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DIFERENTES MANIFESTAÇÕES DO DESEMPREGO: a lei geral de acumulação capitalista Jaqueline da Silva Lima 1 Angélica Luiza Silva Bezerra 2 Adrielle Martins de Lima 3 Michelaine Alves Nunes da Silva Braz 4 Resumo O fenômeno do desemprego têm afetado populações de países centrais e periféricos, como é o caso do Brasil. Entender o processo dinâmico do sistema do capital e a série de contradições que este impulsiona é fundamental para perceber as estratégias que o capitalismo se utiliza, tornando o desemprego um instrumento de controle da ordem sociometabólica do capital. É neste contexto de mudanças estruturais que buscaremos as bases materiais que origina e mantém o fenômeno do desemprego na atual conjuntura a partir da produção de Karl Marx: A lei Geral da Acumulação Capitalista. Palavras-chave: Capitalismo; Desemprego; Pobreza. Abstract The phenomenon of unemployment has affected populations of central and peripheral countries, as is the case of Brazil. Understand the dynamic process of the capital system and a series of contradictions that this drives is critical to understand the strategies that capitalism uses, making unemployment a control instrument of social metabolic order of capital. It is in this context of structural changes that will seek the foundation material that originates and maintains the phenomenon of unemployment in the current situation from the production of Karl Marx: The General Law of Capitalist Accumulation. Keywords:Capitalism; Unemployment; Poverty. 1 Pós-Graduação em Saúde Pública. Faculdade Regional Alternativa. E-mail: [email protected]. 2 Doutora. Professora da Universidade Federal de Alagoas . 3 Estudante de Graduação. 4 Estudante de Graduação.

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DIFERENTES MANIFESTAÇÕES DO DESEMPREGO: a lei geral de acumulação

capitalista

Jaqueline da Silva Lima 1

Angélica Luiza Silva Bezerra2 Adrielle Martins de Lima 3

Michelaine Alves Nunes da Silva Braz4

Resumo O fenômeno do desemprego têm afetado populações de países centrais e periféricos, como é o caso do Brasil. Entender o processo dinâmico do sistema do capital e a série de contradições que este impulsiona é fundamental para perceber as estratégias que o capitalismo se utiliza, tornando o desemprego um instrumento de controle da ordem sociometabólica do capital. É neste contexto de mudanças estruturais que buscaremos as bases materiais que origina e mantém o fenômeno do desemprego na atual conjuntura a partir da produção de Karl Marx: A lei Geral da Acumulação Capitalista.

Palavras-chave: Capitalismo; Desemprego; Pobreza.

Abstract The phenomenon of unemployment has affected populations of central and peripheral countries, as is the case of Brazil. Understand the dynamic process of the capital system and a series of contradictions that this drives is critical to understand the strategies that capitalism uses, making unemployment a control instrument of social metabolic order of capital. It is in this context of structural changes that will seek the foundation material that originates and maintains the phenomenon of unemployment in the current situation from the production of Karl Marx: The General Law of Capitalist Accumulation.

Keywords:Capitalism; Unemployment; Poverty.

1 Pós-Graduação em Saúde Pública. Faculdade Regional Alternativa. E-mail:

[email protected]. 2 Doutora. Professora da Universidade Federal de Alagoas .

3 Estudante de Graduação.

4 Estudante de Graduação.

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I. INTRODUÇÃO

O desemprego tornou-se objeto de discussão e intervenção de forma continuada e

sistemática a partir da Primeira Guerra Mundial, estabelecendo para a agenda das Nações

Unidas formas de enfretamento que protegessem o trabalho no campo dos direitos e

investimento econômico para os países membro da Organização Internacional do Trabalho

(OIT). Todavia, mesmo com o esforço na busca de estratégias que possam garantir o

emprego para os trabalhadores, nas ultimas décadas presenciamos um aumento

considerável do desemprego em escala mundial atingindo, como assevera Mészáros (2002),

a totalidade da força de trabalho. Em outras palavras, nenhum tipo de ocupação ou trabalho

está imune a este fenômeno, pois as formas de gerir as contradições imanentes do sistema

do capital impulsionaram abertamente o aumento do desemprego em massa. A garantia do

pleno emprego foi uma forma de acalmar a força de trabalho, mas sua efetivação passa

bem longe da proposta do sistema do capital, pois o interesse do sistema implica sempre

grandes massas supérfluas e assim intensificar o controle sobre elas e garantir o seu

desenvolvimento sacrificando grandes massas humanas nas fileiras do desemprego. Esta

contradição tornou o desemprego global.

Sua expansão não está apenas presente nos lugares mais atrasados, mas seu

deslocamento atinge os lugares mais avançados do sistema do capital. Para Mészáros, o

desemprego tornou-se crônico e um dos limites absolutos do sistema do capital. Mészáros

esclarece:

Pois uma coisa é imaginar o alívio ou remoção do impacto negativo do desemprego em massa de um, ou mesmo mais de um, país particular [...]. Entretanto, outra coisa completamente diferente é sonhar essa solução quando a doença afeta todo o sistema, estabelecendo um limite óbvio ao que um país pode fazer para “mendigar ao vizinho”, ou mesmo o resto do mundo, caso se trate do país hegemônico mais poderoso, caso dos Estados Unidos no período posterior à Segunda Guerra Mundial. Sob essas circunstâncias, ativa-se a “explosão populacional”, sob a forma de desemprego crônico, como um limite absoluto do capital (MÉSZÁROS, 2002, p.333).

Não é à toa que as políticas de enfrentamento ao desemprego se acham baseadas

em princípios que atualizam as ideologias necessárias ao atual estágio da acumulação

capitalista e que reafirmam o projeto burguês contemporâneo. Uma delas, a da

responsabilização social do sujeito sem emprego que se metamorfoseia, positivamente, num

trabalhador autônomo e empreendedor. Uma outra, a da atribuição do desemprego à

desqualificação profissional do trabalhador em face das novas tecnologias, vinculando a sua

superação com a educação e a qualificação profissionais; e uma das mais predominantes, a

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negação do desemprego pela definição desses trabalhadores como pobres, relacionando-

se, também, com a expansão de programas de assistência social.

Estas são uma das formas que respondem a severidade do desemprego que têm

como centro o desenvolvimento econômico atrelado ao desenvolvimento social e político

através de enfrentamentos via políticas sociais e de emprego que possam promover o pleno

emprego ou outras formas de emprego como o trabalho atípico (Vasapollo, 2006), o trabalho

por conta própria e o incentivo ao empreendedorismo.

As diferentes formas de inserções no mercado de trabalho são legitimadas pela

Organização Internacional do Trabalho (OIT) nas Convenções 88 que preconiza sobre o

Serviço de Emprego e 168 que estabelece as normas sobre Promoção do Emprego e

Proteção contra o Desemprego,como uma das formas de responder ao desemprego

mediante a redução cada vez maior do trabalho formal.

Neste artigo, partimos do pressuposto que embora o desemprego seja objeto de

discussão e intervenção do Estado é um fenômeno indissociável do desenvolvimento

capitalista. Como tal impossível de ser superado por ser fundado e mantido pelo controle do

sistema do capital. Com base na teoria social de Marx, o desemprego faz parte da boa

saúde do sistema. Com base nesta afirmação conduziremos nossa discussão.

Percebe-se que para que o capitalismo continue se reproduzindo é necessário que

haja a força de trabalho sempre livre para a valorização do mesmo. Por isso, a parte que

compõe a superpopulação relativa e ou o exército industrial de reserva é de fundamental

importância para a acumulação capitalista e, até mesmo, para a própria existência de seu

modo de produção, uma vez que os capitalistas sempre terão disponível uma reserva de

trabalhadores, podendo utilizar isso como um dos motivos para redução dos salários da

massa assalariada e exploração dos mesmos, já que o aumento do salário provoca a

multiplicação de forma rápida da massa trabalhadora tornando o capital, com relação a

oferta de trabalho, de certa forma insuficiente, provocando a queda dos salários e o

aumento da exploração acelerando a acumulação e o ciclo inicia-se novamente.

Portanto, diante as transformações no mundo do trabalho e do acentuado índice de

desemprego na entrada do século XXI torna-se ainda central a discussão sobre os

fundamentos do desemprego a partir da Lei Geral da Acumulação Capitalista de K. Marx.

II. A ORIGEM DO DESEMPREGO: A LEI GERAL DE ACUMULAÇÃO CAPITALISTA

Para compreender como foi o processo de fundação do desemprego apresentamos

como este se constitui dentro do processo de acumulação primitiva do capital, que de

acordo com Marx (1984), se deu por meio da expropriação violenta dos produtores da terra

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e que irá obrigatoriamente separar os meios de produção das mãos dos produtores como

forma de garantir a acumulação e valorização do sistema capitalista que estava surgindo

naquele momento. Estes trabalhadores ao perderem a posse e o domínio dos meios e dos

instrumentos de produção de sua subsistência (da propriedade da terra) foram submetidos a

vender força de trabalho, única propriedade que lhes restavam para sobreviver.

Marx em suas reflexões pontuou que “a assim chamada acumulação primitiva é,

portanto, nada mais que o processo histórico de separação entre produtor e meio de

produção” (MARX, 1984, p. 262). História essa que “está inscrita nos anais da humanidade

com traços de sangue e fogo” (MARX, 1984, p. 262), e os que foram expropriados são

lançados no mercado de trabalho como “proletários livres como os pássaros” (ibidem, p.

263). Assim, “o prelúdio do revolucionamento que criou a base do modo de produção

capitalista ocorreu no último terço do século XV e nas primeiras décadas do século XVI [...]”

(ibidem, p. 264), quando uma massa de trabalhadores foi lançada no mercado de trabalho

pela dissolução dos séquitos feudais. É essa fase histórica que forneceu as bases para o

capitalismo, podendo ser evidenciado o começo das contradições imposta pelo

desenvolvimento capitalista, que vai gerar pobreza e desemprego, através da retirada dos

trabalhadores do campo no propósito da exploração do trabalho assalariado.

Assim, Marx (1984) enfatiza que o amadurecimento do sistema capitalista trouxe a

negação do ser individual, isto é, “a propriedade privada capitalista é a primeira negação da

propriedade privada individual, baseada no trabalho próprio. Mas, a produção capitalista

produz, com a inexorabilidade de um processo natural, sua própria negação. É a negação

da negação” (MARX, 1984, p. 294). Neste caso, entender como se deu o processo de

constituição do sistema capitalista, e como se gesta essa negação da negação é de extrema

importância para assimilarmos que o desenvolvimento da produção não supriu as reais

necessidades dos trabalhadores, nem suprirá dentro desse modo de produção, apenas se

desenvolve mais e mais para assegurar as necessidades econômicas do desenvolvimento

capitalista. Assim, a expropriação dos trabalhadores de seus meios de produção e a força

de trabalho enquanto mercadoria são as bases para o surgimento do desemprego.

Nesse contexto, o desenvolvimento do sistema capitalista favoreceu a

pauperização5 da classe trabalhadora, fazendo surgir problemas sociais decorrentes da

exploração e dominação do capital sobre os trabalhadores, principalmente a partir da

consolidação do capitalismo industrial. Marx (1984) ressalta que, no desenvolvimento

5 Segundo Netto (2001), “a pauperização (neste caso, absoluta) massiva da população trabalhadora constitui o aspecto mais imediato da instauração do capitalismo em seu estágio industrial-concorrencial [...]. Pela primeira vez na história registrada, a pobreza crescia na razão direta em que aumentava a capacidade social de produzir riquezas.” (NETTO, 2001, p. 42). Assim,esse pauperismo é pontuado pelos estudiosos como primeira expressão da “questão social”.

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capitalista de produção de mercadorias, há uma tendência em promover uma acumulação

ampliada de capital (principal alavanca da acumulação capitalista) por um lado e por outro

lado, uma tendência em promover o crescimento ampliado da miséria da classe

trabalhadora, ou seja, uma tendência em diminuir a procura da força de trabalho como

também diminuir o salário. Gerando assim o exército industrial de reserva, este que Marx

(1984), vem pontuar como a razão responsável por eliminar os próprios obstáculos

causados pelo decréscimo da acumulação capitalista quando aumenta força de trabalho e

salário. Ou seja, o acréscimo da produtividade do trabalho aparece “no decréscimo da

massa de trabalho proporcionalmente à massa de meios de produção movimentados por

ela” (MARX, 1984, p. 194), se configurando assim como a mudança na composição

orgânica do capital.

Neste contexto, a centralização e concentração do capital são também a alavanca

da acumulação capitalista, ou melhor, “os métodos de elevar a força produtiva social do

trabalho surgida sobre esse fundamento são, ao mesmo tempo, métodos de elevar a

produção de mais-valia ou mais-produto, que, por sua vez, é elemento constitutivo da

acumulação” (MARX, 1984, p. 195). Percebe-se que a centralização “amplia e acelera

simultaneamente as revoluções na composição técnica do capital, que aumentam sua parte

constante à custa de sua parte variável e, com isso, diminuem a demanda relativa do

trabalho” (MARX, 1984, p. 198).

Ou seja, com o aumento do capital constante, houve um decréscimo do capital

variável, fazendo surgir assim uma massa de trabalhadores não empregada. Esta que se

torna a mais nova e poderosa alavanca da acumulação capitalista, assim, a diminuição

absoluta da demanda de trabalho, torna-se tanto maior quanto mais os capitais se

multiplicam. Do ponto de vista de Marx (1984), por um lado, o capital adicional construído ao

longo da acumulação atrai menos e menos trabalhadores; por outro, o velho capital, repele

mais e mais trabalhadores os quais antes estavam empregados. Colocando, em evidência a

essência do desemprego, que surgiu com a expropriação dos trabalhadores de suas terras e

se fundamenta com o desenvolvimento da acumulação capitalista, através da sua

concentração e centralização, que desenvolve o exército industrial de reserva, ou melhor, a

massa de desempregados. Marx afirma que a “acumulação capitalista produz

constantemente uma população trabalhadora adicional relativamente supérflua ou

subsidiária, ao menos concernentes às necessidades de aproveitamento por parte do

capital” (MARX, 1984, p. 199). Marx (1984) assinala que,

[...] a alavanca da acumulação capitalista, até uma condição de existência do modo de produção capitalista. Ela constitui um exército industrial de reserva disponível, que pertence ao capital de maneira tão absoluta, como se ele o tivesse criado à sua própria custa. Ela proporciona às suas mutáveis necessidades de valorização o

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material humano sempre pronto para ser explorado, independente dos limites do verdadeiro acréscimo populacional (MARX, 1984, p. 200).

Essa é a capacidade gerada através do progresso técnico do trabalhador produzir

mais no mesmo período de tempo, este movimento aumenta a exploração do trabalhador,

com uma maior produção de mais valor, não havendo necessariamente o aumento da força

de trabalho, mas fica disponível certa reserva de força de trabalho para quando o capital

dela necessitar. Reserva esta que não implica somente na maior exploração do trabalhador,

mas também, influencia no valor de seu salário, que é pressionado para baixo com o

aumento dessa população supérflua.

Como Marx (1984) pontua, o acréscimo do capital variável torna-se então índice de

mais trabalho, mas não de mais trabalhadores ocupados, ou seja, todo capitalista possui

interesse de extrair determinada quantidade de trabalho de um número menor de

trabalhadores ao invés de extrair de modo tão barato ou mais barato de um número maior

de trabalhadores, dessa forma entendemos que a essência do desemprego se encontra na

acumulação de mais valor através da exploração da força de trabalho, obrigando o

trabalhador ao sobretrabalho6 e a uma submissão aos ditames do capital, deixando assim

um grande contingente de trabalhadores imerso na população supérflua. Esta que irá

permanecer, tanto no campo como na cidade, em tempo de abundância ou período de crise,

um “exército industrial de reserva pressiona durante os períodos de estagnação e

prosperidade média o exército ativo de trabalhadores e contém suas pretensões durante o

período de superprodução e paroxismo” (MARX, 1984, p. 205).

À vista disso, Marx (1984) diz que a superpopulação relativa existe em diversos

matizes possíveis, sendo que todo trabalhador pertence a ela durante todo o tempo em que

está desempregado parcial ou inteiramente. Com isso, Marx pontua a Lei Geral de

Acumulação Capitalista com a frase “quanto maior, finalmente, a camada lazarenta da

classe trabalhadora e o exército industrial de reserva, tanto maior o pauperismo oficial”

(MARX, 1984, p.209). Marx analisa que ela é tendencial e contínua, pois no capitalismo há

uma tendência de gerar tanto riqueza, quanto miséria proporcionalmente ao avanço do

desenvolvimento das forças produtivas do trabalho. Assim, o exército industrial de reserva e

o pauperismo da classe trabalhadora são elementos essenciais para a existência do sistema

do capital e sua constante acumulação de riquezas.

6 Segundo Marx (1984), é o trabalho não pago ao trabalhador, ou seja, a mais valia surge do fato do trabalhador trabalhar mais do que o socialmente necessário, e é este excedente não pago que o capitalista se apropria e se chama mais valia. A produção da mais valia não é mais do que a produção de valor, prolongada para além de certo ponto. Se o processo se trabalho só durar até ao ponto em que o valor da Força de Trabalho paga pelo capital é substituída por um novo equivalente, haverá simples produção de valor, quando ultrapassar este limite haverá produção de mais valia, através do sobretrabalho.

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A Lei Geral da Acumulação Capitalista, em síntese, expressa o nível da exploração

do trabalho, colocando de um lado a pobreza e o trabalhador explorado e do outro a

acumulação, expansão e o ciclo de reprodução do capital. Logo, a desigualdade social é

expressa como parte constitutiva das relações sociais capitalistas, estas que dão base para

a pauperização daqueles detentores apenas da força de trabalho. Pois, como argumenta

Marx (1984), a população trabalhadora crescerá sempre mais que a necessidade de

valorização do capital, ou seja, a demanda do trabalho não é idêntica ao crescimento do

capital. Dado que se mostra com a necessidade do capital em criar um exército industrial de

reserva que fosse favorável para a manutenção e acumulação do sistema capitalista, para

assim garantir sua produção, sem se preocupar com as necessidades dos trabalhadores.

Em suma, percebemos através do exposto de Marx (1984) sobre a Lei Geral de

Acumulação Capitalista, que desemprego da classe trabalhadora é decorrente da expansão

e acumulação do capital, e se justifica por meio do caráter antagônico do desenvolvimento

capitalista. O desemprego na história do desenvolvimento capitalista é uma das alavancas

da acumulação capitalista. Por se tratar de um fenômeno permanente e aparente torna-se

explosivo para o próprio sistema que fundou e impõe para a classe trabalhadora inserções

no mercado cada vez mais precárias, sem direitos trabalhistas em nome da sobrevivência.

III. SUPERPOPULAÇÃO RELATIVA: AS DIFERENTES MANIFESTAÇÕES DO

DESEMPREGO

Como vimos acima, a grande massa populacional desempregada é

indubitavelmente necessária, para o modo de produção vigente. De acordo com Marx (1996)

esse mesmo contingente é condição primordial para a acumulação capitalista. Sob controle

do sistema do capital, a classe trabalhadora é cada vez mais submetida às necessidades de

lucros, com jornadas de trabalho cada vez mais intensas e salários baixos devido a um

grande contingente de pessoas esperando uma oportunidade de emprego. Com isso, Marx

vem afirmar que,

[...] grandes massas humanas precisam estar disponíveis para serem subitamente lançadas nos pontos decisivos, sem quebra da escala de produção em outras esferas. A superpopulação as provê. O curso de vida característico da indústria moderna, sob a forma de um ciclo decenal, interrompido por oscilações menores, de vitalidade média, produção a todo vapor, crise e estagnação, repousa na contínua constituição, na maior ou menor absorção e na reconstituição do exército industrial de reserva ou superpopulação. Por sua vez, as oscilações do ciclo industrial recrutam a superpopulação e tornam-se os mais enérgicos agentes de sua reprodução. (MARX, 1996, p. 263).

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É importante destacar que o capitalismo não se importa com o bem-estar da

população, pois o objetivo central é o lucro, mesmo que para isso grandes contingentes de

pessoas estejam engrossando as fileiras do exército de reserva Assim, a existência do

trabalhador é para as necessidades do sistema do capital, como assevera Marx (1996, p.

253): “[...] Nem poderia ser diferente num modo de produção em que o trabalhador existe

para as necessidades de valorização de valores existentes, ao invés de a riqueza objetiva

existir para as necessidades de desenvolvimento do trabalhador”. O que prevalece não são

os interesses e/ou as necessidades dos trabalhadores, mas sim, a dos capitalistas. Ou nas

palavras de Marx:

[...] Força de trabalho é aí comprada não para satisfazer, mediante seu serviço ou seu produto, às necessidades pessoais do comprador. Sua finalidade é a valorização de seu capital, produção de mercadorias que contenham mais trabalho do que ele paga, portanto, que contenham uma parcela de valor que nada lhe custa e que, ainda assim, é realizada pela venda de mercadorias. Produção de mais-valia ou geração de excedente é a lei absoluta desse modo de produção. (MARX, 1996, p. 251)

Segundo Netto (2006, p. 142), “[...] tal exército é um componente necessário e

constitutivo da dinâmica histórico-concreta do capitalismo”. Sendo assim, a situação da

maioria da população, suas condições de vida, não estão como pauta para os capitalistas,

visto que, o capitalismo já esgotou toda e qualquer forma de processo civilizatório, e dentro

desta ordem de barbárie que não há mais condições de propiciar qualquer alternativa para a

humanidade, tendo em vista que, ele caminha para a destruição da mesma. Netto (2010)

assinala que, esta ordem só tem a oferecer contemporaneamente, soluções “barbarizantes”

para a vida social.

Dentro da lógica da barbárie na vida dos homens, destacamos o que Marx

desenvolveu como superpopulação relativa, uma das condições indispensáveis ao processo

de enriquecimento e acumulação capitalista. Visto que, ela ao mesmo tempo em que é

produto da acumulação capitalista, fruto da contradição capital/trabalho é também a

alavanca da contínua expansão da mesma. E diante do que já foi exposto até aqui,

podemos pontuar, segundo Marx (1996), que ela existe em todos os matizes possíveis,

apresentando-se em três formas, que são: líquida, latente e estagnada.

De acordo com Marx, se o trabalhador estiver desempregado parcial ou

inteiramente, faz parte dessa superpopulação relativa. O que diferencia são as formas que

se apresentam Na forma líquida ou fluente, os trabalhadores saem de um patamar superior

para um inferior e vice-versa. Marx pontua, que os trabalhadores, “[...] ora são repelidos, ora

atraídos em maior proporção [...]” (MARX, 1996, p. 271). Há um processo habitual nesse

tipo de superpopulação, ora empregado, ora engrossando as fileiras do desemprego,

aumentando ainda mais o exército industrial de reserva. Daí o termo líquida ou fluente.

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Os trabalhadores que compõem esse tipo de superpopulação relativa são

absorvidos pelo capital de uma maneira avassaladora, que,

[...] O consumo da força de trabalho pelo capital é, além disso, tão rápido que o trabalhador de mediana idade, na maioria dos casos, já está mais ou menos esgotado. Ele cai nas fileiras dos excedentes ou passa de um escalão mais alto para um mais baixo. Justamente entre os trabalhadores da grande indústria é que deparamos com a duração mais curta de vida (MARX, 1996, p. 271).

Em centros de modernas indústrias, como as fábricas, as manufaturas, as

siderúrgicas, as minas, entre outros, encontra-se a forma liquida da superpopulação, os

trabalhadores são atraídos pela grande indústria ou repelidos proporcionalmente em

períodos regulares. Atualmente isso é perceptível, visto que cada vez mais as grandes

indústrias atraem os trabalhadores jovens com o intuito de que o índice de produtividade

cresça, já que eles possuem uma aptidão física melhor do que os mais velhos. Assim, uma

vez atingido o índice de produtividade e o trabalhador já esteja com suas forças físicas

esgotadas, não conseguindo satisfazer as necessidades do capital, ele é substituído por

outro mais jovem, reiniciando o ciclo.

De acordo com Marx:

Tanto nas fábricas propriamente ditas como em todas as grandes oficinas, em que a maquinaria entra como fator ou em que ao menos a moderna divisão do trabalho é aplicada, precisa-se maciçamente de trabalhadores masculinos até ultrapassarem a juventude. Uma vez atingido esse termo, só um número muito reduzido continua sendo empregado no mesmo ramo de atividade, enquanto a maioria é regularmente demitida. Esta constitui um elemento da superpopulação fluente, que cresce com o tamanho da indústria (MARX, 1996, p. 271).

A segunda forma de superpopulação relativa, a latente, se expressa no campo.

Com a apoderação da agricultura por parte do capital, como uma forma de valorização do

mesmo, a população local se vê obrigada a migrar de sua região a fim de melhores

condições de vida. Há, portanto, um fluxo contínuo da população do campo para os grandes

centros urbanos. De acordo com Marx, “[...] O trabalhador rural é, por isso, rebaixado para o

mínimo do salário e está sempre com um pé no pântano do pauperismo” (ibidem, p. 272).

Esse apoderamento no campo por parte do capital, pode se dá de diversas formas. Uma

delas seria o incremento de maquinarias, o aumentaria o trabalho morto e

consequentemente diminuiria a necessidade de trabalho vivo, forçando este a deixar seu

lugar e procurar outras formas de sobrevivência.

No que tange à terceira forma de superpopulação relativa, a estagnada, Marx

afirma que: “[...] constitui parte do exército ativo de trabalhadores, mas com ocupação

completamente irregular. Ela proporciona, assim, ao capital, um reservatório inesgotável de

força de trabalho disponível” (1996, p. 272). Tendo em vista o objetivo geral dos capitalistas:

o lucro, é exatamente dessa fonte de trabalho inesgotável que estes precisam, para a

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valorização do seu capital. Visto que, a força de trabalho é a única mercadoria capaz de

gerar maior valor do que realmente ela vale. Nesta forma da superpopulação, o trabalhador

estar sempre disponível às necessidades do capital. Assim, podemos dizer que a expansão

do desemprego tem limites estruturais, pois os trabalhadores são indispensáveis para o

lucro. É com o trabalho humano, que os capitalistas extraem a mais-valia, daí a importância

do mesmo para o processo de valorização, centralização e concentração de capital.

Ainda com base na terceira forma da superpopulação, Marx (1996, p.272) afirma

que, “[...] Sua condição de vida cai abaixo do nível normal médio da classe trabalhadora, e

exatamente isso faz dela uma base ampla para certos ramos de exploração do capital. É

caracterizada pelo máximo do tempo de serviço e mínimo de salário.” Há uma exploração

intensiva nessa população. Pois como Marx mesmo disse há o “[...] máximo de tempo de

serviço e mínimo de salário” (MARX, 1996 p. 272). Trabalham muito mais e recebem muito

menos. Dessa maneira, apreende essa população, como a parte mais explorada pelo

capital, é perceptível a contradição capital/trabalho, diante do quadro vivenciado por essa

população, com a jornada de trabalho altíssima e o salário baixíssimo, tornando-se assim,

fonte inesgotável de mais-valia.

Por fim, o autor analisa “[...] o mais profundo sedimento da superpopulação relativa

habita a esfera do pauperismo” (MARX, 1996, p. 273). Para Marx, esse sedimento da

população, com exceção dos delinquentes, prostitutas e vagabundos, ou seja, o

lumpemproletariado divide-se em três categorias: a primeira categoria seria formada por

aqueles que estão aptos ao trabalho; a segunda, pelos órfãos e crianças indigentes e o

terceiro, pelos maltrapilhos, degradados e inaptos para o trabalho. Para essa última

categoria, Marx pontua de forma clara quem são eles:

São notadamente indivíduos que sucumbem devido a sua imobilidade, causada pela divisão do trabalho, aqueles que ultrapassam a idade normal de um trabalhador e finalmente as vítimas da indústria, cujo número cresce com a maquinaria perigosa, minas, fábricas químicas etc., isto é, aleijados, doentes, viúvas etc. (MARX, 1996, p. 273).

Sabe-se que todo modo de produção reproduz uma lógica. No capitalismo, a lógica

que predomina é o acumulo de riquezas à custa da exploração de grandes massas

humanas evidenciando o anúncio da intensificação da barbárie reproduzido inclusive na

desigualdade social e na destruição da natureza. Essa é a lógica destrutiva do sistema que

coloca para a humanidade contradições inéditas que são cada vez mais evidenciadas a

cada ciclo da crise economia. A nosso ver, uma das contradições mais evidentes da lógica

do capitalismo é o fenômeno do desemprego.

Por se tratar de uma das alavancas da acumulação capitalista, o desemprego (apesar dos

esforços dos Organismos Internacionais em direcionar diretrizes e normas para os governos

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em resposta ao desemprego e promoção para o emprego) tornou-se mundial e apresenta-se

como um problema de difícil controle.

IV. CONCLUSÃO

No capitalismo, a exploração da força de trabalho se expressa de maneira mais

intensa pelo fato de torna-se mercadoria. Esta realidade transformou a vida dos homens ao

serem tratados como coisas ou objetos daqueles que os contratam. Portanto, os que

conseguem vender sua força de trabalho são submetidos ao controle do sistema; aqueles

que não conseguem, são convidados a engrossarem as fileiras do exército de reserva ou

para sobreviver, são submetidos as mais variadas formas de trabalho precário.

A parte que compõe a reserva de trabalhadores é de fundamental importância para

a acumulação capitalista e, até mesmo, para a própria existência do modo de produção

capitalista, uma vez que os capitalistas sempre terão disponível uma reserva de

trabalhadores, que por sua vez, pressiona os trabalhadores ativos a qualquer tipo de

vínculos e condições de assalariamento. Assim,

[...] o exército industrial de reserva pressiona durante os períodos de estagnação e prosperidade média o exército ativo de trabalhadores e contém suas pretensões durante o período de superprodução e paroxismo. A superpopulação relativa é, portanto, o pano de fundo sobre o qual a lei da oferta e da procura de mão-de-obra se movimenta. (MARX, 1996, p.269).

Diante disso, percebe-se que a busca implacável para a geração de mais-valia ou

de excedentes provoca a exploração de uma classe que é condicionada a vender sua força

de trabalho para manter-se viva.

As bases que mantém este fenômeno em funcionamento dizem respeito ao

movimento de exploração imanente a este tipo de sociedade, com a transformação da força

de trabalho em mercadoria. Portanto, o ponto de partida do desenvolvimento que gerou

tanto a produção do trabalho assalariado quanto o capitalista foi a servidão do trabalhador,

diz Karl Marx (1984). No capitalismo, a força de trabalho é somente valorizada quando seu

vendedor encontra quem a compre e quando não o encontra é condicionado a subempregos

ou convidado a engrossar as fileiras do exército industrial de reserva. Esta realidade

submete a classe trabalhadora a diferentes manifestações do desemprego através da

precarização do trabalho, como vimos na composição da superpopulação relativa.

Page 12: DIFERENTES MANIFESTAÇÕES DO DESEMPREGO...negação do desemprego pela definição desses trabalhadores como pobres, relacionando-se, também, com a expansão de programas de assistência

REFERÊNCIAS

BRAZ, M.; NETTO, J. P. Economia política: uma introdução crítica. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2006. MARX, K. O capital. Vol. I, tomo 1, São Paulo: Nova Cultura Ltda, 1996. MARX, K. O capital. Vol. I, tomo 2, São Paulo: Nova Cultura Ltda, 1996. MARX, K. O capital. Vol. I, tomo 2, São Paulo: Abril cultura, 1984. MÉSZÁROS, I. Para além do capital. São Paulo: Boitempo. 2002. NETTO, J. P. Cinco notas a propósito da questão social. Temporalis, Brasília, n. 3, 2001. NETTO, J. P. Uma face contemporânea da barbárie (2010).Disponível em:<http://pcb.org.br/portal/docs/umafacecontemporaneadabarbarie.pdf>. Acesso em: 20/01/2017. PIMENTEL, E. Uma “Nova questão social”?Raízes materiais e humano-sociais do pauperismo de ontem e de hoje. 2 ed. São Paulo: Instituto Luckács, 2012.

VASAPOLLO, Luciano. O trabalho atípico e a precariedade: elementos estratégico determinantes do capital no paradigma pós-fordista. IN: Riqueza e miséria do trabalho no Brasil. Antunes R. (Org.). São Paulo: Boitempo, 2006.