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    Argumentum, Vitria (ES), v. 6, n.2, p. 295-299, jul./dez. 2014.

    A Teoria da (Inter) Dependncia de Fernando Henrique Cardoso

    Camilla dos Santos NOGUEIRA1

    RESENHA/ BOOK REVIEW

    TRASPADINI, Roberta. A Teoria da (Inter)

    Dependncia de Fernando Henrique Car-

    doso. So Paulo: Outras Expresses, 2014.

    1 Economista (UFES, Brasil). Mestre em Estudos Latino-americanos (UNSAM, Argentina). Doutoranda em

    Poltica Social junto ao Programa de Ps-Graduao em Poltica Social (UFES, Brasil). E-mail:

    .

    RESENHA

  • Camilla dos Santos NOGUEIRA

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    Argumentum, Vitria (ES), v. 6, n.2, p. 295-299, jul./dez. 2014.

    urante os anos 1960, a Teoria da

    Dependncia demonstrou que o

    subdesenvolvimento dos pases

    perifricos estava conectado com a expan-

    so dos pases industrializados, de tal

    modo que o desenvolvimento e o subde-

    senvolvimento apareciam como aspectos

    distintos de um mesmo movimento. At

    ento, o subdesenvolvimento era conside-

    rado uma condio necessria para o pro-

    cesso evolutivo que tinha o desenvolvi-

    mento como fim. Nesse momento, em que

    grande parte dos intelectuais latino-ameri-

    canos se encontrava exilado no Chile de

    Allende, a Teoria da Dependncia, em

    seus distintos enfoques tericos, e atravs

    de um conjunto complexo e heterogneo

    de ideias apresentou aspectos estruturais

    que explicavam as desigualdades entre as

    naes, e o tipo de insero dos pases la-

    tino-americanos na economia mundial.

    Atualmente, h necessidade de seguir

    questionando a existncia de uma relao

    de subordinao entre os processos polti-

    cos e econmicos operados nos pases pe-

    rifricos e os desenvolvidos nos pases

    centrais, e, para tanto, a primeira indaga-

    o que surge se a Teoria da Dependn-

    cia pode ser atualizada hoje para construir

    um paradigma que contribua a explicar a

    atual realidade. Uma gerao de intelectu-

    ais, atualmente faz um esforo importante

    por recuperar as anlises da Teoria da De-

    pendncia e apresentam as ideias a partir

    das noes de sistema mundial e hegemo-

    nia; capital e trabalho; globalizao e fi-

    nanceirizao. Roberta Traspadini faz

    parte dessa nova gerao que recupera a

    Teoria da Dependncia, e a esse debate

    oferece uma grande contribuio na sua

    obra crtica A Teoria da (Inter) Dependn-

    cia, de Fernando Henrique Cardoso.

    Prefaciado h quinze anos pelo grande

    mestre Reinaldo A. Carcanholo, o livro

    hoje relanado permanece como um

    grande material que desmitifica as ideias

    dependentistas de Fernando Henrique

    Cardoso (FHC). Traspadini defende no li-

    vro a hiptese de que FHC formula uma

    teoria em defesa da interdependncia, en-

    tendendo a dependncia como uma rela-

    o determinada por diferentes formas de

    estruturas sociais internas, argumentando

    em favor da neutralidade que contribua a

    reduzir a existncia real de relaes de do-

    minao a nvel internacional. Deste

    modo, a autora argumenta que:

    A concepo de interdependncia, ex-

    plicada como conexo entre vrios pro-

    cessos e organizao, tanto interna

    quanto externa das naes diante do

    novo cenrio internacional, era o argu-

    mento central de FHC, que volta com

    fora quinze anos aps a assertiva da hi-

    ptese deste livro sobre a efetivao, no

    plano poltico, das ideias consolidadas

    por este sujeito poltico integrado

    classe burguesa (inter) nacional (TRAS-

    PADINI, 2014, p. 28).

    Traspadini (2014) afirma que para FHC o

    desenvolvimento dependente e associado,

    e a interdependncia so os preceitos ne-

    cessrios para o desenvolvimento dos pa-

    ses latino-americanos e consequente inser-

    o dos mesmos na economia capitalista

    mundial. Desse modo, essa nova alterna-

    tiva para a autora [...] vem acompa-

    nhada do risco de esgotar qualquer possi-

    bilidade de desenvolvimento autnomo

    D

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    Argumentum, Vitria (ES), v. 6, n.2, p. 295-299, jul./dez. 2014.

    para os pases do continente (TRASPA-

    DINI, 2014, p. 24), j que o modelo de de-

    senvolvimento defendido por FHC ex-

    plica bem o quanto na viso desse autor as

    economias perifricas latino americanas

    tem de estar alinhadas lgica e determi-

    naes do capitalismo central em situao

    de reproduo da subordinao poltica e

    dependncia econmica.

    Como demonstrao deste aspecto do

    pensamento de FHC, Traspadini divide

    pesquisa em trs partes baseadas nas se-

    guintes obras do intelectual: O Empresrio

    industrial e desenvolvimento econmico

    no Brasil, Dependncia e desenvolvimento

    na Amrica Latina: um ensaio de interpre-

    tao sociolgica, As ideias em seu lugar.

    O estudo da obra O Empresrio industrial e

    desenvolvimento econmico no Brasil, reali-

    zado no primeiro captulo, mostra que a

    argumentao de FHC, valendo-se da di-

    ferenciao schumpeteriana entre empre-

    srios tradicionais e modernos, diagnos-

    tica o empresariado brasileiro como uma

    burguesia industrial impossibilitada de

    conduzir um projeto de desenvolvimento,

    dado ao comportamento de empresas que

    ora se aliam burguesia tradicional, ora se

    aliam burguesia industrial; ou ora se

    aliam ao capital estrangeiro, e ora plei-

    teiam uma estratgia nacionalista por

    parte do Estado. Traspadini afirma que :

    Para o autor, na heterogeneidade em-

    presarial que vai estar ressaltada a espe-

    cificidade do modelo dependente brasi-

    leiro, mostrando que no h como pen-

    sar o desenvolvimento nos moldes dos

    pases centrais. Ao contrrio, o desen-

    volvimento dependente e associado se-

    ria a nica alternativa vivel para que a

    economia brasileira conseguisse romper

    com seu atraso (TRASPADINI, 2014, p.

    47).

    deste modo que FHC defende a insero

    internacional subordinada, uma vez que

    para Cardoso o desenvolvimento s ocor-

    rer atravs da internacionalizao das

    transformaes prprias do empreende-

    dor capitalista.

    Escrito como forma de fazer uma anlise

    crtica ao tipo de desenvolvimento levado

    a cabo na Amrica Latina, e s teses do es-

    truturalismo cepalino, o livro Dependn-

    cia e desenvolvimento na Amrica Latina

    contm as ideias de FHC sobre a nova si-

    tuao de dependncia, que para Cardoso

    est centrada na nova dinmica do pro-

    cesso capitalista, onde a relao entre na-

    es deixam de ser meramente uma troca

    entre pases com graus de produes dis-

    tintas, como no perodo primrio exporta-

    dor, e passa a ocorrer atravs dos investi-

    mentos estrangeiros diretos no interior

    das economias perifricas. Traspadini

    afirma que para FHC A dependncia, en-

    to, assumiria uma nova configurao,

    dado que a integrao entre os pases per-

    mitiria uma nova forma de desenvolvi-

    mento, sustentada em um rearranjo de pri-

    oridades atribudas ao trip do desenvol-

    vimento: capital nacional privado, capital

    internacional e Estado (TRASPADINI,

    2014, p. 85).

    Nas duas obras supracitadas esto os

    apontamentos da interdependncia como

    processo positivo e necessrio aos pases

    dependentes, destacados na hiptese da

    obra de Traspadini, e metodologicamente

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    Argumentum, Vitria (ES), v. 6, n.2, p. 295-299, jul./dez. 2014.

    ancorados em Weber e na aparente sepa-

    rao que FHC faz entre a esfera intelec-

    tual e a esfera poltica de ao-reflexo dos

    sujeitos. Para Traspadini. Esta questo

    metodolgica vital nos debates da de-

    pendncia, pois os crticos marxistas,

    mesmo quando contrrios ao referencial

    cepalino, se afastaro ainda mais da pers-

    pectiva da interdependncia de FHC e seu

    grupo aliado (TRASPADINI, 2014, p. 133).

    Para a autora, o que Cardoso busca mos-

    trar que a dependncia no o resultado

    do prprio desenvolvimento das econo-

    mias centrais, Ou seja, o desenvolvi-

    mento nas economias perifricas nada

    mais do que um reflexo do prprio de-

    senvolvimento das economias centrais, no

    sentido de reproduzir internamente as

    mesmas contradies e conflitos sociais

    existentes em uma sociedade capitalista

    (TRASPADINI, 2014 p. 134). Esta argu-

    mentao de FHC termina de se consoli-

    dar na obra As idias em seu lugar, na qual

    o autor nega a importncia da dependn-

    cia como conceito terico crtico e o toma,

    segundo Traspadini como, [...] algo ine-

    rente ao prprio desenvolvimento capita-

    lista, seria necessrio se ater aos mltiplos

    vnculos de interdependncia resultantes

    da fase monopolista do capitalismo

    (TRANSPADINI, 2014, p. 143).

    Portanto o livro, ao recuperar o pensa-

    mento da dependncia, um grande para-

    digma da histria do pensamento latino-

    americano, retomando as ideias de FHC,

    entendendo os meandros da obra do au-

    tor, recupera tambm as ideais de Ruy

    Mauro Marini que durante muito tempo

    estiveram escondias pelo prprio FHC.

    Marini compe a Teoria Marxista da De-

    pendncia, e indaga a dependncia sobre

    o ponto de vista da relao de dominao

    de alguns pases sobre outros, utilizando-

    se das relaes de valor trabalho para ex-

    plicar como a dependncia e o subdesen-

    volvimento so o resultado do processo de

    desenvolvimento dos pases centrais, que

    ocorre atravs da explorao e extorso

    dos pases dependentes, contribuindo

    deste modo com uma interpretao diale-

    ticamente sustentada, muito distante da

    concebida por Cardoso.

    Em direo oposta corrente marxista,

    FHC considera a dependncia latino-ame-

    ricana como resultado da correlao de

    foras internas, especificamente da bur-

    guesia nacional, que ao atuar de maneira

    subordinada, alimenta a dependncia da

    regio em relao aos pases centrais. No

    considera a influncia do capital internaci-

    onal como determinante da dependncia

    seno que defende o desenvolvimento de-

    pendente e associado, o que leva Trapa-

    dini a concluir que de [...] a postura como

    presidente da Repblica Fernando Henri-

    que Cardoso, no que se refere internaci-

    onalizao da economia bem como rees-

    truturao do Estado, encontra-se susten-

    tada nos seus escritos acadmico datados

    da dcada de 1960 (TRASPADINI, 2014,

    p. 42). O que existe no , portanto uma

    contradio nas idias de FHC, o que sim

    h a dificuldade de entender que o que

    FHC escreveu nos anos 1960 condiz com

    as polticas econmicas e sociais adotadas

    em seus anos de governo.

    A luz desse debate, e desmitificando o que

    significa a dependncia para Fernando

    Henrique Cardoso e, portanto entendendo

  • A Teoria da (Inter) Dependncia de Fernando Henrique Cardoso

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    Argumentum, Vitria (ES), v. 6, n.2, p. 295-299, jul./dez. 2014.

    que para este intelectual-poltico a interde-

    pendncia a melhor sada para o desen-

    volvimento latino-americano, possvel

    debater e entender o atual momento hist-

    rico, as novas formas de dependncia, as

    relaes no mundo do trabalho, a econo-

    mia financeirizada, etc., permitindo o en-

    tendimento de Nuestra Amrica e bus-

    cando caminhos que permitam a transfor-

    mao da realidade.