Desportos de Aventura na Natureza: uma revisão conceptual · Segundo Constantino (1997), no final...

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Desportos de Aventura na Natureza: uma revisão conceptual Pedro Delgado Paiva Porto, 30 de Maio de 2008

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Desportos de Aventura na Natureza:uma revisão conceptual

Pedro Delgado Paiva

Porto, 30 de Maio de 2008

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Desportos de Aventura na Natureza: uma revisão conceptual

Orientador: Professora Doutora Ana Luísa Pereira

Pedro Delgado Paiva

Porto, 30 de Maio de 2008

Monografia realizada no âmbito da disciplina de Seminário do 5º ano da licenciatura em Desporto e Educação Física, na área de Recreação, da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto

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À Maria Luís.

Que o Sol resplandeça no teu percurso,

Que o futuro te seja brilhante…

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I

Agradecimentos

À Professora Doutora Ana Luísa Pereira, pela disponibilidade que sempre

demonstrou, pelos valorosos conselhos e pareceres, pelo auxílio e apoio, pela

boa-disposição com que sempre me recebeu e, acima de tudo, pela atitude e

dedicação com que encara a sua profissão.

A todos os professores do gabinete de Recreação, pela postura e carinho

para com os seus “protegidos”, com quem estabelecem, a par das óbvias relações

de profissionalismo, ligações de afeição e cordialidade.

À minha família:

Aos meus pais, heróis que amo muito, pelo apoio, carinho e confiança;

À minha avó e tio, por me suportarem, sempre;

A todos, pelo constante incentivo… pelo bem-querer… por tudo.

Aos meus amigos:

Ao Damião, por estar sempre lá;

Aos Manos e Maninha – Pedro, Tiago e Ju – pelo constante estímulo;

A todos – Ari, Zé, Sérgio, Rita, Catas, Nabais, Paty… – pelo apoio;

Aos amigos da Tribo do Lagarto e da Turma F, pela companhia no trajecto;

À Telma, por me carregar até aqui;

Ao meu Raio de Sol, por iluminar o meu caminho;

À Lúcia, pelo carinho… por me fazer sonhar…

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III

Índice Geral

Agradecimentos ....................................................................................................... I

Índice Geral ............................................................................................................ III

Resumo...................................................................................................................V

Abstract .................................................................................................................VII

Résumé.................................................................................................................. IX

Lista de Abreviaturas..............................................................................................XI

1. Introdução........................................................................................................ 1

2. Desenvolvimento do Problema ........................................................................ 5

2.1 Objecto de Estudo: do quadro axiológico à legitimação da prática ............ 7

2.1.1 Contexto Social: valores, dinâmica e necessidades ............................ 7

2.1.2 Caracterização: das origens ao público-alvo ..................................... 17

2.1.3 Razões da procura e afirmação......................................................... 27

2.2 Temas de interesse na investigação do objecto de estudo...................... 33

2.2.1 Aventura: sensações e necessidades ............................................... 33

2.2.2 Consumo: sociedade e produto consumível...................................... 43

2.2.3 Problemática Ambiental: do meio e da educação.............................. 55

2.3 Perspectivas de Futuro ............................................................................ 75

3. Conclusões .................................................................................................... 81

4. Referências Bibliográficas ............................................................................. 91

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V

Resumo

Vivemos actualmente uma outra sociedade, um período de complexidade e

inquietação onde se avultam valores e necessidades, frutos de uma aparente

radicalização dos princípios do período da Modernidade (Lipovetsky, 1989;

Gervilla, 1993; Giddens, 1994). Associadas à emergência destes novos princípios,

carências e valores, surgem novas actividades de lazer, profundamente

relacionadas com a Aventura e o contacto com a Natureza (Betrán e Betrán,

1995a; Guzmán, 2002; Costa e Correas, 2005). Neste trabalho, baseado numa

exaustiva revisão bibliográfica, procurámos entender estas novas práticas

desportivas, identificando as suas principais características e analisando as suas

dinâmicas com a sociedade actual. Entre as principais conclusões do nosso

trabalho podem ser destacadas: a proposta do conceito de Desportos de Aventura

na Natureza, que nos parece uma alternativa viável para a definição do nosso

objecto de estudo; o enorme potencial destas práticas para fornecer resposta a

todo um leque de necessidades hoje em evidência na nossa sociedade, dos quais

destacamos a carência de emoções, riscos, sensações, ruptura com a

continuidade da vida, divórcio com o espaço e tempo quotidiano e escape para o

ambiente natural; uma tendência profunda à Mercantilização da Aventura que,

associada a uma forte resposta empresarial e a uma produtiva relação com as

novas formas de turismo activo, torna o nosso objecto de estudo em mais um

produto de consumo; o enorme potencial do referido objecto de estudo para a

Educação Ambiental e promoção de novos valores ecológicos de protecção da

Natureza.

Palavras-Chave: Pós-Modernidade; Desportos de Aventura na Natureza;

Mercado da Aventura.

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VII

Abstract

Nowadays we experience another society, a complexity and disquiet period

where new values and requirements, seeds of a perceptible radical shift of the

principles of Modernity, breed (Lipovetsky, 1989; Gervilla, 1993; Giddens, 1994).

Related to the surge of these new principles, needs and values, a perceptible

bourgeoning of new leisure activities, deeply associated with the Adventure and

the experience of Nature, is noticed (Betrán e Betrán, 1995a; Guzmán, 2002;

Costa e Correas, 2005). With the conception of this work we attempt, through an

exhaustive and meticulous bibliographic review, to understand the new sport

activities, identifying its key characteristics and analyzing its dynamic relations with

the contemporary society. Amongst our primary conclusions there can be

enlightened: our proposal of the concept “Adventure Sports in the Nature”, which

we believe provide a viable alternative to the nomination and conceptualization of

our subject; the vast potential of these practices to provide answers to an all-

complex set of necessities in evidence nowadays, of which we can stand out the

need of emotions and sensations, the risk-seeking tendency, the requirement of

rupture with the continuity of life itself and the escape from the time and space of

the everyday life towards the natural environment; a deep tendency to the

pronouncement of the adventure market, associated to a strong and ever growing

business reply and a productive relation with the new forms of active tourism,

which establishes our subject as another consumption commodity; the large

potential of our subject to the Environmental Education and the promotion of new

ecological values and nature protection ideals.

Keywords: Postmodernity; Adventure Sports in the Nature, Adventure Market.

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IX

Résumé

Actuellement on vivons dans une outre société, un période de complexité et

inquiétude ou se amplifie valeurs et nécessités, conséquence de une apparent

radicalización des débuts de la Modernité (Lipovetsky, 1989; Gervilla, 1993;

Giddens, 1994). Associé à l’émergence de ces nouveaux principes, besoins et

valeurs, se posent de nouvelle activité de loisirs, profondément reporté à

l’Aventure et aux contacte avec la Nature (Betrán e Betrán, 1995a; Guzmán, 2002;

Costa e Correas, 2005). Dans notre travaille, basée à une exhaustif révision

bibliographique, nous cherchons d’attendu cette nouvelle pratiques sportives,

identifié cette principaux caractéristiques et analyser cette dynamique avec la

société actuelle. Parmi les principaux conclusions de notre travaille, on peut mettre

en évidence: la notre propose de le concept de Sport d’Aventure dans la Nature,

que on croyions êtres une alternatif pour la définition e conceptualisation du notre

objecte d’étude; l’énorme potentiel de cette pratique, pour donnée une réponse à

tout un group de nécessités qui nous trouvons aujourd’hui dans notre société, ou

se détache le besoin d’émotion, du risque, de la sensation, de la rupture avec la

continuité de la vie, le divorce avec l’espace et le temps de quotidienne et l’évasion

pour la nature; une profond tendance aux marché de l’Aventure qui, associé a une

fort réponse de l’entreprise et a une productif relation avec le nouvelle forme du

tourisme actif, il prend le notre objecte de l’étude dans un n’outre produit pour

consumé; le grand potentiel du dit objecte d’étude pour le Education Ambiant et la

promotion de nouveaux valeurs écologiques de protection de la nature.

Mots-Clés: Postmodernité; Sport d’Aventure dans la Nature; Marché de

l’Aventure.

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XI

Lista de Abreviaturas

AFEN – Actividades Físicas de Exploração da Natureza

AFAN – Actividades Físicas de Aventura na Natureza

AEISAD – Associação Espanhola de Investigação Social Aplicada ao Desporto

CTP – Confederação do Turismo Português

TV – Televisão

PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

CMAD – Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento

CNUMAD – Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e

Desenvolvimento

CECS – Conferência Europeia sobre Cidades Sustentáveis

E.A. – Educação Ambiental

DAN – Desportos de Aventura na Natureza

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11.. IINNTTRROODDUUÇÇÃÃOO

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Introdução

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1. Introdução

Segundo Constantino (1997), no final do século passado foi possível assistir

ao aparecimento de novos paradigmas civilizacionais (p.117), que lenta mas

profundamente alteraram os estilos e os modos de vida, as relações sociais, as

expectativas e motivações dos cidadãos (idem). De facto, com uma rápida análise

aos trabalhos de autores como Lipovetsky (1989), Gervilla (1993), Giddens (1994),

Fernandes (1999) ou Beck (2000), podemos entender a emergência de uma outra

sociedade, na qual se estabelecem novos valores e princípios, bem como um

novo leque de necessidades para as quais o indivíduo, enquanto ser situado,

procura resposta ou forma de supressão.

Dada a amplitude do fenómeno desportivo – e atendendo ao facto de, como

afirma Bento (1997), cada época ter o seu desporto e o seu cidadão, ambos

dependentes de mutações sociais, sobretudo nos planos dos valores, direitos e

necessidades –, as alterações do quadro axiológico levaram a que, como afirma

Garcia (1997), mesmo nas revistas sobre educação física e desporto mais

conceituadas internacionalmente, novas palavras, novos conceitos (…) surgissem

para situar, qualificar, explanar ou explicar a sociedade em que vivemos (p. 15).

É neste versátil cenário de mudanças culturais, económicas, ideológicas e

de alterações dos paradigmas, dos conceitos e mentalidades – no qual o

hedonismo e o lazer assumem uma dimensão fundamental (Elias, 1992; Pereira e

Félix, 2002) –, que podemos considerar o surgimento de todo um conjunto de

práticas corporais (Betrán e Betrán, 1995a) desenvolvidas em contacto com a

natureza, cuja experiência envolve risco, emoção, prazer e cujo incremento não

pode ser desvalorizado (Pereira e Félix, 2002; Costa e Correas, 2005).

Actividades Físicas de Exploração da Natureza ou Desportos de Aventura

são apenas exemplos do vasto legado terminológico hoje existente para a

objectivação destas práticas, que ocorre em estudos através dos quais, diversos

os autores dão prossecução a artigos e investigações sob temáticas tão variadas

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Introdução

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como o Turismo (Fernández, 2002; Costa, 2006), a Educação Ambiental (Chao,

2004; Marinho, 2004) ou a dimensão simbólica da Aventura (Feixa, 2002).

Estas novas práticas oferecem, aparentemente, resposta às necessidades

impostas pelas formas de vida hoje aceites e experimentadas (Elias, 1992; Betrán

e Betrán, 1995a; Pereira e Monteiro, 1995), tornando-se um objecto de estudo

capaz de gerar um extenso e complexo espólio bibliográfico, que reúne tópicos de

interesse articuláveis de forma evidente com variadíssimas áreas da nossa

sociedade. Assim, e perante um tão vasto legado de obras e artigos – que focam

os aspectos práticos das actividades em causa, a sua ética, as responsabilidades,

as razões, as preocupações, os contextos, a relevância, a coerência e as

perspectivas das partes envolvidas no fenómeno –, torna-se fundamental procurar

entender de forma mais evidente que relação ou relações se estabelecem entre

estas e os novos valores, princípios e carências dos seres humanos, enquanto

seres sociais.

É nossa intenção, através de uma exaustiva revisão bibliográfica, estudar a

temática das Actividades de Ar Livre, com o intuito de entender as suas

interactividades com os valores e consequências da sociedade actual. Para tal,

dividimos o nosso trabalho em 3 partes fundamentais: Num primeiro capítulo

dedicar-nos-emos ao exame do nosso objecto de estudo na sua relação com o

quadro axiológico, procurando definir plenamente a imagem destas novas práticas

e da sociedade em que as mesmas se estabelecem; Num segundo capítulo

procuraremos descrever e compreender as grandes questões que hoje surgem

associadas ao nosso objecto de estudo, e que hipoteticamente definem os

grandes tópicos de relação com as principais instâncias da sociedade actual; Num

terceiro capítulo procuramos estabelecer um possível cenário de futuro para o

nosso objecto de estudo, admitindo que todos os factores considerados ao longo

da revisão bibliográfica poderão de alguma forma ser intervenientes no seu

delineamento e que a exactidão da prognose, pela vastidão de variáveis

envolvidas, será potencialmente complexa.

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22.. DDEESSEENNVVOOLLVVIIMMEENNTTOO DDOO PPRROOBBLLEEMMAA

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Desenvolvimento do Problema

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2.1 Objecto de Estudo: do quadro axiológico à legitimação da prática

2.1.1 Contexto Social: valores, dinâmica e necessidades

En nuestra sociedad pluralista y relativista

todo vale, todo fluye y nada permanece, lo

nuevo rápidamente se hace viejo.

(Gervilla, 1993: 18)

Como referimos na introdução do nosso trabalho, ocorrem transformações

na sociedade actual que são acompanhadas por modificações profundas nas

crenças e atitudes do ser humano, que se verificam também nas novas posturas

face ao fenómeno desportivo. Como afirma Bento (1997), não é estranho que se

procure debater e reformular a temática do desporto, num início de século tão

dinâmico do ponto de vista da mutação de princípios e valores sociais e de tão

evidentes alterações de crenças respeitantes à cidadania.

Para um melhor entendimento do nosso objecto de estudo, será imperativo

conhecer e entender esta mutável sociedade a que nos referimos, procurando

compreender as mudanças axiológicas que lhe são subjacentes.

Vivemos um período de complexidade e inquietação, no qual as sociedades

– de crise permanente, do efémero e do transitório (Gervilla, 1993), numa situação

de vazio, ou, a um nível mais profundo, de transição (Sousa Santos, 2002) –

parecem claramente devedoras do processo e projecto da modernidade (Silva,

2002: 32). Este parece ser o núcleo do problema do novo quadro social

(Lipovestsky, 1983; Gervilla, 1993; Silva, 2002), impossível de definir, por si só, de

modo exacto e consensual, compreensível apenas na relação com o seu anterior

– que se entende de oposição, ruptura, crítica, distanciamento, fracasso, projecto

inacabado (Gervilla, 1993) ou transição com momentos de ruptura e momentos de

continuidade (Sousa Santos, 2002: 92).

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Desenvolvimento do Problema

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Para Lipovetsky (1983), Gervilla (1993), Silva (2002) ou Lyotard (2003),

referimo-nos ao contexto social actual como Pós-Modernidade, mas esta

perspectiva está longe de ser consensual. Segundo Sousa Santos (2002), a

considerar-se a extinção da modernidade, esta seria complexa, definindo-se

parcialmente como um processo de superação – na medida em que são

cumpridas algumas das promessas desse projecto, e até em excesso – e de

obsolescência – pela irremediável incapacidade do cumprimento das restantes.

Mas a extinção não é um termo recorrente e a perspectiva de ordem parece ser

outra. Autores como Giddens, Beck e Lash (2000) negam a entrada na Pós-

Modernidade, defendendo uma modernidade tardia (Giddens, 1994) ou uma

modernização reflexiva (Beck, 2000) – uma ordem nova na qual as consequências

da modernidade se tornam mais radicalizadas e universalizadas (Giddens, 1994:

2). Também Pereira e Félix (2002) referem a radicalização dos princípios

existentes e vividos, afirmando os novos valores como resultantes desse processo

e seguindo uma linha de pensamento mais ou menos consensual. Como afirma

Beck (2000), a modernização reflexiva pode ser vista como uma radicalização da

modernidade, que quebra os contornos da sociedade industrial e origina um

período de autoconfrontação.

Perante as diferentes opiniões relativas à época de crise na qual vivemos,

impõe-se que, para sua melhor compreensão, entendamos o processo evolutivo

que lhe é inerente e que passamos a analisar de forma resumida. Segundo

Gervilla (1993), com o eclodir do Renascimento a ideologia Deus-Homem-Mundo

ganhou posição fundamental na sociedade, tendo mais tarde sido substituída pelo

dogma do Antropocentrismo, que colocava o Homem no centro de tudo. Com o

declínio da Igreja Católica e a revolta contra as instituições estabelecidas, o tempo

da austeridade dos costumes dá lugar a uma certa exuberância da vida (Garcia,

2005:17) e o Homem, através da Ciência, substitui Deus no centro da sociedade –

as explicações científicas tomam o lugar das anteriores explicações divinas e as

crenças religiosas são remetidas para a esfera da vida privada (Touraine, 1994).

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Desenvolvimento do Problema

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Registaram-se séculos de profundas mudanças, que afectaram de forma

evidente vários domínios da sociedade como o conhecimento, tecnologia,

economia, política e religião (Silva, 2002). O sucesso da Ciência, a separação das

doutrinas religiosas e a afirmação da Razão Pura, representam o culminar do

projecto de emancipação e libertação da espécie humana (Gervilla, 1993) e com o

progresso baseado na Ciência e na Razão – factor que fornecerá explicação para

tudo, uma vez que tudo é, à partida, inteligível (Gervilla, 1993) – surge a

sociedade moderna, não em simultâneo por todo o mundo, mas com evidente

prioridade nas sociedades ocidentais (Silva, 2002).

A modernidade não representa a mudança pura, mas a difusão dos

produtos de actividade racional, científica, tecnológica e administrativa (Touraine,

1994, p.21) em sociedades enquadradas por Estados-Nações, marcadas pela

expansão industrial – que reorganizou as classes e originou processos de

urbanização característicos –, pelo forte crescimento demográfico da população e

pelo valorizar o tempo de trabalho (Silva, 2002).

O projecto da modernidade parece ter estado intrinsecamente relacionado

com o capitalismo – expressão do período no plano económico (Touraine, 1994) –

e com a industrialização, baseando-se em dois pilares fundamentais – o da

regulação e o da emancipação (Sousa Santos, 2002) – e revelando como

características de identidade: o domínio racional das coordenadas do espaço e do

tempo; o desenvolvimento de mecanismos e processos de dexcontetualização e

recontextualização dos factos e actos; a apropriação reflexiva do conhecimento –

com a revisão contínua dos objectivos e estratégias de acção; a circulação de

informação e produtos por diferentes contextos sociais; o desenvolvimento dos

sistemas abstractos científicos e técnicos – que garantiam formas de interpretação

e acção cujos fundamentos e legitimidade eram virtualmente universais (Giddens,

1994; Silva, 2002). Terá prevalecido, nesta época, a pluridimensionalidade

institucional, sendo o capitalismo, a vigilância, o poder militar e o desenvolvimento

industrial as dimensões a ponderar (Giddens, 1994).

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Desenvolvimento do Problema

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Para Lipovetsky (1983:11), a sociedade moderna era conquistadora, crente

no futuro, na ciência e na técnica; instituiu-se em ruptura com as hierarquias de

sangue e a soberania sacralizada, com as tradições e os particularismos, em

nome do universal, da razão, da revolução. O autor refere-se a esta época no

pretérito perfeito, sendo ele próprio um dos maiores apoiantes do seu término ou

superação. Como já referimos, o novo quadro social – independentemente da

terminologia pela qual optemos para a sua nomeação – não pode ser visto sem a

compreensão da falência, da superação, da vitória ou da destruição criativa do

processo da modernidade – ou de parte do mesmo.

Vivemos agora numa era onde vigora o descrédito da Razão, a perca do

fundamento, o surgir da fragmentação moral, o esteticismo, a dissolução do

sentido histórico e o pensamento débil (Gervilla, 1993). Uma época de

descontextualização e recontextualização das formas sociais industriais (Beck,

2000). Uma sociedade cosmopolita global cujos contornos ainda mal conseguimos

vislumbrar (Giddens, 2002), na qual se exige uma disciplina emocional global

(Elias, 1992), onde o risco faz parte do quotidiano (Beck, 1992) e em que aparece,

com força crescente, a obsessão pela diferença e especificidade (Touraine, 1994).

A tão objectivada e fundamentada Razão, que imperava e se havia tornado

o princípio e o meio da emancipação – libertação do indivíduo face aos

constrangimentos arbitrários do costume, da tradição ou da dominação (Silva,

2002) –, é posta em causa. O descrédito e desencanto pela Razão, referidos por

Gervilla (1993) e Fernandes (1999), apoiam-se na insegurança, nos enganos e

nas decepções criadas pela tomada de posição do progresso tecnológico, a par

dos acontecimentos históricos desprovidos de sentido racional – como as duas

Grandes Guerras Mundiais, Hiroshima, extermínios étnicos, as guerras do

Vietnam e do Golfo Pérsico, entre outros (Lipovetsky, 1983; Gervilla, 1993).

Somos conduzidos a um relativismo e subjectivismo que afecta todos os âmbitos

do ser, do conhecer e do viver, originando um pluralismo e politeísmo de valores

que torna difícil distinguir os mesmos dos seus antónimos – assim se justifica a

perda de fundamento: deixamos de ter uma razão para conhecermos uma

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Desenvolvimento do Problema

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pluralidade de razões, uma multiplicidade de formas de justificação (Gervilla,

1983). Tudo aquilo que provém do passado e se apresenta como provido de

racionalidade tende a ser reinterpretado, reavaliado ou mesmo abandonado

(Fernandes, 1999).

Nesta época – chamemos-lhe, como muitos, Pós-Modernidade –, o prazer

tende a ditar as regras de desenvolvimento (Lipovetsky, 1989). O hedonismo

estabelece-se como um dos valores mais significativos da sociedade e a busca do

prazer assume um papel fundamental na cultura actual, na qual o indivíduo

adquire um estatuto de centralidade (Pereira e Félix, 2002). Nesta perspectiva,

como explica Heinemann (1994), as investigações sobre a alteração de valores da

nossa sociedade parecem indicar uma diminuição da importância da

competitividade na vida social e a substituição do resultado futuro pelo desfrute do

presente. Mais importante do que o esforço é a busca do máximo de prazer no

que se faz (Pereira e Félix, 2002). O hedonismo reporta-nos aos processos –

segundo Pereira (2004), transformações características da sociedade

contemporânea – de personalização e individualização referidos por Lipovetsky

(1983) numa sociedade que pretende viver livre e sem coacção, escolher sem

restrições o seu modo de existência (p.10), que pretende viver já, aqui e agora

(p.11), no presente e não já em função do passado e do futuro (p.49) e na qual o

indivíduo subsiste como um valor principal, intocável, indiscutível através das suas

múltiplas manifestações (Costa, 2006: 15).

Segundo Lipovetsky (1983), o valor da realização pessoal, do respeito pela

singularidade subjectiva, da personalidade incomparável (p.9) foi promovido e

incarnado pelo processo de personalização, processo visto como o novo modo de

organização e orientação da sociedade, que se pretende com o mínimo possível

de coacção e o máximo possível de opções, com o mínimo de austeridade e o

máximo de desejo, com o mínimo de constrangimento e o máximo de

compreensão (p. 8-9). O indivíduo vira-se para si próprio e passa a estar no centro

da sua acção, onde as questões pessoais se tornam essenciais e a realização

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Desenvolvimento do Problema

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pessoal se destaca como objectivo principal, orientando a actuação pelo princípio

do prazer (Giddens, 1994).

O fenómeno de individualização – o direito de o indivíduo ser

absolutamente ele próprio, de fruir ao máximo a vida (…) inseparável de uma

sociedade que erigiu o indivíduo livre em valor principal (…) transformação dos

estilos de vida associada à revolução do consumo (Lipovetsky, 1983: 9) – é, para

Fernandes (1999), um movimento através do qual, sem perder totalmente os

ligames sociais ou romper com os mesmos, a pessoa se afirma em crescente

autonomia e age com um certo distanciamento do seu meio ambiente. Segundo o

autor, o indivíduo, que surgia dissolvido na colectividade e numa existência

essencialmente comunitária, adquire por este processo a liberdade e

subjectividade, tendo os outros como fonte alimentadora do crescimento e

desenvolvimento pessoal. Segundo Tulloch e Lupton (2003), o processo de

individualização oferece tanto a liberdade de escolha, como a esmagadora

responsabilidade inerente à mesma – esta, passível de fornecer novos riscos, a

associar aos já verificados na sociedade.

Nesta sociedade, também sociedade de risco, os processos industriais e

paradigmas sociais a ele relacionados produzem riscos que – devido aos modelos

de globalização da modernidade tardia – ignoram fronteiras geográficas, sociais e

socioeconómicas (Beck, 1992). A globalização – um fenómeno revolucionário, de

natureza política, tecnológica, cultural e económica, profundamente influenciada

pelo progresso dos sistemas de comunicação – ajuda a definir este importante

período de transição, no qual as mudanças que afectam quase tudo o que

fazemos não estão confinadas a uma única parte do globo (Giddens, 2002). Os

riscos globais verificados na nossa sociedade são resultados, também, embora

não só, das dramáticas mudanças nas estruturas das vidas privadas, que

enfraqueceram as tradições e obrigaram ao processo de individualização (Beck,

1992).

Na opinião de Touraine (1994), o indivíduo é agora um ser activo, centrado

em si próprio e ansioso pela auto-realização, o que uma vez mais nos conduz ao

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Desenvolvimento do Problema

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tema do prazer. O hedonismo, durante muito tempo exclusivo das classes

privilegiadas, foi sendo transformado em comportamento quotidiano pela

sociedade de consumo (Betrán e Betrán, 1995a) e originando, a par do fenómeno

de individualização, as individualidades hedonistas e narcisistas referidas por

Gervilla (1983), Lipovetsky (1983) e Lyotard (2003). Para Lipovetsky (1983), é

claro que o processo de personalização continua a alargar as fronteiras da

sociedade de consumo, cujo fim foi precipitadamente anunciado.

A sociedade de consumo que ainda hoje vivemos – surgida em estreita

ligação com a sociedade moderna, com a produção de massa, com a melhoria

dos rendimentos e bem-estar e com o alargamento dos mercados – não surge

apenas ligada às necessidades de escoamento comercial de produção em série e

às melhorias de rendimentos, mas também à aquisição de certos direitos por parte

dos trabalhadores, traduzidos na redução dos horários de trabalho, no direito ao

descanso semanal e nos períodos de férias remuneradas, que conduzem à

libertação de um tempo individual (Silva, 2002).

Também Garcia (2005) explica que o tempo de trabalho (p.15) tem vindo a

baixar de forma notória, tendo como consequência um aumento do tempo de não

trabalho (idem), tornando os conceitos de recreação, lazer e tempos livres em

expressões quase definidoras da nossa época. Segundo a sua opinião, o lazer,

mobilizando toda a sociedade quer para a sua vivência quer para a sua reflexão

(idem), constitui-se num fenómeno social total, isto é, segundo Durkheim (1987:

39), toda a maneira de fazer, fixada ou não, susceptível de exercer sobre o

indivíduo uma coerção exterior: ou então, que é geral no âmbito de uma dada

sociedade tendo, ao mesmo tempo, uma existência própria, independente das

suas manifestações individuais.

Aliado à redução de tempo de trabalho, ao aumento da esperança média de

vida, ao aumento dos patrimónios familiares, ao maior tempo de escolaridade

obrigatória e tardia inserção no mercado de trabalho, a uma precipitada reforma

das populações, à melhoria dos cuidados médicos que proporcionam uma maior

mobilidade aos indivíduos de idades mais avançadas e à diminuição de

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Desenvolvimento do Problema

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importância dos tradicionais modelos de conduta ditados por factores sociais como

o sexo e a idade entre outros (Heinemann, 1994; Garcia, 2005), surge um caos de

práticas corporais ante o homem pós-industrial (Betrán e Betrán, 1995a). Note-se

que, como afirma Garcia (2005), se é difícil para o homem o trabalho, mais difícil

se torna o divertimento (p.22). Segundo o autor, a organização social sofre pelo

surgimento do ócio – que torna imperioso o aumento e diversificação das ofertas

de lazer, não se esgotando esta premissa na oferta desportiva – e com a

crescente valorização da parcela de tempo a que se podem atribuir sentidos

pessoais diferenciados. A ampla variedade de actividades de lazer existentes

estabelece-se, actualmente – e em resposta a esta e outras necessidades –, como

um dos principais traços de identidade das sociedades do nosso tempo (Elias,

1992).

Por tudo o anteriormente analisado, podemos afirmar que a Pós-

Modernidade optou pelo singular, a sociedade como meio, sempre ao serviço e

subordinação da pessoa, na qual a postura tipo é bem expressa na atitude dos

jovens, desresponsabilizada e despreocupada, posição de quem só tem uma vida

que viver e um presente que gozar (Gervilla, 1993), mais do que uma ética, uma

estética (Betrán e Betrán, 1995a; Pereira e Félix, 2002), ou uma estética sem ética

(Gervilla, 1993), que juntamente com a fragmentação moral gera valores de

afectividade, sentimento, prazer, narcisismo, novidade e aculpabilidade (Pereira e

Félix, 2002). É nesta sociedade – hedonista, pós-industrial, individualista,

narcisista, de múltiplos valores e razões, ainda e cada vez mais de consumo de

massa, que busca o prazer, a realização, o presente e com cada vez mais espaço

para o lazer e ócio – que procuramos entender o nosso objecto de estudo.

Esta sociedade de transição, de novas revoluções tecnológicas, mas com

fundamentalismos religiosos renascidos, de integração económica planetária, mas

de insubsistência alargada a grandes porções da população, de progresso

científico, mas de dúvida imposta pela epistemologia do mesmo avanço (Silva,

2002), de serviços, de computadores e de actividade mental (Betrán e Betrán,

1995a), que, ao legitimar o individualismo hedonista conjugado ao prazer de

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Desenvolvimento do Problema

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consumo, fez com que novas actividades físicas e desportivas surgissem e

adquirissem lugar de destaque (Pereira e Félix, 2002).

As práticas corporais de carácter recreativo afirmam-se então como a

principal forma de utilização do ócio activo nos países economicamente

desenvolvidos do ocidente (Bétran, 1995) e entre elas destacam-se as Actividades

Físicas no Meio Natural, conhecidas popularmente por Desportos de Aventura,

que têm tido uma difusão vertiginosa nos últimos anos e consolidado o seu lugar

com cada vez mais ímpeto na sociedade (Betrán e Betrán 1995b; Miranda, Lacasa

e Muro, 1995).

Entendido o quadro axiológico actual, importa agora focar atenções no

nosso objecto de estudo, atendendo a esta realidade que o enquadra e no qual o

mesmo subsiste. Conhecendo os valores e atitudes da sociedade, torna-se

fundamental entender a forma como os mesmos o influenciam, o fundamentam ou

a ele se opõem. Desta forma, passamos a analisar as suas características,

formas, origens e razões, tendo sempre como pano de fundo – perfeitamente

interactivo – o contexto social contemporâneo.

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Desenvolvimento do Problema

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2.1.2 Caracterização: das origens ao público-alvo

Cada época tem o seu desporto porque

tem o seu cidadão. Um e outro resultantes

de mutações sociais, sobretudo no plano

dos valores, dos direitos, dos interesses,

dos problemas e das necessidades.

(Bento, 1997: 95)

A não sujeição a uma regulamentação fixa, a grande flexibilidade de

horários, formas, intensidades, modos e ritmos de prática – variáveis ao gosto dos

praticantes –, a originalidade e criatividade, a troca do paradigma do esforço pela

perspectiva do prazer sensório-motor e as fortes componentes de aventura e

sensação são, segundo Miranda, Lacasa e Muro (1995), as características

correntes a todo o conjunto de actividades que aqui estudamos, e que têm como

denominador comum a sua prática num ambiente natural, proporcionador de uma

estreita dialéctica com a natureza (Pereira e Monteiro, 1995: 111). O que

procuramos neste capítulo é a breve caracterização do nosso objecto de estudo,

importante para o seu pleno entendimento e para a melhor compreensão das suas

questões e temas de interesse.

São as Actividades de Aventura, as Actividades de Ar Livre ou Desportos

Sliz – o problema da terminologia será abordado um pouco mais à frente – cuja

génese ocorreu, atendendo às ideias de Domingo (1991), Betrán e Betrán (1999)

e Rico (2002), durante a década de 1960, tendo uma forte difusão nas tendências

sociais das décadas de 1970 e 1980. Na opinião dos autores supracitados, as

primeiras modalidades deste âmbito terão surgido na costa oeste dos Estados

Unidos da América – com o nascer de novas práticas na natureza e o reformular

de antigas actividades praticadas no meio natural –, sendo importadas depois para

o resto das sociedades economicamente avançadas.

As suas origens são diversas e dependem de cada modalidade em

concreto. O seu palco são os principais meios físicos conhecidos ao homem –

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Desenvolvimento do Problema

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aéreo, terrestre ou aquático (Betrán e Betrán, 1995b; Guzmán, 2002; Melo, 2003)

– e como modalidades podem ser referidas: Asa Delta, Parapente, Queda-Livre,

Base Jump, Bicicleta Todo-Terreno, Cicloturismo, Street Luge, Ski, Snowboard,

Passeio Pedestre e Equestre, Montanhismo, Trekking, Orientação, Espeleologia,

Escalada, Mergulho, Surf, Body-Board, Wakeboard, Windsurf, Rafting, Canoagem,

Hidrospeed e Canyoning, entre muitas outras (Betrán e Betrán, 1995b; Funollet,

1995; Guzmán, 2002; Melo, 2003).

Para Costa (2006), como seus atributos particulares, são evidenciados: o

risco e a incerteza associadas à aventura, o desenvolvimento articulado com a

expansão das novas tecnologias, a concepção recreativa em oposição à

competição clássica das práticas desportivas tradicionais e a sua relação próxima

com a natureza. Na opinião de Melo (2003), estas podem mesmo definir-se

simplesmente pelo meio em que se praticam – necessariamente um ambiente

natural ou um local de paisagem humanizada mas de forte componente natural –

que ajuda a estabelecer – pela sua imprevisibilidade e características – o risco e

aventura que lhes são inegáveis (Holyfield, 1999; Costa e Correas, 2005).

As forças e condições totalmente imprevisíveis que oferecem, o risco e a

aventura (Krein, 2007), são o motor principal destas práticas, que se baseiam no

aproveitamento das energias livres (Betrán e Betrán, 1995a; Guzmán, 2002) para

proporcionar todo o leque de sensações – mergulho, vertigem, velocidade,

desequilíbrio, quedas, deslize, incerteza, liberdade e adrenalina (Guzmán, 2002;

Marinho, 2004) –, que as tornam tão apelativas e procuradas. Desta forma, a sua

essência é muitas vezes entendida como uma oposição entre o ser humano e o

meio natural – pelo confronto que se origina entre o indivíduo e as forças –,

embora a perspectiva mais sensata deva considerar o praticante em comunhão

com a natureza (Costa e Correas, 2005).

Para alguns autores, a dimensão da aventura a que nos referimos não

deixa de ser imaginária ou simbólica (Feixa, 2002; Marinho, 2004) – esta é uma

temática que mais tarde abordaremos, num capítulo inteiramente dedicado ao seu

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Desenvolvimento do Problema

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estudo – e a relação entre o nosso objecto de estudo e as novas tecnologias é

mais do que evidente (Betrán e Betrán, 1995a).

O que parece ser um facto é que os novos desportos surgem associados

aos paradigmas da realização pessoal, melhoria da qualidade de vida e

hedonismo, deixando para trás as condições fundamentais do rendimento,

esforço, tensão, competição e procura de marcas de maior performance,

características do desporto clássico (Domingo, 1991; Betrán e Betrán, 1995a e

1995b; Miranda et al., 1995). A motivação do desportista está contida no próprio

exercício físico e nas sensações que a sua prática produz, sendo desnecessária

outra justificação para a sua procura, que não a satisfação produzida pela acção

(Guzmán, 2002).

Como foi anteriormente referido, é importante mencionar a existência de

uma infinidade de termos que pretendem designar e caracterizar estas práticas

(Marinho, 2004, p:51). Esta parece ser uma questão premente e que nos

proporciona todo um quadro de problemas, associados à dialéctica dos autores e

investigadores, bem como à etimologia dos termos envolvidos e à multiplicidade

de formas de interpretação que os mesmos comportam em si ao longo dos

tempos.

Marinho (2004) escolheu o conceito “Atividades na Natureza” procurando

esclarecer os equívocos – existentes do seu ponto de vista – manifestados pelo

emprego de termos como desporto – pela falta de institucionalização e

burocratização destas práticas – e radical – explicando que uma caminhada pelo

bosque pode ser meramente tranquila. Na mesma perspectiva, Funollet (1995)

nega os conceitos de Aventura – por considerar que a mesma é uma concepção

muito subjectiva – e de Risco – por considerar que este limita à partida o público-

alvo passível de ser aliciado. Para Guzmán (2002), a aquisição de características

próprias por parte de algumas das actividades, justifica a necessidade de procurar

aglutinar as mesmas em grupos com distintas terminologias – no caso do autor, os

Desportos de Sliz.

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Desenvolvimento do Problema

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Com base nos trabalhos de autores como Betrán e Betrán (1995b), Funollet

(1995), Miranda et al. (1995), Fernández (2002), Guzmán (2002), Marinho (2004),

Costa e Correas (2005) procuramos apresentar uma lista das denominações

propostas ao longo do tempo, bem como esclarecer as suas interpretações ou as

causas que levaram ao seu uso. Desta forma e segundo os autores supracitados,

são ou foram nomenclaturas sugeridas, as seguintes:

- Novos Desportos: conceito proposto numa tentativa de destacar, nestas

novas práticas, um carácter inovador e estruturalmente distinto do verificado na

concepção clássica do Desporto;

- Desportos Californianos: termo proposto numa clara tentativa de

estabelecer a relação com a origem de algumas das actividades em causa;

- Desportos Fun: conceito que estabelece uma clara e objectiva relação

com o divertimento que tais práticas proporcionam;

- Actividades Outdoor, Actividades (Físicas) na Natureza e Desportos na

Natureza: conceitos que procuram claramente enfatizar o local ou meio no qual as

práticas se desenvolvem;

- Actividades Físicas de Aventura, Desportos de Aventura, Desportos de

Risco, Desportos Radicais e Extreme Sports: termos que referenciam e dão

enfoque à incerteza, risco e perigo físico objectivado;

- Desportos Selvagens e Desportos em Liberdade: conceitos que remarcam

o carácter natural, libertador e incerto, característico das práticas alvo, em ruptura

com a estrutura e civilização dos Desportos da modernidade;

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Desenvolvimento do Problema

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- Desportos Tecnológicos e Desportos Tecno-Ecológicos: termos que

procuram estabelecer uma clara referência à simbiose entre tecnologia e o objecto

de estudo;

- Actividades Deslizantes, Desportos Glisse e Desportos de Sliz: termos

que procuram enfatizar o deslizamento como a forma fundamental de

deslocamento nestas actividades, cuja principal energia de propulsão advém das

próprias forças da natureza.

A lista previamente apresentada estaria incompleta sem a inclusão de

outras terminologias que foram surgindo – referenciadas pelos mesmos autores –

e que agrupam em si conceitos anteriormente referidos. São exemplos:

Actividades Físicas de Plena Natureza e Actividades Desportivas no Meio Natural

– ainda no contexto de ênfase ao meio de prática; Actividades de Desafio na

Natureza, Actividades de Aventura no Ar Livre e Actividades Desportivas de

Recreio e Turísticas de Aventura – no contexto da procura de sensações;

Actividades Deslizantes de Aventura e Actividades Deslizantes de Aventura e

Sensação na Natureza – no contexto dos Desportos de Sliz.

A juntar a este extenso reportório, devemos ainda considerar um importante

leque de denominações, mais recentes, abordadas por vários autores e muito bem

evidenciadas por Pereira e Félix (2002), que não servindo directamente para

nomear o nosso objecto de estudo, acabam por a ele se relacionar. Segundo as

autoras, pode ser considerado natural que também as novas formas de turismo

incluam actividades vinculadas à natureza, dando origem a denominações como

Turismo de Natureza, Eco-Turismo ou Turismo Aventura – este tema será

posteriormente desenvolvido no nosso estudo.

Existem duas denominações que, pelo seu frequente uso nos trabalhos

mais recentes, não poderão deixar de ser analisadas. São elas: Actividades

Físicas de Exploração da Natureza (AFEN) e Actividades Físicas de Aventura na

Natureza (AFAN).

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Desenvolvimento do Problema

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O conceito de AFEN é clarificado por Constant (1994, cit. Pereira e

Monteiro, 1995: 111 e Guilherme, 2004: 16), que nos explica que as Actividades

Físicas de Exploração da Natureza caracterizam-se por movimentos realizados

com ou sem engenhos, num meio natural, complexo, variado e por vezes variável,

com controlo de eventuais riscos. Segundo Pereira e Monteiro (1995), no âmbito

das AFEN podemos encontrar um leque variado de actividades, que se estende

da corrida de orientação e passeios pedestres ao surf e escalada. O termo AFEN

é utilizado no Currículo Nacional do Ensino Básico1 e nos Programas Nacionais de

Educação Física2 pelo Ministério da Educação, incluindo nos mesmos e como

conteúdos temáticos: a Canoagem, o Cicloturismo, o Golfe, o

Montanhismo/Escalada, o Tiro com Arco, a Prancha à Vela, a Vela e o

Campismo/Pioneirismo (Jacinto et al., 2001; Maria e Nunes, 2007).

Pereira e Monteiro (1995) são peremptórios em referir, como valores

fundamentais das AFEN, as fortes componentes de incerteza, conquista e

liberdade – propícias à emoção e aventura, que criam situações específicas de

aprendizagem, apaixonantes para os jovens. Estas fortes componentes de risco e

aventura são apropriadas de forma muito mais evidente no segundo termo que

aqui analisamos, este aparentemente em voga no vocabulário dos investigadores

e autores da área.

Referimo-nos às AFAN, conceito apresentado pela primeira vez por Betrán

e Betrán em 1994, no Congresso Nacional de AEISAD (Betrán e Betrán, 1995a).

Segundo os autores, as AFAN devem ser entendidas como aquelas

actividades físicas de tempo livre que buscam a aventura imaginária – emoções e

sensações perspectivadas como hedonistas e fundamentalmente individuais –,

numa relação com o ambiente ecológico ou natural, situadas e em comunhão com

os valores da Pós-Modernidade. Com o recurso à expressão Actividade Física, os

autores procuram a ruptura com o termo Desporto – que consideram

1 Ver Currículo Nacional do Ensino Básico – Competências Essenciais 2 Ver Programas de Educação Física estipulados para 1º, 2º e 3º Ciclo do Ensino Básico

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Desenvolvimento do Problema

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regulamentado, institucionalizado, competitivo e profundamente associado aos

valores da modernidade –, surgindo o conceito de Natureza numa referência ao

meio comum de prática das actividades. Este meio é ainda salientado como um

dos factores de grande popularização das práticas, pela necessidade de evasão

do meio urbano e escape do quotidiano habitual, mas fundamentalmente pela

resposta emocional que o praticante sente na sua prática – liberdade, sentimento

ecológico, paz, harmonia ou por vezes desequilíbrio e vertigem.

Feixa (2002), optando igualmente pela terminologia AFAN, procura realçar

a dimensão imaginária ou simbólica da aventura – cenário para a gestão

controlada das emoções, nas quais as acções se subordinam às percepções e os

riscos reais aos imaginários –, exacerbando a opinião de Betrán e Betrán (1995b),

que embora afirmando uma tendência geral para a supressão do conceito de

aventura – uma vez que o público-alvo pode sentir-se intimidado pelo factor risco –

, aplicam o termo na sua nomenclatura, reconhecendo importância à busca de

sensações inerentes à prática de tais actividades.

Independentemente das dificuldades sentidas na escolha de uma

nomenclatura ou denominação geral e universalmente aceite, os trabalhos sobre

as Actividades de Ar Livre – ou qualquer outro conceito que se pretenda usar –

multiplicam-se e confluem para tópicos de interesse.

Embora o espólio terminológico existente seja muito vasto, os trabalhos

mais recentes têm optado pela terminologia de AFAN – como é o caso de Costa

(2006), Cunha (2006), Mota (2006) e Resende (2006) –; conceito bem estruturado

mas obviamente passível de críticas por parte de outros autores e investigadores.

Parece-nos admissível observar que este universo carece de uma terminologia

universal e de concordância, facto que facilitaria a definição do objecto de estudo,

bem como a organização da globalidade dos trabalhos na sua temática.

Apesar da sua nomenclatura ser discutível, parece concreto que o tipo de

actividades que aqui estudamos, surge hoje como oferta plural a um público

diversificado, sendo o aumento do número de praticantes estabelecido como uma

das suas principais características (Rico, 2002). Esta ideia é abordada por

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Desenvolvimento do Problema

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Fernández (2002), que afirma que o Desporto Aventura – há muito praticado

apenas por uns quantos “loucos e aventureiros” – se estende agora a um novo

público-alvo, que busca o risco e prazer da aventura, convertendo-se num objecto

de consumo de massa.

Embora tópicos de interesse, a busca do risco, da aventura e a perspectiva

do consumo estão longe de ser as únicas razões que justificam o aumento do

número de praticantes, sendo este incremento hipoteticamente justificável por um

vasto conjunto de razões que legitimam a prática e que analisaremos no capítulo

subsequente. O que é certo é que, parecemos estar perante o afirmar cada vez

mais seguro da natureza como cenário pretendido para as actividades

desportivas, num espaço que se pretende aberto e cuja variabilidade se contrapõe

à clausura do quotidiano (Pereira e Félix, 2002).

A variedade de contextos no qual a prática é procurada serve, por agora,

para nos permitir entender a vastidão cada vez mais notória do público-alvo

objectivado. Segundo os peritos, os praticantes procuram as Actividades Físicas

na Natureza em três âmbitos distintos: o pedagógico ou educativo, o competitivo e

o turistico-recreativo (Bétran e Bétran, 1999; Rico, 2002). Com campos tão

distintos e aos quais se relacionam objectivos tão díspares, é no mínimo lógico

que se considere o alargar do número e das características dos consumidores

envolvidos como um facto.

Como referimos anteriormente, os conteúdos curriculares do sistema

educativo começam a dar importância às actividades desenvolvidas no meio

natural para o desenvolvimento e formação de valores ambientais. Thomas e

Raymond (1998), esclarecendo que muitas instituições escolares não perdem a

oportunidade de proporcionar aos seus alunos experiências e viagens de estudo

temáticas, referem-se à importante função das actividades ditas de aventura na

educação e formação das crianças, expondo brevemente o seu relevante papel na

aquisição de objectivos como consciência ambiental e a sua potencialidade para o

desenvolvimento social e pessoal. Pereira e Monteiro (1995) e Guilherme (2004)

evidenciam bem a importância da presença de conteúdos deste género nos

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Desenvolvimento do Problema

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programas de Educação Física Escolar e Nichols (2000), que se foca no conceito

de educação aventura, aviva o seu potencial para o crescimento pessoal das

crianças e jovens, esclarecendo a sua possibilidade para a formação de adultos.

Todo o conjunto de indivíduos que procuram o meio natural para participar

em algum tipo de competição ou evento desportivo, pode ser englobado no âmbito

competitivo ou profissional referido por Rico (2002). Aparentemente, também este

grupo parece ter tendência a um crescimento – utilizemos a título de exemplo a

exposição de Silva (2003) sobre o sucesso das Corridas de Aventura em Portugal,

ou a de Leite, Vinha e Almeida (2002) sobre as Corridas de Orientação. Mas como

refere Palmer (2002), o número cada vez maior de praticantes atraídos pelos

Extreme Sports varia entre o dos “adeptos hard-core” – completamente fundidos

com o estilo e conhecimento técnico da sua disciplina preferida – e o dos

“guerreiros de fim-de-semana” – que não praticam e possuem pouco domínio

técnico.

Para além dos paradoxais “atletas profissionais” das actividades de lazer, a

imagem do atleta consumidor – comprador de experiência – é cada vez mais

usual, muito pela crescente oferta de produtos por parte das empresas de

animação turística (Betrán e Betrán, 1999). Já não é apenas uma minoria,

dominadora de técnicas desportivas especializadas, a que procura os espaços

naturais, sendo cada vez mais amplo o extracto de população que acede a estes

meios, sem possuir uma estupenda forma física e domínio técnico prodigioso

(Rico, 2002). Segundo Pereira e Félix (2002), não é estranho que se verifique a

vinculação entre este tipo de actividades e as novas formas de turismo activo e,

como nos expõe Costa (2003), são cada vez mais as entidade turísticas que se

associam às empresas de Desportos Aventura, para satisfazer as necessidades e

desejos dos seus clientes. Segundo a opinião da Confederação de Turismo

Português (CTP, 2005), os “consumidores” do Ecoturismo e do Turismo Aventura

são geralmente indivíduos com mais de 30 anos, aproximadamente na faixa etária

dos 40, ainda que também se encontrem viajantes na faixa dos 40-60 anos de

idade.

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Desenvolvimento do Problema

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Podemos então afirmar que, o espectro do actual público-alvo do nosso

objecto de estudo é vastíssimo. Para Rico (2002), são os jovens e adultos de nível

socioeconómico médio-alto os principais demandantes das Actividades de

Aventura na Natureza, representando as crianças, idosos e populações especiais

fracções menos evidentes desse espectro. No entanto, como tivemos a hipótese

de compreender, aquela que parecia a loucura de uns poucos, converte-se na

dedicação e paixão de muitos, que cada vez mais numerosos constituem um

grupo onde não há tendência a marginalizar raças, sexos, medidas

antropométricas, estados físicos ou idades (Betrán e Betrán, 1999).

O nosso objecto de estudo é complexo. O seu sucesso e afirmação são

inegáveis e o crescente público-alvo que lhe surge vinculado é prova visível desse

facto – quer se entenda como causa, quer como efeito. São muitas as suas

características, variando do meio especificamente distintivo onde ocorrem à

multiplicidade de sensações e sentimentos que podem proporcionar. É uma

miríade de termos a que o pretende nomear ou identificar, circunstância que

dificulta o seu estudo e o escrutínio lógico da sua essência.

Durante esta breve caracterização, algumas das propriedades específicas

das actividades aqui em causa foram abordadas escassamente e de forma subtil,

entenda-se, pela sua coerência com outras partes do nosso trabalho onde lhes é

atribuída evidente importância e reflexão.

Entendendo um pouco melhor o nosso objecto de estudo e a sociedade em

que se engloba, importa agora entender a interacção ou conjunção verificada, que

leva à adesão e eleição deste tipo de actividades por parte da população.

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Desenvolvimento do Problema

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2.1.3 Razões da procura e afirmação

Nuevos tiempos, nuevos costumbres,

nuevos usos, nuevos hábitos, nuevas

demandas y nuevas ofertas (...)

(Betrán e Betrán, 1995a: 17)

Como foi anteriormente analisado, foi a plena identificação das Actividades

Físicas de Aventura na Natureza com os valores e atitudes da Pós-Modernidade,

que permitiu a sua progressiva integração na nossa sociedade de consumo e

serviços (Betrán, 1995). As modificações económicas, sociais e políticas do século

passado – das quais emergem valores como o hedonismo, o consumismo, o

individualismo, o gosto pelo risco, a superação e exaltação, a busca das origens e

subsequentes buscas da natureza e dos valores ecológicos – levaram a uma

crescente procura das actividades de ócio, desportivas e na natureza (Pereira e

Félix, 2002). Os “Novos Desportos” aparecem associados aos paradigmas da

auto-realização, livre expressão, afirmação e melhoria da qualidade de vida

(Domingo, 1991; Betrán e Betrán, 1995a e 1995b; Miranda et al., 1995) e, como

veremos neste capítulo, são várias as razões que conduzem à sua procura e

contribuem para a sua cada vez mais evidente afirmação.

O risco físico e o contacto directo com a natureza, que faziam parte do

quotidiano habitual das sociedades pré-industriais, sendo ritualizados, vividos em

contexto de guerra, de festa ou subsistência, tornavam desnecessária a criação de

cenografias especiais para a gestão controlada das emoções (Feixa, 2002). Hoje

são menos frequentes e mais reprováveis a forte excitação colectiva e individual,

as explosões incontroladas e as suas manifestações públicas, a menos que

expressas num cenário socialmente aceite (Elias, 1992). A vida nestas sociedades

industriais modernas caracteriza-se, entre outros, pelos excessos de

regulamentação e de sentimento de segurança, que originam monotonia e falta de

surpresas, levando assim à perda de emoções e sensações e a uma diminuição

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Desenvolvimento do Problema

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da gratificação e satisfação em respeito à própria conduta (Heinemann, 1994;

Costa e Correas, 2005). Para trás ficou a época em que, para ser digno da sua

própria humanidade, o homem devia aperfeiçoar-se e progredir através do

trabalho – usando o mesmo como forma de aprendizagem ao respeito pela própria

vida, de aquisição de qualidades morais, fortificação da saúde, vontade e

perseverança – e tem agora lugar uma era na qual é necessária a “paixão da

mudança”, o gosto pela iniciativa, pelo risco e pelas experimentações ultra-rápidas

(Lipovetsky, 1994:142). Vivemos um tempo cronometrado, comprado, calculado e

compulsivo, até por vezes nos momentos de lazer (Marinho, 2004). Vivemos numa

cidade de betão – de urbanização desregrada, com zonas marginalizadas, novos

focos de pobreza e exclusão, aumento do tráfego, degradação dos espaços

públicos, elevados índices de poluição e excesso de mecanicismos (Pereira e

Monteiro, 1995; Constantino, 1997) –, vivemos o cansaço, o stress, contaminação

e ruídos que a caracterizam (Fernández, 2002), e vivemos preocupados com a

sua incompatibilidade com o homem no plano ecológico, antropológico e social – a

relação cidade-cidadão é uma afinidade de aperto e constrangimento, com o

desejo de divórcio baseado na fuga para a natureza (Bento, 1997).

A vida ao ar livre – por intermédio das Actividades na Natureza – passa a

ser encarada pelo homem como espaço privilegiado para o aproveitamento do

tempo de lazer, como “válvula de escape” do quotidiano repetitivo e maculado,

como resposta à necessidade de reencontro com a natureza – a “sua natureza” –,

como momento socialmente aceite para a vivência e expressão de excitação, local

para procura de novas sensações, aventuras e emoções, perdidas no meio urbano

e social actuais (Elias, 1992; Pereira e Monteiro, 1995; Rico, 2002; Chao, 2004;

Costa e Correas, 2005). O descobrimento de um novo meio, desconhecido e

misterioso, apenas domesticado, desprovido das comodidades habituais, permite

a fuga da rotina quotidiana e da cidade viciada, a procura da satisfação associada

à estimulação emocional carregada de tensões agradáveis, a superação do tédio

diário (Feixa, 2002; Costa e Correas, 2005) e até a adesão a uma moda ecológica,

que se associa ao consumo da natureza (Chao, 2004).

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Desenvolvimento do Problema

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Muitos praticantes experimentam os desportos de Natureza por mera

curiosidade, ou porque as chamadas “actividades radicais” ou “de aventura” estão

na moda (…) outros encaram a actividade como um desporto como outro

qualquer, desprezando tanto os riscos pessoais e ambientais, como as

potencialidades educativas (Melo, 2003:16). No entanto, para os indivíduos

verdadeiramente interessados em actividades desportivas, a interacção

potenciada pelos Desportos de Aventura entre o ser humano e o mundo natural é

valorosa, pelas experiências excepcionalmente atléticas que proporciona – umas

das principais atracções destas práticas é a oportunidade de ter um oponente tão

extraordinário como uma onda de 10 metros ou um pico de 8000 metros de altura

(Krein, 2007). Para além de tudo isso, as novas actividades que envolvem risco

podem ainda oferecer ao seus praticantes, de forma consciente ou não, um

sentido de identidade pessoal que a sociedade em crise de valores já não lhes

confere (Almeida, 1997), uma hipótese de crescimento e desenvolvimento pessoal

(Costa e Correas, 2005) e de controlo e responsabilidade sobre a própria

existência (Krein, 2007).

Como explicam Miranda et al. (1995), são múltiplos os factores que

justificam os fenómenos de crescimento e consolidação destas práticas físicas e

desportivas no contexto social actual, factores que passamos a analisar tendo

como referência os trabalhos de Betrán (1995), Betrán e Betrán (1995b), Miranda

et al. (1995), Pereira e Monteiro (1995), Feixa (2002), Pereira e Félix (2002) e Rico

(2002):

- A vasta gama de actividades existentes – quase ao gosto e desejo do

consumidor – e a alternativa viável que constituem aos modelos desportivos

tradicionais – ainda mais pela harmonia com os valores da Pós-Modernidade –

levam cada vez mais os cenários naturais a destacar-se como espaços para o

aproveitamento do tempo livre dos indivíduos, libertos das suas obrigações

quotidianas;

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Desenvolvimento do Problema

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- A grande flexibilidade destas actividades permite-lhes chegar até grupos

de consumidores muito diferenciados – entre os quais se destacam,

especialmente, os aderentes à sub-cultura juvenil e os aspirantes a “sempre

jovens” – público-alvo crescente que contribui para o aumento de procura destas

práticas;

- As sensações e emoções que suscitam, o sentimento de liberdade e

prazer que proporcionam, o simbolismo que lhes é inerente, a necessidade

mínima de institucionalização e de regularidade de prática, contribuíram

exacerbadamente para a sua grande popularidade, a qual foi ainda mais

fortalecida pela resposta empresarial que permitiu ao praticante obter um serviço

total com o mínimo de preocupações ou conhecimentos;

- Os avanços tecnológicos – que permitiram optimizar os materiais,

equipamentos e artefactos necessários – tornaram mais simples e seguro o

acesso a estas práticas;

- A crescente adesão às actividades relacionadas com a natureza, seguida

de perto pelos agentes económicos e pelos media que nela encontram mais uma

forma de incremento das relações de consumo, criou uma moda do natural, à qual

não escapa o turismo activo – relação de recíproca publicitação e fortalecimento;

- Este tipo de práticas – que apresentam características muito próprias e

diferenciadas – fazem delas modelos de educação por excelência, contribuindo

para a sua crescente procura no contexto da formação e instrução.

A forte necessidade de sensações e emoções (Pereira e Monteiro, 1995;

Miranda et al., 1995; Feixa, 2002), aparentemente perdidas ou minimizadas numa

urbanização demasiado poluída, regrada e mecanizada (Marinho, 2004; Costa e

Correas, 2005), são, sem dúvida, grandes factores de influência para o

aparecimento e consolidação das actividades realizadas em exploração e contacto

com o meio natural (Costa e Correas, 2005), até porque este divórcio, e

prossecução da vontade e necessidade individual, acabam por ter profunda

relação com as dinâmicas e valores da nossa sociedade.

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Desenvolvimento do Problema

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Entre os vários agentes que contribuem para a sua popularidade,

destacamos: as fortes actividades empresarial e comercial que orbitam em torno

deste fenómeno e o surgimento e afirmação das novas formas de turismo activo,

que acabam por demonstrar estreita ligação com as nossas actividades.

Depois de conhecida a realidade da nossa sociedade, entendido o nosso

objecto de estudo e abordada a dinâmica entre ambos – analisada sob a forma de

razões que incentivam e condicionam a relação – consideramos importante, até

para consolidação da investigação de alguns temas já analisados, estudar as

grandes questões associadas ao nosso objecto de estudo, que representam

plenamente os problemas sociais e a forma como a prática aqui objectivada

oferece interacção com os mesmos.

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Desenvolvimento do Problema

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2.2 Temas de interesse na investigação do objecto de estudo

2.2.1 Aventura: sensações e necessidades

Actualmente, la prática deportiva en el

médio natural se llama de forma genérica

deportes de aventura, y a veces deportes

de riesgo.

(Funollet, 1995: 125)

O nível e tipo de risco presenciais – substancial hipótese de lesão ou

mesmo morte para o praticante – continuam a ser para muitos, características

definitivas ou pelo menos conceitos intimamente associados ao nosso objecto de

estudo (Holyfield, 1999; Palmer, 2002; Varley, 2006; Jirásek, 2007; Krein, 2007) e,

no entanto, ou talvez por causa deste facto, a popularidade dos Desportos de

Aventura aumenta significativamente, fazendo crescer o número de adeptos do

extremo (Palmer, 2002; Jirásek, 2007).

Não deixa de ser verdade que os perigos inerentes a estas práticas

aparecem cada vez mais orientados e conduzidos. Como nos explicam Betrán e

Betrán (1999), a notoriedade da oferta empresarial associada a estas

experiências, tem, paradoxalmente, a sua sustentação na busca e fornecimento

da maior segurança possível nas suas práticas, estabelecendo o risco como uma

dimensão imaginária (Feixa, 2002). Até os atletas e aficionados despendem de

enormes esforços para limitar o risco das suas actividades, recorrendo a materiais

específicos e ao desenvolvimento de conhecimentos e capacidades, com o

objectivo de tornar o ambiente o mais seguro possível (Krein, 2007). Mas, apesar

da retórica que sugere que estas actividades são desportos sem azares ou

perigos, as coisas podem correr e, por vezes, correm mal (Palmer, 2002).

O que procuramos entender neste capítulo são os verdadeiros valores e

dimensões do risco, da emoção e das sensações intrínsecas às Actividades de

Aventura, analisando igualmente as razões que levam à procura da ocupação do

tempo de lazer com práticas, notória ou subjectivamente, perigosas.

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Nas sociedades avançadas do nosso tempo, muitas profissões, relações

privadas e actividades dependem do autocontrolo individual, sendo limitado o

campo existente para a demonstração de fortes sentimentos, emoções e impulsos

(Elias, 1992). São sociedades nas quais a vida dos indivíduos se encontra muito

regrada (Costa e Correas, 2005), nas quais não mais existe a necessidade de

esforço físico ou mental – substituídos por uma passividade preponderante que

tornou a vida em algo automático e que não requer a actuação humana (Lewis,

2001). Sociedades nas quais tendemos a considerar as emoções como

expressões do nosso Eu privado e interior (Sharpe, 2005) e onde é exacerbado o

poder sobre a própria vida, que ao ser perfeitamente incontestado acaba por privar

os cidadãos da sua própria percepção de auto-determinação (Møller, 2007). Como

refere Baudrillard (1995), de forma a resolver a contradição entre a moral puritana

e a moral hedonista, importa que a tranquilidade da esfera privada surja como

valor disputado, constantemente ameaçado, rodeado por um destino de

catástrofe. É precisa a violência e a inumanidade do mundo exterior para que a

segurança não só se experimente como tal, com maior profundidade, mas também

para que se sinta justificada em escolher-se a si mesma em cada momento.

Segundo o autor, nesta concepção, é fundamental a acção dos media, que

bombardeiam o “consumidor” com informação e factos, embora – como veremos –

a solução possa também ser proporcionada pela vivência de aventuras.

Paradoxalmente, nesta mesma era, a vida vai ficando mais dura e arriscada

no sentido existencial e temos tendência a influenciar as crianças, jovens e

adultos, a tornarem-se mais suaves, menos tolerantes à dor, a lesões e problemas

de stress (Breivik, 2007). Pode ser verdade que, como já referimos, nunca antes

na história tantas pessoas viveram tão relativamente livres de riscos – em termos

financeiros, na perspectiva da saúde e da segurança militar (Møller, 2007), tal

como nos expõe Lewis (2001), ao exacerbar que até a morte foi transformada em

algo irreal, num evento de puro e extraordinário azar, por oposição a algo

inevitável e universal. No entanto, não deixa de ser verdade que, nas sociedades

contemporâneas ocidentais, o conceito de risco ocupa o quotidiano (Beck, 2000;

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Giddens, 2000) e que nos últimos anos se têm vindo a intensificar os discursos

emergentes das diversas áreas do saber (ciências sociais incluídas) sobre a sua

natureza e efeitos na vida da população (Tulloch e Lupton, 2003). Podemos,

assim, afirmar que o clima de segurança de que se desfruta, nunca antes na

história foi observado (Costa e Ferreira, 2000), mas que quando comparamos a

nossa situação com a que se viveu em períodos mais remotos, o conceito de risco

assume uma importância nova e peculiar, não definindo a nossa época como mais

perigosa do que as anteriores, mas como uma na qual o equilíbrio entre estes e os

perigos se alterou (Giddens, 2002).

Neste mundo – controlado, planificado e ao mesmo tempo de risco real –,

no qual a manifestação de emoções espontâneas se vê fortemente limitada por

um conjunto de restrições sociais e culturais (Costa e Correas, 2005), a maioria

das sociedades encontrou, segundo Elias (1992), uma contramedida de oposição

às tensões que elas próprias conceberam – enquanto as rotinas públicas ou

privadas da vida exigem perfeito domínio sobre estados de espírito, impulsos,

afectos e emoções, as ocupações de lazer autorizam-nas a fluir livremente num

quadro especialmente criado. Segundo o mesmo autor, de forma simples ou

complexa, as actividades de lazer proporcionam a erupção de sentimentos

agradáveis, frequentemente ausentes nas rotinas habituais, originando – mais do

que a libertação de tensões – a renovação da tensão necessária à saúde mental:

tensão-excitação.

Frequentemente encontradas no mundo do lazer, as aventuras, que podem

ser consideradas um tipo de situação marginal – caracterizada como um estado

corporal em que acontece a contestação de todas as definições socialmente

objectivadas da realidade e que fornece a hipótese de testemunhar e antecipar a

própria (e a alheia) mortalidade (Lewis, 2001) –, bem como um tipo de resistência

aos constrangimentos da desumanização da modernidade (Holyfield, 1999),

fornecem resposta a muitas das necessidades presentemente em evidência na

nossa sociedade. A paixão pela sua busca é tão velha como a própria espécie.

Romper com o quotidiano, com a norma, com o costume e o estabelecido, é um

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desejo inconfesso do mortal na sua busca por algo extraordinário na vida e por

algo que possa ser narrado aos seus pares (Bétran e Bétran, 1999).

Quando discorremos sobre a Aventura, não podemos deixar de analisar as

perspectivas de Simmel (1997), para quem cada segmento da nossa conduta e

experiência carrega um duplo significado, simbolizando quer a imediata

experiência que proporciona, quer uma parte do decurso da nossa vida. Eventos,

embora similares, podem possuir diferentes significados no contexto da vida como

um todo, ou, eventos, com distintos significados intrínsecos, podem representar

papéis similares na continuidade da nossa existência. Segundo o autor, as formas

mais comuns de aventura caracterizam-se pelo fornecimento de quebras com a

continuidade da vida, sendo detentoras de um significado mais profundo, dada a

sua ocorrência além do usual desenlace quotidiano. Colocada fora do contexto

significativo da vida como um todo – como uma memória que é unida à realidade

por menos fios do que os da experiência ordinária –, a aventura pode ser vista

como uma ilha na existência, cujos limites são muito mais evidentes do que os da

experiência vulgar. Para o autor, falamos de aventura, precisamente, quando a

continuidade da vida é desconsiderada em princípio, ou quando nem se verifica a

necessidade dessa desconsideração, pela certeza de lidarmos com algo intocável,

fora do comum e inusual.

Subjectiva e controversa, a experiência da aventura apresenta, também, um

aspecto fundamental na sua relação com a emoção (Sharpe, 2005), sendo

aparentemente criada quando os riscos são combinados com a incerteza dos

participantes de estarem ou não à altura de ultrapassar os obstáculos (Morgan,

Moore e Mansell, 2005). Entre as suas componentes, surgem as fortes

possibilidades de dano e desastre, cuja relação com a morte parece fornecer um

apelativo sorteio para muitos indivíduos modernos (Varley, 2006) – pois como nos

explica Pereira (2005) quando a ordem social se furta ao seu papel, é necessário

experimentar o risco no corpo, uma capacidade íntima de confronto com a morte,

sem fraquejar (p. 319).

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Verifica-se, na aventura, toda uma busca de sensações aprazíveis, que

permitam ao ser humano conhecer-se a si mesmo, na mesma medida em que

uma criança experimenta o novo mundo que a rodeia na sua infância – é todo um

processo de adaptação (Miranda et al., 1995). A busca da excitação, ou mais

especificamente das sensações, pode envolver, embora não obrigatoriamente, a

tomada de risco (Breivik, 2007) –, cuja aceitação é um dos requisitos da aventura

(Giddens, 2000).

Parece certo que existe um determinado risco em tudo o que fazemos

(Thomas e Raymond, 1998) – inseparável das ideias de probabilidade e incerteza

(Giddens, 2000) –, que a sociedade tende a associar a resultados negativos

(Nichols, 2000), mas cuja definição “oficial” representa como fenómeno neutro de

consequências potencialmente benéficas ou contraproducentes (Tulloch e Lupton,

2003). A vida moderna encoraja a procura de conforto e segurança, mas

aparentemente o ser humano, que quer essa segurança, controlo e previsibilidade

em muitas das áreas da sua vida, procura também os riscos – previsíveis,

controlados, dominados e com os quais lida através das aptidões e competências

–, de forma relevante e considerada racional em determinadas condições (Varley,

2006; Breivik, 2007). Parecemos ter uma besta interior, que por vezes e em

determinadas circunstâncias nos transforma em thrill seekers, que não só aceita o

risco, como o procura (Breivik, 2007).

A teoria do risco é presumivelmente a concepção mais comum para a

justificação da adesão da população aos Desportos Aventura, em grande parte

porque esta se distingue como a característica mais evidente que as actividades

partilham (Krein, 2007) – a constante incerteza e a inexistência de rotina, tornam

impossível a sua remoção das mesmas (Branco, 2002; Krein, 2007) e este pode

surgir numa de duas componentes: mitigável pelas habilidades e experiência do

praticante, ou inerente à prática e incontrolável (Krein, 2007). Assim, os Desportos

Aventura, que oferecerem – senão a própria morte – um toque com o perigo e o

dano, um vislumbre no abismo e a experiência da mutabilidade do ser humano,

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Desenvolvimento do Problema

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poderão permitir ao mesmo tempo, o uso das habilidades e experiências, por parte

dos praticantes, para reforçar o sentido de controlo que refuta os mundanos e

alienados procedimentos do quotidiano, pela habilidosa negociação no fio da

navalha entre a aventura e a desventura (Varley, 2006). São sensações

aprazíveis, que se alcançam a cada dia e a cada nível de mestria, fruto da

instabilidade e insegurança que, quando vencidas, promovem a satisfação e a

auto-afirmação, convertendo-se em sensações de progresso, melhoria e

aprendizagem (Guzmán, 2002).

As práticas desportivas que envolvem o risco proporcionam, ao indivíduo,

um sentido de identidade pessoal que a sociedade em crise de valores já não lhes

confere (Almeida, 1997), tal como nos expõe Pereira (in press), que, ao referir-se

ao mundo do alpinismo, o caracteriza como um espaço privado que permite a

restauração da sensação de espontaneidade e crença no controlo pessoal.

Embora inseparável de muitas das actividades aqui em foco, a ideia de

arriscar a morte ou a lesão grave não é, segundo Krein (2007), o objectivo último

de adesão à pratica, até porque, como explica o autor, se o que o praticante

procura são os puros ímpetos de adrenalina associados ao perigo, existem muitas

actividades sobremaneira mais convenientes e menos dispendiosas em termos de

esforço e desenvolvimento de competências, capazes de as proporcionar. A

importância dada pelos participantes às condições de segurança e ao ambiente

natural, parece, assim, entrar em conflito com o papel do risco como motivador

para a participação em aventuras (Morgan, et al., 2005), tornando possível

equacionar a existência de uma medida de satisfação directamente relacionada

com a sensação de responsabilidade pela própria segurança e uma recompensa,

pela procura da prática, de fonte interna (prazer, alegria satisfação).

Breivik (2007) refere-se a uma teoria de homeostasia – que ajudaria a

entender a procura de perigos numa sociedade focada na segurança e no controlo

–, segundo a qual tendemos a procurar nas nossas vidas o oposto do que

sentimos – justificando desta forma a busca do risco, pelo excesso de restrições e

pela necessidade de quebras com a continuidade do quotidiano. Existem bases

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Desenvolvimento do Problema

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para acreditar que as Actividades de Aventura fornecem resposta a uma

necessidade fundamental – a necessidade de “estar em controlo” (Møller, 2007) –

e que para os atletas – em constante avaliação das suas habilidades, tentando

ampliá-las e superá-las (Krein, 2007) – o desafio é agora muito mais interno,

sendo o adversário a conquistar, o próprio ser, num acto de constante descoberta

do “eu” (Branco, 2002). A valorização do esforço parece catalisar a superação de

si próprio e a necessidade de ultrapassar obstáculos permitindo,

consequentemente, a realização de si (Pereira, 2005: 316). Esta realização

pessoal e superação individual contribuem para a afirmação pessoal e para a

construção de uma própria identidade – facto que poderia ser visto como uma

forma de transgressão, não fossem a construção e re-construção da própria

narrativa identitária, um dos imperativos da sociedade em que coexistimos

(Pereira, in press).

O ser humano procura, então, a aventura, numa tentativa de mitigar

algumas necessidades às quais a sociedade não oferece resposta. Nesta procura,

o homem encontra nos Desportos de Ar Livre uma forma de saciar algumas das

suas ânsias. No entanto, como nos explica Varley (2006), embora possamos

assumir que todos operamos na mesma concepção garantida do termo, as

diferentes personalidades, experiências e situações, fazem da aventura um

constructo infinitamente variável, maleável, fluido, subjectivo e actualmente

parecemos mesmo esquecer a metamorfose da sua versão “ideal”, para a sua

versão de produto “turístico com sabor a aventura”. De facto, temos de admitir

que, para alguns autores, a aventura inerente ao nosso objecto de estudo é

imaginária (Betrán e Betrán, 1995a), simbólica e fornecedora de emoções –

embora fundamentais na perspectiva do contexto social actual – limitadas,

controladas, de certa forma fictícias (Feixa, 2002: 33). Parece, assim, ser verdade

que o conceito de aventura associado a estas práticas tem realmente uma versão

apenas aromatizada com a autêntica essência do termo, facto que no nosso

entender parece associado à premissa de que a venda da extremidade trouxe

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Desenvolvimento do Problema

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mudanças fundamentais às dimensões sociais e simbólicas das Actividades

Aventura (Palmer, 2002).

A prática massiva das AFAN, bem como a lógica mercantil, tendem a

domesticar o risco, calculando-o, minimizando-o e promovendo-o como controlado

(Betrán e Betrán, 1999); as empresas que as comercializam fornecem a desejada

mistura de risco percebido e de organização, onde quase tudo é planeado ao

pormenor para minimizar os “azares” (Holyfield, 1999); a aventura torna-se um

acto mimético, uma dimensão simbólica ou imaginária, onde tudo está controlado,

previsto e tecnificado (Feixa, 2002) e este parece não ser um problema, pois ao

praticante é oferecida a emoção procurada. O êxito das AFAN é explicado pela

resposta que estas fornecem à necessidade que os indivíduos evidenciam de

deixar o mundo seguro e viver uma experiência de risco, embora com toda a

segurança possível, para sentirem a subida de adrenalina e o imenso prazer de

narrarem a façanha aos seus amigos e família (Betrán e Betrán, 1999). O risco

torna-se num factor mais aparente que real (Betrán, 1995), e é através da forma

como este é percebido que parece fluir a dimensão de perigo associada à

comercialização da Aventura, pois, como explica Hollyfield (1999), nem todos os

participantes procuram e exigem a verdadeira acção fatídica, sendo suficiente, por

vezes, apenas a sua aparência para a obtenção da glória e estatuto.

Numa reflexão do que até agora foi analisado, podemos afirmar que os

Desportos Extremos não se encontram marginalizados na nossa sociedade – não

representam somente uma menor classe das actividades motoras e não são

simplesmente uma questão de moda –; estes gozam do máximo de publicidade,

encontram-se no centro da reflexão do desporto e expressam muito claramente as

características da corrente pós-moderna – a crise das experiências, a frustração

existencial, a falta de sentido reflexivo da própria vida –, oferecendo situações que

nos obrigam a pensar de novo pelo significado que fornecem e que não

conhecemos historicamente (Jirásek, 2007).

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Desenvolvimento do Problema

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Embora há muito tendamos a entender as Actividades Outdoor como uma

profunda realidade, devemos aceitar que a autenticidade a que associamos a

experiência da aventura é um nosso constructo. Se esta é entendida como um

espaço para experimentar o real – as emoções genuínas e a essência do nosso

verdadeiro ser –, convém atender ao facto de que a progressão para a realidade

frequentemente descrita como Pós-Modernidade, tende a obscurecer a sua

própria performance (Sharpe, 2005).

Ansiedade existencial, bem como sentimentos de emoção e divertimento,

são fornecidos pela imprevisibilidade das escolhas inerente às actividades em foco

(Manning, 1999), que permitem o desenvolvimento de competências particulares

inexistente nas vidas demasiado rotinadas (Holyfield, 1999). O praticante, em

relação com o meio, procura, através do risco inerente às actividades físico-

desportivas na natureza, elaborar estratégias cognitivas e motoras que permitam o

seu desenvolvimento de modo “seguro” e fácil (Costa e Correas, 2005). Não é seu

objectivo deixar a sobrevivência ao sabor da fortuna ou jogar com a própria vida –

muito embora ao solicitar simbolicamente a morte, o indivíduo confira legitimidade

à existência (Pereira, 2005) –, mas procurar situações que permitam sentir o

controlo e responsabilidade pela própria vida, dependendo a sua continuidade dos

julgamentos e habilidades – no momento em que esta assumpção é adoptada, a

imagem de thrill seaker é alterada para a de atleta na busca do desenvolvimento

de capacidades para atingir objectivos mais árduos (Krein, 2007).

Na aventura abandonamo-nos ao mundo com menos defesas e reservas do

que em qualquer outra relação com ele estabelecida – deliciados por acidentes e

forças que nos podem destruir –, buscando estimulação emocional, novas

sensações e relações sociais, de forma justificada, lógica e numa quebra com a

rotina, e colocando, quer de forma subjectiva ou indiscutivelmente real, a

integridade corporal em jogo (Pereira e Monteiro, 1995; Simmel, 1997; Costa e

Correas, 2005).

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Desenvolvimento do Problema

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2.2.2 Consumo: sociedade e produto consumível

A indústria de massas requer um

consumo de massas. As sociedades

industriais modernas estruturam-se, ao

mesmo tempo, como sociedades de

consumo.

(Silva, 2002: 124)

À nossa volta, existe hoje uma espécie de evidência fantástica do consumo

e da abundância, criada pela multiplicação dos objectos, dos serviços, dos bens

materiais, originando como que uma categoria de mutação fundamental na

ecologia da espécie humana (Baudrillard, 1995:15). É a sociedade em que

vivemos, que não surge após ou em substituição da sociedade industrial, mas em

estreita ligação com esta, podendo ser empiricamente caracterizada pela elevação

do nível de vida, pela abundância de mercadorias e de serviços, pelo culto dos

objectos e dos lazeres, pela moral hedonista e materialista, e estruturalmente

definida como coisa particular pela generalização do processo de moda

(Lipovetsky; 1989; Silva, 2002).

O consumo é hedonista e regressivo, o seu processo é de absorção de

signos e absorção através de signos, o seu lugar é a vida quotidiana. Na sua era

generalizou-se a lógica da mercadoria, que regula hoje, não só os processos de

trabalho e os produtos materiais, mas a cultura inteira, a sexualidade, as relações

humanas e os próprios fantasmas e pulsões individuais (Baudrillard, 1995). É o

consumo como finalidade de vida, como obrigação incessante, muito pela acção

da publicidade e do processo de moda, que tornam os produtos, bens e serviços

em algo de indispensável (Bachelet, 1995).

A sociedade actual representa a apoteose e extensão do consumo à esfera

privada (Lipovetsky, 1983). O que pretendemos analisar neste capítulo, é

precisamente a versão de produto e serviço consumível do nosso objecto de

estudo, que não passa ao lado desta teoria e tendência tão evidente.

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Desenvolvimento do Problema

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Serviço, satisfação das aspirações, relaxamento, diversão, apresentação do

próprio, aceitação e prestígio são conceitos intimamente associados à ideia de

consumo, cujos produtos se estabelecem, acima de tudo, como objectos

economicamente benéficos, de interesse, comercialmente atractivos e com

capacidade para competir num mercado dinâmico como o actual (Heinemann,

1994). A multiplicação do número daqueles que têm acesso aos bens de

consumo, bem como a diferenciação dos grupos – em função da condição,

posição e estatuto social –, que compõem o mercado crescente e heterogéneo,

reportam-nos ao consumo de massa da nossa sociedade (Silva, 2002) e revelam-

nos toda uma problemática quanto à influência desta tendência na vida da

população.

Segundo Giddens (2002), com a globalização, a produção de massa passa

a desenvolver-se à escala planetária, tornando-se possível encontrar os mesmos

produtos em locais tão distintos como a Europa e a África Central. Neste contexto,

Mota (2006) afirma que parecemos tender para a uniformização dos gostos e

opções mas, segundo Lipovetsky (1983), a fórmula da sociedade de consumo não

é isenta de ambiguidade e o acesso de todos a determinados bens e serviços, que

designa uma uniformização de comportamentos, também acentua as

singularidades e o processo de personalização do indivíduo. Segundo o autor, a

era do consumo inscreve-se, por um lado, como regulação total e microscópica do

social e, por outro, como emancipação do indivíduo – este é obrigado a escolhas

permanentes, a tomadas de iniciativa, a procura de informação e a crítica de

produtos anexados ao processo da moda e da obsolência acelerada.

Na opinião de Shoham e Rose (2000), a probabilidade de consumo tende a

aumentar, perante a perspectiva de resultados potencialmente desejáveis – para o

consumidor – advirem desse acto. Assim, a emergência do consumidor como

figura da economia moderna desencadeou modificações importantes nas

estratégias de circulação mercantil dos produtos e tornou cruciais as técnicas que

se dirigem à sua persuasão e condicionamento – como a prospecção de mercado,

a publicidade e os serviços de pós-venda, entre outros (Silva, 2002). Torna-se

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Desenvolvimento do Problema

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então simples entender a ideia de Lipovetsky (1983), de que o processo geral que

tende a regular o consumo, as organizações, as informações, a educação e os

costumes é o de sedução – uma nova espécie de estratégia que governa a vida

nas sociedades contemporâneas, com a sua profusão luxuriante de produtos,

imagens, serviços e com a sua profunda associação ao hedonismo. De facto, uma

grande parte dos bens que hoje consumimos não são directamente proveitosos na

satisfação das necessidades básicas, e mesmo as necessidades que hoje vemos

como básicas já não têm apenas a ver com a sobrevivência e subsistência (Silva,

2002). O homem pode ser visto como um ser com necessidades, dotado de um

intenso princípio de racionalidade formal que o leva a buscar sem hesitação a

felicidade, dando preferência aos objectos que lhe trarão o máximo de satisfação.

O facto desta se revelar inatingível ou inalcançável, leva a história a repetir-se

continuamente, tornando o discurso acerca do consumo articulável, na sequência

mitológica de um conto (Baudrillard, 1995).

A lógica da diferenciação induz à desvalorização e criação de novos sinais

e práticas, assim que se verifica a vulgarização dos anteriores (Silva, 2002).

Assim, a sociedade centrada na expansão das necessidades é antes de tudo o

que reordena a produção e o consumo de massa sob a lei da obsolência, da

sedução e da diversificação, a que faz verter o económico na órbita da forma

moda (Lipovetsky, 1989:213). A circulação, compra, venda, apropriação de bens e

de objectos diferenciados, são hoje a linguagem e o código por intermédio dos

quais toda a sociedade comunica (Baudrillard, 1995). Isto é afirmar, tal como nos

indica Silva (2002: 133), que consumir é manipular signos, é usar objectos como

significantes que exprimem certos significados, lidos segundo um código de

valores e relações que conota estatutos sociais. Esta explosão da moda, que alicia

ao consumo e pela sua aquiescência leva a uma nova forma de expressão, faz

com que a mesma deixe de ter epicentro e de representar o privilégio de alguns –

todos passam a ser arrastados pela embriaguez da mudança e dos entusiasmos,

todos passam a estar submetidos ao seu reino. A sua mensagem é geral e dirige-

se a uma massa profundamente heterogénea, diferenciada pelas condições de

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Desenvolvimento do Problema

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acesso e utilização dos recursos tanto económicos como sociais e culturais

(Lipovetsky, 1989; Silva, 2002).

Discurso de moda é publicidade, que se alimenta do efeito de choque e das

mini-transgressões ou da teatralidade espectacular (Lipovetsky, 1989) e se define

como poderoso agente de socialização, produtor e difusor de modelos de conduta,

símbolos de identificação e princípios de acção propostos para o nosso mundo

quotidiano (Silva, 2002). Esta produz necessidades estritamente adaptadas à

oferta, permite programar o mercado, armadilhar a liberdade dos consumidores

planificando globalmente a própria procura (Lipovetsky, 1989: 257). Segundo Silva

(2002), a sua vertente mediática torna-se no grande difusor da ideologia

consumista (p.137), cuja importância dos efeitos de socialização não cessa de

crescer, modelando grande parte dos grupos de referência das populações,

sustentando, rentabilizando e recriando a aspiração à realização pessoal, ao estilo

de vida e à expressão própria.

A massificação do consumo não está, como vimos anteriormente, apenas

associada às necessidades do escoamento comercial da produção e às melhorias

dos rendimentos familiares, mas também à diminuição média do tempo de

trabalho e à conquista de um tempo individual e livre de obrigações. Para

Baudrillard (1995), este tende cada vez mais a ser directa ou indirectamente

comprado para ser consumido e assim pode ser visto como o consumo do tempo

improdutivo, que representa mais do que o simples gozo do período livre, que a

satisfação pessoal ou o repouso funcional. Relembremos umas das descrições de

Lipovetsky (1994) anteriormente citadas, para evidenciar que há agora lugar uma

era na qual é necessária a “paixão da mudança”, o gosto pela iniciativa, pelo risco

e pelas experimentações ultra-rápidas (p.142). O fenómeno da experiência, que é

um dos mais enfatizados no período pós-moderno, leva a indústria do lazer a criar

a sua própria identidade e a publicitar os seus produtos em termos de experiência

prometida, autêntica, original, extrema, intensiva e profunda (Jirásek, 2007). Com

efeito, o interesse sobre a experiência do consumo é crescente e tornam-se cada

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Desenvolvimento do Problema

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vez mais frequentes os discursos feitos sobre o consumo da experiência

(Hopkinson e Pujari, 1999).

A reposta à necessidade de experiências, também para usufruto e

ocupação do “tempo livre”, sempre foi em parte mitigada pela oferta desportiva,

cumpridora de uma função importante nesse contexto. Segundo Hopkinson e

Pujari (1999), a participação em actividades desportivas não pode deixar de ser

vista como uma forma de consumo – hedonista – que envolve o mercantilismo de

produtos e sempre ao serviço do consumidor. Neste contexto, será importante

atender à opinião de Heinemann (1994), que nos explica brevemente de que

forma a actividade desportiva se destaca cada vez mais como um objecto

económico atractivo no mercado de bens. Para este autor, são hoje apresentados

como produtos: a própria prática desportiva – cada vez mais associada à venda de

saúde, corpos estetizados e bem-estar; as roupas e os equipamentos desportivos,

que hoje são mais do que simples acessórios de prática, mas instrumentos de

auto-apresentação e distinção; o desporto espectáculo – consumido pelos

espectadores que procuram distracção e ao qual se associam cada vez mais as

marcas e outros serviços; e as infra-estruturas desportivas – às quais se associam

também toda uma outra vasta gama de ofertas comerciais.

Seguindo esta linha de pensamento e extrapolando a sua estruturação para

o nosso objecto de estudo, podemos encontrar evidências semelhantes no que

respeita ao “consumo hedonista das actividades de risco” (Shoham e Rose, 2000).

Os novos desportos crescem dentro da civilização do ócio, sendo

incessantemente incorporados pela sociedade de consumo (Miranda et al., 1995)

e levando autores como Betrán e Betrán (1995a) ou Holyfield (1999), entre outros,

a referir-se frequentemente ao praticante das actividades de Ar Livre como

consumidor – relevância dada à importância crescente da resposta empresarial

aos desejos da população, que permite a “compra e venda de emoções”.

Como nos explica Pires (1990), as necessidades criadas pelas campanhas

que visam o consumo, bem como a necessidade de novas formas de preencher o

tempo livre evidenciada pelo consumidor, resultam na crescente procura das

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Desenvolvimento do Problema

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AFAN como mais um produto a ser consumido – uma nova forma de consumo da

natureza (Chao, 2004). Para Betrán e Betrán (1999), é uma importante rede

empresarial que gere actualmente as AFAN, dando resposta à crescente demanda

de um grupo de usuários e apostando fortemente na prestação de serviço a esse

vasto leque da população. Segundo os autores, o marketing empresarial desta

indústria em franco crescimento, baseia-se no simples conceito de que quem

estiver disposto a pagar, pode viver de forma imediata uma aventura única, que

proporcionará intensas emoções, sem necessidades de aprendizagens prévias e

com toda a segurança possível: é a aventura como serviço que se situa ao

alcance de quase todos os cidadãos.

Actualmente, basta que passemos alguns minutos on-line, para que com

facilidade encontremos um vasto número de empresas, que oferecem as mais

variadas actividades nesta área do desporto aventura. São os profissionais, para

quem a persecução das actividades em tempos consideradas marginais, se

metamorfoseou em algo que pode ser fornecido a outros, todos os dias, mediante

pagamento (Varley, 2006). Na perspectiva de Shoham e Rose (2000), da

participação nas actividades aqui em foco, podem advir para o consumidor

benefícios como satisfação da curiosidade, excitação e incremento de estatuto

social. A este último ponto, podemos argumentar, associa-se a importância da

imagem do praticante que pode ser profundamente manipulada pelas formas de

publicidade e apresentações via meios de comunicação social.

De facto, segundo Betrán e Betrán (1995a), os meios de comunicação

social fazem eco da popularidade que assumem estas práticas. Estes terão

inclusive, segundo Branco (2002), ganho a batalha da denominação aos teóricos e

estudiosos da sua essência, baptizando-as de “desportos radicais” e dotando-as

de uma carga de profunda irreverência, loucura e adrenalina. Como nos explica

Lipovetsky (1983), nesta sociedade de consumo inseparável da profusão das

informações, consomem-se em altas doses e por flashes, as actualidades, os

mediatismos, as informações, as músicas, os conselhos, as confissões e os

filmes, numa hipertrofia, numa aceleração da mensagem e da comunicação, que

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Desenvolvimento do Problema

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ao mesmo título que a abundância de mercadorias são parte integrante da nossa

sociedade. As comunicações de massa não nos fornecem a realidade, mas a

vertigem da realidade ou uma realidade sem vertigem (Baudrillard, 1995), facto

bem nos evidente Extreme Sports, pois todos vêm TV, reportagens, webpages

que os satisfazem com imagens extremas e “fixes”, com o uso de linguagens

próprias, das roupas certas ou com este ou aquele suplemento, mas nos quais o

verdadeiro chamamento do desafio e a autêntica experiência da actividade não

representam um propriedade de todos (Jirásek, 2007). Assim, o conhecimento

sobre os hábitos do consumo associados ao desporto tem implicações no

marketing dos produtos e serviços a ele associados, bem como no uso da sua

imagem para a promoção de outros produtos (Hopkinson e Pujari, 1999).

Adicionalmente a intensidade de pertencer a uma cultura de extremidade é

repetidamente amplificada pelos media que, ao associar os seus produtos à

imagem dos Extreme Sports, sugerem aos consumidores que os mesmos são

idealizados para quem não conhece o impossível (Palmer, 2002). É um novo estilo

que se legitima: aventureiro, radical, marca de uma geração, de um grupo distinto

de pessoas, que se identificam pela “vestimenta” de uma nova identidade (Chao,

2004).

Na resposta ao crescimento dos adeptos do extremo, foi possível observar

o inevitável desabrochar de uma indústria notável de meios de comunicação,

dedicada à promoção dos importantes equipamentos especializados e parafernália

associada aos desportos aventura (Palmer, 2002). Paralelamente, criaram-se,

sofisticaram-se e aperfeiçoaram-se artefactos e materiais, fruto da avalanche de

novas tecnologias, que permitem a melhoria de performance, bem como a estética

da prática (Bétran e Betrán, 1995a e 1999), sustendo a proliferação de uma “moda

ecológica” (Chao, 2004). São luvas, óculos de sol, capacetes, t-shirts, sandálias,

equipamento de protecção, bicicletas, ou até cera para pranchas de surf, à venda

e ao discernimento do “comprador extremo” (Palmer, 2002). Guzmán (2002) vai

ainda mais longe, ao afirmar que são os fabricantes e vendedores os verdadeiros

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Desenvolvimento do Problema

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impulsionadores destas modalidades, recorrendo à magnífica visibilidade

publicitária para promover a sua evolução e desenvolvimento.

Embora importante na perspectiva do desenvolvimento e promoção, a

publicitação pode conduzir a desmistificações imprudentes. Segundo Betrán e

Betrán (1999), os acidentes mortais frequentemente postos em foco pelos meios

de comunicação social – que podem pôr em causa a idoneidade destas

actividades e suscitar a eterna discussão sobre a regulação empresarial – são os

fundamentais preços a pagar para garantir o selo de autenticidade imprescindível

ao status das actividades de aventura e risco. Mas, como afirma Palmer (2002),

todo o grande desastre ocorrido no contexto destas práticas poderá, se publicitado

correctamente, ser vendido para lucro, criando produtos que ajudam a embelezar

e construir o discurso da extremidade, pela conversão da luta pela sobrevivência

na imagem do “extreme action hero”, que luta contra os elementos e emerge da

adversidade para se tornar uma classe heróica e à parte.

Segundo Baudrillard (1995), pode agora ser encontrado em toda a parte,

lazer e férias incluídos, o mesmo encarniçamento moral e idealista de realização,

presente na esfera do trabalho. Segundo o autor, tal como o consumo, também o

lazer não é praxis de satisfação, mas só aparentemente assim se manifesta, pois

a obsessão pelo bronzeado, a mobilidade exacerbada, a ginástica da nudez

debaixo do sol obrigatório e o sorriso de viver sem desfalecimento, são

testemunhas da consignação total ao princípio de dever e sacrifício. Como vimos

anteriormente, a par da abundância de produtos e serviços, são características da

nossa sociedade actual a massificação da comunicação e a disponibilização de

informação. Este constante input de informação e bombardeamento dos estímulos

com novas necessidades, fazem com que, segundo Lipovetsky (1989), a realidade

de cada indivíduo se torne insuportável, condenando à necessidade cíclica de

partir – não importa para onde, desde que seja possível sair do lugar onde se está.

Esta ânsia pela novidade – a par do consumo, característica da nossa sociedade –

permite que a partir das práticas aqui em causa, seja possível corresponder à

lógica economicista e à lógica de auto-expressão pelas quais os indivíduos se

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Desenvolvimento do Problema

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parecem guiar, facto que torna, no mínimo, natural, que as novas formas de

turismo se associem também a estas actividades (Pereira e Félix, 2002).

Adicionar o rótulo “aventura” ao termo “férias” parece conferir um brilho

publicitário moderno ao produto (Varley, 2006) e a escolha de destinos, que

praticamente por si só asseguram o seu êxito – nos quais a natureza é o

denominador comum –, torna espontâneo que as novas formas de turismo incluam

actividades vinculadas à natureza e cultura, das quais derivam denominações

como Turismo de Natureza, Turismo Verde, Turismo Rural, Eco-Turismo, Turismo

de Cultura, Turismo de Aventura (Pereira e Félix, 2002; Marinho, 2004).

Na realidade, o turismo assume actualmente, segundo Félix (2002), uma

dimensão mundial de crescente importância, ao potenciar o desenvolvimento

cultural, ao permitir o contacto entre diferentes expressões culturais e ao afirmar-

se como uma das principais actividades económicas. Segundo a Organização

Mundial de Turismo, este é visto como a deslocação, de duração nunca superior a

um ano, de indivíduos a lugares diferentes da sua residência habitual, com o

propósito de férias, negócios ou qualquer outro que não o cumprimento de uma

actividade remunerada no local visitado (CTP, 2005). Convém, no entanto,

destacar que o turista moderno deseja fazer parte da acção, provar, vivênciar e

experimentar (Pereira e Félix, 2002) dando, com esta tendência, procedência à

ideia de Turismo Activo – que deve ser visto como uma peça na engrenagem do

que constitui a oferta turística de determinada região (Martín e Encinas, 2005) –,

conceito associado, também, à relação de desenvolvimento positiva que se

estabelece entre o desporto e as actividades turísticas (Fernández, 2002; Macaya,

2004) –, que origina o conceito de Turismo Desportivo (Standeven e De Knop,

1999; Gibson, 2003), passível de conceder frutos importantes ao beneficiar a

sociedade geral pelo estabelecimento de novos hábitos de prática física (Sallent,

1991).

Aparentemente, afastando-se dos tradicionais destinos seguros, como as

capitais europeias ocidentais, uma nova estirpe de viajantes opta agora pelo

turismo nos centros aventura, pagando a operadores comerciais por experiências,

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Desenvolvimento do Problema

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permitindo às industrias das áreas selvagens entender que os turistas são uma

lucrativa fonte de rendimento e tornando o domínio da viagem de aventura num

fenómeno extraordinário (Palmer, 2002). Este tipo de localizações pode satisfazer

o desejo dos turistas de novidade, assédio ou estimulação, de uma forma

usualmente impossível nas suas rotinas e perto das suas casas (Morgan et al.,

2005), definindo o Turismo Aventura como um mercado potencial – “o creme do

bolo” na montra da pastelaria ou agência de viagens –, que não só funciona como

um produto em si, mas também aumenta o leque de sectores de consumo,

afigurando novas formas do indivíduo gastar o seu dinheiro (Morais, 2003). Os

turistas tendem a ter elevadas expectativas do que devem receber – dado o facto

do acto de partir para longe ser um evento embebido de particular significado – e

assim esperam o extraordinário, sendo potencialmente muito críticos por tudo o

que possa minar a concretização dessa expectativa. Estes serviços

extraordinários não podem, obviamente, ser oferecidos em qualquer local, o que

faz mesmo com que parte do consumido seja a própria localização desse acto

(Urry, 2002). Desta forma, apesar de, ou por causa da relativa inexperiência dos

turistas que participam nestes tipos de actividades – atacados activa e

agressivamente pela indústria como um novo público-alvo –, os seus comerciantes

publicitam-nas inteiramente seguras, mistificando-as como “high thrill, low risk”

(Palmer, 2002) e ao alcance de todos.

Apesar da relativa novidade deste fenómeno, segundo Correia (1997),

evoluímos nos últimos anos de uma situação de escassez de oferta para uma

situação onde o próprio cliente da aventura se define como um recurso escasso,

face à crescente oferta empresarial – o que permite entender o forte

desenvolvimento da indústria. Nesta óptica, considerando o leque de actividades

que a população tem à sua disposição e sabendo que o cliente comprará

unicamente os serviços que forneçam satisfação às suas necessidades e

aspirações, devemos assumir, como explica o autor, que as organizações

encaram os clientes como o seu bem mais precioso – objectivando assim, a oferta

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Desenvolvimento do Problema

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de melhores produtos e serviços do que os providenciados por outras

organizações ou indivíduos.

Segundo Pires (1990), muitas vezes as pessoas aderem,

indiscriminadamente, a práticas desportivas de forma anárquica e anarquizante,

dada essa aquiescência não corresponder a uma necessidade ou desejo adquirido

e cultivado ao longo da vida, mas pela carência de afirmação pessoal e social,

assim suprimidas pela aceitação e pertença a uma moda. A relação que se vai

criando, entre a propagação das AFEN e a sua integração nos serviços de

turismo, é crescente e cada vez mais notória, muito pela evidente e quase perfeita

integração de ambas na nossa sociedade de consumo (Pereira e Félix, 2002). As

actividades físicas no meio natural oferecem respostas lúdicas às necessidades

de experiência da população, por intermédio de agências e empresas (Miranda et

al., 1995), estabelecendo-se assim como uma forma de “compra e venda” de

aventuras, fugas, emoções e sensações (Palmer, 2002). Passar as férias ou os

tempos de lazer em espaços naturais, quanto mais belos e selvagens melhor,

tornou-se, mais do que uma moda, um verdadeiro hábito da nossa sociedade

(Melo, 2003: 13). Negar as regras da vida, recorrer ao espaço físico para negar o

tempo, vivênciar a excepção e poder explicá-la, são o substrato antropológico da

aventura, frequentemente associada à viagem e cujas incerteza do trajecto,

exaltação do desconhecido, implicação corporal com inevitável compromisso

emocional e presença de risco real se tornam elementos imprescindíveis a uma

oferta turística de produtos aventura (Betrán e Betrán, 1999). No entanto, a

aventura desportiva e a prática de desportos em ambientes naturais podem

transformar-se em mais uma das ”taras” da sociedade industrial, que pela loucura

do lucro e do dinheiro pode metamorfoseá-las em novas formas de alienação, por

oposição a formas de realização pessoal (Pires, 1990).

Nesta óptica comercial e mercantil, como referem Pereira e Félix (2002),

torna-se usual que um santuário como a natureza – perspectivada por locais mais

ou menos exuberantes, escolhidos com o objectivo de proporcionar aos clientes

uma atmosfera rica em todos os sentidos – seja invadido por uma série de infra-

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Desenvolvimento do Problema

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estruturas e instalações das quais são exemplos: os espaços destinados a receber

os entusiastas, lojas de objectos promocionais (Holyfield, 1999), as estâncias e

parques aventura (Dougherty, 2007), e aos quais podemos adicionar – já fora do

cenário natural mas também relacionadas com o consumo – as lojas

especializadas em produtos técnicos e algumas arenas desportivas. Assim, pela

loucura do lucro e para a satisfação das nossas necessidades de consumo,

incorremos no risco de transformar a natureza num simples recurso para utilizar

hoje ou no futuro (Mendonça, 1996). Muito embora não seja imprudente afirmar

que alguns praticantes e aficionados procuram a natureza e as suas práticas de

forma independente da rede empresarial que as parece gerir, mesmo estes

acabam por cair na teia da mercantilização, ao dependerem de materiais e

equipamentos comercializados e ao coexistirem com o magnífico desdobramento

publicitário que acompanha as suas disciplinas – factos que levam Guzmán (2002)

a destacar os fabricantes e vendedores como os verdadeiros impulsionadores

destas modalidades.

São actividades e aventuras, férias e viagens, estâncias e parques, lojas

especializadas, objectos, vestuários e equipamentos, modas, empresas e

profissionais, programas televisivos e canais temáticos, revistas, publicações

periódicas e websites que definem as Actividades Aventura – actividades ao

alcance das massas e profundamente rentáveis – como produto de consumo

(Betrán e Betrán, 1995a; Feixa, 2002; Chao, 2004; Varley, 2006; Jirásek, 2007),

naquela que poderá ser considerada a dimensão de Mercantilização da Aventura.

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Desenvolvimento do Problema

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2.2.3 Problemática Ambiental: do meio e da educação

A conservação do ambiente e o respeito

pela natureza, configuram nos nossos

dias uma problemática à escala planetária

(…)

(Pereira e Monteiro, 1995: 115)

Segundo Serres (1990), parece ser verdade que partilhamos com a Terra o

mesmo destino temporal, e que porque a possuímos ela possuir-nos-á novamente

– como outrora, quando submetidos aos constrangimentos naturais –, mas desta

vez de forma global. De facto, podemos afirmar que nas culturas tradicionais e

mesmo na sociedade industrial até ao início desta época, os seres humanos

tinham de se preocupar com riscos originados pela natureza exterior, como

inundações ou pragas, mas que a certa altura, recentemente em termos históricos,

a preocupação passou a ser menos com o que a natureza nos pode fazer e mais

com aquilo que nós fizemos à natureza (Giddens, 2000). Como refere Silva

(2002), a degradação ambiental é no mundo de hoje um problema global – tanto

em amplitude de incidência como de impacto – e, assim, é todo um ecossistema –

mundial – que por ser contínuo e interligado se encontra em risco de destruição.

Nesta mesma sociedade é claramente observável, como anteriormente

analisámos, o aumento da exigência de actividades desportivas no meio natural –

estas vistas por alguns autores como potenciais formas de aceleração da

destruição de habitats ainda preservados (Pereira e Monteiro, 1995; Pires e

Philippi, 2004) –, cuja potencial contribuição para o despertar de uma sensibilidade

e responsabilidade ambiental, colectiva ou individual, não pode ser negada

(Marinho, 2004).

Importa pois entender a dimensão dos problemas ambientais na sociedade

e a sua interacção com o nosso objecto de estudo, analisando a configuração de

uma educação reflectida, que pode contribuir para a intervenção positiva em

ambos: este é propósito do presente capítulo.

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Desenvolvimento do Problema

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Para Beck (2000), as sociedades industriais tardias transitam – como parte

do processo de modernização reflexiva – para sociedades de risco, este cada vez

mais difícil de calcular e controlar, dada a sua capacidade de ultrapassar barreiras

políticas e sócio-económicas por acção do fenómeno de globalização. Para o

autor – que tal como Giddens (2000, 2002) entende os riscos da nossa sociedade

numa perspectiva vasta e estrutural, com tendência para a generalidade abstracta

e esquecendo por vezes o indivíduo concreto –, o conceito de modernização

reflexiva compreende a análise dos resultados da modernidade em termos da sua

produção de riscos – por vezes sinónimos de perigo ou desastre, por vezes

interpretados como constructo socialmente definido e mediado através da lente

dos processos sociais e culturais. Na opinião de Giddens (2000), podemos fazer a

distinção entre dois tipos de riscos presentemente em evidência na sociedade: o

exterior – que nos chega de fora, das imposições da tradição ou da natureza

(p:35) – e o provocado – entendido pelo autor como resultante dos impactos do

desenvolvimento tecnológico sobre o meio ambiente.

Numa construção mais focada no contexto sócio-cultural, e assim

atendendo de forma muito mais evidente ao indivíduo enquanto ser situado,

Douglas e Wildavsky (1982) referem-se à percepção do risco como uma

simulação colectiva que varia consideravelmente ao longo de três formas de

organização social – individualista, hierárquica e igualitária –, o que nos leva a

concluir que a selecção dos riscos a que o público dá atenção, é mais baseada na

voz que processa a informação e no modo como esta é interpretada, do que nas

provas científicas de fortes probabilidades de perigo. Assim, segundo Douglas

(1999), embora longe de ser a primeira civilização a tomar consciência de que o

nosso ambiente se encontra em risco, a percepção e forma como entendemos a

premência da questão é hoje profundamente distinta.

A nossa compreensão dos problemas ambientais é uma construção social,

estabelecida num conceito de ambiente muito fluente, culturalmente baseado e

socialmente contestado (Hannigan, 1995). Assim, somos impelidos a aceitar a

suposição de as formas contemporâneas de degradação serem fruto de

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Desenvolvimento do Problema

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interacções entre as causas demográficas, culturais, políticas e económicas

(Goldblatt, 1996; Silva, 2002), e de se definirem como o problema – de todos os

enfrentados pelo humanidade – mais intrinsecamente transnacional, cujo enfrentar

poderá dar origem a um conflito global ou a uma plataforma de solidariedade

internacional e intergeracional (Sousa Santos, 2002).

Não obstante a degradação ambiental se verificar desde há muito tempo,

só muito recentemente tomou proporções alarmantes – pela urbanização

acelerada, a rápida expansão económica e a utilização irreflectida de novas

técnicas de produção e produtos (Martins, 1990). Segundo Bachelet (1995), o

verdadeiro produto da evolução da humanidade – da qual são factores

constitutivos os poderes científicos e tecnológicos, os modos de vida a eles

associados e as consequências da demografia – é a acumulação dos meios de

destruição pacífica do planeta. Segundo o autor, o homem é um ser poluidor, ou

no mínimo um predador, a tal ponto que a sua própria existência significa poluir e

consumir recursos, fazendo com que, do equilíbrio que tem vindo a ser

assegurado, já nada reste para partilhar, exceptuando aquilo que se adquiriu. Fica

assim exacerbada a dimensão do consumo sob a qual a sociedade se parece

reger, já anteriormente analisada, mas agora entendida sob a perspectiva de

imposição de grandes impactos ambientais. Com efeito, como refere Silva (2002:

54-55), actualmente, o ambiente tanto é ameaçado pela produção industrial

maciça (…), como pelos grandes projectos tecnológicos de colonização da

natureza (…) pela generalização de bens de consumo e hábitos poluidores (…)

pela pressão das populações em crescimento acelerado sobre os bens naturais

disponíveis (…), pelo endividamento brutal dos países pobres e a sua

vulnerabilidade às estratégias de deslocalização e exportação das fábricas

poluidoras. Parece então ser uma verdade que, como afirmam Leite e Caetano

(2004), ao desenvolver actividades baseadas em relações predatórias com a

natureza, o homem criou problemas que ameaçam a própria preservação da

espécie, e seguramente o é que o mundo em que agora vivemos parece – em vez

de a cada passo mais dominado por nós – completamente descontrolado

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Desenvolvimento do Problema

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(Giddens, 2000). Como afirma Serres (1990): à força de a dominar, tornámo-nos

tanto e tão pouco senhores da Terra, que ela ameaça dominar-nos de novo (p:

59).

Entre os problemas ambientais que nos são contemporâneos podemos

destacar e referir: a deterioração da camada de ozono, o efeito estufa e a

crescente poluição atmosférica – frutos das emissões maciças de

clorofluorcarbonetos e dióxido de carbono para a atmosfera –, factos ao qual se

relaciona o aquecimento global e agravados pela desflorestação intensiva,

frequentemente observada pela necessidade alimentar da população em

crescimento exponencial e pela necessidade de exportação de matérias-primas; a

directa poluição dos solos e a sua deterioração pelo usufruto desordenado, que

degradam a terra e assim as condições e possibilidades de cultivo, bem como a

biodiversidade das espécies; a extinção de variadíssimas espécies pela sua caça,

extracção excessiva ou exploração abusiva; a poluição dos oceanos pelo

incontrolado despejo de substâncias nocivas nas águas via efluente industrial,

esgoto urbano e desperdício agrícola – legal, ilegal ou acidental; o abuso de

substâncias como hormonas de crescimento, pesticidas, corantes e químicos na

industrialização da agricultura; os excessos de detritos e desperdícios, lixos

domésticos, hospitalares e industriais, resíduos nucleares e afins; as alterações

climatéricas – hipotéticos frutos dos problemas até agora referidos – que impõem

grandes estragos e fortes limitações no nosso habitat terrestre; entre muitos outros

(Martins, 1990; Figueiredo, 1993; Hannigan, 1995; Giddens, 2000; Silva, 2002;

Sousa Santos, 2002).

Os anteriormente descritos podem ser vistos como as grandes

problemáticas associadas à degradação dos solos e dos oceanos, contaminação

das águas e poluição do ar – necessários imediatos à nossa existência e

sobrevivência no planeta (Leite e Caetano, 2004). No entanto, como refere Silva

(2002), a degradação ambiental não deve ser entendida unicamente na

perspectiva dos problemas e das ameaças ao futuro comum da humanidade,

sendo a mesma representativa de um motivo de agitação, mobilização colectiva e

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Desenvolvimento do Problema

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tema fundamental de debate na sociedade contemporânea. De facto, como nos

refere Hannigan (1995), embora o desenvolvimento do consumismo global tenha

profundas implicações negativas no ambiente e seja, em parte, um produtor ou

facto associado à produção dos riscos aqui em foco, paradoxalmente, acaba por

tornar a protecção da natureza numa actividade de consumo que é culturalmente

formulada. Segundo o autor, o risco e o conhecimento dos problemas que

perturbam o ambiente acabam por ser parte fulcral dos temas da actualidade,

representando tópicos de discussão e preocupação, de certa forma globais. Em

toda esta conjectura, importa atender, no entanto, a uma suposição fundamental.

Como nos lembra Bachelet (1995), o consumo leva à produção – geradora de

poluição e desperdício – baseada em níveis de dispêndio energético que tornam

insustentável, muito pelas supérfluas fontes de despoluição que nos são

conhecidas, a sua perpetuidade. Segundo o autor, por agora tranquilizamo-nos,

segundo a fórmula: isto aguenta (p. 133), e serenamos as multidões com a crença

de que aqueles que sabem estão vigilantes (idem). No entanto, devemos estar

conscientes de que, em algum ponto, o interesse daqueles que sabem poder ser

incompatível com a urgência ambiental – este é um tópico de importância

essencial, que não desenvolveremos de forma mais aprofundada, mas cuja

referência nos pareceu indispensável.

Assim, num momento em que a tomada de consciência dos problemas

relacionados com o meio-ambiente tem aumentado a um ritmo vertiginoso

(Figueiredo, 1993:11), multiplicam-se, por todo o lado, os esforços e discursos

sobre o ambiente, apoiados em movimentos e eventos de massa – factos de

grande impacto social aos quais ninguém fica indiferente, ainda que em termos de

produtividade apresentem resultados muito incipientes. Como exemplos de

acontecimentos com grande impacto, podemos referir o recente evento

“LiveEarth”, com 24 horas de espectáculos musicais, cobertura mundial e ao qual

aderiram 150 dos melhores artistas e bandas da actualidade3, ou o lançamento

3 http://www.liveearth.org

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Desenvolvimento do Problema

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perturbador documentário “Uma Verdade Inconveniente”, que valeu ao

recentemente galardoado Nobel da Paz4, Al Gore, um Óscar da Academia para o

melhor documentário de 2007.

Os problemas mais sérios com que se confronta o sistema mundial – entre

os quais podemos estabelecer a problemática ambiental – são globais, como tal,

exigem soluções globais e estas – urgentes, difíceis de imaginar e

obrigatoriamente desiguais para os diferentes países – terão de ser marcadas pela

solidariedade dos ricos para com os pobres e das gerações presentes para com

as futuras (Sousa Santos, 2002). No entanto, Brodhag (1994) questiona se será

necessária a dramatização da urgência de salvar a Terra, interrogando até que

ponto não poderá esta ser contraproducente face à imensidão da tarefa em causa

– o objectivo a alcançar é representado por um acordo entre povos, capaz de

mediar o término definitivo da perturbação dos equilíbrios dos ecossistemas dos

quais depende a vida no planeta.

Atendendo à dimensão da tarefa torna-se clara, segundo Schmidt (1999), a

necessidade de uma Educação Ambiental – conceito que analisaremos a

posteriori – que deve estender-se de coisas tão elementares como o asseio – dar

a entender como é que, num sistema complexo e global, “porcarias” de tão longe

nos estragam a vida aqui tão perto, tornando a limpeza numa questão de respeito

pelo próximo, que é agora todo o habitante do planeta –, até a assuntos tão vastos

como a compreensão dos circuitos dos problemas económicos e políticos.

Assistimos, então, ao asseverar da “causa verde” (Silva, 2002), num

momento em que, como afirma Pereira (1996), o homem tomou consciência de

que não podia continuar a tomar atitudes destruidoras, e mesmo auto-

destruidoras, e começou a reflectir sobre os problemas que foram surgindo, na

tentativa de salvaguardar o que ainda resta do ambiente natural (p:5). A origem

desta preocupação advém, segundo Raposo (1997), de um processo longínquo,

no qual se verificou a convergência da educação e do ambiente e que deu pelo

4 http://nobelprize.org/nobel_prizes/peace/laureates/2007

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Desenvolvimento do Problema

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nome de Ecologia – este termo terá surgido, em 1866, pela mão do biólogo Ernest

Haeckel (Pereira, 2004) e ter-se-á propagado até à actualidade, embora seja

compreendido com uma essência distinta da que o estabeleceu.

Segundo Bachelet (1995), desde o seu início, os movimentos ecológicos

deram mais a impressão de lutar contra algo, do que a favor de alguma coisa.

Partindo em guerra contra a poluição, e rapidamente descobrindo na economia

vigente a sua origem, estes revoltaram-se contra a economia de mercado, num

ataque confesso aos malefícios da capitalismo predador, esbanjador e hipotecador

de um futuro tão próximo que se confundia com o presente. Segundo o autor, a

ecologia surgiu, então, como uma arma susceptível de impor limites materiais ao

crescimento e de estabelecer novos valores – distintos dos do lucro e consumo –,

conduzindo a novas formas de viver, nas quais reciclagem, recuperação e

redução, passavam a entrar nos vocabulários políticos, economistas e

sociológicos.

Actualmente, tal como nos explica Garcia (1997), a Ecologia não se esgota

no ambiente ou na natureza. Na perspectiva de Bachelet (1995), a ecologia

tornou-se humana, dada a facilidade de estabelecer os saberes sobre os

elementos terrestres, como a base de uma nova ciência social que agrupasse a

quase totalidade dos conhecimentos. A ecologia rapidamente se tornou um

sistema heliocêntrico, ao definir-se como o sol em torno do qual volteia a

totalidade do saber, capaz de impor a sua gravitação a qualquer pensamento

político, social, económico ou cultural. O alargamento do movimento ecológico

trouxe consigo, segundo Martins (1990), desenvolvimentos de grande importância.

As componentes de carácter científico e de protecção da natureza desenvolveram-

se, lado a lado, sob a influência de ecologistas profissionais; começou a

generalizar-se a apreciação pelo ambiente fora das grandes potências mundiais e

a sua concepção tornou-se sobejamente mais vasta. Para o autor, este novo

movimento criou uma concepção mais ampla da relação homem-ambiente,

estabelecendo preocupações, não só com os recursos naturais, como também,

com os valores e tendências do seu uso e gestão por parte da população

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Desenvolvimento do Problema

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Atendendo ao trabalho de Hannigan (1995), a consciencialização sobre a

problemática ambiental parece associada ao “decénio ambiental” de 1970 – época

em que, na opinião de Brodhag (1994), exceptuando alguns visionários, ninguém

levantava o problema da permanência dos equilíbrios ecológicos que regem a

sobrevivência das espécies vivas em geral e da espécie humana em particular (p:

100).

Segundo Lemos (2002), a preocupação dos cientistas com o forte

crescimento populacional, com o aumento dos níveis de poluição e o esgotamento

dos recursos naturais, leva à realização da Conferência das Nações Unidas sobre

o Meio Ambiente Humano – Estocolmo, 1972 –, momento para muitos

considerado como a origem da generalização dos desassossegos com as

questões ambientais. Com base nos trabalhos de Martins (1990), Bachelet (1995),

Hannigan (1995), Lemos (2002) e Resende (2006), passamos a analisar os

principais momentos que deram continuidade a esta inquietação.

A realização da Conferência de Estocolmo introduziu, oficiosamente, a

preocupação sobre as consequências ambientais do, então tradicional, modelo de

crescimento económico, que levaria ao esgotamento dos recursos naturais dos

quais depende a sobrevivência da humanidade. Como resultado desta

conferência, foi criado o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

(PNUMA), agência à qual é imputada a responsabilidade de catalisar a acção

internacional para a protecção do meio-ambiente no contexto do Desenvolvimento

Sustentável – conceito que só mais tarde seria desenvolvido. Estudos em

progresso, que culminam com o lançamento do relatório do Clube de Roma – “Os

Limites do Crescimento” –, exprimem com clareza a premência das questões

ambientais, do crescimento da população, do acréscimo do consumo de recursos

naturais, do aumento dos níveis de poluição e do acentuar das disparidades dos

níveis de riqueza dos países.

Em 1982 – numa Sessão Especial do Conselho de Administração do

PNUMA, em Nairobi, Quénia – uma nova e importante preocupação entra em

cena: a excedência da capacidade de assimilação dos produtos de algumas

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Desenvolvimento do Problema

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actividades humanas, em determinadas zonas, por parte da biosfera. Em

resposta, no ano de 1983, o Conselho de Administração do PNUMA e a

Assembleia Geral das Nações Unidas criam a Comissão Mundial sobre o Meio

Ambiente e Desenvolvimento (CMAD), que termina, em 1987, o seu relatório de

análise – elaborado com o apoio de vários consultores internacionais e com base

na análise de vários aspectos da questão do meio ambiente versus

desenvolvimento – sob o título O Nosso Futuro Comum –, do qual se realça um

tópico particular: o conceito de Desenvolvimento Sustentável – aquele que atende

às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações

futuras atenderem às suas próprias necessidades (Lemos, 2002:13).

Embora sem oferecer planos de actuação, este relatório contribuiu para a

estruturação de linhas orientadoras de acção, no sentido de estabelecer esforços

de cooperação em busca do Desenvolvimento Sustentável, e realçou a

importância da Educação Ambiental em todos os níveis de ensino. Logo após a

sua divulgação, a Organização das Nações Unidas convocou para Junho de 1992

– data à qual eram celebrados os 20 anos da Conferência de Estocolmo – a

Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento

(CNUMAD) – que ficou conhecida como Conferência do Rio (Rio de Janeiro) – e

na qual se preparava a discussão das suas conclusões e propostas. Na

Conferência do Rio foram aprovados vários documentos, dos quais convém

destacar a Agenda 21, pela relação evidente com a Agenda 21 Local que será

discutida de forma cuidada a posteriori.

A Agenda 21 – instrumento teórico e prático para a promoção do

Desenvolvimento Sustentável – constitui um plano global de acção, adoptado em

consenso por 182 países, objectivado para as prementes problemáticas

ambientais. Sugerindo formas de preparar o mundo para os desafios futuros –

atendendo ao Desenvolvimento Sustentável e integrando o desenvolvimento

económico e social como medidas de protecção do ambiente e dos recursos

naturais –, a Agenda 21 incentiva ainda à criação de planos locais, adequados a

cada realidade.

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Desenvolvimento do Problema

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No ano de 1994 realizou-se, em Aalborg, a Conferência Europeia sobre

Cidades Sustentáveis (CECS), onde foi aprovada a Carta das Cidades Europeias

para a Sustentabilidade – composta por 3 partes, nomeadamente a Declaração

Comum das Cidades Europeias para a Sustentabilidade, a Campanha das

Cidades Europeias Sustentáveis e a participação local na Agenda 21, das quais

destacamos esta última.

Segundo Schmidt, Nave e Guerra (2006), a Agenda 21 Local: é um

processo participativo e multisectorial à escala autárquica, que traduz um

programa de acção pluridimensional e requer a participação activa dos cidadãos

nas decisões. Potencia, assim, a proximidade dos governantes e dos cidadãos; é

um instrumento que contribui para o usufruto racional dos recursos, cuja

implementação fica obviamente dependente de uma escala local e cujas medidas

objectivam também as necessidades das gerações vindouras; deve ser um

elemento flexível, cooperante, participativo, pedagógico e dinâmico, cujo alcance

temático vá, obrigatoriamente, muito para além do âmbito estritamente ambiental

dos Planos Municipais do Ambiente; deve envolver empresas, serviços públicos,

instituições educativas, religiosas, científicas, associações, sindicatos, grupos de

interesse e cidadãos; almeja a um Plano de Acção – documento dinâmico de

planeamento que integra diagnóstico, objectivos, estratégias e instrumentos de

acção e monitorização.

Terminando esta análise, resta destacar ainda a realização, em 1996 e

2000, das segunda e terceira Conferências Europeias sobre Cidades Sustentáveis

– em Lisboa e Hannover respectivamente; a realização da Cimeira Mundial do

Desenvolvimento Sustentável – Joanesburgo, 2002; e a conferência de título

Inspirando o Futuro – Aalborg + 10, no ano de 2004, pela necessidade de

consolidar os compromissos estabelecidos 10 anos antes, na conferência

realizada no mesmo local.

Parece então possível asseverar o que foi anteriormente afirmado, isto é,

que parece estar em marcha todo um movimento global, que visa e objectiva a

defesa do ambiente, mesmo atendendo ao facto de esta não ter, nem poder vir a

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Desenvolvimento do Problema

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ter, o mesmo valor em toda a parte – a própria noção de Desenvolvimento

Sustentável tenderá a sofrer muitas adaptações em função das culturas e

tradições, elas próprias associadas às capacidades científicas e técnico-

financeiras que regem os diferentes custos ecológicos (Bachelet, 1995).

Conforme a pesquisa até agora efectuada, podemos afirmar que a

protecção ecológica pressupõe que os países preservem os seus rios e

montanhas, que organizem o seu desenvolvimento de forma sustentável, mas

também que, através da educação, preparem as gerações futuras para essa

mesma protecção (Tavares, 2002). Para que todo o esforço dispendido seja

viável, parece ser necessário investir numa educação a todos os níveis, para que

os indivíduos se possam sentir solidários e co-responsáveis nesta grande missão

de evitar a degradação definitiva das condições existências do nosso planeta

(Lemos, 2002). Nesta lógica, surge o conceito de Educação Ambiental (E.A.), que

se relaciona com a necessidade de expansão de consciências e valores, dada a

urgência de “cuidar” do ambiente global (Schmidt, 1999; Pereira e Monteiro, 1995;

Chao, 2004).

Para Giordan e Souchon (1997), a Educação Ambiental é uma forma

educativa que aborda temas relativos aos problemas do ambiente, dizendo

também respeito às dificuldades da utilização e gestão dos recursos. Segundo os

autores, a E.A. esforça-se por despertar a consciência ecológica, económica,

social e política, as aptidões para resolver os problemas e a responsabilidade

individual (p.12), a fim de preparar os estudantes para a acção responsável e para

a tomada de decisões que respeitam aos actuais e futuros problemas do

ambiente. No entanto, no âmbito da E.A., deparamo-nos com uma grave

problemática. Como salienta Fernandes (1997), todas as acções de informação ou

sensibilização sobre a defesa do ambiente e da natureza têm sido apelidadas de

Educação Ambiental, reflectindo, inúmeras vezes, o desconhecimento de quem as

qualifica acerca das verdadeiras metodologias e conceitos da E.A. Segundo o

autor, são a moda, oportunismo ou mesmo a total convicção dos seus autores,

que transformam os projectos em tentativas de “enverdecimento” das

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Desenvolvimento do Problema

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preocupações (…) processos de propaganda (…) ou “bandeiras de qualidade” (p.

3), tornando a história da E.A numa sucessão de êxitos e fracassos, nos quais,

embora predomine a boa-vontade, fica patente a falta de um instrumento

pedagógico capaz de formar e informar os educadores disponíveis e empenhados.

A E.A. não mais se pretende no formato de workshops vazios de conteúdos, que

fuja aos problemas quotidianos; é uma educação que almeja uma melhor

qualidade de vida, num espaço/tempo em que possamos ser críticos, sonhadores

e assumir os direitos e os deveres para com esta luta; é o despertar de uma

sensibilidade e de uma responsabilidade ambiental colectiva, que alerte para a

necessidade de políticas locais e globais (Marinho, 2004).

Chao (2004) leva-nos a crer que esta educação que pretendemos implica

um trabalho interdisciplinar e conjunto de diversas áreas de experiência e,

segundo Raposo (1997) e Giordan e Souchon (1997), o seu processo deve

almejar objectivos como a sensibilização (tomada de consciência), compreensão

(aquisição de conhecimentos), aplicação (aquisição de atitudes e

comportamentos), execução (desenvolvimento de competências) e capacidade de

avaliação (espírito crítico) para a participação, intervenção e acção responsável

em relação às questões ambientais. As iniciativas de E. A. já partem de diversas

fundações, entidades, universidades, autarquias e associações ambientalistas,

que nos últimos anos levaram a cabo projectos, programas e investigações,

estabelecidos na interacção entre as ciências do ambiente, as didácticas e as

questões sociais, mas cuja penetração se mantém globalmente lenta e com

resultados pouco satisfatórios. Os projectos em causa têm em comum a

contribuição activa para a formação, informação e participação do público mais

jovem, que embora sensibilizado para as questões ambientais, demonstra ainda

que a aquisição de modos específicos de raciocínio se encontra ainda numa fase

balbuciante e que o domínio dos principais conceitos – ordenamento, recursos e

desenvolvimento sustentável – não se encontra ainda assegurado (Giordan, 1996;

Raposo, 1997; Schmidt, 1999).

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Desenvolvimento do Problema

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Baseada na profunda nascente de sentimentos culturais, que encorajam

uma acção positiva em relação a questões de protecção, preservação, educação e

celebração do natural, é visível uma nítida aproximação dos indivíduos à natureza

(Hannigan, 1995) – face à qual, segundo Brodhag (1994), são perceptíveis

diferentes atitudes na nossa sociedade. Se, por um lado, a visão antropocêntrica

define a centralidade do ser humano sobre tudo, por outro, a ecologia inverte o

centro gravitacional do sistema, definindo que o Homem gira em torno do mundo

natural. Na opinião do autor, o contemporaneamente desejável seria um novo

humanismo de cooperação, onde a Natureza fosse vista, não como objecto ou

sujeito, mas como condição de existência. No entanto, segundo Giddens (2000), a

nossa sociedade vive para lá do fim da natureza (p:36), o que obviamente procura

referir o facto de agora existirem poucos aspectos do ambiente material que nos

rodeia que não tenham sido afectados pela intervenção humana (idem).

Aparentemente, podemos considerar que, desde que o ser humano começou a

empregar a mais simples das tecnologias, a relação com a natureza se

estabeleceu como – até certo ponto – mediada, sendo até pouco provável que

qualquer local do planeta possa ser mostrado como inteiramente livre da sua

influência (Dougherty, 2007). Aquilo que, em tempos, permanecia imperturbado e

independente das criações da humanidade, é agora visto como completamente

transfigurado pela acção humana (Giddens, 2002). Da perspectiva de Natureza

Divinizada – na qual não se interpunham ainda os véus da vida civilizada – à de

Natureza Reivindicadora – na qual a existência do ser humano é posta em causa

pela submissão à sua brutal vontade –, passando pela ideia de Natureza

Explorada – na qual o homem se investe no papel de conquistador insaciável –, a

hominização criou urgências pelos efeitos nefastos da sua actividade (Bachelet,

1995). No entanto, independentemente da essência do actual conceito de

natureza, podemos afirmar que a vida ao ar livre é hoje uma necessidade do

homem moderno, que lhe propicia o reencontro consigo próprio (Costa e Correas,

2005), que permite a percepção do ambiente numa outra perspectiva e adjuva a

reflexão sobre o próprio viver (Chao, 2004). Assim, entra em cena o nosso objecto

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Desenvolvimento do Problema

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de estudo, quando, aparentemente, na ânsia de procurar o que resta da natureza

– com o intuito de ocupar o tempo livre, procurar novas sensações, escapar à

rotina, reencontrar o tradicional e as emoções perdidas no espaço controlado

urbano – o Homem encontrou nos “novos desportos” uma forma de realização e

reencontro com o ambiente natural (Pereira e Monteiro, 1995; Garcia, 1997; Rico,

2002).

Embora a ideia ecológica de aproximação do Homem à natureza seja algo

ingénua – uma vez que o ser humano sempre se preocupou em se afastar dela,

enquanto algo exterior a si –, a nova relação que com ela se pretende é uma

relação de coexistência pacífica (Garcia, 1997) –, queremos desfrutar da sua

existência e devemos, para tal, respeitá-la, a todo o momento, mesmo quando a

não experimentamos. Esta “reconciliação”, no entanto, nem sempre tem sido a

mais benéfica para o meio ambiente, cujo equilíbrio é, por vezes, extremamente

frágil (Pereira e Monteiro, 1995:115). Queremos, assim, abordar a ideia por muitos

defendida, de que as actividades de aventura – encaradas como um modo

privilegiado de contacto com o mundo natural e meio através do qual muitos

procuram esse re-aproximar à natureza – produzem riscos que podem não ser

exclusivos para a saúde, vida e integridade do praticante, como faz notar Melo

(2003), ao referir o impacto verificado nos espaços naturais onde as mesmas são

levadas a cabo. De facto, a aproximação à natureza através dos “novos

desportos” tem contribuído invariavelmente para o aumento da pressão humana

em locais tidos como “ecologicamente limpos” (Garcia, 1997), o que em distintos

moldes afecta o meio e cujo impacto será cada vez mais negativo à medida que

se vá observando a crescente massificação, já em movimento, do seu consumo

(Castillo, Fajardo e Funollet, 1995).

O acesso em massa ao mundo natural acarreta consigo problemas

incontestáveis, relacionados com a destruição da fauna/flora, poluição sonora,

erosão e compactação dos solos, abandono de detritos, stress sobre as espécies,

descaracterização das paisagens, urbanização da natureza e alteração da

homeostasia do meio (Pereira e Monteiro, 1995; Garcia, 1997; Fernández, 2002;

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Desenvolvimento do Problema

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Otero, 2002; Pires e Philippi, 2004). A imagem do praticante assume, assim,

frequentemente, o esboço de adversário ecológico – que reduz a natureza a

cenário ou pano de fundo – em oposição à de – esperada – amigo da natureza: o

homem visto dentro desta, numa perspectiva de respeito e coexistência (Brunhs,

2002; Leite e Caetano, 2004; Marinho, 2004).

Muito embora não possam, desta forma, aceitar-se de modo positivo as

actividades desportivas nos espaços naturais se não forem tidas em conta

criteriosas regras ecológicas de conduta, protecção e resguardo do ambiente

(Sequerra, 1996), é inegável a sua potencial contribuição para o despertar da

sensibilidade e responsabilidade ambiental, colectiva ou individual (Marinho,

2004), senão por outra razão, pela premissa de que é mais fácil cuidar daquilo que

se conhece (Pires e Philippi, 2004:149). De facto, segundo Melo (2003), os

Desportos de Natureza apresentam um enorme potencial educativo nesta

vertente, uma vez que não se defende o que não se ama (p. 20) e, na sua

perspectiva, a prática de desportos em ambiente natural é uma das melhores

formas de conhecer a Natureza que temos e de fomentar a paixão pela defesa

desse património, que é de todos nós.

As actividades que requerem os ambientes naturais para a sua realização

parecem, realmente, despertar maiores sensibilidades (Marinho e Gáspari, 2003).

O acto de visitar uma área natural e observar a imensa diversidade que a compõe

– formas, cores e individualidades –, bem como o pensar e o sentir a forma como

dela se faz parte, podem representar para o praticante uma boa oportunidade de

resgatar valores e sentidos adormecidos (Mendonça, 1996). Como afirma Pires

(1990), quando bem utilizada, a dimensão fetichista que a prática destas

modalidades desportivas assume, pode ser um instrumento promotor da protecção

e do respeito pela natureza. Desta forma, tal como destacam Pereira e Monteiro

(1995), podemos assumir que as actividades de aventura no ambiente natural

surgem como uma alternativa desportiva, que permite a valorização da relação

afectiva com a natureza e o respeito pela sua biodiversidade. Mas, como nos

esclarece Marinho (2004), para ser manifesto o desenvolvimento de uma

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Desenvolvimento do Problema

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sensibilidade mais profunda do que a simplesmente necessária para as tomadas

de decisão no decurso das práticas, o trabalho com as actividades na natureza vai

exigir mais do que uma elementar familiarização com as questões sócio-

ambientais e com os conceitos sobre o lazer – vai exigir um envolvimento

dinâmico, intenso, inovador e muito responsável. É o “sentido de preservação” o

que se deve incorporar nestas vivências, uma vez que os seres humanos carecem

de preparação, de atitude e de valores que intensifiquem o seu papel diante da

manutenção dos equilíbrios da natureza (Marinho e Schwartz, 2005).

Parece ser verdade que, como afirma Correia (1997), o desporto aventura

permite o acesso a uma verdadeira educação ecológica. Dado que não se acredita

na possibilidade de preservação sem uma colaboração humana – ordenada e

consciente –, o contacto com a natureza revela-se fundamental, na medida em

que permite ao homem reconhecer-se e entender a necessidade de preservar

outras formas de vida que contribuem para o equilíbrio do ambiente (Chao, 2004).

No entanto, segundo Melo (2003), o conhecimento directo da natureza e a

verdadeira potencialidade educativa destas práticas são muitas vezes

desprezados, pela inconsciência da sua existência ou insensibilidade à sua

enorme importância, não havendo, assim, espaço para aprendizagens

consistentes ou sensibilizações notórias.

Assumindo a potencialidade dos Desportos na Natureza como veículo de

formação, é de fundamental importância que os responsáveis pelas actividades

não sejam unicamente multiplicadores da dinâmica de consumo que se infiltra em

todos os segmentos da sociedade, dado o perigo da questão da protecção do

ambiente poder ser esquecida por trás da “moda ecológica” que imputa novas

responsabilidades aos seus promotores (Heinemann, 1994; Burnhs, 2002; Chao,

2004). Segundo Melo (2003), acima de tudo, os organizadores e

comercializadores destas práticas devem ser imbuídos de uma verdadeira ética de

defesa do ambiente, porque deles dependem todo o comportamento do grupo,

bem como as consequências das suas acções. Tal como referem Marinho e

Gáspari (2003), é necessária toda uma pedagogia, a partir da qual, a percepção

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Desenvolvimento do Problema

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do ambiente natural – com relação às condições de vida na Terra – pode vir a ser

altamente estimulada. A vertente do consumo destas práticas está bem patente na

nossa sociedade e, no entanto, como defende Silveira (1996), a sua direcção tem

de ser encarada num rumo distinto ao do turismo de massa, sinalizando sim,

práticas vocacionadas para a cidadania ambiental – logo associadas à educação –

, perspectivando os turistas-desportistas como guardiães e conservadores do

património natural (Macaya, 2004).

O facto de a iniciação desportiva a estas actividades ser, geralmente,

operacionalizada por via de entidades especializadas, em detrimento da via

escolar (Pereira e Monteiro, 1995), reporta-nos ainda ao consumo e à

comercialização dos Desportos Aventura. Mas, como nos esclarecem Marinho e

Schwartz (2005), as aventuras no meio natural parecem estar a encontrar eco,

ainda que tímido, junto ao contexto educativo, tendo como principal condicionante

à sua implementação a pouca importância que ainda lhes é atribuída. Há que

destacar, porém, que a problemática da conservação do ambiente, não sendo um

exclusivo da educação escolar, encontra aí um instrumento essencial para realçar

um futuro melhor, alicerçado no esclarecimento e formação das crianças (Pereira

e Monteiro, 1995: 115-116). Dado o facto de esta se assumir como o único agente

que garante, de forma equitativa e contínua, a educação a todos os indivíduos da

sociedade, a escola deve assumir um papel fundamental na Educação Ambiental

(Monteiro, 1994), que corresponderá, não a mais uma disciplina autónoma do

currículo, mas, à integração de temas, conhecimentos e informações sobre o

ambiente em todas as matérias de ensino (Schmidt, 1999), entre as quais devem

assumir particular destaque os conteúdos relacionados com as vivências corporais

em contacto com a natureza (Monteiro, 1994).

Desta forma, Marinho e Gáspari (2003) alertam para a necessidade de as

actividades de aventura terem laços estreitos com a educação, pois apenas desta

forma, ambas seriam capazes de vencer desafios e conquistar novos espaços,

ainda carentes de reflexão. A intensificação da aproximação qualitativa do ser

humano à natureza pode acelerar o processo de consciencialização, tornando

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Desenvolvimento do Problema

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efectivo o sonho de harmonia, mais ainda quando, nos espaços institucionais

como a escola, esta pode representar uma excelente condição para a reflexão de

valores catalisadores dessa relação (Marinho e Schwartz, 2005).

Os novos programas e orientações acentuam cada vez mais o carácter

integrador e multidisciplinar da E. A., que deve encontrar – especialmente na

Educação Física, enquanto disciplina na qual é privilegiado o contacto entre o

indivíduo e o meio – apoio para a sua estruturação (Pereira e Monteiro, 1995). O

respeito e conservação da natureza só vingarão, se forem levadas a cabo acções

que a utilizem, de forma activa, como é apanágio das AFEN (idem, p. 116) e só

desta forma, interactiva e integrada, é possível que os homens e mulheres do

futuro tenham uma participação positivamente mais activa e responsável na

preservação e conservação da natureza (Monteiro, 1994). Felizmente, a

popularidade das AFEN faz-se já sentir no mundo escolar e a sua prática vai

sendo um dos programas favoritos de crianças e adolescentes, levando mesmo os

professores a abandonar as salas para partirem à aventura com os seus alunos

(Vasconcelos, 2002).

Para que as pessoas possam encontrar um sentido mais profundo para

suas vidas, podendo realmente desfrutar, compartilhar e desejar a conservação do

mundo natural como algo indissociável de sua própria essência, é preciso todo um

processo de preparação e reaprendizagem, criando as bases para uma nova

relação, em que a razão sucede o sentimento (Mendonça, 1996). Segundo Bruhns

(2004), algumas das práticas aqui em foco, tendo como pano de fundo o

ambientalismo, influem um reencantamento pelo mundo, que, na nossa opinião,

permite o entendimento da natureza na sua vertente mais frágil e romântica.

As actividades definidas como nosso objecto de estudo, revelam um forte

potencial como veículos de formação e sensibilização para as questões de

protecção ambiental. Muito embora não podendo, aparentemente, jogar de forma

independente de outras áreas de saber e formação, ao responder à necessidade

do ser humano de contacto com o mundo natural e permitirem o contacto directo

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Desenvolvimento do Problema

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com a natureza, estas podem revestir-se de uma importante conotação no

desenvolvimento de uma Educação Ambiental, promovendo uma cidadania

individual ou colectiva, estabelecendo e impondo códigos de valores e conduta e

fundamentando a sensibilização necessária às urgências ambientais.

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Desenvolvimento do Problema

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2.3 Perspectivas de Futuro

A aventura desportiva será um dos

grandes interesses desportivos da

juventude (…) que preparará um desporto

diferente, para o próximo século.

(Pires, 1990: 66)

Tendo por base toda a revisão levada a cabo para a elaboração deste

documento, procuramos agora inferir algumas tendências quanto ao futuro do

nosso objecto de estudo – meras hipóteses e conjecturas, estruturadas nas

suposições de alguns dos autores até agora citados.

Começamos por abordar o tema anteriormente destacado, relativo à

terminologia adoptada para a conceptualização das práticas aqui em causa. Como

previamente referimos, é notória a falta de consenso quanto à melhor

denominação para classificar o nosso objecto de estudo, facto que torna

sobejamente mais difícil o escrutínio lógico da sua essência. Verificada a

pertinência da questão, vemo-nos tentados a augurar que uma nova denominação

tenderá a surgir e afirmar-se, para permitir uma melhor abordagem às questões

relacionadas com os estudos desta área. Sob a pena de incorrer no mesmo erro

que anteriormente criticámos, propomos uma nova denominação, hipoteticamente

viável para responder à necessidade em evidência.

Em primeiro lugar, assumimos que o nosso objecto de estudo deverá contar

com uma denominação onde sejam destacadas as suas ligações com a Natureza

e com a Aventura – facto anteriormente salientado por autores como Betrán e

Betrán (1995a e 1995b), Funollet (1995), Miranda et al. (1995), Feixa (2002) e

Costa e Correas (2005) – e, pensamos nós, muito bem evidenciado no decurso do

nosso trabalho.

Em segundo lugar, destacamos uma óbvia tendência nas preocupações

dos diversos autores que até hoje estudaram o tema, que tem sido a dualidade

Desporto – Actividade Física.

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Desenvolvimento do Problema

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Segundo Miranda et al., (1995), os novos desportos e actividades físicas

aqui objectivados aparecem associados aos paradigmas de auto-realização e

melhoria de qualidade de vida, que na perspectiva dos autores pretendem

substituir os anteriormente estabelecidos de competição, esforço e tensão.

Também na opinião de Betrán e Betrán (1995a e 1995b), os novos valores da

sociedade pós-moderna – que encontram eco nas AFAN – surgem em oposição à

cultura corporal fundamentada no esforço, colectividade, superação e rendimento

– característicos da época moderna e dos quais o desporto é o paradigma

máximo. Estes autores justificam a opção pelo conceito de “Actividades Físicas”

na denominação que eles próprios criaram, com a explicação de que o constructo

de Desporto – embora relacionado com actividade física, jogo, recreação – se

entende como actividade regulamentada, institucionalizada e competitiva, na qual

dominam os valores de esforço, superação, produção, competitividade, sacrifício e

treino, com os quais as novas actividades procuram romper (Betrán e Betrán,

1995b). Embora optando pela denominação Novos Desportos, Domingo (1991)

salienta igualmente uma mudança de lógica social no fundamento das actividades

aqui em estudo. Na sua opinião, da concepção clássica que estabelece a meta do

desportista na competição e no atingir de marcas sempre superiores, progredimos

hoje para uma situação onde são o exercício físico e as sensações por si

produzidas que se destacam como principal motivação para a prática. Já para

Funollet (1995), o conceito de desporto reconhece os constructos de actividade

física, competitiva, recreativa, expressiva, regrada, lúdica, técnica e táctica,

tornando admissível que uma actividade física, não competitiva e isenta de regras,

possa ser considerada como desporto, facto que o leva a escolher um constructo

focado na ideia de actividades desportivas.

Numa tentativa de encontrar resposta para esta questão, consultámos a

definição proposta pelo Conselho da Europa, em 1992, segundo a qual se

entendem por Desporto, todas as formas de actividades físicas que, através de

uma participação organizada ou não, têm por objectivo a expressão ou o

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Desenvolvimento do Problema

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melhoramento da condição física e psíquica, o desenvolvimento das relações

sociais ou a obtenção de resultados na competição a todos os níveis5.

Parece-nos aceitável admitir que as práticas associadas ao nosso objecto

de estudo possam ser definidas como Desportos. É inegável que estas surgem

associadas aos novos paradigmas da realização pessoal, hedonismo e satisfação,

muito embora não lhes possam ser vedadas características associadas ao

Desporto clássico ou formal. Quando falamos de esforço, superação, competição,

sacrifício e rendimento, não podemos esquecer as exposições de autores como

Branco (2002), Pereira (2005), Møller (2007) e Krein (2007), entre outros, que nos

relembram que a competição nestas actividades existe, sendo de índole muito

mais interna, onde a superação do próprio e o atingir de melhores performances

num constante acto de superação, se definem como circunstâncias da prática. Na

prossecução desta ideia, podemos afirmar que estas permitem o desenvolvimento

da condição psíquica dos seus praticantes, pela indução da auto-afirmação e pela

constante aprendizagem que proporcionam (Guzmán, 2002), corroborando ainda

a definição da Carta Europeia do Desporto, onde é referida a competição a todos

os níveis. Nunca esquecendo que estas actividades propiciam a expressão da

condição física dos seus praticantes e que, como afirmam Miranda et al. (1995),

parecem promover a participação social e as relações com os pares, parece-nos

indicado afirmar que o nosso objecto de estudo pode ser entendido como uma

forma de prática desportiva.

Atendendo à tendência, cada vez mais acentuada na bibliografia

respeitante à temática, para destacar as características anteriormente referidas,

podemos propor para uma denominação futura, que seguramente vai ao encontro

das perspectivas dos estudos da área, o conceito de Desportos de Aventura na

Natureza (DAN).

5 Artigo 2.º da Carta Europeia do Desporto do Conselho da Europa (1992)

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Desenvolvimento do Problema

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Por causa da relativa novidade que representam, do auge social em que se

encontram e do dinamismo do ramo que as comercializa, estas práticas deparam-

se com um processo interno de crise que, uma vez solucionado, dará origem a um

sector muito mais fortalecido, com uma selecção natural das actividades

envolvidas, as mais sólidas ofertas e um equilíbrio empresarial racional, capaz de

responder qualitativamente à emergente demanda social (Betrán, 1995). No

entanto, segundo Bachelet (1995), basta ser inventivo na criação e logo, ao expô-

la, se exaltam a moda e a publicidade – nas vozes dos que as criam e geram –

seduzindo pela mentira (p. 132) o potencial comprador e fazendo do consumo, a

qualquer custo, a finalidade da vida. Este encanto pela inovação também se faz

sentir na esfera dos DAN dado que, como refere Correia (1997), o Desporto

Aventura não é alheio ao fenómeno da moda. Assim, na opinião do autor, para

permanecer na vanguarda do negócio, tornam-se indispensáveis a adopção de

novas actividades, a alteração das existentes e o investimento em novos

equipamentos baseados em recentes inovações tecnológicas, até porque os

próprios clientes se começam a definir como um recurso escasso e é certo que

estes consumirão unicamente o produto que melhor atender às suas

necessidades e aspirações.

Atendendo à sua apelatividade e nunca esquecendo a óptica do consumo,

estas práticas tornam-se, segundo Sallent (1991), num campo pleno de futuras

possibilidades para os licenciados em Educação Física, tanto em empresas

públicas como privadas, quer em âmbitos de animação quer de docência, não se

esgotando a sua potencialidade nesta hipótese. Segundo Funolet (1989),

Fernández (2002) e Otero (2002), o turismo e o desporto na natureza – se

impulsionados de forma correcta, conveniente e equilibrada – podem jogar um

papel de extrema relevância no favorecimento do desenvolvimento económico e

na participação social nas sociedades pós-modernas, definindo-se mesmo como

alternativas viáveis para o desenvolvimento das áreas rurais e deprimidas.

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Desenvolvimento do Problema

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Para Urry (2002), que se refere a uma tendência de mutação dos padrões

de consumo da sociedade – da sua forma de massa para modelos mais

individualizados – é claro que também no turismo – que segundo Sallent (1991) se

converterá na próxima primeira indústria mundial, enquanto o desporto se

consolida como a principal actividade recreativa da população – se sentirão as

influências destas tendências. Atendendo às ideias de Fernández (2002), turismo

e desporto estão, sem dúvida, destinados a entender-se, permitindo pressagiar um

excelente porvir na aliança entre ambos, em especial num espaço tão completo e

atractivo como é o meio natural.

A Carta Europeia do Desporto lança-nos um outro desafio, cuja análise nos

parece muito adequada a este capítulo das perspectivas futuras, quando no seu

Artigo 10.º nos destaca o princípio do Desporto Sustentável – tema analisado por

autores como DaCosta (1997) e Lenskyj (1998) –, referindo que as actividades

físicas devem ser adaptadas aos recursos limitados do planeta e conduzidas em

harmonia com os princípios de um desenvolvimento sustentável e de uma gestão

equilibrada do meio ambiente.

O conceito de Desporto Sustentável é relativamente novo, quer nos círculos

do Desporto, quer nos do ambiente (Lenskyj, 1998), mas como refere Fernández

(2002), é um facto que as possibilidades e recursos que a natureza nos oferece

não podem ser desaproveitadas, nem tão pouco pervertidas, tornando

fundamental a criação de critérios racionais de utilização e protecção.

Naturalmente, o potencial do ecoturismo e do desporto de Natureza só poderá ser

explorado a prazo se garantirmos a salvaguarda dos espaços que os suportam, e

que, em muitos casos, estão a sofrer enormes pressões (Melo, 2003: 21). Esta

ideia foi anteriormente abordada segundo as opiniões de Sequerra (1996) e

Marinho (2004), destacando esta última a necessidade do desenvolvimento de

uma sensibilidade mais profunda, que permita, a par da ética necessária ao

momento de prática, uma consciencialização generalizada para a preservação do

ambiente e assim um melhor desenvolvimento em direcção ao conceito de

sustentabilidade.

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Desenvolvimento do Problema

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Segundo Costa (2006), parece haver já alguma preocupação e

sensibilização para as questões ambientais e da preservação do ambiente durante

a prática – por parte dos seus promotores e organizadores –, muito embora não

acompanhadas de medidas permanentes, pensadas com um fim de preservação

inteiramente implícito. Assim, como referem Marinho e Gáspari (2003), as

transformações pretendidas para o século XXI passam fundamentalmente por

mudanças axiológicas referentes à formação dos profissionais, os quais terão um

papel decisivo na manutenção ou alteração do contexto sócio-cultural, muito pela

influência sobre os clientes, praticantes e formandos que vivem, experimentam ou

recorrem aos DAN como veículos de formação. Teremos de nos preparar para

que, como afirma Pires (1990), a aventura possa ser, em termos futuros, além de

tudo o resto, um elemento de formação, educação e cultura ao serviço do homem.

Os Desportos de Aventura na Natureza – conceito pelo qual optamos,

encarando a possibilidade da sua viabilidade para futuros trabalhos – poderão, se

bem impulsionados, originar um sector comercial muito rentável e lucrativo, que

encerra em si potencialidades que não devem ser desprezadas. Para que a sua

potencialidade possa ser aproveitada, estes terão primeiro de garantir o seu

sucesso, baseando-se em renovações e inovações, atendendo sempre à

perspectiva da preservação ambiental que garantirá a sua sustentabilidade.

Ultrapassar estes obstáculos exigirá formações e sensibilizações – factos que

podem também vir a ser frutos da afirmação destas práticas – que encaminharão

os DAN para o sucesso. Da asseveração destas práticas poderão advir resultados

proveitosos para os profissionais da área do Desporto, para os promotores do

turismo e para as instâncias e populações das áreas rurais deprimidas, bem como

para a humanidade em geral, pelo desenvolver e imbuir de novos valores face às

problemáticas ambientais.

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33.. CCOONNCCLLUUSSÕÕEESS

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Conclusões

83

3. Conclusões

Da revisão bibliográfica realizada e das análises efectuadas no decurso do

nosso trabalho, surge o presente documento, no qual se podem destacar, como

principais conclusões, as seguintes constatações:

Actualmente vivemos numa sociedade, chamemos-lhe, como muitos, Pós-

Moderna ou Pós-Industrial, profundamente caracterizada pela radicalização dos

princípios existentes e vividos na época da Modernidade. É uma sociedade global,

onde se destacam e ganham cada vez mais relevância: a passividade aparente do

quotidiano, com modos e formas de vida cada dia mais regrados e controlados,

sem espaço para emoções e descontrolos mas nos quais o risco é uma presença

constante; a saturação com esse mesmo quotidiano, com a norma, a rotina e

espaço que o caracterizam; as problemáticas ambientais e a super-exploração dos

recursos, frutos da exaltação do consumo e produção de massa, alimentados

pelos fenómenos da moda, da publicidade e demografia acentuadas; os grandes

desequilíbrios económicos entre Estados e entre diferentes regiões do planeta,

frutos de um capitalismo e industrialismo de diferentes expressões e incidência.

Por causa das suas características, ou por vezes em resposta às

necessidades que estas estabelecem, nestas mesmas sociedades assistimos ao

afirmar de novos valores e princípios – uma pluralidade deles –, segundo os quais

tendemos a regrar a nossa vida e dos quais podemos destacar: o hedonismo, o

individualismo e obsessão pela diferença, o narcisismo, o esteticismo, o

subjectivismo e a personalização; bem expressos na constante busca de prazer,

necessidade de auto-realização e afirmação pessoal, procura de usufruto do

presente, demanda por ócio e melhores condições de vida.

Na afinidade criada entre os novos valores sociais, o aumento da parcela

de tempo livre de obrigações e o aumento da esperança média de vida de que

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Conclusões

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hoje desfrutamos, encontramos cada vez mais espaço para o lazer nesta nossa

sociedade, que exalta a necessidade de novas formas de ocupação dos tempos

livres – períodos aos quais cada um pode atribuir significados diferenciados –,

tornando-o numa expressão distintiva da nossa época.

Na resposta às necessidades de novas formas de lazer, de consumo do

“tempo livre”, de emoções, de momentos de descontrolo e ruptura com a

continuidade existencial, de contacto ou reencontro com a natureza, surgem os

Desporto de Aventura na Natureza, profundamente associados aos paradigmas da

realização pessoal, do hedonismo e da melhoria da qualidade de vida.

Os Desportos de Aventura na Natureza são todo um conjunto de

actividades – cuja génese ocorreu durante a década de 1960 e que rapidamente

se propagaram à generalidade das sociedades economicamente avançadas – nas

quais podemos referir, como principais características: o(s) meio(s) que as

fundamenta(m) – a Natureza, por excelência e os meios aquático, terrestre ou

aéreo onde as suas práticas decorrem; as emoções que proporcionam – risco,

incerteza e sensações associadas à experiência da Aventura; o público

diversificado, crescente e cada vez mais vasto, a que se destinam; a sua forte

popularidade – para a qual contribuem a forte actividade empresarial e comercial,

bem como a sua relação com as formas de turismo activo; e a grande flexibilidade

no que respeita a regulamentações, horários, formas e modos de prática.

No conjunto destas actividades, que optamos por denominar de Desportos

de Aventura na Natureza, podemos incluir práticas como: Asa Delta, Parapente,

Queda-Livre, Base Jump, Bicicleta Todo-Terreno, Cicloturismo, Street Luge, Ski,

Snowboard, Passeio Pedestre e Equestre, Montanhismo, Trekking, Orientação,

Espeleologia, Escalada, Mergulho, Surf, Body-Board, Wakeboard, Windsurf,

Rafting, Canoagem, Hidrospeed e Canyoning, entre muitas outras.

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Conclusões

85

No contexto da sua prática, pode ser discutida a oposição entre o ser

humano e a natureza, pelo antagonismo que opõe o Homem às forças do meio –

mais ainda quando, numa tendência consumista, a própria Natureza é reduzida a

um cenário para a prática, por antítese à imagem de parte integrante da

experiência que deveria ser assumida.

Os Desportos de Aventura na Natureza parecem oferecer resposta a

algumas necessidades básicas da vida dos indivíduos, factos que ajudam a

entender a sua enorme viabilidade e destaque na actualidade. Baseados nesta

perspectiva procurámos abordar, no decurso do nosso trabalho, aqueles que

seriam os temas mais significativos no que concerne à sua investigação e estudo,

unicamente para nos apercebermos que os vários tópicos destacados acabam por

criar um enorme âmbito de pesquisa e análise, dada a forma como

intrinsecamente se relacionam e associam entre si.

Convém então destacar, em primeiro lugar, o Mercado da Aventura. Os

DAN surgem profundamente relacionados com as tendências de consumo – que

associado ao hedonismo se destaca hoje, senão como obrigação, certamente

como tendência, muito pela acção da moda e da publicidade. Serviço, satisfação,

diversão e prestígio são conceitos que lhe surgem intimamente associados e é

certo que a probabilidade da sua ocorrência aumenta com a perspectiva deste

acto fornecer resposta às necessidades – reais ou estabelecidas – do ser humano.

A vertente da Mercantilização da Aventura fornece resposta a algumas das

necessidades existenciais agora sentidas – mesmo que estas sejam fruto da

imposição da moda natural e ecológica –, definindo-se como mais um produto a

ser consumido, mais uma forma de consumo de experiência ou de usufruto do

tempo livre. A moda faz eco da popularidade destas práticas e da sua imagem,

apreciada e comercializada, destaca-se um novo estilo desportivo, fortemente

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Conclusões

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apoiado nos espaços privilegiados para consumo, nos equipamentos, materiais,

objectos, vestiários, serviços e experiências.

A crescente resposta empresarial, que permite a compra e venda de

emoções e da (ou na) Natureza, associa-se igualmente às novas formas de

Turismo Activo, permitindo a comercialização de viagens e cenários do fantástico,

abrindo portas a um mercado potencial com novos sectores e formas de consumo.

Para satisfazer as nossas necessidades de consumo, tendemos a

transformar a Natureza num mero recurso ou simples cenário, facto que de si

pode ser problemático, mais ainda considerando que o acesso em massa ao

mundo natural provocará, obrigatoriamente, impactos negativos no meio,

contribuindo para a pressão e degradação dos habitats e cenários ainda

preservados.

Independentemente da essência da Natureza que hoje possamos

experimentar, é inegável uma tendência de aproximação do homem aos espaços

naturais, definindo-se a vida ao ar livre como uma necessidade estipulada pelo

desejo de regresso e pela necessidade de quebra com o quotidiano e fuga do

meio viciado em que este tende a decorrer.

Dentro das características da sociedade actual podem ser exacerbadas a

degradação ambiental global – entendida agora como objecto de preocupação

generalizada, pela consciencialização da sua ingerência enquanto factor imediato

da nossa sobrevivência – e a aparente tomada de consciência quanto à sua

ocorrência – motivo de agitação e mobilização colectiva, que tem aumentado a um

ritmo vertiginoso, mesmo que não de forma equitativa em toda a parte do planeta.

Os DAN podem cumprir um papel fundamental e inegável enquanto

veículos de sensibilização para as temáticas da natureza, permitindo o

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Conclusões

87

desenvolvimento de uma consciência ambiental e responsabilidade individual ou

colectiva. Ao permitirem o acesso ao que resta deste meio, estas práticas podem

contribuir de forma notória para a Educação Ambiental e para o desenvolvimento

de valores ou princípios de respeito pelo mundo natural – pela própria

necessidade de subsistência – podendo o seu papel ser muito proveitoso e

profundamente produtivo no meio da formação e do ensino – focamos a sua

interdisciplinaridade mas principalmente a viável associação com a Educação

Física.

Para ser válida a vertente de consciencialização, serão no entanto

necessárias ponderações basilares na criação de regras de conduta e protecção

ambiental do espaço utilizado para a prática dos DAN, assim como,

sensibilizações particulares que permitam explorar a capacidade de intervenção e

mediação dos organizadores sobre os praticantes. É assim fundamental que os

DAN não se percam na lógica de consumo pela qual se rege a sociedade, que

tende frequentemente a desvalorizar os produtos no surgimento de novas formas

de consumo, e a explorar os recursos necessários à sua venda sob qualquer

condição.

A prática massiva dos DAN, bem como a venda de actividades extremas,

tendem a domesticar o risco e a proporcionar a aventura inerente às suas práticas

de forma mimética e simbólica que, muito embora perca assim a sua verdadeira

característica, serve ao consumidor o produto desejado, através do conceito de

risco percebido e da manipulação da subjectividade da sua percepção.

A busca de estimulação emocional e sensorial, as novas sensações, a

quebra com a rotina e a continuidade da vida, são assim servidas por intermédio

da Aventura, quer de forma subjectiva, quer de forma indiscutivelmente real –

dependendo do contexto de prática –, oferecendo resposta a uma miríade de

necessidades, impostas aos seres humanos pelas características da sociedade.

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Conclusões

88

O autocontrolo, a limitação na demonstração de sentimentos e emoções, o

excesso de regras e mecanicismos, a retractação dos impulsos e a passividade

preponderante da vida, que negam ao ser humano a sua percepção de

determinação, tornam abstracto o conceito de mortalidade e criam tensões

negativas associadas à falta de excitações, são então suprimidos pela situação

marginal da Aventura, que permite a quebra com a continuidade da vida, com o

costume e o estabelecido, oferecendo a possibilidade de dano, desastre, morte,

perigo, vislumbre no abismo, bem como todo um leque de sensações aprazíveis,

fruto da instabilidade e insegurança, que quando vencidas proporcionam

satisfação, auto-afirmação e progresso.

A necessidade de estar em controlo e o sentimento de domínio sobre a

própria existência voltam assim à vida, mesmo que momentaneamente, de forma

real ou imaginária, permitindo a superação, a conquista do próprio ser, a

afirmação pessoal e a construção da identidade, necessárias à sanidade e

equilíbrio de cada indivíduo.

Para manterem a sua viabilidade e garantir a sua continuidade, os DAN

necessitarão de se basear no conceito de Desporto Sustentável, estando a sua

prosperidade e sequência obviamente dependentes do respeito pelo meio e

cenários onde as práticas são levadas a cabo, do desenvolvimento de novas

tecnologias que objectivem a segurança dos praticantes, da inovação e renovação

das práticas e actividades na perspectiva mercantilista, de uma melhor e mais

eficaz gestão e legislação das entidades que as promovem e da formação de

todos os envolvidos, quer no que consta a matérias de segurança, quer no que diz

respeito à consciência ambiental, quer para usufruto individual como para a

influência de terceiros.

Os DAN não se encontram marginalizados, tendo um lugar de destaque

cada vez mais evidente e alcançando, a cada passo, leques mais vastos da

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Conclusões

89

população. O seu entendimento, bem como a aceitação do seu potencial, poderão

trazer frutos altamente produtivos, oferecendo resposta a muitas das

necessidades actualmente em evidência na nossa sociedade. Estes podem ainda

destacar-se como elementos de importância na formação e educação, devendo,

como tal, ser difundidos e utilizados, mas tendo sempre em conta os conceitos de

segurança e respeito ambiental que lhes devem ser, podem ser e são inerentes.

O nosso estudo permitiu-nos compreender os Desportos de Aventura na

Natureza nas suas relações com o quadro axiológico actual, na sua potencialidade

de resposta às necessidades vigentes da nossa sociedade e na relação com os

imperativos valores que nela se destacam. A revisão efectuada, pela variedade de

conhecimentos que nos permitiu adquirir, agrupar e expor, revelou-se muito

proveitosa, fornecendo todo um espectro de dados relativos a estas importantes

actividades. Podemos assim afirmar, embora com algumas reservas, que o

principal objectivo do nosso trabalho foi atingido, sendo que reunimos todo um

conjunto de informações pertinentes sobre o nosso objecto de estudo, que com

alguma facilidade podiam ser encontradas dispersas pelos textos e obras de

diversas áreas do saber e do conhecer. Admitindo, no entanto, que do seu início

até ao seu término, muitos foram os factos que, a cada passo, surgiram,

complicando e embaraçando a teia de informações exploradas com outros dados,

será possível questionar se todas as instâncias da sociedade, que de alguma

forma têm intervenção sobre os DAN, foram aqui reflectidas, ou se alguma relação

ficou por analisar.

Seria possivelmente produtiva, tendo como base a constatação das

informações aqui reunidas, a reestruturação do documento aqui apresentado,

numa tentativa de encontrar novas relações de pertinência com os valores e

princípios da sociedade. Esta é uma sugestão que deixamos para trabalhos

futuros, a elaborar nesta área de conhecimento.

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44.. RREEFFEERRÊÊNNCCIIAASS BBIIBBLLIIOOGGRRÁÁFFIICCAASS

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Desportos de Aventura na Natureza:uma revisão conceptual

Pedro Delgado Paiva

Porto, 30 de Maio de 2008

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Desportos de Aventura na Natureza: uma revisão conceptual

Orientador: Professora Doutora Ana Luísa Pereira

Pedro Delgado Paiva

Porto, 30 de Maio de 2008

Monografia realizada no âmbito da disciplina de Seminário do 5º ano da licenciatura em Desporto e Educação Física, na área de Recreação, da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto

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À Maria Luís.

Que o Sol resplandeça no teu percurso,

Que o futuro te seja brilhante…

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I

Agradecimentos

À Professora Doutora Ana Luísa Pereira, pela disponibilidade que sempre

demonstrou, pelos valorosos conselhos e pareceres, pelo auxílio e apoio, pela

boa-disposição com que sempre me recebeu e, acima de tudo, pela atitude e

dedicação com que encara a sua profissão.

A todos os professores do gabinete de Recreação, pela postura e carinho

para com os seus “protegidos”, com quem estabelecem, a par das óbvias relações

de profissionalismo, ligações de afeição e cordialidade.

À minha família:

Aos meus pais, heróis que amo muito, pelo apoio, carinho e confiança;

À minha avó e tio, por me suportarem, sempre;

A todos, pelo constante incentivo… pelo bem-querer… por tudo.

Aos meus amigos:

Ao Damião, por estar sempre lá;

Aos Manos e Maninha – Pedro, Tiago e Ju – pelo constante estímulo;

A todos – Ari, Zé, Sérgio, Rita, Catas, Nabais, Paty… – pelo apoio;

Aos amigos da Tribo do Lagarto e da Turma F, pela companhia no trajecto;

À Telma, por me carregar até aqui;

Ao meu Raio de Sol, por iluminar o meu caminho;

À Lúcia, pelo carinho… por me fazer sonhar…

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III

Índice Geral

Agradecimentos ....................................................................................................... I

Índice Geral ............................................................................................................ III

Resumo...................................................................................................................V

Abstract .................................................................................................................VII

Résumé.................................................................................................................. IX

Lista de Abreviaturas..............................................................................................XI

1. Introdução........................................................................................................ 1

2. Desenvolvimento do Problema ........................................................................ 5

2.1 Objecto de Estudo: do quadro axiológico à legitimação da prática ............ 7

2.1.1 Contexto Social: valores, dinâmica e necessidades ............................ 7

2.1.2 Caracterização: das origens ao público-alvo ..................................... 17

2.1.3 Razões da procura e afirmação......................................................... 27

2.2 Temas de interesse na investigação do objecto de estudo...................... 33

2.2.1 Aventura: sensações e necessidades ............................................... 33

2.2.2 Consumo: sociedade e produto consumível...................................... 43

2.2.3 Problemática Ambiental: do meio e da educação.............................. 55

2.3 Perspectivas de Futuro ............................................................................ 75

3. Conclusões .................................................................................................... 81

4. Referências Bibliográficas ............................................................................. 91

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V

Resumo

Vivemos actualmente uma outra sociedade, um período de complexidade e

inquietação onde se avultam valores e necessidades, frutos de uma aparente

radicalização dos princípios do período da Modernidade (Lipovetsky, 1989;

Gervilla, 1993; Giddens, 1994). Associadas à emergência destes novos princípios,

carências e valores, surgem novas actividades de lazer, profundamente

relacionadas com a Aventura e o contacto com a Natureza (Betrán e Betrán,

1995a; Guzmán, 2002; Costa e Correas, 2005). Neste trabalho, baseado numa

exaustiva revisão bibliográfica, procurámos entender estas novas práticas

desportivas, identificando as suas principais características e analisando as suas

dinâmicas com a sociedade actual. Entre as principais conclusões do nosso

trabalho podem ser destacadas: a proposta do conceito de Desportos de Aventura

na Natureza, que nos parece uma alternativa viável para a definição do nosso

objecto de estudo; o enorme potencial destas práticas para fornecer resposta a

todo um leque de necessidades hoje em evidência na nossa sociedade, dos quais

destacamos a carência de emoções, riscos, sensações, ruptura com a

continuidade da vida, divórcio com o espaço e tempo quotidiano e escape para o

ambiente natural; uma tendência profunda à Mercantilização da Aventura que,

associada a uma forte resposta empresarial e a uma produtiva relação com as

novas formas de turismo activo, torna o nosso objecto de estudo em mais um

produto de consumo; o enorme potencial do referido objecto de estudo para a

Educação Ambiental e promoção de novos valores ecológicos de protecção da

Natureza.

Palavras-Chave: Pós-Modernidade; Desportos de Aventura na Natureza;

Mercado da Aventura.

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VII

Abstract

Nowadays we experience another society, a complexity and disquiet period

where new values and requirements, seeds of a perceptible radical shift of the

principles of Modernity, breed (Lipovetsky, 1989; Gervilla, 1993; Giddens, 1994).

Related to the surge of these new principles, needs and values, a perceptible

bourgeoning of new leisure activities, deeply associated with the Adventure and

the experience of Nature, is noticed (Betrán e Betrán, 1995a; Guzmán, 2002;

Costa e Correas, 2005). With the conception of this work we attempt, through an

exhaustive and meticulous bibliographic review, to understand the new sport

activities, identifying its key characteristics and analyzing its dynamic relations with

the contemporary society. Amongst our primary conclusions there can be

enlightened: our proposal of the concept “Adventure Sports in the Nature”, which

we believe provide a viable alternative to the nomination and conceptualization of

our subject; the vast potential of these practices to provide answers to an all-

complex set of necessities in evidence nowadays, of which we can stand out the

need of emotions and sensations, the risk-seeking tendency, the requirement of

rupture with the continuity of life itself and the escape from the time and space of

the everyday life towards the natural environment; a deep tendency to the

pronouncement of the adventure market, associated to a strong and ever growing

business reply and a productive relation with the new forms of active tourism,

which establishes our subject as another consumption commodity; the large

potential of our subject to the Environmental Education and the promotion of new

ecological values and nature protection ideals.

Keywords: Postmodernity; Adventure Sports in the Nature, Adventure Market.

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IX

Résumé

Actuellement on vivons dans une outre société, un période de complexité et

inquiétude ou se amplifie valeurs et nécessités, conséquence de une apparent

radicalización des débuts de la Modernité (Lipovetsky, 1989; Gervilla, 1993;

Giddens, 1994). Associé à l’émergence de ces nouveaux principes, besoins et

valeurs, se posent de nouvelle activité de loisirs, profondément reporté à

l’Aventure et aux contacte avec la Nature (Betrán e Betrán, 1995a; Guzmán, 2002;

Costa e Correas, 2005). Dans notre travaille, basée à une exhaustif révision

bibliographique, nous cherchons d’attendu cette nouvelle pratiques sportives,

identifié cette principaux caractéristiques et analyser cette dynamique avec la

société actuelle. Parmi les principaux conclusions de notre travaille, on peut mettre

en évidence: la notre propose de le concept de Sport d’Aventure dans la Nature,

que on croyions êtres une alternatif pour la définition e conceptualisation du notre

objecte d’étude; l’énorme potentiel de cette pratique, pour donnée une réponse à

tout un group de nécessités qui nous trouvons aujourd’hui dans notre société, ou

se détache le besoin d’émotion, du risque, de la sensation, de la rupture avec la

continuité de la vie, le divorce avec l’espace et le temps de quotidienne et l’évasion

pour la nature; une profond tendance aux marché de l’Aventure qui, associé a une

fort réponse de l’entreprise et a une productif relation avec le nouvelle forme du

tourisme actif, il prend le notre objecte de l’étude dans un n’outre produit pour

consumé; le grand potentiel du dit objecte d’étude pour le Education Ambiant et la

promotion de nouveaux valeurs écologiques de protection de la nature.

Mots-Clés: Postmodernité; Sport d’Aventure dans la Nature; Marché de

l’Aventure.

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XI

Lista de Abreviaturas

AFEN – Actividades Físicas de Exploração da Natureza

AFAN – Actividades Físicas de Aventura na Natureza

AEISAD – Associação Espanhola de Investigação Social Aplicada ao Desporto

CTP – Confederação do Turismo Português

TV – Televisão

PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

CMAD – Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento

CNUMAD – Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e

Desenvolvimento

CECS – Conferência Europeia sobre Cidades Sustentáveis

E.A. – Educação Ambiental

DAN – Desportos de Aventura na Natureza

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11.. IINNTTRROODDUUÇÇÃÃOO

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Introdução

3

1. Introdução

Segundo Constantino (1997), no final do século passado foi possível assistir

ao aparecimento de novos paradigmas civilizacionais (p.117), que lenta mas

profundamente alteraram os estilos e os modos de vida, as relações sociais, as

expectativas e motivações dos cidadãos (idem). De facto, com uma rápida análise

aos trabalhos de autores como Lipovetsky (1989), Gervilla (1993), Giddens (1994),

Fernandes (1999) ou Beck (2000), podemos entender a emergência de uma outra

sociedade, na qual se estabelecem novos valores e princípios, bem como um

novo leque de necessidades para as quais o indivíduo, enquanto ser situado,

procura resposta ou forma de supressão.

Dada a amplitude do fenómeno desportivo – e atendendo ao facto de, como

afirma Bento (1997), cada época ter o seu desporto e o seu cidadão, ambos

dependentes de mutações sociais, sobretudo nos planos dos valores, direitos e

necessidades –, as alterações do quadro axiológico levaram a que, como afirma

Garcia (1997), mesmo nas revistas sobre educação física e desporto mais

conceituadas internacionalmente, novas palavras, novos conceitos (…) surgissem

para situar, qualificar, explanar ou explicar a sociedade em que vivemos (p. 15).

É neste versátil cenário de mudanças culturais, económicas, ideológicas e

de alterações dos paradigmas, dos conceitos e mentalidades – no qual o

hedonismo e o lazer assumem uma dimensão fundamental (Elias, 1992; Pereira e

Félix, 2002) –, que podemos considerar o surgimento de todo um conjunto de

práticas corporais (Betrán e Betrán, 1995a) desenvolvidas em contacto com a

natureza, cuja experiência envolve risco, emoção, prazer e cujo incremento não

pode ser desvalorizado (Pereira e Félix, 2002; Costa e Correas, 2005).

Actividades Físicas de Exploração da Natureza ou Desportos de Aventura

são apenas exemplos do vasto legado terminológico hoje existente para a

objectivação destas práticas, que ocorre em estudos através dos quais, diversos

os autores dão prossecução a artigos e investigações sob temáticas tão variadas

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Introdução

4

como o Turismo (Fernández, 2002; Costa, 2006), a Educação Ambiental (Chao,

2004; Marinho, 2004) ou a dimensão simbólica da Aventura (Feixa, 2002).

Estas novas práticas oferecem, aparentemente, resposta às necessidades

impostas pelas formas de vida hoje aceites e experimentadas (Elias, 1992; Betrán

e Betrán, 1995a; Pereira e Monteiro, 1995), tornando-se um objecto de estudo

capaz de gerar um extenso e complexo espólio bibliográfico, que reúne tópicos de

interesse articuláveis de forma evidente com variadíssimas áreas da nossa

sociedade. Assim, e perante um tão vasto legado de obras e artigos – que focam

os aspectos práticos das actividades em causa, a sua ética, as responsabilidades,

as razões, as preocupações, os contextos, a relevância, a coerência e as

perspectivas das partes envolvidas no fenómeno –, torna-se fundamental procurar

entender de forma mais evidente que relação ou relações se estabelecem entre

estas e os novos valores, princípios e carências dos seres humanos, enquanto

seres sociais.

É nossa intenção, através de uma exaustiva revisão bibliográfica, estudar a

temática das Actividades de Ar Livre, com o intuito de entender as suas

interactividades com os valores e consequências da sociedade actual. Para tal,

dividimos o nosso trabalho em 3 partes fundamentais: Num primeiro capítulo

dedicar-nos-emos ao exame do nosso objecto de estudo na sua relação com o

quadro axiológico, procurando definir plenamente a imagem destas novas práticas

e da sociedade em que as mesmas se estabelecem; Num segundo capítulo

procuraremos descrever e compreender as grandes questões que hoje surgem

associadas ao nosso objecto de estudo, e que hipoteticamente definem os

grandes tópicos de relação com as principais instâncias da sociedade actual; Num

terceiro capítulo procuramos estabelecer um possível cenário de futuro para o

nosso objecto de estudo, admitindo que todos os factores considerados ao longo

da revisão bibliográfica poderão de alguma forma ser intervenientes no seu

delineamento e que a exactidão da prognose, pela vastidão de variáveis

envolvidas, será potencialmente complexa.

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22.. DDEESSEENNVVOOLLVVIIMMEENNTTOO DDOO PPRROOBBLLEEMMAA

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Desenvolvimento do Problema

7

2.1 Objecto de Estudo: do quadro axiológico à legitimação da prática

2.1.1 Contexto Social: valores, dinâmica e necessidades

En nuestra sociedad pluralista y relativista

todo vale, todo fluye y nada permanece, lo

nuevo rápidamente se hace viejo.

(Gervilla, 1993: 18)

Como referimos na introdução do nosso trabalho, ocorrem transformações

na sociedade actual que são acompanhadas por modificações profundas nas

crenças e atitudes do ser humano, que se verificam também nas novas posturas

face ao fenómeno desportivo. Como afirma Bento (1997), não é estranho que se

procure debater e reformular a temática do desporto, num início de século tão

dinâmico do ponto de vista da mutação de princípios e valores sociais e de tão

evidentes alterações de crenças respeitantes à cidadania.

Para um melhor entendimento do nosso objecto de estudo, será imperativo

conhecer e entender esta mutável sociedade a que nos referimos, procurando

compreender as mudanças axiológicas que lhe são subjacentes.

Vivemos um período de complexidade e inquietação, no qual as sociedades

– de crise permanente, do efémero e do transitório (Gervilla, 1993), numa situação

de vazio, ou, a um nível mais profundo, de transição (Sousa Santos, 2002) –

parecem claramente devedoras do processo e projecto da modernidade (Silva,

2002: 32). Este parece ser o núcleo do problema do novo quadro social

(Lipovestsky, 1983; Gervilla, 1993; Silva, 2002), impossível de definir, por si só, de

modo exacto e consensual, compreensível apenas na relação com o seu anterior

– que se entende de oposição, ruptura, crítica, distanciamento, fracasso, projecto

inacabado (Gervilla, 1993) ou transição com momentos de ruptura e momentos de

continuidade (Sousa Santos, 2002: 92).

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Desenvolvimento do Problema

8

Para Lipovetsky (1983), Gervilla (1993), Silva (2002) ou Lyotard (2003),

referimo-nos ao contexto social actual como Pós-Modernidade, mas esta

perspectiva está longe de ser consensual. Segundo Sousa Santos (2002), a

considerar-se a extinção da modernidade, esta seria complexa, definindo-se

parcialmente como um processo de superação – na medida em que são

cumpridas algumas das promessas desse projecto, e até em excesso – e de

obsolescência – pela irremediável incapacidade do cumprimento das restantes.

Mas a extinção não é um termo recorrente e a perspectiva de ordem parece ser

outra. Autores como Giddens, Beck e Lash (2000) negam a entrada na Pós-

Modernidade, defendendo uma modernidade tardia (Giddens, 1994) ou uma

modernização reflexiva (Beck, 2000) – uma ordem nova na qual as consequências

da modernidade se tornam mais radicalizadas e universalizadas (Giddens, 1994:

2). Também Pereira e Félix (2002) referem a radicalização dos princípios

existentes e vividos, afirmando os novos valores como resultantes desse processo

e seguindo uma linha de pensamento mais ou menos consensual. Como afirma

Beck (2000), a modernização reflexiva pode ser vista como uma radicalização da

modernidade, que quebra os contornos da sociedade industrial e origina um

período de autoconfrontação.

Perante as diferentes opiniões relativas à época de crise na qual vivemos,

impõe-se que, para sua melhor compreensão, entendamos o processo evolutivo

que lhe é inerente e que passamos a analisar de forma resumida. Segundo

Gervilla (1993), com o eclodir do Renascimento a ideologia Deus-Homem-Mundo

ganhou posição fundamental na sociedade, tendo mais tarde sido substituída pelo

dogma do Antropocentrismo, que colocava o Homem no centro de tudo. Com o

declínio da Igreja Católica e a revolta contra as instituições estabelecidas, o tempo

da austeridade dos costumes dá lugar a uma certa exuberância da vida (Garcia,

2005:17) e o Homem, através da Ciência, substitui Deus no centro da sociedade –

as explicações científicas tomam o lugar das anteriores explicações divinas e as

crenças religiosas são remetidas para a esfera da vida privada (Touraine, 1994).

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Desenvolvimento do Problema

9

Registaram-se séculos de profundas mudanças, que afectaram de forma

evidente vários domínios da sociedade como o conhecimento, tecnologia,

economia, política e religião (Silva, 2002). O sucesso da Ciência, a separação das

doutrinas religiosas e a afirmação da Razão Pura, representam o culminar do

projecto de emancipação e libertação da espécie humana (Gervilla, 1993) e com o

progresso baseado na Ciência e na Razão – factor que fornecerá explicação para

tudo, uma vez que tudo é, à partida, inteligível (Gervilla, 1993) – surge a

sociedade moderna, não em simultâneo por todo o mundo, mas com evidente

prioridade nas sociedades ocidentais (Silva, 2002).

A modernidade não representa a mudança pura, mas a difusão dos

produtos de actividade racional, científica, tecnológica e administrativa (Touraine,

1994, p.21) em sociedades enquadradas por Estados-Nações, marcadas pela

expansão industrial – que reorganizou as classes e originou processos de

urbanização característicos –, pelo forte crescimento demográfico da população e

pelo valorizar o tempo de trabalho (Silva, 2002).

O projecto da modernidade parece ter estado intrinsecamente relacionado

com o capitalismo – expressão do período no plano económico (Touraine, 1994) –

e com a industrialização, baseando-se em dois pilares fundamentais – o da

regulação e o da emancipação (Sousa Santos, 2002) – e revelando como

características de identidade: o domínio racional das coordenadas do espaço e do

tempo; o desenvolvimento de mecanismos e processos de dexcontetualização e

recontextualização dos factos e actos; a apropriação reflexiva do conhecimento –

com a revisão contínua dos objectivos e estratégias de acção; a circulação de

informação e produtos por diferentes contextos sociais; o desenvolvimento dos

sistemas abstractos científicos e técnicos – que garantiam formas de interpretação

e acção cujos fundamentos e legitimidade eram virtualmente universais (Giddens,

1994; Silva, 2002). Terá prevalecido, nesta época, a pluridimensionalidade

institucional, sendo o capitalismo, a vigilância, o poder militar e o desenvolvimento

industrial as dimensões a ponderar (Giddens, 1994).

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Desenvolvimento do Problema

10

Para Lipovetsky (1983:11), a sociedade moderna era conquistadora, crente

no futuro, na ciência e na técnica; instituiu-se em ruptura com as hierarquias de

sangue e a soberania sacralizada, com as tradições e os particularismos, em

nome do universal, da razão, da revolução. O autor refere-se a esta época no

pretérito perfeito, sendo ele próprio um dos maiores apoiantes do seu término ou

superação. Como já referimos, o novo quadro social – independentemente da

terminologia pela qual optemos para a sua nomeação – não pode ser visto sem a

compreensão da falência, da superação, da vitória ou da destruição criativa do

processo da modernidade – ou de parte do mesmo.

Vivemos agora numa era onde vigora o descrédito da Razão, a perca do

fundamento, o surgir da fragmentação moral, o esteticismo, a dissolução do

sentido histórico e o pensamento débil (Gervilla, 1993). Uma época de

descontextualização e recontextualização das formas sociais industriais (Beck,

2000). Uma sociedade cosmopolita global cujos contornos ainda mal conseguimos

vislumbrar (Giddens, 2002), na qual se exige uma disciplina emocional global

(Elias, 1992), onde o risco faz parte do quotidiano (Beck, 1992) e em que aparece,

com força crescente, a obsessão pela diferença e especificidade (Touraine, 1994).

A tão objectivada e fundamentada Razão, que imperava e se havia tornado

o princípio e o meio da emancipação – libertação do indivíduo face aos

constrangimentos arbitrários do costume, da tradição ou da dominação (Silva,

2002) –, é posta em causa. O descrédito e desencanto pela Razão, referidos por

Gervilla (1993) e Fernandes (1999), apoiam-se na insegurança, nos enganos e

nas decepções criadas pela tomada de posição do progresso tecnológico, a par

dos acontecimentos históricos desprovidos de sentido racional – como as duas

Grandes Guerras Mundiais, Hiroshima, extermínios étnicos, as guerras do

Vietnam e do Golfo Pérsico, entre outros (Lipovetsky, 1983; Gervilla, 1993).

Somos conduzidos a um relativismo e subjectivismo que afecta todos os âmbitos

do ser, do conhecer e do viver, originando um pluralismo e politeísmo de valores

que torna difícil distinguir os mesmos dos seus antónimos – assim se justifica a

perda de fundamento: deixamos de ter uma razão para conhecermos uma

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Desenvolvimento do Problema

11

pluralidade de razões, uma multiplicidade de formas de justificação (Gervilla,

1983). Tudo aquilo que provém do passado e se apresenta como provido de

racionalidade tende a ser reinterpretado, reavaliado ou mesmo abandonado

(Fernandes, 1999).

Nesta época – chamemos-lhe, como muitos, Pós-Modernidade –, o prazer

tende a ditar as regras de desenvolvimento (Lipovetsky, 1989). O hedonismo

estabelece-se como um dos valores mais significativos da sociedade e a busca do

prazer assume um papel fundamental na cultura actual, na qual o indivíduo

adquire um estatuto de centralidade (Pereira e Félix, 2002). Nesta perspectiva,

como explica Heinemann (1994), as investigações sobre a alteração de valores da

nossa sociedade parecem indicar uma diminuição da importância da

competitividade na vida social e a substituição do resultado futuro pelo desfrute do

presente. Mais importante do que o esforço é a busca do máximo de prazer no

que se faz (Pereira e Félix, 2002). O hedonismo reporta-nos aos processos –

segundo Pereira (2004), transformações características da sociedade

contemporânea – de personalização e individualização referidos por Lipovetsky

(1983) numa sociedade que pretende viver livre e sem coacção, escolher sem

restrições o seu modo de existência (p.10), que pretende viver já, aqui e agora

(p.11), no presente e não já em função do passado e do futuro (p.49) e na qual o

indivíduo subsiste como um valor principal, intocável, indiscutível através das suas

múltiplas manifestações (Costa, 2006: 15).

Segundo Lipovetsky (1983), o valor da realização pessoal, do respeito pela

singularidade subjectiva, da personalidade incomparável (p.9) foi promovido e

incarnado pelo processo de personalização, processo visto como o novo modo de

organização e orientação da sociedade, que se pretende com o mínimo possível

de coacção e o máximo possível de opções, com o mínimo de austeridade e o

máximo de desejo, com o mínimo de constrangimento e o máximo de

compreensão (p. 8-9). O indivíduo vira-se para si próprio e passa a estar no centro

da sua acção, onde as questões pessoais se tornam essenciais e a realização

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Desenvolvimento do Problema

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pessoal se destaca como objectivo principal, orientando a actuação pelo princípio

do prazer (Giddens, 1994).

O fenómeno de individualização – o direito de o indivíduo ser

absolutamente ele próprio, de fruir ao máximo a vida (…) inseparável de uma

sociedade que erigiu o indivíduo livre em valor principal (…) transformação dos

estilos de vida associada à revolução do consumo (Lipovetsky, 1983: 9) – é, para

Fernandes (1999), um movimento através do qual, sem perder totalmente os

ligames sociais ou romper com os mesmos, a pessoa se afirma em crescente

autonomia e age com um certo distanciamento do seu meio ambiente. Segundo o

autor, o indivíduo, que surgia dissolvido na colectividade e numa existência

essencialmente comunitária, adquire por este processo a liberdade e

subjectividade, tendo os outros como fonte alimentadora do crescimento e

desenvolvimento pessoal. Segundo Tulloch e Lupton (2003), o processo de

individualização oferece tanto a liberdade de escolha, como a esmagadora

responsabilidade inerente à mesma – esta, passível de fornecer novos riscos, a

associar aos já verificados na sociedade.

Nesta sociedade, também sociedade de risco, os processos industriais e

paradigmas sociais a ele relacionados produzem riscos que – devido aos modelos

de globalização da modernidade tardia – ignoram fronteiras geográficas, sociais e

socioeconómicas (Beck, 1992). A globalização – um fenómeno revolucionário, de

natureza política, tecnológica, cultural e económica, profundamente influenciada

pelo progresso dos sistemas de comunicação – ajuda a definir este importante

período de transição, no qual as mudanças que afectam quase tudo o que

fazemos não estão confinadas a uma única parte do globo (Giddens, 2002). Os

riscos globais verificados na nossa sociedade são resultados, também, embora

não só, das dramáticas mudanças nas estruturas das vidas privadas, que

enfraqueceram as tradições e obrigaram ao processo de individualização (Beck,

1992).

Na opinião de Touraine (1994), o indivíduo é agora um ser activo, centrado

em si próprio e ansioso pela auto-realização, o que uma vez mais nos conduz ao

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Desenvolvimento do Problema

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tema do prazer. O hedonismo, durante muito tempo exclusivo das classes

privilegiadas, foi sendo transformado em comportamento quotidiano pela

sociedade de consumo (Betrán e Betrán, 1995a) e originando, a par do fenómeno

de individualização, as individualidades hedonistas e narcisistas referidas por

Gervilla (1983), Lipovetsky (1983) e Lyotard (2003). Para Lipovetsky (1983), é

claro que o processo de personalização continua a alargar as fronteiras da

sociedade de consumo, cujo fim foi precipitadamente anunciado.

A sociedade de consumo que ainda hoje vivemos – surgida em estreita

ligação com a sociedade moderna, com a produção de massa, com a melhoria

dos rendimentos e bem-estar e com o alargamento dos mercados – não surge

apenas ligada às necessidades de escoamento comercial de produção em série e

às melhorias de rendimentos, mas também à aquisição de certos direitos por parte

dos trabalhadores, traduzidos na redução dos horários de trabalho, no direito ao

descanso semanal e nos períodos de férias remuneradas, que conduzem à

libertação de um tempo individual (Silva, 2002).

Também Garcia (2005) explica que o tempo de trabalho (p.15) tem vindo a

baixar de forma notória, tendo como consequência um aumento do tempo de não

trabalho (idem), tornando os conceitos de recreação, lazer e tempos livres em

expressões quase definidoras da nossa época. Segundo a sua opinião, o lazer,

mobilizando toda a sociedade quer para a sua vivência quer para a sua reflexão

(idem), constitui-se num fenómeno social total, isto é, segundo Durkheim (1987:

39), toda a maneira de fazer, fixada ou não, susceptível de exercer sobre o

indivíduo uma coerção exterior: ou então, que é geral no âmbito de uma dada

sociedade tendo, ao mesmo tempo, uma existência própria, independente das

suas manifestações individuais.

Aliado à redução de tempo de trabalho, ao aumento da esperança média de

vida, ao aumento dos patrimónios familiares, ao maior tempo de escolaridade

obrigatória e tardia inserção no mercado de trabalho, a uma precipitada reforma

das populações, à melhoria dos cuidados médicos que proporcionam uma maior

mobilidade aos indivíduos de idades mais avançadas e à diminuição de

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Desenvolvimento do Problema

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importância dos tradicionais modelos de conduta ditados por factores sociais como

o sexo e a idade entre outros (Heinemann, 1994; Garcia, 2005), surge um caos de

práticas corporais ante o homem pós-industrial (Betrán e Betrán, 1995a). Note-se

que, como afirma Garcia (2005), se é difícil para o homem o trabalho, mais difícil

se torna o divertimento (p.22). Segundo o autor, a organização social sofre pelo

surgimento do ócio – que torna imperioso o aumento e diversificação das ofertas

de lazer, não se esgotando esta premissa na oferta desportiva – e com a

crescente valorização da parcela de tempo a que se podem atribuir sentidos

pessoais diferenciados. A ampla variedade de actividades de lazer existentes

estabelece-se, actualmente – e em resposta a esta e outras necessidades –, como

um dos principais traços de identidade das sociedades do nosso tempo (Elias,

1992).

Por tudo o anteriormente analisado, podemos afirmar que a Pós-

Modernidade optou pelo singular, a sociedade como meio, sempre ao serviço e

subordinação da pessoa, na qual a postura tipo é bem expressa na atitude dos

jovens, desresponsabilizada e despreocupada, posição de quem só tem uma vida

que viver e um presente que gozar (Gervilla, 1993), mais do que uma ética, uma

estética (Betrán e Betrán, 1995a; Pereira e Félix, 2002), ou uma estética sem ética

(Gervilla, 1993), que juntamente com a fragmentação moral gera valores de

afectividade, sentimento, prazer, narcisismo, novidade e aculpabilidade (Pereira e

Félix, 2002). É nesta sociedade – hedonista, pós-industrial, individualista,

narcisista, de múltiplos valores e razões, ainda e cada vez mais de consumo de

massa, que busca o prazer, a realização, o presente e com cada vez mais espaço

para o lazer e ócio – que procuramos entender o nosso objecto de estudo.

Esta sociedade de transição, de novas revoluções tecnológicas, mas com

fundamentalismos religiosos renascidos, de integração económica planetária, mas

de insubsistência alargada a grandes porções da população, de progresso

científico, mas de dúvida imposta pela epistemologia do mesmo avanço (Silva,

2002), de serviços, de computadores e de actividade mental (Betrán e Betrán,

1995a), que, ao legitimar o individualismo hedonista conjugado ao prazer de

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Desenvolvimento do Problema

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consumo, fez com que novas actividades físicas e desportivas surgissem e

adquirissem lugar de destaque (Pereira e Félix, 2002).

As práticas corporais de carácter recreativo afirmam-se então como a

principal forma de utilização do ócio activo nos países economicamente

desenvolvidos do ocidente (Bétran, 1995) e entre elas destacam-se as Actividades

Físicas no Meio Natural, conhecidas popularmente por Desportos de Aventura,

que têm tido uma difusão vertiginosa nos últimos anos e consolidado o seu lugar

com cada vez mais ímpeto na sociedade (Betrán e Betrán 1995b; Miranda, Lacasa

e Muro, 1995).

Entendido o quadro axiológico actual, importa agora focar atenções no

nosso objecto de estudo, atendendo a esta realidade que o enquadra e no qual o

mesmo subsiste. Conhecendo os valores e atitudes da sociedade, torna-se

fundamental entender a forma como os mesmos o influenciam, o fundamentam ou

a ele se opõem. Desta forma, passamos a analisar as suas características,

formas, origens e razões, tendo sempre como pano de fundo – perfeitamente

interactivo – o contexto social contemporâneo.

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Desenvolvimento do Problema

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2.1.2 Caracterização: das origens ao público-alvo

Cada época tem o seu desporto porque

tem o seu cidadão. Um e outro resultantes

de mutações sociais, sobretudo no plano

dos valores, dos direitos, dos interesses,

dos problemas e das necessidades.

(Bento, 1997: 95)

A não sujeição a uma regulamentação fixa, a grande flexibilidade de

horários, formas, intensidades, modos e ritmos de prática – variáveis ao gosto dos

praticantes –, a originalidade e criatividade, a troca do paradigma do esforço pela

perspectiva do prazer sensório-motor e as fortes componentes de aventura e

sensação são, segundo Miranda, Lacasa e Muro (1995), as características

correntes a todo o conjunto de actividades que aqui estudamos, e que têm como

denominador comum a sua prática num ambiente natural, proporcionador de uma

estreita dialéctica com a natureza (Pereira e Monteiro, 1995: 111). O que

procuramos neste capítulo é a breve caracterização do nosso objecto de estudo,

importante para o seu pleno entendimento e para a melhor compreensão das suas

questões e temas de interesse.

São as Actividades de Aventura, as Actividades de Ar Livre ou Desportos

Sliz – o problema da terminologia será abordado um pouco mais à frente – cuja

génese ocorreu, atendendo às ideias de Domingo (1991), Betrán e Betrán (1999)

e Rico (2002), durante a década de 1960, tendo uma forte difusão nas tendências

sociais das décadas de 1970 e 1980. Na opinião dos autores supracitados, as

primeiras modalidades deste âmbito terão surgido na costa oeste dos Estados

Unidos da América – com o nascer de novas práticas na natureza e o reformular

de antigas actividades praticadas no meio natural –, sendo importadas depois para

o resto das sociedades economicamente avançadas.

As suas origens são diversas e dependem de cada modalidade em

concreto. O seu palco são os principais meios físicos conhecidos ao homem –

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Desenvolvimento do Problema

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aéreo, terrestre ou aquático (Betrán e Betrán, 1995b; Guzmán, 2002; Melo, 2003)

– e como modalidades podem ser referidas: Asa Delta, Parapente, Queda-Livre,

Base Jump, Bicicleta Todo-Terreno, Cicloturismo, Street Luge, Ski, Snowboard,

Passeio Pedestre e Equestre, Montanhismo, Trekking, Orientação, Espeleologia,

Escalada, Mergulho, Surf, Body-Board, Wakeboard, Windsurf, Rafting, Canoagem,

Hidrospeed e Canyoning, entre muitas outras (Betrán e Betrán, 1995b; Funollet,

1995; Guzmán, 2002; Melo, 2003).

Para Costa (2006), como seus atributos particulares, são evidenciados: o

risco e a incerteza associadas à aventura, o desenvolvimento articulado com a

expansão das novas tecnologias, a concepção recreativa em oposição à

competição clássica das práticas desportivas tradicionais e a sua relação próxima

com a natureza. Na opinião de Melo (2003), estas podem mesmo definir-se

simplesmente pelo meio em que se praticam – necessariamente um ambiente

natural ou um local de paisagem humanizada mas de forte componente natural –

que ajuda a estabelecer – pela sua imprevisibilidade e características – o risco e

aventura que lhes são inegáveis (Holyfield, 1999; Costa e Correas, 2005).

As forças e condições totalmente imprevisíveis que oferecem, o risco e a

aventura (Krein, 2007), são o motor principal destas práticas, que se baseiam no

aproveitamento das energias livres (Betrán e Betrán, 1995a; Guzmán, 2002) para

proporcionar todo o leque de sensações – mergulho, vertigem, velocidade,

desequilíbrio, quedas, deslize, incerteza, liberdade e adrenalina (Guzmán, 2002;

Marinho, 2004) –, que as tornam tão apelativas e procuradas. Desta forma, a sua

essência é muitas vezes entendida como uma oposição entre o ser humano e o

meio natural – pelo confronto que se origina entre o indivíduo e as forças –,

embora a perspectiva mais sensata deva considerar o praticante em comunhão

com a natureza (Costa e Correas, 2005).

Para alguns autores, a dimensão da aventura a que nos referimos não

deixa de ser imaginária ou simbólica (Feixa, 2002; Marinho, 2004) – esta é uma

temática que mais tarde abordaremos, num capítulo inteiramente dedicado ao seu

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Desenvolvimento do Problema

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estudo – e a relação entre o nosso objecto de estudo e as novas tecnologias é

mais do que evidente (Betrán e Betrán, 1995a).

O que parece ser um facto é que os novos desportos surgem associados

aos paradigmas da realização pessoal, melhoria da qualidade de vida e

hedonismo, deixando para trás as condições fundamentais do rendimento,

esforço, tensão, competição e procura de marcas de maior performance,

características do desporto clássico (Domingo, 1991; Betrán e Betrán, 1995a e

1995b; Miranda et al., 1995). A motivação do desportista está contida no próprio

exercício físico e nas sensações que a sua prática produz, sendo desnecessária

outra justificação para a sua procura, que não a satisfação produzida pela acção

(Guzmán, 2002).

Como foi anteriormente referido, é importante mencionar a existência de

uma infinidade de termos que pretendem designar e caracterizar estas práticas

(Marinho, 2004, p:51). Esta parece ser uma questão premente e que nos

proporciona todo um quadro de problemas, associados à dialéctica dos autores e

investigadores, bem como à etimologia dos termos envolvidos e à multiplicidade

de formas de interpretação que os mesmos comportam em si ao longo dos

tempos.

Marinho (2004) escolheu o conceito “Atividades na Natureza” procurando

esclarecer os equívocos – existentes do seu ponto de vista – manifestados pelo

emprego de termos como desporto – pela falta de institucionalização e

burocratização destas práticas – e radical – explicando que uma caminhada pelo

bosque pode ser meramente tranquila. Na mesma perspectiva, Funollet (1995)

nega os conceitos de Aventura – por considerar que a mesma é uma concepção

muito subjectiva – e de Risco – por considerar que este limita à partida o público-

alvo passível de ser aliciado. Para Guzmán (2002), a aquisição de características

próprias por parte de algumas das actividades, justifica a necessidade de procurar

aglutinar as mesmas em grupos com distintas terminologias – no caso do autor, os

Desportos de Sliz.

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Desenvolvimento do Problema

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Com base nos trabalhos de autores como Betrán e Betrán (1995b), Funollet

(1995), Miranda et al. (1995), Fernández (2002), Guzmán (2002), Marinho (2004),

Costa e Correas (2005) procuramos apresentar uma lista das denominações

propostas ao longo do tempo, bem como esclarecer as suas interpretações ou as

causas que levaram ao seu uso. Desta forma e segundo os autores supracitados,

são ou foram nomenclaturas sugeridas, as seguintes:

- Novos Desportos: conceito proposto numa tentativa de destacar, nestas

novas práticas, um carácter inovador e estruturalmente distinto do verificado na

concepção clássica do Desporto;

- Desportos Californianos: termo proposto numa clara tentativa de

estabelecer a relação com a origem de algumas das actividades em causa;

- Desportos Fun: conceito que estabelece uma clara e objectiva relação

com o divertimento que tais práticas proporcionam;

- Actividades Outdoor, Actividades (Físicas) na Natureza e Desportos na

Natureza: conceitos que procuram claramente enfatizar o local ou meio no qual as

práticas se desenvolvem;

- Actividades Físicas de Aventura, Desportos de Aventura, Desportos de

Risco, Desportos Radicais e Extreme Sports: termos que referenciam e dão

enfoque à incerteza, risco e perigo físico objectivado;

- Desportos Selvagens e Desportos em Liberdade: conceitos que remarcam

o carácter natural, libertador e incerto, característico das práticas alvo, em ruptura

com a estrutura e civilização dos Desportos da modernidade;

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Desenvolvimento do Problema

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- Desportos Tecnológicos e Desportos Tecno-Ecológicos: termos que

procuram estabelecer uma clara referência à simbiose entre tecnologia e o objecto

de estudo;

- Actividades Deslizantes, Desportos Glisse e Desportos de Sliz: termos

que procuram enfatizar o deslizamento como a forma fundamental de

deslocamento nestas actividades, cuja principal energia de propulsão advém das

próprias forças da natureza.

A lista previamente apresentada estaria incompleta sem a inclusão de

outras terminologias que foram surgindo – referenciadas pelos mesmos autores –

e que agrupam em si conceitos anteriormente referidos. São exemplos:

Actividades Físicas de Plena Natureza e Actividades Desportivas no Meio Natural

– ainda no contexto de ênfase ao meio de prática; Actividades de Desafio na

Natureza, Actividades de Aventura no Ar Livre e Actividades Desportivas de

Recreio e Turísticas de Aventura – no contexto da procura de sensações;

Actividades Deslizantes de Aventura e Actividades Deslizantes de Aventura e

Sensação na Natureza – no contexto dos Desportos de Sliz.

A juntar a este extenso reportório, devemos ainda considerar um importante

leque de denominações, mais recentes, abordadas por vários autores e muito bem

evidenciadas por Pereira e Félix (2002), que não servindo directamente para

nomear o nosso objecto de estudo, acabam por a ele se relacionar. Segundo as

autoras, pode ser considerado natural que também as novas formas de turismo

incluam actividades vinculadas à natureza, dando origem a denominações como

Turismo de Natureza, Eco-Turismo ou Turismo Aventura – este tema será

posteriormente desenvolvido no nosso estudo.

Existem duas denominações que, pelo seu frequente uso nos trabalhos

mais recentes, não poderão deixar de ser analisadas. São elas: Actividades

Físicas de Exploração da Natureza (AFEN) e Actividades Físicas de Aventura na

Natureza (AFAN).

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Desenvolvimento do Problema

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O conceito de AFEN é clarificado por Constant (1994, cit. Pereira e

Monteiro, 1995: 111 e Guilherme, 2004: 16), que nos explica que as Actividades

Físicas de Exploração da Natureza caracterizam-se por movimentos realizados

com ou sem engenhos, num meio natural, complexo, variado e por vezes variável,

com controlo de eventuais riscos. Segundo Pereira e Monteiro (1995), no âmbito

das AFEN podemos encontrar um leque variado de actividades, que se estende

da corrida de orientação e passeios pedestres ao surf e escalada. O termo AFEN

é utilizado no Currículo Nacional do Ensino Básico1 e nos Programas Nacionais de

Educação Física2 pelo Ministério da Educação, incluindo nos mesmos e como

conteúdos temáticos: a Canoagem, o Cicloturismo, o Golfe, o

Montanhismo/Escalada, o Tiro com Arco, a Prancha à Vela, a Vela e o

Campismo/Pioneirismo (Jacinto et al., 2001; Maria e Nunes, 2007).

Pereira e Monteiro (1995) são peremptórios em referir, como valores

fundamentais das AFEN, as fortes componentes de incerteza, conquista e

liberdade – propícias à emoção e aventura, que criam situações específicas de

aprendizagem, apaixonantes para os jovens. Estas fortes componentes de risco e

aventura são apropriadas de forma muito mais evidente no segundo termo que

aqui analisamos, este aparentemente em voga no vocabulário dos investigadores

e autores da área.

Referimo-nos às AFAN, conceito apresentado pela primeira vez por Betrán

e Betrán em 1994, no Congresso Nacional de AEISAD (Betrán e Betrán, 1995a).

Segundo os autores, as AFAN devem ser entendidas como aquelas

actividades físicas de tempo livre que buscam a aventura imaginária – emoções e

sensações perspectivadas como hedonistas e fundamentalmente individuais –,

numa relação com o ambiente ecológico ou natural, situadas e em comunhão com

os valores da Pós-Modernidade. Com o recurso à expressão Actividade Física, os

autores procuram a ruptura com o termo Desporto – que consideram

1 Ver Currículo Nacional do Ensino Básico – Competências Essenciais 2 Ver Programas de Educação Física estipulados para 1º, 2º e 3º Ciclo do Ensino Básico

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Desenvolvimento do Problema

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regulamentado, institucionalizado, competitivo e profundamente associado aos

valores da modernidade –, surgindo o conceito de Natureza numa referência ao

meio comum de prática das actividades. Este meio é ainda salientado como um

dos factores de grande popularização das práticas, pela necessidade de evasão

do meio urbano e escape do quotidiano habitual, mas fundamentalmente pela

resposta emocional que o praticante sente na sua prática – liberdade, sentimento

ecológico, paz, harmonia ou por vezes desequilíbrio e vertigem.

Feixa (2002), optando igualmente pela terminologia AFAN, procura realçar

a dimensão imaginária ou simbólica da aventura – cenário para a gestão

controlada das emoções, nas quais as acções se subordinam às percepções e os

riscos reais aos imaginários –, exacerbando a opinião de Betrán e Betrán (1995b),

que embora afirmando uma tendência geral para a supressão do conceito de

aventura – uma vez que o público-alvo pode sentir-se intimidado pelo factor risco –

, aplicam o termo na sua nomenclatura, reconhecendo importância à busca de

sensações inerentes à prática de tais actividades.

Independentemente das dificuldades sentidas na escolha de uma

nomenclatura ou denominação geral e universalmente aceite, os trabalhos sobre

as Actividades de Ar Livre – ou qualquer outro conceito que se pretenda usar –

multiplicam-se e confluem para tópicos de interesse.

Embora o espólio terminológico existente seja muito vasto, os trabalhos

mais recentes têm optado pela terminologia de AFAN – como é o caso de Costa

(2006), Cunha (2006), Mota (2006) e Resende (2006) –; conceito bem estruturado

mas obviamente passível de críticas por parte de outros autores e investigadores.

Parece-nos admissível observar que este universo carece de uma terminologia

universal e de concordância, facto que facilitaria a definição do objecto de estudo,

bem como a organização da globalidade dos trabalhos na sua temática.

Apesar da sua nomenclatura ser discutível, parece concreto que o tipo de

actividades que aqui estudamos, surge hoje como oferta plural a um público

diversificado, sendo o aumento do número de praticantes estabelecido como uma

das suas principais características (Rico, 2002). Esta ideia é abordada por

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Desenvolvimento do Problema

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Fernández (2002), que afirma que o Desporto Aventura – há muito praticado

apenas por uns quantos “loucos e aventureiros” – se estende agora a um novo

público-alvo, que busca o risco e prazer da aventura, convertendo-se num objecto

de consumo de massa.

Embora tópicos de interesse, a busca do risco, da aventura e a perspectiva

do consumo estão longe de ser as únicas razões que justificam o aumento do

número de praticantes, sendo este incremento hipoteticamente justificável por um

vasto conjunto de razões que legitimam a prática e que analisaremos no capítulo

subsequente. O que é certo é que, parecemos estar perante o afirmar cada vez

mais seguro da natureza como cenário pretendido para as actividades

desportivas, num espaço que se pretende aberto e cuja variabilidade se contrapõe

à clausura do quotidiano (Pereira e Félix, 2002).

A variedade de contextos no qual a prática é procurada serve, por agora,

para nos permitir entender a vastidão cada vez mais notória do público-alvo

objectivado. Segundo os peritos, os praticantes procuram as Actividades Físicas

na Natureza em três âmbitos distintos: o pedagógico ou educativo, o competitivo e

o turistico-recreativo (Bétran e Bétran, 1999; Rico, 2002). Com campos tão

distintos e aos quais se relacionam objectivos tão díspares, é no mínimo lógico

que se considere o alargar do número e das características dos consumidores

envolvidos como um facto.

Como referimos anteriormente, os conteúdos curriculares do sistema

educativo começam a dar importância às actividades desenvolvidas no meio

natural para o desenvolvimento e formação de valores ambientais. Thomas e

Raymond (1998), esclarecendo que muitas instituições escolares não perdem a

oportunidade de proporcionar aos seus alunos experiências e viagens de estudo

temáticas, referem-se à importante função das actividades ditas de aventura na

educação e formação das crianças, expondo brevemente o seu relevante papel na

aquisição de objectivos como consciência ambiental e a sua potencialidade para o

desenvolvimento social e pessoal. Pereira e Monteiro (1995) e Guilherme (2004)

evidenciam bem a importância da presença de conteúdos deste género nos

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Desenvolvimento do Problema

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programas de Educação Física Escolar e Nichols (2000), que se foca no conceito

de educação aventura, aviva o seu potencial para o crescimento pessoal das

crianças e jovens, esclarecendo a sua possibilidade para a formação de adultos.

Todo o conjunto de indivíduos que procuram o meio natural para participar

em algum tipo de competição ou evento desportivo, pode ser englobado no âmbito

competitivo ou profissional referido por Rico (2002). Aparentemente, também este

grupo parece ter tendência a um crescimento – utilizemos a título de exemplo a

exposição de Silva (2003) sobre o sucesso das Corridas de Aventura em Portugal,

ou a de Leite, Vinha e Almeida (2002) sobre as Corridas de Orientação. Mas como

refere Palmer (2002), o número cada vez maior de praticantes atraídos pelos

Extreme Sports varia entre o dos “adeptos hard-core” – completamente fundidos

com o estilo e conhecimento técnico da sua disciplina preferida – e o dos

“guerreiros de fim-de-semana” – que não praticam e possuem pouco domínio

técnico.

Para além dos paradoxais “atletas profissionais” das actividades de lazer, a

imagem do atleta consumidor – comprador de experiência – é cada vez mais

usual, muito pela crescente oferta de produtos por parte das empresas de

animação turística (Betrán e Betrán, 1999). Já não é apenas uma minoria,

dominadora de técnicas desportivas especializadas, a que procura os espaços

naturais, sendo cada vez mais amplo o extracto de população que acede a estes

meios, sem possuir uma estupenda forma física e domínio técnico prodigioso

(Rico, 2002). Segundo Pereira e Félix (2002), não é estranho que se verifique a

vinculação entre este tipo de actividades e as novas formas de turismo activo e,

como nos expõe Costa (2003), são cada vez mais as entidade turísticas que se

associam às empresas de Desportos Aventura, para satisfazer as necessidades e

desejos dos seus clientes. Segundo a opinião da Confederação de Turismo

Português (CTP, 2005), os “consumidores” do Ecoturismo e do Turismo Aventura

são geralmente indivíduos com mais de 30 anos, aproximadamente na faixa etária

dos 40, ainda que também se encontrem viajantes na faixa dos 40-60 anos de

idade.

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Desenvolvimento do Problema

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Podemos então afirmar que, o espectro do actual público-alvo do nosso

objecto de estudo é vastíssimo. Para Rico (2002), são os jovens e adultos de nível

socioeconómico médio-alto os principais demandantes das Actividades de

Aventura na Natureza, representando as crianças, idosos e populações especiais

fracções menos evidentes desse espectro. No entanto, como tivemos a hipótese

de compreender, aquela que parecia a loucura de uns poucos, converte-se na

dedicação e paixão de muitos, que cada vez mais numerosos constituem um

grupo onde não há tendência a marginalizar raças, sexos, medidas

antropométricas, estados físicos ou idades (Betrán e Betrán, 1999).

O nosso objecto de estudo é complexo. O seu sucesso e afirmação são

inegáveis e o crescente público-alvo que lhe surge vinculado é prova visível desse

facto – quer se entenda como causa, quer como efeito. São muitas as suas

características, variando do meio especificamente distintivo onde ocorrem à

multiplicidade de sensações e sentimentos que podem proporcionar. É uma

miríade de termos a que o pretende nomear ou identificar, circunstância que

dificulta o seu estudo e o escrutínio lógico da sua essência.

Durante esta breve caracterização, algumas das propriedades específicas

das actividades aqui em causa foram abordadas escassamente e de forma subtil,

entenda-se, pela sua coerência com outras partes do nosso trabalho onde lhes é

atribuída evidente importância e reflexão.

Entendendo um pouco melhor o nosso objecto de estudo e a sociedade em

que se engloba, importa agora entender a interacção ou conjunção verificada, que

leva à adesão e eleição deste tipo de actividades por parte da população.

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Desenvolvimento do Problema

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2.1.3 Razões da procura e afirmação

Nuevos tiempos, nuevos costumbres,

nuevos usos, nuevos hábitos, nuevas

demandas y nuevas ofertas (...)

(Betrán e Betrán, 1995a: 17)

Como foi anteriormente analisado, foi a plena identificação das Actividades

Físicas de Aventura na Natureza com os valores e atitudes da Pós-Modernidade,

que permitiu a sua progressiva integração na nossa sociedade de consumo e

serviços (Betrán, 1995). As modificações económicas, sociais e políticas do século

passado – das quais emergem valores como o hedonismo, o consumismo, o

individualismo, o gosto pelo risco, a superação e exaltação, a busca das origens e

subsequentes buscas da natureza e dos valores ecológicos – levaram a uma

crescente procura das actividades de ócio, desportivas e na natureza (Pereira e

Félix, 2002). Os “Novos Desportos” aparecem associados aos paradigmas da

auto-realização, livre expressão, afirmação e melhoria da qualidade de vida

(Domingo, 1991; Betrán e Betrán, 1995a e 1995b; Miranda et al., 1995) e, como

veremos neste capítulo, são várias as razões que conduzem à sua procura e

contribuem para a sua cada vez mais evidente afirmação.

O risco físico e o contacto directo com a natureza, que faziam parte do

quotidiano habitual das sociedades pré-industriais, sendo ritualizados, vividos em

contexto de guerra, de festa ou subsistência, tornavam desnecessária a criação de

cenografias especiais para a gestão controlada das emoções (Feixa, 2002). Hoje

são menos frequentes e mais reprováveis a forte excitação colectiva e individual,

as explosões incontroladas e as suas manifestações públicas, a menos que

expressas num cenário socialmente aceite (Elias, 1992). A vida nestas sociedades

industriais modernas caracteriza-se, entre outros, pelos excessos de

regulamentação e de sentimento de segurança, que originam monotonia e falta de

surpresas, levando assim à perda de emoções e sensações e a uma diminuição

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Desenvolvimento do Problema

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da gratificação e satisfação em respeito à própria conduta (Heinemann, 1994;

Costa e Correas, 2005). Para trás ficou a época em que, para ser digno da sua

própria humanidade, o homem devia aperfeiçoar-se e progredir através do

trabalho – usando o mesmo como forma de aprendizagem ao respeito pela própria

vida, de aquisição de qualidades morais, fortificação da saúde, vontade e

perseverança – e tem agora lugar uma era na qual é necessária a “paixão da

mudança”, o gosto pela iniciativa, pelo risco e pelas experimentações ultra-rápidas

(Lipovetsky, 1994:142). Vivemos um tempo cronometrado, comprado, calculado e

compulsivo, até por vezes nos momentos de lazer (Marinho, 2004). Vivemos numa

cidade de betão – de urbanização desregrada, com zonas marginalizadas, novos

focos de pobreza e exclusão, aumento do tráfego, degradação dos espaços

públicos, elevados índices de poluição e excesso de mecanicismos (Pereira e

Monteiro, 1995; Constantino, 1997) –, vivemos o cansaço, o stress, contaminação

e ruídos que a caracterizam (Fernández, 2002), e vivemos preocupados com a

sua incompatibilidade com o homem no plano ecológico, antropológico e social – a

relação cidade-cidadão é uma afinidade de aperto e constrangimento, com o

desejo de divórcio baseado na fuga para a natureza (Bento, 1997).

A vida ao ar livre – por intermédio das Actividades na Natureza – passa a

ser encarada pelo homem como espaço privilegiado para o aproveitamento do

tempo de lazer, como “válvula de escape” do quotidiano repetitivo e maculado,

como resposta à necessidade de reencontro com a natureza – a “sua natureza” –,

como momento socialmente aceite para a vivência e expressão de excitação, local

para procura de novas sensações, aventuras e emoções, perdidas no meio urbano

e social actuais (Elias, 1992; Pereira e Monteiro, 1995; Rico, 2002; Chao, 2004;

Costa e Correas, 2005). O descobrimento de um novo meio, desconhecido e

misterioso, apenas domesticado, desprovido das comodidades habituais, permite

a fuga da rotina quotidiana e da cidade viciada, a procura da satisfação associada

à estimulação emocional carregada de tensões agradáveis, a superação do tédio

diário (Feixa, 2002; Costa e Correas, 2005) e até a adesão a uma moda ecológica,

que se associa ao consumo da natureza (Chao, 2004).

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Desenvolvimento do Problema

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Muitos praticantes experimentam os desportos de Natureza por mera

curiosidade, ou porque as chamadas “actividades radicais” ou “de aventura” estão

na moda (…) outros encaram a actividade como um desporto como outro

qualquer, desprezando tanto os riscos pessoais e ambientais, como as

potencialidades educativas (Melo, 2003:16). No entanto, para os indivíduos

verdadeiramente interessados em actividades desportivas, a interacção

potenciada pelos Desportos de Aventura entre o ser humano e o mundo natural é

valorosa, pelas experiências excepcionalmente atléticas que proporciona – umas

das principais atracções destas práticas é a oportunidade de ter um oponente tão

extraordinário como uma onda de 10 metros ou um pico de 8000 metros de altura

(Krein, 2007). Para além de tudo isso, as novas actividades que envolvem risco

podem ainda oferecer ao seus praticantes, de forma consciente ou não, um

sentido de identidade pessoal que a sociedade em crise de valores já não lhes

confere (Almeida, 1997), uma hipótese de crescimento e desenvolvimento pessoal

(Costa e Correas, 2005) e de controlo e responsabilidade sobre a própria

existência (Krein, 2007).

Como explicam Miranda et al. (1995), são múltiplos os factores que

justificam os fenómenos de crescimento e consolidação destas práticas físicas e

desportivas no contexto social actual, factores que passamos a analisar tendo

como referência os trabalhos de Betrán (1995), Betrán e Betrán (1995b), Miranda

et al. (1995), Pereira e Monteiro (1995), Feixa (2002), Pereira e Félix (2002) e Rico

(2002):

- A vasta gama de actividades existentes – quase ao gosto e desejo do

consumidor – e a alternativa viável que constituem aos modelos desportivos

tradicionais – ainda mais pela harmonia com os valores da Pós-Modernidade –

levam cada vez mais os cenários naturais a destacar-se como espaços para o

aproveitamento do tempo livre dos indivíduos, libertos das suas obrigações

quotidianas;

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Desenvolvimento do Problema

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- A grande flexibilidade destas actividades permite-lhes chegar até grupos

de consumidores muito diferenciados – entre os quais se destacam,

especialmente, os aderentes à sub-cultura juvenil e os aspirantes a “sempre

jovens” – público-alvo crescente que contribui para o aumento de procura destas

práticas;

- As sensações e emoções que suscitam, o sentimento de liberdade e

prazer que proporcionam, o simbolismo que lhes é inerente, a necessidade

mínima de institucionalização e de regularidade de prática, contribuíram

exacerbadamente para a sua grande popularidade, a qual foi ainda mais

fortalecida pela resposta empresarial que permitiu ao praticante obter um serviço

total com o mínimo de preocupações ou conhecimentos;

- Os avanços tecnológicos – que permitiram optimizar os materiais,

equipamentos e artefactos necessários – tornaram mais simples e seguro o

acesso a estas práticas;

- A crescente adesão às actividades relacionadas com a natureza, seguida

de perto pelos agentes económicos e pelos media que nela encontram mais uma

forma de incremento das relações de consumo, criou uma moda do natural, à qual

não escapa o turismo activo – relação de recíproca publicitação e fortalecimento;

- Este tipo de práticas – que apresentam características muito próprias e

diferenciadas – fazem delas modelos de educação por excelência, contribuindo

para a sua crescente procura no contexto da formação e instrução.

A forte necessidade de sensações e emoções (Pereira e Monteiro, 1995;

Miranda et al., 1995; Feixa, 2002), aparentemente perdidas ou minimizadas numa

urbanização demasiado poluída, regrada e mecanizada (Marinho, 2004; Costa e

Correas, 2005), são, sem dúvida, grandes factores de influência para o

aparecimento e consolidação das actividades realizadas em exploração e contacto

com o meio natural (Costa e Correas, 2005), até porque este divórcio, e

prossecução da vontade e necessidade individual, acabam por ter profunda

relação com as dinâmicas e valores da nossa sociedade.

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Desenvolvimento do Problema

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Entre os vários agentes que contribuem para a sua popularidade,

destacamos: as fortes actividades empresarial e comercial que orbitam em torno

deste fenómeno e o surgimento e afirmação das novas formas de turismo activo,

que acabam por demonstrar estreita ligação com as nossas actividades.

Depois de conhecida a realidade da nossa sociedade, entendido o nosso

objecto de estudo e abordada a dinâmica entre ambos – analisada sob a forma de

razões que incentivam e condicionam a relação – consideramos importante, até

para consolidação da investigação de alguns temas já analisados, estudar as

grandes questões associadas ao nosso objecto de estudo, que representam

plenamente os problemas sociais e a forma como a prática aqui objectivada

oferece interacção com os mesmos.

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Desenvolvimento do Problema

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2.2 Temas de interesse na investigação do objecto de estudo

2.2.1 Aventura: sensações e necessidades

Actualmente, la prática deportiva en el

médio natural se llama de forma genérica

deportes de aventura, y a veces deportes

de riesgo.

(Funollet, 1995: 125)

O nível e tipo de risco presenciais – substancial hipótese de lesão ou

mesmo morte para o praticante – continuam a ser para muitos, características

definitivas ou pelo menos conceitos intimamente associados ao nosso objecto de

estudo (Holyfield, 1999; Palmer, 2002; Varley, 2006; Jirásek, 2007; Krein, 2007) e,

no entanto, ou talvez por causa deste facto, a popularidade dos Desportos de

Aventura aumenta significativamente, fazendo crescer o número de adeptos do

extremo (Palmer, 2002; Jirásek, 2007).

Não deixa de ser verdade que os perigos inerentes a estas práticas

aparecem cada vez mais orientados e conduzidos. Como nos explicam Betrán e

Betrán (1999), a notoriedade da oferta empresarial associada a estas

experiências, tem, paradoxalmente, a sua sustentação na busca e fornecimento

da maior segurança possível nas suas práticas, estabelecendo o risco como uma

dimensão imaginária (Feixa, 2002). Até os atletas e aficionados despendem de

enormes esforços para limitar o risco das suas actividades, recorrendo a materiais

específicos e ao desenvolvimento de conhecimentos e capacidades, com o

objectivo de tornar o ambiente o mais seguro possível (Krein, 2007). Mas, apesar

da retórica que sugere que estas actividades são desportos sem azares ou

perigos, as coisas podem correr e, por vezes, correm mal (Palmer, 2002).

O que procuramos entender neste capítulo são os verdadeiros valores e

dimensões do risco, da emoção e das sensações intrínsecas às Actividades de

Aventura, analisando igualmente as razões que levam à procura da ocupação do

tempo de lazer com práticas, notória ou subjectivamente, perigosas.

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Desenvolvimento do Problema

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Nas sociedades avançadas do nosso tempo, muitas profissões, relações

privadas e actividades dependem do autocontrolo individual, sendo limitado o

campo existente para a demonstração de fortes sentimentos, emoções e impulsos

(Elias, 1992). São sociedades nas quais a vida dos indivíduos se encontra muito

regrada (Costa e Correas, 2005), nas quais não mais existe a necessidade de

esforço físico ou mental – substituídos por uma passividade preponderante que

tornou a vida em algo automático e que não requer a actuação humana (Lewis,

2001). Sociedades nas quais tendemos a considerar as emoções como

expressões do nosso Eu privado e interior (Sharpe, 2005) e onde é exacerbado o

poder sobre a própria vida, que ao ser perfeitamente incontestado acaba por privar

os cidadãos da sua própria percepção de auto-determinação (Møller, 2007). Como

refere Baudrillard (1995), de forma a resolver a contradição entre a moral puritana

e a moral hedonista, importa que a tranquilidade da esfera privada surja como

valor disputado, constantemente ameaçado, rodeado por um destino de

catástrofe. É precisa a violência e a inumanidade do mundo exterior para que a

segurança não só se experimente como tal, com maior profundidade, mas também

para que se sinta justificada em escolher-se a si mesma em cada momento.

Segundo o autor, nesta concepção, é fundamental a acção dos media, que

bombardeiam o “consumidor” com informação e factos, embora – como veremos –

a solução possa também ser proporcionada pela vivência de aventuras.

Paradoxalmente, nesta mesma era, a vida vai ficando mais dura e arriscada

no sentido existencial e temos tendência a influenciar as crianças, jovens e

adultos, a tornarem-se mais suaves, menos tolerantes à dor, a lesões e problemas

de stress (Breivik, 2007). Pode ser verdade que, como já referimos, nunca antes

na história tantas pessoas viveram tão relativamente livres de riscos – em termos

financeiros, na perspectiva da saúde e da segurança militar (Møller, 2007), tal

como nos expõe Lewis (2001), ao exacerbar que até a morte foi transformada em

algo irreal, num evento de puro e extraordinário azar, por oposição a algo

inevitável e universal. No entanto, não deixa de ser verdade que, nas sociedades

contemporâneas ocidentais, o conceito de risco ocupa o quotidiano (Beck, 2000;

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Desenvolvimento do Problema

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Giddens, 2000) e que nos últimos anos se têm vindo a intensificar os discursos

emergentes das diversas áreas do saber (ciências sociais incluídas) sobre a sua

natureza e efeitos na vida da população (Tulloch e Lupton, 2003). Podemos,

assim, afirmar que o clima de segurança de que se desfruta, nunca antes na

história foi observado (Costa e Ferreira, 2000), mas que quando comparamos a

nossa situação com a que se viveu em períodos mais remotos, o conceito de risco

assume uma importância nova e peculiar, não definindo a nossa época como mais

perigosa do que as anteriores, mas como uma na qual o equilíbrio entre estes e os

perigos se alterou (Giddens, 2002).

Neste mundo – controlado, planificado e ao mesmo tempo de risco real –,

no qual a manifestação de emoções espontâneas se vê fortemente limitada por

um conjunto de restrições sociais e culturais (Costa e Correas, 2005), a maioria

das sociedades encontrou, segundo Elias (1992), uma contramedida de oposição

às tensões que elas próprias conceberam – enquanto as rotinas públicas ou

privadas da vida exigem perfeito domínio sobre estados de espírito, impulsos,

afectos e emoções, as ocupações de lazer autorizam-nas a fluir livremente num

quadro especialmente criado. Segundo o mesmo autor, de forma simples ou

complexa, as actividades de lazer proporcionam a erupção de sentimentos

agradáveis, frequentemente ausentes nas rotinas habituais, originando – mais do

que a libertação de tensões – a renovação da tensão necessária à saúde mental:

tensão-excitação.

Frequentemente encontradas no mundo do lazer, as aventuras, que podem

ser consideradas um tipo de situação marginal – caracterizada como um estado

corporal em que acontece a contestação de todas as definições socialmente

objectivadas da realidade e que fornece a hipótese de testemunhar e antecipar a

própria (e a alheia) mortalidade (Lewis, 2001) –, bem como um tipo de resistência

aos constrangimentos da desumanização da modernidade (Holyfield, 1999),

fornecem resposta a muitas das necessidades presentemente em evidência na

nossa sociedade. A paixão pela sua busca é tão velha como a própria espécie.

Romper com o quotidiano, com a norma, com o costume e o estabelecido, é um

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Desenvolvimento do Problema

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desejo inconfesso do mortal na sua busca por algo extraordinário na vida e por

algo que possa ser narrado aos seus pares (Bétran e Bétran, 1999).

Quando discorremos sobre a Aventura, não podemos deixar de analisar as

perspectivas de Simmel (1997), para quem cada segmento da nossa conduta e

experiência carrega um duplo significado, simbolizando quer a imediata

experiência que proporciona, quer uma parte do decurso da nossa vida. Eventos,

embora similares, podem possuir diferentes significados no contexto da vida como

um todo, ou, eventos, com distintos significados intrínsecos, podem representar

papéis similares na continuidade da nossa existência. Segundo o autor, as formas

mais comuns de aventura caracterizam-se pelo fornecimento de quebras com a

continuidade da vida, sendo detentoras de um significado mais profundo, dada a

sua ocorrência além do usual desenlace quotidiano. Colocada fora do contexto

significativo da vida como um todo – como uma memória que é unida à realidade

por menos fios do que os da experiência ordinária –, a aventura pode ser vista

como uma ilha na existência, cujos limites são muito mais evidentes do que os da

experiência vulgar. Para o autor, falamos de aventura, precisamente, quando a

continuidade da vida é desconsiderada em princípio, ou quando nem se verifica a

necessidade dessa desconsideração, pela certeza de lidarmos com algo intocável,

fora do comum e inusual.

Subjectiva e controversa, a experiência da aventura apresenta, também, um

aspecto fundamental na sua relação com a emoção (Sharpe, 2005), sendo

aparentemente criada quando os riscos são combinados com a incerteza dos

participantes de estarem ou não à altura de ultrapassar os obstáculos (Morgan,

Moore e Mansell, 2005). Entre as suas componentes, surgem as fortes

possibilidades de dano e desastre, cuja relação com a morte parece fornecer um

apelativo sorteio para muitos indivíduos modernos (Varley, 2006) – pois como nos

explica Pereira (2005) quando a ordem social se furta ao seu papel, é necessário

experimentar o risco no corpo, uma capacidade íntima de confronto com a morte,

sem fraquejar (p. 319).

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Desenvolvimento do Problema

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Verifica-se, na aventura, toda uma busca de sensações aprazíveis, que

permitam ao ser humano conhecer-se a si mesmo, na mesma medida em que

uma criança experimenta o novo mundo que a rodeia na sua infância – é todo um

processo de adaptação (Miranda et al., 1995). A busca da excitação, ou mais

especificamente das sensações, pode envolver, embora não obrigatoriamente, a

tomada de risco (Breivik, 2007) –, cuja aceitação é um dos requisitos da aventura

(Giddens, 2000).

Parece certo que existe um determinado risco em tudo o que fazemos

(Thomas e Raymond, 1998) – inseparável das ideias de probabilidade e incerteza

(Giddens, 2000) –, que a sociedade tende a associar a resultados negativos

(Nichols, 2000), mas cuja definição “oficial” representa como fenómeno neutro de

consequências potencialmente benéficas ou contraproducentes (Tulloch e Lupton,

2003). A vida moderna encoraja a procura de conforto e segurança, mas

aparentemente o ser humano, que quer essa segurança, controlo e previsibilidade

em muitas das áreas da sua vida, procura também os riscos – previsíveis,

controlados, dominados e com os quais lida através das aptidões e competências

–, de forma relevante e considerada racional em determinadas condições (Varley,

2006; Breivik, 2007). Parecemos ter uma besta interior, que por vezes e em

determinadas circunstâncias nos transforma em thrill seekers, que não só aceita o

risco, como o procura (Breivik, 2007).

A teoria do risco é presumivelmente a concepção mais comum para a

justificação da adesão da população aos Desportos Aventura, em grande parte

porque esta se distingue como a característica mais evidente que as actividades

partilham (Krein, 2007) – a constante incerteza e a inexistência de rotina, tornam

impossível a sua remoção das mesmas (Branco, 2002; Krein, 2007) e este pode

surgir numa de duas componentes: mitigável pelas habilidades e experiência do

praticante, ou inerente à prática e incontrolável (Krein, 2007). Assim, os Desportos

Aventura, que oferecerem – senão a própria morte – um toque com o perigo e o

dano, um vislumbre no abismo e a experiência da mutabilidade do ser humano,

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Desenvolvimento do Problema

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poderão permitir ao mesmo tempo, o uso das habilidades e experiências, por parte

dos praticantes, para reforçar o sentido de controlo que refuta os mundanos e

alienados procedimentos do quotidiano, pela habilidosa negociação no fio da

navalha entre a aventura e a desventura (Varley, 2006). São sensações

aprazíveis, que se alcançam a cada dia e a cada nível de mestria, fruto da

instabilidade e insegurança que, quando vencidas, promovem a satisfação e a

auto-afirmação, convertendo-se em sensações de progresso, melhoria e

aprendizagem (Guzmán, 2002).

As práticas desportivas que envolvem o risco proporcionam, ao indivíduo,

um sentido de identidade pessoal que a sociedade em crise de valores já não lhes

confere (Almeida, 1997), tal como nos expõe Pereira (in press), que, ao referir-se

ao mundo do alpinismo, o caracteriza como um espaço privado que permite a

restauração da sensação de espontaneidade e crença no controlo pessoal.

Embora inseparável de muitas das actividades aqui em foco, a ideia de

arriscar a morte ou a lesão grave não é, segundo Krein (2007), o objectivo último

de adesão à pratica, até porque, como explica o autor, se o que o praticante

procura são os puros ímpetos de adrenalina associados ao perigo, existem muitas

actividades sobremaneira mais convenientes e menos dispendiosas em termos de

esforço e desenvolvimento de competências, capazes de as proporcionar. A

importância dada pelos participantes às condições de segurança e ao ambiente

natural, parece, assim, entrar em conflito com o papel do risco como motivador

para a participação em aventuras (Morgan, et al., 2005), tornando possível

equacionar a existência de uma medida de satisfação directamente relacionada

com a sensação de responsabilidade pela própria segurança e uma recompensa,

pela procura da prática, de fonte interna (prazer, alegria satisfação).

Breivik (2007) refere-se a uma teoria de homeostasia – que ajudaria a

entender a procura de perigos numa sociedade focada na segurança e no controlo

–, segundo a qual tendemos a procurar nas nossas vidas o oposto do que

sentimos – justificando desta forma a busca do risco, pelo excesso de restrições e

pela necessidade de quebras com a continuidade do quotidiano. Existem bases

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Desenvolvimento do Problema

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para acreditar que as Actividades de Aventura fornecem resposta a uma

necessidade fundamental – a necessidade de “estar em controlo” (Møller, 2007) –

e que para os atletas – em constante avaliação das suas habilidades, tentando

ampliá-las e superá-las (Krein, 2007) – o desafio é agora muito mais interno,

sendo o adversário a conquistar, o próprio ser, num acto de constante descoberta

do “eu” (Branco, 2002). A valorização do esforço parece catalisar a superação de

si próprio e a necessidade de ultrapassar obstáculos permitindo,

consequentemente, a realização de si (Pereira, 2005: 316). Esta realização

pessoal e superação individual contribuem para a afirmação pessoal e para a

construção de uma própria identidade – facto que poderia ser visto como uma

forma de transgressão, não fossem a construção e re-construção da própria

narrativa identitária, um dos imperativos da sociedade em que coexistimos

(Pereira, in press).

O ser humano procura, então, a aventura, numa tentativa de mitigar

algumas necessidades às quais a sociedade não oferece resposta. Nesta procura,

o homem encontra nos Desportos de Ar Livre uma forma de saciar algumas das

suas ânsias. No entanto, como nos explica Varley (2006), embora possamos

assumir que todos operamos na mesma concepção garantida do termo, as

diferentes personalidades, experiências e situações, fazem da aventura um

constructo infinitamente variável, maleável, fluido, subjectivo e actualmente

parecemos mesmo esquecer a metamorfose da sua versão “ideal”, para a sua

versão de produto “turístico com sabor a aventura”. De facto, temos de admitir

que, para alguns autores, a aventura inerente ao nosso objecto de estudo é

imaginária (Betrán e Betrán, 1995a), simbólica e fornecedora de emoções –

embora fundamentais na perspectiva do contexto social actual – limitadas,

controladas, de certa forma fictícias (Feixa, 2002: 33). Parece, assim, ser verdade

que o conceito de aventura associado a estas práticas tem realmente uma versão

apenas aromatizada com a autêntica essência do termo, facto que no nosso

entender parece associado à premissa de que a venda da extremidade trouxe

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Desenvolvimento do Problema

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mudanças fundamentais às dimensões sociais e simbólicas das Actividades

Aventura (Palmer, 2002).

A prática massiva das AFAN, bem como a lógica mercantil, tendem a

domesticar o risco, calculando-o, minimizando-o e promovendo-o como controlado

(Betrán e Betrán, 1999); as empresas que as comercializam fornecem a desejada

mistura de risco percebido e de organização, onde quase tudo é planeado ao

pormenor para minimizar os “azares” (Holyfield, 1999); a aventura torna-se um

acto mimético, uma dimensão simbólica ou imaginária, onde tudo está controlado,

previsto e tecnificado (Feixa, 2002) e este parece não ser um problema, pois ao

praticante é oferecida a emoção procurada. O êxito das AFAN é explicado pela

resposta que estas fornecem à necessidade que os indivíduos evidenciam de

deixar o mundo seguro e viver uma experiência de risco, embora com toda a

segurança possível, para sentirem a subida de adrenalina e o imenso prazer de

narrarem a façanha aos seus amigos e família (Betrán e Betrán, 1999). O risco

torna-se num factor mais aparente que real (Betrán, 1995), e é através da forma

como este é percebido que parece fluir a dimensão de perigo associada à

comercialização da Aventura, pois, como explica Hollyfield (1999), nem todos os

participantes procuram e exigem a verdadeira acção fatídica, sendo suficiente, por

vezes, apenas a sua aparência para a obtenção da glória e estatuto.

Numa reflexão do que até agora foi analisado, podemos afirmar que os

Desportos Extremos não se encontram marginalizados na nossa sociedade – não

representam somente uma menor classe das actividades motoras e não são

simplesmente uma questão de moda –; estes gozam do máximo de publicidade,

encontram-se no centro da reflexão do desporto e expressam muito claramente as

características da corrente pós-moderna – a crise das experiências, a frustração

existencial, a falta de sentido reflexivo da própria vida –, oferecendo situações que

nos obrigam a pensar de novo pelo significado que fornecem e que não

conhecemos historicamente (Jirásek, 2007).

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Desenvolvimento do Problema

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Embora há muito tendamos a entender as Actividades Outdoor como uma

profunda realidade, devemos aceitar que a autenticidade a que associamos a

experiência da aventura é um nosso constructo. Se esta é entendida como um

espaço para experimentar o real – as emoções genuínas e a essência do nosso

verdadeiro ser –, convém atender ao facto de que a progressão para a realidade

frequentemente descrita como Pós-Modernidade, tende a obscurecer a sua

própria performance (Sharpe, 2005).

Ansiedade existencial, bem como sentimentos de emoção e divertimento,

são fornecidos pela imprevisibilidade das escolhas inerente às actividades em foco

(Manning, 1999), que permitem o desenvolvimento de competências particulares

inexistente nas vidas demasiado rotinadas (Holyfield, 1999). O praticante, em

relação com o meio, procura, através do risco inerente às actividades físico-

desportivas na natureza, elaborar estratégias cognitivas e motoras que permitam o

seu desenvolvimento de modo “seguro” e fácil (Costa e Correas, 2005). Não é seu

objectivo deixar a sobrevivência ao sabor da fortuna ou jogar com a própria vida –

muito embora ao solicitar simbolicamente a morte, o indivíduo confira legitimidade

à existência (Pereira, 2005) –, mas procurar situações que permitam sentir o

controlo e responsabilidade pela própria vida, dependendo a sua continuidade dos

julgamentos e habilidades – no momento em que esta assumpção é adoptada, a

imagem de thrill seaker é alterada para a de atleta na busca do desenvolvimento

de capacidades para atingir objectivos mais árduos (Krein, 2007).

Na aventura abandonamo-nos ao mundo com menos defesas e reservas do

que em qualquer outra relação com ele estabelecida – deliciados por acidentes e

forças que nos podem destruir –, buscando estimulação emocional, novas

sensações e relações sociais, de forma justificada, lógica e numa quebra com a

rotina, e colocando, quer de forma subjectiva ou indiscutivelmente real, a

integridade corporal em jogo (Pereira e Monteiro, 1995; Simmel, 1997; Costa e

Correas, 2005).

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Desenvolvimento do Problema

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2.2.2 Consumo: sociedade e produto consumível

A indústria de massas requer um

consumo de massas. As sociedades

industriais modernas estruturam-se, ao

mesmo tempo, como sociedades de

consumo.

(Silva, 2002: 124)

À nossa volta, existe hoje uma espécie de evidência fantástica do consumo

e da abundância, criada pela multiplicação dos objectos, dos serviços, dos bens

materiais, originando como que uma categoria de mutação fundamental na

ecologia da espécie humana (Baudrillard, 1995:15). É a sociedade em que

vivemos, que não surge após ou em substituição da sociedade industrial, mas em

estreita ligação com esta, podendo ser empiricamente caracterizada pela elevação

do nível de vida, pela abundância de mercadorias e de serviços, pelo culto dos

objectos e dos lazeres, pela moral hedonista e materialista, e estruturalmente

definida como coisa particular pela generalização do processo de moda

(Lipovetsky; 1989; Silva, 2002).

O consumo é hedonista e regressivo, o seu processo é de absorção de

signos e absorção através de signos, o seu lugar é a vida quotidiana. Na sua era

generalizou-se a lógica da mercadoria, que regula hoje, não só os processos de

trabalho e os produtos materiais, mas a cultura inteira, a sexualidade, as relações

humanas e os próprios fantasmas e pulsões individuais (Baudrillard, 1995). É o

consumo como finalidade de vida, como obrigação incessante, muito pela acção

da publicidade e do processo de moda, que tornam os produtos, bens e serviços

em algo de indispensável (Bachelet, 1995).

A sociedade actual representa a apoteose e extensão do consumo à esfera

privada (Lipovetsky, 1983). O que pretendemos analisar neste capítulo, é

precisamente a versão de produto e serviço consumível do nosso objecto de

estudo, que não passa ao lado desta teoria e tendência tão evidente.

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Desenvolvimento do Problema

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Serviço, satisfação das aspirações, relaxamento, diversão, apresentação do

próprio, aceitação e prestígio são conceitos intimamente associados à ideia de

consumo, cujos produtos se estabelecem, acima de tudo, como objectos

economicamente benéficos, de interesse, comercialmente atractivos e com

capacidade para competir num mercado dinâmico como o actual (Heinemann,

1994). A multiplicação do número daqueles que têm acesso aos bens de

consumo, bem como a diferenciação dos grupos – em função da condição,

posição e estatuto social –, que compõem o mercado crescente e heterogéneo,

reportam-nos ao consumo de massa da nossa sociedade (Silva, 2002) e revelam-

nos toda uma problemática quanto à influência desta tendência na vida da

população.

Segundo Giddens (2002), com a globalização, a produção de massa passa

a desenvolver-se à escala planetária, tornando-se possível encontrar os mesmos

produtos em locais tão distintos como a Europa e a África Central. Neste contexto,

Mota (2006) afirma que parecemos tender para a uniformização dos gostos e

opções mas, segundo Lipovetsky (1983), a fórmula da sociedade de consumo não

é isenta de ambiguidade e o acesso de todos a determinados bens e serviços, que

designa uma uniformização de comportamentos, também acentua as

singularidades e o processo de personalização do indivíduo. Segundo o autor, a

era do consumo inscreve-se, por um lado, como regulação total e microscópica do

social e, por outro, como emancipação do indivíduo – este é obrigado a escolhas

permanentes, a tomadas de iniciativa, a procura de informação e a crítica de

produtos anexados ao processo da moda e da obsolência acelerada.

Na opinião de Shoham e Rose (2000), a probabilidade de consumo tende a

aumentar, perante a perspectiva de resultados potencialmente desejáveis – para o

consumidor – advirem desse acto. Assim, a emergência do consumidor como

figura da economia moderna desencadeou modificações importantes nas

estratégias de circulação mercantil dos produtos e tornou cruciais as técnicas que

se dirigem à sua persuasão e condicionamento – como a prospecção de mercado,

a publicidade e os serviços de pós-venda, entre outros (Silva, 2002). Torna-se

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Desenvolvimento do Problema

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então simples entender a ideia de Lipovetsky (1983), de que o processo geral que

tende a regular o consumo, as organizações, as informações, a educação e os

costumes é o de sedução – uma nova espécie de estratégia que governa a vida

nas sociedades contemporâneas, com a sua profusão luxuriante de produtos,

imagens, serviços e com a sua profunda associação ao hedonismo. De facto, uma

grande parte dos bens que hoje consumimos não são directamente proveitosos na

satisfação das necessidades básicas, e mesmo as necessidades que hoje vemos

como básicas já não têm apenas a ver com a sobrevivência e subsistência (Silva,

2002). O homem pode ser visto como um ser com necessidades, dotado de um

intenso princípio de racionalidade formal que o leva a buscar sem hesitação a

felicidade, dando preferência aos objectos que lhe trarão o máximo de satisfação.

O facto desta se revelar inatingível ou inalcançável, leva a história a repetir-se

continuamente, tornando o discurso acerca do consumo articulável, na sequência

mitológica de um conto (Baudrillard, 1995).

A lógica da diferenciação induz à desvalorização e criação de novos sinais

e práticas, assim que se verifica a vulgarização dos anteriores (Silva, 2002).

Assim, a sociedade centrada na expansão das necessidades é antes de tudo o

que reordena a produção e o consumo de massa sob a lei da obsolência, da

sedução e da diversificação, a que faz verter o económico na órbita da forma

moda (Lipovetsky, 1989:213). A circulação, compra, venda, apropriação de bens e

de objectos diferenciados, são hoje a linguagem e o código por intermédio dos

quais toda a sociedade comunica (Baudrillard, 1995). Isto é afirmar, tal como nos

indica Silva (2002: 133), que consumir é manipular signos, é usar objectos como

significantes que exprimem certos significados, lidos segundo um código de

valores e relações que conota estatutos sociais. Esta explosão da moda, que alicia

ao consumo e pela sua aquiescência leva a uma nova forma de expressão, faz

com que a mesma deixe de ter epicentro e de representar o privilégio de alguns –

todos passam a ser arrastados pela embriaguez da mudança e dos entusiasmos,

todos passam a estar submetidos ao seu reino. A sua mensagem é geral e dirige-

se a uma massa profundamente heterogénea, diferenciada pelas condições de

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Desenvolvimento do Problema

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acesso e utilização dos recursos tanto económicos como sociais e culturais

(Lipovetsky, 1989; Silva, 2002).

Discurso de moda é publicidade, que se alimenta do efeito de choque e das

mini-transgressões ou da teatralidade espectacular (Lipovetsky, 1989) e se define

como poderoso agente de socialização, produtor e difusor de modelos de conduta,

símbolos de identificação e princípios de acção propostos para o nosso mundo

quotidiano (Silva, 2002). Esta produz necessidades estritamente adaptadas à

oferta, permite programar o mercado, armadilhar a liberdade dos consumidores

planificando globalmente a própria procura (Lipovetsky, 1989: 257). Segundo Silva

(2002), a sua vertente mediática torna-se no grande difusor da ideologia

consumista (p.137), cuja importância dos efeitos de socialização não cessa de

crescer, modelando grande parte dos grupos de referência das populações,

sustentando, rentabilizando e recriando a aspiração à realização pessoal, ao estilo

de vida e à expressão própria.

A massificação do consumo não está, como vimos anteriormente, apenas

associada às necessidades do escoamento comercial da produção e às melhorias

dos rendimentos familiares, mas também à diminuição média do tempo de

trabalho e à conquista de um tempo individual e livre de obrigações. Para

Baudrillard (1995), este tende cada vez mais a ser directa ou indirectamente

comprado para ser consumido e assim pode ser visto como o consumo do tempo

improdutivo, que representa mais do que o simples gozo do período livre, que a

satisfação pessoal ou o repouso funcional. Relembremos umas das descrições de

Lipovetsky (1994) anteriormente citadas, para evidenciar que há agora lugar uma

era na qual é necessária a “paixão da mudança”, o gosto pela iniciativa, pelo risco

e pelas experimentações ultra-rápidas (p.142). O fenómeno da experiência, que é

um dos mais enfatizados no período pós-moderno, leva a indústria do lazer a criar

a sua própria identidade e a publicitar os seus produtos em termos de experiência

prometida, autêntica, original, extrema, intensiva e profunda (Jirásek, 2007). Com

efeito, o interesse sobre a experiência do consumo é crescente e tornam-se cada

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Desenvolvimento do Problema

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vez mais frequentes os discursos feitos sobre o consumo da experiência

(Hopkinson e Pujari, 1999).

A reposta à necessidade de experiências, também para usufruto e

ocupação do “tempo livre”, sempre foi em parte mitigada pela oferta desportiva,

cumpridora de uma função importante nesse contexto. Segundo Hopkinson e

Pujari (1999), a participação em actividades desportivas não pode deixar de ser

vista como uma forma de consumo – hedonista – que envolve o mercantilismo de

produtos e sempre ao serviço do consumidor. Neste contexto, será importante

atender à opinião de Heinemann (1994), que nos explica brevemente de que

forma a actividade desportiva se destaca cada vez mais como um objecto

económico atractivo no mercado de bens. Para este autor, são hoje apresentados

como produtos: a própria prática desportiva – cada vez mais associada à venda de

saúde, corpos estetizados e bem-estar; as roupas e os equipamentos desportivos,

que hoje são mais do que simples acessórios de prática, mas instrumentos de

auto-apresentação e distinção; o desporto espectáculo – consumido pelos

espectadores que procuram distracção e ao qual se associam cada vez mais as

marcas e outros serviços; e as infra-estruturas desportivas – às quais se associam

também toda uma outra vasta gama de ofertas comerciais.

Seguindo esta linha de pensamento e extrapolando a sua estruturação para

o nosso objecto de estudo, podemos encontrar evidências semelhantes no que

respeita ao “consumo hedonista das actividades de risco” (Shoham e Rose, 2000).

Os novos desportos crescem dentro da civilização do ócio, sendo

incessantemente incorporados pela sociedade de consumo (Miranda et al., 1995)

e levando autores como Betrán e Betrán (1995a) ou Holyfield (1999), entre outros,

a referir-se frequentemente ao praticante das actividades de Ar Livre como

consumidor – relevância dada à importância crescente da resposta empresarial

aos desejos da população, que permite a “compra e venda de emoções”.

Como nos explica Pires (1990), as necessidades criadas pelas campanhas

que visam o consumo, bem como a necessidade de novas formas de preencher o

tempo livre evidenciada pelo consumidor, resultam na crescente procura das

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Desenvolvimento do Problema

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AFAN como mais um produto a ser consumido – uma nova forma de consumo da

natureza (Chao, 2004). Para Betrán e Betrán (1999), é uma importante rede

empresarial que gere actualmente as AFAN, dando resposta à crescente demanda

de um grupo de usuários e apostando fortemente na prestação de serviço a esse

vasto leque da população. Segundo os autores, o marketing empresarial desta

indústria em franco crescimento, baseia-se no simples conceito de que quem

estiver disposto a pagar, pode viver de forma imediata uma aventura única, que

proporcionará intensas emoções, sem necessidades de aprendizagens prévias e

com toda a segurança possível: é a aventura como serviço que se situa ao

alcance de quase todos os cidadãos.

Actualmente, basta que passemos alguns minutos on-line, para que com

facilidade encontremos um vasto número de empresas, que oferecem as mais

variadas actividades nesta área do desporto aventura. São os profissionais, para

quem a persecução das actividades em tempos consideradas marginais, se

metamorfoseou em algo que pode ser fornecido a outros, todos os dias, mediante

pagamento (Varley, 2006). Na perspectiva de Shoham e Rose (2000), da

participação nas actividades aqui em foco, podem advir para o consumidor

benefícios como satisfação da curiosidade, excitação e incremento de estatuto

social. A este último ponto, podemos argumentar, associa-se a importância da

imagem do praticante que pode ser profundamente manipulada pelas formas de

publicidade e apresentações via meios de comunicação social.

De facto, segundo Betrán e Betrán (1995a), os meios de comunicação

social fazem eco da popularidade que assumem estas práticas. Estes terão

inclusive, segundo Branco (2002), ganho a batalha da denominação aos teóricos e

estudiosos da sua essência, baptizando-as de “desportos radicais” e dotando-as

de uma carga de profunda irreverência, loucura e adrenalina. Como nos explica

Lipovetsky (1983), nesta sociedade de consumo inseparável da profusão das

informações, consomem-se em altas doses e por flashes, as actualidades, os

mediatismos, as informações, as músicas, os conselhos, as confissões e os

filmes, numa hipertrofia, numa aceleração da mensagem e da comunicação, que

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Desenvolvimento do Problema

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ao mesmo título que a abundância de mercadorias são parte integrante da nossa

sociedade. As comunicações de massa não nos fornecem a realidade, mas a

vertigem da realidade ou uma realidade sem vertigem (Baudrillard, 1995), facto

bem nos evidente Extreme Sports, pois todos vêm TV, reportagens, webpages

que os satisfazem com imagens extremas e “fixes”, com o uso de linguagens

próprias, das roupas certas ou com este ou aquele suplemento, mas nos quais o

verdadeiro chamamento do desafio e a autêntica experiência da actividade não

representam um propriedade de todos (Jirásek, 2007). Assim, o conhecimento

sobre os hábitos do consumo associados ao desporto tem implicações no

marketing dos produtos e serviços a ele associados, bem como no uso da sua

imagem para a promoção de outros produtos (Hopkinson e Pujari, 1999).

Adicionalmente a intensidade de pertencer a uma cultura de extremidade é

repetidamente amplificada pelos media que, ao associar os seus produtos à

imagem dos Extreme Sports, sugerem aos consumidores que os mesmos são

idealizados para quem não conhece o impossível (Palmer, 2002). É um novo estilo

que se legitima: aventureiro, radical, marca de uma geração, de um grupo distinto

de pessoas, que se identificam pela “vestimenta” de uma nova identidade (Chao,

2004).

Na resposta ao crescimento dos adeptos do extremo, foi possível observar

o inevitável desabrochar de uma indústria notável de meios de comunicação,

dedicada à promoção dos importantes equipamentos especializados e parafernália

associada aos desportos aventura (Palmer, 2002). Paralelamente, criaram-se,

sofisticaram-se e aperfeiçoaram-se artefactos e materiais, fruto da avalanche de

novas tecnologias, que permitem a melhoria de performance, bem como a estética

da prática (Bétran e Betrán, 1995a e 1999), sustendo a proliferação de uma “moda

ecológica” (Chao, 2004). São luvas, óculos de sol, capacetes, t-shirts, sandálias,

equipamento de protecção, bicicletas, ou até cera para pranchas de surf, à venda

e ao discernimento do “comprador extremo” (Palmer, 2002). Guzmán (2002) vai

ainda mais longe, ao afirmar que são os fabricantes e vendedores os verdadeiros

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Desenvolvimento do Problema

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impulsionadores destas modalidades, recorrendo à magnífica visibilidade

publicitária para promover a sua evolução e desenvolvimento.

Embora importante na perspectiva do desenvolvimento e promoção, a

publicitação pode conduzir a desmistificações imprudentes. Segundo Betrán e

Betrán (1999), os acidentes mortais frequentemente postos em foco pelos meios

de comunicação social – que podem pôr em causa a idoneidade destas

actividades e suscitar a eterna discussão sobre a regulação empresarial – são os

fundamentais preços a pagar para garantir o selo de autenticidade imprescindível

ao status das actividades de aventura e risco. Mas, como afirma Palmer (2002),

todo o grande desastre ocorrido no contexto destas práticas poderá, se publicitado

correctamente, ser vendido para lucro, criando produtos que ajudam a embelezar

e construir o discurso da extremidade, pela conversão da luta pela sobrevivência

na imagem do “extreme action hero”, que luta contra os elementos e emerge da

adversidade para se tornar uma classe heróica e à parte.

Segundo Baudrillard (1995), pode agora ser encontrado em toda a parte,

lazer e férias incluídos, o mesmo encarniçamento moral e idealista de realização,

presente na esfera do trabalho. Segundo o autor, tal como o consumo, também o

lazer não é praxis de satisfação, mas só aparentemente assim se manifesta, pois

a obsessão pelo bronzeado, a mobilidade exacerbada, a ginástica da nudez

debaixo do sol obrigatório e o sorriso de viver sem desfalecimento, são

testemunhas da consignação total ao princípio de dever e sacrifício. Como vimos

anteriormente, a par da abundância de produtos e serviços, são características da

nossa sociedade actual a massificação da comunicação e a disponibilização de

informação. Este constante input de informação e bombardeamento dos estímulos

com novas necessidades, fazem com que, segundo Lipovetsky (1989), a realidade

de cada indivíduo se torne insuportável, condenando à necessidade cíclica de

partir – não importa para onde, desde que seja possível sair do lugar onde se está.

Esta ânsia pela novidade – a par do consumo, característica da nossa sociedade –

permite que a partir das práticas aqui em causa, seja possível corresponder à

lógica economicista e à lógica de auto-expressão pelas quais os indivíduos se

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Desenvolvimento do Problema

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parecem guiar, facto que torna, no mínimo, natural, que as novas formas de

turismo se associem também a estas actividades (Pereira e Félix, 2002).

Adicionar o rótulo “aventura” ao termo “férias” parece conferir um brilho

publicitário moderno ao produto (Varley, 2006) e a escolha de destinos, que

praticamente por si só asseguram o seu êxito – nos quais a natureza é o

denominador comum –, torna espontâneo que as novas formas de turismo incluam

actividades vinculadas à natureza e cultura, das quais derivam denominações

como Turismo de Natureza, Turismo Verde, Turismo Rural, Eco-Turismo, Turismo

de Cultura, Turismo de Aventura (Pereira e Félix, 2002; Marinho, 2004).

Na realidade, o turismo assume actualmente, segundo Félix (2002), uma

dimensão mundial de crescente importância, ao potenciar o desenvolvimento

cultural, ao permitir o contacto entre diferentes expressões culturais e ao afirmar-

se como uma das principais actividades económicas. Segundo a Organização

Mundial de Turismo, este é visto como a deslocação, de duração nunca superior a

um ano, de indivíduos a lugares diferentes da sua residência habitual, com o

propósito de férias, negócios ou qualquer outro que não o cumprimento de uma

actividade remunerada no local visitado (CTP, 2005). Convém, no entanto,

destacar que o turista moderno deseja fazer parte da acção, provar, vivênciar e

experimentar (Pereira e Félix, 2002) dando, com esta tendência, procedência à

ideia de Turismo Activo – que deve ser visto como uma peça na engrenagem do

que constitui a oferta turística de determinada região (Martín e Encinas, 2005) –,

conceito associado, também, à relação de desenvolvimento positiva que se

estabelece entre o desporto e as actividades turísticas (Fernández, 2002; Macaya,

2004) –, que origina o conceito de Turismo Desportivo (Standeven e De Knop,

1999; Gibson, 2003), passível de conceder frutos importantes ao beneficiar a

sociedade geral pelo estabelecimento de novos hábitos de prática física (Sallent,

1991).

Aparentemente, afastando-se dos tradicionais destinos seguros, como as

capitais europeias ocidentais, uma nova estirpe de viajantes opta agora pelo

turismo nos centros aventura, pagando a operadores comerciais por experiências,

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Desenvolvimento do Problema

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permitindo às industrias das áreas selvagens entender que os turistas são uma

lucrativa fonte de rendimento e tornando o domínio da viagem de aventura num

fenómeno extraordinário (Palmer, 2002). Este tipo de localizações pode satisfazer

o desejo dos turistas de novidade, assédio ou estimulação, de uma forma

usualmente impossível nas suas rotinas e perto das suas casas (Morgan et al.,

2005), definindo o Turismo Aventura como um mercado potencial – “o creme do

bolo” na montra da pastelaria ou agência de viagens –, que não só funciona como

um produto em si, mas também aumenta o leque de sectores de consumo,

afigurando novas formas do indivíduo gastar o seu dinheiro (Morais, 2003). Os

turistas tendem a ter elevadas expectativas do que devem receber – dado o facto

do acto de partir para longe ser um evento embebido de particular significado – e

assim esperam o extraordinário, sendo potencialmente muito críticos por tudo o

que possa minar a concretização dessa expectativa. Estes serviços

extraordinários não podem, obviamente, ser oferecidos em qualquer local, o que

faz mesmo com que parte do consumido seja a própria localização desse acto

(Urry, 2002). Desta forma, apesar de, ou por causa da relativa inexperiência dos

turistas que participam nestes tipos de actividades – atacados activa e

agressivamente pela indústria como um novo público-alvo –, os seus comerciantes

publicitam-nas inteiramente seguras, mistificando-as como “high thrill, low risk”

(Palmer, 2002) e ao alcance de todos.

Apesar da relativa novidade deste fenómeno, segundo Correia (1997),

evoluímos nos últimos anos de uma situação de escassez de oferta para uma

situação onde o próprio cliente da aventura se define como um recurso escasso,

face à crescente oferta empresarial – o que permite entender o forte

desenvolvimento da indústria. Nesta óptica, considerando o leque de actividades

que a população tem à sua disposição e sabendo que o cliente comprará

unicamente os serviços que forneçam satisfação às suas necessidades e

aspirações, devemos assumir, como explica o autor, que as organizações

encaram os clientes como o seu bem mais precioso – objectivando assim, a oferta

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Desenvolvimento do Problema

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de melhores produtos e serviços do que os providenciados por outras

organizações ou indivíduos.

Segundo Pires (1990), muitas vezes as pessoas aderem,

indiscriminadamente, a práticas desportivas de forma anárquica e anarquizante,

dada essa aquiescência não corresponder a uma necessidade ou desejo adquirido

e cultivado ao longo da vida, mas pela carência de afirmação pessoal e social,

assim suprimidas pela aceitação e pertença a uma moda. A relação que se vai

criando, entre a propagação das AFEN e a sua integração nos serviços de

turismo, é crescente e cada vez mais notória, muito pela evidente e quase perfeita

integração de ambas na nossa sociedade de consumo (Pereira e Félix, 2002). As

actividades físicas no meio natural oferecem respostas lúdicas às necessidades

de experiência da população, por intermédio de agências e empresas (Miranda et

al., 1995), estabelecendo-se assim como uma forma de “compra e venda” de

aventuras, fugas, emoções e sensações (Palmer, 2002). Passar as férias ou os

tempos de lazer em espaços naturais, quanto mais belos e selvagens melhor,

tornou-se, mais do que uma moda, um verdadeiro hábito da nossa sociedade

(Melo, 2003: 13). Negar as regras da vida, recorrer ao espaço físico para negar o

tempo, vivênciar a excepção e poder explicá-la, são o substrato antropológico da

aventura, frequentemente associada à viagem e cujas incerteza do trajecto,

exaltação do desconhecido, implicação corporal com inevitável compromisso

emocional e presença de risco real se tornam elementos imprescindíveis a uma

oferta turística de produtos aventura (Betrán e Betrán, 1999). No entanto, a

aventura desportiva e a prática de desportos em ambientes naturais podem

transformar-se em mais uma das ”taras” da sociedade industrial, que pela loucura

do lucro e do dinheiro pode metamorfoseá-las em novas formas de alienação, por

oposição a formas de realização pessoal (Pires, 1990).

Nesta óptica comercial e mercantil, como referem Pereira e Félix (2002),

torna-se usual que um santuário como a natureza – perspectivada por locais mais

ou menos exuberantes, escolhidos com o objectivo de proporcionar aos clientes

uma atmosfera rica em todos os sentidos – seja invadido por uma série de infra-

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Desenvolvimento do Problema

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estruturas e instalações das quais são exemplos: os espaços destinados a receber

os entusiastas, lojas de objectos promocionais (Holyfield, 1999), as estâncias e

parques aventura (Dougherty, 2007), e aos quais podemos adicionar – já fora do

cenário natural mas também relacionadas com o consumo – as lojas

especializadas em produtos técnicos e algumas arenas desportivas. Assim, pela

loucura do lucro e para a satisfação das nossas necessidades de consumo,

incorremos no risco de transformar a natureza num simples recurso para utilizar

hoje ou no futuro (Mendonça, 1996). Muito embora não seja imprudente afirmar

que alguns praticantes e aficionados procuram a natureza e as suas práticas de

forma independente da rede empresarial que as parece gerir, mesmo estes

acabam por cair na teia da mercantilização, ao dependerem de materiais e

equipamentos comercializados e ao coexistirem com o magnífico desdobramento

publicitário que acompanha as suas disciplinas – factos que levam Guzmán (2002)

a destacar os fabricantes e vendedores como os verdadeiros impulsionadores

destas modalidades.

São actividades e aventuras, férias e viagens, estâncias e parques, lojas

especializadas, objectos, vestuários e equipamentos, modas, empresas e

profissionais, programas televisivos e canais temáticos, revistas, publicações

periódicas e websites que definem as Actividades Aventura – actividades ao

alcance das massas e profundamente rentáveis – como produto de consumo

(Betrán e Betrán, 1995a; Feixa, 2002; Chao, 2004; Varley, 2006; Jirásek, 2007),

naquela que poderá ser considerada a dimensão de Mercantilização da Aventura.

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Desenvolvimento do Problema

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2.2.3 Problemática Ambiental: do meio e da educação

A conservação do ambiente e o respeito

pela natureza, configuram nos nossos

dias uma problemática à escala planetária

(…)

(Pereira e Monteiro, 1995: 115)

Segundo Serres (1990), parece ser verdade que partilhamos com a Terra o

mesmo destino temporal, e que porque a possuímos ela possuir-nos-á novamente

– como outrora, quando submetidos aos constrangimentos naturais –, mas desta

vez de forma global. De facto, podemos afirmar que nas culturas tradicionais e

mesmo na sociedade industrial até ao início desta época, os seres humanos

tinham de se preocupar com riscos originados pela natureza exterior, como

inundações ou pragas, mas que a certa altura, recentemente em termos históricos,

a preocupação passou a ser menos com o que a natureza nos pode fazer e mais

com aquilo que nós fizemos à natureza (Giddens, 2000). Como refere Silva

(2002), a degradação ambiental é no mundo de hoje um problema global – tanto

em amplitude de incidência como de impacto – e, assim, é todo um ecossistema –

mundial – que por ser contínuo e interligado se encontra em risco de destruição.

Nesta mesma sociedade é claramente observável, como anteriormente

analisámos, o aumento da exigência de actividades desportivas no meio natural –

estas vistas por alguns autores como potenciais formas de aceleração da

destruição de habitats ainda preservados (Pereira e Monteiro, 1995; Pires e

Philippi, 2004) –, cuja potencial contribuição para o despertar de uma sensibilidade

e responsabilidade ambiental, colectiva ou individual, não pode ser negada

(Marinho, 2004).

Importa pois entender a dimensão dos problemas ambientais na sociedade

e a sua interacção com o nosso objecto de estudo, analisando a configuração de

uma educação reflectida, que pode contribuir para a intervenção positiva em

ambos: este é propósito do presente capítulo.

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Desenvolvimento do Problema

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Para Beck (2000), as sociedades industriais tardias transitam – como parte

do processo de modernização reflexiva – para sociedades de risco, este cada vez

mais difícil de calcular e controlar, dada a sua capacidade de ultrapassar barreiras

políticas e sócio-económicas por acção do fenómeno de globalização. Para o

autor – que tal como Giddens (2000, 2002) entende os riscos da nossa sociedade

numa perspectiva vasta e estrutural, com tendência para a generalidade abstracta

e esquecendo por vezes o indivíduo concreto –, o conceito de modernização

reflexiva compreende a análise dos resultados da modernidade em termos da sua

produção de riscos – por vezes sinónimos de perigo ou desastre, por vezes

interpretados como constructo socialmente definido e mediado através da lente

dos processos sociais e culturais. Na opinião de Giddens (2000), podemos fazer a

distinção entre dois tipos de riscos presentemente em evidência na sociedade: o

exterior – que nos chega de fora, das imposições da tradição ou da natureza

(p:35) – e o provocado – entendido pelo autor como resultante dos impactos do

desenvolvimento tecnológico sobre o meio ambiente.

Numa construção mais focada no contexto sócio-cultural, e assim

atendendo de forma muito mais evidente ao indivíduo enquanto ser situado,

Douglas e Wildavsky (1982) referem-se à percepção do risco como uma

simulação colectiva que varia consideravelmente ao longo de três formas de

organização social – individualista, hierárquica e igualitária –, o que nos leva a

concluir que a selecção dos riscos a que o público dá atenção, é mais baseada na

voz que processa a informação e no modo como esta é interpretada, do que nas

provas científicas de fortes probabilidades de perigo. Assim, segundo Douglas

(1999), embora longe de ser a primeira civilização a tomar consciência de que o

nosso ambiente se encontra em risco, a percepção e forma como entendemos a

premência da questão é hoje profundamente distinta.

A nossa compreensão dos problemas ambientais é uma construção social,

estabelecida num conceito de ambiente muito fluente, culturalmente baseado e

socialmente contestado (Hannigan, 1995). Assim, somos impelidos a aceitar a

suposição de as formas contemporâneas de degradação serem fruto de

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Desenvolvimento do Problema

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interacções entre as causas demográficas, culturais, políticas e económicas

(Goldblatt, 1996; Silva, 2002), e de se definirem como o problema – de todos os

enfrentados pelo humanidade – mais intrinsecamente transnacional, cujo enfrentar

poderá dar origem a um conflito global ou a uma plataforma de solidariedade

internacional e intergeracional (Sousa Santos, 2002).

Não obstante a degradação ambiental se verificar desde há muito tempo,

só muito recentemente tomou proporções alarmantes – pela urbanização

acelerada, a rápida expansão económica e a utilização irreflectida de novas

técnicas de produção e produtos (Martins, 1990). Segundo Bachelet (1995), o

verdadeiro produto da evolução da humanidade – da qual são factores

constitutivos os poderes científicos e tecnológicos, os modos de vida a eles

associados e as consequências da demografia – é a acumulação dos meios de

destruição pacífica do planeta. Segundo o autor, o homem é um ser poluidor, ou

no mínimo um predador, a tal ponto que a sua própria existência significa poluir e

consumir recursos, fazendo com que, do equilíbrio que tem vindo a ser

assegurado, já nada reste para partilhar, exceptuando aquilo que se adquiriu. Fica

assim exacerbada a dimensão do consumo sob a qual a sociedade se parece

reger, já anteriormente analisada, mas agora entendida sob a perspectiva de

imposição de grandes impactos ambientais. Com efeito, como refere Silva (2002:

54-55), actualmente, o ambiente tanto é ameaçado pela produção industrial

maciça (…), como pelos grandes projectos tecnológicos de colonização da

natureza (…) pela generalização de bens de consumo e hábitos poluidores (…)

pela pressão das populações em crescimento acelerado sobre os bens naturais

disponíveis (…), pelo endividamento brutal dos países pobres e a sua

vulnerabilidade às estratégias de deslocalização e exportação das fábricas

poluidoras. Parece então ser uma verdade que, como afirmam Leite e Caetano

(2004), ao desenvolver actividades baseadas em relações predatórias com a

natureza, o homem criou problemas que ameaçam a própria preservação da

espécie, e seguramente o é que o mundo em que agora vivemos parece – em vez

de a cada passo mais dominado por nós – completamente descontrolado

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Desenvolvimento do Problema

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(Giddens, 2000). Como afirma Serres (1990): à força de a dominar, tornámo-nos

tanto e tão pouco senhores da Terra, que ela ameaça dominar-nos de novo (p:

59).

Entre os problemas ambientais que nos são contemporâneos podemos

destacar e referir: a deterioração da camada de ozono, o efeito estufa e a

crescente poluição atmosférica – frutos das emissões maciças de

clorofluorcarbonetos e dióxido de carbono para a atmosfera –, factos ao qual se

relaciona o aquecimento global e agravados pela desflorestação intensiva,

frequentemente observada pela necessidade alimentar da população em

crescimento exponencial e pela necessidade de exportação de matérias-primas; a

directa poluição dos solos e a sua deterioração pelo usufruto desordenado, que

degradam a terra e assim as condições e possibilidades de cultivo, bem como a

biodiversidade das espécies; a extinção de variadíssimas espécies pela sua caça,

extracção excessiva ou exploração abusiva; a poluição dos oceanos pelo

incontrolado despejo de substâncias nocivas nas águas via efluente industrial,

esgoto urbano e desperdício agrícola – legal, ilegal ou acidental; o abuso de

substâncias como hormonas de crescimento, pesticidas, corantes e químicos na

industrialização da agricultura; os excessos de detritos e desperdícios, lixos

domésticos, hospitalares e industriais, resíduos nucleares e afins; as alterações

climatéricas – hipotéticos frutos dos problemas até agora referidos – que impõem

grandes estragos e fortes limitações no nosso habitat terrestre; entre muitos outros

(Martins, 1990; Figueiredo, 1993; Hannigan, 1995; Giddens, 2000; Silva, 2002;

Sousa Santos, 2002).

Os anteriormente descritos podem ser vistos como as grandes

problemáticas associadas à degradação dos solos e dos oceanos, contaminação

das águas e poluição do ar – necessários imediatos à nossa existência e

sobrevivência no planeta (Leite e Caetano, 2004). No entanto, como refere Silva

(2002), a degradação ambiental não deve ser entendida unicamente na

perspectiva dos problemas e das ameaças ao futuro comum da humanidade,

sendo a mesma representativa de um motivo de agitação, mobilização colectiva e

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Desenvolvimento do Problema

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tema fundamental de debate na sociedade contemporânea. De facto, como nos

refere Hannigan (1995), embora o desenvolvimento do consumismo global tenha

profundas implicações negativas no ambiente e seja, em parte, um produtor ou

facto associado à produção dos riscos aqui em foco, paradoxalmente, acaba por

tornar a protecção da natureza numa actividade de consumo que é culturalmente

formulada. Segundo o autor, o risco e o conhecimento dos problemas que

perturbam o ambiente acabam por ser parte fulcral dos temas da actualidade,

representando tópicos de discussão e preocupação, de certa forma globais. Em

toda esta conjectura, importa atender, no entanto, a uma suposição fundamental.

Como nos lembra Bachelet (1995), o consumo leva à produção – geradora de

poluição e desperdício – baseada em níveis de dispêndio energético que tornam

insustentável, muito pelas supérfluas fontes de despoluição que nos são

conhecidas, a sua perpetuidade. Segundo o autor, por agora tranquilizamo-nos,

segundo a fórmula: isto aguenta (p. 133), e serenamos as multidões com a crença

de que aqueles que sabem estão vigilantes (idem). No entanto, devemos estar

conscientes de que, em algum ponto, o interesse daqueles que sabem poder ser

incompatível com a urgência ambiental – este é um tópico de importância

essencial, que não desenvolveremos de forma mais aprofundada, mas cuja

referência nos pareceu indispensável.

Assim, num momento em que a tomada de consciência dos problemas

relacionados com o meio-ambiente tem aumentado a um ritmo vertiginoso

(Figueiredo, 1993:11), multiplicam-se, por todo o lado, os esforços e discursos

sobre o ambiente, apoiados em movimentos e eventos de massa – factos de

grande impacto social aos quais ninguém fica indiferente, ainda que em termos de

produtividade apresentem resultados muito incipientes. Como exemplos de

acontecimentos com grande impacto, podemos referir o recente evento

“LiveEarth”, com 24 horas de espectáculos musicais, cobertura mundial e ao qual

aderiram 150 dos melhores artistas e bandas da actualidade3, ou o lançamento

3 http://www.liveearth.org

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Desenvolvimento do Problema

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perturbador documentário “Uma Verdade Inconveniente”, que valeu ao

recentemente galardoado Nobel da Paz4, Al Gore, um Óscar da Academia para o

melhor documentário de 2007.

Os problemas mais sérios com que se confronta o sistema mundial – entre

os quais podemos estabelecer a problemática ambiental – são globais, como tal,

exigem soluções globais e estas – urgentes, difíceis de imaginar e

obrigatoriamente desiguais para os diferentes países – terão de ser marcadas pela

solidariedade dos ricos para com os pobres e das gerações presentes para com

as futuras (Sousa Santos, 2002). No entanto, Brodhag (1994) questiona se será

necessária a dramatização da urgência de salvar a Terra, interrogando até que

ponto não poderá esta ser contraproducente face à imensidão da tarefa em causa

– o objectivo a alcançar é representado por um acordo entre povos, capaz de

mediar o término definitivo da perturbação dos equilíbrios dos ecossistemas dos

quais depende a vida no planeta.

Atendendo à dimensão da tarefa torna-se clara, segundo Schmidt (1999), a

necessidade de uma Educação Ambiental – conceito que analisaremos a

posteriori – que deve estender-se de coisas tão elementares como o asseio – dar

a entender como é que, num sistema complexo e global, “porcarias” de tão longe

nos estragam a vida aqui tão perto, tornando a limpeza numa questão de respeito

pelo próximo, que é agora todo o habitante do planeta –, até a assuntos tão vastos

como a compreensão dos circuitos dos problemas económicos e políticos.

Assistimos, então, ao asseverar da “causa verde” (Silva, 2002), num

momento em que, como afirma Pereira (1996), o homem tomou consciência de

que não podia continuar a tomar atitudes destruidoras, e mesmo auto-

destruidoras, e começou a reflectir sobre os problemas que foram surgindo, na

tentativa de salvaguardar o que ainda resta do ambiente natural (p:5). A origem

desta preocupação advém, segundo Raposo (1997), de um processo longínquo,

no qual se verificou a convergência da educação e do ambiente e que deu pelo

4 http://nobelprize.org/nobel_prizes/peace/laureates/2007

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Desenvolvimento do Problema

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nome de Ecologia – este termo terá surgido, em 1866, pela mão do biólogo Ernest

Haeckel (Pereira, 2004) e ter-se-á propagado até à actualidade, embora seja

compreendido com uma essência distinta da que o estabeleceu.

Segundo Bachelet (1995), desde o seu início, os movimentos ecológicos

deram mais a impressão de lutar contra algo, do que a favor de alguma coisa.

Partindo em guerra contra a poluição, e rapidamente descobrindo na economia

vigente a sua origem, estes revoltaram-se contra a economia de mercado, num

ataque confesso aos malefícios da capitalismo predador, esbanjador e hipotecador

de um futuro tão próximo que se confundia com o presente. Segundo o autor, a

ecologia surgiu, então, como uma arma susceptível de impor limites materiais ao

crescimento e de estabelecer novos valores – distintos dos do lucro e consumo –,

conduzindo a novas formas de viver, nas quais reciclagem, recuperação e

redução, passavam a entrar nos vocabulários políticos, economistas e

sociológicos.

Actualmente, tal como nos explica Garcia (1997), a Ecologia não se esgota

no ambiente ou na natureza. Na perspectiva de Bachelet (1995), a ecologia

tornou-se humana, dada a facilidade de estabelecer os saberes sobre os

elementos terrestres, como a base de uma nova ciência social que agrupasse a

quase totalidade dos conhecimentos. A ecologia rapidamente se tornou um

sistema heliocêntrico, ao definir-se como o sol em torno do qual volteia a

totalidade do saber, capaz de impor a sua gravitação a qualquer pensamento

político, social, económico ou cultural. O alargamento do movimento ecológico

trouxe consigo, segundo Martins (1990), desenvolvimentos de grande importância.

As componentes de carácter científico e de protecção da natureza desenvolveram-

se, lado a lado, sob a influência de ecologistas profissionais; começou a

generalizar-se a apreciação pelo ambiente fora das grandes potências mundiais e

a sua concepção tornou-se sobejamente mais vasta. Para o autor, este novo

movimento criou uma concepção mais ampla da relação homem-ambiente,

estabelecendo preocupações, não só com os recursos naturais, como também,

com os valores e tendências do seu uso e gestão por parte da população

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Desenvolvimento do Problema

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Atendendo ao trabalho de Hannigan (1995), a consciencialização sobre a

problemática ambiental parece associada ao “decénio ambiental” de 1970 – época

em que, na opinião de Brodhag (1994), exceptuando alguns visionários, ninguém

levantava o problema da permanência dos equilíbrios ecológicos que regem a

sobrevivência das espécies vivas em geral e da espécie humana em particular (p:

100).

Segundo Lemos (2002), a preocupação dos cientistas com o forte

crescimento populacional, com o aumento dos níveis de poluição e o esgotamento

dos recursos naturais, leva à realização da Conferência das Nações Unidas sobre

o Meio Ambiente Humano – Estocolmo, 1972 –, momento para muitos

considerado como a origem da generalização dos desassossegos com as

questões ambientais. Com base nos trabalhos de Martins (1990), Bachelet (1995),

Hannigan (1995), Lemos (2002) e Resende (2006), passamos a analisar os

principais momentos que deram continuidade a esta inquietação.

A realização da Conferência de Estocolmo introduziu, oficiosamente, a

preocupação sobre as consequências ambientais do, então tradicional, modelo de

crescimento económico, que levaria ao esgotamento dos recursos naturais dos

quais depende a sobrevivência da humanidade. Como resultado desta

conferência, foi criado o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

(PNUMA), agência à qual é imputada a responsabilidade de catalisar a acção

internacional para a protecção do meio-ambiente no contexto do Desenvolvimento

Sustentável – conceito que só mais tarde seria desenvolvido. Estudos em

progresso, que culminam com o lançamento do relatório do Clube de Roma – “Os

Limites do Crescimento” –, exprimem com clareza a premência das questões

ambientais, do crescimento da população, do acréscimo do consumo de recursos

naturais, do aumento dos níveis de poluição e do acentuar das disparidades dos

níveis de riqueza dos países.

Em 1982 – numa Sessão Especial do Conselho de Administração do

PNUMA, em Nairobi, Quénia – uma nova e importante preocupação entra em

cena: a excedência da capacidade de assimilação dos produtos de algumas

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Desenvolvimento do Problema

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actividades humanas, em determinadas zonas, por parte da biosfera. Em

resposta, no ano de 1983, o Conselho de Administração do PNUMA e a

Assembleia Geral das Nações Unidas criam a Comissão Mundial sobre o Meio

Ambiente e Desenvolvimento (CMAD), que termina, em 1987, o seu relatório de

análise – elaborado com o apoio de vários consultores internacionais e com base

na análise de vários aspectos da questão do meio ambiente versus

desenvolvimento – sob o título O Nosso Futuro Comum –, do qual se realça um

tópico particular: o conceito de Desenvolvimento Sustentável – aquele que atende

às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações

futuras atenderem às suas próprias necessidades (Lemos, 2002:13).

Embora sem oferecer planos de actuação, este relatório contribuiu para a

estruturação de linhas orientadoras de acção, no sentido de estabelecer esforços

de cooperação em busca do Desenvolvimento Sustentável, e realçou a

importância da Educação Ambiental em todos os níveis de ensino. Logo após a

sua divulgação, a Organização das Nações Unidas convocou para Junho de 1992

– data à qual eram celebrados os 20 anos da Conferência de Estocolmo – a

Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento

(CNUMAD) – que ficou conhecida como Conferência do Rio (Rio de Janeiro) – e

na qual se preparava a discussão das suas conclusões e propostas. Na

Conferência do Rio foram aprovados vários documentos, dos quais convém

destacar a Agenda 21, pela relação evidente com a Agenda 21 Local que será

discutida de forma cuidada a posteriori.

A Agenda 21 – instrumento teórico e prático para a promoção do

Desenvolvimento Sustentável – constitui um plano global de acção, adoptado em

consenso por 182 países, objectivado para as prementes problemáticas

ambientais. Sugerindo formas de preparar o mundo para os desafios futuros –

atendendo ao Desenvolvimento Sustentável e integrando o desenvolvimento

económico e social como medidas de protecção do ambiente e dos recursos

naturais –, a Agenda 21 incentiva ainda à criação de planos locais, adequados a

cada realidade.

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Desenvolvimento do Problema

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No ano de 1994 realizou-se, em Aalborg, a Conferência Europeia sobre

Cidades Sustentáveis (CECS), onde foi aprovada a Carta das Cidades Europeias

para a Sustentabilidade – composta por 3 partes, nomeadamente a Declaração

Comum das Cidades Europeias para a Sustentabilidade, a Campanha das

Cidades Europeias Sustentáveis e a participação local na Agenda 21, das quais

destacamos esta última.

Segundo Schmidt, Nave e Guerra (2006), a Agenda 21 Local: é um

processo participativo e multisectorial à escala autárquica, que traduz um

programa de acção pluridimensional e requer a participação activa dos cidadãos

nas decisões. Potencia, assim, a proximidade dos governantes e dos cidadãos; é

um instrumento que contribui para o usufruto racional dos recursos, cuja

implementação fica obviamente dependente de uma escala local e cujas medidas

objectivam também as necessidades das gerações vindouras; deve ser um

elemento flexível, cooperante, participativo, pedagógico e dinâmico, cujo alcance

temático vá, obrigatoriamente, muito para além do âmbito estritamente ambiental

dos Planos Municipais do Ambiente; deve envolver empresas, serviços públicos,

instituições educativas, religiosas, científicas, associações, sindicatos, grupos de

interesse e cidadãos; almeja a um Plano de Acção – documento dinâmico de

planeamento que integra diagnóstico, objectivos, estratégias e instrumentos de

acção e monitorização.

Terminando esta análise, resta destacar ainda a realização, em 1996 e

2000, das segunda e terceira Conferências Europeias sobre Cidades Sustentáveis

– em Lisboa e Hannover respectivamente; a realização da Cimeira Mundial do

Desenvolvimento Sustentável – Joanesburgo, 2002; e a conferência de título

Inspirando o Futuro – Aalborg + 10, no ano de 2004, pela necessidade de

consolidar os compromissos estabelecidos 10 anos antes, na conferência

realizada no mesmo local.

Parece então possível asseverar o que foi anteriormente afirmado, isto é,

que parece estar em marcha todo um movimento global, que visa e objectiva a

defesa do ambiente, mesmo atendendo ao facto de esta não ter, nem poder vir a

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Desenvolvimento do Problema

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ter, o mesmo valor em toda a parte – a própria noção de Desenvolvimento

Sustentável tenderá a sofrer muitas adaptações em função das culturas e

tradições, elas próprias associadas às capacidades científicas e técnico-

financeiras que regem os diferentes custos ecológicos (Bachelet, 1995).

Conforme a pesquisa até agora efectuada, podemos afirmar que a

protecção ecológica pressupõe que os países preservem os seus rios e

montanhas, que organizem o seu desenvolvimento de forma sustentável, mas

também que, através da educação, preparem as gerações futuras para essa

mesma protecção (Tavares, 2002). Para que todo o esforço dispendido seja

viável, parece ser necessário investir numa educação a todos os níveis, para que

os indivíduos se possam sentir solidários e co-responsáveis nesta grande missão

de evitar a degradação definitiva das condições existências do nosso planeta

(Lemos, 2002). Nesta lógica, surge o conceito de Educação Ambiental (E.A.), que

se relaciona com a necessidade de expansão de consciências e valores, dada a

urgência de “cuidar” do ambiente global (Schmidt, 1999; Pereira e Monteiro, 1995;

Chao, 2004).

Para Giordan e Souchon (1997), a Educação Ambiental é uma forma

educativa que aborda temas relativos aos problemas do ambiente, dizendo

também respeito às dificuldades da utilização e gestão dos recursos. Segundo os

autores, a E.A. esforça-se por despertar a consciência ecológica, económica,

social e política, as aptidões para resolver os problemas e a responsabilidade

individual (p.12), a fim de preparar os estudantes para a acção responsável e para

a tomada de decisões que respeitam aos actuais e futuros problemas do

ambiente. No entanto, no âmbito da E.A., deparamo-nos com uma grave

problemática. Como salienta Fernandes (1997), todas as acções de informação ou

sensibilização sobre a defesa do ambiente e da natureza têm sido apelidadas de

Educação Ambiental, reflectindo, inúmeras vezes, o desconhecimento de quem as

qualifica acerca das verdadeiras metodologias e conceitos da E.A. Segundo o

autor, são a moda, oportunismo ou mesmo a total convicção dos seus autores,

que transformam os projectos em tentativas de “enverdecimento” das

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Desenvolvimento do Problema

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preocupações (…) processos de propaganda (…) ou “bandeiras de qualidade” (p.

3), tornando a história da E.A numa sucessão de êxitos e fracassos, nos quais,

embora predomine a boa-vontade, fica patente a falta de um instrumento

pedagógico capaz de formar e informar os educadores disponíveis e empenhados.

A E.A. não mais se pretende no formato de workshops vazios de conteúdos, que

fuja aos problemas quotidianos; é uma educação que almeja uma melhor

qualidade de vida, num espaço/tempo em que possamos ser críticos, sonhadores

e assumir os direitos e os deveres para com esta luta; é o despertar de uma

sensibilidade e de uma responsabilidade ambiental colectiva, que alerte para a

necessidade de políticas locais e globais (Marinho, 2004).

Chao (2004) leva-nos a crer que esta educação que pretendemos implica

um trabalho interdisciplinar e conjunto de diversas áreas de experiência e,

segundo Raposo (1997) e Giordan e Souchon (1997), o seu processo deve

almejar objectivos como a sensibilização (tomada de consciência), compreensão

(aquisição de conhecimentos), aplicação (aquisição de atitudes e

comportamentos), execução (desenvolvimento de competências) e capacidade de

avaliação (espírito crítico) para a participação, intervenção e acção responsável

em relação às questões ambientais. As iniciativas de E. A. já partem de diversas

fundações, entidades, universidades, autarquias e associações ambientalistas,

que nos últimos anos levaram a cabo projectos, programas e investigações,

estabelecidos na interacção entre as ciências do ambiente, as didácticas e as

questões sociais, mas cuja penetração se mantém globalmente lenta e com

resultados pouco satisfatórios. Os projectos em causa têm em comum a

contribuição activa para a formação, informação e participação do público mais

jovem, que embora sensibilizado para as questões ambientais, demonstra ainda

que a aquisição de modos específicos de raciocínio se encontra ainda numa fase

balbuciante e que o domínio dos principais conceitos – ordenamento, recursos e

desenvolvimento sustentável – não se encontra ainda assegurado (Giordan, 1996;

Raposo, 1997; Schmidt, 1999).

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Desenvolvimento do Problema

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Baseada na profunda nascente de sentimentos culturais, que encorajam

uma acção positiva em relação a questões de protecção, preservação, educação e

celebração do natural, é visível uma nítida aproximação dos indivíduos à natureza

(Hannigan, 1995) – face à qual, segundo Brodhag (1994), são perceptíveis

diferentes atitudes na nossa sociedade. Se, por um lado, a visão antropocêntrica

define a centralidade do ser humano sobre tudo, por outro, a ecologia inverte o

centro gravitacional do sistema, definindo que o Homem gira em torno do mundo

natural. Na opinião do autor, o contemporaneamente desejável seria um novo

humanismo de cooperação, onde a Natureza fosse vista, não como objecto ou

sujeito, mas como condição de existência. No entanto, segundo Giddens (2000), a

nossa sociedade vive para lá do fim da natureza (p:36), o que obviamente procura

referir o facto de agora existirem poucos aspectos do ambiente material que nos

rodeia que não tenham sido afectados pela intervenção humana (idem).

Aparentemente, podemos considerar que, desde que o ser humano começou a

empregar a mais simples das tecnologias, a relação com a natureza se

estabeleceu como – até certo ponto – mediada, sendo até pouco provável que

qualquer local do planeta possa ser mostrado como inteiramente livre da sua

influência (Dougherty, 2007). Aquilo que, em tempos, permanecia imperturbado e

independente das criações da humanidade, é agora visto como completamente

transfigurado pela acção humana (Giddens, 2002). Da perspectiva de Natureza

Divinizada – na qual não se interpunham ainda os véus da vida civilizada – à de

Natureza Reivindicadora – na qual a existência do ser humano é posta em causa

pela submissão à sua brutal vontade –, passando pela ideia de Natureza

Explorada – na qual o homem se investe no papel de conquistador insaciável –, a

hominização criou urgências pelos efeitos nefastos da sua actividade (Bachelet,

1995). No entanto, independentemente da essência do actual conceito de

natureza, podemos afirmar que a vida ao ar livre é hoje uma necessidade do

homem moderno, que lhe propicia o reencontro consigo próprio (Costa e Correas,

2005), que permite a percepção do ambiente numa outra perspectiva e adjuva a

reflexão sobre o próprio viver (Chao, 2004). Assim, entra em cena o nosso objecto

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Desenvolvimento do Problema

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de estudo, quando, aparentemente, na ânsia de procurar o que resta da natureza

– com o intuito de ocupar o tempo livre, procurar novas sensações, escapar à

rotina, reencontrar o tradicional e as emoções perdidas no espaço controlado

urbano – o Homem encontrou nos “novos desportos” uma forma de realização e

reencontro com o ambiente natural (Pereira e Monteiro, 1995; Garcia, 1997; Rico,

2002).

Embora a ideia ecológica de aproximação do Homem à natureza seja algo

ingénua – uma vez que o ser humano sempre se preocupou em se afastar dela,

enquanto algo exterior a si –, a nova relação que com ela se pretende é uma

relação de coexistência pacífica (Garcia, 1997) –, queremos desfrutar da sua

existência e devemos, para tal, respeitá-la, a todo o momento, mesmo quando a

não experimentamos. Esta “reconciliação”, no entanto, nem sempre tem sido a

mais benéfica para o meio ambiente, cujo equilíbrio é, por vezes, extremamente

frágil (Pereira e Monteiro, 1995:115). Queremos, assim, abordar a ideia por muitos

defendida, de que as actividades de aventura – encaradas como um modo

privilegiado de contacto com o mundo natural e meio através do qual muitos

procuram esse re-aproximar à natureza – produzem riscos que podem não ser

exclusivos para a saúde, vida e integridade do praticante, como faz notar Melo

(2003), ao referir o impacto verificado nos espaços naturais onde as mesmas são

levadas a cabo. De facto, a aproximação à natureza através dos “novos

desportos” tem contribuído invariavelmente para o aumento da pressão humana

em locais tidos como “ecologicamente limpos” (Garcia, 1997), o que em distintos

moldes afecta o meio e cujo impacto será cada vez mais negativo à medida que

se vá observando a crescente massificação, já em movimento, do seu consumo

(Castillo, Fajardo e Funollet, 1995).

O acesso em massa ao mundo natural acarreta consigo problemas

incontestáveis, relacionados com a destruição da fauna/flora, poluição sonora,

erosão e compactação dos solos, abandono de detritos, stress sobre as espécies,

descaracterização das paisagens, urbanização da natureza e alteração da

homeostasia do meio (Pereira e Monteiro, 1995; Garcia, 1997; Fernández, 2002;

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Desenvolvimento do Problema

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Otero, 2002; Pires e Philippi, 2004). A imagem do praticante assume, assim,

frequentemente, o esboço de adversário ecológico – que reduz a natureza a

cenário ou pano de fundo – em oposição à de – esperada – amigo da natureza: o

homem visto dentro desta, numa perspectiva de respeito e coexistência (Brunhs,

2002; Leite e Caetano, 2004; Marinho, 2004).

Muito embora não possam, desta forma, aceitar-se de modo positivo as

actividades desportivas nos espaços naturais se não forem tidas em conta

criteriosas regras ecológicas de conduta, protecção e resguardo do ambiente

(Sequerra, 1996), é inegável a sua potencial contribuição para o despertar da

sensibilidade e responsabilidade ambiental, colectiva ou individual (Marinho,

2004), senão por outra razão, pela premissa de que é mais fácil cuidar daquilo que

se conhece (Pires e Philippi, 2004:149). De facto, segundo Melo (2003), os

Desportos de Natureza apresentam um enorme potencial educativo nesta

vertente, uma vez que não se defende o que não se ama (p. 20) e, na sua

perspectiva, a prática de desportos em ambiente natural é uma das melhores

formas de conhecer a Natureza que temos e de fomentar a paixão pela defesa

desse património, que é de todos nós.

As actividades que requerem os ambientes naturais para a sua realização

parecem, realmente, despertar maiores sensibilidades (Marinho e Gáspari, 2003).

O acto de visitar uma área natural e observar a imensa diversidade que a compõe

– formas, cores e individualidades –, bem como o pensar e o sentir a forma como

dela se faz parte, podem representar para o praticante uma boa oportunidade de

resgatar valores e sentidos adormecidos (Mendonça, 1996). Como afirma Pires

(1990), quando bem utilizada, a dimensão fetichista que a prática destas

modalidades desportivas assume, pode ser um instrumento promotor da protecção

e do respeito pela natureza. Desta forma, tal como destacam Pereira e Monteiro

(1995), podemos assumir que as actividades de aventura no ambiente natural

surgem como uma alternativa desportiva, que permite a valorização da relação

afectiva com a natureza e o respeito pela sua biodiversidade. Mas, como nos

esclarece Marinho (2004), para ser manifesto o desenvolvimento de uma

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Desenvolvimento do Problema

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sensibilidade mais profunda do que a simplesmente necessária para as tomadas

de decisão no decurso das práticas, o trabalho com as actividades na natureza vai

exigir mais do que uma elementar familiarização com as questões sócio-

ambientais e com os conceitos sobre o lazer – vai exigir um envolvimento

dinâmico, intenso, inovador e muito responsável. É o “sentido de preservação” o

que se deve incorporar nestas vivências, uma vez que os seres humanos carecem

de preparação, de atitude e de valores que intensifiquem o seu papel diante da

manutenção dos equilíbrios da natureza (Marinho e Schwartz, 2005).

Parece ser verdade que, como afirma Correia (1997), o desporto aventura

permite o acesso a uma verdadeira educação ecológica. Dado que não se acredita

na possibilidade de preservação sem uma colaboração humana – ordenada e

consciente –, o contacto com a natureza revela-se fundamental, na medida em

que permite ao homem reconhecer-se e entender a necessidade de preservar

outras formas de vida que contribuem para o equilíbrio do ambiente (Chao, 2004).

No entanto, segundo Melo (2003), o conhecimento directo da natureza e a

verdadeira potencialidade educativa destas práticas são muitas vezes

desprezados, pela inconsciência da sua existência ou insensibilidade à sua

enorme importância, não havendo, assim, espaço para aprendizagens

consistentes ou sensibilizações notórias.

Assumindo a potencialidade dos Desportos na Natureza como veículo de

formação, é de fundamental importância que os responsáveis pelas actividades

não sejam unicamente multiplicadores da dinâmica de consumo que se infiltra em

todos os segmentos da sociedade, dado o perigo da questão da protecção do

ambiente poder ser esquecida por trás da “moda ecológica” que imputa novas

responsabilidades aos seus promotores (Heinemann, 1994; Burnhs, 2002; Chao,

2004). Segundo Melo (2003), acima de tudo, os organizadores e

comercializadores destas práticas devem ser imbuídos de uma verdadeira ética de

defesa do ambiente, porque deles dependem todo o comportamento do grupo,

bem como as consequências das suas acções. Tal como referem Marinho e

Gáspari (2003), é necessária toda uma pedagogia, a partir da qual, a percepção

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Desenvolvimento do Problema

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do ambiente natural – com relação às condições de vida na Terra – pode vir a ser

altamente estimulada. A vertente do consumo destas práticas está bem patente na

nossa sociedade e, no entanto, como defende Silveira (1996), a sua direcção tem

de ser encarada num rumo distinto ao do turismo de massa, sinalizando sim,

práticas vocacionadas para a cidadania ambiental – logo associadas à educação –

, perspectivando os turistas-desportistas como guardiães e conservadores do

património natural (Macaya, 2004).

O facto de a iniciação desportiva a estas actividades ser, geralmente,

operacionalizada por via de entidades especializadas, em detrimento da via

escolar (Pereira e Monteiro, 1995), reporta-nos ainda ao consumo e à

comercialização dos Desportos Aventura. Mas, como nos esclarecem Marinho e

Schwartz (2005), as aventuras no meio natural parecem estar a encontrar eco,

ainda que tímido, junto ao contexto educativo, tendo como principal condicionante

à sua implementação a pouca importância que ainda lhes é atribuída. Há que

destacar, porém, que a problemática da conservação do ambiente, não sendo um

exclusivo da educação escolar, encontra aí um instrumento essencial para realçar

um futuro melhor, alicerçado no esclarecimento e formação das crianças (Pereira

e Monteiro, 1995: 115-116). Dado o facto de esta se assumir como o único agente

que garante, de forma equitativa e contínua, a educação a todos os indivíduos da

sociedade, a escola deve assumir um papel fundamental na Educação Ambiental

(Monteiro, 1994), que corresponderá, não a mais uma disciplina autónoma do

currículo, mas, à integração de temas, conhecimentos e informações sobre o

ambiente em todas as matérias de ensino (Schmidt, 1999), entre as quais devem

assumir particular destaque os conteúdos relacionados com as vivências corporais

em contacto com a natureza (Monteiro, 1994).

Desta forma, Marinho e Gáspari (2003) alertam para a necessidade de as

actividades de aventura terem laços estreitos com a educação, pois apenas desta

forma, ambas seriam capazes de vencer desafios e conquistar novos espaços,

ainda carentes de reflexão. A intensificação da aproximação qualitativa do ser

humano à natureza pode acelerar o processo de consciencialização, tornando

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Desenvolvimento do Problema

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efectivo o sonho de harmonia, mais ainda quando, nos espaços institucionais

como a escola, esta pode representar uma excelente condição para a reflexão de

valores catalisadores dessa relação (Marinho e Schwartz, 2005).

Os novos programas e orientações acentuam cada vez mais o carácter

integrador e multidisciplinar da E. A., que deve encontrar – especialmente na

Educação Física, enquanto disciplina na qual é privilegiado o contacto entre o

indivíduo e o meio – apoio para a sua estruturação (Pereira e Monteiro, 1995). O

respeito e conservação da natureza só vingarão, se forem levadas a cabo acções

que a utilizem, de forma activa, como é apanágio das AFEN (idem, p. 116) e só

desta forma, interactiva e integrada, é possível que os homens e mulheres do

futuro tenham uma participação positivamente mais activa e responsável na

preservação e conservação da natureza (Monteiro, 1994). Felizmente, a

popularidade das AFEN faz-se já sentir no mundo escolar e a sua prática vai

sendo um dos programas favoritos de crianças e adolescentes, levando mesmo os

professores a abandonar as salas para partirem à aventura com os seus alunos

(Vasconcelos, 2002).

Para que as pessoas possam encontrar um sentido mais profundo para

suas vidas, podendo realmente desfrutar, compartilhar e desejar a conservação do

mundo natural como algo indissociável de sua própria essência, é preciso todo um

processo de preparação e reaprendizagem, criando as bases para uma nova

relação, em que a razão sucede o sentimento (Mendonça, 1996). Segundo Bruhns

(2004), algumas das práticas aqui em foco, tendo como pano de fundo o

ambientalismo, influem um reencantamento pelo mundo, que, na nossa opinião,

permite o entendimento da natureza na sua vertente mais frágil e romântica.

As actividades definidas como nosso objecto de estudo, revelam um forte

potencial como veículos de formação e sensibilização para as questões de

protecção ambiental. Muito embora não podendo, aparentemente, jogar de forma

independente de outras áreas de saber e formação, ao responder à necessidade

do ser humano de contacto com o mundo natural e permitirem o contacto directo

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Desenvolvimento do Problema

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com a natureza, estas podem revestir-se de uma importante conotação no

desenvolvimento de uma Educação Ambiental, promovendo uma cidadania

individual ou colectiva, estabelecendo e impondo códigos de valores e conduta e

fundamentando a sensibilização necessária às urgências ambientais.

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Desenvolvimento do Problema

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2.3 Perspectivas de Futuro

A aventura desportiva será um dos

grandes interesses desportivos da

juventude (…) que preparará um desporto

diferente, para o próximo século.

(Pires, 1990: 66)

Tendo por base toda a revisão levada a cabo para a elaboração deste

documento, procuramos agora inferir algumas tendências quanto ao futuro do

nosso objecto de estudo – meras hipóteses e conjecturas, estruturadas nas

suposições de alguns dos autores até agora citados.

Começamos por abordar o tema anteriormente destacado, relativo à

terminologia adoptada para a conceptualização das práticas aqui em causa. Como

previamente referimos, é notória a falta de consenso quanto à melhor

denominação para classificar o nosso objecto de estudo, facto que torna

sobejamente mais difícil o escrutínio lógico da sua essência. Verificada a

pertinência da questão, vemo-nos tentados a augurar que uma nova denominação

tenderá a surgir e afirmar-se, para permitir uma melhor abordagem às questões

relacionadas com os estudos desta área. Sob a pena de incorrer no mesmo erro

que anteriormente criticámos, propomos uma nova denominação, hipoteticamente

viável para responder à necessidade em evidência.

Em primeiro lugar, assumimos que o nosso objecto de estudo deverá contar

com uma denominação onde sejam destacadas as suas ligações com a Natureza

e com a Aventura – facto anteriormente salientado por autores como Betrán e

Betrán (1995a e 1995b), Funollet (1995), Miranda et al. (1995), Feixa (2002) e

Costa e Correas (2005) – e, pensamos nós, muito bem evidenciado no decurso do

nosso trabalho.

Em segundo lugar, destacamos uma óbvia tendência nas preocupações

dos diversos autores que até hoje estudaram o tema, que tem sido a dualidade

Desporto – Actividade Física.

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Desenvolvimento do Problema

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Segundo Miranda et al., (1995), os novos desportos e actividades físicas

aqui objectivados aparecem associados aos paradigmas de auto-realização e

melhoria de qualidade de vida, que na perspectiva dos autores pretendem

substituir os anteriormente estabelecidos de competição, esforço e tensão.

Também na opinião de Betrán e Betrán (1995a e 1995b), os novos valores da

sociedade pós-moderna – que encontram eco nas AFAN – surgem em oposição à

cultura corporal fundamentada no esforço, colectividade, superação e rendimento

– característicos da época moderna e dos quais o desporto é o paradigma

máximo. Estes autores justificam a opção pelo conceito de “Actividades Físicas”

na denominação que eles próprios criaram, com a explicação de que o constructo

de Desporto – embora relacionado com actividade física, jogo, recreação – se

entende como actividade regulamentada, institucionalizada e competitiva, na qual

dominam os valores de esforço, superação, produção, competitividade, sacrifício e

treino, com os quais as novas actividades procuram romper (Betrán e Betrán,

1995b). Embora optando pela denominação Novos Desportos, Domingo (1991)

salienta igualmente uma mudança de lógica social no fundamento das actividades

aqui em estudo. Na sua opinião, da concepção clássica que estabelece a meta do

desportista na competição e no atingir de marcas sempre superiores, progredimos

hoje para uma situação onde são o exercício físico e as sensações por si

produzidas que se destacam como principal motivação para a prática. Já para

Funollet (1995), o conceito de desporto reconhece os constructos de actividade

física, competitiva, recreativa, expressiva, regrada, lúdica, técnica e táctica,

tornando admissível que uma actividade física, não competitiva e isenta de regras,

possa ser considerada como desporto, facto que o leva a escolher um constructo

focado na ideia de actividades desportivas.

Numa tentativa de encontrar resposta para esta questão, consultámos a

definição proposta pelo Conselho da Europa, em 1992, segundo a qual se

entendem por Desporto, todas as formas de actividades físicas que, através de

uma participação organizada ou não, têm por objectivo a expressão ou o

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Desenvolvimento do Problema

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melhoramento da condição física e psíquica, o desenvolvimento das relações

sociais ou a obtenção de resultados na competição a todos os níveis5.

Parece-nos aceitável admitir que as práticas associadas ao nosso objecto

de estudo possam ser definidas como Desportos. É inegável que estas surgem

associadas aos novos paradigmas da realização pessoal, hedonismo e satisfação,

muito embora não lhes possam ser vedadas características associadas ao

Desporto clássico ou formal. Quando falamos de esforço, superação, competição,

sacrifício e rendimento, não podemos esquecer as exposições de autores como

Branco (2002), Pereira (2005), Møller (2007) e Krein (2007), entre outros, que nos

relembram que a competição nestas actividades existe, sendo de índole muito

mais interna, onde a superação do próprio e o atingir de melhores performances

num constante acto de superação, se definem como circunstâncias da prática. Na

prossecução desta ideia, podemos afirmar que estas permitem o desenvolvimento

da condição psíquica dos seus praticantes, pela indução da auto-afirmação e pela

constante aprendizagem que proporcionam (Guzmán, 2002), corroborando ainda

a definição da Carta Europeia do Desporto, onde é referida a competição a todos

os níveis. Nunca esquecendo que estas actividades propiciam a expressão da

condição física dos seus praticantes e que, como afirmam Miranda et al. (1995),

parecem promover a participação social e as relações com os pares, parece-nos

indicado afirmar que o nosso objecto de estudo pode ser entendido como uma

forma de prática desportiva.

Atendendo à tendência, cada vez mais acentuada na bibliografia

respeitante à temática, para destacar as características anteriormente referidas,

podemos propor para uma denominação futura, que seguramente vai ao encontro

das perspectivas dos estudos da área, o conceito de Desportos de Aventura na

Natureza (DAN).

5 Artigo 2.º da Carta Europeia do Desporto do Conselho da Europa (1992)

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Desenvolvimento do Problema

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Por causa da relativa novidade que representam, do auge social em que se

encontram e do dinamismo do ramo que as comercializa, estas práticas deparam-

se com um processo interno de crise que, uma vez solucionado, dará origem a um

sector muito mais fortalecido, com uma selecção natural das actividades

envolvidas, as mais sólidas ofertas e um equilíbrio empresarial racional, capaz de

responder qualitativamente à emergente demanda social (Betrán, 1995). No

entanto, segundo Bachelet (1995), basta ser inventivo na criação e logo, ao expô-

la, se exaltam a moda e a publicidade – nas vozes dos que as criam e geram –

seduzindo pela mentira (p. 132) o potencial comprador e fazendo do consumo, a

qualquer custo, a finalidade da vida. Este encanto pela inovação também se faz

sentir na esfera dos DAN dado que, como refere Correia (1997), o Desporto

Aventura não é alheio ao fenómeno da moda. Assim, na opinião do autor, para

permanecer na vanguarda do negócio, tornam-se indispensáveis a adopção de

novas actividades, a alteração das existentes e o investimento em novos

equipamentos baseados em recentes inovações tecnológicas, até porque os

próprios clientes se começam a definir como um recurso escasso e é certo que

estes consumirão unicamente o produto que melhor atender às suas

necessidades e aspirações.

Atendendo à sua apelatividade e nunca esquecendo a óptica do consumo,

estas práticas tornam-se, segundo Sallent (1991), num campo pleno de futuras

possibilidades para os licenciados em Educação Física, tanto em empresas

públicas como privadas, quer em âmbitos de animação quer de docência, não se

esgotando a sua potencialidade nesta hipótese. Segundo Funolet (1989),

Fernández (2002) e Otero (2002), o turismo e o desporto na natureza – se

impulsionados de forma correcta, conveniente e equilibrada – podem jogar um

papel de extrema relevância no favorecimento do desenvolvimento económico e

na participação social nas sociedades pós-modernas, definindo-se mesmo como

alternativas viáveis para o desenvolvimento das áreas rurais e deprimidas.

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Desenvolvimento do Problema

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Para Urry (2002), que se refere a uma tendência de mutação dos padrões

de consumo da sociedade – da sua forma de massa para modelos mais

individualizados – é claro que também no turismo – que segundo Sallent (1991) se

converterá na próxima primeira indústria mundial, enquanto o desporto se

consolida como a principal actividade recreativa da população – se sentirão as

influências destas tendências. Atendendo às ideias de Fernández (2002), turismo

e desporto estão, sem dúvida, destinados a entender-se, permitindo pressagiar um

excelente porvir na aliança entre ambos, em especial num espaço tão completo e

atractivo como é o meio natural.

A Carta Europeia do Desporto lança-nos um outro desafio, cuja análise nos

parece muito adequada a este capítulo das perspectivas futuras, quando no seu

Artigo 10.º nos destaca o princípio do Desporto Sustentável – tema analisado por

autores como DaCosta (1997) e Lenskyj (1998) –, referindo que as actividades

físicas devem ser adaptadas aos recursos limitados do planeta e conduzidas em

harmonia com os princípios de um desenvolvimento sustentável e de uma gestão

equilibrada do meio ambiente.

O conceito de Desporto Sustentável é relativamente novo, quer nos círculos

do Desporto, quer nos do ambiente (Lenskyj, 1998), mas como refere Fernández

(2002), é um facto que as possibilidades e recursos que a natureza nos oferece

não podem ser desaproveitadas, nem tão pouco pervertidas, tornando

fundamental a criação de critérios racionais de utilização e protecção.

Naturalmente, o potencial do ecoturismo e do desporto de Natureza só poderá ser

explorado a prazo se garantirmos a salvaguarda dos espaços que os suportam, e

que, em muitos casos, estão a sofrer enormes pressões (Melo, 2003: 21). Esta

ideia foi anteriormente abordada segundo as opiniões de Sequerra (1996) e

Marinho (2004), destacando esta última a necessidade do desenvolvimento de

uma sensibilidade mais profunda, que permita, a par da ética necessária ao

momento de prática, uma consciencialização generalizada para a preservação do

ambiente e assim um melhor desenvolvimento em direcção ao conceito de

sustentabilidade.

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Desenvolvimento do Problema

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Segundo Costa (2006), parece haver já alguma preocupação e

sensibilização para as questões ambientais e da preservação do ambiente durante

a prática – por parte dos seus promotores e organizadores –, muito embora não

acompanhadas de medidas permanentes, pensadas com um fim de preservação

inteiramente implícito. Assim, como referem Marinho e Gáspari (2003), as

transformações pretendidas para o século XXI passam fundamentalmente por

mudanças axiológicas referentes à formação dos profissionais, os quais terão um

papel decisivo na manutenção ou alteração do contexto sócio-cultural, muito pela

influência sobre os clientes, praticantes e formandos que vivem, experimentam ou

recorrem aos DAN como veículos de formação. Teremos de nos preparar para

que, como afirma Pires (1990), a aventura possa ser, em termos futuros, além de

tudo o resto, um elemento de formação, educação e cultura ao serviço do homem.

Os Desportos de Aventura na Natureza – conceito pelo qual optamos,

encarando a possibilidade da sua viabilidade para futuros trabalhos – poderão, se

bem impulsionados, originar um sector comercial muito rentável e lucrativo, que

encerra em si potencialidades que não devem ser desprezadas. Para que a sua

potencialidade possa ser aproveitada, estes terão primeiro de garantir o seu

sucesso, baseando-se em renovações e inovações, atendendo sempre à

perspectiva da preservação ambiental que garantirá a sua sustentabilidade.

Ultrapassar estes obstáculos exigirá formações e sensibilizações – factos que

podem também vir a ser frutos da afirmação destas práticas – que encaminharão

os DAN para o sucesso. Da asseveração destas práticas poderão advir resultados

proveitosos para os profissionais da área do Desporto, para os promotores do

turismo e para as instâncias e populações das áreas rurais deprimidas, bem como

para a humanidade em geral, pelo desenvolver e imbuir de novos valores face às

problemáticas ambientais.

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33.. CCOONNCCLLUUSSÕÕEESS

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Conclusões

83

3. Conclusões

Da revisão bibliográfica realizada e das análises efectuadas no decurso do

nosso trabalho, surge o presente documento, no qual se podem destacar, como

principais conclusões, as seguintes constatações:

Actualmente vivemos numa sociedade, chamemos-lhe, como muitos, Pós-

Moderna ou Pós-Industrial, profundamente caracterizada pela radicalização dos

princípios existentes e vividos na época da Modernidade. É uma sociedade global,

onde se destacam e ganham cada vez mais relevância: a passividade aparente do

quotidiano, com modos e formas de vida cada dia mais regrados e controlados,

sem espaço para emoções e descontrolos mas nos quais o risco é uma presença

constante; a saturação com esse mesmo quotidiano, com a norma, a rotina e

espaço que o caracterizam; as problemáticas ambientais e a super-exploração dos

recursos, frutos da exaltação do consumo e produção de massa, alimentados

pelos fenómenos da moda, da publicidade e demografia acentuadas; os grandes

desequilíbrios económicos entre Estados e entre diferentes regiões do planeta,

frutos de um capitalismo e industrialismo de diferentes expressões e incidência.

Por causa das suas características, ou por vezes em resposta às

necessidades que estas estabelecem, nestas mesmas sociedades assistimos ao

afirmar de novos valores e princípios – uma pluralidade deles –, segundo os quais

tendemos a regrar a nossa vida e dos quais podemos destacar: o hedonismo, o

individualismo e obsessão pela diferença, o narcisismo, o esteticismo, o

subjectivismo e a personalização; bem expressos na constante busca de prazer,

necessidade de auto-realização e afirmação pessoal, procura de usufruto do

presente, demanda por ócio e melhores condições de vida.

Na afinidade criada entre os novos valores sociais, o aumento da parcela

de tempo livre de obrigações e o aumento da esperança média de vida de que

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Conclusões

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hoje desfrutamos, encontramos cada vez mais espaço para o lazer nesta nossa

sociedade, que exalta a necessidade de novas formas de ocupação dos tempos

livres – períodos aos quais cada um pode atribuir significados diferenciados –,

tornando-o numa expressão distintiva da nossa época.

Na resposta às necessidades de novas formas de lazer, de consumo do

“tempo livre”, de emoções, de momentos de descontrolo e ruptura com a

continuidade existencial, de contacto ou reencontro com a natureza, surgem os

Desporto de Aventura na Natureza, profundamente associados aos paradigmas da

realização pessoal, do hedonismo e da melhoria da qualidade de vida.

Os Desportos de Aventura na Natureza são todo um conjunto de

actividades – cuja génese ocorreu durante a década de 1960 e que rapidamente

se propagaram à generalidade das sociedades economicamente avançadas – nas

quais podemos referir, como principais características: o(s) meio(s) que as

fundamenta(m) – a Natureza, por excelência e os meios aquático, terrestre ou

aéreo onde as suas práticas decorrem; as emoções que proporcionam – risco,

incerteza e sensações associadas à experiência da Aventura; o público

diversificado, crescente e cada vez mais vasto, a que se destinam; a sua forte

popularidade – para a qual contribuem a forte actividade empresarial e comercial,

bem como a sua relação com as formas de turismo activo; e a grande flexibilidade

no que respeita a regulamentações, horários, formas e modos de prática.

No conjunto destas actividades, que optamos por denominar de Desportos

de Aventura na Natureza, podemos incluir práticas como: Asa Delta, Parapente,

Queda-Livre, Base Jump, Bicicleta Todo-Terreno, Cicloturismo, Street Luge, Ski,

Snowboard, Passeio Pedestre e Equestre, Montanhismo, Trekking, Orientação,

Espeleologia, Escalada, Mergulho, Surf, Body-Board, Wakeboard, Windsurf,

Rafting, Canoagem, Hidrospeed e Canyoning, entre muitas outras.

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Conclusões

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No contexto da sua prática, pode ser discutida a oposição entre o ser

humano e a natureza, pelo antagonismo que opõe o Homem às forças do meio –

mais ainda quando, numa tendência consumista, a própria Natureza é reduzida a

um cenário para a prática, por antítese à imagem de parte integrante da

experiência que deveria ser assumida.

Os Desportos de Aventura na Natureza parecem oferecer resposta a

algumas necessidades básicas da vida dos indivíduos, factos que ajudam a

entender a sua enorme viabilidade e destaque na actualidade. Baseados nesta

perspectiva procurámos abordar, no decurso do nosso trabalho, aqueles que

seriam os temas mais significativos no que concerne à sua investigação e estudo,

unicamente para nos apercebermos que os vários tópicos destacados acabam por

criar um enorme âmbito de pesquisa e análise, dada a forma como

intrinsecamente se relacionam e associam entre si.

Convém então destacar, em primeiro lugar, o Mercado da Aventura. Os

DAN surgem profundamente relacionados com as tendências de consumo – que

associado ao hedonismo se destaca hoje, senão como obrigação, certamente

como tendência, muito pela acção da moda e da publicidade. Serviço, satisfação,

diversão e prestígio são conceitos que lhe surgem intimamente associados e é

certo que a probabilidade da sua ocorrência aumenta com a perspectiva deste

acto fornecer resposta às necessidades – reais ou estabelecidas – do ser humano.

A vertente da Mercantilização da Aventura fornece resposta a algumas das

necessidades existenciais agora sentidas – mesmo que estas sejam fruto da

imposição da moda natural e ecológica –, definindo-se como mais um produto a

ser consumido, mais uma forma de consumo de experiência ou de usufruto do

tempo livre. A moda faz eco da popularidade destas práticas e da sua imagem,

apreciada e comercializada, destaca-se um novo estilo desportivo, fortemente

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Conclusões

86

apoiado nos espaços privilegiados para consumo, nos equipamentos, materiais,

objectos, vestiários, serviços e experiências.

A crescente resposta empresarial, que permite a compra e venda de

emoções e da (ou na) Natureza, associa-se igualmente às novas formas de

Turismo Activo, permitindo a comercialização de viagens e cenários do fantástico,

abrindo portas a um mercado potencial com novos sectores e formas de consumo.

Para satisfazer as nossas necessidades de consumo, tendemos a

transformar a Natureza num mero recurso ou simples cenário, facto que de si

pode ser problemático, mais ainda considerando que o acesso em massa ao

mundo natural provocará, obrigatoriamente, impactos negativos no meio,

contribuindo para a pressão e degradação dos habitats e cenários ainda

preservados.

Independentemente da essência da Natureza que hoje possamos

experimentar, é inegável uma tendência de aproximação do homem aos espaços

naturais, definindo-se a vida ao ar livre como uma necessidade estipulada pelo

desejo de regresso e pela necessidade de quebra com o quotidiano e fuga do

meio viciado em que este tende a decorrer.

Dentro das características da sociedade actual podem ser exacerbadas a

degradação ambiental global – entendida agora como objecto de preocupação

generalizada, pela consciencialização da sua ingerência enquanto factor imediato

da nossa sobrevivência – e a aparente tomada de consciência quanto à sua

ocorrência – motivo de agitação e mobilização colectiva, que tem aumentado a um

ritmo vertiginoso, mesmo que não de forma equitativa em toda a parte do planeta.

Os DAN podem cumprir um papel fundamental e inegável enquanto

veículos de sensibilização para as temáticas da natureza, permitindo o

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Conclusões

87

desenvolvimento de uma consciência ambiental e responsabilidade individual ou

colectiva. Ao permitirem o acesso ao que resta deste meio, estas práticas podem

contribuir de forma notória para a Educação Ambiental e para o desenvolvimento

de valores ou princípios de respeito pelo mundo natural – pela própria

necessidade de subsistência – podendo o seu papel ser muito proveitoso e

profundamente produtivo no meio da formação e do ensino – focamos a sua

interdisciplinaridade mas principalmente a viável associação com a Educação

Física.

Para ser válida a vertente de consciencialização, serão no entanto

necessárias ponderações basilares na criação de regras de conduta e protecção

ambiental do espaço utilizado para a prática dos DAN, assim como,

sensibilizações particulares que permitam explorar a capacidade de intervenção e

mediação dos organizadores sobre os praticantes. É assim fundamental que os

DAN não se percam na lógica de consumo pela qual se rege a sociedade, que

tende frequentemente a desvalorizar os produtos no surgimento de novas formas

de consumo, e a explorar os recursos necessários à sua venda sob qualquer

condição.

A prática massiva dos DAN, bem como a venda de actividades extremas,

tendem a domesticar o risco e a proporcionar a aventura inerente às suas práticas

de forma mimética e simbólica que, muito embora perca assim a sua verdadeira

característica, serve ao consumidor o produto desejado, através do conceito de

risco percebido e da manipulação da subjectividade da sua percepção.

A busca de estimulação emocional e sensorial, as novas sensações, a

quebra com a rotina e a continuidade da vida, são assim servidas por intermédio

da Aventura, quer de forma subjectiva, quer de forma indiscutivelmente real –

dependendo do contexto de prática –, oferecendo resposta a uma miríade de

necessidades, impostas aos seres humanos pelas características da sociedade.

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Conclusões

88

O autocontrolo, a limitação na demonstração de sentimentos e emoções, o

excesso de regras e mecanicismos, a retractação dos impulsos e a passividade

preponderante da vida, que negam ao ser humano a sua percepção de

determinação, tornam abstracto o conceito de mortalidade e criam tensões

negativas associadas à falta de excitações, são então suprimidos pela situação

marginal da Aventura, que permite a quebra com a continuidade da vida, com o

costume e o estabelecido, oferecendo a possibilidade de dano, desastre, morte,

perigo, vislumbre no abismo, bem como todo um leque de sensações aprazíveis,

fruto da instabilidade e insegurança, que quando vencidas proporcionam

satisfação, auto-afirmação e progresso.

A necessidade de estar em controlo e o sentimento de domínio sobre a

própria existência voltam assim à vida, mesmo que momentaneamente, de forma

real ou imaginária, permitindo a superação, a conquista do próprio ser, a

afirmação pessoal e a construção da identidade, necessárias à sanidade e

equilíbrio de cada indivíduo.

Para manterem a sua viabilidade e garantir a sua continuidade, os DAN

necessitarão de se basear no conceito de Desporto Sustentável, estando a sua

prosperidade e sequência obviamente dependentes do respeito pelo meio e

cenários onde as práticas são levadas a cabo, do desenvolvimento de novas

tecnologias que objectivem a segurança dos praticantes, da inovação e renovação

das práticas e actividades na perspectiva mercantilista, de uma melhor e mais

eficaz gestão e legislação das entidades que as promovem e da formação de

todos os envolvidos, quer no que consta a matérias de segurança, quer no que diz

respeito à consciência ambiental, quer para usufruto individual como para a

influência de terceiros.

Os DAN não se encontram marginalizados, tendo um lugar de destaque

cada vez mais evidente e alcançando, a cada passo, leques mais vastos da

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Conclusões

89

população. O seu entendimento, bem como a aceitação do seu potencial, poderão

trazer frutos altamente produtivos, oferecendo resposta a muitas das

necessidades actualmente em evidência na nossa sociedade. Estes podem ainda

destacar-se como elementos de importância na formação e educação, devendo,

como tal, ser difundidos e utilizados, mas tendo sempre em conta os conceitos de

segurança e respeito ambiental que lhes devem ser, podem ser e são inerentes.

O nosso estudo permitiu-nos compreender os Desportos de Aventura na

Natureza nas suas relações com o quadro axiológico actual, na sua potencialidade

de resposta às necessidades vigentes da nossa sociedade e na relação com os

imperativos valores que nela se destacam. A revisão efectuada, pela variedade de

conhecimentos que nos permitiu adquirir, agrupar e expor, revelou-se muito

proveitosa, fornecendo todo um espectro de dados relativos a estas importantes

actividades. Podemos assim afirmar, embora com algumas reservas, que o

principal objectivo do nosso trabalho foi atingido, sendo que reunimos todo um

conjunto de informações pertinentes sobre o nosso objecto de estudo, que com

alguma facilidade podiam ser encontradas dispersas pelos textos e obras de

diversas áreas do saber e do conhecer. Admitindo, no entanto, que do seu início

até ao seu término, muitos foram os factos que, a cada passo, surgiram,

complicando e embaraçando a teia de informações exploradas com outros dados,

será possível questionar se todas as instâncias da sociedade, que de alguma

forma têm intervenção sobre os DAN, foram aqui reflectidas, ou se alguma relação

ficou por analisar.

Seria possivelmente produtiva, tendo como base a constatação das

informações aqui reunidas, a reestruturação do documento aqui apresentado,

numa tentativa de encontrar novas relações de pertinência com os valores e

princípios da sociedade. Esta é uma sugestão que deixamos para trabalhos

futuros, a elaborar nesta área de conhecimento.

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