto de produtos (e.g, ableda-

ta.com ou assistiva.org.br).

Segundo a ADA American with Disabilities Act, TA consiste em “qualquer item, peça de e-

quipamento, sistema de produto, seja adquirido comercialmente, modificado ou customizado,

utilizado para aumentar, manter ou melhorar capacidades funcionais dos indivíduos com defi-

ciência”. (BERSCH, 2008).

Bersch e Tonolli (2006) explicam que a TA “visa melhorar a funcionalidade de pessoas com

deficiência” e advertem que o termo funcionalidade não apenas como a habilidade em realizar

tarefas. Os referidos autores afirmam que, a fim de compreender e explicar a incapacidade e a

funcionalidade propuseram-se vários modelos conceituais, quais sejam:

- Modelo Médico – que considera a incapacidade como um problema da pessoa e que re-

quer assistência sob a forma de tratamento por profissionais de saúde;

- Modelo Social – considera a questão como um problema de integração à sociedade. A in-

capacidade não é vista como um atributo de um indivíduo, mas do ambiente social;

- Abordagem Biopsicosocial – baseia-se numa integração dos modelos anteriores, onde é

utilizada uma síntese das perspectivas de saúde: biológica, individual e social.

Bersch e Tonolli (2006) argumentam, ainda, que segundo a CIF (Classificação Internacional

de Funcionalidade), o modelo de intervenção deve ser biopsicosocial e diz respeito à inter-

venção em: (1) funções e estruturas do corpo – deficiência; (2) atividades e participação - li-

mitações de atividades e de participação; e (3) fatores contextuais - ambientais e pessoais.

Tais recomendações de intervenção vinculam-se com a aceitação do produto por parte do usu-

ário. Nesse sentido, Phillips e Zhao (1993) realizaram uma pesquisa para identificar quais as

maiores causas do abandono do uso de TA pelos deficientes. Como resultado, identificou-se

que os fatores mais importantes eram: a falta de consideração pela opinião dos usuários na

seleção do produto, aquisição fácil do produto, baixo desempenho do produto e mudanças nas

necessidades e prioridades dos usuários.

No que tange à tecnologia embarcada, percebe-se que a TA pode variar de itens de baixa tec-

nologia, tais como bengalas, muletas, barras de apoio, e andadores, a equipamentos de alta

tecnologia, tais como sintetizadores de voz, cadeiras de rodas elétricas ou aparelhos para sur-

dez. (BRUMMEL-SMITH e DANGIOLO, 2009). Em outras palavras, Leung et al. (2009)

afirmam que TA pode ser tão complexo, como uma comunicação informatizada ou tão sim-

ples quando a incorporação de alças em utensílios de cozinha.

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As deficiências que podem acometer as pessoas podem ser permanentes ou temporárias, como

no caso de acidentes ou cirurgias. Além disso, elas podem ser de cunho genético, factuais ou

relacionadas com o próprio processo de envelhecimento natural da população. Neste último

caso, as falhas no organismo vão ocorrendo e as capacidades vão sendo perdidas pouco a

pouco, inclusive a capacidade de enxergar.

Entretanto, apesar da variedade deficiências e de suas etiologias, Brummel-Smith e Dangiolo

(2009) afirmam que mais de 75% dos adultos portadores de alguma deficiência utilizam al-

guma tecnologia assistiva. O que indica que, mesmo que o número de deficientes diminua, o

envelhecimento da população e aumento da expectativa de vida levará a uma maior necessi-

dade equipamentos de auxílio.

Atualmente é possível encontrar existem algumas categorizações de TA realizadas por orga-

nizações, tais como: ADA – American With Disabilities Act, EUSTAT – Empowering Users

Through Assistive Technology, IPAT - Iowa Program for Assistive Technology e a ISO.

(BERSCH, 2008).

A ISO 9999:2002, por exemplo, que trata da classificação e terminologia de produtos assisti-

vos para pessoas com deficiências, apresenta onze categorias de TA, quais sejam:

- Produto de apoio para tratamento clínico individual - são produtos de apoio destinados a

melhorar, monitorizar ou manter a condição clínica da pessoa, não considerando os produ-

tos utilizados pelos profissionais de saúde;

- Produtos de apoio para treino de competências - dispositivos concebidos para melhorar as

capacidades físicas, mentais e sociais. Dentre estas capacidades, pode ser listada a comuni-

cação, a continência, contagem numérica, artísticas, entre outras;

- Órteses e próteses – são dispositivos aplicados externamente. As ortóteses visam modifi-

car as características estruturais e funcionais dos sistemas neuromuscular e esquelético e as

próteses substituem uma parte do corpo ausente;

- Produtos de apoio para cuidados pessoais e proteção - produtos de apoio para vestir e

despir, para proteção do corpo, ajuda para higiene pessoal, traqueostomia, ostomia e incon-

tinência, para medir as propriedades fisiológicas e para as atividades sexuais;

- Produtos de apoio para a mobilidade pessoal - incluem as ortóteses e próteses, produtos

de apoio para levantar e transportar, adaptações para carros, veículos de transporte indus-

trial, tapetes transportadores, etc.;

- Produtos de apoio para atividades domésticas - produtos de apoio para comer e beber,

desde a medição, preparação, ingestão e lavagem dos utensílios;

- Mobiliário e adaptações para habitação e outros edifícios - mobiliário (com ou sem rodí-

zios) para descanso ou trabalho. Acessórios para mobiliário e produtos de apoio e instala-

ções para adaptações de edifícios residenciais, de formação e educação;

- Produtos de apoio para comunicação e informação - dispositivos para ajudar a pessoa a

receber, enviar, produzir ou processar informação. Estão incluídos dispositivos para ver,

ouvir, ler, escrever, telefonar, sinalizar, avisar e tecnologia de informação;

- Produtos de apoio para manuseamento de objetos e dispositivos;

- Produtos de apoio para melhoria do ambiente, máquinas e ferramentas - visam ajudar a

melhorar o ambiente pessoal na vida diária, ferramentas manuais e máquinas motorizadas;

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- Produtos de apoio para atividades recreativas - dispositivos destinados a jogos, hobbies,

desportos e outras atividades de lazer.

O produto desenvolvido e apresentado neste trabalho trata-se de apoios para manuseamento

de objetos e dispositivos, também podendo ser classificado como apoio para atividades do-

mésticas. Deste modo, verifica-se que determinado produto pode atender à conceituação refe-

rente a mais de uma classificação da ISO 9999: 2002.

Por fim, sendo entendidos os aspectos relativos à TA, em especial a forma de atuação e aos

cuidados no desenvolvimento e prescrição do produto ao deficiente, torna-se possível definir

os aspectos conceituas vinculados com o ato de projetar o dispositivo propriamente dito.

3. Desenvolvimento de Produtos

O Processo de Desenvolvimento do Produto (PDP) é composto por uma série de atividades

que objetiva auxiliar a realização das tarefas de forma mais rápida, precisa e orientada para o

mercado. Para isso se faz necessário reduzir o tempo de desenvolvimento, custos, aumentar a

qualidade e, consequentemente, a produtividade.

Rozenfeld et al (2006) afirmam que o PDP se diferencia das atividades rotineiras de produção

e prestação de serviços em uma empresa por conta dos seguintes aspectos: importantes deci-

sões são tomadas no início do processo, quando o grau de incerteza é bastante elevado; difi-

culdade de alterar as decisões iniciais; as atividades seguem um ciclo projetar, construir, testar

e otimizar; a manipulação e geração de alto volume de informação e a existência de informa-

ções e atividades envolvendo diversas áreas da empresa.

Wheelwright e Clark (1992), afirmam que o PDP é um processo de negócios que promove a

interação dos setores gerencial, técnico e comercial. Para Baxter (2000), o PDP é uma ativi-

dade complexa, por requerer pesquisa, planejamento, controle e ainda envolver marketing,

engenharia de métodos e o uso de conhecimentos de estética e estilo. Para Rozenfeld et al

(2006), o PDP é como um conjunto de atividades realizadas em uma sequência lógica como

objetivo de produzir um bem ou serviço que tem valor para um grupo específico de clientes

Como é um processo estratégico para as organizações, passou a ser estudado e alguns autores

definiram metodologias específicas. Cada modelo de PDP tem suas particularidades. Os traba-

lhos desenvolvidos por Ulrich e Eppinger (2004) e o por Rozenfeld et al (2006), por exem-

plo, apresentam um número maior de fases, abrangendo desde o planejamento do produto até

o acompanhamento do produto no mercado.

O modelo de referência de Rozenfeld et al (2006) para o PDP (Figura 1) foi elaborado a par-

tir dos trabalhos de Wheelwright e Clark (1992), Pahl et al. (2005), etc., estando estruturado

em macrofases, fases, etapas e atividades.

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Figura 1 – Modelo de desenvolvimento de produtos

Fonte: Rozenfeld et al. (2006)

Nesta proposição as macrofases e fases são assim apresentadas: pré-desenvolvimento (plane-

jamento estratégico do produto e planejamento do projeto), desenvolvimento (projeto infor-

macional, projeto conceitual, projeto detalhado, preparação da produção e lançamento do pro-

duto) e pós-desenvolvimento (acompanhar produto e processo e descontinuar o produto).

Cada fase é composta por atividades que podem ser realizadas em paralelo ou quando a ativi-

dade anterior for concluída; o que permite maior flexibilidade e maior interação entre os seto-

res responsáveis. A quantidade e complexidade das atividades a serem desenvolvidas no PDP

vão depender da realidade de cada empresa.

Neste sentido, alguns fatores de adaptação são importantes: setor ou ramo de atividade, com-

plexidade e nível de inovação do produto, posição da cadeia de suprimentos e nível de interfe-

rência do cliente no projeto do produto. Levando em conta tal adaptabilidade prevista, para o

desenvolvimento das etiquetas em Braille, optou-se por tomar como base o modelo desenvol-

vido por Rozenfeld et al (2006), sendo apresentados nesse artigo apenas as atividades essen-

ciais ao entendimento do conceito do produto e do processo de projeto.

3.1. Projeto Conceitual

Segundo Rozenfeld, et. al. (2006), na fase do projeto conceitual é feita a busca, criação, repre-

sentação e seleção de soluções para o projeto. O processo de criação é livre de restrições, po-

rém direcionado pelos requisitos do cliente e auxiliado por métodos de criatividade.

Segundo os referidos autores, a fase conceitual é iniciada com uma modelagem funcional do

produto. Warell (2001) apresenta uma metodologia em que são explicitadas funções técnicas

(estruturai e operativas) e interativas (ergonômicas e comunicativas).

Após isso, são buscadas as soluções para cada função através da matriz morfológica. Este é

um método que busca encontrar a melhor solução para cada função do produto (visão cartesi-

ana) e a melhor solução total (visão sistêmica).

Nesta fase também são definidos os aspectos semânticos do produto, diretamente relacionados

com sua estética e ergonomia. É, também, o estudo das qualidades das formas no contexto

cognitivo e social e a aplicação do conhecimento aos objetos de desenho industrial.

Segundo Baxter (2000), a ergonomia tem por objetivo entender as relações entre as pessoas,

os artefatos e o meio-ambiente, usando conhecimentos de anatomia, fisiologia e psicologia,

direcionando isto ao projeto de objetos. Por fim, a representação das soluções pode ser feita

por meio de esquemas, croquis ou desenhos.

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4. Metodologia

Este trabalho pode ser classificado, quanto aos fins, em aplicado (devido seu valor prático) e

intervencionista (ligado à mudança da realidade), e, quanto aos meios, é um estudo de caso,

pois procura conhecer profundamente a realidade dos deficientes visuais de maneira pouco

ampla. (VERGARA, 1997).

A partir desta classificação e da revisão da literatura foi possível conceber um método para o

projeto do produto, sendo realizado em três fases: (1) conhecimento da realidade do portador

de PC, (2) identificação dos produtos eletrônicos existentes no mercado e a sua adaptação dos

deficientes visuais, e (3) desenvolvimento do conceito de um novo produto que supere as li-

mitações encontradas.

Na primeira fase foram realizadas visitas semanais as seguintes instituições: FUNAD (Funda-

ção de Apoio ao Deficiente), ASPADEF (Associação Paraibana de Deficientes) e ao Instituto

dos Cegos da Paraíba Adalgisa Cunha, ambas em João Pessoa-PB. Notou-se, através de con-

versas que a maior crítica dos deficientes estava relacionada com a dificuldade na realização

de atividades domésticas, especialmente quando se trata de novos aparelhos.

Posteriormente, foram identificados por meio de pesquisas em sítios da internet produtos ele-

troeletrônicos, sendo verificada a sua adaptabilidade ao uso por pessoas com limitações de

visão ou completamente cegas.

Finalmente, foram buscados métodos de adaptar os comandos dos aparelhos, em especial os

fornos de micro-ondas em que os deficientes visuais não pudessem operar, tendo por solução

a criação de etiquetas autoadesivas fixadas no quadro de comando. Toda investigação e de-

senvolvimento são apresentados no tópico se segue.

5. Desenvolvimento das etiquetas em Braille para equipamentos eletrônicos

Observou-se a necessidade do desenvolvimento de um produto que atingisse o maior público

alvo possível, fosse economicamente viável ao nicho desejado, e principalmente fosse de fácil

e prática utilização. Fazendo com que o desenvolvimento tecnológico caminhe alinhado com

a inclusão social.

Assim sendo, a melhor opção de produto foram as etiquetas em Braille para equipamentos

eletrônicos com tela sensível ao toque. Nas seções abaixo serão discutidos os mais importan-

tes tópicos referentes a esse desenvolvimento.

5.1 Identificação do problema de projeto

Durante a realização de visitas técnicas os deficientes visuais apresentaram diversas queixas

aos aparelhos com painéis lisos, cujas teclas só podem ser identificadas através da visão. Para

aqueles que usam o tato para identificar números e funções nos aparelhos a vida foi dificulta-

da com a introdução de nova estética e tecnologia.

Foram particularmente importantes, para os deficientes visuais, as dificuldades apresentadas

no uso do aparelho de micro-ondas, ainda que outros dispositivos como celulares, televisores,

aparelhos de DVD ou home-theater também se apresentassem como problema. No ponto de

vista da independência, o aparelho de micro-ondas permite ao deficiente visual independência

na alimentação. A comida pode ser preparada e congelada por pessoas com visão para deter-

minado período e vai sendo aquecida, sem ajuda, à medida que for necessária.

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No Quadro 1 são apresentados diversos modelos de forno de micro-ondas pesquisados. Como

se pode perceber pela análise, a maioria deles apresenta telas de comando em que não é possí-

vel identificar as teclas pelo simples toque.

Quadro 1 – Pesquisa de modelos de forno de micro-ondas

Fonte: Pesquisa direta

Embora não se possa considerar que é uma amostra representativa dos modelos existentes, a

lista constante no Quadro 1 apresenta o problema expresso pelos deficientes visuais. E, apesar

de alguns modelos possuem comandos com botões em alto-relevo, com formato e tamanhos

diferentes, a queixa não deixa de existir, pois muitos aparelhos já comprados ficam inutiliza-

dos por conta da inacessibilidade.

5.1. Especificação da oportunidade de desenvolvimento

Segundo Baxter (2000), a especificação da oportunidade deve desembocar na determinação

de uma proposta básica de benefício, ou seja, aquilo a que o produto se propõe a fazer. Para o

autor, tal definição deve ser feita por meio de pesquisas de mercado e tecnológica.

No caso do artigo em questão, as necessidades são de facilitar as atividades diárias dos defici-

entes visuais, buscando dessa forma um produto adaptado que proporcione independência e

interação social a essas pessoas.

Assim, para obtenção do projeto do produto, foram realizadas pesquisas de mercado e tecno-

lógicas, visitas a instituições em João Pessoa-PB, com o intuito de facilitar o desenvolvimento

do produto em questão.

5.2. Modelagem Funcional

Foi utilizada a tipologia de Warell (2001) para a análise funcional. Esta tipologia divide as

funções em técnicas e interativas, sendo as primeiras divididas em estruturais e operativas e as

últimas em ergonômicas e comunicativas. O resultado é apresentado no Quadro 2.

FUNÇÕES TÉCNICAS FUNÇÕES INTERATIVAS

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Funções Estruturais Funções Operativas Funções Ergonômicas Funções Comunicativas

Adaptar-se ao aparelho

de micro-ondas.

Possibilitar a identifica-

ção das teclas através do

toque.

Facilitar a utilização do

aparelho micro-ondas.

Transmitir informações

do conteúdo presente nas

teclas para o deficiente.

Quadro 2 – Modelagem Funcional

Fonte: Elaboração Própria

As funções das etiquetas em Braille são subdividas nas seguintes funções do aparelho micro-

ondas: funções básicas, programadas e ajustes pré-definidos, onde cada uma dessas funções

tem sua respectiva subdivisão, como é ilustrado na Figura 2.

Figura 2 – Funções do painel do aparelho de micro-ondas

Fonte: Pesquisa Direta

A lista de funções para as etiquetas Braille, constantes no Quadro 2, e as funções do aparelho

de micro-ondas, constantes na Figura 2, orientaram a busca de soluções do produto para o

atendimento aos requisitos dos clientes.

5.3. Desenvolvimento das alternativas de solução

Para que o produto atinja a sua função, este deverá ser corretamente colado com o auxilio de

outra pessoa. Neste caso, as funções mostradas anteriormente deverão ser guiadas por um

manual e a pessoa que vai comprar deverá acompanhar toda a colagem dos adesivos para que

nenhuma peça fique fora dos padrões desejados.

Função Princípios de soluções

1 2 3 4

Informar as fun-

ções básicas

Formato da tecla

diferenciada por

função do forno

Formato da tecla

diferenciada e

abreviação da fun-

ção em Braille

Abreviação da

função em Braille

Símbolos no lugar

do braile

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Informar funções

de programação

Formato da tecla

diferenciada por

função do forno

Alto relevo ao

redor do Braille

Abreviação das

funções de progra-

mação em Braille.

-

Informar as fun-

ções pré-definidas

Manual informando

o tempo cada item

está programado

Abreviações das

funções pré-

definidas.

Informação o tem-

po na própria tecla -

Quadro 3 – Alternativas de solução

Fonte: Elaboração Própria

A decisão do princípio de solução total do produto projetado, as Etiquetas em Braille para

aparelhos de micro-ondas, recaiu para a combinação presente na segunda coluna do Quadro 3.

Nesta sugestão foram previstos que o produto deverá ter (I) Formato da tecla diferenciada por

função do forno e abreviação da função em Braille, (II) Alto relevo ao redor do Braille e (III)

Abreviações das funções pré-definidas.

5.4. Arquitetura, ergonomia e estética do produto

A definição das funções do produto e seus princípios de solução tornaram possíveis determi-

nar como as suas partes constituintes irão interagir entre e com o aparelho. As etiquetas adesi-

vas não possuem interação mútua, o que da flexibilidade ao produto, podendo ser utilizado em

qualquer marca de micro-ondas visto que as funções principais estão em todos os aparelhos.

O maior objetivo das etiquetas para micro-ondas em Braille é tornar o uso deste aparelho a-

cessível aos deficientes visuais, para isso serão utilizados diferentes formatos para as funções

do aparelho bem como inscrições em Braille.

O painel numérico terá suas etiquetas no formato retangular, as funções Ligar/desligar e Pa-

rar/cancelar serão na forma de triângulo e as demais ovais para que o portador de necessida-

des especiais possa identificar qual função deseja acionar, relacionando-as com as demais e

consequentemente, diminuindo o número de erros ao acionar a tecla errada.

As etiquetas serão fabricadas em material transparente para que não modifique as característi-

cas estéticas do forno de micro-ondas e para que não interfira no manuseio deste por pessoas

não portadoras de deficiência visual, possibilitando-as enxergar as funções do painel, como é

ilustrado na Figura 2.

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Figura 2 – Protótipo Virtual

6. Considerações Finais

O desenvolvimento das etiquetas para micro-ondas em Braille é uma proposta de produto para

incluir os portadores de necessidades especiais no avanço tecnológico que participa cada vez

mais da vida das pessoas.

Com as pesquisas de mercado e de produtos realizadas foi verificado que muitos produtos de

utilidade doméstica ainda não foram adaptados para as pessoas deficientes visuais. A escolha

do desenvolvimento deste produto foi feita com base na necessidade percebida que os defici-

entes visuais têm de utilizar produtos com teclas sensíveis ao toque.

Para dar continuidade ao desenvolvimento do produto, observa-se a importância de apresentar

este projeto às instituições que foram anteriormente visitadas. Para tanto se faz necessária a

produção do protótipo real para testes e posterior lançamento do produto no mercado. Essa

etapa do PDP ainda não foi realizada, porém encontra-se em fase de desenvolvimento.

Vale ressaltar que a necessidade de utilizar produtos com painéis lisos não se limita apenas ao

aparelho de micro-ondas. Assim as etiquetas como as desenvolvidas podem ser adaptadas a

diferentes aparelhos eletroeletrônicos, permitindo que os deficientes visuais possam ser mais

independentes. As etiquetas podem até ser parte integrante e destacável dos manuais de ins-

trução dos equipamentos.

Referências

BAXTER, M. Projeto de Produto: Guia prático para o design de novos produtos. São Paulo.

Blücher, 2000.

BERSCH, R. Introdução à Tecnologia Assistiva. Centro Especializado em Desenvolvimento

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