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CADERNO CRH, Salvador, v. 27, n. 70, p. 131-150, Jan./Abr. 2014 131 Simone Wolff DESENVOLVIMENTO LOCAL, EMPREENDEDORISMO E “GOVERNANÇA” URBANA: onde está o trabalho nesse contexto? Simone Wolff * O artigo questiona três concepções de políticas públicas que se apresentam hoje como propos- tas alternativas ao paradigma econômico neoliberal e à precarização do mercado laboral que veio em sua esteira: desenvolvimento local, empreendedorismo e governança urbana, tendo como objeto as empresas que compõem o Arranjo Produtivo Local de Tecnologia de Informação da região de Londrina (PR) , o qual se insere dentro das políticas públicas aqui problematizadas. Os dados coletados do MTE demonstram que essas empresas tendem a aportar as atividades rotineiras presentes nas cadeias de valor das grandes transnacionais do ramo, que são mais sujeitas às vulnerabilidades laborais postas pela mobilidade que o capital ganhou com a globalização da economia. Assim, diferente da perspectiva oficial que orienta essas políticas, os resultados remetem a indicadores de precarização já consensuais na literatura especializada sobre o tema: baixo grau (relativo) de escolaridade, salários em torno de 0,5 a um salário mínimo, e alto índice de rotatividade. PALAVRAS-CHAVE: Desenvolvimento local. Empreendedorismo. Governança urbana. Arranjos Pro- dutivos Locais. Precarização do trabalho. INTRODUÇÃO Pretende-se colocar em questão três concep- ções de políticas públicas voltadas para a geração de renda que, conjugadas, se apresentam hoje como respostas ou propostas alternativas à precarização laboral que veio na esteira do paradigma econômico neoliberal: desenvolvimento local, empreendedorismo e governança urbana. Essas noções ganharam re- levância na literatura especializada a partir da dé- cada de 2000, quando os efeitos deletérios das políticas liberalizantes ao comércio exterior sobre o mercado de trabalho no país se tornaram mais evidentes e prementes. Desde então, assiste-se a reformulações substanciais na concepção de ad- ministração pública com impactos nas ações vol- tadas para a geração de emprego e renda, agora marcadas por uma abordagem empreendedora que reorienta o projeto de desenvolvimento nacional para projetos de desenvolvimento local. É nesse contexto que as cidades emergem como lócus pri- vilegiado de atuação dessas políticas. De acordo com Telles (2007, p. 207): [...] é o modo como a ordem das coisas é configu- rada, construída e descrita num plano de refe- rência que desloca os termos do que está posto como “verdade” e “fato incontestável”, e é nesse mesmo deslocamento que essas verdades e esses fatos incontestáveis se desfazem como tais para se refazerem num outro diagrama de relações [...] A força da crítica não está na retórica da de- núncia da barbárie que hoje se instala no mundo. A potência da crítica se faz num parâmetro des- critivo que desloca ou redefine a ordem das coi- sas e suas relações, permitindo, a partir daí, esta- belecer uma pauta de questões que não podem mais ser resolvidas nos termos habituais e que abre, portanto, a fenda a partir da qual a imagi- nação crítica pode se mostrar fecunda. É dentro desse espírito que se levanta a hi- pótese, ou “fenda”, que será aqui desenvolvida. Ou seja, a de que a perspectiva empreendedora que vem norteando as atuais políticas públicas de desenvolvimento e geração de renda, paradoxal- * Doutora em Ciências Sociais. Professora do Departa- mento e do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Estadual de Londrina – UEL. Líder do Grupo de Estudos de Novas Tecnologias e Tra- balho – GENTT/CNPq. ROD. C. G. CID, KM (380). Campus Universitário. Cep:86051- 990. Londrina – Paraná – Brasil. [email protected] Agradeço ao meu orientando Leonardo Antonio Silvano Ferreira pelo auxílio na elaboração dos gráficos e tabelas utlizados neste artigo, durante a vigência de seu curso de Mestrado.

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DESENVOLVIMENTO LOCAL, EMPREENDEDORISMO E“GOVERNANÇA” URBANA: onde está o

trabalho nesse contexto?

Simone Wolff*

O artigo questiona três concepções de políticas públicas que se apresentam hoje como propos-tas alternativas ao paradigma econômico neoliberal e à precarização do mercado laboral queveio em sua esteira: desenvolvimento local, empreendedorismo e governança urbana, tendocomo objeto as empresas que compõem o Arranjo Produtivo Local de Tecnologia de Informaçãoda região de Londrina (PR) , o qual se insere dentro das políticas públicas aqui problematizadas.Os dados coletados do MTE demonstram que essas empresas tendem a aportar as atividadesrotineiras presentes nas cadeias de valor das grandes transnacionais do ramo, que são maissujeitas às vulnerabilidades laborais postas pela mobilidade que o capital ganhou com aglobalização da economia. Assim, diferente da perspectiva oficial que orienta essas políticas,os resultados remetem a indicadores de precarização já consensuais na literatura especializadasobre o tema: baixo grau (relativo) de escolaridade, salários em torno de 0,5 a um saláriomínimo, e alto índice de rotatividade.PALAVRAS-CHAVE: Desenvolvimento local. Empreendedorismo. Governança urbana. Arranjos Pro-dutivos Locais. Precarização do trabalho.

INTRODUÇÃO

Pretende-se colocar em questão três concep-ções de políticas públicas voltadas para a geração derenda que, conjugadas, se apresentam hoje comorespostas ou propostas alternativas à precarizaçãolaboral que veio na esteira do paradigma econômiconeoliberal: desenvolvimento local, empreendedorismo

e governança urbana. Essas noções ganharam re-levância na literatura especializada a partir da dé-cada de 2000, quando os efeitos deletérios daspolíticas liberalizantes ao comércio exterior sobreo mercado de trabalho no país se tornaram maisevidentes e prementes. Desde então, assiste-se areformulações substanciais na concepção de ad-ministração pública com impactos nas ações vol-tadas para a geração de emprego e renda, agora

marcadas por uma abordagem empreendedora quereorienta o projeto de desenvolvimento nacionalpara projetos de desenvolvimento local. É nessecontexto que as cidades emergem como lócus pri-vilegiado de atuação dessas políticas.

De acordo com Telles (2007, p. 207):

[...] é o modo como a ordem das coisas é configu-rada, construída e descrita num plano de refe-rência que desloca os termos do que está postocomo “verdade” e “fato incontestável”, e é nessemesmo deslocamento que essas verdades e essesfatos incontestáveis se desfazem como tais parase refazerem num outro diagrama de relações[...] A força da crítica não está na retórica da de-núncia da barbárie que hoje se instala no mundo.A potência da crítica se faz num parâmetro des-critivo que desloca ou redefine a ordem das coi-sas e suas relações, permitindo, a partir daí, esta-belecer uma pauta de questões que não podemmais ser resolvidas nos termos habituais e queabre, portanto, a fenda a partir da qual a imagi-nação crítica pode se mostrar fecunda.

É dentro desse espírito que se levanta a hi-pótese, ou “fenda”, que será aqui desenvolvida.Ou seja, a de que a perspectiva empreendedoraque vem norteando as atuais políticas públicas dedesenvolvimento e geração de renda, paradoxal-

* Doutora em Ciências Sociais. Professora do Departa-mento e do Programa de Pós-Graduação em CiênciasSociais da Universidade Estadual de Londrina – UEL.Líder do Grupo de Estudos de Novas Tecnologias e Tra-balho – GENTT/CNPq.ROD. C. G. CID, KM (380). Campus Universitário. Cep:86051-990. Londrina – Paraná – Brasil. [email protected]ço ao meu orientando Leonardo Antonio SilvanoFerreira pelo auxílio na elaboração dos gráficos e tabelasutlizados neste artigo, durante a vigência de seu cursode Mestrado.

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mente, acaba por esconder processos deprecarização do trabalho, uma vez que osmicroempreendimentos fomentados tendem aaportar, preponderantemente, as atividades presentesnas “franjas” das cadeias de valor das corporaçõestransnacionais. Espera-se confrontar tal perspecti-va a partir de um “outro diagrama de relações” quepermita recolocar a figura do trabalhador no centrode tais políticas, de modo que ele volte a ser enten-dido como portador de direito à proteção social, jáque, sob a pecha de microempreendedor, elas reca-em sobre seus ombros não mais como direitos,mas como encargos.1

A mudança no paradigma de mercado detrabalho ora em tela reflete os processos de desin-dustrialização levados a cabo pela liberalização daeconomia, carreada pela introdução das políticasneoliberais no país em meados da década de 1990.A mobilidade proporcionada ao grande capital poressa conjuntura ensejou a transferência dos pro-cessos mais rotineiros das plantas produtivas dasgrandes corporações transnacionais para países pe-riféricos, cuja força de trabalho é tradicionalmentemais barata e dócil. É esse fenômeno que explica ocrescimento de ocupações com baixa exigência dequalificação, majoritariamente dentro do setor deserviços, causando inflexões quantitativas e quali-tativas no perfil da classe trabalhadora.

Esse padrão de mercado de trabalho diferesubstancialmente daquele que vigorava nas déca-das de 1970 e 1980, quando as políticas ma-croeconômicas no país eram orientadas pelo mode-lo nacional-desenvolvimentista, pois, a renda oriun-da do trabalho era primordial e fundamental à suamanutenção. Nesse período, houve considerável ge-ração de postos de trabalho, sendo que a maior par-te dos rendimentos relativos “[...] resultava dosomatório das ocupações com remuneração de até1,5 salário mínimo e de mais de cinco salários mí-nimos mensais [...]” (Pochmann, 2012, p. 27).

Conforme Pochmann (2012, p. 30), em quepese o recrudescimento do trabalho formal no país,

particularmente depois de 2004, com o aumentodas exportações e perda relativa na participaçãodas importações, 94,8% dos postos de trabalhocriados ou recriados se inserem na faixa salarialde até 1,5 salário mínimo. Em 2009, esse padrãosalarial representava quase a metade do total deempregos formais no país, sendo que sua maiorparte, 47,8%, estava vinculada ao setor de servi-ços. Assim, contrariamente ao que o governo, in-telectuais do mainstream e mídia oficial levam aacreditar, longe de essa recuperação representaruma mobilidade social rumo a uma “nova” classemédia com potencial “microempreendedor”, essestrabalhadores seriam mais bem analisados sob acategoria de “working poor”, referente a ocupaçõesque estão na base da pirâmide social, com rendi-mentos que giram em torno do salário mínimo(Pochmann, 2012, p. 30).

A partir desse entendimento, a reflexão aquidesenvolvida tentará seguir o caminho inversodaquele que vem pautando as atuais políticas go-vernamentais, ou seja, pensar esse novo universolaboral como um campo que sustenta a atual fasede acumulação capitalista, em que as políticaspúblicas são instrumentalizadas em prol de umaperspectiva de livre iniciativa, a qual reitera, aoinvés de dirimir, a precarização do mercado de tra-balho oportunizada pela globalização da economia.Para tanto, tomou-se como objeto o caso do ArranjoProdutivo Local de Tecnologia de Informação daregião de Londrina – PR (APL de TI), tendo emvista ser essa uma ação que se coloca dentro daspolíticas públicas que apostam no fomento da ativi-dade empreendedora como um meio de incremen-to ao desenvolvimento das economias locais, isto é,dos estados e municípios (CEAPG/CENN, 2012).

A pesquisa contou com uma primeira parterelativa à revisão bibliográfica sobre o tema e umasegunda relativa ao levantamento de dados sobreo perfil da força de trabalho presente nas firmasdo APL selecionado. Os dados foram de naturezaquantitativa, coletados do site do Ministério doTrabalho e Emprego (RAIS/CAGED), e se referiamàs seguintes variáveis: vínculos empregatícios for-mais, salário por segmento de atividade, escolari-

1 Como informa De Sena (2010, p.82) em sua pesquisasobre microempreendimentos na América Latina, via deregra, tais encargos se colocam como uma “alternativa for-çada” frente à atual precarização do mercado laboral formal.

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dade, demissão e rotatividade. Esse percurso foiestruturado em três seções, sendo que em cadauma foram desenvolvidos os três eixos em tornodos quais se articulam as questões conceituais econjunturais que podem explicar, pela perspecti-va aqui assumida, o tripé que atualmente funda-menta as concepções e aplicações das políticaspúblicas de enfoque empreendedorista.

Na primeira seção, será discutido o contextoem que tais políticas emergem, ou seja, a nova confi-guração de cadeias produtivas e de criação de valorformatada pela liberalização da economia e, portan-to, da nova divisão internacional do trabalho engen-drada por essa reestruturação, que trouxe a necessi-dade de novas respostas institucionais concernentesao modelo de desenvolvimento econômico do país(Tapia, 2005). Na segunda, serão apresentadas as re-lações entre as políticas públicas urbanas inspiradasna concepção de desenvolvimento local, que funda-mentam a abordagem empreendedorista de mercadode trabalho atualmente adotada pelo governo brasi-leiro. Na terceira, será discutido o local do trabalhosob os contextos e análises apresentados nos itensanteriores, a partir do caso do APL de TI de Londri-na (PR) e região. Ao final, espera-se revelar a gama deinteresses que perpassam a formulação de tais políti-cas em sua relação com a atual fase de acumulaçãocapitalista e, assim, reencontrar o lugar do trabalhonessa dinâmica.

DAS CONEXÕES ENTRE AS CADEIAS PRODU-TIVAS GLOBAIS DE VALOR E A ABORDAGEMEMPREENDEDORA DE DESENVOLVIMENTO

As convulsivas crises capitalistas que vêmassolando o mundo na atualidade decorrem doesgotamento do padrão de acumulação fordista, oqual levou ao limite a propensão à desvalorizaçãoe substituição da força de trabalho mediante a apli-cação de capital fixo para a melhoria da produtivi-dade, gerando, como efeito, o subconsumo que,por sua vez, conduz à famigerada crise de super-produção. Quando a crise de superprodução ocor-re, outra crise se instala, a de sobreacumulação,

ocasionada pela “falta de oportunidades de inves-timentos lucrativos” (Harvey, 2005b, p. 116). Asaída para a primeira crise é a clássica busca deforça de trabalho barata e novos mercados de con-sumo. Para a crise de sobreacumulação, a soluçãoé a criação de uma demanda de bens de capital ede novos recursos produtivos, o que exige umcontínuo movimento de abertura de novos merca-dos para o aporte do capital excedente emanadodos países de industrialização avançada (2005b,p. 116). Em outras palavras, ambas as crises exi-gem um novo movimento de expansão capitalistaque se manifesta a partir de uma nova divisão in-ternacional do trabalho.

Esse cenário foi arquitetado pelas políticasmacroeconômicas de cunho neoliberal, assinala-das, especialmente, por dois carros-chefe: 1) aglobalização financeira, que tende a concentrar osinvestimentos estrangeiros diretos (IED) nos paí-ses centrais, ampliando seus derivativos a tal pon-to, que eles passaram a exercer influência decisivasobre as políticas de desenvolvimento das nações;e 2) a reestruturação produtiva carreada pelas gran-des empresas a partir da incorporação dastecnologias de informação (TIs), que permitem adescentralização dos seus processos e cadeias deprodução em vários pontos do planeta, sem queseja necessário neles se sediarem e, portanto, ab-sorverem suas vulnerabilidades e encargos locais(Pochmann, 2004).

Foi no bojo dessas políticas que se forjouum novo padrão de acumulação de capital no quala inovação tanto de processos como de produtos eserviços se tornou a principal estratégia competiti-va. Para enfrentar o novo mercado de consumo, asgrandes companhias, outrora alicerçadas sobre ummodelo piramidal e centralizador dos diversos pro-cessos necessários à sua produção, deram lugar afirmas enxutas e flexíveis, caracterizadas pela com-pressão dos níveis hierárquicos e pela generaliza-ção dos processos de terceirização, subcontratação,contratos temporários etc. Tal descentralização émais adequada ao paradigma econômico contem-porâneo uma vez que permite às grandes empre-sas abarcarem rápida e eficientemente novos mer-

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cados – tanto de trabalho como de consumo –, aomesmo tempo em que, pelo suporte das TIs, asconecta em uma rede capaz de integrá-las e geri-lasem tempo real.

Esse novo modelo de empresa transfonteirasexigiu uma nova forma de disposição dos postosde trabalho, o que incidiu diretamente no âmbitoda divisão internacional do trabalho. O sistema li-near, inspirado no modelo fordista de organizaçãodo trabalho, em que tanto os produtos como os ser-viços de apoio à sua fabricação eram realizados nointerior de uma mesma planta, com postos de tra-balho bem definidos e dentro de atividades extre-mamente padronizadas, funcionou bastante bem atémeados dos anos 1970, quando a meta era a produ-ção em série voltada para os mercados nacionais.Entretanto, com o acirramento da competitividadeinternacional e a diversificação do consumo ence-tada pela internacionalização da economia, a plan-ta da fábrica teve de ser repensada. É assim que osistema Toyota tornou-se mais adequado ao con-texto do capitalismo contemporâneo, já que ele sefundamenta num modelo de planta em que os pro-cessos são horizontalizados sob a forma de célulasinterdependentes, cuja relação se dá através desistemas de informação.

Dessa forma, as unidades produtivasextrapolam os muros da fábrica, conformando-secomo semiautônomas e podendo, assim, estabele-cer relações mercantis mais imediatas com seusmercados de consumo, tornando-se mais aptas parasuprir as crescentes variações do mercadoglobalizado. Ademais, tal arranjo possibilita ame-nizar eventuais efeitos negativos que uma unida-de poderia exercer sobre as outras, permitindo queos gargalos de produção sejam detectados e resol-vidos sem que haja interferências sistêmicas nosprocessos de produção em sua totalidade.

Foi assim que as antigas empresas multi-nacionais se transformaram em grandes grupostransnacionais que, de acordo com Pochmann(2004, p. 31-32), hoje compreendem o

[...] mundo inteiro como espaço relevante parasuas decisões de investimentos e produção, pro-vocando, por consequência, a reorganização do

processo produtivo em grandes extensõesterritoriais, sobrepondo, inclusive, jurisdiçõesnacionais.

Com isso, foi inaugurada uma nova divisãointernacional do trabalho, calcada em um “multico-lonialismo renovado” que, embora continue a serdiligenciado pelas grandes corporações, difere deoutros momentos de expansão e readequação geo-gráfico-territorial capitalista, visto que agora não seassenta mais nas chamadas vantagens comparati-vas, mas sim competitivas.

O termo “vantagens competitivas” refere-se aum novo léxico econômico atualmente utilizado parase diferenciar das teorias econômicas clássicas, quese apoiam na antiga concepção de “vantagens com-parativas”, isto é, aquelas referidas à disponibilidadee custos dos fatores de produção (trabalho, matérias-primas e recursos naturais) de cada país e (ou) região(Dall’Acqua, 2003). A ideia de vantagem comparativaesteve em voga como política industrial no Brasil du-rante o período conhecido como desenvolvimentista(que vai de meados dos anos 1940 a meados de1970), o qual supunha “[...] forte expansão estatal eampla internacionalização do mercado interno.”(Pochmann, 2004, p. 57). Já o termo “vantagem com-petitiva” é atribuído aos

[...] recursos específicos do território, ou seja, ascaracterísticas históricas, culturais e sociais doambiente em que as empresas se inserem e quesão dinamizadas na proximidade geográfica en-tre atores, instituições e organizações locais, nãosendo facilmente reproduzidas em outros luga-res (Fuini, 2008, p. 48).

Em síntese, enquanto as vantagens compa-rativas fundamentavam um projeto de desenvol-vimento calcado na noção de nação, em que o Es-tado exercia um papel primordial na promoção doaquecimento da economia interna por meio de gas-tos públicos e políticas que visavam a alavancar ahomogeneização econômica regional, as vantagenscompetitivas partem de um raciocínio contrário,quer dizer, imputam primazia ao local sobre o na-cional. Segundo essa perspectiva, as “vantagenscompetitivas locacionais” são entendidas comoaquelas relacionadas a um ambiente oportuno à

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disseminação e incremento do conhecimento atra-vés do fácil acesso a ativos e serviços de apoio, bemcomo de ações que incentivem a cooperação entreempresas e poder público (BNDES, 2004). É a par-tir desse horizonte que regiões e municípios pas-sam a ser vistos como “variáveis importantes noestudo da competitividade” (Fuini, 2008, p. 150).

Na verdade, o que está em tela é um novotipo de relação entre centro e periferia no plano dadivisão internacional do trabalho, que, diferente-mente das fases anteriores de expansão do capita-lismo, não se organiza primordialmente em tornoda equação manufatura (centro) X matérias-prima(periferia), como no período colonial, ou bens dealto valor agregado + tecnologia avançada (centro)X manufatura (periferia), como ocorreu sob odesenvolvimentismo. A ênfase agora se dá a partirda relação tecnologia avançada + bens de alto va-lor agregado (centro) X manufatura e serviços coli-

gados (periferia) (Pochmann, 2005, 2004). Com isso,desenha-se um novo projeto de desenvolvimentoem que

[...] a equidade [regional] deu lugar ao conceito deeficiência econômica, o emprego passou a ser me-nos importante que a competitividade e o Estado seretirou de arenas estratégicas, ampliando as basespara a retomada de fluxos de capital internacional(Caiado; Ribeiro; Amorim, 2004, p. 67).

É isso que explica o expediente de externalizaçãodas cadeias produtivas e de valor das grandescorporações e o novo contorno que elas ganharam naatualidade. Favorecidas pela desregulamentação e isen-ção tributárias diligenciadas pela liberalização dasfronteiras nacionais ao comércio exterior, as gran-des corporações passaram a distribuir grande par-te de seus processos a empresas fornecedoras esubcontratadas, não só nas regiões periféricas deseus países de origem, mas, sobretudo, nos paísesperiféricos que, além de tradicionalmente oferece-rem força de trabalho barata, passam também aofertar menores custos trabalhistas mediante aflexibilização dos direitos laborais, bem como mai-ores incentivos fiscais e logísticos.

Assim, diferentemente das antigas multina-cionais, as transnacionais caracterizam-se como

“networks globais”, ou seja, firmas cujo espaço deatuação é o mundo, extraindo mais-valia de modouniversal (Dall’Acqua, 2003). Para tanto, a dispo-sição dessas empresas na forma de rede é crucial,pois isso lhes confere a flexibilidade e a mobilida-de necessárias para atuar de forma global, ao mes-mo tempo em que lhes permite centralizar o con-trole de seus processos e transações sem que pre-cisem se fixar nos lugares em que atuam, obtendo,desse modo, a vantagem adicional de se livrar deencargos sociais pátrios (Alves; Wolff, 2008). Nuncaé demais lembrar o papel fundamental das TIs parao gerenciamento desses processos.

Tal mobilidade, por sua vez, requer a cria-ção de localidades com condições adequadas parareceber os “[...] excedentes de capital monetáriocarentes de oportunidades para investimento pro-dutivo e lucrativo” (Harvey, 2004, p. 34). Na me-dida em que essas estruturas exigem intervençãoestatal e financeira, explica-se a formação dos cha-mados distritos industriais ou clusters. Essa con-formação considera a forma pela qual cada unida-de produtiva se organiza a fim de se manter emconexão com os processos globais de produção,tanto para a manutenção de sua competitividadecomo para angariar o amparo de órgãos públicos,ou de parcerias público-privadas (MDIC, 2012;DECOMTEC/FIESP, 2005).

Nos termos de Castillo (2008, p.41), talenfoque supõe perspectivar esses vínculos a par-tir da noção de “processos completos de produ-ção”, ou seja, considerando-os não como unida-des avulsas, mas como atividades integradas “[...]em processos de produção e de trabalho de queforma parte desprendida, externalizada ousubcontratada [...]”, de modo que cada uma cons-titui um nexo dentro de um circuito complexo eintegrado de atividades que envolvem desde a dis-tribuição de insumos, processos e produtos até acomercialização das mercadorias.

Tal estratégia remete àquilo que Silver (2005)apontou como a busca das quatro soluções de queo capitalismo sistematicamente lança mão em mo-mentos de crise, tanto de superprodução como desobreacumulação, a saber:

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[...] a “solução espacial” (relocação geográfica daprodução); a “solução tecnológica/organizacional”(a introdução de tecnologias para reduzir mãode obra e a reestruturação das organizaçõescorporativas, o que inclui a expansão daterceirização e de relações trabalhistas contin-gentes); a “solução de produto” (o deslocamentodo capital para novas linhas de produção, menossujeitas à competição e aos conflitos); e a “solu-ção financeira” (o deslocamento integral do ca-pital da produção para as finanças e a especula-ção) (Silver, 2005, p. 12).

Essas soluções vêm ao encontro da noçãode “processo completo de produção” de Castillo(2008), a partir da qual o autor demarca umametodologia que contempla a análise das cadeiasprodutivas coevas, desde os centros dos quais suasredes se irradiam, traduzidos em ramos particula-res da economia, bem como a maneira pela qualeles atuam na opção de desenvolvimento adotadapelos países e regiões onde elas se conectam oupretendem se conectar. Entendem-se, desse modo,os processos de “especialização forçada” de deter-minados produtos a que as localidades são sub-metidas, os quais, longe de representar maior au-tonomia no seu desenvolvimento, anexa-as de for-ma subordinada através de atividades que deman-dam menor agregação de valor (Caiado; Ribeiro;Amorim, 2004).

Com isso, o grande capital desenha a paisa-gem do mundo de acordo com suas necessidades.A noção de “rearranjo espaciotemporal” (Harvey,2004) ajuda a elucidar melhor essa questão. Trata-se de um artifício a que o capital recorre visando acriar os requisitos necessários para que os exce-dentes tanto de commodities como de capital mo-netário e variável possam ser lucrativamente in-vestidos. Esses requisitos são basicamente três:

[...] (a) deslocamento temporal, mediante investi-mentos em projetos de capital de longo prazo ougastos sociais (como educação e pesquisa), queadiam para um futuro distante a reentrada na cir-culação dos atuais excessos de valores de capital;(b) deslocamentos espaciais, por meio da abertu-ra de novos mercados, novas capacidades produ-tivas e novas possibilidades de recursos, sociais ede trabalho, em outras regiões; ou (c) alguma com-binação de (a) e (b) (Harvey, 2004, p. 34).

Ainda segundo o autor, os requisitos (a) e(b) são aqueles que mais interferem nas localida-des, pois requerem a construção de umainfraestrutura física apropriada a receber os gran-des montantes de capital excedentes, os quais de-mandam toda a sorte de serviços de utilidade pú-blica, tangíveis e intangíveis, para se desenvolver,isto é, parques industriais, saneamento, energiaelétrica, telecomunicações, transportes, armazena-gem, escolas (educação, qualificação).2 Ocorre que,com a perda de controle dos fluxos de capitaisestrangeiros por parte dos Estados, os investimen-tos outrora captados pela mediação dos governoscentrais também se liberalizam. Assim, cada vezmais, tal captação prescinde da intervenção estatale passa a ser realizada mediante negociação diretaentre poder local, público e privado, e o capitalfinanceiro internacional (Harvey, 2006).

É isso que tem levado as gestões públicasmunicipais a deixarem de se orientar, ou de espe-rar pelos fomentos provenientes das administra-ções centrais, optando por uma investida “empre-endedora” na condução de suas políticas de de-senvolvimento, o que esclarece o surgimento dasnumerosas parcerias público-privadas nos últimosanos. Com efeito, essa é a abordagem que atual-mente fundamenta as concepções de desenvolvi-mento local:

A construção de redes que visam fortalecer asligações entre as formas intermediárias de coor-denação constitui-se na própria essência do de-senvolvimento econômico local [...] As redes sãoexpressão das formas de ajustamento entre res-trições extraterritoriais e as relações territoriaise nesse sentido a própria condição para o desen-volvimento local (Muls, 2008, p. 11).

Por isso, a metodologia aqui consideradaparte da análise da forma pela qual cada localida-de organiza sua produção a fim de se manter emconexão com as cadeias globais de produção e va-lor para assegurar a manutenção de sua economia,bem como o amparo dado por órgãos públicos, ourealizado em parceria público-privada, para facul-2 Isso, inclusive, esclarece em grande medida a necessida-

de e efetivação dos processos de privatização que vieramna esteira do neoliberalismo.

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tar essa estratégia. É essa visão que se pretendeproblematizar a seguir.

DAS CONEXÕES ENTRE DESENVOLVIMENTOLOCAL, EMPREENDEDORISMO EGOVERNANÇA URBANA

Entende-se por políticas públicas sociaisaquelas que regulamentam, por intermédio do Es-tado, o modo de reprodução das classes trabalha-doras (Soldano; Andrenacci, 2005). São três asesferas de atuação dessas políticas, quais sejam,as de cunho assistencial (tais como o ProgramaBolsa Família e Bolsa Escola no Brasil), as de ser-viços universais (como acesso à educação, saúde,saneamento básico etc.), e as relativas ao emprego,que visam a regulamentar o mercado de trabalhono sentido de garantir sua (re)qualificação e reno-vação ou perpetuação.

Até recentemente, essas últimas políticasvoltavam-se para a garantia das conquistas traba-lhistas legadas pelo padrão fordista de mercadolaboral, ou seja, aquelas estabelecidas com base emum contrato formal de trabalho, por tempoindeterminado e seguridade social, tanto dentrocomo fora da esfera da produção. Com as mudan-ças trazidas pelas políticas neoliberais, sobretudoaquelas ocasionadas pelos processos de privatizaçãodas instituições reprodutivas da força de trabalho(referentes à educação, previdência, sistemas desaúde etc.), observa-se uma remercantizilização des-ses tipos de serviços, que antes estavam nas mãosou sob a tutela do Estado, e cujas fontes de financia-mento eram os encargos trabalhistas, dentre outrosimpostos voltados para as classes empresariais. Asprivatizações secaram essa última fonte, o que obri-gou tais políticas a virarem a página do paradigmafordista de mercado e de trabalho, de maneira a ade-quarem-se à era do capitalismo flexível.

No Brasil, essa inflexão começou a ocorrernos anos 1990, e teve a ver com a quebra dos mo-nopólios das empresas estatais e a abertura comer-cial, que inauguraram um quadro de intensacompetitividade entre as grandes empresas. A res-

posta foi o estabelecimento de um novo “regimede acumulação financeirizada”, no qual os inves-timentos são dirigidos primeiramente para o mer-cado de capitais, transformando os grandes gru-pos transnacionais “nos principais agentesmicroeconômicos” da economia nacional (Fiori,2001, p. 120-121, grifo do autor).

Desde então, os governos vêm adotandocomo sistemática o controle das taxas de inflaçãoem prol da elevação da taxa de juros, como formade atrair investimentos estrangeiros e garantir oaquecimento da economia, o que acaba acarretan-do um continuado desequilíbrio nas contas públi-cas. Sem o suporte das grandes empresas estataise diante da queda contínua das receitas fiscais emvirtude do arrocho salarial e das políticas de isen-ção tributária às grandes empresas (medida tam-bém recorrentemente utilizada para atraí-las ao es-paço nacional), a saída encontrada foi se inserirno novo regime de acumulação e transformar osdéficits públicos em ativos financeiros (Fiori,2001). Essa dinâmica levou a uma drástica redu-ção dos investimentos governamentais voltadospara o setor industrial, em favor do grande capitalfinanceiro internacional, gerando estagnação daeconomia e ocasionando uma ruptura com relaçãoao modelo de desenvolvimento anterior, no qual ocrescimento econômico era baseado na criação depostos de trabalho formais com salários compatí-veis ao incremento do mercado nacional.

Nessas circunstâncias, as políticas de de-senvolvimento regional quase desaparecem, redu-zindo-se à estratégia de tornar os espaços urbanose seus mercados de trabalho também fonte de es-peculação. A ideia é: “ganha” mais a cidade queoferecer melhores infraestruturas produtivas, mai-ores benefícios ou isenções fiscais e um mercadode trabalho qualificado no que se refere aos servi-ços de apoio à produção e ao consumo, porémmais barato relativamente a outras regiões e, nãomenos importante, sem tradição de conflitos tra-balhistas. É desse modo que a “[...] guerra fiscal

tornou-se o principal fator capaz de alterar as vanta-gens locacionais existentes entre as várias regiões”(Caiado; Ribeiro; Amorim, 2004, p. 70). Dentre elas,

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encontram-se as regulamentações trabalhistas que,cada vez mais, passam a ocorrer nos locais de tra-balho, em detrimento dos acordos nacionais, bor-rando as fronteiras entre o trabalho formal e o in-formal e tornando oportuno o discurso doempreendedorismo urbano e individual (Portal do.../MDIC, 2012).

Assim, a mencionada ênfase na atratividadefinanceira acaba por facultar a volatilidade dos in-vestimentos externos, tornando vulneráveis as fon-tes de emprego e, por conseguinte, o mercado detrabalho ao cassino global. Longe de alavancar umdesenvolvimento autônomo e sustentável, essa si-tuação tem levado os governos municipais a apos-tarem no embelezamento e “gentrificação”3 de suascidades, de modo a passar uma imagem de “cida-de global”, preparada a acolher o capital externo ea frutificar seus investimentos (Telles, 2007, p.204).Ocorre que a concorrência agora estabelecida emâmbito local acaba por tornar essas “cidades glo-bais” verdadeiras “cidades genéricas” (idem), pa-dronizadas tal qual um shopping center (Harvey,2006). No final das contas, o que vai diferenciá-lase, assim, garantir a permanência ou conexão dogrande capital no seu território são os incentivos eas isenções tributárias, bem como as subvençõesao mercado de consumo, principalmente de altopadrão, e às atividades e serviços que podem ser-vir de subsídio aos seus negócios.

Esse contexto impele as políticas públicasde desenvolvimento a atuarem de modo semelhan-te, ou seja, a se estabelecerem como medidas atra-

tivas ao grande capital. É em consequência dissoque ocorre a tendência à concentração de oferta deprodutos e, sobretudo, de força de trabalho de baixovalor agregado, particularmente no setor de servi-ços (Pochmann, 2012), que hoje representa as fran-jas das cadeias de valor das transnacionais (Baltar;Wolff, 2009). Não é à toa que, no final da décadade 1990, a participação dos investimentos estran-geiros diretos declinou consideravelmente no se-tor industrial, na mesma medida em que cresceuno setor de serviços. Em 1997, os IEDs relativosao setor industrial foram da ordem de 13,3%, en-quanto que o setor de serviços aportou 83,7% (Cai-ado; Ribeiro; Amorim, 2004).

É no marco dessa conjuntura que surgem ese disseminam, especialmente a partir da décadade 1990, as concepções que norteiam a noção dedesenvolvimento local como uma alternativa à cres-cente degradação do emprego formal. Essa pers-pectiva de desenvolvimento foi inspirada nas bemsucedidas experiências da chamada Terceira Itália,que, nos anos 1980, revigoraram economias deregiões que se colocavam à margem das grandescadeias de produção europeias, através doengajamento de pequenos empreendimentos emtorno de projetos comuns com o escopo de esti-mular os setores econômicos tradicionais. Essasestratégias logo começaram a influenciar a formu-lação de novas políticas públicas de geração derenda como uma resposta aos desafios colocadosàs economias nacionais pela globalização da eco-nomia e a consequente transnacionalização dasgrandes empresas (Tapia, 2005).

O desenvolvimento local se embasa noschamados pactos territoriais, que

[...] trouxeram uma inovação institucional e deprocedimento, na medida em que foram conce-bidos como um instrumento de intervenção pú-blica descentralizada, ancorado em uma fortecooperação entre o governo, as regiões e as pro-víncias autônomas, para o estabelecimento deobjetivos comuns de maneira conjunta e para aescolha dos setores econômicos a serem estimu-lados (Tapia, 2005, p.135).

No que tange às políticas de geração de renda,seu fundamento principal é a substituição de medi-

3 Gentrificação é um termo utilizado pelos estudos urba-nos para designar um processo de nobilitação de espaçosmetropolitanos deteriorados com vistas à sua ocupaçãopelas classes de maior poder aquisitivo (Wacquant, 2010;Harvey, 2006). Segundo Wacquant (2010, p.52, grifosdo autor), tal fenômeno vem ao encontro de um novoconceito de desenvolvimento urbano fundamentadonum “[…] modelo mais amplo de invisibilidade da clas-se operária na esfera pública e na investigação social aolongo das últimas duas décadas […]“ que causa uma“obliteração literal e figurada do proletariado na cidade”.Para o autor, essa leitura incita “[…] o papel em transfor-mação do Estado, de provedor de assistência social parapopulações de renda mais baixa a fornecedor de serviçose amenidades empresariais para urbanitas de classe mé-dia – e alta – principalmente, entre eles, a limpeza, noambiente construído e nas ruas, dos detritos físicos ehumanos engendrados pela desregulação econômica e ocorte de gastos de bem-estar social, de modo a renovar acidade como local aprazível de e para o consumo burgu-ês” (Wacquant, 2010, p.52, grifos do autor).

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das entendidas como anacrônicas e assistencialistasem relação à força de trabalho, por estratégiasembasadas na noção de “empreendedorismo” (Por-tal do... /MDIC, 2012). É desse modo que as peque-nas e microempresas, geralmente de capital regio-nal e (ou) municipal, ganham destaque. Dentro dessaperspectiva empreendedora de desenvolvimento:

Um importante ator do desenvolvimento econô-mico local são as micro e pequenas empresas.Estas podem desempenhar um papel importan-te e acionar um processo de desenvolvimentoendógeno a partir do momento em que elas seorganizem em redes e, além disso, que essas re-des estejam articuladas com outras formas inter-mediárias de coordenação que, juntas, represen-tam o ambiente institucional de um território ouregião. Quanto maior é o grau de coesão das re-des (sociais e econômicas, formais e informais)entre as formas intermediárias de coordenação,que se manifestam essencialmente no planoterritorial, maior é o estoque de capital social4

deste território e maiores serão as chances de suaestratégia de reação autônoma redirecionar, a seufavor, as forças que emanam da pressãoheterônoma (Portal do... /MDIC, 2012, p. 20).

Segundo essa concepção, portanto, a con-centração de empresas de pequeno porte de umamesma cadeia produtiva leva à formação de distri-tos industriais ou clusters que tornam mais fácil aobtenção de apoio estatal e financeiro. Via de re-gra, o primeiro é requerido para cavar incentivosaos investimentos pecuniários, agora oriundospreponderantemente do setor privado. Nesse sen-tido, a chave para a compreensão da interseçãoentre cadeias produtivas e as mencionadas políti-cas públicas de desenvolvimento local parte daideia de que elas agenciam “[...] estruturas de co-mando (governance) em que uma ou mais empre-sas coordenam e controlam atividades econômi-cas geograficamente dispersas [...]”, de modo aconectá-las àquelas “[...] que são estratégicas e queagregam mais valor [...]” (Dall’Acqua, 2003, p. 94).

É nesse sentido que as localidades ganhamrelevância, pois passam a ser percebidas comoaquelas que comportam os aportes necessários aesse processo, uma vez que ali residem os liames

que podem propulsionar melhorias e inovaçõesmais condizentes com as particularidades dos seusmercados de trabalho e consumo, além de encur-tar o tempo de giro das mercadorias e, com isso,do capital. É isso que leva Dall’Acqua a afirmarque o atual padrão de desenvolvimento “[...] pare-ce depender muito da capacidade política das ins-

tituições nacionais e supranacionais para impulsi-

onar a estratégia de crescimento desses países ou

regiões sob sua jurisdição” (2003, p. 52, grifo daautora).

O empreendedorismo urbano é a abordagemque atualmente orienta as gestões públicas e priva-das para esse tipo de ação. Dentro da nova divisãointernacional do trabalho aqui conceituada.

[...] o movimento rumo ao empreendedorismotem desempenhado um importante papelfacilitador na transição dos sistemas de produ-ção fordistas localizacionalmente rígidos, supor-tados pela doutrina do bem-estar socialkeynesiano, para formas de acumulação flexí-vel, muito mais abertas em termos geográficos ecom base no mercado (Harvey, 2006, p. 181).

A governança urbana tenta combinar quatroestratégias que se tornaram fundamentais para aslocalidades enfrentarem o atual padrão de acumu-lação e competitividade (Harvey, 2006). A primeiradelas já foi aqui mencionada e refere-se à criação devantagens competitivas. Como também se viu, es-ses investimentos têm operado preponderantementeatravés de parcerias público-privadas e se traduzem,entre outros, em subsídios ou renúncias fiscais,recursos logísticos, crédito acessível e financiamen-to de pesquisas e qualificações que possam forjar asvantagens competitivas locacionais.

A segunda concerne ao incremento do mer-cado de consumo local, o que também tem a vercom o acesso ao crédito barato e, particularmente,com a gentrificação metropolitana, que tenta criarmelhorias físicas, arquitetônicas e culturais de modoa gerar um ambiente urbano que possa passar aimagem de um lugar com boa qualidade de vida,cultural, dinâmico e inovador e, portanto, compotencial para absorver novos modos de consu-mo. O aquecimento da indústria do turismo nos4 O conceito de “capital social” será apresentado mais adiante.

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últimos anos, por exemplo, tem se dado a partirdesse tipo de ação. Já a terceira estratégia dagovernança urbana diz respeito às novas formasde buscar captação de recursos do governo fede-ral, que cada vez mais passam por canais que colo-cam em concorrência Estados e municípios.

A quarta medida é aquela que aqui maisinteressa, e tem a ver com a “[...] obtenção dasatividades de controle e comando referentes às al-tas finanças, ao governo, à coleta de informações eao seu processamento.” (Harvey, 2006, p. 177). Ouseja, atividades vinculadas aos serviços de apoioàs transações financeiras, comerciais e produtivasdas grandes empresas, que, além de exigirem umainfraestrutura tecnológica adequada à coleta e aoprocessamento eficiente de informações estratégi-cas, também requerem uma força de trabalho qua-lificada para atender a essas atividades específi-cas. Como tais investimentos compreendem umpatamar intermediário de valor agregado nos seusprocessos, funções e equipamentos, requeremhabilidades especializadas. É aqui que se abremas brechas para a proliferação de instituições pri-vadas de ensino superior que hoje assolam o pa-norama das cidades (Selari, 2009).

Nota-se, assim, todo um discurso oficial queparte do pressuposto de que a maior interconexãoentre os mercados e, portanto, a cooperação coor-denada de uma rede de empresas do mesmo setorpodem atrair maiores investimentos e, desse modo,promover um incremento de sua cadeia produti-va. Segundo essa visão, os fluxos das redes forma-das por tais empresas tenderiam a espraiar inova-ção em todos os pontos de suas cadeias de produ-ção, gerando, com isso, o desenvolvimento dasregiões e localidades que abrangem (Arranjo Pro-dutivo Local, 2011). Assim, tais fluxos levariamprogressivamente à distribuição de recursos àsdemais atividades interligadas, gerando um efeitomultiplicador a toda população do entorno, umavez que promovem a criação de novos empregos erenda, elevam a qualificação requerida e, com isso,incrementam os salários, o consumo e as condi-ções de existência (Câmara; Campos; Sereia, 2009).

Atualmente, os Arranjos Produtivos Locais

(APLs) evidenciam-se como uma das principaispolíticas referentes a essa noção, pois tratam deestimular pequenas e microempresas a se consti-tuírem como clusters que oportunizem a inclina-ção produtiva de uma dada região. Com isso, osAPLs expressam uma concepção de desenvolvi-mento sustentável na qual o local passa a ser vistocomo um eixo articulador de agenciamento econô-mico e social (Antero, 2006). É desse modo que osAPLs se reportam ao conceito de desenvolvimen-to local, governança e empreendedorismo urbano.

Contrariamente a essa perspectiva oficial,aventa-se aqui a hipótese de que os APLs tendema alavancar esse desenvolvimento pela reiteração

da precarização das relações de trabalho,açambarcadas nas cadeias produtivas das grandescorporações e favorecendo as pontas virtuosas(matrizes) dessas cadeias, em detrimento da valo-rização do emprego formalmente protegido presentenas suas “franjas”. Com efeito, é essa hipótese queserá desenvolvida a seguir.

OS ELOS DA PRECARIZAÇÃO: políticaspúblicas de empreendedorismo e o caso doapl de TI de Londrina (PR)

Como se viu, a concepção de desenvolvi-mento local emerge como uma nova agenda pararesponder aos efeitos sociais nefastos que as polí-ticas neoliberais geraram, colocando-se, assim,como uma alternativa a essa via de desenvolvimen-to (Tapia, 2005). Ao contrário do modelo neoliberal,cujo enfoque parte do global, o foco do desenvol-vimento local volta-se para o crescimento das loca-lidades e, como também já foi visto, fundamenta-se na noção de vantagem competitiva, entendidacomo um “processo contínuo de inovação, cresci-mento e agregação de valor às atividades” produti-vas regionalmente ambientadas (Dall’Acqua, 2003,p. 48, 50). Espera-se, assim, garantir um desen-volvimento sustentável, ou seja, capaz de dinami-zar as economias locais de maneira autônoma, tor-nando-as menos sujeitas às dinâmicas predatóriasda competitividade global.

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As políticas de empreendedorismo são tidascomo a chave para a busca desse desenvolvimentolocal sustentável na medida em que preveem açõespara empreendimentos que, embora pequenos, sãosuficientemente inovadores para “[...] gerar um altoimpacto no crescimento econômico, movendo a eco-nomia para produtos e serviços com maior valoragregado.” (CEAPG/CENN, 2012, p. 12). A seleçãode uma indústria nativa dominante é estratégia bá-sica para se criar esse ambiente. Isso passa pela suapotencialidade de atrair investimentos privados derisco, venture capital, direcionados a iniciativas ain-da em fase de consolidação, bem como incentivospúblicos que possam contribuir para criar condi-ções vantajosas a essa atratividade (2012).

Os Arranjos Produtivos Locais constituemuma ação que se integra a essa concepção de de-senvolvimento, pois são considerados como umapolítica pública capaz de dinamizar as empresasde pequeno e microporte, valendo-se não só daspropensões econômicas, mas também de políticas,sociais e culturais específicas ao “capital social”das localidades em que estão inseridas. O concei-to de capital social foi emprestado das teorias soci-ológicas influenciadas pelo pensamento de PierreBourdieu e vem sendo usado pelas teorias econô-micas referentes ao contexto neoliberal para invo-car as “[...] características das organizações sociaistais como as redes, as normas e a confiança, quefacilitam a coordenação e a cooperação em vista deum benefício mútuo” (Muls, 2008, p. 7). Segundotais teorias, “[...] regiões que têm uma forte tradi-ção de engajamento cívico (elevado estoque de ca-pital social) conseguem acionar mecanismos quemelhoram o desempenho das instituições e gover-nos locais.” (2008, p. 7).

Consoante o jargão presente nos discursosoficiais atrelados às atuais políticas de fomento aoempreendedorismo, é por intermédio do “capitalsocial” local que se podem diligenciar “vantagenscompetitivas” que garantam um desenvolvimentoeconômico regional mais equilibrado e sustentá-vel, portanto com maior possibilidade de geraçãode emprego e renda, o que incidiria na qualidadede vida das populações dos lugares em que ope-

ram (DECOMTEC/FIESP, 2005).Nesse sentido, a competitividade passaria a

ter como principias fontes: 1) a “capacidadetecnológica” (que prevê uma inter-relação virtuosaentre ciência, tecnologia, gerência e qualificação);2) o “acesso a um grande mercado afluente inte-grado” (que supõe a inserção geopolítica em zonasde comércio territorialmente definidas); 3) o “dife-rencial entre os custos de produção no local daprodução e os preços do mercado de destino” (re-ferente às regulamentações, legislação, direitos so-ciais e tributos regionais); 4) a “[...] capacidadepolítica das instituições nacionais e supranacionaispara impulsionar a estratégia de crescimento des-ses países ou regiões sob sua jurisdição, incluin-do a criação de vantagens competitivas no merca-do internacional para as empresas incluídas norol das que servem aos interesses das populaçõesde seus territórios, gerando emprego e renda”(Dall’Acqua, 2003, p. 51-52).

Nota-se que tais fontes têm um teor maisestratégico do que aquelas relativas às vantagenscomparativas, as quais são dadas a priori e, por-tanto, necessitam do amparo de um Estado prote-cionista. Já o desenvolvimento das “vantagens com-parativas” depende mais do engenho das admi-nistrações locais do que do suporte da Federação.São esses os princípios que fundamentam o con-ceito de desenvolvimento local que, por sua vez,orienta a constituição de um APL.

O termo “Tecnópolis” tem sido usado parailustrar as cidades que optam por esse tipo de estra-tégia, de modo a “ressaltar novos cenários da inova-ção científica e tecnológica responsáveis pelo êxitode determinadas áreas ante outras, tais como o Valedo Silício (EUA)” (Pochmann, 2004, p. 42; Araki,2000). Conforme Harvey (2006, p.177), a intenção épassar a imagem de uma “cidade do futuro”, volta-da para “[...] atividades de controle e comando, umacidade informacional, pós-industrial, em que a ex-portação de serviços (financeiros, informacionais,produção de conhecimento) se torna a base econô-mica para a sobrevivência urbana.”

Geralmente, os municípios que fazem essetipo de opção são aqueles sem tradição industrial,

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voltados para atividades de apoio à economia agrí-cola, e que sofreram com a abertura comercial aoagronegócio. Sem indústria e com o declínio dosetor agrário, tais municípios encontraram, no dis-curso do empreendedorismo urbano inspirado nasTecnópolis, um caminho sedutor para o fomentodo desenvolvimento local.

Os dados referentes ao APL de Tecnologiada Informação (TI) do município de Londrina con-firmam essas análises. Desde a decadência da ca-feicultura na região no final de década de 1970, aselites empresariais e os governos municipais vêmtentando forjar uma nova “vocação” para a cidade,como forma de atrair investimentos externos e,assim, alavancar a economia local. A partir da con-sideração de que Londrina é referência de forneci-mento de serviços para o seu entorno regional,especialmente em educação, saúde e centros deP&D (Ruiz; Uchoa Jr., Dinato, 2002), o empresariadoregional e a administração pública, com o apoiodas instituições de pesquisa locais, vêm, desdemeados da década de 1990, apostando naestruturação de um polo tecnológico com vistas afortalecer sua base empresarial relativamente re-cente e a granjear novos investimentos (Ruiz, 2011).

Em 1999, foi inaugurado o ProjetoTecnópolis (ADETEC, 2012), com a finalidade depromover “uma aproximação de ativos de inova-ção tecnológica com o setor produtivo” (Ruiz, 2011,p. 6). Por isso, o setor de TI foi reputado comoestratégico para o desenvolvimento econômico daregião. Foi com esse espírito que o APL de TI foicriado em novembro de 2006, “[...] com o objetivode implementar ações comuns, que permitam aintegração de empresas, o desenvolvimento de ino-vações tecnológicas e o acesso a novos negócios”,bem como “demonstrar o potencial de crescimen-to da área de tecnologia da região, caracterizado

essencialmente por pequenas empresas” (ArranjoProdutivo Local, 2011, grifo nosso).

No entanto, igualmente se constatou queesse crescimento não ocorre de forma independen-te do mercado global e das estratégias empresariaisdas grandes transnacionais. Com efeito, ele se dádentro de uma rede que tem um centro assinalado

pelo monopólio do mercado das ditas “inovaçõesrevolucionárias” e “radicais”, isto é, aquelas quetêm um impacto qualitativo tanto no mercado deconsumo como no de bens de capital e, portanto,detêm o poder de redirecioná-los (Hirata; Zarifian,1991). São empresas altamente intensivas no in-vestimento em tecnologias de ponta, sendo, porisso, menos intensivas em trabalho vivo altamentequalificado. O papel estratégico dessa força de tra-balho e a dificuldade em encontrar qualificaçõestécnicas mais específicas aos seus copyrights system

amenizam seus custos e explicam o motivo peloqual ela reside, sobretudo, nos países centrais(Morris-Suzuki, 1997).

Por outro lado, no contexto da produçãoinformatizada, o saber local exerce um papel estra-tégico fundamental, porque pode dar o diferencialnecessário para o desenvolvimento daquilo que,no léxico empresarial, é chamado de “inovaçõesincrementais” – relativas aos “resultados dos esfor-ços cotidianos para aperfeiçoar produtos e proces-sos existentes, visando obter maior qualidade e maiorprodutividade” (Fleury, 1993, p. 35). Essas inova-ções são conseguidas pela mediação dos softwares

desenvolvidos pelas grandes transnacionais do se-tor, que desenvolvem e são detentoras dos referidoscopyrights system. O direito de uso destes softwares

é adquirido pelas intermediárias de suas cadeias deprodução e adaptados para viabilizar a digitalização“dos caminhos pelos quais o trabalho pode ser fei-to de modo mais fácil e produtivo” (Morris-Suzuki,1997, p. 16), o que incide diretamente na capacida-de competitiva das empresas.

Como assinala Pochmann (2005), as cadeiasprodutivas se estruturam em dois planos hierar-quicamente divididos: um relativo às atividades deconcepção, planejamento e P&D, geralmente locali-zado nos países centrais, e outro pela relocação, nospaíses periféricos, das atividades menos comple-xas dos seus processos. Segundo o autor, essa di-nâmica tem levado a uma “periferização da indús-tria”, com consequências sobre as condições detrabalho daqueles trabalhadores que, inclusive,permanecem como formalizados nos processos deprodução, pois:

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A mão de obra envolvida nesse processo assumemenor custo do trabalho e as mais flexíveis e pre-cárias condições de trabalho possíveis ao emprega-dor [...]. As principais atividades laborais encon-tram-se concentradas nas esferas de execução, dis-tribuição e montagem de produtos, muitas vezes,com organização do trabalho crescentementetaylorizada (Pochmann, 2005, p. 33).

Dessa forma, a distribuição e os benefícios,nas empresas de uma mesma cadeia produtiva,não serão iguais, na medida em que, por essa lógi-ca, a razão de ser dessas pequenas e médias em-presas é o seu cume. É isso que leva Bernardo(2004, p. 118) a afirmar que, na realidade, seuselos intermediários (fornecedores, subcontratados,montadoras, distribuidores e serviços terceirizados)são gestados como se fossem filiais: “[...] em ter-mos de propriedade, são pequenas empresas lo-cais, mas, por outro lado, graças à sua capacidadede integração tecnológica e de centralização admi-nistrativa, são grandes empresas transnacionais.”Portanto, a reestruturação econômica neoliberalreorganizou as cadeias produtivas de um modoque dissimula uma complexa diversidade de no-vas formas de assalariamento, as quais conjugame reequacionam os meios de extração de mais-valiarelativa e absoluta, à semelhança do sistema deputting-out-system prevalecente nos primórdios docapitalismo (Bernardo, 2004).

Já estão por demais evidenciadas aspesquisas que demonstram que esses pro-cessos são medidas para reduzir os custostrabalhistas, bem como para promover aprecarização dos contratos, condições e re-lações laborais que resulta dessa conjuntu-ra (Druck, 2011; Marcelino, 2008; Krein,2007). É através desses processos que ocor-re a desregulamentação do mercado de tra-balho, com a aplicação de estratégias deflexibilização dos contratos trabalhistas, o quetêm inflado significativamente informali-dade, ampliado o desemprego real, alémde ensejar modelos de gestão que oportunizam pro-cessos espúrios de terceirização e subcontrataçãonos elos intermediários das cadeias produtivas dasgrandes corporações privadas (Krein, 2007). Assim

se entende o vertiginoso crescimento das pequenase microempresas no capitalismo contemporâneo.

Os dados referentes às empresas presentesno APL de Tecnologia da Informação (TI) de Londri-na, apresentados nesta seção, confirmam essas aná-lises. As variáveis delimitadas para análise foram:vínculos empregatícios formais e salário por segmen-to, demissão e rotatividade, escolaridade. Os dadosforam coletados no período de Março e Junho de2012, através do site do Ministério do Trabalho eEmprego (RAIS/CAGED).5 Os resultados permitemidentificar que a perspectiva empreendedora que vemnorteando essas ações acaba por esconder processosde precarização do trabalho, uma vez que aportampreponderantemente as atividades mais rotineiras pre-sentes nas cadeias de suprimentos das grandescorporações.

Atualmente, esse APL constitui-se de 110empresas regionais, entre micro e pequenas, 23delas estabelecidas em Londrina. Seus segmentosbásicos são: consultoria em hardware; desenvol-vimento de software; processamento de dados; ati-vidades de banco de dados e distribuição on-line

de conteúdo eletrônico; e manutenção e reparaçãode maquinário informático. Elas se ramificam emmais de 65 subsetores, dos quais 11 são exporta-dos (Arranjo Produtivo Local, [20—]).

5 A questão da informalidade será contemplada em umasegunda etapa da pesquisa, visto não ser possível de serdetectada mediante dados quantitativos, sendo neces-sárias pesquisas de campo.

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Nota-se, que, desde a implantação do APLde TI, também houve um aumento considerávelde microempresas no aglomerado produtivo, istoé, daquelas que operam com até 10 empregados,surpreendendo o grande aumento relativo de “em-presas” sem nenhum vínculo empregatício, talcomo se pode confirmar pelos Gráficos apresenta-dos a seguir.

Percebe-se que a grande maioria das empre-sas do setor no município, 63,4% (Gráfico 1), érelativa a atividades que se colocam nas “franjas”das cadeias produtivas de TI, ou seja, aquelasconcernentes ao processamento e organização dedados, consultoria em software, distribuição on-

line de conteúdo eletrônico e outras atividades deinformática. Por conseguinte, referem-se às empre-

sas cuja força de trabalho empregada,93,78% pela somatória de todas as ativi-dades apresentadas, é a mais barata den-tro das categorias profissionais existen-tes no setor, com uma média salarial quevai de 0,51 a um salário mínimo, comexceção da atividade de consultoria emsoftware, que tem uma média salarial dedois a três salários mínimos, como podeser verificado nos gráficos 5, 6 e 7.

No Gráfico 8, é possível observarque apenas o conjunto da força de traba-

lho inserida na faixa salarial que vai dedois a três salários mínimos, isto é,consultoria em software e hardware,possui ensino superior completo. Norestante, prevalece o ensino médio com-pleto, o que é um indicativo de baixaqualificação e explica a predominânciados baixos salários.

Na legenda desse ultimo gráfi-co, “Analfabeto” e “Ensino Médio com-pleto” estão praticamente da mesmacor... É assim mesmo? Além disso, aparte inferior das colunas está truncada.

Outra variável que demonstra, demaneira mais qualitativa, a precarização dotrabalho no setor de TI em Londrina é oalto grau de rotatividade de sua força detrabalho. Estudos demonstram que essaquestão tem relação direta tanto com asazonalidade derivada de alguns setores,tal como o de confecções (Silva, 2009;Jinkings; Amorim, 2006), bem como comas condições de trabalho próprias de traba-lhos rotineiros e pouco criativos, que re-querem baixa qualificação (Antunes; Braga,

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2009). De acordo com o Cadastro Geral de Emprega-dos e Desempregados (CAGED), Gráfico 9, no setorde TI de Londrina ocorre uma grande rotatividade.

Como adverte Bernardo(2004), a rotativi-dade presente nossetores tecnologicamente avançadosevidencia a introdução da lógica damais-valia absoluta em processosque tradicionalmente eram lócus demais-valia relativa. Isso ocorre, so-bretudo, em função da lógica doscopyright system, que, para mantersua clientela cativa, promove recor-rentes atualizações visando a dei-xar o seu uso mais “amigável”. Comisso, igualmente, ocorre a simplifi-cação do trabalho dos seus proces-sos intermediários, tornando taisatividades dependentes e vulne-ráveis às qualificações fornecidaspelas empresas detentoras dessaspatentes. Como a simplificação dossistemas também simplifica as ha-bilitações requeridas para suaoperacionalização, diminui-se otempo de capacitação, o que facul-ta às empresas usuárias demitir eempregar conforme a contingênciade suas demandas.

Consequentemente, essequadro configura a mesma dinâmi-ca da superexploração do trabalho,característica dos processos produ-tivos relativamente menos intensi-vos em tecnologia, espaço da mais-valia absoluta, e, para os ramos dealta densidade tecnológica, espaçoda mais-valia relativa. Assim, aempregabilidade da força de traba-lho vinculada às cadeias produti-vas das grandes empresas produto-ras de tecnologias avançadas se tor-na sujeita à mesma degradação e ins-tabilidade laboral presente nas ati-vidades de baixo valor agregado.

[...] como a força de trabalho precária não man-tém relações duráveis com as mesmas empresas,ela não recebe a formação e o treinamento que

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conservam ou aumentam as qualificações da for-ça de trabalho estável, o que a condena a deterio-rar as suas capacidades e, portanto a conduz paratipos de empregos piores. Em conclusão, no pro-cesso de exploração a que está sujeita, essa forçade trabalho, que embora precária era inicialmen-te qualificada, diminui a componente da mais-valia relativa e aumenta progressivamente a damais-valia absoluta (Bernardo, 2004, p.131).

Tendo em vista que, com a globalização eco-nômica, igualmente se constitui um mercado detrabalho global, essa evidente debilitação das con-dições de trabalho dos países periféricos acaba porse refletir sobre os trabalhadores situados nas na-ções centrais.

Deste modo, ao mesmo tempo em que introdu-ziu um novo estágio de mais-valia relativa [...][tem-se] o aparecimento de certas modalidadesde exploração, que, comparadas com os estágiosanteriores, apresentam-se como mais-valia rela-tiva, mas que, comparadas com a situação dasempresas mais evoluídas do estágio atual, reve-lam-se como mais-valia absoluta. Tal como sem-pre tem sucedido, também hoje a mais-valia ab-soluta é o complemento necessário da mais-valiarelativa (Bernardo, 2004, p.132).

Há de se considerar, ainda, que o novo for-mato da divisão internacional do trabalho e areconjugação entre mais-valia absoluta e relativa queessa dinâmica implicou traz, em seu bojo, novascontradições, pois, ao integrar e incrementar novosmercados, tende não só a acirrar a competitividadeentre os países, como, ao fazê-lo, saturar, mais cedoou mais tarde, seus mercados internos de trabalhoe consumo. Com isso, criam-se novos excedentesde capital e força de trabalho, o que pode levar anovas crises de sobreacumulação, tal qual a origi-nariamente enfrentada pelos países de industriali-zação avançada.

Para os nossos propósitos, o que é importan-te ressaltar é que os rearranjos setoriais, constituídosno bojo da reestruturação e da flexibilização produti-vas e trazidos pelo novo movimento de expansãocapitalista, longe de dinamizarem as economias lo-cais para a sua inserção autônoma e sustentável na

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economia globalizada, traduzem um novo modo desua subordinação a esse processo. Reproduz-se, as-sim, em novas bases, a divisão internacional do tra-balho, de modo desigual e mais conectado do quenunca. Em síntese, tem-se o resultado oposto aoesperado e apregoado pelo discurso e pelas açõesligadas às políticas públicas de cunho empreende-dorista, cujo principal mote é blindar o local contraas intempéries do capital global.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em que pese o risco da generalização e anecessidade de comparação com outras experiên-cias nacionais e internacionais, projeto que já estáno horizonte, o estudo aqui desenvolvido permi-tiu formular um percurso metodológico prelimi-nar com o objetivo de fornecer parâmetros paraanálises que permitam avaliar em que medida aspolíticas públicas ancoradas nas concepções dedesenvolvimento local, empreendedorismo egovernança urbana vêm tendo êxito.

É certo que, na última década, os ArranjosProdutivos Locais passaram a ter uma especial re-levância dentro dessas políticas, como uma apos-ta para dirimir as vulnerabilidades das economiaslocais face à transnacionalização do capital e à suatendência à debilitação do mercado de trabalho.Viu-se, porém, que essa aposta esbarra nas estra-tégias das grandes corporações transnacionais que,ao externalizarem as “franjas” de suas cadeias pro-dutivas no espaço dos mercados nacionais forne-cedores de trabalho barato, forjam uma especiali-zação forçada, voltada para as atividades de apoioa seus processos, produtos e comercialização. Comisso, inflaciona aquele setor que mais tem instiga-do formas de precarização das relações e condi-ções laborais, o setor de serviços.

A análise do APL de TI de Londrina (PR)permitiu identificar o aumento do número demicroempresas do setor, inclusive muitas sem ne-nhum vínculo empregatício, sendo a maior parterelativa a processos de parametrização e customizaçãode produtos adquiridos das transnacionais do ramo.

O perfil preponderante da força de trabalho presen-te nessas firmas – baixo grau (relativo) de escolari-dade, prevalecendo o ensino médio completo, faixasalarial que gira em torno de 0,5 a um salário míni-mo, além do alto índice de rotatividade – remete aindicadores de precarização já consensuais na lite-ratura especializada sobre o tema (Druck, 2011).

Assim, diferentemente da perspectiva ofici-al, os resultados demonstram que, no caso em ques-tão, reitera-se, ao invés de dirimir, a precarizaçãodo mercado de trabalho, visto que as microempresastendem a sediar os processos mais simples pre-sentes nas cadeias de valor das corporaçõesdesenvolvedoras de tecnologias avançadas. Ou seja,justamente aquelas atividades que estão mais su-jeitas às vulnerabilidades laborais postas pela mo-bilidade que o grande capital ganhou com aglobalização da economia.

Isso ocorre porque a atual integração flexíveldas cadeias de produção, em sua articulação global–local, exige não apenas uma reestruturação produti-va e nas relações de trabalho internas às empresas,mas também o remodelamento das bases sociais, eco-nômicas, geográficas e institucionais que servem desuporte a essa integração. Em outras palavras, exigeum arranjo que extrapole a esfera da produção e seestenda a toda a sociedade através de políticas espe-cíficas que incentivem e atendam ao novo padrão deacumulação e competição capitalista.

Faz-se necessário, ainda, observar em quemedida as atuais políticas públicas de desenvolvi-mento orientadas pela abordagem empreendedorasão efetivamente adotadas na totalidade dos pro-cessos de produção das empresas, ou seja, conside-rando todas as unidades ou atividades produtivasnecessárias à produção e circulação de seu produtofinal; ou se apenas funcionam como um meio deangariar seus possíveis bônus, deixando os ônus acargo dos trabalhadores forçadamente especializadose externalizados do seu nexo produtivo. É o que seaponta para a continuidade desta pesquisa.

Recebido para publicação em 20 de dezembro de 2012Aceito em 24 de março de 2013

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Simone Wolff – Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. Docentedo Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Estadual de Londri-na – UEL. Líder do Grupo de Estudos de Novas Tecnologias e Trabalho - GENTT/CNPq. Entre suas principaispublicações destacam-se o livro Informatização do Trabalho e Reificação: uma análise à luz dos Programasde Qualidade Total (2005), publicado pela Editora da UNICAMP em co-edição com a EDUEL, além decapítulos nos livros Infoproletários (2009) e Riqueza e Miséria do Trabalho no Brasil (2006), ambos publica-dos pela Editora Boitempo.

LOCAL DEVELOPMENT,ENTREPREUNERISM AND URBAN

“GOVERNANCE”: where is labor insertedwithin this context?

Simone Wolff

This paper questions three concepts of publicpolicies presented nowadays as alternatives to theneoliberal economic paradigm and to theprecarization of the labor market that has come inits wake: local development, entrepreneurism andurban governance. As their object are the companiesthat form the Productive Local Arrangement ofInformation Technology in the region of Londrina,Paraná, inserted within the public policies hereproblematized. Data collected from the Ministry ofLabor and Employment (MTE) show that thesecompanies tend to provide the routine activitiespresent in the chains of value of the sector’s largetransnational corporations, which are moresusceptible to the labor vulnerabilities imposed bythe mobility that capital has acquired witheconomic globalization. Thus, different from theofficial perspective that guides these policies, theresults refer to precarization indicators that are aconsensus in specialized literature on the topic:lower schooling grade, salaries around 0.5 to oneminimum wage and high turnover level.

KEY WORDS: Local Development. Entrepreneurism.Urban governance. Local productive arrangements.Labor precarization.

DÉVELOPPEMENT LOCAL,ENTREPRENEURIAT ET “GOUVERNANCE”URBAINE: quelle est la place du travail dans

ce contexte?

Simone Wolff

On s’interroge sur trois conceptions depolitiques publiques présentées aujourd’hui commedes propositions alternatives pour le paradigmeéconomique néo-libéral et la précarisation du marchédu travail qui l’a accompagné: le développementlocal, l’entrepreuneuriat et la gouvernance urbaineayant pour objet les entreprises qui font partie del’Arrangement Productif Local de Technologie del’Information de la Région de Londrina (PR), etqui s’insère dans les politiques publiques iciproblématisées. Les données recueillies auprès duMTE démontrent que les entreprises ont tendanceà faire l’apport des activités courantes présentesdans les chaînes de valeur des grandes entreprisestransnationales du secteur, qu’elles sont plussujettes aux vulnérabilités de la main-d’œuvre àcause de la mobilité du capital due à lamondialisation de l’économie. Ainsi, à l’oposé dela perspective officielle qui oriente ces politiques,les résultats renvoient à des indicateurs deprécarisation, fruits d’un consensus dans lalittérature spécialisée sur le sujet: bas niveau (relatif)de scolarité, salaires d’environ 0,5 à 1 salaireminimum et un indice de rotativité très élevé.

MOTS-CLÉS: Développement local. Entreprenariat.Gouvernance urbaine. Arrangements ProductifsLocaux. Précarisation du travail.