Dinossauros a três dimensões

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SOCIEDADE CIÊNCIA. INVESTIGAÇÃO Dinossauros a três dimensões Esteve em Marrocos a fotografar ossos com milhões de anos. Agora, Luís Rodrigues vai reconstituir o corpo e os movimentos do dinossauro mais antigo do mundo ABÍLIO RIBEIRO C orreu bem, mas podia ter acabado em tragédia. Luís Rodrigues, 34 anos, pa- leontólogo, estava no museu de Car- negie, nos Estados Unidos, a analisar os- sos de dinossauro, quando um deles qua- se lhe caiu em cima. "Tinha 1,80 m, pesava centenas de quilos e podia esmagar-me. Tivemos de o deslocar e, durante a opera- ção, ia levando com ele em cima", conta à SÁBADO. O episódio não assustou o in- vestigador do Museu Nacional de História Natural (MNHN) e, este mês, Luís Rodri- gues foi a Marrocos para digitalizar os os- sos do dinossauro mais antigo do mun- do. Trata-se do Tazoudasaurus, uma espé- cie com cerca de 180 milhões de anos, baptizada com o nome da localidade onde foram encontra- dos os seus restos, em 1998 - Ta- zuda. "Descobriram-se ossos de um adulto com nove metros e res- tos de dois juvenis", explica. Luís é o único investigador por- tuguês envolvido neste projecto. A sua participação deve-se à tecno- logia pioneira do MNHN, que já foi uti- lizada noutros programas semelhantes: o MicroScribe, aparelho que digitaliza a morfologia dos ossos. Até 2007 o paleontólogo espera criar imagens a três dimensões que mostrem como os Tazoudasaurus se deslocavam. "Fa- remos sobreposições matemáticas e análi- ses estatísticas da forma dos ossos. É com- plexo, mas é isto que está por trás das ima- Mistérios dos Tazoudasaurus 0 Tazoudasaurus passou pela Terra há cerca de 180 milhões de anos. Os primeiros indícios da sua existência foram descobertos em 1998, em Marrocos, na localidade de Tazuda - d a í a designação de Tazoudasaurus. Estes animais passaram de bípedes a quadrúpedes. Luís Rodrigues poderá descobrir o porquê desta evolução, que não se verificou noutros mamíferos. gens que depois vão revelar as alterações que estes dinossauros sofreram ao longo dos tempos", conta. Só as imagens recolhidas em Marrocos não chegam para reconstituir os movimen- tos do Tazoudasaurus. Será preciso confron- tar as dimensões com a forma dos ossos de exemplares que estão expostos em vários A reconstituição será feita a partir da análise estatística dos ossos encontrados Há sempre um clima de companheiris- mo", diz. museus. 0 paleontólogo já visitou 12, mas ainda o espe- ram mais oito. As próximas vi- sitas, agendadas para Julho, vão levá-lo à Alemanha. Apesar de ser um apreciador do "traba- lho de laboratório", Luís Rodrigues não encontra nada comparável com o trabalho de campo. "Costumo dizer que os paleon- tólogos são pessoas demasiado informais. CINCO ANOS ligado ao MNHN, o inves- tigador será o terceiro português doutora- do em Paleobiología de Dinossauros pela Universidade Autónoma de Madrid, onde é orientado por Jeffrey Wilson. "É o maior especialista mundial em sauró- podes, espécie à qual pertencem os ossos de dinossauro encon- trados em Marrocos", explica. 0 gosto pelos animais gigan- tes surgiu na adolescência. So- bretudo a partir do momento em que decidiu frequentar o curso de Bio- logia e Geologia, em Vila Real. Seguiu-se a ida para Espanha, onde ti- rou uma especialização em Paleontologia, que lhe aguçou ainda mais a curiosidade sobre estes seres já recriados por Steven Spielberg. Luís não está em Hollywood e por isso as suas motivações são outras. "Os fósseis dos dinossauros ajudam a com- preender melhor a vida na terra", diz. • 94 23 MARCO 2006

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SOCIEDADE

CIÊNCIA. INVESTIGAÇÃO

Dinossauros a três dimensões Esteve em Marrocos a fotografar ossos com milhões de anos. Agora, Luís Rodrigues vai reconstituir o corpo e os movimentos do dinossauro mais antigo do mundo

ABÍLIO RIBEIRO

Correu bem, mas podia ter acabado em tragédia. Luís Rodrigues, 34 anos, pa-leontólogo, estava no museu de Car-

negie, nos Estados Unidos, a analisar os­sos de dinossauro, quando um deles qua­se lhe caiu em cima. "Tinha 1,80 m, pesava centenas de quilos e podia esmagar-me. Tivemos de o deslocar e, durante a opera­ção, ia levando com ele em cima", conta à SÁBADO. O episódio não assustou o in­vestigador do Museu Nacional de História Natural (MNHN) e, este mês, Luís Rodri­gues foi a Marrocos para digitalizar os os­sos do dinossauro mais antigo do mun­do. Trata-se do Tazoudasaurus, uma espé­cie com cerca de 180 milhões de anos, baptizada com o nome da localidade onde foram encontra­dos os seus restos, em 1998 - Ta-zuda. "Descobriram-se ossos de um adulto com nove metros e res­tos de dois juvenis", explica.

Luís é o único investigador por­tuguês envolvido neste projecto. A sua participação deve-se à tecno­logia pioneira do MNHN, que já foi uti­lizada noutros programas semelhantes: o MicroScribe, aparelho que digitaliza a morfologia dos ossos.

Até 2007 o paleontólogo espera criar imagens a três dimensões que mostrem como os Tazoudasaurus se deslocavam. "Fa­remos sobreposições matemáticas e análi­ses estatísticas da forma dos ossos. É com­plexo, mas é isto que está por trás das ima-

Mistérios dos Tazoudasaurus

0 Tazoudasaurus passou pela Terra há cerca de 180 milhões de anos. Os primeiros indícios da sua existência foram descobertos em 1998, em Marrocos, na localidade de Tazuda -daía designação de Tazoudasaurus. Estes animais passaram de bípedes a quadrúpedes. Luís Rodrigues poderá descobrir o porquê desta evolução, que não se verificou noutros mamíferos.

gens que depois vão revelar as alterações que estes dinossauros sofreram ao longo dos tempos", conta.

Só as imagens recolhidas em Marrocos não chegam para reconstituir os movimen­tos do Tazoudasaurus. Será preciso confron­tar as dimensões com a forma dos ossos de exemplares que estão expostos em vários

A reconstituição será feita a partir da análise estatística

dos ossos encontrados

Há sempre um clima de companheiris­mo", diz.

museus. 0 paleontólogo já visitou 12, mas ainda o espe­ram mais oito. As próximas vi­

sitas, agendadas para Julho, vão levá-lo à Alemanha.

Apesar de ser um apreciador do "traba­lho de laboratório", Luís Rodrigues não encontra nada comparável com o trabalho de campo. "Costumo dizer que os paleon-tólogos são pessoas demasiado informais.

HÁ CINCO ANOS ligado ao MNHN, o inves­tigador será o terceiro português doutora­do em Paleobiología de Dinossauros pela Universidade Autónoma de Madrid, onde é orientado por Jeffrey Wilson. "É o maior

especialista mundial em sauró-podes, espécie à qual pertencem os ossos de dinossauro encon­trados em Marrocos", explica.

0 gosto pelos animais gigan­tes surgiu na adolescência. So­bretudo a partir do momento

em que decidiu frequentar o curso de Bio­logia e Geologia, em Vila Real.

Seguiu-se a ida para Espanha, onde ti­rou uma especialização em Paleontologia, que lhe aguçou ainda mais a curiosidade sobre estes seres já recriados por Steven Spielberg. Luís não está em Hollywood e por isso as suas motivações são outras. "Os fósseis dos dinossauros ajudam a com­preender melhor a vida na terra", diz. •

94 23 MARCO 2006