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DIREITO CONSTITUCIONAL EM EXERCÍCIOS
ANALISTA LEGISLATIVO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
MATERIAL DE APOIO E EXERCÍCIOS
Pontos do edital enfrentados neste material: 1.1 Princípios fundamentais (arts. 1º a 4º). 2
Aplicabilidade das normas constitucionais. 2.1 Normas de eficácia plena, contida e limitada. 2.2 Normas
programáticas.
Considerações doutrinárias sobre princípios fundamentais (arts. 1º a 4º da CF/88)
Os princípios constituem a base do ordenamento jurídico de um Estado e influenciam a
formação, a interpretação e a integração das demais normas jurídicas. Para além dessas funções
normogenética, interpretativa e integradora, os princípios desempenham um papel sistemático,
por meio do qual dão coerência interna a todo o sistema normativo.
São características dos princípios jurídicos:
a) o alto grau de generalidade, abstração e indeterminação;
b) a força normativa (as normas jurídicas dividem-se em regras e princípios, sendo que
ambos impõem obrigações legais);
Na aplicação aos casos concretos, os princípios não se submetem à lógica do tudo ou
nada, característica das regras, pela qual, presentes os seus pressupostos fáticos, ou a regra é
integralmente aplicada ao caso que lhe é submetido, caso válida, ou não é aplicada por ser
considerada inválida, à luz dos critérios cronológico, hierárquico e da especialidade.
O princípio possui uma dimensão de peso e pode não ser aplicado num caso concreto,
apesar de válido e pertinente, em razão da incidência de outros princípios igualmente aplicáveis.
Daí que os princípios são considerados como mandados de otimização e devem ser aplicados
na medida do possível e a depender das circunstâncias do caso concreto.
No caso de colisão de princípios, deverá ser feita uma ponderação de interesses, com a
utilização do princípio da proporcionalidade, que resulte na solução mais justa ao caso
concreto1.
Os princípios constitucionais, por estarem no topo do ordenamento jurídico, dão
coerência e unidade de sentido a todo o sistema normativo.
A doutrina reconhece a existência de princípios constitucionais positivados e não
positivados. O principal exemplo de princípio não positivado na CF88 é o princípio da
proporcionalidade, deduzido do seu art. 5.º, LIV.
Princípio do Estado Democrático de Direito O princípio do Estado Democrático de Direito (CF, art. 1.º) representa uma evolução da
concepção inicial do Estado Liberal de Direito. É importante que tenhamos uma noção da
evolução desses paradigmas.
1.º) Estado Liberal de Direito – surgiu com as revoluções liberais burguesas do final
do século XVIII e exigia: a submissão ao império da lei (inclusive que o Estado fosse limitado
pelas normas jurídicas escritas e elaboradas pelos representantes do povo); a adoção do
princípio da separação de poderes; e a previsão de direitos fundamentais, principalmente do
direito de liberdade individual (direito de 1.ª geração).
2.º) Estado Social de Direito (também chamado de Estado do bem-estar social, Welfare
State ou Estado-providência) – originou-se dos movimentos operários e sociais do final do
século XIX que criticavam a inércia do Estado Liberal de Direito.
O qualificativo social teve a intenção de corrigir o individualismo e o abstencionismo
do Estado Liberal, além de exigir uma atuação mais forte do Estado e a garantia dos chamados
direitos sociais (exs.: saúde, educação, moradia, trabalho, previdência social, etc. – direitos de
2.ª geração), a fim de realizar a justiça social.
Ocorre que os ideais de um Estado intervencionista, sob a pretensa justificativa de
promover a justiça social, desvirtuaram-se na forma de Estados totalitários, evidenciando que o
1 Entendida como aquela que melhor realize o princípio da dignidade da pessoa humana e onde a restrição a cada
princípio em jogo seja a mínima indispensável à sobrevivência do outro.
qualificativo social não garantiu o surgimento de um efetivo Estado promotor do bem-estar
geral!
Surge, enfim, a concepção do Estado Democrático de Direito (após a 2.ª guerra
mundial), o qual, sem abandonar os ideais de justiça social (daí também ser chamado de Estado
da social-democracia), incorpora os princípios democráticos da soberania popular, da
participação do povo na gestão da coisa pública e do pluralismo político, como garantias de que
os direitos fundamentais sejam respeitados e a justiça social, implementada.
Na lição da doutrina, o Estado Democrático de Direito representa mais do que a simples
reunião do Estado de Direito com o Estado Democrático. Nesse sentido, ele estabelece um
conceito novo que incorpora um (terceiro) componente revolucionário de transformação do
status quo.
Ressalte-se que o Brasil adotou o modelo semidireto de democracia, pelo qual o povo
exerce o poder por meios de representantes eleitos (democracia indireta ou representativa),
ou diretamente pela participação em plebiscitos, referendos, iniciativa popular de lei, além do
ajuizamento de ação popular (mecanismos de democracia direta).
Formas de governo
A forma de governo diz respeito a como o poder político é adquirido e exercido na
comunidade. Dito de outra forma, a forma de governo refere-se a como se dá a relação entre
governantes e governados.
De acordo com a classificação de Nicolau Maquiavel, existem duas formas de governo:
a república e a monarquia.
São características da república:
a) o poder político é adquirido por meio de eleições e exercido de maneira temporária
(poder eletivo e temporário);
b) os governantes são representantes do povo e exercem o poder em seu nome;
c) é prevista a responsabilização dos governantes que gerenciem mal a coisa pública (res
publica, coisa do povo) e há o dever de prestação de contas (princípio da publicidade).
Já a monarquia é caracterizada pelo:
a) poder político adquirido pela hereditariedade e exercido de forma vitalícia (poder
hereditário e vitalício);
b) os governantes não são representantes eleitos do povo;
c) não há previsão de responsabilização do monarca ou de prestação de contas.
Formas de Estado
A forma de estado revela como o poder político se encontra distribuído em função do
território. Se tivermos um poder político concentrado no espaço territorial, teremos o Estado
simples ou unitário.
Se tivermos um poder político repartido em função do território, o que resulta em uma
pluralidade de entidades governamentais (ex.: União, estados-membros, DF e municípios),
teremos o Estado composto ou complexo.
As duas principais formas de estado composto ou complexo são:
a) A confederação: união de Estados soberanos que, por meio de um tratado (vínculo
contratual), associam-se para determinados fins (ex.: defesa e paz externas). Na confederação,
os Estados mantêm as suas soberanias, sendo possível qualquer deles desligar-se da
Confederação (direito de secessão). Ex.: Confederação dos Estados Unidos, de 1781 a 1787.
b) A federação: união de dois ou mais Estados que, por meio de uma Constituição
(vínculo constitucional), formam uma nova organização estatal. Na Federação, o Estado
Federal é o único dotado de soberania, enquanto os estados-membros possuem autonomia
administrativa e política. Aqui, não há o direito de secessão. Exs.: Brasil, Argentina, EUA e
México.
Considerações gerais sobre o federalismo e sobre a versão brasileira
A forma federativa de Estado é adotada no Brasil desde o Decreto n.º 1, de 15/11/1889
(o qual instituiu também a forma republicana de governo) e consolidada na Constituição de
1891.
A Federação foi mantida nas Constituições brasileiras posteriores, com a ressalva das
CFs de 1937, 1967 e de sua EC n.º 1/69, as quais mantiveram apenas um federalismo de
fachada ou nominal. A CF/88 gravou a federação como cláusula pétrea no seu art. 60, § 4.º, I.
O Estado Federal consiste em espécie de Estado composto, o qual é caracterizado pela
divisão espacial do poder, i.e., o poder político encontra-se dividido em relação ao
território. Assim, no Estado Federal existe uma pluralidade de entidades governamentais (no
Brasil: a União, os estados-membros, o DF e os municípios) e de ordenamentos jurídicos, a
saber:
a) o ordenamento jurídico nacional ou total, que obriga todas as entidades da Federação
(daí a expressão leis nacionais, como é o caso da LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional – Lei n.º 9.394/96); e
b) os ordenamentos jurídicos parciais, que são: o federal, os estaduais, o distrital e os
municipais, os quais vinculam respectivamente a União (ex.: Lei n.º 8.112/90), os estados, o
DF e os municípios.
No Estado Federal, portanto, sobre um mesmo território e população, convivem uma
pluralidade de entidades governamentais e de ordenamentos jurídicos, no intuito de
conciliar a unidade necessária às atividades de interesse nacional e comum (ex.: defesa externa)
com o respeito às diferenças regionais.
A Federação caracteriza-se por ser a reunião de entidades federativas dotadas de
autonomia (e não soberania, a qual é privativa do Estado Federal), unidas em torno de uma
Constituição rígida, que organiza a Federação e distribui as tarefas estatais entre as entidades
(trazendo o chamado pacto federativo), numa concepção maior de descentralização político-
administrativa do poder do Estado.
Podemos resumir da seguinte forma as características comuns a um Estado Federal:
a) Existe uma Constituição Federal rígida, que organiza o Estado Federativo.
b) A Federação caracteriza-se por uma descentralização político-administrativa e por
uma divisão espacial do poder, que geram uma pluralidade de entidades governamentais e de
ordenamentos jurídicos dentro de um mesmo território estatal.
c) O Estado Federal (a República Federativa do Brasil) é o único dotado de
soberania, entendida esta como o poder de autodeterminação plena, não condicionado a
nenhum outro poder, externo ou interno.
d) As entidades federativas (União, estados, DF e municípios) são dotadas apenas de
autonomia, concebida como a capacidade de autodeterminação (financeira, administrativa,
legislativa, orçamentária e política – FALOP), dentro dos limites previstos na CF/88.
e) É inadmissível o direito de secessão (os entes federativos não possuem o direito de
se separar do Estado Federal – princípio da indissolubilidade federativa). No Brasil,
qualquer movimento separatista resultará na decretação de intervenção federal (CF, art. 34, I).
f) Não existe hierarquia entre os entes da Federação (a União não é hierarquicamente
superior aos estados nem estes aos municípios).
g) Há repartição de competências entre os entes (no pacto federativo, serão repartidas
as tarefas estatais entre as entidades e se assegurará exatamente a autonomia necessária para o
cumprimento das atribuições de cada um).
h) As entidades federativas participam na formação da vontade nacional (por meio
do Senado Federal, constituído de representantes dos estados-membros e do DF).
i) É previsto um controle de constitucionalidade para evitar a invasão de
competências entre os entes da Federação.
j) Existe um guardião da Constituição (no Brasil, o STF).
Importante para concursos!
- O Estado brasileiro (a República Federativa do Brasil) é o único dotado de soberania (ampla
liberdade externa e interna). A União, os estados-membros, o DF e os municípios são dotados
apenas de autonomia (liberdade político-administrativa nos limites da CF).
- Na Federação, não existe o direito de secessão, valendo o princípio da indissolubilidade
federativa.
Já as características da federação brasileira são as seguintes:
a) Trata-se de uma federação de formação centrífuga (movimento do centro para as
extremidades), uma vez que foi o Estado unitário brasileiro (o ―Império do Brazil‖) que decidiu
se dividir em 1889; diferentemente da federação norte-americana, a qual surgiu quando os
Estados Americanos confederados, dotados de soberania, resolveram se unir sob a forma
federativa (federação de formação centrípeta).
b) Pela mesma razão, o federalismo brasileiro é classificado como um federalismo por
desagregação ou por segregação (o Estado unitário soberano decidiu dividir-se em Estados-
membros autônomos ainda não existentes), enquanto o federalismo dos EUA é tido como um
federalismo por agregação (vários Estados soberanos decidiram unir-se, formando um único
Estado Federativo). Essa, inclusive, é a razão pela qual os Estados-membros norte-americanos
possuem uma autonomia muito superior à concedida aos estados-membros brasileiros.
c) A CF/88 tenta implementar um federalismo de equilíbrio (entre o poder central e os
poderes regionais e locais), mas, na prática, ainda constata-se no Brasil um federalismo
centrípeto (com a concentração maior de poder no ente central).
d) O federalismo brasileiro é tridimensional, tricotômico, trino, tríplice ou
tripartido, por reconhecer 3 esferas governamentais: a central da União, a regional dos estados
e a local dos municípios (o DF acumula as esferas: regional e local, tendo a principal função de
abrigar a Capital da República, Brasília, e os Poderes da União).
Nesse ponto, o Brasil não seguiu o federalismo norte-americano, denominado de
clássico ou dual, que conhece duas esferas de poder: o central da União e o regional dos
estados-membros.
e) Apesar de manter o federalismo homogêneo ou simétrico, em que cada ente
federativo é dotado da mesma parcela de poder, a CF/88 faz concessões ao federalismo
assimétrico ou heterogêneo, pelo qual se reconhece uma situação de desigualdade entre os
entes e propõe-se o tratamento diferenciado, a fim de promover o equilíbrio federativo (ex.:CF,
arts. 45, § 1.º, e 43, § 2.º).
f) A CF/88 contempla mecanismos do federalismo cooperativo, pelo qual as entidades
da Federação auxiliam-se mutuamente, por meio de subsídios, transferência de receitas, etc., a
fim de garantir que as competências federativas sejam cumpridas por cada ente da maneira mais
eficiente possível (ex.: CF, arts. 157 a 162 e 23, § único).
g) O federalismo dual ou clássico (norte-americano) adota a repartição horizontal de
competências, em que há uma atuação separada e independente entre as entidades federadas
(sem competências comuns ou concorrentes). A CF/88 abraça a repartição horizontal de
competências em seus arts. 21, 22, 25, § 1.º, e 30.
Já nos seus arts. 23 e 24, a CF/88 adota a repartição vertical de competências, típica
do federalismo cooperativo, em que há uma atuação conjunta e coordenada entre os entes
federativos (em níveis distintos, como na competência concorrente do art. 24, ou em pé de
igualdade, como na competência comum do art. 23).
Sistemas de governo O sistema de governo dispõe sobre a relação entre o Poder Executivo e o Legislativo
no exercício de suas funções. Uma maior independência entre esses Poderes revela o sistema
presidencialista. Uma maior interdependência e colaboração entre o Legislativo e o Executivo
geram o sistema parlamentarista.
São características do sistema de governo presidencialista:
a) o presidente da República acumula as funções de chefe de Estado e de chefe de
Governo (o Poder Executivo é, portanto, monocrático, concentrado na figura do
presidente da República);
b) Os ministros de Estado são meros auxiliares do presidente da República, de livre
nomeação e exoneração;
c) O presidente da República é eleito para um mandato fixo e autônomo e não necessita
da confiança do Legislativo para permanecer no poder;
d) O Legislativo não está sujeito à dissolução, pois os seus membros são eleitos para um
mandato fixo e pré-determinado.
e) Relação entre Executivo e Legislativo é mais rígida, vigorando o princípio da
separação dos poderes, independentes e harmônicos entre si;
f) É típico das repúblicas.
Por outro lado, são características do sistema de governo parlamentarista:
a) O Poder Executivo encontra-se dividido em duas figuras (Executivo dual): o
primeiro-ministro (chefe de Governo) e o monarca ou presidente da República
(chefe de Estado);
b) O Legislativo (chamado aqui de Parlamento) assume funções políticas e
governamentais, pois o gabinete de ministros (cujo chefe é o primeiro-ministro) é
formado por membros do Parlamento;
c) Há uma interdependência entre o Legislativo e o Executivo, que gera, não uma
independência, mas uma colaboração entre esses poderes. Como consequencia, o
governo pode ser responsabilizado perante o Parlamento, por meio do voto ou da
moção de desconfiança, que resulta na destituição do gabinete e do primeiro-ministro
(o qual, portanto, não possui mandato fixo e pré-estabelecido); e o Parlamento pode ser
dissolvido pelo chefe de Estado, o que resulta na convocação de novas eleições
parlamentares;
d) O parlamentarismo é típico das monarquias, mas é adotado também pelas repúblicas
européias (exs.: França, Alemanha, Portugal e Itália).
Ressalte-se que o Brasil adotou, na CF88, a forma de governo republicana, a forma de
Estado federativa e o sistema de governo presidencialista.
A Constituição, no seu art. 60, § 4.º, gravou a forma federativa de Estado como
cláusula pétrea. Já a forma de governo republicana não é cláusula pétrea da CF88, mas um
princípio constitucional sensível da Carta Republicana (art. 34, VII), que enseja a intervenção
federal no estado-membro que a desrespeitar.
Princípio da separação dos poderes
Consagrado na obra do Barão de Montesquieu ―O espírito das leis‖, o princípio da
separação dos poderes propõe que as funções do Estado (legislativa, executiva e judiciária)
sejam exercidas por órgãos distintos e autônomos, sem qualquer ingerência de um órgão sobre o
outro.
Esse princípio busca a limitação do poder do Estado por meio de uma fiscalização
recíproca entre os órgãos (denominados impropriamente de Poderes), a fim de evitar o arbítrio e
o abuso do poder estatal.
Ocorre que o princípio da separação entre os Poderes não é mais concebido em sua
concepção rígida, que imperou nas revoluções francesa e americana. Atualmente, prevalece
uma concepção flexível, com as seguintes características:
a) Separação não absoluta entre os poderes – a distribuição das funções estatais entre
os poderes não ocorre com exclusividade absoluta. Exemplos: o Poder Executivo edita medidas
provisórias (CF, art. 62), enquanto o Poder Legislativo possui a função de julgar o impeachment
do presidente da República (CF, art. 52, I).
b) Sistema de freios e contrapesos (checks and balances) – os poderes devem interferir
uns nos outros para que haja a limitação e a fiscalização do exercício das funções estatais.
Exemplos: o presidente da República veta os projetos de lei do Legislativo (CF, art. 66); o
Poder Judiciário declara a inconstitucionalidade das leis elaboradas pelo Legislativo (CF, art.
102, I, a).
Resumo de José Afonso da Silva (JAS) sobre princípios fundamentais
1. Na aplicação aos casos concretos, os princípios não se submetem à lógica do tudo ou
nada, característica das regras (ou a regra é aplicada, caso válida, ou não é aplicada, pelos
critérios cronológico, hierárquico e da especialidade; conflito entre regras gera antinomia). Já os
princípios possuem uma dimensão de peso, de importância (valor), são aplicados na medida
do possível (são mandados de otimização) e o conflito entre eles não gera antinomia (pois os
princípios convivem). Na colisão de princípios, faz-se a ponderação de interesses, com a
utilização do princípio da proporcionalidade.
2. J.J. Gomes Canotilho divide a Constituição em um sistema aberto de princípios e
regras. Ronald Dworkin divide a CF em regras, princípios e diretrizes políticas. José Afonso
da Silva (JAS) divide-a em normas e princípios, enquanto a palavra regra é mais ampla.
3. Para JAS, princípio é o núcleo de condensação no qual conflui valores e bens
constitucionais e, quando positivados, transformam-se em normas-princípio.
4. Princípios jurídico-constitucionais: são princípios constitucionais gerais informadores
da ordem jurídica nacional, não raro são desdobramentos dos princípios fundamentais (princípio
da constitucionalidade – desdobramento da supremacia da CF -, da legalidade, da proibição do
excesso, da imparcialidade, da isonomia, da autonomia individual – desdobramentos da
declaração de direitos). Princípios político-constitucionais: são os princípios constitucionais
fundamentais, as decisões políticas fundamentais de Carl Schmitt (arts. 1º a 5º da CF).
Princípios institucionais ou regionais: regem e modelam o sistema normativo das instituições
constitucionais, como os princípios da Administração Pública, do processo legislativo, do
sistema tributário e orçamentário, da ordem econômica, da independência da magistratura e os
princípios-garantias (nullum crimen sine lege, nulla poena sine lege, devido processo legal, juiz
natural, ampla defesa e contraditório).
5. Princípios constitucionais fundamentais: estão positivados na CF (Título I),
traduzindo-se em normas fundamentais, normas-síntese ou normas-matrizes que contêm as
decisões políticas fundamentais. Alguns deles são normas-sínteses ou normas-matrizes (ex:
separação de poderes, soberania popular, República Federativa do Brasil, Estado Democrático
de Direito), que possuem aplicabilidade direta e imediata. Princípios gerais do direito
constitucional: formam temas de uma teoria geral do Direito Constitucional, de um direito
constitucional geral (ex.: princípios da supremacia da CF, rigidez constitucional, classificação
das constituições, poder constituinte).
6. Disposições programáticas: são as normas de eficácia limitada de princípio
programático, de aplicabilidade mediata/indireta/diferida/reduzida.
7. Fundamentos da R.F.B.: SO – DI – CI – VA – PLU. RFB: regra que traz a forma de
governo e a forma de Estado (a CF/88 apenas perenizou a república e a federação já instaladas
no Brasil desde 1889) e Estado Democr. Dir.: regra que traz o tipo de Estado e o regime
político/regime de governo adotado.
7.1. Soberania: desnecessário, pois inerente ao conceito de Estado; é também princípio da
ordem econômica; significa poder político supremo (não limitado por nenhum outro na ordem
interna – soberania interna) e independente (está em pé de igualdade e não deve se submeter a
qualquer ordem que não seja voluntariamente aceita na ordem internacional – soberania
externa); a independência nacional também está nos arts. 3.º, I, e 4.º, I, da CF/88.
7.2. Cidadania: a cidadania é tributária da soberania popular, cidadão como o nacional
dotado de direitos políticos de votar e ser votado (oposta à ideia de vassalagem). Cidadão no
sentido amplo: todos os nacionais; no sentido restrito: nacional titular de direitos políticos. A
nova dimensão da cidadania decorre da ―Constituição dirigente‖ com a previsão de direitos
sociais mais ou menos eficazes (evolução dos direitos fundamentais do ser humano). JAS:
cidadania é mais do que titular de direitos políticos, é participante da vida do Estado, integrado
na sociedade estatal, com o Estado submetido à vontade popular.
7.3. Dignidade da pessoa humana: os seres racionais (pessoas) são um fim em si mesmo,
devem ser objeto de respeito e não podem ser tratados como meios, ao contrário das coisas
(Kant). Coisas têm preço, pessoas têm dignidade. A CF/88 não o criou, apenas o reconheceu
como valor supremo (não só da ordem jurídica, mas também da política, econômica, social e
cultural) que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem (inclusive sociais,
culturais e econômicos). A CF não protegeu a dignidade como dignidade de natureza espiritual,
intelectual, social ou moral, mas a dignidade inerente a qualquer pessoa humana, independente
de como se comporte (nem mesmo um comportamento indigno priva a pessoa de seus direitos
fundamentais), daí que a CF não traz a pena de morte generalizada ou permite a tortura em
casos de crimes hediondos. A dignidade humana baseia-se na autonomia (liberdade) do homem
e exige condições mínimas de existência digna conforme os ditames da justiça social.
7.4. Valores sociais do trabalho (livre escolha do trabalho, direito a condições equitativas
e de igualdade de tratamento, além de remuneração digna) e da livre iniciativa (liberdade para
regular suas relações comerciais, exercer livremente a atividade escolhida, etc.). São também
princípios da ordem econômica. Os valores da livre iniciativa estão subordinados à função
social da empresa e ao dever de propiciar melhores condições de vida aos trabalhadores, daí que
a CF/88 não valoriza o lucro pelo lucro.
7.5. Pluralismo político: a CF/88 opta pela sociedade pluralista, que respeite a pessoa
humana e a liberdade, em lugar da sociedade monista, dos regimes coletivistas, monolíticos e de
poder fechado.
8. A Democracia não é um valor em si, mas meio de realização de valores essenciais de
convivência, que são os direitos fundamentais. Não é um processo estático, pois evolui com o
processo de afirmação do povo e de seus direitos. A CF/88 combina representação (democracia
representativa – participação popular indireta, periódica e formal) e participação direta
(democracia participativa – participação direta e pessoal da cidadania na formação dos atos de
governo), tendendo para a democracia participativa. Instrumentos da CF/88 de democracia
semidireta: iniciativa popular, referendo, plebiscito, arts. 10, 11, 31, § 3º, 74, § 2º, 194, VII, 206,
VI, 216, § 1º. Democracia é regime político (ou regime constitucional ou regime de governo),
sendo o regime político o complexo estrutural de instituições, princípios e forças políticas que
configuram determinada concepção de Estado e de sociedade, e que inspiram ser ordenamento
jurídico. Os regimes políticos são a democracia (organizados de baixo pra cima, soberania
popular, respeito aos direitos fundamentais) e a autocracia (de cima para baixo, princípio do
chefe, soberania do governante, privação de direitos fundamentais). Todo o poder emana do
povo, mas o poder do povo submete-se à Constituição. No E.D.D., não se abandona o ideal de
justiça social do Estado Social de Direito nem os princípios da legalidade, da separação e
poderes e dos direitos fundamentais do Estado Liberal. Mas a eles se agrega um 3º componente
revolucionário ou de transformação do status quo. A lei no E.D.D. não deve ser apenas geral e
abstrata, mas promover intervenções que promovam a justiça social (ex.: ações afirmativas).
9. Princípio da divisão de Poderes: esteve sempre presente em nosso Estado. No Império,
prevaleceu a separação quadripartida com a inclusão do Poder Moderador (Benjamin Constant),
a partir de 1891, prevaleceu a separação tripartida de Montesquieu. Esse princípio não se
contrapõe as características fundamentais do poder político: unidade, indivisibilidade e
indelegabilidade, sendo, na verdade, impróprio falar em divisão ou delegação de Poderes. Não
se deve confundir distinção de funções do poder (especialização das tarefas estatais, sem
considerar se os órgãos que a exercem são concentrados ou separados) com divisão de poderes
(que consiste na técnica de confiar cada uma dessas funções a órgãos diferentes – Legislativo,
Executivo e Judiciário). A divisão de poderes fundamenta-se em dois elementos: especialização
funcional e independência orgânica (i.e., ausência de subordinação entre eles). No
parlamentarismo, há colaboração de poderes. No presidencialismo, há independência orgânica
(a investidura, o exercício e a permanência no poder não depende da confiança, da vontade ou
da autorização dos outros Poderes) e harmonia (cortesia no trato e respeito às prerrogativas e
imunidades) dos Poderes. Exemplos de mecanismos de freios e contrapesos: iniciativa
legislativa privativa do Poder Executivo (art. 61, § 1º), sanção/veto (art. 66), pedido de urgência
constitucional (art. 64, §§ 1º a 4º), declaração judicial de inconstitucionalidade das leis,
nomeação dos ministros dos tribunais superiores pelo Executivo com sabatina do Senado (arts.
101, 104, etc.), congressistas podem exercer funções de Ministro de Estado sem perder o
mandato (art. 56, I), convocação de ministros para depor perante o Parlamento (art. 50) e a
edição de medidas provisórias e leis delegadas pelo presidente da República (arts. 62 e 68).
Jurisprudência: norma inserida, por emenda parlamentar, em projeto de iniciativa exclusiva do
Chefe do Poder Executivo, que acarreta aumento de despesa pública – Ofensa aos princípios da
independência e harmonia entre os Poderes (STF, ADI/MC 873/RS). A função executiva
divide-se em função de governo, com atribuições políticas, co-legislativas e de decisão
(exercida pelo órgãos supremos ou constitucionais, que formam o governo), e função
administrativa (exercida pelos órgãos dependentes ou administrativos, que formam a
Administração Pública), com as missões de intervenção, fomento e serviço público.
10. Objetivos fundamentais da R.F.B. (art. 3º): CO – RE – ER – PROMO – GA. Não
são objetivos de governo, mas do Estado. Só na aparência têm sentido programático. São
normas dirigentes ou teleológicas, que apontam fins positivos a serem alcançados pela aplicação
de outras normas da CF/88. O art. 3º traz os fins a que se subordina o Estado constitucional
brasileiro, o qual se encontra constitucionalmente vinculado quanto aos meios e quanto aos fins.
Garantia do desenvolvimento nacional: na CF/67, era apenas um princípio da ordem econômica
(a Ditadura buscava o crescimento/desenvolvimento econômico); na CF/88, o desenvolvimento
é nacional em todas as dimensões, daí que não se quer simples crescimento econômico sem
justiça social! O direito ao desenvolvimento é direito fundamental de 3ª geração voltado para a
melhoria da qualidade de vida das pessoas.
11. Princípios da R.F.B. em suas relações internacionais: são de eficácia plena,
aplicabilidade imediata e observância obrigatória, ainda que alguns contenham enunciados
abertos, mas que são determináveis pela doutrina. Relações internacionais é mais amplo que
relações externas ou exteriores, porque abrange não só as relações com Estados, mas também
com organismos internacionais e comunitários. A independência nacional reafirma o caráter
externo da soberania, mas não é pura redundância, ao inadmitir qualquer laço de união ou
federação que se oponha à independência. Autodeterminação dos povos provém do princípio
das nacionalidades, segundo o qual é direito de uma nação escolher seu próprio governo, mas o
Brasil repele qualquer autodeterminação que desrespeite os direitos fundamentais, daí que o
princípio não pode dar margem à formação de regimes autoritários e ditatoriais. A paz (direito
fundamental de 3ª geração) defendida pela CF é a ausência de conflitos armados, ainda que sem
a declaração formal de guerra. Guerra e paz são celebrados pelo presidente da República com a
autorização ou referendo do Congresso nacional (CF, art. 84, XX). O Brasil não pode entrar em
guerra de conquista, direta ou indiretamente, por si ou em aliança com terceiro. Asilo político:
compreende dois institutos inconfundíveis: asilo diplomático (depende de acordos
internacionais e propõe-se a abrigar o indivíduo na repartição diplomática) e asilo territorial
(instituto de Direito interno, que se propõe a receber indivíduo no território, sem os requisitos
normais de ingresso, a seu pedido, para evitar perseguição por delito de natureza política ou
ideológica). O asilo político não pode ser invocado em caso de perseguição legítima pela prática
de crimes comuns ou por atos contrários aos princípios da ONU. O asilado fica sujeito às
normas de Direito interno do Brasil e não pode sair do país sem autorização do governo
brasileiro, sob pena de renúncia ao asilo e impedimento de reingresso nessa condição.
12. Forma de governo: maneira como se dá a instituição do poder e a relação entre
governantes e governados (quem e como se exerce o poder). República e monarquia (Nicolau
Maquiavel; Aristóteles: monarquia e tirania, aristocracia e oligarquia, república/democracia e
demagogia). A república na CF/88 é mais do que contraposição à forma de governo
monárquica. É afirmar a ―coisa do povo‖, contra qualquer forma de tirania. Características da
república: poder eletivo e temporário, princípio da representatividade, publicidade,
transparência, igualdade, ausência de privilégios, responsabilização dos governantes, prestação
de contas. Forma de estado: como o poder político se encontra distribuído em função do
território. Estados simples ou unitários e Estados compostos ou complexos (federação – estados
dotados de autonomia política e administrativa reunidos por uma Constituição rígida, sem
direito de secessão; confederação: reunião de estados soberanos por tratado internacional, há
direito de secessão). O movimento descentralizador nos estados unitários dá origem a estados
unitários com descentralização do tipo autárquica (administrativa, mas não política) ou até a
formas intermediárias de Estado (semifederais): o Estado Regional (Itália) e o Estado
Autonômico (Espanha). Sistema de governo: Sistema de governo: relação entre o Poder
Executivo e Legislativo. No sistema presidencialista, o Executivo é monocrático, os ministros
são meros auxiliares e de livre nomeação e exoneração e há independência e harmonia entre os
Poderes (no parlamentarismo, há colaboração entre os poderes e o Legislativo pode ser
dissolvido pelo chefe de Estado e o chefe de governo pode ser derrubado pelo parlamento). Na
CF/88, a federação é cláusula pétrea expressa (art. 60, § 4º) e a república é princípio
constitucional sensível (art. 34, VII).
Jurisprudências do STF sobre os princípios fundamentais dos arts. 1º a 4º da CF/88
Art. 1.º da CF/88
- ―O pacto federativo, sustentando-se na harmonia que deve presidir as relações institucionais entre as
comunidades políticas que compõem o Estado Federal, legitima as restrições de ordem constitucional que
afetam o exercício, pelos Estados-membros e Distrito Federal, de sua competência normativa em tema de
exoneração tributária pertinente ao ICMS.‖ (ADI 1.247‑MC)
- ―Ninguém é obrigado a cumprir ordem ilegal, ou a ela se submeter, ainda que emanada de autoridade
judicial. Mais: é dever de cidadania opor -se à ordem ilegal; caso contrário, nega -se o Estado de Direito.‖
(HC 73.454)
- ―Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à
integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por
escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da
prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado‖ (Súmula
Vinculante 11). No julgamento que deu origem a essa Súmula Vinculante, o STF decidiu que não se
harmoniza com o princípio da dignidade da pessoa humana (além de influenciar negativamente a decisão
dos jurados) manter o réu algemado durante o julgamento perante o Tribunal do Júri, sem que haja
demonstração de sua periculosidade (HC 91.952).
- ―A cláusula da reserva do possível – que não pode ser invocada, pelo Poder Público, com o propósito de
fraudar, de frustrar e de inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria
Constituição – encontra insuperável limitação na garantia constitucional do mínimo existencial, que
representa, no contexto de nosso ordenamento positivo, emanação direta do postulado da essencial
dignidade da pessoa humana. (...) A noção de ‗mínimo existencial‘, que resulta, por implicitude, de
determinados preceitos constitucionais (CF, art. 1º, III, e art. 3º, III), compreende um complexo de
prerrogativas cuja concretização revela -se capaz de garantir condições adequadas de existência digna, em
ordem a assegurar, à pessoa, acesso efetivo ao direito geral de liberdade e, também, a prestações positivas
originárias do Estado, viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais básicos, tais como o direito à
educação, o direito à proteção integral da criança e do adolescente, o direito à saúde, o direito à
assistência social, o direito à moradia, o direito à alimentação e o direito à segurança‖ (ARE 639.337‑AgR)
- ―A mera instauração de inquérito, quando evidente a atipicidade da conduta, constitui meio hábil a
impor violação aos direitos fundamentais, em especial ao princípio da dignidade humana‖ (HC 82.969).
- O STF entende que o suposto pai não pode ser obrigado a se submeter ao exame de DNA, pois tal
medida afrontaria a dignidade humana, a intimidade, a intangibilidade do corpo humano e o disposto no
art. 5.º, LXIII, da CF/88, razão pela qual não se admite decisão judicial, em ação civil de investigação de
paternidade, que implique determinação no sentido de o réu ser conduzido ao laboratório, ―debaixo de
vara‖, para coleta compulsória do material indispensável à feitura do exame DNA. Considera-se que, na
ação investigatória, a recusa do suposto pai em submeter-se ao exame de DNA induz presunção ―juris
tantum‖ de sua paternidade (vide ainda Súmula 301 do STJ) (HC 71.373)
- ―O direito ao nome insere-se no conceito de dignidade da pessoa humana, princípio alçado a
fundamento da República Federativa do Brasil (CF, art. 1º, III)‖ (RE 248.869)
- O STF declarou a inconstitucionalidade do art. 44 da Lei 11.343/2006, no ponto em que trazia a vedação
abstrata da concessão da liberdade provisória para os presos em flagrante pelo crime de tráfico de drogas.
Entendeu-se que da previsão do art. 5.º, XLIII, da CF/88, no sentido de serem inafiançáveis os
crimes de tráfico de drogas, não resulta a proibição de liberdade provisória e a imposição de uma
prisão “ex lege”, a impedir que o juiz analise em cada caso a necessidade da prisão cautelar, sob pena de
antecipação da pena criminal e de violação aos princípios da presunção de inocência, do devido processo
legal e da dignidade humana (HC 104339/SP).
- Acusações genéricas violam a ampla defesa: o processo penal de tipo acusatório repele, por ofensivas a
garantia da plenitude de defesa, quaisquer imputações que se mostrem indeterminadas, vagas,
contraditórias, omissas ou ambíguas. A denúncia – peça inaugural da ação penal – deve conter a
exposição do fato delituoso, em toda a sua essência e com todas as suas circunstancias, sob pena de
nulidade processual absoluta. Essa narração, ainda que sucinta, impõe-se ao acusador como exigência
derivada do postulado constitucional que assegura ao réu o exercício, em plenitude, do direito de defesa
(HC 70.763/DF). Ressalte-se que nos chamados crimes societários, isto é, nos crimes de autoria coletiva
praticados pelos sócios de determinada sociedade contra a ordem tributária (Lei n.º 8.137/90), ordem
financeira (Lei n.º 7.492/86) e previdência social (Lei n.º 9.983/00), houve mudança na orientação
jurisprudencial do STF que entendia ser apta a denúncia que não individualizasse as condutas de cada
indiciado, bastando a indicação de que os acusados fossem de algum modo responsáveis pela condução
da sociedade comercial sob a qual foram supostamente praticados os delitos. Com a mudança de
entendimento, o STF passou a exigir a individualização das condutas criminosas, i.e., a descrição, ainda
que mínima, da participação de cada um dos acusados nos crimes societários, a fim de possibilitar o
adequado exercício do direito de defesa e o respeito à dignidade humana (HC 86.362/SP).
- ECT e monopólio das atividades postais: O STF julgou improcedente ADPF que pedia a não recepção
de lei federal anterior à CF/88 que instituíra o monopólio das atividades postais pela Empresa Brasileira
de Correios e Telégrafos - ECT. Prevaleceu o entendimento pelo qual o serviço postal constitui serviço
público, portanto, não atividade econômica em sentido estrito, daí a não aplicação dos princípios da
livre iniciativa e da livre concorrência (STF, ADPF 46/DF).
- ―A fixação de horário de funcionamento de estabelecimento comercial é matéria de competência
municipal, considerando improcedentes as alegações de ofensa aos princípios constitucionais da
isonomia, da livre iniciativa, da livre concorrência, da liberdade de trabalho, da busca do pleno emprego e
da proteção ao consumidor‖ (AI 481.886‑AgR).
- ―Em face da atual Constituição, para conciliar o fundamento da livre iniciativa e do princípio da livre
concorrência com os da defesa do consumidor e da redução das desigualdades sociais, em conformidade
com os ditames da justiça social, pode o Estado, por via legislativa, regular a política de preços de
bens e de serviços, abusivo que é o poder econômico que visa ao aumento arbitrário dos lucros‖ (ADI
319‑QO).
- O STF julgou improcedente ADI contra lei estadual que assegura aos estudantes o pagamento de meia-
entrada do valor cobrado para o ingresso em eventos esportivos, culturais e de lazer. Considerou-se que,
se de um lado a Constituição assegura a livre iniciativa, de outro determina ao Estado a adoção de
providências tendentes a garantir o efetivo exercício do direito à educação, à cultura e ao desporto (ADI
1950/SP).
- Inconstitucionalidade da cláusula de barreira: O STF declarou a inconstitucionalidade de alguns
artigos da Lei 9.096/95 (Lei Orgânica dos Partidos Políticos) que condicionavam o funcionamento
parlamentar a determinado desempenho eleitoral (o que se conhece como ―cláusula de barreira ou de
desempenho‖), reduzindo, ainda, substancialmente o tempo de propaganda partidária gratuita (―direito de
antena‖) e a participação no rateio do Fundo Partidário, conforme alcançados, ou não, os patamares de
desempenho impostos para o funcionamento parlamentar. Entendeu-se que os dispositivos impugnados
violam o art. 1º, V (pluralismo político); o art. 17 (liberdade partidária) e o art. 58, § 1º (participação dos
partidos na constituição das mesas e comissões parlamentares), todos da CF/88. Considerou-se, ainda, que
o art. 17, IV, da CF/88 (funcionamento parlamentar de acordo com a lei) não autoriza o legislador
ordinário a esvaziar princípios constitucionais como o pluripartidarismo, nem inviabilizar, por completo,
esse funcionamento parlamentar, reduzindo a participação no Fundo Partidário e o tempo disponível para
a propaganda partidária, além de impedir a participação dos partidos minoritários na constituição das
mesas e comissões parlamentares (ADI 1.351/DF e ADI 1.354/DF).
- O STF decidiu que o princípio da insignificância penal não pode ser aplicado ao art. 290 do Código
Penal Militar (posse de substância entorpecente em lugar sujeito à administração castrense)
independentemente da quantidade da droga envolvida, não havendo que se cogitar de violação ao
princípio da dignidade humana nesse entendimento. Considerou-se que tal conduta ofende as instituições
militares, a operacionalidade das Forças Armadas, e os princípios da hierarquia e da disciplina (HC
94685/CE).
- O STF entendeu que o fato de o estrangeiro não possuir domicílio no território brasileiro não afasta, por
si só, o benefício penal da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito.
Entendimento contrário estaria baseado em indevida interpretação literal do art. 5º, ―caput‖, da CF/88,
pela qual os estrangeiros não residentes no País não seriam titulares de direitos fundamentais. Apesar de
os estrangeiros não serem titulares de todos os direitos fundamentais previstos na CF/88 (a exemplo dos
direitos políticos, privativos dos cidadãos brasileiros), o STF não admitiu o tratamento distintivo no caso
concreto (HC 94.477).
- O STF entendeu cabível impetração de ―habeas corpus‖ para assegurar a detento em estabelecimento
prisional o direito de receber visitas de seus filhos e enteados, por entender que tal privação agrava e
intensifica a restrição à liberdade de locomoção do réu. Lembrou-se, nesse julgamento, que a
possibilidade de impetração de ―habeas corpus‖ exige uma lesão ou ameaça, real ou ao menos potencial, à
liberdade de locomoção, o que foi reconhecido no presente caso e em outras situações, contra instauração
de inquérito criminal para tomada de depoimento, indiciamento policial, recebimento de denúncia,
sentença de pronúncia no âmbito do processo do Júri e decisão condenatória, entre outras (HC 107.701).
- A condenação por crime hediondo não enseja, por si só, uma proibição objetiva e incondicional à
concessão de prisão domiciliar, tendo em vista o princípio da dignidade da pessoa humana (HC 83.358).
Art. 2.º da CF/88
- ―É inconstitucional a criação, por Constituição estadual, de órgão de controle administrativo do Poder
Judiciário do qual participem representantes de outros Poderes ou entidades‖ (Súmula 649).
- O STF entendeu que as normas infraconstitucionais, aí incluída a lei federal, e as normas estaduais
(inclusive a constituição do estado) não podem criar novas interferências de um Poder na órbita de
outro que não derive explícita ou implicitamente de regra ou princípio da Constituição Federal. No
caso concreto, o STF declarou a inconstitucionalidade de norma de constituição estadual que autorizava a
qualquer parlamentar, individualmente, realizar o poder de fiscalização sobre a atuação administrativa do
Poder Executivo. Ocorre que tal poder, pela CF/88, é outorgado aos órgãos coletivos de cada câmara do
Congresso Nacional, no plano federal, e da Assembleia Legislativa, no âmbito dos Estados; nunca, aos
seus membros individualmente, salvo, é claro, quando atuem em representação (ou presentação) de sua
Casa ou comissão (ADI 3.046).
- O STF já decidiu que, no sistema ―belga‖ ou da ―contenciosidade limitada‖, adotado no Brasil, o STF
limita-se a examinar os requisitos legais de ordem formal para a concessão da extradição passiva (i.e.,
aquela que é solicitada ao Brasil), a exemplo: a) do compromisso do estado requerente de não aplicar
pena de morte não admitida no Brasil ou pena de caráter perpétuo (cuja execução supere 30 anos – art. 75
do Código Penal); e b) da existência de tratado internacional de extradição ou compromisso de
reciprocidade com o Brasil, nos termos dos arts. 76 e ss. da Lei n.º 6.815/80, sem adentrar no mérito da
acusação penal ou no contexto probatório em que a extradição se apoia. Apesar disso, a jurisprudência do
STF (Ext 1.082/Uruguai) excepcionalmente admite, no âmbito do processo de extradição passiva (CF, art.
102, I, ―g‖), a análise de alguns aspectos de mérito que envolvem o processo criminal no exterior, a
exemplo: a) da não ocorrência de prescrição penal (no Brasil ou no exterior); b) da observância do
princípio da dupla tipicidade (o fato deve ser considerado crime no Brasil e no ordenamento jurídico do
Estado requerente, sendo desnecessário que os crimes tenham a mesma designação formal); c) da não
configuração de extradição política ou de opinião (CF, art. 5.º, LII); d) da não observância, no processo
criminal estrangeiro, dos parâmetros do devido processo legal, do Estado de Direito e do direitos básicos
do réu, como a ampla defesa, a igualdade das partes e o juiz natural, em um ―fair trial‖ (Ext
897/República Tcheca e Ext 986/Bolívia).
- Afirmada a ilegalidade do processo extradicional pelo STF, tal decisão vincula o presidente da
República, que está proibido de dar sequência à extradição do indivíduo. Por outro lado, entendendo a
Suprema Corte ser cabível a extradição, o processo é encaminhado ao presidente da República, o
qual não se vincula a essa decisão do STF e pode decidir discricionariamente se extradita ou não o
indivíduo (CF, art. 84, VII) (Ext 1085/Itália). Assim, o princípio da separação dos Poderes indica não
competir ao STF rever o mérito de decisão do presidente da República acerca da efetivação ou não
da extradição (i.e., trata-se de medida insindicável pelo STF), vez que a extradição não é ato de um
dos Poderes do Estado, mas ato de soberania da República Federativa do Brasil, na figura do seu chefe
supremo, a quem cabe privativamente a função de representação externa do país (Rcl 11.243/DF).
- O fato de o estrangeiro possuir família brasileira (esposa/companheira e/ou filhos) que vive sob
sua dependência econômica e que esteja sob sua guarda (no caso de filho) impede a expulsão do
estrangeiro (art. 75 da Lei n.º 6.815/80), mas não a sua extradição. Nesse sentido, conferir a seguinte
decisão: ―A família é a base da sociedade e tem especial proteção do Estado. O impetrante é casado com
brasileira e tem filho brasileiro, que vivem sob sua dependência econômica. Expulsá-lo seria destruir sua
família e desamparar mulher e filho brasileiros‖ (STJ, MS 3.399/DF). Vide ainda enunciado n.º 421 da
Súmula do STF: ―Não impede a extradição a circunstância de ser o extraditando casado com brasileira ou
ter filho brasileiro‖.
- Constitucionalidade da especialização de varas judiciárias por resolução de tribunal e os
princípios da reserva legal (ou reserva da lei em sentido estrito) e princípio da legalidade (ou
reserva da norma): O STF decidiu que resolução de tribunal que disponha sobre a especialização de
varas e a redistribuição de processos judiciais não viola o princípio do juiz natural, considerando
que o tema da organização judiciária pode ser regulado por resolução de tribunal e que, no caso,
não foi criado um juízo de exceção, mas houve simples especialização de vara, visando a uma melhor
prestação da tutela jurisdicional (HC 88.660/CE). Em outro julgado, o STF afirmou que: ―Especializar
varas e atribuir competência por natureza de feitos não é matéria alcançada pela reserva da lei em
sentido estrito, porém apenas pelo princípio da legalidade afirmado no art. 5º, II, da CB, ou seja,
pela reserva da norma. No enunciado do preceito – ‗ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer
alguma coisa senão em virtude de lei‘– há visível distinção entre as seguintes situações: (i) vinculação às
definições da lei e (ii) vinculação às definições ‗decorrentes‘ – isto é, fixadas em virtude dela – de lei. No
primeiro caso estamos diante da „reserva da lei‟; no segundo, em face da „reserva da norma‟ (norma
que pode ser tanto legal quanto regulamentar ou regimental). Na segunda situação, ainda quando as
definições em pauta se operem em atos normativos não da espécie legislativa – mas decorrentes de
previsão implícita ou explícita em lei – o princípio estará sendo devidamente acatado. No caso concreto, o
princípio da legalidade expressa „reserva de lei em termos relativos‟ (= „reserva da norma‟) não
impede a atribuição, explícita ou implícita, ao Executivo e ao Judiciário, para, no exercício da função
normativa, definir obrigação de fazer ou não fazer que se imponha aos particulares – e os vincule. Se há
matérias que não podem ser reguladas senão pela lei (...) das excluídas a essa exigência podem tratar,
sobre elas dispondo, o Poder Executivo e o Judiciário, em regulamentos e regimentos. Quanto à definição
do que está incluído nas matérias de reserva de lei, há de ser colhida no texto constitucional; quanto a
essas matérias não cabem regulamentos e regimentos. [...] A legalidade da Resolução 20 do presidente do
TRF 4ª Região é evidente. Não há delegação de competência legislativa na hipótese e, pois,
inconstitucionalidade. Quando o Executivo e o Judiciário expedem atos normativos de caráter não
legislativo – regulamentos e regimentos, respectivamente –, não o fazem no exercício da função
legislativa, mas no desenvolvimento de ‗função normativa‘. O exercício da função regulamentar e da
função regimental não decorrem de delegação de função legislativa; não envolvem, portanto, derrogação
do princípio da divisão dos Poderes‖ (HC 85.060).
- O STF declarou a nulidade de norma de constituição estadual que previa a possibilidade de
reexame, pelo Tribunal de Contas estadual, das decisões fazendárias de última instância contrárias
ao erário, por entender que não cabe ao Poder Legislativo apreciar recursos interpostos contra decisões
tomadas pelo Executivo em processos administrativos nos quais se discuta questão tributária, sob pena de
violação ao art. 2º e ao art. 70 da CF/88 (ADI 523).
- ―Norma que subordina convênios, acordos, contratos e atos de Secretários de Estado à aprovação da
Assembleia Legislativa: inconstitucionalidade, porque ofensiva ao princípio da independência e harmonia
dos Poderes‖ (ADI 676).
- O STF declarou a inconstitucionalidade de norma de constituição estadual que possibilitava à
assembleia legislativa convocar o presidente do Tribunal de Justiça para prestar, pessoalmente,
informações sobre assunto previamente determinado, importando crime de responsabilidade a
ausência injustificada desse chefe de Poder. Entendeu-se que houve desrespeito ao princípio da
separação de Poderes, pois a constituição estadual não seguiu o paradigma da CF (art. 50), extrapolando
as fronteiras do esquema de freios e contrapesos – cuja aplicabilidade é sempre estrita ou materialmente
inelástica (ADI 2.911/ES).
- O STF decidiu que CPI estadual tem poderes para quebrar sigilo de dados bancários, pois, ainda
que omissa a Lei Complementar 105/01, tal poder encontra respaldo no parâmetro da CPI federal,
previsto no art. 58, § 3.º, da CF/88 (ACO 730).
- ―Embora resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo, a prerrogativa de formular e
executar políticas públicas, revela-se possível, no entanto, ao Poder Judiciário, determinar, ainda que em
bases excepcionais, especialmente nas hipóteses de políticas públicas definidas pela própria Constituição,
sejam estas implementadas pelos órgãos estatais inadimplentes, cuja omissão – por importar em
descumprimento dos encargos político-jurídicos que sobre eles incidem em caráter mandatório – mostra -
se apta a comprometer a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de estatura
constitucional‖ (RE 436.996‑AgR).
- ―Afronta os princípios constitucionais da harmonia e independência entre os Poderes e da
liberdade de locomoção norma estadual que exige prévia licença da Assembleia Legislativa para
que o governador e o vice-governador possam ausentar-se do País por qualquer prazo. Espécie de
autorização que, segundo o modelo federal, somente se justifica quando o afastamento exceder a quinze
dias. Aplicação do princípio da simetria‖ (ADI 738).
- ―Atuação do Judiciário como legislador positivo. Inadmissibilidade. Recurso improvido. (...) A
exigência constitucional de lei em sentido formal para a veiculação ordinária de isenções tributárias
impede que o Judiciário estenda semelhante benefício a quem, por razões impregnadas de
legitimidade jurídica, não foi contemplado com esse favor legis. A extensão dos benefícios
isencionais, por via jurisdicional, encontra limitação absoluta no dogma da separação de poderes.
Os magistrados e tribunais, que não dispõem de função legislativa – considerado o princípio da divisão
funcional do poder –, não podem conceder, ainda que sob fundamento de isonomia, isenção tributária em
favor daqueles a quem o legislador, com apoio em critérios impessoais, racionais e objetivos, não quis
contemplar com a vantagem desse benefício de ordem legal. Em tema de controle de constitucionalidade
de atos estatais, o Poder Judiciário só deve atuar como legislador negativo‖ (AI 360.461‑AgR).
- Impossibilidade de submissão da escolha de diretores de empresas estatais à prévia aprovação do
Poder Legislativo: ―Separação e independência dos poderes: submissão à Assembleia Legislativa, por lei
estadual, da escolha de diretores e membros do conselho de administração de autarquias, fundações
públicas e empresas estatais: jurisprudência do Supremo Tribunal. À vista da cláusula final de abertura do
art. 52, III, f, da Constituição Federal, consolidou-se a jurisprudência do STF no sentido da validade de
normas locais que subordinam a nomeação dos dirigentes de autarquias ou fundações públicas à prévia
aprovação da Assembleia Legislativa. Diversamente, contudo, atento ao art. 173 da Constituição,
propende o Tribunal a reputar ilegítima a mesma intervenção parlamentar no processo de
provimento da direção das entidades privadas, empresas públicas ou sociedades de economia mista da administração indireta dos Estados‖ (STF, ADI 2.225/SC-MC).
- ―Orientação assentada no STF no sentido de que, não sendo dado ao presidente da República retirar da
apreciação do Congresso Nacional medida provisória que tiver editado, é-lhe, no entanto, possível ab-
rogá-la por meio de nova medida provisória, valendo tal ato pela simples suspensão dos efeitos da
primeira, efeitos esses que, todavia, o Congresso poderá ver estabelecidos, mediante a rejeição da medida
ab-rogatória‖ (ADI 1.315‑MC).
- ―É plausível, em face do ordenamento constitucional brasileiro, o reconhecimento da
admissibilidade das leis interpretativas, que configuram instrumento juridicamente idôneo de
veiculação da denominada interpretação autêntica. As leis interpretativas – desde que reconhecida a
sua existência em nosso sistema de direito positivo – não traduzem usurpação das atribuições
institucionais do Judiciário e, em consequência, não ofendem o postulado fundamental da divisão
funcional do poder. Mesmo as leis interpretativas expõem -se ao exame e à interpretação dos juízes e
tribunais‖ (ADI 605‑MC).
- Infidelidade partidária e vacância de mandato: Considerando a essencialidade dos partidos políticos
no regime democrático, a importância do postulado da fidelidade partidária e as relações de recíproca
dependência entre o eleitor, o partido político e o representante eleito, o STF decidiu que a desfiliação
partidária sem justa causa resulta na perda do mandato político, seja dos cargos eleitos pelo
sistema majoritário (presidente da República, governadores, prefeitos e senadores), seja dos eleitos pelo
sistema proporcional (deputados federais, estaduais e vereadores). Entendeu-se não se tratar de
imposição, ao parlamentar infiel, de sanção de perda de mandato, por mudança de partido, a qual não
configuraria ato ilícito, não incidindo, por isso, o art. 55 da CF, mas de reconhecimento de inexistência de
direito subjetivo autônomo à manutenção pessoal do cargo, como efeito de seu ato de infidelidade
partidária, entendido como incompatível com a função representativa do ideário político em cujo nome o
parlamentar foi eleito. Nesse julgamento, o STF declarou a constitucionalidade, até que o Congresso
Nacional disponha sobre a matéria, da Resolução n.º 22.610/2007 do TSE (ADI 3.999/DF).
- O STF declarou a constitucionalidade do art. 1º da Lei Federal n.º 9.494/1997, por entender que as leis
restritivas ao poder geral de cautela do juiz, desde que fundadas no critério da razoabilidade, não
violam o princípio do livre acesso ao Judiciário (CF, art. 5º, XXXV) (ADC 4/DF).
- ―Conforme entendimento consolidado da Corte, os requisitos constitucionais legitimadores da edição de
medidas provisórias, vertidos nos conceitos jurídicos indeterminados de ‗relevância‘ e ‗urgência‘ (art. 62
da CF), apenas em caráter excepcional se submetem ao crivo do Poder Judiciário, por força da regra da
separação de poderes (art. 2.º da CF)‖ (ADC 11‑MC).
- Por afronta aos princípios da Federação e da separação dos Poderes, é inconstitucional lei de estado-
membro que estabelece vinculação automática de reajuste da remuneração dos servidores estaduais
a índices federais de atualização monetária (AO 366).
- O STF declarou a inconstitucionalidade de artigos de lei estadual que se originaram de emenda
parlamentar que aumentou a remuneração de servidores públicos e, consequentemente, a despesa
originalmente prevista em projeto de lei de iniciativa privativa do chefe do Executivo e de outros
artigos igualmente oriundos de emenda parlamentar, a qual dispôs sobre perdão a servidores por
falta ao trabalho (i.e., regime jurídico dos servidores). Entendeu o STF que foram violados os seguintes
artigos da CF/88: art. 2.º (separação de poderes), art. 61, § 1.º, II, ―a‖ (iniciativa legislativa privativa do
chefe do Executivo para as leis que disponham sobre regime jurídico dos servidores públicos) e art. 63, I
(vedação de emenda parlamentar que aumente despesa no projeto de lei de iniciativa privativa do chefe
do Executivo) (ADI 13/SC).
- Por violação ao princípio da separação dos Poderes, o STF declarou a inconstitucionalidade de lei
estadual que outorgava à assembleia legislativa o poder de destituição dos conselheiros de agência
reguladora autárquica, antes do final do período da sua nomeação a termo. Ora, a nomeação a termo
pressupõe um mandato com tempo pré-fixado, o que impede a demissão ―ad nutum‖ pelo Poder
Executivo e, pelas mesmas razões, não deve admitir uma destituição antecipada por decisão da
assembleia legislativa (ADI 1.949‑MC).
Art. 3.º da CF/88
- ―Em face da atual Constituição, para conciliar o fundamento da livre iniciativa e do princípio da livre
concorrência com os da defesa do consumidor e da redução das desigualdades sociais, em conformidade
com os ditames da justiça social, pode o Estado, por via legislativa, regular a política de preços de
bens e de serviços, abusivo que é o poder econômico que visa ao aumento arbitrário dos lucros‖ (ADI
319‑QO).
- ―IPI. Alíquota regionalizada incidente sobre o açúcar. Alegada ofensa ao disposto nos arts. 150, I, II
e § 3º, e 151, I, da CB. Constitucionalidade. O Decreto 420/1992 estabeleceu alíquotas diferenciadas
– incentivo fiscal – visando dar concreção ao preceito veiculado pelo art. 3.º da Constituição, ao
objetivo da redução das desigualdades regionais e de desenvolvimento nacional. Autoriza-o o art.
151, I, da Constituição. [...] A concessão do benefício da isenção fiscal é ato discricionário, fundado em
juízo de conveniência e oportunidade do Poder Público, cujo controle é vedado ao Judiciário‖ (AI
630.997‑AgR).
Art. 4.º da CF/88
- O STF decidiu que os atos delituosos caracterizados como terrorismo não se confundem com os crimes
políticos, cuja extradição é vedada pelo art. 5º, LI, da CF/88. Ponderou-se que a CF repudia o terrorismo,
tratando-o como um crime comum equiparável aos delitos hediondos, inafiançável e insuscetível de graça
ou anistia (art. 4º, VIII, e art. 5º, XLIII); enquanto dispensa tratamento benigno para os autores de crimes
políticos ou de opinião, os quais não serão extraditados pelo Estado brasileiro, uma vez acusados de
crimes que revelam meras perseguições políticas ou a rebelião legítima contra regimes autoritários e a
luta pelo restabelecimento de regimes políticos democráticos (Ext 855).
- Considerando que a divisão dos seres humanos em raças resulta de um processo de conteúdo meramente
político-social, o STF decidiu que se enquadra no crime de racismo, nos termos da Lei Federal n.º
7.716/89, quaisquer discriminações injustificadas com base em critérios de raça, cor, credo, descendência
ou origem nacional ou étnica, inspiradas na pretensa superioridade de um povo sobre outro, de que são
exemplos a xenofobia, negrofobia, islamafobia e o antissemitismo (HC 82.424/RS).
- ―Negativa, pelo presidente da República, de entrega do extraditando ao país requerente. (...) O Tratado
de Extradição entre a República Federativa do Brasil e a República Italiana, no seu art. III, 1, f, permite a
não entrega do cidadão da parte requerente quando ‗a parte requerida tiver razões ponderáveis para supor
que a pessoa reclamada será submetida a atos de perseguição‘. (...) Deveras, antes de deliberar sobre a
existência de poderes discricionários do presidente da República em matéria de extradição, ou mesmo se
essa autoridade se manteve nos lindes da decisão proferida pelo Colegiado anteriormente, é necessário
definir se o ato do chefe de Estado é sindicável pelo Judiciário, em abstrato. O art. 1º da Constituição
assenta como um dos fundamentos do Estado brasileiro a sua soberania – que significa o poder
político supremo dentro do território, e, no plano internacional, no tocante às relações da República
Federativa do Brasil com outros Estados soberanos, nos termos do art. 4º, I, da Carta Magna. A
soberania nacional no plano transnacional funda-se no princípio da independência nacional,
efetivada pelo presidente da República, consoante suas atribuições previstas no art. 84, VII e VIII,
da Lei Maior. A soberania, dicotomizada em interna e externa, tem na primeira a exteriorização da
vontade popular (art. 14 da CRFB) através dos representantes do povo no parlamento e no governo; na
segunda, a sua expressão no plano internacional, por meio do presidente da República. No campo da
soberania, relativamente à extradição, é assente que o ato de entrega do extraditando é exclusivo, da
competência indeclinável do presidente da República, conforme consagrado na Constituição, nas Leis,
nos Tratados e na própria decisão do Egrégio STF na Ext 1.085. O descumprimento do Tratado, em
tese, gera uma lide entre Estados soberanos, cuja resolução não compete ao STF, que não exerce
soberania internacional, máxime para impor a vontade da República italiana ao chefe de Estado
brasileiro, cogitando -se de mediação da Corte Internacional de Haia, nos termos do art. 92 da Carta das
Nações Unidas de 1945‖ (Rcl 11.243).
- Extradição e refúgio: O STF declarou a constitucionalidade do art. 33 da Lei 9.474/1997 (Estatuto do
Refugiado), pelo qual o reconhecimento da condição de refugiado obsta o seguimento do pedido de
extradição baseado nos fatos que fundamentaram a concessão de refúgio. Com base nesse
entendimento, o STF considera que o reconhecimento administrativo da condição de refugiado, enquanto
dure, impede o deferimento de extradição que possua pertinência temática com os motivos da concessão
do refúgio (Ext 1.008/Colômbia).
- Extradição e asilo político: Por outro lado (em nossa humilde opinião, uma decisão não harmônica com
os fundamentos morais e jurídicos expostos no julgado anterior), o STF entendeu que não há
incompatibilidade absoluta entre o instituto do asilo político e o da extradição passiva, na exata
medida em que o STF não está vinculado ao juízo formulado pelo Poder Executivo na concessão
administrativa desse benefício, razão pela qual a condição jurídica de asilado político não suprime, só
por si, a possibilidade de o Estado brasileiro conceder a extradição que lhe haja sido requerida. O
estrangeiro asilado no Brasil só não será passível de extradição quando o fato ensejador do pedido
assumir a qualificação de crime político ou de opinião (Ext 524/Paraguai).
- A norma de conteúdo meramente programático do art. 4.º, parágrafo único, da CF não tem o condão de
dispensar os mecanismos tradicionais de incorporação dos tratados internacionais ao Direito brasileiro (a
saber: decreto legislativo do Congresso Nacional e decreto do presidente da República), quanto aos
tratados de integração no âmbito do Mercosul (CR 8.279‑AgR).
Princípios fundamentais (arts. 1º a 4º da CF/88)
1. (CESPE.Analista.Infraestrutura.MPOG.2012) Por ser um país regido, em suas relações internacionais,
pelo princípio da concessão de asilo político, o Brasil é impedido de extraditar estrangeiros.
2. (CESPE.Analista. Infraestrutura.MPOG.2012) A Federação brasileira — formada, de acordo com o
disposto na CF, pela união indissolúvel da União, dos estados-membros, do Distrito Federal e dos
municípios — é um federalismo do tipo assimétrico, em razão da falta de homogeneidade entre os entes
federativos.
3. (CESPE.Diplomata.IRB.2012) No Brasil, a não intervenção e a não ingerência em assuntos internos de
outras nações estão incorporadas à CF como normas que impedem o país de, sem prévia declaração de
guerra, empregar suas Forças Armadas fora do território nacional.
4. (CESPE.Diplomata.IRB.2012) O compromisso da República Federativa do Brasil com a manutenção
da paz e com a não beligerância é enfatizado por referências textuais da Lei Maior à solução pacífica de
controvérsias na ordem internacional.
5. (CESPE.Analista.Adm.STJ.2012) A não intervenção, um dos fundamentos da República Federativa do
Brasil, expressa, assim como outros fundamentos, o poder supremo e independente do país.
6. (CESPE.Ténico.MPU.2010) A Constituição Federal de 1988 apresenta os chamados princípios
fundamentais da República Federativa do Brasil, que incluem referências a sua forma de Estado, forma de
governo e regime político. Deduz-se do texto constitucional que a República Federativa do Brasil é um
Estado de Direito, o que limita o próprio poder do Estado e garante os direitos fundamentais dos
particulares.
7. (CESPE.Analista Processual.MPU.2010) Como decorrência do princípio da simetria e do princípio da
separação dos poderes, as hipóteses de iniciativa reservada ao presidente da República, previstas na
Constituição Federal, não podem ser estendidas aos governadores.
8. (CESPE.Analista.MPU.2010) A dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos da República
Federativa do Brasil, apresenta-se como direito de proteção individual em relação ao Estado e aos demais
indivíduos e como dever fundamental de tratamento igualitário dos próprios semelhantes.
9. (CESPE.Analista de Infraestrutura.MPOG.2010) A dignidade da pessoa humana, os valores sociais do
trabalho e da livre iniciativa, bem como a construção de sociedade livre, justa e solidária, figuram entre os
fundamentos da República Federativa do Brasil.
10. (CESPE.Analista de Infraestrutura.MPOG.2010) Em suas relações internacionais, a República
federativa do Brasil rege-se, entre outros princípios, pelo da igualdade entre os estados, da não
intervenção e da vedação à concessão de asilo político.
11. (CESPE.Analista.SERPRO.2010) De acordo com a CF, a forma de governo republicana no Brasil é
considerada cláusula pétrea e não pode ser modificada por emenda constitucional.
12. (CESPE.Analista.INCA.2010) A livre iniciativa está entre os fundamentos da República Federativa
do Brasil inseridos na CF, o que denota a opção do constituinte originário por uma economia de mercado
capitalista.
13. (CESPE.Técnico.ANEEL.2010) Os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, a construção de
uma sociedade livre justa e solidária e a garantias do desenvolvimento nacional constituem fundamentos
da República Federativa do Brasil.
14. (CESPE.Analista.Adm.MP.PI.2011) O princípio federativo estabelece a forma de governo de um
Estado.
15. (CESPE.Analista.Adm.MP.PI.2011) A democracia representativa é exercida pelo povo, individual ou
coletivamente, a partir dos instrumentos constitucionais que possibilitam interferir diretamente nas
decisões políticas do Estado.
16. (CESPE.Analista Judiciário.Área Administrativa.TRE/ES.2011) Constituem fundamentos da
República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana, a independência nacional e a igualdade
entre as nações.
17. (CESPE.Analista Judiciário.Área Judiciária.STM.2011) No exercício de sua autonomia política, os
estados podem adotar o regime parlamentar de governo.
18. (CESPE - 2011 - PC-ES - Perito Criminal) Não viola o princípio constitucional da separação dos
poderes a apreciação, pelo Poder Judiciário, do ato administrativo discricionário tido por ilegal e abusivo.
19. (CESPE.Assistente em Administração.MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO/FUB.2011) Os objetivos
fundamentais da República brasileira incluem a garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da
pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades sociais e regionais e a promoção do bem de
todos, sem quaisquer preconceitos ou outras formas de discriminação.
20. (CESPE.Assistente em Administração.MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO/FUB.2011) O Brasil, como
signatário de tratados e convenções internacionais, repudia a igualdade entre os Estados, já que os países
menos desenvolvidos recebem ajuda financeira e humanitária dos países mais ricos como forma de
cooperação entre os povos para o progresso da humanidade.
21. (CESPE.Auxiliar de Pericia Médico-Legal.PC/ES.2011) Os objetivos da República Federativa do
Brasil incluem a erradicação da pobreza, a independência nacional e os valores sociais do trabalho.
22. (CESPE.Auxiliar de Pericia Médico-Legal.PC/ES.2011) A República Federativa do Brasil, formada
pela união indissolúvel dos estados, dos municípios e do Distrito Federal, constitui Estado democrático de
direito e tem por fundamentos, entre outros, a soberania, o pluralismo político, a prevalência dos direitos
humanos e a construção de uma sociedade livre, justa e solidária.
23. (CESPE - 2011 - TJ-ES - Analista Judiciário - Área Administrativa) O princípio da dignidade da
pessoa humana possui um caráter absoluto, sendo um princípio primordial presente na Constituição
Federal de 1988.
24. (CESPE - 2011 - STM - Analista Judiciário - Análise de Sistemas) No âmbito das relações
internacionais, a República Federativa do Brasil adotou expressamente como princípio o repúdio ao
terrorismo e ao racismo.
25. (CESPE - 2011 - STM - Analista Judiciário - Análise de Sistemas) Os fundamentos da República
Federativa do Brasil incluem o pluralismo político e a cidadania.
26. (CESPE - 2011 - IFB - Professor – Direito) A execução de determinação judicial, proferida nos autos
de ação de investigação de paternidade, com o objetivo de conduzir coercitivamente o réu ao laboratório
para coleta do material indispensável à feitura do exame DNA não viola o princípio da dignidade humana.
27. (CESPE - 2011 - IFB - Professor – Direito) A utilização de idioma estrangeiro em atos processuais no
país não ofende a soberania como fundamento da República Federativa do Brasil.
28. (CESPE - 2011 - PC-ES - Perito Papiloscópico) O dever que possuem os governantes de prestar
contas de suas gestões decorre do princípio federativo.
Gabarito: 1 – E; 2 – C; 3 – E; 4 – C; 5 – E; 6 – C; 7 – E; 8 – C; 9 – E; 10 – E; 11 – E; 12 – C; 13 – E; 14
– E; 15 – E; 16 – E; 17 – E; 18 – C; 19 – C; 20 – E; 21 – E; 22 – E; 23 – E; 24 – C; 25 – C; 26 – E; 27 –
E; 28 – E.
Considerações doutrinárias sobre aplicabilidade das normas constitucionais
As normas jurídicas possuem duas espécies de eficácia: a eficácia social ou
efetividade, relacionada com a real observância da norma no meio social, e a eficácia jurídica,
que diz respeito à aplicabilidade e exigibilidade da norma, i.e., sua capacidade para produzir os
efeitos próprios das normas jurídicas.
Todas as normas constitucionais possuem eficácia jurídica, i.e., são aptas a produzir
os efeitos próprios das normas jurídicas. Já em relação à eficácia social, José Afonso da Silva
classifica as normas constitucionais em normas de eficácia plena, normas de eficácia contida e
normas de eficácia limitada. Vejamos cada uma delas:
a) Normas constitucionais de eficácia plena – são aquelas que, desde a entrada em
vigor da Constituição, produzem ou têm possibilidade de produzir todos os efeitos essenciais,
relativamente aos interesses que o legislador constituinte quis regular, porquanto já dotadas de
normatividade suficiente. Possuem aplicabilidade imediata, direta e integral e eficácia social
plena. São exemplos: arts. 1.º, 4.º, 5.º, caput, IV, XXXV e XXXVI, 15, 17, §4.º, 21, 30, 44, 69,
76, 145, 153 e 230, §2.º, todos da CF/88.
b) Normas constitucionais de eficácia contida (redutível ou restringível) – são
normas igualmente dotadas de força normativa suficiente para produzir todos os seus efeitos
essenciais.
Porém, diferentemente das normas de eficácia plena, o próprio texto da norma de
eficácia contida deixa margem a que sua incidência venha a ser restringida posteriormente, nos
termos em que o legislador infraconstitucional estabelecer ou diante de conceitos gerais nela
enunciados. A restrição dessas normas ainda pode ocorrer por força de outras normas
constitucionais.
Portanto, na lição de J. Afonso da Silva, a norma de eficácia contida pode ser
restringida:
a) por ―conceitos gerais e abstratos‖ nela enunciados (denominados de conceitos ético-
jurídicos), tais como: ordem pública, segurança nacional, bons costumes, necessidade ou
utilidade pública, etc., resultando em limitação da eficácia do seu conteúdo quando de sua
aplicação no caso concreto (ex.: CF, art. 136, art. 34, I, e art. 144);
b) por obra do legislador infraconstitucional (ex.: CF, art. 5.º, VIII e XIII, e art. 37, I);
c) por obra de outras normas constitucionais (ex.: o direito de reunião e o sigilo de
correspondência podem ser restringidos em caso de decretação de estado de defesa – CF, art.
136, § 1.º, III; assim como o art. 5.º, XXII, restringido pelos incisos XXIII a XXV do art. 5.º).
As normas constitucionais de eficácia contida possuem aplicabilidade imediata e
direta, mas possivelmente não integral; e eficácia social contida ou redutível.
c) Normas constitucionais de eficácia limitada – são aquelas que apresentam
aplicabilidade mediata ou indireta (também chamada de reduzida ou diferida), porque
somente incidem totalmente sobre os interesses que regulam após uma legislação ulterior que
lhes desenvolva a aplicabilidade. Temos como exemplos o art. 7.º, incisos XX e XXVII, art.
192, art. 215, art. 218, todos da CF/88.
Para José Afonso da Silva, as normas de eficácia limitada subdividem-se em normas
constitucionais de princípio institutivo e normas constitucionais de princípio programático.
Normas constitucionais de princípio institutivo são aquelas que traçam esquemas gerais
de estruturação e atribuições de órgãos, entidades ou institutos, para que o legislador ordinário
os estruture em definitivo, mediante lei. De acordo com José Afonso, as normas de princípio
institutivo podem facultar a elaboração de uma legislação integrativa (facultativas ou
permissivas – ex.: arts. 22, § único, 125, §3.º, 125,§ 6.º) ou obrigar o legislador à emissão
dessa legislação (impositivas ou peremptórias – exs.: arts. 20, §2.º, 33, 88, art. 109, VI, e 121).
Por sua vez, as normas constitucionais de princípio programático ou, simplesmente,
normas programáticas explicitam verdadeiros ―comandos-valores‖, programas de atuação
futura, fins a serem perseguidos pelo Estado. Exs.: arts. 3.º, 7.º, XI, XX, XXVII, 173, § 4.º, 216,
§3.º, 184, 193, 215, 217, 218, todos da CF/88. Os direitos sociais, em regra, vêm previstos na
forma de ―normas programáticas‖.
Essas normas costumam ser muito cobradas em concursos públicos, em razão da nossa
CF/88 ser uma ―constituição-dirigente‖, repleta de normas-programa. Essas normas
caracterizam-se por prescrever finalidades, programas de governo para o Estado (ex: promover
o desenvolvimento científico, dar saúde, educação, direitos culturais, etc.), sem especificar os
meios de sua realização. Apesar de uma parcela da doutrina negar a força jurídica dessas
normas, a doutrina majoritária (seguida pela jurisprudência do STF – RE 271286 AgR/RS) já
pacificou que as normas programáticas obrigam todos os poderes públicos, condicionando a
atividade do Executivo, do Legislativo e do Judiciário às finalidades nelas contidas.
Para dar efetividade às normas constitucionais limitadas, carentes de complementação
legislativa, a CF/88 previu os institutos da ADI por omissão e do mandado de injunção, a serem
estudados em momento oportuno.
Embora menos cobrada em concursos, destacamos a classificação de normas
constitucionais quanto à sua eficácia social da professora Maria Helena Diniz:
1) normas supereficazes ou com eficácia absoluta (caracterizadas pela intangibilidade,
não podendo o poder constituinte derivado restringi-las indevidamente – são as cláusulas
pétreas previstas no art. 60, § 4.º, da CF);
2) normas com eficácia plena (equivalem às normas de eficácia plena da classificação
proposta por José Afonso da Silva);
3) normas com eficácia relativa restringível (correspondem às normas de eficácia
contida);
4) normas com eficácia relativa complementável ou dependente de complementação
legislativa (correspondem às normas de eficácia limitada).
Aplicabilidade das normas constitucionais
1. (VUNESP.Proc. Munic.São Carlos.SP.09) Sobre a eficácia das normas constitucionais, assinale a
alternativa incorreta.
(A) A entrada em vigor de uma norma constitucional programática implica a proibição de que sejam
produzidas normas ulteriores que contrariem o programa por ela estabelecido.
(B) As normas de eficácia contida são de aplicabilidade indireta e mediata, já que o direito nelas previsto
é imediatamente exercitável, desde a promulgação da Constituição.
(C) As normas definidoras de princípio institutivo são as que traçam esquemas gerais de estruturação e
atribuições de órgãos, entidades ou institutos.
(D) As normas constitucionais de princípio programático são as que traçam princípios a serem cumpridos
pelos órgãos do Estado.
(E) A entrada em vigor de uma norma constitucional programática implica a revogação de todas as
disposições em sentido contrário aos seus comandos.
2. (CESPE.Técnico.MPU.2010) As normas de eficácia plena não exigem a elaboração de novas normas
legislativas que lhes completem o alcance e o sentido ou lhes fixem o conteúdo; por isso, sua
aplicabilidade é direta, ainda que não integral.
3. (CESPE.Analista Processual.MPU.2010) As normas de eficácia contida permanecem inaplicáveis
enquanto não advier normatividade para viabilizar o exercício do direito ou benefício que consagram; por
isso, são normas de aplicação indireta, mediata ou diferida.
4. (CESPE.Analista Processual.MPU.2010) As normas constitucionais de eficácia limitada são
desprovidas de normatividade, razão pela qual não surtem efeitos nem podem servir de parâmetro para a
declaração de inconstitucionalidade.
5. (CESPE.Analista.MPU.2010) O livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, desde que
atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer, é norma constitucional de eficácia contida;
portanto, o legislador ordinário atua para tornar exercitável o direito nela previsto.
6. (CESPE.Analista de Infraestrutura.MPOG.2010) O dispositivo constitucional que estabelece ser livre o
exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais instituídas em
lei, constitui exemplo de norma de eficácia limitada.
7. (CESPE.Analista de Infraestrutura.MPOG.2010) Constitui exemplo de norma de eficácia plena o
preceito constitucional que garante aos maiores de 65 anos de idade a gratuidade dos transportes coletivos
urbanos.
8. (CESPE.Procurador.AGU.2010) De acordo com entendimento do STF, configura exemplo de norma
constitucional programática o preceito constitucional segundo o qual a política agrícola deve ser
planejada e executada na forma da lei, com a participação efetiva do setor de produção, envolvendo tanto
produtores e trabalhadores rurais, como setores de comercialização, de armazenamento e de transportes.
9. (CESPE.Analista.INCA.2010) O Ato das Disposições Constitucionais Transitórias não possui a mesma
natureza jurídica das normas constitucionais inseridas na Constituição Federal de 1988 (CF), razão pela
qual é de hierarquia inferior a estas.
10. (CESPE.Analista.Judiciário.TRE.BA.2010) No tocante à aplicabilidade, de acordo com a tradicional
classificação das normas constitucionais, são de eficácia limitada aquelas em que o legislador constituinte
regula suficientemente os interesses concernentes a determinada matéria, mas deixa margem à atuação
restritiva por parte da competência discricionária do poder público, nos termos em que a lei estabelecer ou
na forma dos conceitos gerais nela previstos.
11. (CESPE Analista Téc-Adm MS 2010) Para que se possa identificar uma norma constitucional de
eficácia limitada, é suficiente observar a expressão ―nos termos da lei‖, prevista no texto constitucional.
12. (CESPE Analista Téc-Adm MS 2010) A distinção hierárquica entre normas constitucionais é
inadmissível perante a Constituição.
13. (CESPE.Defensor Público.DPU.2010) Os direitos sociais previstos na Constituição, por estarem
submetidos ao princípio da reserva do possível, não podem ser caracterizados como verdadeiros direitos
subjetivos, mas, sim, como normas programáticas. Dessa forma, esses direitos devem ser tutelados pelo
poder público, quando este, em sua análise discricionária, julgar favoráveis as condições econômicas e
administrativas.
14. (CESPE.Analista.INCA.2010) Normas constitucionais de aplicabilidade reduzida ou de eficácia
limitada são aquelas normas que necessitam da promulgação de uma lei infraconstitucional para produzir
os seus efeitos, podendo ser classificadas em normas constitucionais de princípio institutivo e normas
constitucionais de princípio programático.
15. (VUNESP.Advogado.CRM/SP.2011) Analise as seguintes disposições da Constituição Federal:
I. São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
II. É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais
que a lei estabelecer.
III. O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação
tecnológicas.
IV. Conceder-se-á habeas-corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou
coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.
Considerando a doutrina clássica brasileira sobre a eficácia e aplicabilidade das normas constitucionais,
pode-se afirmar que as disposições acima reproduzidas são classificadas, respectivamente, como normas
de eficácia
(A) contida, plena, programática e plena.
(B) plena, limitada, plena e contida.
(C) limitada, plena, plena e contida.
(D) plena, plena, contida e programática.
(E) plena, contida, limitada e plena.
16. (CESPE - 2011 - EBC - Analista – Advocacia) As normas previstas no Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias possuem natureza de norma constitucional.
17. (CESPE - 2011 - EBC - Analista – Advocacia) O preâmbulo da Constituição Federal não faz parte do
texto constitucional propriamente dito e não possui valor normativo.
18. (CESPE - 2011 - ECB – Analista – Advocacia) Constitui exemplo de norma programática o
dispositivo segundo o qual o Estado deve garantir a todos pleno exercício dos direitos culturais e acesso
às fontes da cultura nacional, além de apoio e incentivo a iniciativas de valorização e difusão das
manifestações culturais.
19. (CESPE - 2011 - IFB - Professor – Direito) Entre as normas constitucionais de eficácia exaurida,
incluem- se dispositivos constantes das disposições constitucionais transitórias.
20. (CESPE - 2011 - IFB - Professor – Direito) As normas constitucionais de eficácia plena podem, em
regra geral, ser revistas pelo poder reformador.
21. (CESPE - 2011 - IFB - Professor – Direito) Enquanto, nas normas de eficácia contida, as leis podem
restringir-lhes o alcance, nas normas de eficácia limitada, o seu alcance poderá ser ampliado.
22. (CESPE - 2011 - STM - Analista Judiciário - Execução de Mandados) Consideram-se normas de
eficácia absoluta os preceitos constitucionais intangíveis, que são inalteráveis mesmo por meio de
propostas de emendas constitucionais.
23. (Cespe.Juiz.TJ.PB.2010) Acerca dos princípios constitucionais e da classificação e interpretação das
normas constitucionais, assinale a opção correta.
A É prevalecente, na doutrina constitucional brasileira, o entendimento de que as normas que consagram
as cláusulas pétreas estão em nível hierárquico superior às demais normas constitucionais.
B Entre as modalidades de eficácia dos princípios constitucionais inclui-se a eficácia negativa, que
implica a paralisação de qualquer norma ou ato jurídico que contrarie um princípio.
C No que concerne à forma de aplicação, os princípios operam por via do enquadramento do fato no
relato normativo, ainda que, tanto quanto as regras, eles comportem a subsunção.
D As normas constitucionais programáticas cingem-se a estipular princípios ou programas que devem ser
perseguidos pelos poderes públicos, não possuindo eficácia vinculante nem sendo capazes de gerar
direitos subjetivos na sua versão positiva ou negativa, embora impeçam a produção de normas que
contrariem o direito nelas inserido.
E As normas institutivas, que traçam esquemas gerais de organização e estruturação de órgãos, entidades
ou instituições do Estado, são dotadas de eficácia plena e aplicabilidade imediata, visto que possuem
todos os elementos necessários à sua executoriedade direta e integral.
24. (CESPE.Juiz.TJ.ES.2011) Acerca da aplicabilidade das normas constitucionais, assinale a opção
correta.
A O dispositivo constitucional que estabelece que lei federal disporá sobre a utilização, pelo governo do
DF, das polícias civil e militar e do corpo de bombeiros militar constitui exemplo de norma de eficácia
limitada.
B Inexiste hierarquia entre normas constitucionais, salvo no que diz respeito às cláusulas pétreas e aos
direitos fundamentais, que representam o núcleo essencial da CF e envolvem diretamente a noção de
dignidade da pessoa humana.
C As normas constitucionais de eficácia contida são de aplicabilidade indireta, mediata e reduzida,
havendo necessidade de lei integrativa infraconstitucional para produzir todos os seus efeitos.
D As normas de eficácia limitada são desprovidas de normatividade, incapazes de produzir quaisquer
efeitos e de servir de parâmetro para a declaração de inconstitucionalidade.
25. (CESPE.Analista.Adm.MP.PI.2011) O dispositivo constitucional que afirma que ―ninguém será
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei‖ é uma norma constitucional de
eficácia contida.
26. (CESPE.Analista.Adm.MP.PI.2011) A gratuidade dos transportes coletivos urbanos aos maiores de
sessenta e cinco anos é uma norma constitucional de eficácia plena e aplicabilidade imediata.
27. (CESPE.Analista.Adm.MP.PI.2011) O texto constitucional contempla norma de eficácia plena que
garante ao servidor público civil e militar o direito à livre associação sindical.
28. (CESPE.Defensor.DPE.Maranhão.2012) O parágrafo único do art. 170 da CF, que assegura a todos o
livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos,
salvo nos casos previstos em lei, traduz norma de eficácia
A contida.
B limitada.
C reduzida.
D plena.
E programática.
Gabarito: 1 – B; 2 – E; 3 – E; 4 – E; 5 – E; 6 – E; 7 – C; 8 – C; 9 – E; 10 – E; 11 – E; 12 – C; 13 – E; 14
– C; 15 –E; 16 – C; 17 – C; 18 – C; 19 – C; 20 – C; 21 – C; 22 – C;.23 – B; 24 – A; 25 – E; 26 – C; 27 –
E; 28 – A.