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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS DESENVOLVIMENTO EM PERSPECTIVA COMPARADA: A EXPERIÊNCIA DO BRASIL E DA COREIA DO SUL TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO Bernardo Schirmer Muratt Santa Maria, RS, Brasil 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS

CURSO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS

DESENVOLVIMENTO EM PERSPECTIVA COMPARADA: A EXPERIÊNCIA DO BRASIL E DA

COREIA DO SUL

TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO

Bernardo Schirmer Muratt

Santa Maria, RS, Brasil

2014

 

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DESENVOLVIMENTO EM PERSPECTIVA COMPARADA:

A EXPERIÊNCIA DO BRASIL E DA COREIA DO SUL

Bernardo Schirmer Muratt

Trabalho Final de Graduação apresentado ao curso de Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, RS) como requisito parcial

para obtenção do grau de Bacharel em Relações Internacionais

Orientador: Prof. Dr. José Carlos Martines Belieiro Jr.

Santa Maria, RS, Brasil

2014

 

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Universidade Federal de Santa Maria Centro de Ciências Sociais e Humanas

Curso de Bacharelado em Relações Internacionais

A comissão examinadora, abaixo assinada, aprova o Trabalho Final de Conclusão de Curso

DESENVOLVIMENTO EM PERSPECTIVA COMPARADA: A EXPERIÊNCIA DO BRASIL E DA COREIA DO SUL

elaborado por Bernardo Schirmer Muratt

COMISSÃO EXAMINADORA:

José Carlos Martines Belieiro Jr., Dr. (Presidente/Orientador)

Daniela Dias Kuhn, Dra. (UFSM)

Danielle Jacon Ayres Pinto, Me. (UFSM)

Santa Maria, 11 de dezembro de 2014.

 

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, antes de mais nada, aos

meus pais, Alfeu e Ceres, que sempre se

dedicaram a mim com muita ternura e

amor, me dando todas as condições e

apoio incomensurável para que eu

pudesse realizar os meus sonhos.

À minha namorada, Gabriela, pelo

carinho, amor, compreensão nos

momentos de cansaço e por me fazer

“esquecer dos livros” quando

necessário.

Aos meus amigos de Santa Maria

que estiveram junto comigo todas as

horas durante esse grande desafio que

foi o curso de Relações Internacionais

da UFSM.

Aos meus amigos de Porto Alegre,

com os quais sempre pude contar nos

melhores e piores momentos.

Por último e não menos importante,

ao meu professor orientador José Carlos

Martines Belieiro Júnior, pela

disponibilidade e auxílio tanto na

monografia quanto nas seleções de

mestrado.

 

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RESUMO

Trabalho Final de Graduação Curso de Relações Internacionas

Universidade Federal de Santa Maria

DESENVOLVIMENTO EM PERSPECTIVA COMPARADA: A EXPERIÊNCIA DO BRASIL E DA CORÉIA DO SUL

AUTOR: BERNARDO SCHIRMER MURATT ORIENTADOR: JOSÉ CARLOS MARTINES BELIEIRO JR.

Data e Local de Defesa: Santa Maria, 11 de dezembro de 2014.

Este trabalho apresenta uma comparação entre as políticas econômicas de

desenvolvimento de Brasil e Coreia do Sul, com ênfase nas ações de seus bancos públicos de

desenvolvimento, BNDES e KDB, respectivamente, no setor automotivo. Através de uma

análise histórica desde a criação dos bancos até o fim dos anos 2000, este trabalho procura

mostrar a relevância da ação estatal para o desenvolvimento econômico dos países periféricos,

sendo na Coreia do Sul um exemplo de nação que superou a lacuna tecnológica frente aos

Estados centrais. Os capítulos estão divididos de maneira cronológica. O primeiro capítulo

trata do contexto político e econômico de Brasil e Coreia do Sul e das circunstâncias que

levaram à criação dos seus bancos públicos de desenvolvimento. O segundo capítulo aborda

os anos de 1950 até 1980, quando há grande similaridade no processo de industrialização

inicial dos dois países e uma taxa muito alta de crescimento de ambas as economias. O

terceiro capítulo apresenta o contraste entre o cenário recessivo brasileiro frente à crise da

dívida e o crescimento econômico coreano cada vez mais dominado pela indústria local, para

depois focar no processo de liberalização dos dois países. O quarto capítulo aborda e

economia de Brasil e Coreia após o processo de liberalização econômica, com ênfase no

Brasil, que passa a dar mostras de uma maior inserção estatal nas políticas econômicas.

Palavras-chave: Desenvolvimentismo. BNDES. KDB. Neodesenvolvimentismo.

 

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ABSTRACT

Graduation Term Paper International Relations Undergraduate Course

Santa Maria Federal University

DEVELOPMENT UNDER A COMPARATIVE PERSPECTIVE: BRAZIL AND SOUTH KOREA’S CASE

AUTOR: BERNARDO SCHIRMER MURATT ADVISOR: JOSÉ CARLOS MARTINES BELIEIRO JR.

Defence Date and Place: Santa Maria, December 11th, 2014.

This work presents a comparison between Brazil and South Korea’s development

economic policies highlighting the measures taken by their development banks, BNDES and

KDB, respectively, in the auto industry. Through a historical analysis starting at the creation

of both banks until the and of the 2000’s, this paper aims at showing the state’s action

relevance to peripheral countries’ economic development, having in South Korea the example

of a nation which surpassed the central nations’ technological gap. The chapters are

chronologically divided. The first chapter is about Brazil and Korea’s political and

economical context, and the circumstances that lead to the creation of their development

banks. The second chapter regards the 1950s and 1980s in which there is much similarity

between the beginnings of both countries initial industry and there is a very high growth rate

on their economies. The third chapter relates to the contrast between Brazilian recession after

the debt crisis, and a Korean economic growth more and more dominated by their national

giants. The fourth chapter concerns the two countries’’ economy after the liberalization

process, emphasizing Brazil, that starts to show a greater state insertion in its economic

policies.

Keywords: Developmentalism. BNDES. KDB. Neodevelopmentalism.

 

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 − Aprovações de financiamento do sistema BNDES por setor − 1952/1959 .......... 29 Gráfico 2 − Aprovações de financiamento do sistema BNDES por setor − 1961/1967 .......... 31 Gráfico 3 − Aprovações de financiamento do sistema BNDES por setor − 1968/1979 .......... 33 Gráfico 4 – Desembolsos do BNDES 2000-2011 (em bilhões de reais) .................................. 60 Gráfico 5 − Desembolsos KDB 2002-2008 (em bilhões de wons) .......................................... 60 Gráfico 6 – Distribuição percentual dos empréstimos do BNDES de acordo com o porte da

empresa (2002-2011) ........................................................................................... 62 Gráfico 7 – Vendas no setor automotivo (azul) e taxa de desemprego (preto) ........................ 63

 

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 −Principais medidas do plano de longo prazo do setor automotivo ......................... 26 Quadro 2 – Projetos aprovados pelo Geia – 1956-1957 ........................................................... 28 Quadro 3 – Mudanças feitas no plano original do MCI ........................................................... 43 Quadro 4 – Velho desenvolvimentismo x Novo desenvolvimentismo .................................... 58

 

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Taxas de juro real do sistema bancário e do mercado paralelo .............................. 20 Tabela 2 − Desempenho econômico comparado − 1950-1980 ................................................ 36 Tabela 3 – Recursos despendidos em pesquisa e desenvolvimento − 1975-1990 .................... 39 Tabela 4 – Exportações por destino (%) ................................................................................... 45 Tabela 5 − Desempenho econômico comparado − 1980-2000 ................................................ 51 Tabela 6 – Gastos sociais totais – governo FHC II (em R$ milhões) ...................................... 54 Tabela 7 − Gastos sociais totais – governo Lula (em R$ milhões) .......................................... 54 Tabela 8 − Desembolsos para o setor automotivo − 2002-2011 .............................................. 64

 

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 11 CAPÍTULO 1 − ANTECEDENTES ..................................................................................... 14 CAPÍTULO 2 − A FORMAÇÃO DOS BANCOS DE DESENVOLVIMENTO E SEU PAPEL DOS ANOS 1950 A 1979 NO SETOR AUTOMOTIVO .......................................... 18 2.1 A indústria automotiva do Brasil e da Coreia do Sul .................................................... 24 CAPÍTULO 3 − 1980-2000 CRISE DA DÍVIDA E PROCESSOS DE ABERTURA ...... 38 CAPÍTULO 4 − ANOS 2000 .................................................................................................. 54 4.1 A mudança de estratégia do Estado brasileiro para o desenvolvimento econômico .. 58 4.2 Os bancos de desenvolvimento de 2003 a 2010 .............................................................. 60 4.3 O setor automotivo nos anos 2000 ................................................................................... 62 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 67 REFERÊNCIAS ...................................................................................................................... 69

 

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INTRODUÇÃO

Os Estados brasileiro e coreano apresentam certas peculiaridades frente a outras

nações periféricas. Ambos os países obtiveram grau considerável de crescimento econômico a

partir da segunda metade do século XX e conseguiram uma grande diversificação do seu

parque industrial, tornando-se competidores internacionais e diminuindo sua diferença na

capacidade de acumulação de capital frente os Estados do centro.

Para que isso ocorresse, tanto Brasil quanto Coreia do Sul tiveram que lançar mão de

uma forte máquina estatal, que pudesse aproveitar as oportunidades advindas da conjuntura

em que os seus respectivos Estados se encontravam. Um dos mais notáveis instrumentos dos

países para o fomento de sua política econômica e industrial são os bancos de

desenvolvimento, que, no caso dos países estudados neste trabalho, são o Banco Nacional de

Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) do Brasil e o Korea Development Bank

(KDB). Eles serão o nosso principal objeto de estudo.

O estudo dos bancos de desenvolvimento é de fundamental importância para uma

análise da política econômica dos Estados de industrialização tardia. As inversões realizadas

por esses bancos são necessárias para o fomento da indústria nacional, substituindo a livre-

iniciativa burguesa, que geralmente é incipiente em países em desenvolvimento. Brasil e

Coreia do Sul são casos notáveis em que esses bancos foram, e continuam sendo,

fundamentais para o desenvolvimento nacional.

Este trabalho busca dar atenção à indústria automotiva, pois em ambos os países ela é

uma fonte de emprego e renda considerável. No caso coreano, o setor automotor é ainda mais

importante, pois consiste no primeiro caso de um país periférico que produz automóveis

capazes de concorrer com os veículos produzidos pelas nações centrais, como Estados

Unidos, Japão e os integrantes da União Europeia.

A força do Estado e as instituições criadas por ele moldam o modelo de

desenvolvimento dos Newly Industrialyzed Countries (NICs). Tanto o Brasil quanto a Coreia

do Sul contaram com taxas de crescimento superiores a 10% na década de 1970. Apesar de

suas políticas econômicas terem uma gênese semelhante, elas passam a diferir muito em sua

política industrial e seus graus de protecionismo, sendo o Brasil mais vinculado a parcerias do

Estado com multinacionais e a Coreia concentrada na formação de gigantes industriais

nacionais privados como a base de sua economia.

Como dois Estados que se mostram interventores na economia, os bancos de

 

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desenvolvimento de Brasil e Coreia representam burocracia estatal que atua na política

econômica. Essa burocracia é necessária para moldar e atingir a eficácia desejada pelo Estado

nos processos econômicos nos quais ele está inserido. A autonomia de ação de um país frente

às suas problemáticas de política econômica é representada pelo poder da sua burocracia

estatal e pela capacidade que esta tem de dialogar com diversos agentes econômicos,

procurando o cenário mais favorável possível para a nação.

Nesse sentido, este trabalho visa mostrar até que ponto as políticas do BNDES se

assemelham às do KDB, principalmente nos anos 2000, visto que recentemente o BNDES se

mostra como um dos principais instrumentos estatais de fomento econômico, buscando mais

força econômica interna e externamente para o país, semelhante de certa forma aos chaebols1.

O trabalho se apoia nas análises de Sebastião Carlos Velasco e Cruz para o caso

coreano, Bresser-Pereira para o caso brasileiro e Amsden, junto com Stephan Haggard e Peter

Evans, para uma análise comparada entre a política econômica dos dois países. Para esses

autores, não há uma divisão clara entre política e economia; sendo contrários ao pensamento

econômico ortodoxo, salientam a participação do Estado como agente indutor do crescimento

econômico.

O estudo desses autores predominantemente, além de artigos e revistas especializadas,

é a base para a realização deste trabalho. Além disso, dados primários − obtidos

principalmente de relatórios do BNDES e KDB, de modo a realizar um estudo comparado

consistente − representam a base metodológica para a realização do estudo.

Este trabalho está dividido em quatro capítulos. O primeiro capítulo versará sobre os

antecedentes históricos de Brasil e Coreia do Sul até a fundação de seus bancos de

desenvolvimento na década de 1950, bem como o processo de mudança social ocorrido nos

dois países para a implantação de um modelo desenvolvimentista. O segundo capítulo tratará

sobre as políticas dos bancos de desenvolvimento e o caráter da política desenvolvimentista

de cada país, analisando a indústria automotiva. O terceiro debaterá novamente as políticas de

fomento dos bancos públicos frente ao setor automotor, mas agora com ênfase na segunda

crise do petróleo e suas consequências no início da década de 1980 até o período neoliberal

dos anos 1990 e as reformas ocorridas no Brasil e na Coreia do Sul. O último capítulo

1Sobre chaebols ver o capítulo 2. 2 Para Zaibatsu ver: SOBRINHO, Barbosa Lima. Japão: O Capital se faz em casa. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1973. 3 A partida dos japoneses criou um vácuo nas relações econômicas externas e na administração interna. Entre 1944 e o fim de 1946 o número de estabelecimentos manufatureiros caiu 44 por cento, o desemprego manufatureiro caiu cerca de 60 por cento. A produção industrial total em 1948 foi um quinto da de 1940, e os preços no varejo quase dobraram entre 1946 e 1947. O comércio no pós-guerra diminui para níveis muito baixos,

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discutirá, principalmente, a mudança de abordagem da política econômica brasileira após o

esgotamento da agenda neoliberal e a Coreia do Sul pós-crise, focando nas ações dos bancos

públicos no desempenho da manufatura automotiva.

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CAPÍTULO 1 − ANTECEDENTES

Brasil e Coreia são dois países de aspectos econômicos semelhantes no que diz

respeito ao seu desenvolvimento. Primeiramente, deve ser deixado claro que ambos são ex-

colônias e tiveram sua produção econômica inicial voltada ao mercado externo, baseada na

exportação de produtos primários.

Como colônia de Portugal e, posteriormente, no período imperial e na República

Oligárquica, o Brasil concentrou-se como agroexportador, tendo como seu principal produto o

café. Esse arranjo econômico oligárquico beneficiava apenas uma parcela ínfima da

população, que era a dos proprietários de terra. O modo de produção vigente tornava inviável

a formação de um mercado interno eficiente, visto que os únicos que tinham poder de

consumo eram os latifundiários que consumiam bens importados da Europa; o restante da

população vivia de subsistência, produzindo artesanalmente os seus bens de consumo.

Com a abolição da escravatura em 1888 e a proclamação da República em 1889, há

um impulso no mercado interno, que reside na vinda de mão de obra assalariada para trabalhar

na produção cafeeira. Com essa nova classe assalariada, surge um mercado interno, ainda que

incipiente, no Brasil. No início do século XX, principalmente no período da Primeira Guerra,

há um surto industrial na região Sudeste, impulsionado pela crise europeia e por uma nova

burguesia urbana derivada da elite cafeeira paulista, que passa a empreender a industrialização

do café e de bens de consumo não duráveis, o que configura a industrialização brasileira até o

fim da década de 1920.

Ex-colônia japonesa, a Coreia primeiramente foi a base para a produção do arroz que

era exportado para o Japão. Com o aumento do poderio industrial dos nipônicos, parte de sua

indústria migrou para a Coreia e junto dela veio a burocratização nos moldes japoneses, com

uma nova hierarquia, diferente da coreana, que era mais antiquada, baseada nos costumes

confucionistas, que valorizavam o trabalho público e a hierarquização da sociedade, ajudando

na formação de uma burocracia coesa (VELASCO E CRUZ, 2007).

A colonização japonesa teve três fases, a primeira de exploração para o fornecimento

de produtos primários, no caso o arroz. Em 1919, após protestos nacionalistas, houve a

garantia de direitos civis aos coreanos e a transformação da região em plataforma industrial

para o império japonês, caracterizando a segunda fase de colonização. Já em 1937, começa a

terceira etapa, que mescla a tentativa de anulação da identidade nacional coreana e o

aprofundamento da industrialização colonial, que passa a receber a indústria química e

 

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siderúrgica e outros setores da indústria pesada de base. Todas instaladas pelos zaibatsu2,

assim é colocado o modelo industrial japonês na colônia.

O exército, a polícia e os setores produtivos eram compostos por nativos. Muitos dos

coreanos influentes e ricos, fundadores de chaebols, pertenciam a essa classe, como o grupo

LOTTE, que foi fundado no Japão por coreanos (HAGGARD, 1990). Os chaebols são grupos

industriais de origem familiar fundamentais no processo de acumulação coreano. Para

Velasco e Cruz (2007, p. 209), os chaebols eram um:

Conjunto de firmas com atuação em diferentes mercados de produtos, sob controle empresarial e financeiro comum, a diversificação é um traço inerente aos grupos econômicos, como às grandes empresas industriais modernas. Em ambas o mecanismo de mercado dá lugar à hierarquia.

Os chaebols serão tratados com mais profundidade no decorrer do trabalho.

Mesmo com essas características sociais, a Coreia lutava por seu nacionalismo. Com a

derrota japonesa na guerra em 1945, houve uma forte organização de cunho nacionalista e, um

mês depois, era proclamada a República Popular da Coreia (RPC), que planejava uma forte

reforma social, com o confisco de terras e empresas japonesas.

Assim, surgiu o Partido Democrático Coreano, baseado em proprietários rurais,

empresários antigos membros da burocracia colonial, que, com a ajuda dos Estados Unidos,

dissolveram os comitês populares. No pós-1945, é importante destacar a fuga da indústria

coreana com a derrota japonesa, o que forçou medidas de protecionismo econômico na Coreia

pós-guerra civil.

The departure of the Japanese created a vaccum in external economic relations and domestic management. Between 1944 and the end of 1946 the number of manufacturing establishment dropped by 44 percent, manufacturing employment by nearly 60 percent. Total industrial output in 1948 was one-fifth of the 1940 level, and the retail prices almost doubled between 1946 and 1947. Postwar trade dwindled to very low levels, crating severe balance-of-payments difficulties. Protection and Exchange controls were not so much chosen as impose by events. (HAGGARD, 1990, p. 54).3

2 Para Zaibatsu ver: SOBRINHO, Barbosa Lima. Japão: O Capital se faz em casa. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1973. 3 A partida dos japoneses criou um vácuo nas relações econômicas externas e na administração interna. Entre 1944 e o fim de 1946 o número de estabelecimentos manufatureiros caiu 44 por cento, o desemprego manufatureiro caiu cerca de 60 por cento. A produção industrial total em 1948 foi um quinto da de 1940, e os preços no varejo quase dobraram entre 1946 e 1947. O comércio no pós-guerra diminui para níveis muito baixos, criando severas dificuldades na balança de pagamentos. Proteção e controles cambiais não eram uma escolha na medida em que eram necessários no contexto. (tradução nossa).

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Como no pós-guerra a Coreia foi divida no paralelo 38, entre Estados Unidos (sul) e

União Soviética (norte), havia planos de unificar o país, mas não houve consulta aos coreanos

sobre os rumos nacionais, o que trouxe fortes protestos e, com a forte postura anticomunista

do sul, os comitês dissolvidos pegaram em armas e atacaram Seul. Começava, assim, a Guerra

da Coreia.

O principal aspecto que devemos ressaltar desse conflito para o presente trabalho é de

que, durante a ofensiva do norte, que deixou o general Mac Arthur encurralado, foi realizada

uma grande reforma agrária no sul, que era predominantemente rural. Assim, a classe rural,

que já era enfraquecida desde a colonização japonesa, passa a ser virtualmente dissolvida,

pois as reformas foram mantidas sob tutela dos Estados Unidos. Com o armistício em 1953,

Syngman Rhee (1948-1960) é mantido presidente da Coreia do Sul e tem os Estados Unidos

como seu principal aliado.

A questão da ausência de uma classe rural forte é determinante para entender a

diferença na industrialização entre Brasil e Coreia do Sul. No Brasil, as elites rurais foram o

principal impasse para a realização de políticas industrializantes mais profundas. Em 1929,

com a crise internacional, a elite cafeicultora sofre sua pior crise e coloca em xeque o modo

de produção que predominava no Brasil. O forte federalismo trazido pela chamada “Política

dos Governadores”, que, segundo Bresser-Pereira (2003), eram mais fortes que a União, mas

menos poderosos que os coronéis locais, era uma constante na República Velha e a

predominância de Minas Gerais e São Paulo no poder deixou outras elites nacionais

fortemente descontentes. Bresser-Pereira afirma que o Brasil até 1930 era “semicolonial”.

O que caracteriza politicamente o Brasil semicolonial é o domínio de uma pequena oligarquia de senhores de terra, que tem na organização estatal e no capitalismo internacional, respectivamente, o seu principal instrumento e a sua razão de existência. No regime a um só tempo feudal e capitalista que então vivíamos, o domínio político cabe por definição ao proprietário de terra. (BRESSER-PEREIRA, 2003, p. 37).

O setor militar – responsável pela proclamação da República – também não estava

satisfeito com a fragmentação nacional e, por meio das revoltas tenentistas, expressa sua

insatisfação com a república do “Café com Leite”. Getúlio Vargas (1930-1945; 1951-1954),

formado na escola militar, adepto dos ideias positivistas e governador do Rio Grande do Sul,

que era um estado das elites dissidentes, perde a eleição para Júlio Prestes (candidato da

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situação). Ao acusar o processo eleitoral de fraude e com o apoio das elites nordestina e

mineira, toma o poder no país na Revolução de 1930.

Essa revolução quebra com o poder cafeicultor no processo decisório nacional. Isso é

muito importante, pois a partir desse ponto o poder aristocrático-oligárquico brasileiro vai ser

mínimo perto do que fora. Com isso, em 1932, há uma tentativa de revolução por parte dessas

elites e classes médias tradicionais, para tirar Vargas do poder. Diante disso, o Governo

Federal faz um acordo com essas elites e passa a comprar o café, queimar o excedente para

manter o preço e exportá-lo. Apenas o fato de o governo ser simpático à industrialização já

difere fortemente de seus predecessores.

Em 1942, Vargas lança a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), que, além de

unificar as leis do trabalho urbano, faz com que os sindicatos sejam vinculados ao Ministério

do Trabalho e, consequentemente, ao governo. Já na Coreia, as leis trabalhistas existiam, mas

quase nunca eram cumpridas. A busca de Vargas pelo desenvolvimento nacional batia de

frente com a questão da indústria de base, mais particularmente a siderurgia.

Após tentativas frustradas de sociedade com empresas estrangeiras e de fazer com que

as siderúrgicas existentes suprissem a demanda nacional, o governo não obteve sucesso.

Estando sem alternativas, Vargas busca auxílio financeiro dos Estados Unidos, então

empenhados na Segunda Guerra, para construir uma usina siderúrgica. Sendo inicialmente

negada, o presidente busca ajuda alemã. O jogo de barganha de Getúlio lhe rendeu frutos e,

com o auxílio americano, foi instalada a primeira siderúrgica integral da América Latina, a

Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em 1941, dando um passo fundamental na superação

do modelo agrário-exportador.

Vargas usou a ocasião do esforço de guerra para elaborar uma política de industrialização, objetivo para o qual se encaminhava desde 1937, se bem que até 1940 ele ainda não se houvesse empenhado a fundo no desenvolvimento industrial sistemático. Em 1943, Vargas anunciou com orgulho que, com empresas como usinas de ferro e aço, fábricas de minérios, o Brasil estava caldeando ‘os elementos básicos para a transformação de uma vasta e esparsa comunidade agrícola em uma nação capaz de prover as suas necessidades fundamentais’. (SKIDMORE, 1982, p. 68-69).

A burocratização do Estado e a criação de instituições para reger a economia nacional,

feita na Coreia ainda no período colonial e no Brasil com Vargas, são as maiores semelhanças

entre esses países no período descrito. Aí estão as bases para a industrialização e o

aprofundamento do Estado nas relações econômicas industriais, para superar o vácuo

manufatureiro com relação às nações desenvolvidas.

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CAPÍTULO 2 − A FORMAÇÃO DOS BANCOS DE DESENVOLVIMENTO

E SEU PAPEL DOS ANOS 1950 A 1979 NO SETOR AUTOMOTIVO

No pós-guerra civil, com o território destruído, a Coreia passa a necessitar de ajuda

externa para se reerguer, momento em que se torna determinante a ajuda estadunidense para a

economia coreana. No contexto da Guerra Fria, a Coreia do Sul se configura como um aliado

estratégico na política externa americana para a Ásia. O recém-formado país não era apenas

uma aliado ideológico na visão americana, mas também seria um novo mercado para suas

Empresas Transnacionais (ETNs). O governo de Rhee passa a receber pressão dos Estados

Unidos, para transferir o que restava da indústria japonesa à iniciativa privada.

Assim como a terra e a infraestrutura de transporte e comunicações, com a derrota japonesa no campo de batalha, as propriedades industriais e comerciais japonesas na Coreia passaram todas ao controle do Usamgik (U. S. Army Military Government in Korea). Tratava-se de um patrimônio respeitável, composto por mais de 2.500 empresas (cf. Jones & Sakong, 1980, p.30). Em agosto de 1948, essas propriedades foram transferidas ao recém-criado governo coreano, que passou a ser pressionado por Washington para que procedesse rapidamente à sua privatização. (VELASCO E CRUZ, 2007, p. 225).

Ao lançar o Korea Reconstruction Bank (que é rebatizado de Korea Development

Bank) em 1954, para receber o capital proveniente dos americanos, está concretizado um

sistema de financiamento baseado na poupança externa, que irá caracterizar o padrão de

desenvolvimento coreano. O banco foi fundado em um momento em que os Estados Unidos

forçavam a implantação de reformas “pró-mercado”. Assim como o KDB, diversos bancos

públicos “especiais” iam sendo criados para atender a outros nichos da economia, como é o

exemplo do Agriculture Bank, que mais tarde se tornou a National Agricultural Cooperatives

Federation (NACF).

Os bancos comerciais existentes logo depois do pós-guerra eram muito pequenos e

recorriam ao Banco da Coreia como emprestador de última instância. Com isso, o governo

começou a estabelecer tetos para os empréstimos no setor privado. A partir desse ponto,

começa a relação de forte proximidade entre os bancos e o setor empresarial coreano

(CASTRO, 2009). O KDB também passa a proporcionar auxílio aos empresários que foram

selecionados por Rhee para ficar com o espólio japonês.

 

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Rhee manejou a transferência dos ativos estatais para constituir um gigantesco sistema de clientela, em cujo núcleo estava um seleto grupo de velhos e novos empresários. Além da transferência quase gratuita de propriedades públicas, esse sistema envolvia ainda a garantia de lucros aos grupos favorecidos, pela concessão de crédito a taxas de juros negativas e pela conclusão de contratos sem concorrência e em condições privilegiadas. (VELASCO E CRUZ, 2007, p. 225).

No caso do Brasil, a gênese do seu banco de desenvolvimento se dá no governo

democrático de Vargas, que havia voltado ao poder em 1951, após o governo de Eurico

Gaspar Dutra (1945-1950). Vargas negocia com os Estados Unidos a formação de uma

comissão mista de ajuda, a Comissão Mista Brasil Estados Unidos (CMBEU).

Através dela, é feita uma promessa de financiamento de 22 bilhões de cruzeiros pelo

Banco Interamericano de Reconstrução e Desenvolvimento (Bird) e é criado o Banco

Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) em 1952, para gerir os recursos

provenientes do Bird, direcionando-os à indústria de acordo com os interesses do governo

(SKIDMORE, 1982). No entanto, o valor total não chegou ao BNDE, forçando o banco a

trabalhar com menos capital, o que tornou mais dificultosa a implantação e o financiamento

na indústria doméstica.

De acordo com Luciano Martins (1985), o Banco Mundial e o Eximbank exigiam o

comprometimento de recursos internos equivalentes ao aporte em moeda estrangeira, além da

garantia de que os recursos assim reunidos fossem empregados de maneira racional. O

emprego dos recursos de maneira “irracional” seria a política nacionalista do governo Vargas,

como a criação da Petrobras, que ainda estava em discussão na época.

Em síntese: o novo organismo seria o locus de um novo tipo de ação administrativa e, simultaneamente, um polo de poder. Após longo debate parlamentar, o Banco é criado em meados de 1952, sob forma de uma autarquia subordinada ao Ministro da Fazenda e dispondo da garantia de poder contar com recursos próprios (o adicional do Imposto de Renda, entre outros), por um período de cinco anos. A esses recursos de origem interna se deveriam somar os provenientes do prometido financiamento internacional. (MARTINS, 1985, p. 86).

Os maiores expoentes desse setor industrial coreano, que são também os setores

privilegiados pelo governo, são os chaebols. Velasco e Cruz (2007) afirma que esses grandes

conglomerados tiveram sua origem no governo de Syngman Rhee. A classe rural dominante

se encontrava nas cidades depois da reforma agrária que foi feita durante a guerra. Como

Syngman Rhee necessitava de apoio, ele estabeleceu a clientela com essa classe e alguns

outros empresários que já empreendiam durante o período colonial. De acordo com Velasco e

20

Cruz (2007), vinte dos trinta maiores chaebols foram formados no governo de Rhee entre

1948 e 1960. Esses grandes grupos coreanos dão os primeiros passos no processo de

substituição de importações (PSI). Green (1992) apresenta uma exata caracterização da

dimensão desses conglomerados:

A typical chaebol consists of 25–40 subsidiaries under a family-controlled holding company, which are engaged in a wide range of activities: shipping, construction, textiles, food processing, retailing, heavy machinery, electronics, consumer goods, chemicals, and so on. Each of the largest conglomerates also includes a general trading company. As a group they are very highly leveraged, and are extremely dependent on bank loans rather then equity capital. (GREEN, 1992, p. 422).4

Como observado por Green, as holdings coreanas são muito dependentes de

empréstimos e o KDB foi um dos principais agentes do seu financiamento. O governo de

Rhee traçava objetivos para os grupos industriais cumprirem, e a oferta de crédito era feita a

juros muito baixos e a longo prazo. Graças à estatização do sistema bancário em 1961, já sob

o comando de Park Chung Hee, o Estado oferecia condições para que os grupos atendessem

aos objetivos nacionais e facilitava a sua diversificação. As empresas agraciadas com

empréstimos e os emprestadores tinham uma relação muito segura, pois contavam com forte

apoio do Estado também nesse aspecto.

The ultimate borrower was committed to repay the loan, and bear any Exchange risk, but he had the backing of both the KDB and BOK that, in the event of his default, the loan would be repaid. United States assistance to, and support of, Korea undoubtedly gave further assurance that Korea’s external financial commitments would be met. In addition to all of this, the U.S. and Japanese governments granted various types of investments guarantees to their nationals who made loans to, or invested in, Korea. Thus the risk of default for the lender was practically negligible, while the Korean borrower had assurances of support, not only from domestic banking institutions, but also the central bank and the Economic Planning Board (COLE; PARK, 1983, p. 60-61 apud CASTRO, 2009, p. 30).5

4 Um chaebol típico consiste em 25 a 40 subsidiárias pertencentes a uma holding de administração familiar, as quais se dedicam a uma variada gama de atividades, navegação, construção, têxteis, alimentação, varejo, maquinário pesado, eletrônicos, bens de consumo, produtos químicos etc. Cada um dos maiores conglomerados ainda possuía uma trading company. Como grupo, eles possuíam forte poder de barganha e eram extremamente dependentes em empréstimos bancários, em vez de capital próprio. (tradução nossa). 5 O devedor de final estava comprometido a pagar o empréstimo e arcar com qualquer risco cambial, mas ele tinha o apoio do KDB e do BOK (Bank of Korea) no sentido de que, mesmo que não pudesse pagar, o empréstimo seria quitado. A ajuda estadunidense e o apoio para a Coreia, sem dúvida, deram mais segurança de que os compromissos financeiros externos coreanos seriam cumpridos. Além disso, os governos dos EUA e do Japão disponibilizavam diversos tipos de garantias para as empresas nacionais que emprestassem ou investissem na Coreia. Portanto, o risco de calote pelo mutuário era praticamente não considerável, pois o devedor coreano tinha apoio não só dos bancos domésticos, mas também do Banco Central e do EPB. (tradução nossa).

21

No entanto, essas vantagens eram praticamente restritas aos chaebols. Pequenas

empresas que estavam fora dos planos e objetivos do governo não eram agraciadas com as

mesmas facilidades, tendo que pedir socorro a um mercado paralelo de crédito, com juros não

regulados, como pode ser observado na tabela 1. Além de proteger o grande capital local da

concorrência das pequenas e médias empresas domésticas, o Estado também protegia esses

setores da concorrência das transnacionais.

Tabela 1 – Taxas de juro real do sistema bancário e do mercado paralelo Ano Empréstimos bancários (gerais) Mercado paralelo (crubmarket) 1962 -3,4 -- 1963 -14,3 23,1 1964 -15,0 31,4 1965 20,2 52,6 1966 11,9 44,2 1967 10,8 30,8 1968 9,1 39,9 1969 8,0 36,4 1970 7,2 35,2 1971 11,6 30,1 1972 -7,2 19,7 1973 -1,2 26,0 1974 -14,6 8,0 1975 -9,7 16,6 1976 -1,5 22,8 1977 -1,9 21,8 1978 -2,0 21,1 1979 -0,7 23,1 1980 -6,3 19,2

Fonte: Song (2003, p. 190 apud VELASCO E CRUZ, 2007, p. 215).

O BNDES, por sua vez, sofre com a falta de recursos, já mencionada, que se dá por

razões políticas. As políticas de fomento da indústria nacional não eram vistas com bons

olhos pelos organismos financeiros internacionais nem pelos idealizadores da comissão

mista, que buscavam uma cooperação com os Estados Unidos e uma maior abertura da

economia brasileira. Após serem reduzidos a um terço do prometido, os financiamentos

externos cessam em 1958 (MARTINS, 1985).

22

A partir desse período, em que o banco, quase virtualmente desativado, passa a contar

com menos recursos, o seu caráter institucional passa a ser moldado de forma mais notável.

Visando à sobrevivência da instituição, são criados quadros intermediários, que fazem

alianças políticas dentro e fora do aparelho estatal. Na ausência de capitais, o banco passa a

acumular conhecimentos e a tecer estratégias de ação global, desenvolvendo técnicas de

análises de projetos a partir da ideia de subdesenvolvimento e com a abordagem estruturalista.

Esses conceitos foram resultantes da cooperação Cepal-BNDES estabelecida ainda em 1953

(MARTINS, 1985).

Os quadros iniciais do Banco se constituem e se consolidam, portanto, pensando gestalticamente os problemas brasileiros, independentemente nas diretorias políticas que lhe são impostas, e, ao mesmo tempo, se dotam daquilo que constitui o recurso político por excelência da tecnocracia: o controle da informação. Recurso este, por assim dizer, ampliado, pelo próprio fato de que a abordagem ‘estrutural’ levava o Banco a reunir a informação econômica antes segmentada e dispersa por vários órgãos de administração. (MARTINS, 1985, p. 87, grifo do autor).

O fato de o BNDES ser uma autarquia na época faz com que o recrutamento e o

treinamento do seu pessoal sejam menos sujeitos a intervenções e influências do poder

central. Desse modo, o banco passa a funcionar como uma think-tank, passando a ter um

caráter institucional diferenciando, presente antes apenas em quadros como o Itamaraty e o

Banco do Brasil. Esses fatores foram de grande importância para o BNDES executar um papel

fundamental no Plano de Metas do governo de Juscelino Kubitschek (JK) e lançar-se em uma

campanha com a finalidade de angariar mais recursos.

De fato, os compromissos táticos em benefício de uma estratégia; a luta interna entre facções em torno de concepções distintas de desenvolvimento e, ao mesmo tempo, a formação de um esprit de corps capaz de manter a unidade básica do organismo para efeitos externos; a procura de afirmação de sua personalidade própria e autônoma; a confrontação com o Governo sempre que aquela personalidade era percebida como ameaçada. (MARTINS, 1985, p. 93-94).

Em 1960, com a deposição de Rhee, um breve governo republicano liderado por Chang

Myon, entre 1960 e 1961, e a chegada de Park ao poder em 1961, a industrialização nacional

passa a ser liderada pelo presidente em si. Para isso, Park Chung Hee cria o Economic

Planning Board (EPB). Esse órgão foi formado por burocratas que não haviam tido muita

influência nos governos de Rhee e Chang Myon. No EPB, estavam concentrados os poderes

de orçamento e planejamento no mesmo ministério.

23

The EPB took over planning functions from the Ministry of Reconstruction and budgetary functions from the Bureau of Budget in the Ministry of Finance. It was also granted control over foreign borrowing and direct investment. The screening of foreing investment applications and ability to guarantee foreign loans gave it a powerful tool in shaping the sectoral distribution of investment. (HAGGARD, 1990, p. 65).6

Essa concentração de poder gera a autonomia necessária à burocracia estatal para

implantar as medidas econômicas necessárias, diferente dos governos anteriores, em que o

processo de substituição de importações foi implantado, mas era tido como corrupto e lento,

sendo esses alguns dos motivos para o golpe militar em 1961. Vale destacar que o EPB, na

época de sua formação, era composto por desenvolvimentistas (HAGGARD, 1990). Assim

como o BNDES, o EPB passa a ser um órgão com um insulamento burocrático de forte

importância para atingir as metas de desenvolvimento do país.

A burocracia estatal de Park trouxe um maior grau de protecionismo na economia do

país. O know-how e a tecnologia necessários ao crescimento industrial advinham de acordos

de assistência técnica e licenciamento de tecnologia, ao contrário do Brasil, onde provinham

basicamente através de Investimentos Externos Diretos (IEDs), para que o país pudesse ser

mais atrativo, pois não detinha a mesma poupança externa da Coreia. Tudo era

supervisionado pelo Estado nesse quesito e tinha que ser negociado com o governo,

devendo-se especificar o valor do capital, os níveis e o tipo de tecnologia a ser transferida,

assim como deveria ser feito com joint venture.

A fim de proteger e facilitar a propriedade e a produção, o Estado coreano não aprovava um investimento estrangeiro se ele fosse concorrer com um produtor doméstico. Em paralelo a essa política, nenhuma firma estrangeira poderia assumir o controle ou comprar uma firma coreana... Se uma empresa coreana quisesse vender sua operação, o Estado requeria que o comprador fosse nacional da Coreia. No curso da pesquisa para este estudo, só consegui documentar um caso de firma coreana comprada por investidor estrangeiro. (MARDON, 1990, p. 111-138 apud VELASCO E CRUZ, 2007, p. 217).

O então presidente, Park Chung Hee, tinha forte simpatia por grandes projetos de

capital intensivo liderado pelo Estado, que tinham como objetivo tornar a economia interna

autossuficiente. Sua atuação no exército japonês fez com que pudesse participar do

planejamento estatal na ocupação militar na Manchúria. Park era inspirado pelos modelos de

6 O EPB tomou para si as funções de planejamento do Ministério da Reconstrução e as funções orçamentárias da Secretaria do Orçamento no Ministério das Finanças. Também foi dado controle sobre empréstimos externos e investimento direto. A avaliação dos investimentos externos e a habilidade de garantir empréstimos estrangeiros deram ao EPB uma ferramenta poderosa para moldar a distribuição de investimentos setoriais. (tradução nossa).

24

desenvolvimento da União Soviética e do Japão da Segunda Guerra e queria um projeto

semelhante para a Coreia do Sul. Por mais que os militares coreanos fossem anticomunistas,

eram extremamente nacionalistas, e um projeto nacional-desenvolvimentista de indústria

própria, mesmo que não visto com bons olhos pelos Estados Unidos, foi adotado pelos

militares (LEE, 2002).

In any case, Park had a familiar model for Korea to follow in war time Japan, and this militarized model left an indelible mark on the path of economic development that remains even today. As a result of his preference for capital-intensive industries even at the early stage of economic development, the auto industry became the major concern of state’s economic policymakers. (LEE, 2002, p. 128).7

2.1 A indústria automotiva do Brasil e da Coreia do Sul

Com a intenção de consolidar o desenvolvimento liderado pelo Estado, Park tomou

diversas medidas, como a criação do já citado EPB e a nacionalização de todos os bancos

comerciais, para realizar uma política de empréstimos em longo prazo. O foco imediato do

governo é a industrialização visando às exportações, pois no parque industrial coreano ainda

predominava a indústria leve. A indústria mais intensiva voltada à exportação seria a solução

para a deterioração do balanço de pagamentos. Todavia, o setor automotivo não teve um apoio

contundente nos anos 1960, com poucos objetivos claros.

O setor automotor começa montando kits CKD e SDK sob licença, e a indústria

automotiva exemplifica de forma bastante precisa o processo de assimilação tecnológica e

obtenção de know-how para o fomento da indústria nacional nesse setor. Um breve histórico

das principais indústrias do setor automotivo coreano pode ilustrar essa afirmação.

Em 1962, é lançada a Lei de Proteção da Indústria Automotiva. Essa lei foi fruto de

lobby feito pelo diretor da Korean Central Intelligence Agency (KCIA) em benefício da

Nissan Motors, que tinha parceria com a coreana Senara Motors, visando ao nascente

mercado da Coreia do Sul.

A legislação previa que a importação de carros estava proibida, montadoras teriam

isenção de impostos e peças e componentes estavam isentos de taxas de importação. A

7 De qualquer maneira, Park tinha no Japão pós-guerra um modelo que lhe era familiar para a Coreia seguir, e esse modelo militarizado deixou uma inconfundível marca no caminho do seu desenvolvimento econômico que continua até hoje. Como resultado da preferência de Park por indústrias de capital intensivo mesmo em estágios inicias de desenvolvimento econômico, a indústria atomotiva se tornou o maior interesse dos policymakers econômicos do Estado. (tradução nossa).

25

primeira linha de montagem da Coreia do Sul começou em 1962, com kits vindos do Japão.

Na época, havia apenas 20% de conteúdo nacional nos carros; nos anos 1970, passou a 90%,

graças aos incentivos dados pelo governo (GREEN, 1992).

A indústria automotiva coreana tem três gigantes escolhidas pelo governo: Hyundai,

Kia e Daewoo. A Hyundai começou com a construção civil e foi selecionada no governo de

Park Chung Hee para ser a produtora naval de navios-tanque, construindo o maior estaleiro do

mundo na década de 1970, em Ulsan (VELASCO E CRUZ, 2007).

A Hyundai entrou no setor automotivo em 1967, como montadora de veículos da Ford

sob licença, com assistência técnica da mesma. Já nos anos 1970, passou a produzir as partes

localmente, através de engenharia reversa, sem a ajuda da Ford. O motor era importado do

Japão, fornecido pela Mitsubishi, visto que as empresas coreanas não tinham conhecimento

suficiente para produzir motores mais sofisticados.

A Daewoo começou no setor em 1972, quando comprou a Saehan Motors, que era

resultado de uma joint venture com a General Motors (GM) e a coreana Shinjin Motors. Mais

tarde, a empresa adquiriu a outra metade da Shinjin Motors, que passava por dificuldades

financeiras. A companhia passou a montar carros da GM no país pela década de 1970.

A Kia começou como fabricante de bicicletas na década de 1940, depois se expandiu

para o setor de motos e caminhões de três rodas. Entrou no mercado de carros na década de

1970, montando modelos antigos da Fiat e da Peugeot. No entanto, o governo inicialmente

proibiu o grupo de entrar no nicho de carros de passeio, para passar a fabricar veículos

militares; mais tarde, a companhia receberia o monopólio sobre vans e caminhões pequenos.

O mercado coreano de automóveis, até o fim dos anos 1970, focava-se basicamente no

mercado interno. O negócio não era muito lucrativo, com margens de 70% de lucro, e apenas

20% da produção era exportada para a América Latina e o Oriente Médio (GREEN, 1992).

Swings on demand reflected periodic crises in the economy – inflation, shortages of foreign Exchange, and high interest rates, which depressed demand and/or made it difficult to import necessary parts. Starting in 1974, however, the industry experienced five years of growth which saw production rise more than a tenfold, from 9,069 cars in 1974 to 112,314 in 1979. (GREEN, 1992, p. 414).8

A Hyundai foi a primeira fábrica de automóveis da Coreia do Sul a produzir o seu

8 Flutuações na demanda refletem crises periódicas na economia – inflação, escassez de câmbio e altas taxas de juros, as quais diminuíam a demanda e/ou tornavam dificultosa a importação de peças necessárias. Começando em 1974, no entanto, a indústria testemunhou cinco anos de crescimento, nos quais viu a produção crescer mais de dez vezes, de 9.069 carros em 1974 para 112.314 em 1979. (tradução nossa).

26

próprio modelo, sem a licença de empresas estrangeiras. Sendo um dos maiores chaebols do

país, o grupo aproveitou-se da sua diversificação industrial para resistir às pressões das

concorrentes internacionais e do mercado. Em 1972, começou a construção da sua fábrica

principal, sendo construída pela Hyundai Construction Company.

De acordo com Lee (2002), a Hyundai sempre teve o interesse de ser uma concorrente

de respeito frente às principais líderes no setor que estava se instalando. Vide o exemplo da já

citada questão dos estaleiros, Velasco e Cruz (2007) aponta que a Hyundai Heavy Industries,

que teve amplo apoio de Park em “situações adversas”, consolidou-se como a maior

construtora naval do mundo e até hoje se mantém nesse patamar.

A diversificação do grupo ajudou a empresa e arcar com os custos de forma mais fácil.

O seu financiamento se deu não apenas por bancos do governo, mas a Hyundai também foi

autorizada a pedir empréstimo a outros bancos, conseguindo cerca de US$ 72 milhões de

bancos do Japão, França e Inglaterra. O governo entrou com o empréstimo de US$ 100

milhões para a construção de uma fábrica própria, capaz de montar 56 mil carros por ano. Lee

comenta sobre a ajuda do Estado para promover a indústria no setor automotivo:

To promote the auto industry, the government also exempted the direct tax on the construction of factories and equipment investment and provided long-term loans at a much lower interest rate than that applied to general loans from banks. Yet the most important source of financing during the latter half of the 1970s was foreign borrowings. (LEE, 2002, p. 191).9

As medidas tomadas pela Hyundai Motor Company estavam ligadas às medidas

estabelecidas pelo governo, que, em 1974, decretou o “The Long-Term Develpment Plan for

the Auto Industry” (Quadro 1), que consistia em um plano de longo prazo para a indústria

automotiva, a qual, até então, não havia sido agraciada. Entre as suas medidas, estava o apoio

do governo a empresas escolhidas, no caso a Hyundai, Kia e GM Korea. Elas teriam que

produzir, em economia de escala, modelos produzidos totalmente de forma local, com

motores menores que 1.500 cc, e foi estabelecida a produção mínima de 50 mil carros por ano

para cada fabricante. A produção deveria ter no mínimo 95% de conteúdo nacional.

9 Para promover a indústria automotiva, o governo também acabou com o imposto direto dos investimentos na construção de fábricas e equipamentos e forneceu empréstimos a longo prazo com uma taxa de juros muito mais baixa do que as aplicadas pelos outros bancos. Contudo, a mais importante fonte de financiamento nos anos 1970 foi o empréstimo externo. (tradução nossa).

27

Conteúdos

Veículos

completos

1. Nacionalização completa dos carros de passeio em 1975 (conteúdo nacional de 95%).

2. Exportações de 75 mil veículos em 1981.

3. Estabelecimento de um sistema especializado e de produção em massa de acordo com o tipo

de veículo.

4. Desenvolvimento de carros de passeio “subcompactos” (modelo original dentro do preço de

US$ 2.000, produção de no mínimo 50 mil carros por montadora).

Peças

1. Promoção distinta da de empresas de montagem e empresas de peças.

2. Princípio da especialização: uma firma produz apenas um tipo de peça.

3. Encorajamento de formação de joint ventures com fabricantes de peças estrangeiras (a

participação de parceiros estrangeiros não pode exceder 50%).

4. Construção de um parque industrial em Changwon.

5. Provisão de variados incentivos financeiros e tributários.

Quadro 1 −Principais medidas do plano de longo prazo do setor automotivo Fonte: Kiet (1982 apud LEE, 2002, p. 198).

Os planos e incentivos do governo residiam na fabricação de um carro popular, como

podemos observar nas especificações do plano. O Ministério do Comércio e Indústria tutelou

as três principais fabricantes (Hyundai, GM Korea e Daewoo) a produzir carros pequenos.

Graças aos seus investimentos e à resposta aos estímulos estatais, nos fins de 1974 a Hyundai

já superava a produção da GM Korea e se distanciou ainda mais desta com a introdução de

um modelo doméstico, o Pony.

Os automóveis coreanos, que, durante a década de 1960, abasteciam o mercado

doméstico e eram feitos por montadoras em Complete Knock-Down (CKD), em produção

baixa, deram lugar aos veículos domésticos produzidos em escala. Com isso, a partir de 1974,

com o plano de longo prazo do governo em apoio às montadoras, a Coreia do Sul passa a

modificar o paradigma da divisão internacional do trabalho no quesito de produção

automotora (LEE, 2002).

Ao contrário do Brasil, que cedeu às exigências da Ford em 1966, para se implantar

com mais facilidade no mercado interno, a Coreia protegeu o seu mercado. Os grupos

selecionados do governo detinham capital suficiente para a empreitada. Enquanto os

brasileiros contavam com transnacionais para produzir automóveis, ainda sendo de conteúdo

nacional, faziam com que a indústria média crescesse (AMSDEN, 2009). Já a Coreia do Sul

foi capaz de fomentar sua própria indústria.

28

A indústria automotiva brasileira, em 1952, consistia apenas em montagem de kits

CKD importados e em uma indústria de autopeças voltada apenas para a reposição.

Anteriormente, todos os veículos eram importados, mas, com o desequilíbrio na balança de

pagamentos e com o aumento da demanda por automóveis, logo houve uma proibição da

importação de veículos completos, o que apenas fez com que kits passassem a ser montados

no Brasil. Sobre a implantação da indústria automotiva, Peter Evans (2004) afirma que o

Estado brasileiro foi pioneiro entre os periféricos:

O Brasil foi pioneiro no Terceiro Mundo em estabelecer uma produção local de automóveis. Mesmo que a indústria implantada na década de 1950 tenha tomado a forma de subsidiárias de transnacionais com capital 100% estrangeiro, o papel do Estado foi crucial. Sem a capacidade do Estado de oferecer proteção contra a competição externa, além do apoio necessário, as companhias transnacionais de automóveis teriam considerado a perspectiva de investir na produção local algo entre muito arriscado e completamente insensato. (EVANS, 2004, p. 130-131).

Antes da proibição da importação, havia três fábricas de automóveis no Brasil: a

Volkswagen, a Willys-Overland e a Mercedes-Benz. Porém, a produção girava em torno de

20 mil unidades ao ano (BNDES, 2002b). As montadoras presentes no país não objetivavam

grandes escalas de produção, o que começou a mudar com o governo de JK e o chamado

“Plano de Metas” (1956-1961).

No entanto, já em 1954 a Fábrica Nacional de Motores (FNM) obteve licença para

produzir veículos da Alfa Romeo com componentes nacionais e passou a ser financiada pelo

BNDES. Em 1958, foi a vez da Vemag de São Paulo, que passou a produzir veículos da

DKW; em 1959, a Willys passou a produzir jipes. De modo semelhante à indústria coreana,

montadoras brasileiras tinham licença para produzir veículos de montadoras estrangeiras com

participação local no capital.

O primeiro veículo fabricado no Brasil foi a Kombi, da Volkswagen, e contou com

20% de financiamento do BNDES, pois o desembolso era proporcional ao montante de

conteúdo local utilizado na produção dos veículos. O banco julgava necessário que as

empresas estrangeiras tivessem participação nacional e estava disposto a financiá-las

proporcionalmente a essa participação.

No plano econômico do governo JK, a indústria automotiva foi considerada básica e

foi uma das únicas medidas que não contemplavam a infraestrutura. Com a construção de

estradas e a demanda de veículos crescendo, foi criado o Grupo Executivo da Indústria

Automobilística (Geia), que passou a coordenar a implantação da indústria. Caminhões de

29

carga eram prioritários para o Geia, e os veículos de passeio eram muito importantes para o

governo, pois seriam emblemáticos para a população.

O Brasil foi o primeiro país periférico a estabelecer medidas de conteúdo local na sua

produção de veículos, a fim de acabar com o problema na balança de pagamentos e fomentar

a indústria local. Logo foi estabelecida uma série de medidas para as montadoras instaladas

em território nacional.

As montadoras tinham de seguir um cronograma de conteúdo interno extremamente ambicioso para serem elegíveis para a plena gama de subsídios financeiros. A cada ano seus veículos tinham de conter uma porcentagem maior de componentes comprados internamente. Em 1º de julho de 1960, os caminhões e veículos utilitários precisavam ter 90% de conteúdo nacional, e os jipes e carros, 95%. [...] Ao oferecer os incentivos financeiros somente por um período limitado, o plano punha as iniciantes retardatárias em desvantagem competitiva. (SHAPIRO, 1994, p. 81-83 apud AMSDEN, 2009, p. 275).

As empresas tinham que apresentar seus projetos para o Geia; uma vez aprovados,

poderiam receber os incentivos do BNDES. Após as medidas do governo, 18 empresas

apresentaram projetos, dos quais 11 foram aprovados e implantados (Quadro 2).

Empresas Produtos

General Motors

Ford Motor Co. Exports

Mercedes-Benz do Brasil

Toyota do Brasil

Volkswagen do Brasil

Vemag S.A. Veículos e Máquinas Agrícolas

Scania-Vabis do Brasil

Fábrica Nacional de Motores

International Harvester Máquinas

Willys-Overland

S.A. Ind. de Motores, Caminhões e Ônibus. Simca do Brasil

Caminhão médio e leve

Caminhão médio e leve

Caminhão médio e pesado e ônibus

Jipe

Utilitário e carro de passeio

Utilitário, jipe e carro de passeio

Caminhão pesado

Caminhão pesado e carro de passeio

Caminhão pesado

Jipe, utilitário, carro de passeio

Carro de passeio

Quadro 2 – Projetos aprovados pelo Geia – 1956-1957 Fonte: Shapiro H. Engines of Growth (apud BNDES, 2002b).

Não era proibido financiar as empresas estrangeiras, mas era fundamental analisar o

grau de investimento nos setores desejados pelo governo e se essas prioridades poderiam ser

atingidas pelas empresas estrangeiras. Foi decidido que o setor automotivo poderia ter a

participação de empresas estrangeiras, mas, como afirmamos anteriormente, foi estabelecido

30

um programa de nacionalização gradativa. As empresas que deixassem de atender ao cronograma de conteúdo local do Brasil eram ameaçadas com a recusa de moeda estrangeira e a retirada de subsídios. (Quanto maior o porte do mercado doméstico, mais crível a ameaça do governo. De sua parte, montadoras estrangeiras, e por vezes fornecedores nacionais de peças da ‘primeira camada’, pressionavam os governos retardatários por requisitos mais baixos, valendo-se de ameaças de ‘saída’. (AMSDEN, 2009, p. 275).

Apesar de importantes, os investimentos no setor automotivo, incluindo a indústria de

autopeças, corresponderam a apenas 3,7% dos desembolsos totais do banco entre 1956 e

1960, devido ao forte investimento em infraestrutura no mesmo período. Ao observarmos o

gráfico 1, notamos que o banco ainda estava muito voltado ao empreendimento público. No

entanto, houve crescimento da indústria automotiva, devido a uma demanda reprimida. A

crise econômica do governo de João Goulart (1962-1964) e o golpe militar de 1964 fizeram

com que o setor operasse com excesso de capacidade (BNDES, 2002a).

Gráfico 1 − Aprovações de financiamento do sistema BNDES por setor − 1952/1959 Fonte: Najberg (2002, p. 353 apud REDIVO; CARIO, 2013, p. 8).

O país passava pelo esgotamento do modelo do ciclo populista de poder com a

inserção dos militares na política e na economia. É importante dar destaque à mudança

política que ocorre no Brasil nesse período. A crise tem origem na renúncia do sucessor de

Juscelino, Jânio Quadros, em 1961. Após uma fracassada tentativa de golpe pelos setores

militares e conservadores, seu vice-presidente, João Goulart, toma posse, ainda que num

sistema parlamentarista.

O BNDES do início dos anos 1960 sofreu um estrangulamento de recursos que eram

paulatinamente liberados de acordo com o gosto do Ministério da Fazenda. Como destacado

1952 1953 1954 1955 1956 1957 1958 1959 1960 Pública 100 89 90 77 95 79 87 70 92 Privada - 11 10 23 5 21 13 30 8

-

25

50

75

100

31

anteriormente, isso moldou seu modo de agir frente às adversidades administrativas e

trabalhar sob conceitos estruturalistas e de desenvolvimento. Em 1964, no início do regime

autoritário no Brasil, há uma reforma tributária que extingue o Fundo de Reaparelhamento

Econômico, que era a principal fonte de recursos para o banco.

Essa fase, que vai de maio a dezembro de 1964, é claramente marcada – em meio às hesitações iniciais de um novo regime, que facilitam tanto as vendetas interburocráticas como a busca de novos esquemas de alianças políticas – pela criação de novos canais institucionais de representação de interesses adequados às características do regime autoritário em implantação. Um primeiro patamar desse edifício se constitui através da criação do Conselho Monetário Nacional, e no mesmo ato que o criou, o reconhecimento do BNDE como ‘principal instrumento de execução da política de investimento do Governo Federal’ (Art. 13, Lei 4.595, de 31.12.64). (MARTINS, 1985, p. 93).

Ocorrem mudanças no BNDES, ele deixa de ser parte da jurisdição do Ministério da

Fazenda e passa para o Ministério do Planejamento (BNDES, 2002a). Além disso, são criados

fundos para diversificar sua atuação em diferentes áreas. Os principais são: Fundo de

Financiamento para a Aquisição de Máquinas e Equipamentos (Finame, 1964),

posteriormente transformado em subsidiário (1971); Programa de Financiamento às Pequenas

e Médias Empresas (Fipeme, 1965); Fundo Agroindustrial de Reconversão (Funar, 1965);

Fundo de Desenvolvimento Técnico e Científico (Funtec, 1966); Fundo de Desenvolvimento

da Produtividade (Fundepro, 1967); e a subsidiária Investimentos Brasileiros S.A. (Ibrasa,

1974). O mais importante para este trabalho é o Finame, pois é vinculado com a fabricação e

aquisição de bens de capital, necessários para a indústria automotiva. A partir daí, o BNDES

passa a se consolidar como uma das principais instituições econômicas do país. Por mais que

sempre houvesse uma disputa interna no banco no que diz respeito à abordagem dos

problemas brasileiros, alianças com o capital estrangeiro etc., o projeto desenvolvimentista

ganha força e é mantido. O BNDES passa a exercer seu caráter autônomo, fazendo parte dos

chamados “bolsões de eficiência” da burocracia estatal brasileira (GEDDES, 1986, p. 105

apud EVANS, 2004, p. 95).

Ao analisarmos as aprovações de financiamento do banco entre o setor público e

privado no período entre 1961 e 1967 (Gráfico 2), podemos observar que há uma mudança,

ainda inicial, no direcionamento do banco, que passa a ser, segundo Luciano Martins (1985, p.

105), o “demiurgo do empresariado nacional”.

32

Gráfico 2 − Aprovações de financiamento do sistema BNDES por setor − 1961/1967 Fonte: Najberg (2002, p. 353 apud REDIVO; CARIO, 2013, p. 12).

A esfera pública ainda recebe mais incentivos. Na década de 1960, a ampliação da

siderurgia estatal e do setor de energia elétrica ganha destaque até 1963, enquanto o mercado

automotivo ainda fica com pouca porcentagem dos desembolsos (MARTINS, 1985). De 1964

a 1967, com a finalidade de acabar com a crise econômica do Brasil, o governo militar põe em

prática o Plano de Ação Econômica do Governo, que, sob moldes ortodoxos, promoveu um

ajuste fiscal e tributário e condicionou a economia a crescer novamente. Durante esse período,

o BNDES passa pelas mudanças mencionadas anteriormente.

O setor automotivo, que estava atuando com excesso de capacidade, devido à política

de aperto monetário, sofre uma redução nas vendas. O setor só se estabilizaria em 1967,

quando ocorre a compra de empresas brasileiras no setor. A Vemag e a Willys do Brasil são

compradas pela Volkswagen e Ford, respectivamente.

Após esse período, só as empresas estrangeiras sobreviveram, e, das onze com projetos implantados, restaram oito. Data da mesma época a entrada da Ford e da General Motors na esperada produção de carros de passeio, investindo em unidades novas e adquirindo empresas. (BNDES, 2002b, p. 4).

Comparando a indústria nacional de automóveis brasileira e sul-coreana nesse mesmo

período, podemos inferir alguns aspectos. As empresas brasileiras, como a Vemag e a FMN,

não tinham a mesma força nem o mesmo tamanho dos chaebols para resistir a variações de

mercado. O mercado da Coreia do Sul era mais protegido e um plano de longo prazo foi posto

em execução, enquanto no Brasil a entrada de subsidiárias estrangeiras era permitida e

incentivada, sem conter, no entanto, as mesmas medidas protecionistas do governo coreano.

Lee (2002) faz essa comparação da questão protecionista entre Brasil e Coreia do Sul.

1961 1962 1963 1964 1965 1966 1967 Pública 91 96 91 94 67 58 66 Privada 10 4 9 6 33 42 35

-

25

50

75

100

33

[…] when the Brazilian government announced a mandatory manufacturing policy, instead of the simple assembly of imported parts, in 1956, the major U.S. automakers did not accept the government policy immediately and began to bargain with the state concerning the terms of participation in the Brazilian auto industry. Ten years after the formulation of the state policy, for instance, Ford presented a new proposal in 1966, and it was accepted by the Brazilian government. Shapiro (1994, 118) comments on this by saying, ‘Ford gambled that it would eventually beallowed in the Brazilian market on its ownterms. It correctly bet that the Brazilians would be forced to accept a company with Ford’s international stature and clout’. (LEE, 2002, p. 187).10

Em 1967, inicia-se o chamado “milagre econômico” brasileiro, período que se estende

até a crise do petróleo de 1973. O BNDES − já consolidado como o principal, e único, banco

de investimentos a longo prazo − e suas subsidiárias são os principais indutores do

desenvolvimento. O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro estava crescendo na casa dos dois

dígitos ao ano. O governo incentivou o crédito ao consumidor para a aquisição de veículos, o

que fez o setor automotor crescer cerca de 20% a.a. (BNDES, 2002b).

Enquanto, até então, a produção era mais focada em caminhões e ônibus, durante o

milagre a produção de carros de passeio passa a crescer em ritmo muito mais acelerado. A

frota de carros multiplica-se por oito de 1956 até 1973, enquanto a de caminhões aumenta

2,4% no mesmo espaço de tempo. A taxa de crescimento da frota de carros de passeio passa a

ser 13%, e a de caminhões, 5% (BNDES, 2002b).

Apesar do forte crescimento, o setor não foi contemplado com nenhuma política

específica nos moldes de Seul. A prioridade do governo no I Plano Nacional de

Desenvolvimento (I PND) era focada na ampliação do setor de siderurgia, química e

petroquímica. O nicho automotor era atendido pelo Finame, que financiava a indústria de

caminhões e ônibus pesados. O setor de cargas teve forte incentivo, os financiamentos do

BNDES visavam ao empresariado privado nacional no setor.

As diretrizes do BNDES estavam voltadas para a criação de condições de compra, adaptação e desenvolvimento de tecnologia visando a novos desenhos de carrocerias ou de partes significativas e de condições para que as empresas pudessem competir adequadamente na comercialização interna e externa. O apoio foi direcionado sobretudo para as empresas-líderes, e vários projetos foram aprovados para

10 [...] quando, em 1956 o governo brasileiro anunciou uma política industrial obrigatória, em vez de manter uma política de montar peças importadas, os principais fabricantes de carros dos Estados Unidos não aceitaram a política industrial e imediatamente começaram a barganhar com o Estado sobre os termos de participação na indústria automobilística brasileira. Dez anos após a formulação dessa política estatal, em 1966, a Ford apresentou uma nova proposta, que foi aceita pelo governo brasileiro. Shapiro (1994, 118) comenta no assunto dizendo, “A Ford apostou que eventualmente ela entraria no Mercado brasileiro com suas próprias medidas. Ela apostou corretamente que os brasileiros seriam forçados a aceitar uma companhia com a estatura e influência internacional da Ford”. (tradução nossa).

34

investimento fixo e capital de giro, entre os quais aqueles da Recrusul, Iderol, Marcofrigo, Reciferal, Carrocerias Nielson, Engesa, Randon, Rodoviária SA, Sanvas e Ciferal. (BNDES, 2002b, p. 7).

Gráfico 3 − Aprovações de financiamento do sistema BNDES por setor − 1968/1979 Fonte: Najberg (2002, p. 353 apud REDIVO; CARIO, 2013, p. 17).

As montadoras eram dominadas pelo capital estrangeiro. No entanto, seu

desenvolvimento foi muito importante para a média indústria nacional. A indústria de

autopeças apresentou grande crescimento, sendo de renome até a atualidade.

Induzidas a entrar, as transnacionais acharam a vida do protegido mercado brasileiro muito lucrativa durante as décadas de 1960 e 1970. A indústria de automóveis tornou-se um dos maiores contribuintes para o ‘milagre econômico’ do Brasil, eventualmente atingindo uma produção de um milhão de carros por ano, gerando uma grande indústria local de autopeças com uma proporção substancial de capital local e tornando-se uma das maiores contribuintes das exportações de manufaturados do Brasil. (EVANS, 2004, p. 131).

Com a crise do petróleo de 1973, as montadoras de carros apresentam capacidade

ociosa, sem necessidade de expansão − até então a entrada da Fiat no mercado brasileiro foi

responsável por 88% dos investimentos do banco. É a partir daí que o governo vê a

oportunidade de expandir internacionalmente o seu setor de autopeças. Nos anos 1970, das

vinte maiores empresas de autopeças, apenas seis estavam sob controle nacional. A Ibrasa foi

relevante para o setor, capitalizando nele muitas empresas nacionais, para aumentar sua

competitividade.

O BNDES buscou apoiar programas para melhorar a qualidade de pesquisa e

desenvolvimento nas empresas de autopeças, aumentar a sua produtividade e fortalecer a

estrutura do capital das indústrias nacionais com capital de giro próprio (BNDES, 2002b).

1968 1969 1970 1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979 Pública 46 40 35 34 22 24 34 23 19 21 13 17 Privada 54 60 65 66 78 76 67 77 81 79 87 83

-

25

50

75

100

35

Empresas de destaque no setor eram Cofap, a Máquinas Varga, a Tupy, Braseixos, a Brasinca,

a Arteb, a Ferropeças Villares, a DHB e a Nakata.

Na questão de incentivos de exportação, as empresas usaram a Comissão para a

Concessão de Incentivos Fiscais e Programas Especiais de Exportação (Befiex), criada em 15

de maio de 1972. O Befiex não era subsidiário do BNDES, seus incentivos à exportação

estavam vinculados à isenção de tarifas de importação de insumos para exportar produtos

finais (BAUMANN, 1990). A primeira empresa beneficiada pelo programa foi a Ford Motor

Company, que visava introduzir o modelo Maverick no Brasil. Amsden descreve o programa:

O governo brasileiro estabeleceu o programa Befiex no início da década de 1970, após negociações para a introdução do modelo Maverick. Esse programa permitia aumentos no conteúdo importado e isenção fiscal em troca de compromissos com o desempenho nas exportações, e ‘estava afinado com as políticas de promoção das exportações do Brasil desde o final dos anos 1960’. (AMSDEN, 2009, p. 272).

Todavia, os programas eram ainda dominados pelas empresas estrangeiras. Em 1974,

foi feito o primeiro programa para uma empresa de capital nacional, sendo que na época já

haviam sido feitos cinco programas para empresas de capital estrangeiro. Com a crise do

petróleo de 1973, esse processo passa a contar com indústrias nacionais de autopeças. O

governo opta por ignorar a crise internacional que se formava e lança o II PND (1974-1979).

É nessa mesma época que o BNDES passa a contar os recursos do PIS/Pasep para gerar

crédito.

O plano tinha o objetivo de fazer com que o país superasse a industrialização “difícil”,

visando à exportação e aos setores de maior tecnologia. A política de 1974 restringiu

fortemente as importações e passou a dar grande fomento às exportações, visando à produção

própria de tecnologia (CASTRO, 2009). O governo optou por reprimir os subsídios à

importação, exceto os do Befiex.

O setor automotivo era um dos mais agraciados com esses benefícios: das dez maiores

empresas do setor, oito eram beneficiárias (BAUMANN, 1990). Isso fez com que o setor de

veículos e autopeças, inclusive as de alto valor agregado, como motores e peças terminais,

aumentasse sua exportação e competitividade.

Apesar do crescimento das exportações do setor automotor, a produção de bens de

consumo duráveis já não era mais prioridade nacional nesse novo plano de desenvolvimento.

Antonio Barros de Castro, ao citar entrevistas do Ministro do Planejamento, aponta que o

modelo que vinha em curso no Brasil estava apresentando esgotamento:

36

A solução proposta pelo novo governo era, sem dúvida, extremamente ousada. E isto por diversas razões. Primeiramente, porque o crescimento da economia brasileira vinha sendo liderado, desde os anos 1950 e, particularmente, ao longo do último surto de crescimento (1967-1973), pelos duráveis de consumo. Agora, porém, declara o novo governo, pela voz de seu Ministro da Indústria e Comércio, que ‘algumas atividades industrias, como a indústria automobilística, por exemplo, deixarão de merecer atenção prioritária. [...] Não é hora de estimular o crescimento de uma grande faixa de indústrias produtoras de bens de consumo duráveis’. Em tais condições, e dada a proeminência atribuída à expansão de ramos intermediários, percebe-se que a nova política propunha, de fato, a reorientação do processo de crescimento. (CASTRO, 2009, p. 32).

O Brasil passa a contornar a crise em um ritmo de crescimento médio de 6,5%

(BRESSER-PEREIRA, 2003). O financiamento de longo prazo da indústria de formação

tecnológica e de bens de capital é feito pelo BNDES e também por poupança externa advinda

das nações produtoras de petróleo, que, com a alta de seu principal produto, obtiveram

liquidez para novos investimentos, ao mesmo tempo que a Coreia do Sul continuava a contar

com investimentos significativos por parte dos Estados Unidos, devido à sua posição

estratégica para os norte-americanos na Guerra Fria.

No entanto, em 1979 ocorre um novo choque do petróleo, que faz com que a crise da

dívida entre com força nos países latino-americanos. Como os Estados Unidos são um dos

principais afetados, os juros da dívida americana aumentam, causando um forte desequilíbrio

no balanço de pagamentos. A indústria nacional não era plenamente competitiva externamente

e suas empresas líderes não tinham a mesma margem de manobra que os chaebols. Os anos

1980 começam com crise para o Brasil e a superação do PSI para a Coreia do Sul.

É importante salientar que, mesmo que os dois países tenham sido bem-sucedidos nos

quesitos de industrialização e produtividade, a industrialização dessas duas nações periféricas

teve diferenças marcantes (Tabela 2).

Ao fim dos anos 70, portanto, Brasil e Coreia do Sul haviam concluído o ciclo de industrialização dentro do padrão da segunda revolução industrial. Na Coreia constituiu-se uma economia industrial, construída pelo Estado e articulada pelo grande capital nacional, num contexto social mais igualitário, em função das políticas de universalização da educação e das infraestruturas sociais, além da reforma agrária concretizada nos anos 50. No Brasil, é indispensável assinalar a persistência das profundas desigualdades, do analfabetismo e da concentração fundiária, num país de dimensões continentais, preenchido por oligarquias regionais e nacionalmente articulado pelo Estado. A industrialização produziu um sistema empresarial compartilhado, com forte presença do capital estrangeiro, coadjuvado pelo capital nacional, na condição de ‘sócio minoritário’ – a grande empresa estrangeira dominando os setores manufatureiros mais sofisticados, de maior valor agregado; a empresa nacional aparecendo como supridora de peças e matérias-primas nessas cadeias, sendo dominante apenas nos setores produtores de commodities semiprocessadas; e a empresa estatal

37

preenchendo os setores de elevada intensidade de capital e de alta escala produtiva (insumos intermediários). (COUTINHO, 2001, p. 362).

Tabela 2 − Desempenho econômico comparado − 1950-1980 Brasil Coreia do Sul

Período Taxa média de cresc. do PIB

Período Taxa média de cresc. do PIB

1950-1962 (inclui o período JK)

6,9% 1950-1962 (perído S. Rhee)

4,9%

1963-1967 (crise política e reformas sob gov. Castelo Branco)

3,2% 1963-1971 (1ª arrancada gov. do

Gen. Park)

8,8%

1968-1974 (“milagre econômico” sob o auge do regime autoritário)

11,0% 1972-1975 (1ª fase da industrialização

pesada)

8.9%

1975-1980 (II PND, conclusão da base pesada da indústria)

6,6% 1976-1979 (2ª fase e conclusão da base

pesada da indústria, fim da “era Park”)

10,6%

Taxa média anual do período 1950-1980

6,5% Taxa média anual do período 1950-1979

6,5%

Fonte: Coutinho (2001).

38

CAPÍTULO 3 − 1980-2000 CRISE DA DÍVIDA E PROCESSOS DE

ABERTURA

Os anos 1980 começam conturbados, tanto para o Brasil quanto para a Coreia do Sul.

O país asiático acabara de perder o seu presidente Park Chung Hee (1961-1979), que fora

assassinado pelo chefe da KCIA em um jantar da cúpula do governo, em meio a uma

reviravolta econômica e ideológica de pontos-chave do governo (VELASCO E CRUZ, 2007).

O Brasil encontrava-se no início da crise da dívida externa após o segundo choque do

petróleo; politicamente, passaria a acenar a abertura da ditadura a militar, que viria a culminar

com o fim do regime em 1985 (BRESSER-PEREIRA, 2003).

Em termos econômicos, o EPB na Coreia passa a mudar o viés de sua abordagem

frente às políticas da gestão estatal e a sua relação com o empresariado dominante. Tendo boa

parte dos seus economistas obtendo formação no norte, o núcleo da burocracia do EPB passou

a ser predominantemente neoliberal. Isso gerou uma cisão na gestão da política econômica

sul-coreana. Velasco e Cruz (2007) afirma que o que ocorreu nesse período na Coreia do Sul

ocorreu também na América Latina, a adesão do ideário pelas elites burocráticas.

Os economistas do EPB vinham alertando o presidente Park, desde 1978, de que havia

a necessidade de menos intervenção econômica do Estado e de que era necessário “pôr um

freio no crescimento da economia” (VELASCO E CRUZ, 2007, p. 251-252). É de se

estranhar que um país como a Coreia do Sul, que vinha apresentando um crescimento

expressivo graças a medidas desenvolvimentistas, venha a apresentar um pensamento

ortodoxo frente à problemática inflacionária e recessiva que se apresentou no ano de 1979

diante da crise do petróleo.

No diagnóstico desses economistas, o intervencionismo estatal nos anos passados era a verdadeira causa da alta inflação crônica. A eficiência econômica seria recobrada apenas por intermédio de políticas que restaurassem a livre concorrência: as mercadorias deveriam ter os seus preços regulados pelas forças do mercado; os juros bancários deveriam flutuar de acordo com a oferta e demanda de crédito; o Estado deveria transferir gradualmente para o setor privado o controle de seus bancos comerciais e relaxar a regulação das atividades bancárias do país. (VELASCO E CRUZ, 2007, p. 253).

Entre 1970 e 1990, 801 coreanos obtiveram doutorado nos Estados Unidos, enquanto,

no mesmo período, 301 japoneses tiveram a mesma formação (AMSDEN, 1994 apud

VELASCO E CRUZ, 2007). A elite e o aparelho burocrático coreano estavam agora nutrindo

 

39

simpatia pelo neoliberalismo, o que vinha de encontro às aspirações do governo. Isso dividiu a

burocracia estatal, colocando o EPB e o Ministério das Finanças do lado ortodoxo, e o

Ministério da Indústria e o Ministério das Obras Públicas do outro.

No mesmo período, há crescentes tensões do capital com o Estado. Nos fins da década

de 1970, a Hyundai vinha sendo pressionada para fazer uma joint venture com a GM, em vez

de seguir sozinha no ramo. A empresa contrariou as sugestões dos burocratas e constituiu seu

projeto, como mostrado no capítulo anterior.

A tentativa de consolidação da indústria em 1980-81 mostrou novamente os limites da capacidade de o Estado impor a mudança quando existe significativa resistência por parte do setor privado. O número de montadoras foi reduzido de três para duas, mas mesmo a eliminação da Kia acabou sendo de curta duração... Ao final de 1984, o governo decidiu permitir que a Kia retornasse à produção de automóveis, decisão anunciada no ano seguinte. Uma vez mais, o governo parecia estar mais seguindo que liderando o setor privado na indústria automotiva. (RAVENHILL, 2003, p. 119-120 apud VELASCO E CRUZ, 2007, p. 251).

A clara indisposição dos chaebols frente ao governo ficou ainda mais forte após o

anúncio das “Medidas Abrangentes para a Estabilização Econômica”, que foi um programa

anti-inflacionário autorizado por Park em março de 1979, cedendo às demandas do EPB. Por

mais que seja contraditório, os maiores chaebols não ficaram satisfeitos com as medidas, pois

fizeram com que sua expectativa de lucros não fosse cumprida, graças às medidas restritivas e

de arrocho.

Com a morte de Park, em 1979, assume o poder o General Doo Hwan (1980-1988),

com quem os anseios por liberalização por parte do empresariado e da burocracia são

atendidos. Outra característica do período em que Hwan esteve no poder é a sua luta com os

sindicatos.

Em 1981, os bancos comerciais passam da mão do Estado para a iniciativa privada,

ainda que sob estrito comando estatal. O governo ainda tinha poder para nomear dirigentes e

outras funções importantes (VELASCO E CRUZ, 2007). Os principais beneficiados com a

liberalização do sistema bancário foram os chaebols, os únicos agentes privados nacionais

com capacidade de arcar com os custos de aquisições dos bancos. Além da liberalização,

houve um ajuste para conter a inflação, que ficou abaixo dos 5% a partir de 1982.

O efeito acumulado desses desencontros é curioso: as políticas de liberalização implantadas gradualmente na década de 1980 aumentam o poder e a autonomia dos grandes grupos econômicos, que pedem sempre mais espaço para decidir de seus negócios em nome da liberdade do mercado. E os tecnocratas liberais apontam o

40

fortalecimento desmedido desses mesmos grupos como provas de que um regime de liberdade econômica só existirá de fato quando o poder desses grupos for reduzido, o que supõe determinadas formas de intervenção do Estado. (VELASCO E CRUZ, 2007, p. 255).

Na economia coreana, começam a ocorrer embates dentro do seu núcleo burocrático:

ministérios a favor de ajustes e medidas “racionalizantes” versus ministérios

desenvolvimentistas. O EPB e o Ministério das Finanças, desde o fim da década de 1970,

passam a ter uma posição de maior predominância na tomada de decisões econômicas estatais.

O Ministério da Indústria e Comércio ainda é uma parte da burocracia governamental em que

predomina o pensamento desenvolvimentista.

A primeira mudança a considerar é a redução paulatina da capacidade do Estado de disciplinar os grandes grupos econômicos e de subordiná-los às suas diretivas. Dois elementos se conjugam na produção desse resultado. De um lado, esses grupos ganham crescente autonomia à medida que se consolidam, movem-se em direção a setores situados na fronteira tecnológica e ampliam sua presença no mercado internacional. Por outro lado, chamada a lidar com problemas de gestão cada vez mais complexos, a burocracia econômica passa a ser tensionada por conflitos de interesse e perspectivas, e muito de sua antiga unidade se perde. (VELASCO E CRUZ, 2007, p. 250).

Apesar de os anos 1980 serem conhecidos como o início do processo de liberalização

econômica na Coreia, o Estado ainda era predominante na economia e seu papel era

fundamental para o processo de acumulação de capital. Além disso, os custos com pesquisa e

desenvolvimento (P&D) nas principais indústrias coreanas cresceram muito nesse período,

como podemos observar na tabela 3 (LEE, 2002; VELASCO E CRUZ, 2007).

Tabela 3 – Recursos despendidos em pesquisa e desenvolvimento − 1975-1990 1975 1980 1985 1990

P&D/PIB 0,42 0,77 1,58 1,95

Número de pesquisadores (total)* 10.275 18.434 41.473 70.503

Inst. de pesquisa governamentais 3.086 4.598 7.542 10.434

Universidades 4.534 8.695 14.935 21.332

Setor privado 2.655 5.141 18.996 38.737

Fonte: Kim e Linsu (2003, p. 99 apud VELASCO E CRUZ, 2007, p. 249). *Não incluídos assistentes de pesquisa, técnicos e pessoal ocupado em outras atividades de apoio.

É possível afirmar que tais índices de desempenho em P&D não seriam possíveis sem

o auxílio governamental. O governo coreano criou vários fundos para esse fim, com

41

incentivos fiscais e financeiros em nome do desenvolvimento da tecnologia, como o Fundo de

Desenvolvimento do KDB, que tinha taxas de juro por volta de 10 a 11%. Além disso, quando

as empresas se inseriam em atividades de P&D com assistência do Ministério do Comércio e

Indústria, o Estado provia 70% dos custos totais (LEE, 2002).

A Coreia se recuperara bem do choque do petróleo de 1978, o que é mais uma vez

explicado pela poupança externa provida pelos Estados Unidos, a qual ainda era abundante. O

Brasil, por sua vez, encontrou vários obstáculos para a tomada de empréstimos nos anos 1980.

A moratória declarada pelo México em 1982 fez com que as nações periféricas em geral

perdessem a credibilidade e confiança no mercado de investimentos externos. Todavia, a

credibilidade sul-coreana parece ter se mantido intacta:

A Coreia não parece ter tido nenhuma dificuldade de tomar empréstimos durante esse período. Levantar fundos externos era uma grande preocupação de alguns funcionários no Ministério das Finanças... No início da década de 1980, os banqueiros chegaram a eles... Em 1984, tiveram que viajar aos principais centros financeiros... Mas, ao descrever a situação, as políticas correntes e os planos para o futuro, a Coreia foi capaz de tomar os empréstimos prontamente. De fato, depois da crise da dívida mexicana, tomar empréstimos ficou mais fácil para a Coreia. (COOPER, 1994, p. 283 apud VELASCO E CRUZ, 2004, p. 263).

A crise do aumento dos juros da dívida americana, aliada com o choque do petróleo de

1978 e a moratória mexicana, fez com que o Brasil, além de não ter recursos, não tivesse

ninguém disposto a passar por fortes riscos de calote ao investir no país. Em 1983, a crise do

país se transforma numa crise fiscal, as reservas brasileiras, que, na época, eram de US$ 3

bilhões, esgotam-se em um período de dois meses (BRESSER-PEREIRA, 2003).

O contexto de crise se dá no mesmo momento da transição democrática no Brasil. A

abertura política “lenta, gradual e segura”, como dita pelo presidente militar General Ernesto

Geisel, era prevista para 1985, quando o seu sucessor, João Batista Figueiredo (1979-1985),

deixaria o cargo, após uma eleição no colégio eleitoral entre Arena e MDB, os dois únicos

partidos políticos permitidos no regime. Isso fez com que os benefícios políticos e a euforia da

volta da democracia não fossem acompanhados por uma euforia econômica.

A economia brasileira, apesar da crise, mostra crescimento nos anos de 1984, 1985 e

1986; o PIB cresce, pois ainda há formação bruta de capital fixo, graças ao II PND. Ainda

que, desde o fim da década de 1970, o país estivesse em crise, ela é ignorada e o investimento

continua (CASTRO, 2004). No entanto, a inflação chega à casa dos 100% e, no ano de 1988,

chega a 1.000%.

42

Em 1986, o primeiro presidente da nova democracia brasileira, José Sarney (1986-

1990), lança o Plano Cruzado, para acabar com a inflação altíssima que prejudicava a

economia nacional em todos os níveis, principalmente no capital produtivo. Claro que a

indexação ajudou o país a manter uma convivência com a inflação, mas, no grau em que se

encontrava e com raros investimentos externos, o país passa a procurar maneiras de acabar

com o processo inflacionário. Inicialmente bem-sucedido, o plano causou uma maior inflação,

devido ao uso extensivo do congelamento de preços.

Nesse período, o BNDES passa a ter uma função dupla: enquanto ainda é responsável

pelo funding, ele também passa a ser responsável pelas privatizações. Em 1981, o banco já

seria responsável pela Comissão Especial de Privatizações, que indicou 140 empresas que

poderiam sofrer privatização, com a finalidade de diminuir o tamanho do Estado-empresário

brasileiro. Mesmo com esse movimento de liberalização econômica, o banco também

implantou diversas políticas de cunho desenvolvimentista:

De modo coerente, o BNDES retomou a orientação desenvolvimentista. A Finame, por exemplo, ampliou a participação nos setores de ponta. Investiu em informática, microeletrônica, química fina, biotecnologia e novos materiais. Mais dois programas foram lançados: o Programa Especial de Apoio ao Setor de Informática (Proinfo), para dar suporte financeiro à consolidação e à capacitação tecnológica nesse segmento, e o Programa Nacional de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PNPCH). Programas já tradicionais na instituição, como o POC e Promicro, também tiveram aumento real de recursos. (BNDES, 2002a, p. 129).

O papel do BNDES também foi de manter o parque industrial, visto que, no contexto

de crise, não era possível aumentá-lo, mas também não era benéfico diminuí-lo.

Como podemos observar, a tendência neoliberal na Coreia do Sul já era bem mais

forte do que no Brasil. O embate burocrático do país asiático estava cada vez mais forte.

Basicamente, a divisão burocrática do país estava na maneira em que se deveria fomentar a

indústria. Para o EPB, os subsídios direcionados às indústrias específicas deveriam ser

terminados, pois seriam o principal responsável pelas disparidades do sistema de

desenvolvimento coreano. O Ministério do Comércio e Indústria (MCI) apoiava a setorização

dos incentivos, modelo que vinha sendo efetivamente aplicado desde a década de 1960.

Apesar de o MCI ainda exercer maior influência no início da década, em 1986 os seus

burocratas percebem que deveria haver uma reforma no sistema.

Para tanto, o MCI lança uma legislação unificada para a indústria do país, tentando

conciliar políticas desenvolvimentistas com políticas econômicas de cunho neoliberal.

43

Todavia, sofre retaliações por parte do Ministério das Finanças e do EPB. O plano ainda era

tido como irracional: um dos elementos principais, por exemplo, era o de selecionar a “sunrise

industry”,11 que seria a indústria que necessitaria de uma maior competitividade internacional.

Essa política era vista pelos burocratas mais ortodoxos como um risco de maior intervenção

estatal “irracional”, pois não haveria competição justa. A “sunset industry”,12 concentrada nos

antigos setores, como têxteis e alimentícios, necessitava reestruturação e isso não foi motivo

de protestos virulentos por parte do EPB e do MOF.

É importante destacar que a indústria automotiva fazia parte de uma “coalizão

neomercantilista”, composta pelas indústrias privadas nacionais e pelo MCI (anteriormente, a

burocracia estatal de forma mais coesa), enquanto havia uma “coalizão liberal” entre os

burocratas ortodoxos (inicialmente na década de 1970, mais tarde o EPB e o MOF) e as ETNs

(LEE, 2002). Para a “sunrise industry”, a coalizão neomercantilista, que implicava o fator

estatal como decisivo no sucesso de sua competitividade internacional, não poderia ser

quebrada tão facilmente. Eis o balanço do plano traçado pelo MCI, após revisão feita pelo

EPB e MOF (Quadro 3):

Plano original Opiniões de outros

ministérios Plano revisado Resultado final

Promoção de indústrias via investimento induzido

Oposição do EPB e do MOF

Possibilidade de desenvolvimento sem subsídios

Revisão (EPB)

Promoção da “sunrise industry”

Oposição do EPB e do MOF

Incorporação em um plano de racionalização

Manutenção (MCI)

Encorajamento da racionalização industrial

Oposição do MOF Encorajamento da racionalização econômica

Manutenção (MCI)

Aceleração do desenvolvimento de tecnologia industrial

Oposição do MST Promoção de pesquisa básica na indústria

Revisão (MST)

Fundo para o avanço da estrutura industrial

Oposição do MOF Incorporação no Fundo Nacional de Desenvolvimento

Manutenção (MCI)

Quadro 3 – Mudanças feitas no plano original do MCI Fonte: Lee (2002, p. 311).

11 “Indústria do alvorecer” é a indústria que vem demonstrando crescimento, no caso coreano eram as exportadoras de bens de capital e automóveis. 12 “Indústria do entardecer” é a indústria que vem decaindo, mas ainda apresenta importância, no caso coreano eram as de consumo duráveis e não duráveis, pioneiras no PSI.

44

Apesar de o plano final ter ficado um tanto destoante do que foi inicialmente proposto

pelo MCI, a indústria automotiva continuou mantendo a coalizão neomercantilista. Essa

indústria foi considerada “sunrise industry”, sendo um setor de importância para o governo, e

continuou tendo acesso a subsídios e empréstimos a juros amigáveis. Os subsídios foram

alocados para a “racionalização industrial”, em que o grupo de empresas selecionadas iria

receber subsídios para ter capacidade de competição.

Na metade da década, os chaebols já estavam mais fortalecidos e suas ambições já

eram incompatíveis com as medidas estatais. Seu fortalecimento está baseado no incentivo à

indústria química e pesada, sob a tutela do presidente Park. Sua porcentagem no PIB coreano

também era crescente e muito significativa.

By the end of the 1980s, big businesses were no longer instruments of economic growth that could be rather easily controlled by the state. They began to use their own voices, or even express over top position to certain government economic policies. As a result, it became much harder for both camps of bureau crats to form a coalition with big businesses, with out making some concessions to their demands. (LEE, 2002, p. 317).13

Podemos entender o tamanho e a força dos chaebols no país e no período ao compará-

los com as indústrias de outras nações periféricas, como México e Brasil:

In 1985 ten chaebol were among Fortune’s International 500 and five were in the top 100. By contrast, Mexico (with a GNP twice that of Korea) and Brazil (with a GNP four times larger) combined had only 11 in the top 500 and only one each in the top 100. (GREEN, 1992, p. 423).14

A questão da indústria automotiva na própria Coreia do Sul também era assegurada

pelo Estado. Mais uma vez, entra a “coalizão neomercantilista” para a exportação e também o

aporte do Estado para o controle de preço pelas próprias empresas. Houve restrição às

importações de veículos completos de 1986 até 1988, ou seja, durante o período de

racionalização da indústria. De acordo com Green “of the carson South Korean roads, 99.9%

13 No fim dos anos 1980, grande negócios já não eram mais instrumentos de crescimento econômico que poderiam ser facilmente controlados pelo Estado. Eles começaram a usar suas próprias vozes ou mesmo expressar aparente oposição a certas políticas econômicas do governo. Como resultado, se tornou muito mais difícil para ambos os campos dos burocratas formar uma coalizão com os grandes negócios sem fazer concessões às suas demandas. (tradução nossa). 14 Em 1985, dez chaebols figuravam entre os Fotune’s Internationl 500 e cinco estavam no top 100. Enquanto que, contrastando, o México (com um PNB duas vezes maior que o da Coréia) e o Brasil (com um PNB quatro vezes maior) combinados, tinham apenas 11 no top 500 e uma empresa cada um no top 100. (tradução nossa).

45

are Korean made. Despite the formal adoption of animportliberalization policy in 1988,

foreign cars are hard to find in the streets of Seoul”15 (GREEN, 1992, p. 419).

No caso da indústria automobilística da Coreia, os preços eram supervisionados pelo Ministério das Finanças para promover a estabilidade. Como as montadoras não podiam a princípio concorrer internacionalmente a preços do mercado mundial (por causa de sua pequena escala de produção), elas tinham permissão para definir preços internos suficientemente altos para compensar os prejuízos no mercado da exportação. (AMSDEN, 2009, p. 280).

Nesse mesmo período, a Hyundai passa a entrar no mercado americano. Após a

expansão da fábrica de carros em Ulsan, no início da década de 1980, a empresa aumentou

sua produção. Como o mercado interno não era suficiente para a oferta crescente, a alternativa

era a exportação. Em 1986, empresa lança o modelo compacto Excel nos Estados Unidos e,

junto com a Hyundai, a Daewoo passa a produzir o Pontiac Le Mans e a Kia monta o Ford

Festiva (GREEN, 1992).

A venda de carros coreanos nos Estados Unidos subiu 105% em 1987 e 37% em 1988.

A experiência adquirida na introdução de veículos no Oriente Médio e em alguns países da

América Latina, ainda que timidamente, fez com que a Hyundai tivesse o know-how

necessário para a empreitada no território norte-americano. O governo sul-coreano mais uma

vez entrou em ação quando a Hyundai foi acusada de dumping no Canadá e nos Estados

Unidos (GREEN, 1992). Graças a medidas diplomáticas do governo, como o envio de cartas e

comunicação diplomática, a Hyundai pôde passar pelo processo sem maiores complicações

(GREEN, 1992).

O caso da indústria automotiva brasileira era distinto do coreano. O setor automotor no

Brasil passava por estagnação. As restrições monetárias adotadas pelo país para sair da crise

da dívida e da crise fiscal fizeram como que a participação do BNDES no setor caísse 50%.

Todavia, o âmbito de caminhões seguiu mais forte do que o de veículos de passeio. No início

da década de 1980, os seguintes produtos eram financiados pelo banco:

- chassis de caminhão com capacidade mínima igual ou superior a trinta toneladas;

- chassis de ônibus rodoviário com motor diesel de potência superior a 130 hp;

- carrocerias metálicas para chassi de capacidade máxima igual ou superior a 19

toneladas;

15 “dos carros nas estradas sul coreanas, 99,9% são fabricados na Coréia. Apesar da adoção formal de uma politica de liberalização de importações em 1988, carros estrangeiros são difíceis de achar em Seul.” (tradução nossa).

46

- carrocerias metálicas para chassi com motor diesel de potência superior a 130 hp;

- equipamentos adaptáveis a chassis com capacidade máxima de tração igual ou

superior a 19 toneladas (BNDES, 2002b).

No âmbito dos carros de passeio, a Ford e Volkswagen criaram em 1987 a Autolatina,

uma joint venture com a finalidade de diminuir os custos de produção no cenário recessivo

interno e externo.

[...] as empresas decidiram unir projetos, sistema, compras, motores, peças etc., a fim de reduzir os custos de produção, compartilhar tecnologias e ampliar escalas. Mantendo as marcas e as concessionárias próprias, foram desenvolvidos diversos produtos gêmeos, como o Volkswagen Apollo e o Ford Verona e o Volkswagen Santana e o Ford Versailles (BNDES, 2012, p. 107).

No entanto, a joint venture não teve capacidade de se manter, pois fora do Brasil Ford

e Volkswagen eram ainda concorrentes e isso dificultava o intercâmbio de desenvolvimento e

conhecimento, além do problema da inflação e da grande instabilidade econômica. A

Autolatina encerrou as suas atividades em 1994. Os investimentos no segmento de veículos no

Brasil, de 1980 a 1989, totalizaram apenas US$ 5,1 bilhões e US$ 4 bilhões em autopeças. Por

estar primordialmente focado no mercado interno, o setor estava sofrendo com a baixa

eficiência e a falta de competitividade internacional, já que fabricava modelos defasados com

altos custos de produção (BNDES, 2012).

No início dos anos 1990, os carros coreanos passam a perder mercado nos Estados

Unidos, todavia os mercados da América Latina e Europa Ocidental passam a receber muitos

carros da Coreia do Sul (LEE, 1997), conforme podemos observar na tabela 4.

Tabela 4 – Exportações por destino (%)

1990 1993 1994 1994 1996

América do Norte 72,4 22,5 34 20,7 18,5

Europa Ocidental 5,6 22,9 20 28,3 25,1

Europa Oriental 2,7 4,6 3,1 7,8 12,1

África 1,6 2,1 2,5 4,3 7,5

Ásia 9,7 11,1 4,2 4,2 5,2

Oriente Médio 1,8 15,7 11,9 10,2 8,9

Pacífico 3,8 5,3 6,6 7,6 8,9

América Latina 2,4 15,8 17,7 16,9 13,8

Total 100 100 100 100 100

Fonte: Lee (1997).

47

A manutenção da política exportadora no setor automotivo mostra que, mesmo com as

tendências liberalizantes da década de 1980, o setor automotivo ainda dependia da coalizão

neomercantilista com a burocracia estatal, devido ao fato de o mercado interno coreano não

era suficiente para absorver a produção das empresas. No caso brasileiro, em que o mercado

interno é grande, as exportações nunca foram o foco, apenas o excedente da produção era

exportado.

Uma importante razão do aumento das exportações para a Europa era o crescimento da

demanda por carros compactos nesse continente, aliado à valorização do iene, que fez com

que os carros coreanos se tornassem mais competitivos. Todavia, nos Estados Unidos, onde a

principal vantagem de obter um carro coreano era o consumo de combustível, uma alta nos

juros para financiamentos fez com que os carros coreanos perdessem a competitividade e

passasse a haver procura por carros de melhor qualidade, como os japoneses e os domésticos

(EBERT; MONTONEY, 2007). Por outro lado, no mercado latino-americano e asiático, em

geral, em que o preço é tido como um fator mais vantajoso que a qualidade do carro, os

veículos coreanos foram inseridos com sucesso em meio à retração nos Estados Unidos.

No mercado brasileiro, após uma forte estagnação nos anos 1980, a indústria nacional

sofre, nos anos 1990, um processo de integração com o mercado mundial, devido à abertura

do mercado nacional ao capital estrangeiro, buscando eficácia e redução dos custos e

procurando estimular a concorrência. Esse cenário é posto em prática no governo de Fernando

Collor de Melo (1990-1992), o primeiro presidente eleito por voto direto desde o golpe militar

de 1964.

Collor tinha como finalidade adequar a economia nacional ao modelo proposto pelo

Consenso de Washington, o modelo do Estado mínimo. A política de cunho neoliberal

ortodoxo abriu o mercado ao capital estrangeiro buscando uma modernização rápida, devido

ao atraso estrutural deixado pelo esgotamento do modelo desenvolvimentista brasileiro.

A missão também era acabar com a inflação, todavia o Plano Collor I (1990),

altamente ortodoxo, que contava com o confisco das poupanças como medida restritiva para

conter a inflação, foi extremamente malsucedido (BRESSER-PEREIRA, 2003). Nos anos

1990 é que o ideário neoliberal se instala de fato no Brasil. Entre 1981 e 1990, o PIB

brasileiro cresceu em uma média de 1,57%, demonstrando forte cenário recessivo. Em vias de

reforma, cabe explicar as causas da crise nos países latino-americanos, que, de acordo com o

Consenso do Washington, eram:

48

basicamente duas: (1) o excessivo crescimento do Estado, traduzido em protecionismo (o modelo de substituição de importações), excesso de regulação de empresas estatais ineficientes e em número excessivo; e (2) o populismo econômico, definido pela incapacidade de controlar o déficit público e de manter sob controle as demandas salariais tanto do setor privado quanto do setor público. A partir dessa avaliação, as reformas a curto prazo deveriam combater o populismo econômico e lograr equilíbrio fiscal e estabilização. (BRESSER-PEREIRA, 2003, p. 249).

Para os neoliberais, a solução seria o estabelecimento de uma estratégia voltada para o

mercado internacional, baseada na diminuição do papel estatal na economia, na liberalização

das trocas internacionais e na promoção das exportações. Seria esse o molde básico das

medidas econômicas adotadas pelo Brasil durante os anos 1990.

A partir desse momento, põe-se um fim nas políticas desenvolvimentistas no Brasil. O

modelo tripé, composto pela tecnoburocracia estatal com as empresas estatais, pelo capital

internacional com as ETNs e pela burguesia nacional, representa o capital privado nacional. O

insulamento burocrático é diminuído, o Estado, que é tido como o principal problema e

impasse econômico, tem seu papel tolhido, apesar de alguns órgãos continuarem

predominantes.

Todavia, com a crise política instaurada no país durante o governo Collor, graças ao

malogro dos planos econômicos Collor I e II, as reformas do Estado ficam em segundo plano

e o foco do poder executivo é o fim da inflação. Em 1993, a inflação, que havia saído do

controle desde o fim da ditadura militar, estava acumulada no nível de 2.477,15 no ano.

O então presidente Itamar Franco (1992-1995), que assumiu o poder após o

impedimento do mandato de Fernando Collor, acusado de corrupção, forma uma equipe

econômica encarregada de acabar com a inflação no país. Em 1994, é lançado o Plano Real,

que foi responsável pela estabilização inflacionária do Brasil até os dias de hoje. Logo a

inflação é reduzida: passa para 916,43% em 1994 e 22,41% em 1995 para, nos anos seguintes,

ficar na casa de um dígito (BRESSER-PEREIRA, 2003).

O BNDES, a partir da década de 1990, passa a ser o principal agente do Executivo

responsável pelas privatizações que estavam tomando forma no Brasil desde a década

passada. Como já destacamos anteriormente, a burocratização diminui e o modelo econômico

que dava legitimidade ao funding realizado pelo BNDES entra em esgotamento. A partir do

governo Collor, o banco passa a ser o maior responsável pelo Plano Nacional de

Desestatização (PND), que foi lançado no mesmo governo.

49

Em virtude das reformas terem sido implantadas em ritmo acelerado o PND também ganhou novo perfil e menos burocracia para acelerar as vendas das estatais. Em substituição à Comissão Diretora do PND, foi criado o Conselho Nacional de Desestatização [...]. (DINIZ, 2004, p. 95).

Durante o processo de privatizações, que tomaria conta da política do banco por toda a

década, a atenção frente a projetos setoriais de desenvolvimento foi claramente relegada a um

segundo plano. Isso não quer dizer que não houve desembolsos em determinados setores da

economia no período, mas eles não tinham como objetivo primordial o desenvolvimento

econômico, como fora em anos anteriores.

O Banco não seguiu nenhuma política de desenvolvimento setorial adotando o discurso de livre mercado, agiu ajudando apenas empresas e projetos com possibilidade de retorno, se afastando, neste período, do seu papel histórico de agente de articulador de políticas de desenvolvimento. (DINIZ, 2004, p. 80)

Vale citar o superintende do BNDES João Mourão, que ilustra a mudança de papel do

banco na economia:

Não havia uma linha clara de ação: as decisões de enquadramento dos pedidos de financiamento eram tomadas caso a caso numa Comissão de Prioridades, sem nenhum plano, documento ou parâmetros que norteassem suas decisões, a não ser a experiência de seus membros, executivos e técnicos altamente preparados em questões setoriais. (MOURÃO, 1994, p. 6 apud DINIZ, 2004, p. 80).

Contudo, não é correto afirmar que não houve desembolsos volumosos. O funding do

banco era agora direcionado para financiar a compra das empresas estatais brasileiras. Os

setores siderúrgico e de telecomunicações foram responsáveis por grandes leilões. Os

principais compradores eram estrangeiros, sendo os dois principais Estados Unidos e

Espanha, responsáveis por 33,31% e 30,08% dos investimentos totais nas privatizações,

respectivamente. Diniz (2004) cita a venda do Sistema Telebras como um dos principais

responsáveis pelo aumento dos desembolsos na década.

O ano de 1998 teve por vedete a venda do Sistema Telebras, gerou uma arrecadação de US$ 19,2 bilhões (câmbio da época) e foi lançada uma linha institucional do BNDES para financiamento da aquisição das empresas estatais. Notou-se um salto significativo na curva dos desembolsos do BNDES, por exemplo, em 1993 foram liberados o equivalente a US$ 3,2 bilhões e em 1998 US$ 16,34 bilhões. Esse aumento significativo deveu-se ao fato de que as empresas privatizadas recorreram aos programas de financiamento do Banco; aliás, é importante lembrar que não havia mais restrição de empréstimos a empresas estrangeiras. (DINIZ, 2004, p. 99).

50

O setor automotivo do Brasil nos anos 1990 recebeu desembolsos por parte do

BNDES, todavia concentrou uma porcentagem muito baixa do total, cerca de 3,6 bilhões de

dólares para o setor como um todo entre 1991 e 2001, o que representou 4,3% do total de

desembolsos para o decênio em questão. Todavia, o número de IEDs foi grande, apenas entre

1991 e 1993 foram investidos US$ 900 milhões, enquanto de 1980 a 1984 o valor foi de US$

466 milhões e de 1985 a 1989, US$ 451 milhões (BNDES, 2002b).

Os demais incentivos foram feitos seguindo o receituário econômico ortodoxo, com

redução de imposto de importações para o setor de autopeças e isenção de impostos

municipais, como o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) e o Imposto Predial e

Territorial Urbano (IPTU). Houve também uma guerra fiscal entre os estados da federação

para atrair montadoras, com isso houve uma maior variação do Imposto sobre Circulação de

Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) por estado.

Nos final dos anos 1980, mais precisamente em 1987, Chun Doo Hwan deixa o seu

mandato, como estabelecido quando tomou o poder, e dá lugar a eleições diretas para a

decisão do seu sucessor. A oposição tradicional na Coreia do Sul estava dividida entre Kim

Young Sam e Kim Dae Jung, líderes de regiões menos privilegiadas do país, contrários à

concentração dos chaebols. Como a oposição não agiu em conjunto no processo eleitoral, o

candidato da situação, General Roh Tae Woo (1988-1993), acabou por ganhar o pleito.

O candidato eleito herdou um cenário de fortes reivindicações por parte da classe

trabalhadora, que vinha de um movimento grevista desde 1987, buscando fazer frente à

Federação dos Sindicatos, que representava os empresários. Os protestos fazem com que o

Estado passe a gastar mais no bem-estar dos mais necessitados e aumente significativamente o

custo da força de trabalho.

O gasto público em desenvolvimento social chega a 10,2% do PIB (VELASCO E

CRUZ, 2007). A irrupção dos trabalhadores fez com que o crescimento diminuísse e a

inflação crescesse, fatos que fizeram a classe trabalhadora perder o apoio da classe média. Um

dos principais líderes políticos do país, Kim Young Sam, alia-se com as alas mais

conservadoras para lançar-se candidato à presidência nas eleições de 1993, buscando

responder aos anseios da classe média aliada com a sua popularidade.

Kim Young Sam (1993-1998) é eleito presidente e passa a liderar as reformas

liberalizantes no país, ainda que de forma um tanto descompassada com o discurso oficial.

Nesse período, outros mercados emergentes, principalmente os latino–americanos, estão

abrindo suas economias e, com a confiança dos mercados estrangeiros frente ao mercado

51

coreano, os chaebols passaram se internacionalizar. Os grandes grupos empresariais passam a

absorver a liquidez do mercado que lhes era disponibilizada.

A Coreia, por sua vez, na segunda metade dos anos 90, viu serem reforçadas, na opinião dos ‘mercados financeiros’, as suas ‘virtudes’ enquanto economia promissora e capaz de crescer rapidamente. A pletora de liquidez foi induzindo a um relaxamento crescente com relação ao seu déficit em transações correntes com o exterior. Os recursos financeiros baratos e abundantes colocados à disposição dos chaebols aumentaram-lhe o apetite pelo crescimento e pela perseguição de metas de ocupação de mercados (ampliação de market-shares). Os grandes grupos aceleraram a sua internacionalização, investiram pesadamente na fixação de suas marcas, buscaram penetrar os mercados dos países desenvolvidos (especialmente os EUA) através de investimentos diretos. (COUTINHO, 2001, p. 371).

Os investimentos realizados pelas grandes holdings coreanas contribuíram para a

ampliação do déficit na balança de pagamentos no que diz respeito ao saldo de capitais. Em

conjunto com isso, seguindo a tendência neoliberalizante internacional, a Coreia do Sul

também estava a realizar leilões para a venda de suas empresas públicas.

Em março de 1994 o governo iniciou seu programa para transferir 68 das 133 empresas públicas ao setor privado através de leilões em um período de quatro anos. Entretanto, em pouco tempo o programa começou a enfrentar dificuldades. Tornou-se claro que os chaebols eram os únicos grupos empresarias em condições de comprar essas companhias. Assim, uma parcela cada vez maior do poder econômico do país acabaria concentrada em suas mãos. (BERNARD, 1997, p. 256 apud VELASCO E CRUZ, 2007, p. 273).

Todavia, o país não poderia cometer o mesmo erro do passado e limitações foram

impostas aos chaebols quanto à participação nos leilões. Logo o governo baixou uma medida

que impedia que os trinta maiores grupos participassem de leilões. Mas, para promover

mudanças de infraestrutura, a fim de concorrer na economia aberta, o país precisaria recorrer

ao crédito privado e às empreiteiras, e os chaebols estavam aí mais uma vez como

beneficiados do projeto. Nesse primeiro processo liberalizante por Kim Young Sam, os

chaebols ainda saíram com o mesmo grau de poder (VELASCO E CRUZ, 2007).

A quebra da bolsa de valores de Hong Kong fez com que a confiança nas economias

dos Tigres Asiáticos caísse. Como a Coreia já estava com um balanço de pagamentos

deficitário e detinha uma poupança externa de curto prazo considerável, a quebra da bolsa fez

com que os investimentos se retraíssem e prejudicou o financiamento econômico do país

(GUIMARÃES, 2010).

52

A solução adotada pelo país foi a reestruturação setorial dos grupos econômicos, mas os

chaebols não iriam permitir tal manobra. No entanto, com o aprofundamento da crise, eles

acabaram cedendo, todavia isso não era suficiente. A falta de transparência dos grandes grupos

coreanos e das relações Estado-capital figura como um dos principais motivos para a crise dos

mercados asiáticos (COUTINHO, 2001; GUIMARÃES, 2010; VELASCO E CRUZ, 2007).

Kim Dae Jung (1998-2003) é eleito em meio à crise e sua notória oposição ao regime

autoritário e aos chaebols aguça o processo de liberalização das grandes corporações do país.

Jung reúne os vinte maiores chaebols e estabelece cinco princípios, que mais tarde viraram

leis, para a reestruturação dos grupos econômicos, “todos eles pouco compatíveis com o seu

modo de ser e agir: transparência, redução das garantias cruzadas de débito; diminuição do

coeficiente de endividamento; enxugamento de atividades; prestação de contas” (VELASCO

E CRUZ, 2007, p. 277).

Houve também o processo de fusão e aquisição de setores dos holdings para o capital

estrangeiro, a fim de reformar o cenário produtivo do país. Com maiores investimentos, a

Coreia se recupera em 12 meses da crise de 1997 (COUTINHO, 2001), contando com maiores

investimentos externos e financeiros, todavia com maior emprego informal e renda mais

concentrada (VELASCO E CRUZ, 2007).

Apesar de tudo, os chaebols continuam compondo a paisagem econômica dessa ‘nova Coreia’. Favorecidos pelas condições criadas com a recuperação econômica, eles adotaram uma série de estratagemas para contornar as regras adotadas para destruí-los, sem afrontá-las, e empregaram todo o poder de barganha que lhes restava para ampliar suas oportunidades de ganho sem abrir mão da forma de organização que lhes era própria. Sobreviveram, mas como fruto de vitórias obtidas em combates travados na retaguarda. (VELASCO E CRUZ, 2007, p. 282).

Tabela 5 − Desempenho econômico comparado − 1980-2000 Brasil Coreia do Sul

Período Taxa média de cresc. do PIB

Período Taxa média de cresc. do PIB

1981-1983 (recessão provocada pelo “choque da crise da dívida”)

-1,0% 1980-1982 (recessão/estagnação após a queda de Park

e crise da dívida)

1,1%

1984-1989 (crescimento irregular com inflação alta, stop n’go, pré e pós Plano Cruzado)

4,5% 1983-1987 (drive exportador,

integração econômica com o Japão e

upgrade industrial)

10,2%

53

1990-1993 (recessão decorrente dos planos fracassados Collor I e Collor II, com início de abertura)

-1,3% 1988-1993 (transição para a economia

baseada nos complexos eletrônico

e automotivo)

7,8%

1994-1998 (estabilização com Plano Real, juros altos e câmbio valorizado)

3,6% 1994-1997 (expansão com abertura financeira e

internacionalização dos chaebols)

7,5%

1999-2000 (crise cambial e recuperação precária)

1,3% 1998-2000 (crise cambial e

recuperação promissora)

2,0%

Taxa média anual do período 1981-2000

1,6% Taxa média anual do período 1980-2000

5,4%

Fonte: Coutinho (2001).

A tabela acima mostra a diferença da economia dos dois países no período estudado

nesse capítulo (Tabela 5). A crise da dívida, junto com o choque do petróleo, se mostra

devastadora no Brasil. A abertura dos dois países tem efeitos econômicos diferentes: a Coreia

mantem taxas altas de crescimento graças a resistência econômica dos chaebols; o Brasil sofre

um desmanche estatal forte, em meio a severas crises econômicas internas.

Os anos vindouros vão ser marcantes para o Brasil, uma vez que novamente o Estado

volta a agir de forma mais afirmativa no desenvolvimento, contrariando o histórico da década

de 1990. Quanto à Coreia, a busca pelo fomento de grupos menores, antes deixados em

segundo plano, passa a ser uma das prioridades para um desenvolvimento mais igualitário e

justo do país, enquanto externamente os chaebols buscam dominância, contando ainda com o

funding estatal.

54

CAPÍTULO 4 − ANOS 2000

Como visto no capítulo anterior, houve uma mudança nos paradigmas coreano e

brasileiro de desenvolvimento na década de 1990. Ambos os países abandonam suas tradições

desenvolvimentistas e fazem reformas na sua economia, principalmente a industrial. No caso

do Brasil, a privatização das estatais foi o principal reflexo da reforma ocorrida no período. Já

na Coreia, a quebra dos chaebols, tanto nos setores verticais quanto horizontais nos quais

haviam se expandido, foi o processo mais notável para o país asiático.

Como nos anos 1980, em que o caminho entre as duas nações foi distinto, os anos

2000 mostram novamente uma mudança da abordagem estatal de um dos países. O Brasil,

ainda que de forma menos agressiva, começa a trazer o Estado e as instituições de volta à

economia nacional. Em 2002, o presidente que sucede Fernando Henrique Cardoso é Luiz

Inácio Lula da Silva (2003-2010). A Coreia do Sul, por sua vez, mantém-se na política

econômica exercida por Kim Dae Jung, que segue as exigências do Fundo Monetário

Internacional (FMI), mas o papel do Estado continua grande em sua economia. Todavia, no

momento devemos nos concentrar na mudança de caráter do Estado brasileiro frente a

questões econômicas e sociais na década (VELASCO E CRUZ, 2007).

Lula tem um histórico de peso nos movimentos sindicais que foram de extrema

importância no fim do regime autoritário, estando presente nos protestos dos trabalhadores

das fábricas automotivas do ABC paulista. Sua eleição foi uma reação frente às políticas

adotadas pelo seu predecessor. Como o programa neoliberal baseado na economia ortodoxa é

fundamentado no corte de gastos e arrocho salarial, o voto dos mais pobres foi muito

importante na sua eleição. Em todo o continente sul-americano, houve uma reação desse

gênero, reflexo da desaprovação das políticas econômicas anteriores. (BENJAMIN; SADER

et al., 2004)

Lula, assim que eleito, tinha muitas expectativas na sua presidência, muitos

acreditavam que esse era o momento em que demandas históricas seriam atendidas, como a

reforma agrária, a reforma tributária, somadas com o fim de políticas econômicas ortodoxas.

No entanto, não é isso o que ocorre: assim que o presidente assume o governo, demonstra

intenções de continuar com a política econômica exercida nos anos anteriores.

Isso pode ser explicado pelo temor lançado na mídia e nos empresários que não tinham

conhecimento do que poderia ser a política econômica do governo brasileiro nas mãos do

 

55

Partido dos Trabalhadores (PT). A fim de não acabar com o modus operandi econômico

estabelecido na década anterior, o governo continuou com as metas de superávit primário, que

de 2003 a 2005 representaram 4,25% do PIB (DINIZ; BOSCHI, 2007).

É importante destacar a situação econômica em que o país se encontrava no momento

da sucessão presidencial. A inflação era de 12,53%, com uma dívida de US$ 14,7 bilhões com

o FMI, a dívida externa representava 57,5% do PIB, com uma taxa de juros de 25% e com a

balança comercial deficitária em US$ 8,4 bilhões. É compreensível a manutenção de algumas

políticas de cunho ortodoxo, dado o estado econômico com uma inflação chegando à casa de

dois dígitos. Portanto, a mudança de abordagem por parte do governo brasileiro, no que diz

respeito à economia, seria paulatina.

Logo no início do mandato, é lançado um programa de cunho social, o “Fome Zero”,

todavia os críticos da esquerda logo afirmaram que seria difícil dar cabo ao programa

mantendo um viés econômico monetarista. Para César Benjamin (2004), o governo Lula

claramente manteve o viés neoliberal das gestões anteriores, apontando um cenário incerto

para os anos seguintes.

No entanto, ao analisarmos os gastos sociais do segundo governo de FHC e os do

governo Lula até 2005, podemos observar um aumento (Tabelas 6 e 7).

Tabela 6 – Gastos sociais totais – governo FHC II (em R$ milhões) Ano 1999 2000 2001 2002

Gasto 132.901 150.291 173.8691 198.971

Fonte: Diniz e Boschi (2007, p. 117).

Tabela 7 − Gastos sociais totais – governo Lula (em R$ milhões) Ano 2003 2004 2005

Gasto 232.810 268.863 301.683

Fonte: Diniz e Boschi (2007, p. 117).

Somado a isso, há uma mudança no índice de Gini no país e uma transferência de

renda de cerca de R$ 7,1 bilhões, como observado por Eli Diniz e Boschi (2007, p. 111):

Importante assinalar que, pela primeira vez, observou-se uma inflexão nos índices de desigualdade social no país, Ainda que expressa numa pequena variação do índice de Gini de 0,573, registrado no governo FHC, para 0,559, essa cifra inclui uma transferência de renda de R$ 7,1 bilhões no período Lula, enquanto comparada a um valor de R$ 2,3 bilhões no governo FHC. Por outro lado, expressando uma tendência

56

à desconcentração, o índice de Gini da distribuição dos rendimentos do trabalho, de 1995 a 2005, apresentou tendência de declínio. Esse indicador estava em 0,585 em 1995, e atingiu 0,566, em 2001, e passou para 0,544 em 2005, o melhor resultado desde 1981. Em dez anos, esse indicador apresentou queda de 7% segundo as informações do PNAD.

Diniz e Boschi também ressaltam a importância do programa “Bolsa Família” no

combate à pobreza no país. O programa é um aperfeiçoamento do “Bolsa Escola”,

aumentando sua abrangência e supervisão e chegando a atender uma quantidade de lares

pobres acima da estimativa do Ministério do Desenvolvimento Social (DINIZ BOSCHI,

2007). A mudança de perspectiva frente às problemáticas sociais é clara no novo governo.

Por outro lado, a Coreia do Sul, que também passa por um processo de sucessão

presidencial no ano de 2003, demonstra não ser muito clara na sua política econômica ao

longo da década, seguindo as recomendações do FMI para o desmantelamento dos grandes

grupos empresariais na continuidade do governo Kim Dae Jung no período pós-crise. O

governo coreano, em conformidade com o receituário do FMI, aumentou a taxa de juros de

forma significativa, fazendo com que a obtenção de crédito por parte da pequena e média

indústria encontrasse fortes obstáculos, levando essas empresas à falência, uma vez que mais

bancos públicos também passaram à iniciativa privada (HEO et al., 2008).

O governo também promoveu uma flexibilização das leis do trabalho, visando facilitar

demissões, e também fez fusões dos setores mais fracos dos chaebols, muitas delas com

empresas estrangeiras. O aumento do consumo baseado no cartão de crédito foi incentivado

pelo presidente Kim Dae Jung.

O novo presidente, Roh Moo Hyun (2003-2008), foi obrigado a arcar com os custos da

política econômica adotada por Kim. O presidente encontrou um contexto de

descontentamento por parte dos trabalhadores e das pequenas empresas, tendo em vista os

métodos ortodoxos adotados pelo seu antecessor. Graças a esses fatores, o gasto com o bem-

estar social cresceu, de 17,9% em 1997 para 25,3% em 2006. A economia teve um

crescimento menor tanto para Roh Moo Hyun quanto para Kim Dae Jung, cerca de 4% a.a.,

enquanto Kim Young Sam teve um crescimento médio de 7,1% a.a.

Outro fator herdado que contribuiu para o baixo crescimento coreano foi a baixa taxa

de investimento doméstico. Como na década anterior, os holdings do país passaram por um

processo da internacionalização, seus investimentos foram focalizados em outros países, com

a finalidade de redução de custos e maior competitividade, uma vez que Roh aumentou

57

impostos para poder arcar com maiores gastos sociais, o que fez a taxa de investimentos

domésticos cair de forma notável.

De acordo com Heo et al. (2008), o desempenho econômico da presidência de Roh

Moo Hyun pode ser resumido da seguinte maneira:

In summary, the Roh administration had to deal with the results of the my opic policies adopted by the Kim Dae-jung administration to quickly recover from the financial crisis. To make matters worse, the Roh administration in creased social welfare expenditures by increasing taxes to improve social wealth redistribution. As a result, corporate capital moved to foreign countries looking for better business environments, which turned slowed the economy. (HEO et al., 2008, p. 21).16

Apesar das tentativas de sanar os problemas causados pela abrupta abertura do

mercado coreano a partir da crise, o governo de Roh Moo Hyun não foi bem-sucedido em

termos gerais da economia. Apesar de ter ensaiado uma quebra do modelo neoliberal, não

houve uma volta definitiva ao desenvolvimentismo nos moldes de Park. Um exemplo disso

é o crescimento nos valores dos empréstimos do KDB. Esse fator, no entanto, é devido a um

maior ganho de independência dos chaebols após o big-push estatal na metade da década de

1980.

O seu sucessor, Lee Myung Bak (2008-2013), promoveu várias políticas no início do

seu governo que não foram muito bem vistas pela população, teve um viés mais orientado

para os negócios internacionais e concentrou-se em baixar os impostos para os mais ricos,

trazendo descontentamento às camadas populares. Também houve planos de privatizar o KDB

e transformar a economia mais voltada para o mercado (MICHELL, 2009). Todavia, durante a

crise de 2009, a Coreia do Sul resistiu bem, pois tinha integrantes fortes na indústria nacional,

como os chaebols.

A crise internacional veio de encontro aos planos de Bak, que buscava uma maior

integração com o mercado globalizado. É importante destacar que a economia coreana ainda

tem um pensamento estrutural marcante, principalmente no que diz respeito à sua economia

doméstica, sendo o país que deu a melhor resposta à crise mundial, de acordo com os dados

da revista Carta Capital de 12 de novembro de 2014.

16 Resumindo, a administração de Roh teve que lidar com os resultados das politicas míopes adotadas pela administração de Kim Dae-jung para rapidamente recuperar-se da crise financeira. Para deixar as coisas ainda piores, o governo de Roh aumentou os gastos sociais pelo aumento de impostos para promover a distribuição de renda. Como resultado disso, o capital empresarial foi para outros países buscando melhores ambientes de negócios, o que desacelerou a economia (tradução nossa).

58

4.1 A mudança de estratégia do Estado brasileiro para o desenvolvimento econômico

Os dados apresentados sobre o Brasil evidenciam um câmbio na abordagem da política

econômica. A mudança brasileira está relacionada, de certa maneira, a uma reedição do

pensamento econômico hegemônico no continente latino-americano pré-neoliberal, que seria

o desenvolvimentismo.

De acordo com diversos intelectuais da área econômica e política, como Bresser-

Pereira (2006), João Sicsú (2007) e Armando Boito Jr. (2012), o Brasil apresenta o que é

chamado de “novo desenvolvimentismo” ou “neodesenvolvimentismo”. Diferentemente do

modelo nacional-desenvolvimentista que foi adotado pelo país desde a década de 1930 até o

fim do regime militar, o novo desenvolvimentismo não é focado no PSI e sim nas

exportações. Não se busca diminuir o tamanho do Estado, mas sim rearranjá-lo a fim de

fortalecer o mercado interno. Outros objetivos são: a formação de poupança interna e o

controle do câmbio quando necessário (BRESSER-PEREIRA, 2006). Esses preceitos vão de

encontro ao receituário brasileiro adotado na década de 1990.

De acordo com Boito Jr. (2012), o governo petista mostrou um certo distanciamento

do modelo da década passada. O neodesenvolvimentismo teria sido posto em prática quando o

Estado foi capaz de adotar as seguintes políticas:

a) políticas de recuperação do salário mínimo e de transferência de renda que aumentaram o poder aquisitivo das camadas mais pobres, isto é, daqueles que apresentam maior propensão ao consumo; b) forte elevação da dotação orçamentária do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES) para financiamento das grandes empresas nacionais a uma taxa de juro favorecida ou subsidiada; c) política externa de apoio às grandes empresas brasileiras ou instaladas no Brasil para exportação de mercadorias e de capitais; d) política econômica anticíclica – medidas para manter a demanda agregada nos momentos de crise econômica e e) incremento do investimento estatal em infraestrutura. (BOITO JR., 2012, p. 5).

Para Boito Jr., a estratégia neodesenvolvimentista apresenta uma mudança frente às

políticas ortodoxas convencionais, mas não representa uma ruptura com elas. Boito Jr. afirma

que o “neodesenvolvimentismo é o desenvolvimentismo da época do capitalismo neoliberal”

(BOITO JR., 2012, p. 6). Ao citar seis características que diferem o neodesenvolvimentismo

do nacional-desenvolvimentismo, o autor define a nova estratégia como um projeto muito

menos ambicioso que o antigo nacional-desenvolvimentismo.

59

a) apresenta um crescimento econômico que, embora seja muito maior do que aquele verificado na década de 1990, é bem mais modesto que aquele propiciado pelo velho desenvolvimentismo, b) confere importância menor ao mercado interno, posto que mantém a abertura comercial herdada de Collor e de FHC, c) atribui importância menor à política de desenvolvimento do parque industrial local (BRESSER-PEREIRA, 2012), d) aceita os constrangimentos da divisão internacional do trabalho, promovendo, em condições históricas novas, uma reativação da função primário-exportadora do capitalismo brasileiro, e) tem menor capacidade distributiva da renda e f) o novo desenvolvimentismo é dirigido por uma fração burguesa que perdeu toda veleidade de agir como força social nacionalista e antiimperialista. (BOITO JR., 2012, p. 6).

No entanto, quando Bresser-Pereira (2010) compara as duas estratégias de

desenvolvimento de cunho nacional, a questão de uma maior capacidade distributiva de renda

é salientada como vantagem do programa novo-desenvolvimentista, pois traz o fomento do

mercado interno e deve estar vinculada a uma política industrial estratégica e limitada.

De fato, o modelo nacional-desenvolvimentista inicialmente detinha um potencial para

a distribuição de renda, com o aumento de produção e de salários principalmente na década de

1950. Todavia, a política econômica do governo militar fez com que a concentração de renda

fosse a chave para o consumo interno de bens duráveis de maior valor agregado, como

automóveis (EVANS, 1980).

A quebra de modelo econômico não é abrupta e muito disso se deve ao fato de que o

modelo neodesenvolvimentista não é protecionista, e sim exportador, e a ele compete

responsabilidade fiscal e controle inflacionário, “o papel do Estado diminui e o do mercado

aumenta” (BRESSER-PEREIRA; GALA, 2010, p. 679). Ainda que, no viés crítico, isso possa

ser considerado uma estratégia de crescimento tímida frente ao programa neoliberal, a

mudança é inegável e trouxe ganhos ao país.

Podemos observar as diferenças dos tipos de desenvolvimentismo no quadro 4.

60

Quadro 4 – Velho desenvolvimentismo x Novo desenvolvimentismo Fonte: Bresser-Pereira e Gala (2010). Para João Sicsú, as diferenças também residem no contexto histórico da acumulação

capitalista no Brasil, particularmente, no que diz respeito ao protecionismo:

Essa é uma das diferenças fundamentais entre o velho e novo desenvolvimentismo. Enquanto o primeiro focava suas políticas defensivas na balança comercial, procurando tornar a economia menos dependente da exportação de produtos primários, uma vez que a economia brasileira transitava de uma economia agro-exportadora para uma economia industrial; o segundo — neste particular — está basicamente preocupado em estabelecer critérios de controle da conta de capitais para que o país possa ter trajetórias de crescimentos não abortadas e possa constituir políticas autônomas rumo ao pleno emprego e à equidade social. O protecionismo moderno deve ser o da conta de capitais — as transações comerciais devem ser liberalizadas, embora esta abertura deva ser feita de uma forma inteligente, cautelosa e negociada para que reciprocidades que interessem às exportações brasileiras sejam conquistadas. (SICSÚ; PAULA; MICHEL, 2007, p. 519-520).

Na citação, quando se afirma que a liberalização deve ser feita de “uma forma

inteligente”, é feita uma crítica ao modelo ortodoxo, visto que o modelo neoliberal realizou

uma abertura econômica mais abrupta e agressiva nos anos anteriores, prejudicando o

posicionamento econômico do Brasil como um player autônomo no cenário internacional.

Ditando o ritmo no câmbio da abordagem macroeconômica do Brasil, o BNDES mais

uma vez volta a ser um dos principais órgãos. A próxima seção tratará das políticas do banco

para o país em perspectiva comparada com o KDB coreano.

4.2 Os bancos de desenvolvimento de 2003 a 2010

61

Dada a mudança iniciada em 2003 no Brasil, o BNDES também teve seu perfil

modificado, em primeiro lugar por voltar a financiar empresas públicas, como a Petrobras, em

obras de infraestrutura. Tudo isso devido a uma nova abordagem dada à problemática do

crescimento econômico trazida pelo novo governo. Em 2004, o Estado lançou o Programa de

Aceleração do Crescimento (PAC).

O BNDES foi responsável pela modernização dos setores produtivos, importação,

exportação, micro e médias empresas, desenvolvimento social e urbano. O banco reedita o

papel que teve desde a sua criação até os anos 1990, o papel de grande investidor, responsável

pela injeção de liquidez no mercado nacional.

[...] o banco teve importante papel, assim como outros bancos oficiais, na manutenção do nível dos investimentos durante a fase de escassez de liquidez pela qual passou o sistema financeiro privado nacional em decorrência da crise financeira interncional, que teve seu ápice em setembro de 2008. Entre 2004 e 2010, o volume de financiamento ssalta de R$ 40,0 bilhões para R$ 168,4 bilhões, evidenciando o aumento dos empréstimos do banco nos últimos anos. (COUTO; TRINTIM, 2012, p. 7).

O maior volume de financiamentos por parte do banco de desenvolvimento brasileiro

evidencia a mudança na abordagem do BNDES frente à economia nacional (Gráfico 4). A

Coreia do Sul, por sua vez, teve um aumento nos desembolsos em capital produtivo,

principalmente no fim do governo de Roh Moo Hyun. Isso foi seguido pelo seu sucessor,

pelo menos no ano de 2008, visto que, no período de Bak, houve a grande crise

internacional e o KDB tomou medidas anticíclicas para não ser afetado, tendo um papel

preponderante (Gráfico 5).

Gráfico 4 – Desembolsos do BNDES 2000-2011 (em bilhões de reais) Fonte: Couto e Trintim (2012).

62

Gráfico 5 − Desembolsos KDB 2002-2008 (em bilhões de wons) Fonte: elaboração própria a partir de Relatórios KDB (2003-2008).

Os desembolsos dos bancos apresentam sinais de crescimento especialmente no

intervalo de 2007 a 2008. Ambos apresentam aumento de 42% nominalmente nos seus

desembolsos, enquanto de 2008 para 2009 o BNDES apresenta um crescimento de 49%.

Esse crescimento significativo tem duas causas principais, o início da política dos

campeões nacionais, com fusões para formar grandes companhias em setores em que o Brasil

é mais competitivo, no caso alimentação e bebidas; e a injeção de crédito na economia, que

começava a sentir alguns efeitos da grande crise financeira internacional, como exemplificado

por Couto e Trintim (2012):

a partir de setembro de 2008, com o agravamento da crise financeira internacional (desencadeada pelo mercado subprime dos EstadosUnidos) e a consequente redução da liquidez externa, o governo teve que atuar de forma a minimizar os efeitos da restrição do crédito. No que diz respeito ao BNDES, houve ampliação das linhas de financiamento às exportações e ao capital de giro, e o banco foi responsável por cerca de um terço da expansão do crédito no país. Em setembro de 2008, o BNDES respondia por apenas 16% da oferta de crédito ao setor privado. Mas com o agravamento da crise financeira internacional, a participação do BNDES sobe para 17% em dezembro do mesmo ano. (COUTO; TRINTIM, 2012, p. 14-15).

Ou seja, ao contrário dos anos anteriores, o Estado brasileiro, através do BNDES,

passava a protagonizar políticas anticíclicas. É notável a mudança de abordagem frente à

economia por parte do Estado. A Coreia do Sul, por sua vez, também faz uso de sua máquina

estatal para contornar a crise, com desembolsos do KDB. Apesar de os empréstimos de 2009

serem menores do que os de 2008, a quantidade investida na indústria foi 0,3% maior, ou seja,

30.508 32.676 30.630 30.670 30.684

39.359

56.081 54.765

0

10.000

20.000

30.000

40.000

50.000

60.000

2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009

63

manteve-se dentro do mesmo patamar. A economia do país asiático também contou com

auxílio dos chaebols, principalmente dos fabricantes de automóveis, que concentraram suas

vendas no mercado chinês (MICHELL, 2009).

No que diz respeito ao direcionamento dos empréstimos dos bancos de

desenvolvimento, tanto no Brasil quanto na Coreia do Sul o maior beneficiado é a indústria. O

desembolso para a indústria em geral representou, de 2002 a 2009, 53,4% (KDB, 2003-2010)

dos desembolsos do KDB, em média. A respeito do BNDES, a média de desembolsos de 2002

a 2010 foi de 45,6% (COUTO; TRINTIM, 2012).

Os dois países também apresentam uma semelhança no que diz respeito ao

investimento na pequena e média indústria. Contrariando o seu histórico das décadas de 1970

e 1980, os países passaram a investir mais nas indústrias de menor porte, a partir dos anos

2000. O gráfico 6 ilustra o caso do Brasil.

Gráfico 6 – Distribuição percentual dos empréstimos do BNDES de acordo com o porte da empresa (2002-2011) Fonte: Couto e Trintim (2012).

A Coreia do Sul mantém clara a sua política de acabar com as assimetrias econômicas

internas, pois os grandes holdings coreanos, durante muito tempo, principalmente nos

governos de Park Chung Rhee e Chun Doo Hwan, foram praticamente os únicos beneficiados

pelas políticas econômicas do Estado.

Nos relatórios do KDB, fica claro o investimento nos setores menos favorecidos.

Segundo o relatório de 2005, de 2000 até 2005, o KDB desembolsou 3 trilhões de wons,

através do Fundo de Estímulo à Economia Regional, realocando indústrias de Seul para outras

64

áreas menos favorecidas e criando cooperativas de investimento em cooperação com as

autoridades regionais (KDB, 2006).

4.3 O setor automotivo nos anos 2000

Um setor que apresentou avanços e recebeu incentivos do Estado no caso brasileiro foi

o setor automotivo. Sendo uma área preponderante para o mercado interno, como visto nos

capítulos anteriores, o nicho automotor sempre foi um dos grandes responsáveis pela

industrialização do Brasil. No caso coreano, o setor de automóveis também é de alta

relevância, todavia a sua produção é muito mais voltada ao mercado externo, mas suas

flutuações acabam também por causar efeitos multiplicadores na economia coreana, como

mostrado no gráfico 7.

Gráfico 7 – Vendas no setor automotivo (azul) e taxa de desemprego (preto) Fonte: Ebert e Montoney (2007).

É claro, de acordo com o gráfico acima, que o setor automotivo na Coreia do Sul e o

seu desempenho influenciam fortemente a questão do emprego no país. Por isso, os

investimentos estatais ainda são pesados nessa área, pois os efeitos do desemprego podem

gerar uma forte estagnação nos mais variados setores econômicos do país.

No Brasil, a partir dos anos 2000, o setor automotivo também recebeu maiores

incentivos. Um desses incentivos propostos pelo BNDES foi o Programa de Sustentação do

Investimento (PSI), criado em 2009, no contexto de crise internacional. O programa foi muito

65

importante para baratear custos de financiamento de bens de capital, o que permitiu que as

montadoras e fabricantes de autopeças realizassem investimentos planejados para a

manutenção do crescimento do setor.

O âmbito da indústria automotora também recebeu uma quantidade significativa de

desembolsos. Assim como na Coreia, o setor automotivo é responsável por uma expressiva

parte do emprego nacional. De 2002 a 2011, os desembolsos direcionados à fabricação de

carros e autopeças representaram 6% do total do BNDES (Tabela 8), em média, enquanto na

década de 1990 até 2001 os investimentos representaram 4,3% do total, lembrando que os

empréstimos do BNDES na época foram mais retraídos.

Tabela 8 − Desembolsos para o setor automotivo − 2002-2011

Fonte: BNDES (2012).

O programa BNDES Proengenharia é de sua importância para a economia nacional.

Tendo sido criado em 2009, ele se concentra em investimentos em P&D, para o

desenvolvimento de novos motores e peças. Através disso, também é feita uma política de

maior localização da produção para alavancar a industrialização interna (BNDES, 2012).

A localização de projetos no país é fundamental para o desenvolvimento do setor, por permitir atualização tecnológica dos produtos, geração de receitas de royalties e exportação, desenvolvimento de fornecedores, aumento de compra de componentes nacionais etc. (BNDES, 2012, p. 119).

66

As políticas de conteúdo nacional foram fundamentais para o fomento da indústria

nacional. Como visto nos capítulos anteriores, tanto na Coreia quanto no Brasil, a localização

da produção foi um dos catalisadores da superação industrial e obtenção de know-how com a

finalidade de exercer uma competitividade forte na economia internacional.

Atualmente, o setor automotivo na Coreia do Sul apresenta uma taxa de conteúdo local

de 97% (KDI, 2013). Os seus carros já não se baseiam apenas no baixo custo, o forte

investimento em inovação que passou a ocorrer desde a década de 1980 fez com que a

indústria automotiva se concentrasse em desempenho e design. Desse modo, os produtos

coreanos se diferem pela qualidade e têm mais valor agregado.

Outra questão notável é o caráter da produção automotiva nos dois países. A Coreia do

Sul, desde a década de 1980, buscou aumentar sua produção visando ao mercado externo,

principalmente o mercado dos Estados Unidos, ao passo que o Brasil sempre contou com um

mercado interno amplo.

A nação asiática, na segunda metade da década de 1990, já detinha uma produção de

veículos próxima a 3 milhões de unidades, enquanto o Brasil produzia pouco mais de 2

milhões. Considerando o diminuto mercado interno coreano frente ao brasileiro, fica evidente

a vantagem de ser uma economia exportadora em um setor com maior benefício tecnológico.

Como as montadoras brasileiras são em sua maioria internacionais, o interesse de

exportar não é predominante. Basta ver os números de exportação de unidades de veículos das

duas nações em 2010. De acordo com a think tank coreana KDI, em 2010 a Coreia do Sul

exportou 2.772.107 veículos, enquanto o Brasil foi responsável por exportar 767.432

automóveis.

Ao observarmos a indústria do Brasil no período estudado neste capítulo, é clara a sua

evolução. É igualmente nítida a diferença da industrialização coreana em relação à brasileira.

A produção industrial da nação asiática é muito mais intensiva no que tange à tecnologia de

ponta, e o parque produtivo do país é composto de gigantes nacionais que atualmente

competem pela liderança de seus setores. Apesar da matriz produtiva, há uma semelhança

importante, que é a do perfil do Estado frente à economia.

A máquina estatal nos dois países utilizou-se de suas instituições e empresas, no caso

os bancos de desenvolvimento, para o fomento dos seus setores preponderantes. Além disso, a

economia dos dois Estados não se sujeitou inteiramente às regras de mercado, agindo com

pragmatismo, principalmente nos momentos de crise.

67

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O desenvolvimento industrial da periferia sempre foi um desafio grande que pode

sofrer vários percalços. Aqueles que conseguem uma superação do gap industrial considerável

geralmente apresentam um elevado grau de intervenção estatal na economia. As nações

centrais tiveram seu desenvolvimento marcado pela livre-iniciativa burguesa, o mesmo não

ocorre com a maioria dos países da periferia, que geralmente têm uma sociedade menos

igualitária e focada e uma elite formada em produtos primários.

No caso das nações periféricas, a superação do subdesenvolvimento recai na

capacidade de entender as oportunidades que surgem para o fomento econômico, como o

exemplo do proveito da ajuda americana dada à Coreia do Sul nos tempos da Guerra Fria, ou

a busca de poupança externa advinda dos países produtores de petróleo na década de 1970 por

parte do governo brasileiro.

Este trabalho procurou mostrar que há uma forte diferença entre Brasil e Coreia pelo

fato de o país sul-americano ter uma elite rural forte, que apresenta interesses antagônicos aos

industrializantes que permearam a política econômica pós-crise de 1929. A antiga elite agrária

da Coreia do Sul não teve escolha além de se urbanizar após a reforma agrária realizada

durante a guerra civil, e isso teve relação direta com a formação dos chaebols.

No que diz respeito às políticas dos bancos de desenvolvimento, o BNDES e o KDB

têm uma gênese similar, advinda do auxílio americano. Ambos iniciam incentivando o

processo de substituição de importações, mas a sua maior diferença reside no fato de que a

Coreia busca incentivar indústrias privadas nacionais, enquanto o Brasil conta com produtoras

estrangeiras de bens de consumo duráveis e estatais por trás da indústria pesada. O BNDES

passou a financiar também as empresas estrangeiras, enquanto na Coreia as subsidiárias

estrangeiras eram raras e, à medida que os chaebols foram crescendo, o mercado foi se

fechando ainda mais para os que vinham de fora.

A questão da indústria automotiva serve para destacar bem a diferença que a

localização das fábricas exerce no papel de um crescimento próprio. A Coreia do Sul, com um

setor automotor praticamente todo nacional, que teve fortes incentivos governamentais,

representou a superação completa do gap industrial, enquanto as transnacionais brasileiras,

responsáveis pela produção de automóveis, não causaram o mesmo efeito multiplicador,

sendo a única parte verdadeiramente brasileira o setor de autopeças, que é uma indústria

intermediária, de menos valor final se comparada com as vendedoras de veículos.

 

68

Ambos os bancos funcionaram e têm funcionado como agentes de funding de maior

relevância e, no caso brasileiro, como único agente do tipo. O Estado está presente na

economia dos dois países, mas na brasileira ele aparece como empresário e também indutor da

produção. Já na Coreia, o país ocupa o papel de indutor somente, apostando nos grandes

grupos empresariais nacionais voltados à exportação. O Brasil era focado no mercado interno,

muito pelo seu tamanho e população, o que parece ter implicado um caráter concentrador de

renda no Brasil.

O auxílio americano à nação asiática, que deu a esta uma poupança externa abundante,

também foi um elemento diferenciador frente ao Brasil. A Coreia tinha liquidez financeira e

abundância de recursos, enquanto os brasileiros passaram a ter dificuldades em financiar seu

desenvolvimento com recursos externos, sobretudo na década de 1980.

No quesito de liberalização econômica, o BNDES também foi um instrumento

preponderante, ainda que distante de seu propósito original. Na Coreia do Sul, o Estado foi

também um agente de política econômica importante, ao implantar o desmanche de alguns

chaebols para gerar uma concorrência mais sadia e equidade de desenvolvimento.

Há uma certa semelhança entre o BNDES e o KDB nos anos 2000, principalmente no

que diz respeito à crise financeira. Além disso, a política adotada para o fortalecimento da

indústria por setores que o BNDES adotou na década em questão lembra muito o modelo

coreano sob a gestão de Park Chung Hee.

No entanto, os níveis de investimento nacional em relação ao PIB têm que crescer para

que o Brasil possa ter uma superação do mesmo nível que o da Coreia. Apesar de o novo

desenvolvimentismo não alcançar um índice de crescimento tal qual o do antigo

desenvolvimentismo, ele se mostra presente e indutor do crescimento. Contudo, diante do que

foi exposto, é válido afirmar que hoje Brasil e Coreia são países de níveis diferentes no

quesito industrial, todavia, ao utilizarem-se de órgãos como o BNDES para financiar o

desenvolvimento próprio, as expectativas parecem favoráveis, como mostra o exemplo

brasileiro passado e o coreano até hoje.

69

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