Direito de Família no Código Civil de 2002

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1 PROF A JULIANA GONTIJO Rua Guajajaras, n. 1944, Barro Preto, CEP 30180-101 – Belo Horizonte – MG - Tel. (31) 2112.4114 - Fax 2112.4108 site: www.direitodefamilia.adv.br – e-mail: [email protected][email protected] DIREITO DE FAMÍLIA NO CÓDIGO CIVIL DE 10/1/02 JULIANA GONTIJO - advogada, professora, mestre em Direito Civil pela UFMG. I. CONSIDERAÇÕES GENÉRICAS 1) DO HISTÓRICO DA LEI N. 10.406, DE 10/1/02, QUE INSTITUIU O CÓDIGO CIVIL A proposta de elaboração de um Código Civil brasileiro para substituir o de 1916, data do final da década de 50, após o que se sucederam várias comissões de notáveis para a sua redação. Já em 1963, um projeto sob a responsabilidade de CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA e OROZIMBO NONATO, foi entregue ao então Ministro da Justiça, MILTON CAMPOS. Em 1969, formou-se uma nova comissão, então coordenada por MIGUEL REALE, e que, somente em 1975, apresentou o projeto primevo de que se originou o texto que após várias emendas e modificações resultou no Código sancionado em 10/1/02. Quando da elaboração do texto pelo Poder Executivo, coube a MIGUEL REALE coordenar a respectiva comissão composta por JOSÉ CARLOS MOREIRA ALVES, AGOSTINHO DE ARRUDA ALVIM, SYLVIO MARCONDES, EBERT CHAMOUN, CLÓVIS DO COUTO E SILVA, E TORCQUATO CASTRO. O trabalho consistiu em condensar tanto o projeto de Código Civil de ORLANDO GOMES e com o Código das Obrigações de autoria de CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, ambos ultimados em 1963. O esboço da Comissão coordenada por MIGUEL REALE oficializou-se como o Projeto de Lei n. 634/75, afinal aprovado na Câmara dos Deputados e enviado ao Senado em 1984, onde recebeu 360 emendas. Em 1991 foi provisoriamente arquivado. Em 1995, o senador JOSAPHAT MARINHO provocou sua reativação e em 1997 ganhou novo impulso. Mas somente no início do ano 2000, designado como seu Relator o Dep. RICARDO FIÚZA esse dinamizou sua apreciação e suscitou sugestões da sociedade, reunindo vários juristas e escutando entidades de classes. No Senado, ao texto original do Projeto de Lei n. 634/75, foram apresentadas 366 emendas de senadores e mais 128 de iniciativa do relator-geral, Senador JOSAPHAT MARINHO, das quais muitas foram aprovadas no todo ou em parte. Tantas emendas aprovadas pelo Senado modificando o Projeto, obrigou sua reapreciação pela Câmara dos Deputados. O seu relator nesta Casa, Dep. RICARDO FIUZA, enfatiza as dificuldades da missão e enaltece o papel e o apoio do Dep. JOÃO CASTELO, Presidente da Comissão especial destinada para apreciar e proferir parecer sobre as emendas do Senado Federal. Diante de algumas inadequações, até inconstitucionais, os dois Deputados mencionados, conseguiram contornar os óbices legislativos e aprovar a resolução n. 1/2000 que alterou o regimento comum do Congresso Nacional para superar os entraves regimentais para atualização daquele antigo Projeto de CC. Nesta Comissão especial os trabalhos para sugerir as adequações de atualização foram divididos entre vários sub-relatores. O Livro IV relativo ao Direito de Família, coube ao Dep. ANTÔNIO CARLOS BISCAIA e o Livro V, do Direito das Sucessões, ao Dep. SYNVAL GUAZZELLI. O relator, Dep. RICARDO FIÚZA, com a ajuda daqueles sub-relatores e inúmeros outros juristas 1 , ofereceu um parecer preliminar, que foi submetido à Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Este parecer é o embrião do novo Código Civil. O Direito de Família certamente foi o responsável pelo maior número de emendas e das últimas alterações sofridas naquele Projeto que começou a ter suas diretrizes definidas em 1969, e o primeiro texto apresentado em 1975. De lá para cá foram tantas as alterações sociais sofridas, com várias leis introduzidas principalmente como reflexo da Constituição Federal de 1988, que o Direito de Família exigiu completa revisão para tornar viável fosse levado avante o Projeto 634/75. Afinal, o Projeto de Lei n. 634, que institui o novo Código Civil, foi enviado à Câmara dos Deputados pelo Poder Executivo em 1975 pelo Presidente ERNESTO GEISEL, após ter as últimas alterações aprovadas em 6/11/01, foi sancionado pelo Presidente da República, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO,

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1 PROFA JJUULL IIAANNAA GGOONNTT II JJOO

Rua Guajajaras, n. 1944, Barro Preto, CEP 30180-101 – Belo Horizonte – MG - Tel. (31) 2112.4114 - Fax 2112.4108 site: www.direitodefamilia.adv.br – e-mail: [email protected][email protected]

DIREITO DE FAMÍLIA NO CÓDIGO CIVIL DE 10/1/02

JULIANA GONTIJO - advogada, professora, mestre em Direito Civil pela UFMG.

I. CONSIDERAÇÕES GENÉRICAS

1) DO HISTÓRICO DA LEI N. 10.406, DE 10/1/02, QUE INSTITUIU O CÓDIGO CIVIL

A proposta de elaboração de um Código Civil brasileiro para substituir o de 1916, data do final da década de 50, após o que se sucederam várias comissões de notáveis para a sua redação. Já em 1963, um projeto sob a responsabilidade de CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA e OROZIMBO NONATO, foi entregue ao então Ministro da Justiça, MILTON CAMPOS. Em 1969, formou-se uma nova comissão, então coordenada por MIGUEL REALE, e que, somente em 1975, apresentou o projeto primevo de que se originou o texto que após várias emendas e modificações resultou no Código sancionado em 10/1/02.

Quando da elaboração do texto pelo Poder Executivo, coube a MIGUEL REALE coordenar a respectiva comissão composta por JOSÉ CARLOS MOREIRA ALVES, AGOSTINHO DE ARRUDA ALVIM, SYLVIO MARCONDES, EBERT CHAMOUN, CLÓVIS DO COUTO E SILVA, E TORCQUATO CASTRO. O trabalho consistiu em condensar tanto o projeto de Código Civil de ORLANDO GOMES e com o Código das Obrigações de autoria de CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, ambos ultimados em 1963.

O esboço da Comissão coordenada por MIGUEL REALE oficializou-se como o Projeto de Lei n. 634/75, afinal aprovado na Câmara dos Deputados e enviado ao Senado em 1984, onde recebeu 360 emendas. Em 1991 foi provisoriamente arquivado. Em 1995, o senador JOSAPHAT MARINHO provocou sua reativação e em 1997 ganhou novo impulso. Mas somente no início do ano 2000, designado como seu Relator o Dep. RICARDO FIÚZA esse dinamizou sua apreciação e suscitou sugestões da sociedade, reunindo vários juristas e escutando entidades de classes.

No Senado, ao texto original do Projeto de Lei n. 634/75, foram apresentadas 366 emendas de senadores e mais 128 de iniciativa do relator-geral, Senador JOSAPHAT MARINHO, das quais muitas foram aprovadas no todo ou em parte. Tantas emendas aprovadas pelo Senado modificando o Projeto, obrigou sua reapreciação pela Câmara dos Deputados. O seu relator nesta Casa, Dep. RICARDO FIUZA, enfatiza as dificuldades da missão e enaltece o papel e o apoio do Dep. JOÃO CASTELO, Presidente da Comissão especial destinada para apreciar e proferir parecer sobre as emendas do Senado Federal. Diante de algumas inadequações, até inconstitucionais, os dois Deputados mencionados, conseguiram contornar os óbices legislativos e aprovar a resolução n. 1/2000 que alterou o regimento comum do Congresso Nacional para superar os entraves regimentais para atualização daquele antigo Projeto de CC.

Nesta Comissão especial os trabalhos para sugerir as adequações de atualização foram divididos entre vários sub-relatores. O Livro IV relativo ao Direito de Família, coube ao Dep. ANTÔNIO CARLOS BISCAIA e o Livro V, do Direito das Sucessões, ao Dep. SYNVAL GUAZZELLI. O relator, Dep. RICARDO FIÚZA, com a ajuda daqueles sub-relatores e inúmeros outros juristas1, ofereceu um parecer preliminar, que foi submetido à Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Este parecer é o embrião do novo Código Civil.

O Direito de Família certamente foi o responsável pelo maior número de emendas e das últimas alterações sofridas naquele Projeto que começou a ter suas diretrizes definidas em 1969, e o primeiro texto apresentado em 1975. De lá para cá foram tantas as alterações sociais sofridas, com várias leis introduzidas principalmente como reflexo da Constituição Federal de 1988, que o Direito de Família exigiu completa revisão para tornar viável fosse levado avante o Projeto 634/75.

Afinal, o Projeto de Lei n. 634, que institui o novo Código Civil, foi enviado à Câmara dos Deputados pelo Poder Executivo em 1975 pelo Presidente ERNESTO GEISEL, após ter as últimas alterações aprovadas em 6/11/01, foi sancionado pelo Presidente da República, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO,

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no dia 10 de janeiro de 2002, instituindo a vacatio legis de um ano, pelo que, sua vigência tem início em 11/1/03.

A Lei 1.046/02 é composta de 2.046 artigos, enquanto a Lei 3.071 (CC/16) continha 1.807 dispositivos.

O Código Civil/02 foi dividido da seguinte forma: Parte Geral composta de três Livros: o Livro I - Das Pessoas (arts. 1º a 78); o Livro II - Dos Bens

(arts. 79 a 103); o Livro III - Dos Fatos Jurídicos (arts. 104 a 232). Parte Especial contém outros cinco Livros, a saber: Livro I - Do direito das Obrigações (arts. 233

a 965); Livro II - Do Direito de Empresa (arts. 966 a 1.195); Livro III - Do Direito das Coisas (arts. 1.196 a 1.510); Livro IV - Do Direito de Família (arts. 1.511 a 1.783); e, Livro V - Do Direito das Sucessões (arts. 1.784 a 2.027).

• Livro Complementar que trata "das disposições finais e transitórias" abrangendo os arts. 2.028 a 2.046.

CARLOS ROBERTO GONÇALVES2 explica que, no limiar deste novo século, o Congresso

Nacional aprovou o novo Código Civil brasileiro que unificou, parcialmente, o direito privado, trazendo para o bojo do Código Civil a matéria constante da primeira parte do Código Comercial. [...] O novo Código manteve a estrutura do Código Civil de 1916, unificando as obrigações civis e mercantis. Procurou atualizar a técnica deste último, que em muitos pontos foi superado pelos progressos da Ciência Jurídica, bem como se afastar das concepções individualistas que nortearam esse diploma para seguir orientação compatível com a socialização do direito contemporâneo. Contudo, a demorada tramitação legislativa fez com que fosse atropelado por leis especiais modernas e pela própria Constituição Federal, especialmente no âmbito do direito de família, já estando a merecer, por isso, uma reestruturação.”

Por reconhecer a necessidade de aprimoramento de algumas normas, estão em andamento dois Projetos de Lei de autoria do próprio Dep. RICARDO FIUZA, de nos 6960/02 e 7160/02, o primeiro contendo proposta de alteração de redação de 188 artigos do novo CC (cinqüenta referentes ao Direito de Família e vinte ao Direito das Sucessões) e o segundo de outros 88 dispositivos da Lei 1.046/02 (praticamente todos relativos ao Direito de Empresa).

2) DAS EXPLICAÇÕES TÉCNICAS, DIRETRIZES E CARACTERÍSTICAS BÁSICAS DO CC/02

Segundo informações do renomado jurista MIGUEL REALE3 “foi criada, em 1969, uma Comissão Revisora e Elaboradora do Código Civil, na esperança de ser aproveitada a maior parte do Código Civil de 1916. Todavia, verificou-se logo a inviabilidade desse desideratum, não podendo deixar de prevalecer a reelaboração, uma vez que a experiência, ou seja, a análise progressiva da matéria veio revelando que novos princípios ou diretrizes deveriam nortear a codificação. Por outro lado, em se tratando de um trabalho sistemático, a alteração feita em um artigo ou capítulo repercute necessariamente em outros pontos do projeto.

Daí ficarem assentes estas diretrizes: a) Preservação do código vigente sempre que possível, não só pelos seus méritos intrínsecos, mas

também pelo acervo de doutrina e de jurisprudência que em razão dele se constituiu. b) Impossibilidade de nos atermos à mera revisão do Código Bevilaqua, dada a sua falta de

correlação com a sociedade contemporânea e as mais significativas conquistas da ciência do Direito;

c) Alteração geral do código atual no que se refere a certos valores considerados essenciais, tais como o de eticidade, de sociabilidade e de operabilidade;

d) Aproveitamento dos trabalhos de reforma da Lei Civil, nas duas meritórias tentativas feitas, anteriormente, por ilustres jurisconsultos, primeiro por HAHNEMAN GUIMARÃES, OROZIMBO NONATO e PHILADELPHO DE AZEVEDO, com o anteprojeto do Código das Obrigações; e, depois, por ORLANDO GOMES e CAIO MÁRIO DA SILVA Pereira, com a proposta de elaboração separada de um Código Civil e de um Código das Obrigações, contando com a colaboração, neste caso, de SILVIO MARCONDES, THEÓPHILO DE AZEVEDO SANTOS e NEHEMIAS GUEIROS.

e) Firmar a orientação de somente inserir no código matéria já consolidada ou com relevante grau de experiência crítica, transferindo-se para a legislação especial aditiva o regramento de questões ainda em processo de estudo, ou, que, por sua natureza complexa, envolvem problemas e soluções que extrapolam do Código Civil;

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f) Dar nova estrutura ao código, mantendo-se a parte geral - conquista preciosa do Direito brasileiro, desde Teixeira de Freitas - mas com nova ordenação da matéria, a exemplo das mais recentes codificações;

g) Não realizar, propriamente, a unificação do Direito privado, mas sim do Direito das obrigações - de resto já uma realidade operacional no País - em virtude do obsoletismo do Código Comercial de 1850 - com a conseqüente inclusão de mais um livro na parte especial, que, de início, se denominou Atividades Negociais, e, posteriormente, Direito de Empresa.”

Os três princípios básicos norteadores do Novo CC foram: a) ETICIDADE: “Não obstante os méritos desses valores técnicos, não era possível deixar de

reconhecer, em nossos dias, a indeclinável participação dos valores éticos no ordenamento jurídico, sem abandono, é claro, das conquistas da técnica jurídica, que com aqueles deve se compatibilizar. Daí a opção, às vezes, por normas genéricas ou cláusulas gerais, sem a preocupação de excessivo rigorismo conceitual, a fim de dar a razão de ser dos modelos jurídicos e orientar os operadores do Direito em sua interpretação teórica e em sua aplicação prática.” “Freqüente é no projeto a referência à probidade e a boa-fé, assim como à correção (corretezza) ao contrário do que ocorre no código vigente, demasiado parcimonioso nessa matéria, como se tudo pudesse ser regido por determinações de caráter estritamente jurídico.”

b) SOCIALIDADE: “É constante o objetivo do novo código no sentido de superar o manifesto caráter individualista da lei vigente, feita para um País ainda eminentemente agrícola, com cerca de 80% da população no campo. Hoje em dia, vive o povo brasileiro nas cidades, na mesma proporção de 80%, o que representa uma alteração de 180 graus na mentalidade reinante, inclusive em razão dos meios de comunicação, como o rádio e a televisão. Daí o predomínio do social sobre o individual. Alguns dos exemplos dados já consagram, além da exigência ética, o imperativo da socialidade, como quando se declara a função social do contrato na seguinte forma: Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato."

c) OPERABILIDADE: “Muito importante foi a decisão tomada no sentido de estabelecer soluções normativas de modo a facilitar sua interpretação e aplicação pelo operador do Direito”. Nessa ordem de idéias, o primeiro cuidado foi eliminar as dúvidas que haviam persistido durante a aplicação do código anterior. Exemplo disso é o relativo à distinção entre prescrição e decadência, tendo sido baldados os esforços no sentido de verificarem-se quais eram os casos de uma ou de outra, com graves conseqüências de ordem prática. Para evitar esse inconveniente, resolveu-se enumerar, na Parte Geral, os casos de prescrição, em numerus clausus, sendo as hipóteses de decadência previstas em imediata conexão com a disposição normativa que a estabelece. Assim é, por exemplo, que após o artigo declarar qual a responsabilidade do construtor de edifícios pela higidez da obra, é estabelecido o prazo de decadência para ser ela exigida. Por outro lado, pôs-se termo a sinonímias que podiam dar lugar a dúvidas, fazendo-se, por exemplo, distinção entre associação e sociedade. Destinando-se aquela para indicar as entidades de fins não econômicos, e esta para designar as de objetivos econômicos.

Não menos relevante é a resolução de lançar mão, sempre que necessário, de cláusulas gerais, como acontece nos casos em que se exige probidade, boa-fé ou correção (corretezza) por parte do titular do direito, ou quando é impossível determinar com precisão o alcance da regra jurídica. É o que se dá, por exemplo, na hipótese de fixação de aluguel manifestamente excessivo, arbitrado pelo locador e a ser pago pelo locatário que, findo o prazo de locação, deixar de restituir a coisa, podendo o juiz, a seu critério, reduzi-lo.”

“Somente assim se realiza o direito em sua concretude, sendo oportuno lembrar que a teoria do Direito concreto, e não puramente abstrato, encontra o apoio de jurisconsultos do porte de ENGISCH, BETTI, LARENZ, esses e muitos outros, implicando maior participação decisória conferida aos magistrados. Como se vê, o que se objetiva alcançar é o Direito em sua concreção, ou seja, em razão dos elementos de fato e de valor que devem ser sempre levados em conta na enunciação e na aplicação da norma.”

Por seu turno, o Dep. RICARDO FIUZA4 justifica que "não poderia o novo Código pretender tudo disciplinar." Diz que, "um Código Civil, na condição de lei geral, deve apresentar seus comandos de forma suficientemente aberta, de maneira a permitir a função criadora do intérprete. Tem de sair do positivismo exagerado que engessa o direito e atrasa as transformações, para alcançar o que chamo a fase pós - positivista do direito."

Prossegue o Dep. RICARDO FIUZA explicando que: “O animus desse novo Código reside justamente no combate a essa

Instabilidade. Não que se esteja a defender a chamada "escola do direito livre",

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encabeçada por KANTOROWICZ, nem mesmo o movimento muito em moda na atualidade do chamado ‘direito alternativo’. Mas a flexibilidade na interpretação das normas permitirá que o direito se modernize, sem que haja necessidade de estar, a cada instante, alterando os textos legais.

Tenho em repetidas ocasiões externado a importância que a Hermenêutica Jurídica terá nos tempos que se avizinham, principalmente em função da velocidade das grandes transformações sociais e políticas. As leis não poderiam deixar de ser expressas em termos gerais, fixando regras, consolidando princípios, estabelecendo normas, em linguagem o mais clara e precisa possível. Todavia, seria absolutamente impossível que descessem a minúcias. É a imperiosa necessidade do intérprete de entender a relação entre o texto abstrato da lei e o caso concreto, entre a norma jurídica e o fato social. Fixar o sentido verdadeiro da norma positiva e logo depois o respectivo alcance e sua extensão, extraindo da norma o que nela se contém, determinando seu sentido e alcance. A interpretação não deve ser confundida com a Hermenêutica, sendo a primeira a aplicação da segunda, que fixa os princípios. CARLOS MAXIMILIANO, em seu livro Hermenêutica e aplicação do direito, classifica a Hermenêutica como a teoria científica da arte de interpretar. [...]

Enquadrar, portanto, o caso concreto na norma jurídica adequada é a verdadeira aplicação do direito, que deverá verificar inclusive as particularidades e as dificuldades que surgem entre preceitos que parecem adaptáveis a uma mesma hipótese, ou entre regras que podem colidir ou se confundir no espaço ou no tempo, obrigando o intérprete muitas vezes a recorrer ao exame prévio do Direito Constitucional.”

3) DAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A TENDÊNCIA A DESCODIFICAÇÃO

Uma vez que o novo Código Civil é uma realidade, não cabe mais discussão ou não sobre a conveniência da codificação, como acirradamente debateu-se antes do seu sancionamento.

Diante das dúvidas sobre as vantagens de um novo Código Civil aderiu-se à tese da descodificação e da defesa das leis setoriais, em micro-sistemas legislativos, como opção mais racional, lógica e de bom-senso. Uma forma de manter sempre atuais as normas que regem a sociedade, tal como era defendido por grandes e respeitáveis juristas do escol do Prof. CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, JOÃO BAPTISTA VILLELA e GUSTAVO TEPEDINO.

As leis setoriais não levavam a uma postura de quem se acomoda ou prefere que as coisas fiquem como estão, sem contribuir para que as mudanças acontecessem. A Des. MARIA BERENICE DIAS considerava que “as plásticas a que foi submetida (a lei velha) não lhe deram o viço que todos queríamos que ela, e até mesmo nós, tivéssemos”. Em contrário, defendia-se que melhor seria continuar, aos poucos, usando novas leis setoriais com as modificações necessárias sobre cada assunto ou tema, conforme as exigências sociais. O megacódigo aprovado não colocará fim na colcha de retalhos das inúmeras leis que vieram alterando ao longo do tempo o CC de 1916. Agora, além de permanecerem vigentes várias leis de temas específicos passou-se a conviver com a agravante da discussão sobre temas complexos como direito adquirido, direito intertemporal e daí por diante.

Analisando alguns exemplos no Direito de Família: como o Código Civil não pode tratar de normas de caráter adjetivo e não há ainda Projeto de um novo CPC adaptado à Lei 10.406/02, está previsto no art. 2.043 que os dispositivos de caráter administrativo e processual continuarão em vigência, até nova disciplina; ou seja, as normas procedimentais sobre o divórcio e a separação continuarão regidas pela Lei 6.515/77 que então não foi completamente revogada, restando aos intérpretes saber qual parte desta lei que então ainda será aproveitada por incompatibilidade ou não com o novo CC. Assim também em termos de alimentos que continuarão regidos pela Lei 5.478/68; ou quanto à filiação em que ainda teremos parte da Lei n. 8.069/90 (ECA) e da Lei 8.560/92 em vigência.

Não se pode considerar que a Lei 1.046/02 tenha sido solução para as inúmeras leis setoriais existentes no sistema jurídico pátrio. Como eram específicas e profundas sobre cada tema, os micro-sistemas legislativos traçaram normas não só de caráter substantivo, mas também administrativo e processual para aquela matéria que abordaram. O próprio CC/02 por ter pretensão de flexibilidade, buscou normas genéricas, deixando espaço para as leis temáticas, o que leva à conclusão da discussão sobre a revogação ou não das leis pormenorizadas de determinados institutos, bem como sobre o objetivo de "unidade" pretendido.

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Mais sábio seria continuar naquela toada que vinha dando certo: na medida da necessidade, cada assunto era objeto de lei própria, com amplo debate, reflexão e ponderação sobre cada questão. Foi assim com os direitos da criança e do adolescente objeto da Lei 8.069/90; a isonomia da filiação foi tratada pela Lei 8.560/92; a disciplina da união estável foi feita pelas Leis 8.971/94 e 9.278/96. Vários projetos de lei já estavam em andamento no Congresso para debater assuntos como a alteração de regime de bens por meio de pedido motivado e formulado em juízo, bem como propondo a redução da maioridade civil para 18 anos. Existem projetos para regulamentar os direitos decorrentes das relações homoafetivas; os diversos espectros da procriação assistida; a proteção do genoma humano; para estabelecer que o menor de 16 anos pode ser ouvido em juízo, mesmo que por meio de estudo social e psicológico; e para que não se estabeleça a força da coisa julgada material em ação de investigação de paternidade em que não se realize a perícia genética.

Conclui-se que, para que fossem feitas inovações no sistema jurídico pátrio, não era necessário substituir o Código Civil existente e que vinha, na medida das necessidades, adequando-se às novas exigências por meio dos micro-sistemas legislativos.

4) FAMÍLIA – CONCEITO – HISTÓRICO - TRANSFORMAÇÕES

A expressão família tem origem no latim, famulus que quer dizer escravo e, por conseqüência, família seria o conjunto de escravos pertencentes a um mesmo homem. Ainda no tempo de CAIUS, a família, id est patrimonium: quer dizer, parte da herança, era transmitida testamentariamente. “O radical fam corresponde àquele outro dhã, da língua ariana, que dá idéia de fixação, ou de coisa estável, tendo da mudança do dh em f surgido, no dialeto do LÁCIO, a palavra faama, depois famulus (servo) e finalmente família, esta última a definir, inicialmente, o conjunto formado pelo pater famílias, esposa, filhos, e servos, todos considerados, primitivamente, como integrantes do grupo familiar, daí ULPIANO, no ‘DIGESTO”, já advertir que a palavra ‘família’ tinha inicialmente acepção ampla, abrangendo pessoas, bens e até escravos.”

Hoje, inexiste dúvida que família é expressão de significados múltiplos, variáveis no tempo e no espaço.

Grande número de juristas, sociólogos, filósofos e outros por anos a fio defenderam a família como um fato natural, espontâneo, decorrente principalmente da própria natureza gregária do homem e da necessidade de perpetuação da espécie, como se pode extrair do depoimento de ORLANDO FIDA5: “convém lembrar que o homem é um animal social, segundo a vetusta assertiva aristotélica. Ditados pelos paradigmas instintivos naturais de sua própria constituição física-psíquica, o homem já nasce imbuído de dois instintos primários - a fome e o sexo que o acompanham durante toda sua existência. Recalcitrado por estes instintos, o homem foi se aglutinando a outros, dando origem aos embrionários preceitos sociológicos. A fome levou o homem à guerra, às conquistas e, conseqüentemente, ocasionando o desenvolvimento das primeiras civilizações. Quanto ao sexo, instinto natural, preservativo à perpetuação de sua própria espécie, além de lhe trazer satisfação oriundas das relações propriamente ditas, tinha”. como “condão de filhos que”, em última análise, constituir-se-ia na própria continuidade de sua dinastia ou de raça. A história nos registra, sob ponto de vista controvertido, dada as prova fragmentárias, que houve período em que o homem perdeu o seu prognaticado machismo, assumindo a mulher as rédeas não só dos negócios de Estado, como também, os de família. Neste aspecto, a mulher tinha sob seu jugo tantos homens que lhe aprouvesse, não só para lhe satisfazer sexualmente, como também, para tirar proveito em política interna ou externa. Podemos citar, v.g., entre outras, Cleópatra, Lucrécia Bórgia, Catarina da Rússia etc.”

No entanto, um grupo de juristas de elevado escol (dentre os quais exemplifica-se com JOÃO BAPTISTA VILLELA, JOÃO BATISTA DE OLIVEIRA CÂNDIDO, MARIA BERENICE DIAS e RODRIGO DA CUNHA PEREIRA) tem defendido que a família não é um fato natural mas sim cultural. Explica RODRIGO DA CUNHA PEREIRA6 que “a família” não se constitui apenas por um homem, mulher e filhos. Ela é antes uma estruturação psíquica, onde cada um de seus membros ocupa um lugar, uma função. Lugar do pai, lugar da mãe, lugar dos filhos, sem entretanto estarem necessariamente ligados biologicamente. Tanto é assim, uma questão de lugar, que um indivíduo pode ocupar o lugar de pai sem que seja o pai biológico. Exatamente por ser uma questão de lugar, de função, que é possível, no Direito, que se faça e que exista o instituto da adoção. Da mesma forma, o pai ou a mãe biológica podem ter dificuldade, ou até mesmo não ocupar o lugar de pai ou de mãe, tão necessários (essenciais) à nossa estruturação psíquica e formação como seres humanos.” “É somente após a passagem do homem da natureza para a cultura que se torna possível estruturar a família. Esta é uma estrutura psíquica e que possibilita ao homem estabelecer-se como sujeito e desenvolver relações na polis e conseqüentemente as relações jurídicas.” Com a visão cultural da família acabam por justificar a admissão do casamento homoafetivo. JOÃO

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BATISTA DE OLIVEIRA CÂNDIDO7 ressalta que a família não é um fato natural, como entendem os que defendem a tese da natureza institucional do matrimônio, mas uma estrutura. Não se pode ter o casamento como um regulador de uma organização natural, mas regulador de uma organização estruturada, de caráter cultural. Somente assim pensando é que se pode compreender, por exemplo, a possibilidade do casamento de pessoas do mesmo sexo.

Interessante a observação de LUIZ ALBERTO D’AZEVEDO AURVALLE8 quando assinala que “os homens não vivem; os homens convivem. Essa inseparabilidade do homem e seu meio social, esse instinto gregário, inerente à natureza humana, que se exterioriza na família, na tribo, no bairro, na escola, no Município, na Nação, pressupõe longo e delicado processo de adaptação social. Ao iniciar o tratamento do Direito de Família, PONTES DE MIRANDA refere-se a sete processos sociais de adaptação, perfilando-os propositadamente numa ordem crescente de mobilidade, a saber: Religião, Moral, Estética, Ciência, Direito, Política e Economia. Procedendo à análise taxionômica de tais processos, o mestre de sempre conclui que as sociedades, onde preponderam os três primeiros, tendem à estabilidade, à fixidez, à aversão à mudança, à resistência à inovação. Em outras palavras, ‘puxam para o passado’. O processo cognoscitivo das ciências, por seu turno, tende à neutralidade, sendo o que mais se aproxima do equilíbrio. Já o Direito, a Política e a Economia ‘puxam para o futuro’; aquele, imperceptivelmente, e essa, de modo violento.” Adiante: “afortunadamente, tal padrão não se repete no Direito de Família. Ainda que possa parecer paradoxal, dadas suas fontes religiosas e romanas, o Direito de Família é o que mais celeremente tem evoluído, por obra, digna de encômios, da sensibilidade dos seus lidadores e da jurisprudência criativa. Em verdade, segundo referido pelo saudoso ORLANDO GOMES, no Direito de Família ‘o escândalo de hoje é o plausível de amanhã’.”

Diz KEILA GRINBERG9 que o CC/16 “apenas continuava um movimento inaugurado tempos antes, ainda no Império, que definia a família em função da chamada proteção à moral, mas também por conta da necessidade de circunscrever os limites dos direitos à propriedade.”

Para CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA10, considera-se família o conjunto de pessoas que descendem de tronco ancestral comum. Ainda neste plano geral, acrescenta-se o cônjuge, aditam-se os filhos do cônjuge (enteados), os cônjuges dos filhos (genros e noras), os cônjuges dos irmãos e os irmãos do cônjuge (cunhados). É às vezes considerada como o conjunto de pessoas unidas pelos laços do casamento e da filiação ou, como a define ENNECCERUS, “o conjunto de pessoas ligadas pelo parentesco e pelo casamento.” Durante séculos, fora ela um organismo extenso e hierarquizado; mas, sob a influência da lei da evolução, retraiu-se, para se limitar aos pais e filhos. Na verdade, em senso estrito, a família se restringe ao grupo formado pelos pais e filhos. Aí se exerce a autoridade paterna e materna, participação na criação e educação, orientação para a vida profissional, disciplina do espírito, aquisição dos bons ou maus hábitos influentes na projeção social do indivíduo. Aí se pratica e desenvolve em mais alto grau o princípio da solidariedade doméstica e cooperação recíproca. Por tudo que representa, a família é universalmente considerada a “célula social por excelência”, conceito que, de tanto se repetir, não se lhe aponta mais a autoria. A família não tem suas normas somente no Direito. Como organismo ético e social, vai hauri-las também na religião, na moral, nos costumes, sendo de assinalar que a sua força coersiva é, antes de tudo, um dado psíquico.

RODRIGO DA CUNHA PEREIRA11 considera que os princípios estruturadores do Direito de Família no Brasil, e na maior parte dos países ocidentais, estão assentados em concepções de uma moral sexual do século passado. E que foi a partir da Revolução Industrial, com a redivisão sexual do trabalho, o movimento feminista e o declínio da ideologia patriarcal, que os paradigmas norteadores da família começaram a mudar. Ela deixou de ser apenas um núcleo econômico e de reprodução, para ser o espaço de companheirismo, camaradagem e livre expressão do amor e do afeto. Sexo, casamento e reprodução desatrelaram-se, pois se tornou possível uma coisa sem outra. Não é mais necessário sexo para reprodução e não se exige mais casamento para relacionamentos sexuais.

GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA12 - Qualquer análise envolvendo tema relacionado à família contemporânea demanda uma breve digressão acerca da evolução do organismo natural, ético, moral, econômico, religioso e, principalmente, social que é a família. Como ressalta GISELDA HIRONAKA, "há uma imortalização na idéia de família", levando em conta que a história da civilização humana sempre esteve - e assim prosseguirá indefinidamente - atrelada à história da família. O modelo familiar sempre sofreu marcada influência do poder político, econômico, religioso e social da época e localidade nas quais estava inserido, daí as tensões geradas no próprio seio da sociedade quando a força da natureza não coincidia com o arcabouço jurídico criado pelo Homem. E, em virtude de tal dissonância, a família não é valor objeto de preocupação apenas do Direito, mas sim reúne uma gama de campos do conhecimento humano para buscar a sua perfeita compreensão e estudo. Não se pode conceber um só modelo de família, diante da multiplicidade de culturas sociais, regimes políticos, sistemas econômicos

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e, mesmo, religiões. Não há campo, pois, para a família universalmente considerada como modelo único, hermético, estanque e intocável.

GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA13 - Há sérias controvérsias acerca da ORIGEM DA FAMÍLIA, já que as diversas teorias que surgiram a tal respeito são reputadas como simples hipóteses, baseadas ora em dados obtidos sem comprovação suficiente, ora no estudo dos grupos humanos existentes na atualidade, ainda em estágio primitivo. De acordo com a teoria matriarcal, após o estágio original da promiscuidade sexual, no qual todas as mulheres pertenceriam a todos os homens, evolui-se para o momento em que a genitora era o centro e a origem da família, existindo apenas o parentesco uterino, diante da certeza da maternidade e da insegurança acerca da paternidade. A teoria patriarcal, ao contrário, nega a promiscuidade sexual originária, sustentando que desde os tempos mais remotos o pai sempre foi o centro da organização familiar.

Contudo, a controvérsia existente não é empecilho a que se proceda a análise da evolução da família nas nações ocidentais, principalmente, diante do reconhecimento de que a família contemporânea tem como antecedente remoto o modelo da estrutura familiar da civilização romana. Em Roma, quando do aparecimento do Estado, a família já seguia o modelo tipicamente patriarcal, tendo como expoente o pater familias, no qual inseria-se o princípio da autoridade do pater, de forma incontestável. Nas formas mais antigas de matrimônio, entre os romanos, são lembrados os casamentos por compra ou troca, sob as modalidades da coemptio - venda simbólica da mulher ao noivo, seguindo a ritualística prevista -, e da confarreatio - celebração do casamento, de natureza religiosa e forma solene -, além do casamento por rapto e casamento pelo usus.

Há notícia de que o matrimônio não foi devidamente regulamentado no Direito romano e, assim, não recebeu disciplina jurídica. SAN TIAGO DANTAS equiparou o casamento, em Roma, à posse, como situação de fato, que deveria conjugar os elementos subjetivo e objetivo. O elemento subjetivo do casamento era a affectio maritalis, de difícil conceituação, mas entendido, sob o prisma externo, como sendo o tratamento dado pelo marido à esposa, associando-a à sua condição social, aos seus costumes, ao seu nome e ao seu modus vivendi; sob o prisma interno, íntimo do casal, era o consenso contínuo, a intenção do marido de viver com a esposa até a morte. Tal elemento anímico é de vital importância na fase atual da família contemporânea, onde os valores existenciais devem preponderar sobre qualquer outro, mormente no organismo familiar. O elemento objetivo do casamento romano era a deductio in domum mariti, ou seja, a transferência da mulher para a casa de seu marido.

Afora outras distinções, um dos pontos diferenciadores entre as justa e nuptiae e o concubinatus era a presença da affectio maritalis entre os casados, e a sua ausência entre os concubinos. Daí a razão pela qual a concubina não tinha a honor matrimoni, pois esta era privativa das esposas, na civilização romana. Acerca do tema, Heloisa Helena Barboza Apontou a presença do elemento subjetivo no casamento romano: "a intenção de serem marido e mulher, o consenso contínuo, expresso na affectio maritalis. As mesmas características acerca do modelo patriarcal, e a conotação política, hierarquizada do organismo familiar, foram observadas no tocante à família primitiva grega.

GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA14 esclarece que “com acentuada percepção, HELOÍSA HELENA BARBOZA questionou e, em seguida, conclui acerca de qual é o novo papel da família, no mundo contemporâneo: ‘Qual a função atual da família? Se é certo que ela é a base da sociedade, qual o papel que a ela cumpre desempenhar, já que não tem mais funções precipuamente religiosa, econômica ou política como outrora? Devemos reunir todas essas funções ou simplesmente considerar o seu verdadeiro e talvez único fundamento: a comunhão de afetos?’ As relações familiares, portanto, passaram a ser funcionalizadas em razão da dignidade de cada partícipe. A dignidade da pessoa humana, coloca no ápice do ordenamento jurídico, encontra na família o solo apropriado para o seu enraizamento e desenvolvimento, daí a ordem constitucional, constante do texto brasileiro de 1988, dirigida ao Estado no sentido de dar especial e efetiva proteção à família, independentemente da sua espécie. Propõe-se, por intermédio da repersonalização das entidades familiares, preservar e desenvolver o que é mais relevante entre os familiares: o afeto, a solidariedade, a união, o respeito, a confiança, o amor, o projeto de vida comum, permitindo o pleno desenvolvimento pessoal e social de cada partícipe, com base em idéias pluralistas, solidaristas, democráticos e humanistas”.

VICENZO SCALISI, conforme citação de ANA LUIZA MAIA NEVARES,15 considera que "o advento de uma sociedade industrial de massa criou condições humanas e sociais de larga mobilidade e determinou uma fratura entre vida e trabalho, gerando um novo sistema produtivo, que não tinha mais na família o seu centro de gravitação. No entanto, exigia da família uma organização pessoal e patrimonial que para ser funcional e homogênea ao sistema devia se apresentar o mais possível livre, aberta e paritária, sem repartições predeterminadas de funções e com papéis fungíveis e intercambiáveis entre cônjuges."

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Segundo GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA,16 “hodiernamente, tal sistema sofreu radicais alterações e, por que não dizer, precisou ser revisitado, como resultado da própria evolução da sociedade e da necessária preocupação acerca da observância dos novos valores introduzidos e acolhidos pela civilização contemporânea. A família, nesse contexto, ‘é formação social, lugar-comunidade tendente à formação e ao desenvolvimento da personalidade de seus participantes; de maneira que exprime uma função instrumental para a melhor realização dos interesses afetivos e existenciais de seus componentes’. Não há mais lugar, no mundo atual, para o Direito de Família aristocrático, ou seja, aquele que objetivava tutelar a família “legítima”, detentora de patrimônio e da paz doméstica, como valores absolutos, sem qualquer conteúdo ético e humanista nas relações travadas entre os partícipes de tal organismo familiar. ‘Construção doutrinária e jurisprudencial, realidade sociológica, a família plural ganha o artigo constitucional e se projeta na legislação mais recente que se pronuncia.’

Houve uma completa reformulação do conceito de família, no mundo contemporâneo, não apenas no Brasil, mas no contexto do mundo globalizado.

Em todos os cantos do planeta, o modelo tradicional de família vem perdendo terreno para o surgimento de uma nova família, que é essencial para a própria existência da sociedade e do Estado, mas funcionalizada em seus partícipes: ‘Uma família que continua sendo imprescritível como célula básica da sociedade, fundamental para a sobrevivência desta e do Estado, mas que se funda em valores e princípios diversos daqueles outrora alicerçadores da família tradicional’. “Um dos pioneiros defensores brasileiros do modelo plural de família, no mundo jurídico, ORLANDO GOMES anunciava a mudança dos tempos no Direito de Família, ainda no período anterior ao advento do texto constitucional: ‘Funda-se o casamento na vontade inicial, solenemente declarada ao juiz, e irretratável, da qual nasce, incontinenti, a família legítima, subordinadas as relações assim criadas às normas inderrogáveis pela vontade das partes. Mas a tendência para facilitar o divórcio, permitido pelo mútuo consentimento em muitas legislações e favorecido pela multiplicação de suas causas, está deslocando o fundamento do matrimônio para uma vontade contínua. Não se regride, evidentemente, à concepção romana, que vinculava seus efeitos à combinação de dois elementos: a convivência e a affectio maritalis, dos quais nascia e se cimentava o mundo dos afetos mais vasto que é a família. Exige-se, entretanto, que perdurem os sentimentos determinantes da união conjugal, uma vez que se ”possibilita” o rompimento do vínculo matrimonial se seu desaparecimento torna intolerável a vida em comum (...) Por outro lado, o interesse do Estado em que se legalizem as uniões sexuais se desenvolve juridicamente no sentido da certeza que oferecem quanto às relações que originam.”

“A família é valor constitucionalmente garantido nos limites de sua conformação e de não contraditoriedade aos valores que caracterizam as relações civis, especialmente a dignidade humana: ainda que diversas possam ser as suas modalidades de organização, ela é finalizada à educação e à promoção daqueles que a ela pertencem.”

A Constituição de 1988, na verdade, tratou da família, no dizer que PIETRO PERLINGIERI17 "como formação social não como portadora de um interesse superior e superindividual, mas, sim, em função da realização das exigências humanas, como lugar onde se desenvolve a pessoa."

O Direito de Família no CC/02 sofreu muitas críticas, como as de GUSTAVO TEPEDINO18 para quem o seu "mal maior foi a reprodução de uma dogmática matrimonialista, institucionalizada, que focaliza a família através da lente do casamento e dos seus diversos regimes patrimoniais."

Por seu turno, ANA LUIZA MARIA NEVARES19 considera que o novo Código Civil "manteve a mesma disciplina abstrata e geral do sujeito de direito, não concebendo a pessoa em sua real dimensão humana, ou seja, tendo em vista sua variedade e diversidade de necessidades, interesses exigências, qualidades individuais, condições econômicas e posições sociais. Dito diversamente, não assimilou o princípio constitucional, elevado a fundamento da República, de proteção à dignidade da pessoa humana. Um bom exemplo é a ausência total de referência à proteção das pessoais idosas, disposta no art. 230 da CF/88 e ignorada no CC."

Conclui RODRIGO DA CUNHA PEREIRA que "a reforma do Direito de Família não significa apenas uma simples mudança dos textos normativos. Significa repensar a família em seu sentido mais profundo. Precisamos entender a organização da família como uma estruturação psíquica (LACAN e L. STRAUSS). Somente assim poderemos vê-la acima dos conceitos, às vezes, estigmatizantes de uma determinada época ou espaço. Conseqüentemente os textos legislativos sobre a família responderão às suas representações sociais, e certamente seriam para a liberdade e libertação dos sujeitos. Estaríamos, talvez, caminhando em direção a um Código de Família."

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BERTOLDO MATEUS DE OLIVEIRA FILHO20 - A história começou há 4,5 milhões de anos, quando os primeiros hominídeos desceram das árvores. Pela mitologia bíblica, Adão e Eva se deleitaram com a maçã e experimentaram o constrangimento de tê-la provado. Os ancestrais religiosos perderam a inocência e nunca mais foram os mesmos.

Na Ilíada, os problemas conjugais de HELENA E MENELAU deflagraram dez anos de uma guerra de verdade, a de TRÓIA. Num outro relato grego, MEDÉIA, possuída por um ciúme incontrolável, na dor de ter sido trocada por outra mulher, matou os próprios filhos. Achava que assim punia JASÃO, o marido infiel. ADÃO E EVA, HELENA E MENELAU, MEDÉIA E JASÃO: o que não falta são mitos sobre a complicação que é a convivência entre homens e mulheres.

O relacionamento amoroso, sem dúvida, é um fato social que tem merecido diversificado estudo, sendo a multidisciplinaridade uma característica notável nesta busca incessante de conhecer o vínculo. Certamente que existe uma vasta bibliografia sobre o tema, variando desde a hermética seriedade dos compêndios da Psicologia científica até os manuais de conquista e preservação do ente amado.

Na seara jurígena, a regulamentação do relacionamento familial enfocou as demandas afetivas como valores sobremaneira tutelados pelo Direito Positivo. A Constituição Federal de 1988, no Capítulo VII, traduz a ampla preocupação do legislador na conformação do afeto como objetivos fundamentais dos núcleos de convivência interpessoal, estimulando a mútua assistência no parentesco e na conjugalidade. Aliás, já se diz que muitos dispositivos magnos embutem a consagração de um direito constitucional de ser feliz.

Entrementes, no ambiente favorável de uma legislação abolicionista de preconceitos, desigualdades e discriminações, ainda assim vicejam os conflitos e proliferam os dissídios entre homem e mulher e pais e filhos, exteriorizando-se na violência doméstica, no abandono material, na ruptura de compromissos e na incessante necessidade da intervenção judicial para a minimização dos confrontos. Em que aspecto reside, então, a dificuldade para a subsistência dos laços de afetividade.

Não parece haver dúvida que o poderio exercido pela ilusão de que as perspectivas prazerosas do relacionamento amoroso e a poética auréola de uma perpetuação existencial imaginada na prole dominam os vínculos firmados no suposto de uma higidez perene. Assim, desarmamo-nos para o enfrentamento das reações ambivalentes (tolerância, ira, recompensa, frustração) que imantam naturalmente a intimidade, o que conduz à incapacidade de lidar racionalmente com problemas do cotidiano e insere no convívio ingredientes intoxicantes.

De fato, o objetivo de ser feliz a qualquer custo é um paradoxo que vai de encontro a toda e qualquer consideração sensata da realidade. Se aspirar à felicidade significa dar corpo a um impulso vital e positivo, pensar que se pode alcançá-la de maneira permanente é uma coisa completamente diferente.

BERTOLDO MATEUS DE OLIVEIRA FILHO21 - O Direito de Família codificado e mesmo em fase de crescente constitucionalização deve considerar, portanto, na sua aplicação, os intensos paroxismos das turbações emocionais do indivíduo, incorporando elementos que permitam um maior conhecimento do psiquismo, em prol da efetividade dos objetivos de solidariedade, reciprocidade e comunhão reverenciados na legislação. Isso porque o projeto parental, matrimonializado ou não, formal ou informal, livre ou regulamentado, instaura-se sob a construção de uma história a quatro mãos, uma viagem de possibilidades e edificação afetiva. Na decolagem jurídica há uma vínculo formador, originário ou superveniente. A vida em comum não passa despercebida da lente do Direito, que dela trata como um plano minucioso de preparação para esse vôo. Espaço plural do existir humano, fomento de aspirações, protagonista de um projeto parental de esperança possível. Eis uma dimensão possível e renovada das uniões.

A grande tarefa desse novo tempo é a de transmutar os fundamentos axiológicos rigidamente normativos - que ontem norteavam o Direito de Família em critérios interpretativos humanizados pela certeza de que o sentimento pertence à contextura do modelo familial desejado. E que a família nuclear (que é um verdadeiro estado de espírito, antes que uma estrutura, distribuição e arranjo de casa, ou de diagrama de relações de parentesco, composto pela mãe, pai e filhos) distingue-se de todos os outros padrões familiares pelo sentido muito peculiar de solidariedade que une entre si os membros da unidade doméstica, ao mesmo tempo que os separa do resto da coletividade.

Os membros da família nuclear têm um aguçado sentimento de viver num clima afetivo privilegiado que os protege contra qualquer intrusão, isolando-os atrás do muro da privacidade.

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O suporte emocional do indivíduo através da ambiência familiar não se exterioriza mais, nos dias que correm, apenas na tutela formal dos integrantes aglutinados, posto exigir doravante a afirmação da importância jurídica do afeto como expressão da dignidade da pessoa humana.

LUIS EDSON FACHIN22- A família constitui um corpo que se reconhece no tempo. Uma agregação histórica e cultural como espaço de poder, de laços e de liberdade. Uma aliança composta para representar harmonia e paradoxos. Uma agremiação destinatária de projetos e de discursos, especialmente da alocução normativa, junção que encarna o elo entre o direito, a família e a sociedade

É uma arena na qual tudo está sempre para ser dito, o que reconstrói, no presente, os limites do passado sob as vestes da modernidade, e projeta para o futuro as interrogações próprias do destino que se quer ver prometido. Eles foram felizes para sempre era o dístico que encimava o brasão dos enlaces. Mais tarde apreende-se que seja infinito enquanto dure. E nos dias correntes assume-se que viveram felizes por um certo tempo.

Sustenta-se uma concepção plural e aberta de família que, de algum modo, conforte, agasalhe e dê abrigo durante o trânsito da jornada de cada um e de todos coletivamente. Nela se ambiciona todo o desfrute possível sem perder a percepção poética da própria existência. Anda-se, pois, no equilíbrio da corda bamba do impossível.

A esperança é a alavanca nos sustenta contra as adversidades. Não será precisamente de códigos que esse porvir reclama e sim da superação dos algoritmos que querem, preventivamente, explicar e conter a vida.

Superar uma percepção fundamentalista da família na estrutura que simplifica o bem e o mal. A família é mais que essa dualidade, é ambivalente, é complexa e sem polarizações.

Uma das propostas é edificar a família da amizade como vínculo. Propomos a família cidadã pela ternura e, pelo afeto. Abrir espaço para o reconhecimento da inclusão na cidadania da amizade, que é, quem sabe, o que mais nos resta no tempo da intolerância.

Quiçá na família se veja o que CÍCERO viu na amizade: "Quem olha para um amigo verdadeiro vê nele, por assim dizer, uma imagem (exempla) de si mesmo. E por isso que os amigos, ainda que ausentes, estão presentes; ainda que pobres, têm abundância, ainda que fracos, são fortes e, o que é mais difícil de dizer, ainda que mortos, estão vivos".

MARIA BERENICE DIAS23 - Sob a justificativa de estabelecer padrões de moralidade e com a finalidade de regulamentar a ordem social, nominou-se de família os relacionamentos afetivos. O Estado solenizou sua formação pelo casamento e transformou a família em uma instituição. A Igreja deu-lhe status de sacramento. Seja o Estado da espécie que for, tenha a formação que tiver, nomine a religião o seu deus da forma que o idealize, o fato é que ambos, o Estado e a Igreja, acabaram se imiscuindo na vida das pessoas. Foram gerados interditos – proibições de natureza cultural e não-biológica – para regulamentar as relações amorosas.

Como lembra VIRGÍLIO DE SÁ PEREIRA: A família é um fato natural, o casamento é uma convenção social. A partir do intervencionismo estatal, os vínculos interpessoais, para merecerem aceitação social e reconhecimento jurídico, necessitavam ser chancelados pelo que se convencionou chamar de matrimônio. Uma vez atendidos os pressupostos e requisitos estabelecidos pela lei, o casamento transforma-se em uma união praticamente indissolúvel.

Parece que o Estado, com sua onipotência, olvida que são os vínculos e pactos íntimos que ligam o par. Não são as imposições sociais ou os mandamentos legais que os mantêm unidos. Mas não se limita o legislador a chancelar o casamento e atribuir responsabilidades ao casal. Também busca interferir em sua vida íntima. Assegura direitos e impõe encargos a serem cumpridos durante o período de convívio. Além dos deveres impostos a ambos os cônjuges, como o de fidelidade recíproca, vida em comum e mútua assistência, atribui a lei ônus e bônus diferentes para o marido e a mulher.1 Essa distinção, no entanto, tem-se por não mais vigorante desde o advento da Constituição Federal, que considera que os direitos e os deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

Dita ingerência na vida familiar, além de nitidamente descabida, é de todo despicienda. Ainda que tente a lei impor obrigações e assegurar direitos, o descumprimento de qualquer dos deveres do casamento não gera a possibilidade de o cônjuge credor buscar seu adimplemento em juízo. Não há como exigir judicialmente as imposições contidas na lei. São previsões que servem tão-só para fundamentar uma ação de separação. A infringência aos deveres conjugais outorga legitimidade para a busca da separação, imputando-se ao infrator a culpa pelo fim do amor. Portanto, as regras estabelecidas para vigorar durante a vida em comum têm utilidade somente para justificar o pedido de separação, ou seja, são invocáveis depois de findo o casamento.

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A participação do Estado é invocada de forma supletiva ou residual. Ou seja, exime-se o Estado de seus deveres sociais, delegando-os à família, sem garantir-lhe condições ou repassar-lhe recursos para o desempenho desses misteres. Inconscientemente o Constituinte vale-se da ideologia da família para assim desonerar o Estado – ou ao menos compartir o ônus – de certas funções públicas e deveres sociais para cujo desempenho e adimplemento a grande maioria das famílias brasileiras não têm recursos econômicos, nem outras condições.

A legislação infraconstitucional que veio a regular essa nova espécie de família acabou praticamente copiando o modelo oficial do casamento. Além de estabelecer os requisitos para o seu reconhecimento, impõe deveres e cria direitos. Assegura alimentos, estabelece o regime de bens, insere o convivente na ordem de vocação hereditária, institui usufruto e concede direito real de habitação. Aqui também pouco resta da vontade do par, cabendo afirmar que a união estável se transforma em um “casamento por decurso de prazo”.

No momento em que o formato hierárquico da família cedeu à sua democratização, em que as relações são muito mais de igualdade e de respeito mútuo e o traço fundamental é a lealdade, não mais existem razões, morais, religiosas, políticas, físicas ou naturais, que justifiquem essa excessiva e indevida ingerência do Estado na vida das pessoas.

A esfera privada das relações conjugais tende cada vez mais a repudiar a interferência do público, não se podendo deixar de concluir que está ocorrendo uma verdadeira estatização do afeto.

RODRIGO DA CUNHA PEREIRA24- Está havendo uma mudança a partir da teoria, que vai sustentando uma outra qualidade de pensamento. Mas é uma mudança que também advém da prática, da vida como ela é, e mostra que o Direito tem que organizar juridicamente essas relações. A evolução acontece na teoria e na prática. E o costume, que é uma das mais importantes fontes do Direito, vai determinando as mudanças.

A noção de cidadania nos permite pensar o novo Direito de Família, mas, antes disso, o que nos autoriza a pensar a cidadania é a consciência dos direitos humanos. Se os direitos humanos não tivessem sido desenvolvidos como um valor, e declarados em 1948, talvez não estivéssemos aptos a pensar o Direito de Família como estamos pensando atualmente.

À medida que os julgados não fazem justiça, muitas decisões, que continuam excluindo pessoas do laço social, são sustentadas pela legislação. A lei, como é uma norma geral e abstrata de conduta, não é para atender a uma especificidade. Mas em cada caso concreto cabe uma interpretação e essa interpretação da lei, que é outra fonte de direito, a hermenêutica, é subjetiva. E essa subjetividade do julgador é contaminada por diversos fatores, como o contexto histórico, sociológico e por sua própria formação individual, por sua singularidade.

A ciência às vezes se depara com aspectos da moralidade vigente que não são o que as pessoas gostariam, como a clonagem e a inseminação artificial. Temos de pensar o Direito como ciência, temos de pensar cientificamente. Não podemos ser atropelados por valores morais que muitas vezes são estigmatizantes.

RODRIGO DA CUNHA PEREIRA25- A ética é um valor maior, acima do pessoal e acima dos valores morais. Às vezes o que é ético não é moral e o que é moral não é ético. Dar a guarda do filho para a companheira da Cássia Eller, por exemplo, é uma atitude ética, mais próxima da Justiça do que dar a guarda para um parente que não tem ligação com a criança, só porque está escrito na lei que os laços de sangue devem prevalecer sobre os outros. Uma coisa é a moral, que às vezes promove injustiças. Outra coisa é a ética, que faz justiça, e fica acima desses valores estigmatizantes. A ética é norteada pelo bem comum, pelo bem geral. No caso da decisão de dar a guarda para a companheira, por exemplo, se o viés for mais moralista, a decisão é pelo avô. Por isso é que construímos uma norma, que seja geral, dizendo que, neste caso, a guarda deve ir para aquele que melhor pode defender os interesses da criança e não para um parente distante, em razão de uma posição moral.

Se for considerar a letra fria da lei, já que o Direito de Família condiciona a paternidade ao laço biológico, pode-se dizer que o “verdadeiro” pai é o doador do sêmen. Mas, na verdade, ele não é o pai. O seu pai é o do afeto, ou seja, aquele que cuidou, educou, enfim, exerceu as funções paternas. É essa vitória do afeto sobre a moral que nos possibilita pensar um Direito de família mais moderno, criando esses novos institutos como parentalidade socioafetiva, o fim da culpa para o fim do casamento, entre outras mudanças no Direito de Família.

Temos de achar um meio-termo, pois não se pode retirar do laço biológico sua vinculação familiar. Esse vínculo também é importante e deve ser considerado. A idéia não é excluir o laço biológico, mas incluir a paternidade socioafetiva. E aí teremos de criar normas de condutas para regular

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essa situação. É por isso que têm sido desenvolvidos estudos e teorias e o III Congresso faz história neste sentido: pensar a família a partir da cidadania, da inclusão e dos direitos humanos.

RODRIGO DA CUNHA PEREIRA26- O Estado deveria intervir para proteger a parte mais fraca? Foi o que aconteceu com o caso do concubinato. Ao mesmo tempo em que intervém para proteger, o Estado acaba impedindo uma união livre. Assim, o indivíduo . não tem mais o direito de estabelecer uma relação sem a intervenção do estado, que passa a ditar direitos e deveres a partir de um determinado momento. A não ser que o casal firme um contrato em contrário, valem as regras defendidas pelo Estado. Há, no entanto, que se definir um limite entre o público e o privado. É uma discussão que só está começando.

Porque a essência da vida é essa: dar e receber amor. E o Direito de Família tenta regular essas relações. Este é um imperativo categórico desde que surja a compreensão de que a família não é mais um núcleo econômico e de reprodução. Mas sim o espaço do amor, do afeto. No entanto, como uma moeda de duas faces, pressupõe-se também o contrário dele: o ódio. O pai que não paga pensão, que não reconhece a paternidade, que não quer dar o afeto. A lei é para aqueles que não querem dar afeto ou para os que não têm afeto. A lei não vai obrigá-los a ter afeto, mas vai impingir-lhes responsabilidade.

As pessoas que têm afeto nem precisam da lei, pois já têm a lei internalizada. Na verdade, a lei entra para socorrer aqueles que não recebem o afeto. Aqueles que não têm a paternidade reconhecida, aqueles que não recebem a pensão por pirraça ou briga. A lei socorre em casos de litígio conjugal, que é uma situação de desafeto, de desamor e até de ódio. As relações são sustentadas pelo amor, mas também pelo ódio. Talvez até o ódio sustente muito mais uma relação do que o amor. Aliás, o Direito só existe porque existe o torto, como já disse DELVECCHIO.

O ódio não só sustenta uma relação como dá força a ela, deixa as pessoas vinculadas. O ódio faz parte do amor e por isso tem de ser feito um trabalho para transformar este sentimento. Há processos que ficam anos e anos na Justiça em função desse outro lado da moeda amorosa. O ódio vincula tanto quanto ou mais do que o amor. É isso, inclusive, que sustenta os eternizantes processos de separação litigiosa. O amor liberta o indivíduo do outro e liberta o outro. É como a questão da culpa. A culpa paralisa e a responsabilidade constrói. Por isso é preciso estirpar do ordenamento jurídico brasileiro a noção de culpa, porque ela é paralisante. É importante trabalhar com a noção de responsabilidade. E não uma responsabilidade civil, mas a responsabilidade de escolha pela situação em que ele se encontra e pela própria saída do conflito. Há toda uma técnica, que é o Direito de Família, que vai ser determinada pela compreensão da vida. Este é o autêntico Direito de Família.

Particularmente, não consigo mais ver o Direito de Família sem o apoio dessas ciências. Não possível mais pensar o Sujeito do direito sem levar em consideração que ele é o sujeito do Desejo. Não significa a não responsabilidade do inconsciente. O próprio Lacan disse isso: todo sujeito deve responder pelos seus atos. E os atos e fatos jurídicos são precedidos por escolhas que, “as vezes, são inconscientes. Não se pode mais pensar o Direito de Família moderno sem considerar que na objetividade dos atos e fatos jurídicos permeia o tempo todo uma subjetividade.

O Direito de Família é o ramo da ciência jurídica que mais avançou, mas as pessoas ainda não se prepararam para isso. Compreender o novo Direito de Família é compreender as novas concepções morais. O Direito não está mais pronto e acabado. Os currículos ainda não estão adequados a esta contemporaneidade, mas esta evolução depende muito do professor, que pode colocar o aluno para pensar.

Não há como negar razão para GUILHERME GAMA quando ressalta que “um dos segmentos do universo jurídico em que se observam profundas mudanças nos últimos tempos é, indubitavelmente, o Direito de Família. E, não poderia ser diferente, diante do redirecionamento das relações políticas, econômicas, sociais e, conseqüentemente, familiares no sentido de se buscar o fundamento das relações pessoais contemporâneas nos ideais e valores de pluralismo, solidarismo, democracia, igualdade, liberdade e humanismo. Cuida-se de adotar posturas que sejam coerentes com o significado da própria existência do homem na Terra, elucidando os mistérios e segredos da pessoa humana e do meio que a circunda, tentando atingir o bem existencial mais desejado: o bem-estar social ou, mais individualmente, a felicidade.”

RAINER CZAJKOWSKI27 lembra que “não é casual, ou desmotivada, a proteção estatal às famílias. O ordenamento jurídico leva em conta, fundamentalmente, a importância da família como núcleo básico e central de toda a estrutura social, onde o indivíduo recebe seu primeiro sustento e assistência, além do mais essencial de sua educação. É através da família que o indivíduo se insere na sociedade, adquire seu primeiro status e as condições necessárias para o convívio harmonioso em seu

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grupo.” Razão do DES. FRANCISCO FIGUEIREDO chegar a afirmar que “a família é a Igreja Doméstica” e que “a pátria é a família amplificada”;

CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA28 – O direito de nosso tempo manifesta cuidados especiais com a família. E nisto revela já uma diferença muito grande com o passado. As leis e os Códigos falavam nas relações familiares, aludiam ao casamento, à filiação, ao regime de bens. Mas não mencionavam a palavra "família". A observação, posto que em geral, foi enfatizada por Savatier, em referência especial ao Código Napoleão.

Hoje em dia outras são as idéias. Na dimensão genética ou biológica, tutelada inicialmente pelo Direito Moderno, considerava-se família o conjunto de pessoas que descendem de tronco ancestral comum. A ele se agrupavam os que se encontravam, direta ou indiretamente, em decorrência das relações conjugais, na linha reta, ascendente e descendente, como na colateral ou oblíqua. Como organismo ético e social, não se desprezavam as normas da religião, da moral e dos costumes.

Num passado recente, ainda se discriminavam as relações extraconjugais, o ato jurídico da adoção. E se distinguiam filhos legítimos, ilegítimos, adulterinos, incestuosos. Todas essas classificações desapareceram em face de disposição constitucional que equiparou todos os filhos, abolindo quaisquer designações discriminatórias (Constituição Federal, art. 227, § 6°).

Priorizada a convivência familiar, ora nos confrontamos com o grupo fundado no casamento ou no companheirismo, ora assumimos o reconhecimento da família monoparental identificada com os mesmos direitos e deveres. O Direito Brasileiro outorgou, ainda, direitos à família substituta e já se esboça o reconhecimento de prerrogativas e compromissos próprios à família sócio, afetiva onde prevalecem os laços de afetividade sobre os elementos meramente .formais.

Não podemos esquecer, no entanto, que a família, nas últimas décadas e neste início de milênio, busca mecanismos jurídicos diversos de proteção para seus membros, busca e respeito às diferenças, necessidades e possibilidades.

SÁLVIO DE FIGUEIREDO29 - A união entre homem e mulher é uma realidade das mais antigas da história da humanidade, cuja origem e evolução se prendem e se mesclam com a própria origem e evolução da família.

Daí ser esta considerada a célula mater da sociedade e, a partir de tal premissa, seu estudo, sob vários focos, inclusive o jurídico, é visto com inquestionável importância. Mas, o que vem a ser a família? Qual sua origem?

Todas as sociedades reconhecem a existência de unidades básicas, organizadas, que são intermediárias entre o indivíduo e a sociedade de que ele faz parte.

Certo é que a formação dos primeiros grupos familiares é questão controvertida, que suporta inúmeras divagações, teorias e conclusões. Embora escassos os dados referentes ao homem primitivo, tem-se o suficiente para configuração das diversas espécies de costumes sociais. Deduzir a origem da família a partir de fragmentos de fósseis e objetos de pedra do homem do período paleolítico, certamente, é tarefa árdua, sempre sujeita a riscos.

Sabe-se, entretanto, que os primeiros grupamentos se teriam formado em razão de subsistência, dado que alimentação, defesa e procriação apresentam-se como elementos da própria natureza. É que a tendência do ser humano é congregar-se e não se isolar. Por isso ADAHYL LOURENÇO DIAS, citando VICENTE DE FARIA COELHO, afirma que a família é um fato natural, com predominância do social sobre o jurídico.

Fato é que a família subsiste de forma contínua e indestrutível à marcha inexorável da humanidade, antecedendo ao surgimento do Estado, anterior ao próprio Direito e à Igreja, que sobre ela sempre exerceu grande influência.

Pode-se dizer que estudar a família é estudar as bases fundamentais do comportamento humano, pois toda sociedade nasce e se desenvolve a partir de uma base fundamental, que surge a partir da união de um homem e uma mulher.

Em outros termos, por mais que seja importante explorar as bases biológicas, a seleção por parentesco não explica todo o comportamento social do homem na formação da família, pois, por maior força que tenham os laços de sangue, nenhuma relação natural explica o dever de exclusividade sexual entre um homem e uma mulher, cuja associação denota intenção de permanência ou durabilidade.

A família é modo de organização social assentada, primariamente, na seleção por parentesco, onde os demais elementos (reciprocidade e coerção) evoluíram seqüencialmente e agora estão presentes em todas as sociedades, excetuando, talvez, as mais remotas e sem Estado.

Com o desenvolvimento de novas tendências, independentemente da dúvida metodológica quanto ao papel do parentesco no estudo da origem das famílias primitivas, ou mesmo quanto à

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universalidade da família como categoria cultural, parece possível tratar a questão sem abolir as relações biológicas, mas em categorias culturais mais amplas, sobretudo nas sociedades ocidentais.

SÁLVIO DE FIGUEIREDO30 - O ponto comum, presente em todos os estudos sobre a evolução humana, indica uma primeira fase de promiscuidade sexual, cuja evolução, restringindo as uniões sexuais, foi o primeiro passo para a organização familiar. Segundo AMÉRICO LUÍS MARTINS DA SILVA, a promiscuidade demonstra apenas a ausência de limites morais proibitivos, apontando esse autor a repressão ao instinto, pela intervenção da cultura, como o primeiro passo para a formação das uniões que vieram a receber o nome de casamento.

Observada a grande diversidade das sociedades através dos tempos, como sustenta SHAPIRO, citando LÉVI-STRAUS, “a única coisa que se pode dizer é que a família conjugal monogâmica é relativamente freqüente.”

A família patriarcal, base do processo monogâmico, representou a grande derrocada histórica do sexo feminino em todo o mundo, pois, para assegurar a fidelidade feminina e a conseqüente certeza da paternidade, a mulher era entregue, sem reservas, ao poder do homem.

A análise histórico-evolutiva das uniões entre homem e mulher, para a afirmação da natureza do vínculo,encontra relevância jurídica. E põe a claro que os diversos regimes de aquisição e transmissão de direitos e patrimônio ligam-se, diretamente, ao próprio sistema de definição de cidadania.

SÁLVIO DE FIGUEIREDO31 - Quanto ao romanos, todas as correntes sobre a origem e evolução da família e suas polêmicas influíram nos estudos do Direito Romano, como afirma CONVERTI, que identifica, entre os romanistas, três posições distintas:

a) a primeira corrente via a família romana como uma sociedade patriarcal, doméstica, sob o poder absoluto do pater, por razões de sangue ou religiosas (sacras);

b) para a segunda corrente, a família não era considerada como originária, mas como um grupo social. Ou seja, não teria nascido com o homem, mas seria "uma conquista da civilização";

c) a terceira corrente, encabeçada por Bonfante, não se preocupava se teria sido a família a origem das gente, tribus, ou, ao contrário, se estes, divididos, é que teriam dado origem à família. Eles se interessavam pela família, pelo seu aspecto político, como preexistente a civitas, organizada jurídica e politicamente de tal modo que preenchia todas as funções do Estado em uma sociedade primitiva.

Mas, o principal aspecto jurídico da família antiga, em Roma, é fundar-se, basicamente, na monogamia e no patriarcado. A monogamia visando garantir a certeza da prole para a transferência do patrimônio, como já mencionado. Sob o patronato do pater familias se encontra toda a estrutura familiar romana.

O princípio da família é o poder paterno, não sendo relevantes os vínculos biológicos nem os de afeição.

Em Roma, a criança que o pai não reconhecia era, simplesmente, enjeitada. Conforme Veyne, "um cidadão não tem um filho: ele o toma, levanta (tollere); o pai exercia a prerrogativa, tão logo nasce a criança, de levantá-la do chão, onde a parteira a depositou, para tomá-la nos braços e assim manifestar que a reconhece e se recusa a enjeitá-la. (...) Em Roma a voz do sangue falava muito pouco; o que falava mais alto era a voz do nome da família".

E mais, a família ameaçada de extinção pela via natural podia ser perpetuada pela via artificial. Desde seus primórdios, Roma conhecia e utilizava a instituição da adoção. A adoção era largamente utilizada - outro exemplo desse modelo da família romana - e não apenas para assegurar a continuação de uma estirpe, mas também como meio de controlar o movimento dos patrimônios, de vez que, por exemplo, as heranças que o adotado recebesse caberiam ao pater familias...

SÁLVIO DE FIGUEIREDO32 - Esta potestas do pater familias, como visto anteriormente, deriva da religião e é estabelecida por ela. FUSTEL DE COULANGES defendeu e desenvolveu magnificamente esta tese, afirmando que "uma família era um grupo de pessoas às quais a religião permitia invocar o mesmo lar e oferecer a refeição fúnebre aos mesmos ancestrais".

Mas, efetivamente, como se compunha a família? Quem eram seu membros e quais eram seus vínculos?

De acordo com MOREIRA ALVES, a estrutura geral da família romana pode ser estabelecida levando-se em consideração cinco grupos de pessoas vinculadas pelo parentesco ou pelo casamento:

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a) a gens, cujos membros acreditavam descender de um mesmo antepassado (lendário e imemorável), do qual recebiam o nome (gentílico) que os unia (não necessariamente via parentesco consangüíneo);

b) a família comuni iuri, correspondente a um conjunto de pessoas ligadas por parentesco agnatício (que se transmite apenas pelos homens descendência de um tronco comum de varão em varão) e sujeitas à potestas de um pater familias comum;

c) o conjunto de cognados (o parentesco cognatício é o que se transmite pelo sangue, tanto por via masculina quanto feminina) em sentido restrito, porquanto não sendo reciprocamente agnados estavam ligados somente pelo parentesco consangüíneo;

d) a família proprio iure, compreendendo o complexo de pessoas que se encontravam sob a potestas do pater familias;

e) a família natural, constituída pelos cônjuges e sua prole, independentemente de o marido e pai ser, ou não, pater familias da mulher e descendentes imediatos.

Quanto ao concubinato, entre os romanos podem ser identificadas várias etapas. Na República era irrelevante para o Direito, não produzindo qualquer efeito. No Império, atribui-se a Augusto o reconhecimento de licitude às relações extramatrimoniais entre homem e mulher de categorias sociais diferentes.

Na verdade, a atribuição de licitude ao concubinato (ainda que mantido em grau de inferioridade em relação ao casamento) nada mais foi que o reconhecimento jurídico de uma situação freqüente nas classes sociais de todo o Império Romano.

O concubinato, mais que um sistema tipicamente romano, era uma prática aceita e até incentivada pelas mulheres legítimas, como esclarece ROUSSELLE: "As esposas da alta sociedade romana não viam inconveniente nas relações dos seus maridos com escravas ou concubinas. Eram elas próprias, por vezes, que escolhiam estas sócias. E isto desde a República. Por exemplo, a mulher de CIPIÃO, o Africano, conhecia a amiga de seu marido, libertou-a depois da morte de CIPIÃO e casou-se com um de seus libertos. LÍVIA fornecia a AUGUSTO, que lhe estava verdadeiramente ligado, as rapariguinhas virgens que ele gostava de deflorar.”

SÁLVIO DE FIGUEIREDO33 - Aliás, como observou SAN TIAGO DANTAS, o concubinato passou a ser uma união bastante comum: "O concubinatus era uma união muito comum entre os romanos, não tendo então o mesmo sentido imoral que hoje em dia se lhe empresta. A concubina tinha uma posição social de que defluíam conseqüências jurídicas e de que os autores se ocupam. Era concubinato a união da liberta com seu patrono. Era concubinato, enfim, toda ligação entre o homem e a mulher na qual não ocorresse a affectio maritalis."

Com o advento do Cristianismo, instaurou-se o repúdio às relações extraconjugais, embora os filhos nascidos dessas relações pudessem ser legitimados pelo casamento subseqüente dos pais.

SÁLVIO DE FIGUEIREDO34 - Assim, antes da instituição do casamento civil, sob a forma legal, e com o crescimento da respectiva legislação, o concubinato era considerado um casamento de segundo grau.

Devido à influência do cristianismo, o pater familias tem a sua rigorosa e absoluta autoridade sensivelmente diminuída. Com essa substituição da religião doméstica, dá-se a transferência do sacerdócio ao clero e o pater familias perde sua autoridade sagrada, oriunda do culto dos antepassados.

Da mesma forma, os poderes do pater familias sobre sua mulher são abolidos. Uma nova concepção de casamento é introduzida: a indissolubilidade da união (sintetizada na máxima de São Paulo: "Que o homem não separe o que Deus uniu").

Além disso, no setor patrimonial, chega-se à comunhão de bens, como se encontra no Digesto: "nuptiae sunt coniunctio maris et feminae consortium omnis vitae divini et humani iuris comunicatio."

Assim se deu o início da Igreja: na ascendência sobre o indivíduo, imiscuindo-se no seio de sua família, projetando uma nova moral, conseguindo firmar-se como aliada do poder e adquirindo, com isso, autoridade. A substituição dos deuses particulares, cultuados no seio das famílias, por um Deus único é, sem dúvida, uma grande conquista.

Na Idade Média, por influência do Cristianismo, as regras de sucessão agnatícia cedem lugar a novas regras pelas quais as mulheres passam a ter direitos hereditários mais amplos.

SÁLVIO DE FIGUEIREDO35 - Diferentemente do sistema romano, na época medieval as mulheres passam a ter certa autonomia em relação aos seus bens. Parte do dote é assegurado à mulher, em caso de viuvez, como uma espécie de pecúlio. E mais, se o casal não tivesse filhos, poder-se-ia garantir a aprovação e autorização da mulher para venda de bens que fizessem parte do dote. Pode-se afirmar que

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as mudanças das regras de casamento e do sistema dotal estão intimamente relacionados com o desenvolvimento do sistema feudal. Esta divisibilidade do patrimônio, introduzida pelas novas normas do regime dotal, sem dúvida, minaram a autoridade do marido; podendo levar a uma certa forma de endogamia, ou casamentos no seio do grupo, como esclarece CASEY: "Detectamos uma tendência semelhante à do Islão, no sentido de uma certa forma de endogamia, com a generalização do dote a partir do ano 1000. O pai cada vez mais quer confiar a sua filha a quem conhece e não a estranhos. Quer poder traçar a transmissão da propriedade que colocou na filha destinada à prole aos seus netos. Parece que o casamento no seio do grupo do parentesco se foi realmente tomando uma característica notória da sociedade do fim da Idade Média, à medida que aumentava a necessidade de conservar a propriedade."

Na família medieval pode-se observar uma tendência endogâmica, mas não no sentido restrito do parentesco consangüíneo e sim no sentido de comunidade, traduzida como um conceito de vizinhança - fundamentalmente territorial, a procura de recursos materiais, sob a forma de dote, passa a dominar a estratégia matrimonial. A estrutura da famIlia está ligada à posse da terra.

Considerando que o casamento tinha sérias implicações sobre a propriedade e a hierarquia social, tornou-se questão de vital importância a constituição do perfil do casamento, distinguindo-o do mero concubinato. Por isso a Igreja, também preocupada em espiritualizar e disciplinar as relações sexuais, passou a legislar e sacramentar o casamento. Por muito tempo, as decisões dos Concílios e decretos pontificiais constituíram a autoridade concernente ao matrimônio.

Até o surgimento das cidades e o fortalecimento do Estado, a família medieval se encontra dentro do sistema da comunidade senhorial, de solidariedade entre linhagens, de vínculos de vassalagem. A comunidade enquadra e limita as pessoas, configurando um meio familiar, como espaço territorial habitado e regulamentado (feudo).

As mudanças na vida material e espiritual, nas relações com o Estado, repercutem na família, uma vez que a mentalidade do indivíduo e de seu papel na sociedade se modificaram.

SÁLVIO DE FIGUEIREDO36 - Vê-se um novo papel do Estado, que, a partir do século XV não parou de se impor e interferir no espaço social antes entregue à comunidade. CASEY assim resume as transformações sofridas pela família na passagem da Idade Média para a Idade Moderna: "Provavelmente, o que estava a acontecer era uma nova forma de estruturar as relações sociais, na era do capitalismo nascente. As famílias abertas e os bandos de vassalos, consolidados pela entrega das mulheres para noivas, tornavam-se coisas do passado. O poder das grandes famílias passou a ter que ser reforçado por recursos materiais mais tangíveis, o que implicava repensar as estratégias matrimoniais. Nos países com uma burguesia mais desenvolvida do que a espanhola gerou-se uma prática mais freqüente do disparagement: os membros da aristocracia rebaixavam-se a aceitar as filhas de ricos mercadores ou banqueiros, pour redorer le blason ou pour fumer ses terres (para dourar o brasão ou para adubar as terras). Os historiadores do princípio da Idade Moderna conhecem tão bem estas práticas que, por vezes, as tomamos com demasiada facilidade por comprovadas. Mas um espanhol que escreveu sobre o casamento no fim do ANCIEN RÉGIME via nelas, com horror, a destruição de toda a hierarquia do feudalismo."

Pode-se dizer que tais transformações são oriundas de uma necessidade, emergente no fim da Idade Média e início da Idade Moderna, de equilibrar dois sistemas de estratificação social: um baseado na linhagem, outro na riqueza.

Na Idade Média a vida dos indivíduos dependia da solidariedade coletiva e de lideranças que assumem papel protetor. Tais vínculos de dependência provocavam uma confusão entre o público e o privado. O processo que, entre os séculos XVI e XVIII, estabeleceu novas formas de conceber e viver provocava a distinção entre o público e o privado (sediado na célula familiar), como afirma CHARTIER: "A família se toma a sede por excelência do privado. Por um lado, identifica-se com um espaço próprio, distinto: o da habitação doméstica. Por outro lado, a família concentra os afetos, capta a afetividade, une o indivíduo. Assim, a construção do Estado em suas formas modernas não só permitiu a delimitação, por diferença, do que doravante já não pertencia ao público, como ainda - e muito mais - ofereceu garantia e proteção ao privado então constituído e cada vez mais reconhecido no interior da vida da família."

A família, como cerne da sociedade civil, é responsável pela administração dos interesses privados.

SÁLVIO DE FIGUEIREDO37 - O casamento era uma prática inicialmente abraçada apenas pela elite,"não se podendo, contudo, negar sua importância no projeto colonizador do Estado e da Igreja, pois conferia status e segurança aos colonos.

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A organização familiar, nos primeiros séculos de colonização, foi influenciada por fatores que marcaram profundamente a formação da sociedade brasileira. A distância, que muitas vezes dividia famílias, entre os dois lados do Atlântico, a falta de mulheres brancas, a escravidão de negros e indígenas, a necessidade de constante expansão do território, a precariedade de recursos são apenas alguns dos fatores que conduziram a transformações e adaptações de costumes solidamente firmados no Reino, levando à formação de uma sociedade peculiar, com padrões próprios.

Em outros termos, é importante ressaltar que a formação da família brasileira não segue fielmente o modelo europeu e não comporta, tampouco, uma abordagem uniforme, como se, em toda nossa extensão territorial, houvesse uma única estrutura familiar.

5) EVOLUÇÃO DA FAMÍLIA

SÁLVIO DE FIGUEIREDO38 - Seja durante a Idade Média, seja no início dos tempos modernos, pode-se verificar um movimento de vida coletiva, independentemente de idade ou condições sociais, não deixando às pessoas o tempo da solidão, que permite a intimidade das famílias em si e dos indivíduos nelas inseridos. A família cumpria uma função - assegurava transmissão da vida, dos bens e dos nomes - mas não penetrava muito longe na sensibilidade. Os mitos como o do amor cortês (ou precioso) desprezavam o casamento, enquanto realidades como aprendizagem das crianças afrouxavam o laço afetivo entre pais e filhos".

A família moderna, mesmo envolvendo relação entre o sentimento de classe e entre os seus integrantes, passa cada vez mais a atender à necessidade de intimidade e identidade de seus membros, que se unem pelo sentimento, costume e gênero de vida. A qualificação social pelo nascimento e as condições de vida se mesclam, estabelecendo contrastes considerados naturais (ou deviam sê-lo). A busca da intimidade e do conforto acentua as desigualdades, repugnando a idéia de classes ou modelos dos quais não se pode afastar ou alterar. Embora continue a existir relação entre o sentimento de família e o de classe, a evolução dos costumes contemporâneos faz triunfar sobre o esforço de separar o homem em classes, a própria família, em posição destacada até mesmo pela ingerência normativa do Estado.

Para concluir sobre a família moderna, tendo em vista a sua evolução, cumpre reproduzir as palavras de PROST: “À primeira vista família é simples: ela perdeu suas funções públicas e passou a ter apenas funções privadas. Essa análise não está errada, mas é insuficiente. A família que agora se consagra exclusivamente a suas funções privadas já não é, de fato, exatamente a mesma que possuía funções públicas. A mudança de funções acarreta uma mudança de natureza: na verdade, a família deixa de ser uma instituição forte; sua privatização é uma "desinstitucionalização". Nossa sociedade se encaminha para famílias informais."

Esta tendência de "desinstitucionalização" da família indica maior aceitação social das relações extramatrimoniais promovendo seu reconhecimento pelo Estado.

Possível, então, delimitar tais relações e estabelecer os parâmetros da proteção jurídica. SÁLVIO DE FIGUEIREDO39 - A família contemporânea se expressa pela característica da

comunhão de vida, seja por meio do casamento, seja por meio da união de fato, seja pelos vínculos de parentesco, o que bem se compreende diante da inegável evolução da família, que hoje não se funda mais somente em tomo do casamento, dadas a intensificação do fenômeno do concubinato na esfera da proteção jurídica, do seu reconhecimento pela Carta de 1988 e sua elevação à categoria de entidade familiar (art. 226, § 3°), assim como da valorização do aspecto afetivo sobre o apenas formal.

A família passa a ser vista, pela legislação, como uma entidade mais ampla, que deve ser protegida pelo Estado, estendendo este sua influência a formas não tradicionalmente aceitas de organização familiar.

Poder-se-ia entender haver nisso uma tentativa de se ampliar o controle do Estado a aspectos da vida familiar, sobre os quais antes ele não influía, como em relação às uniões estáveis. Tal idéia, contudo, pode ser tão extremada quanto a antiga doutrina francesa, fundada na máxima de Bonaparte, segundo a qual, se os concubinos se esquecem ou passam à margem da lei, a lei se desinteressa deles.50

O alargamento da noção jurídica de família exige proteção e regulamentação dos efeitos da união estável. Mesmo no direito francês, embora não existindo previsão legal, a jurisprudência vem conferindo efeitos e conseqüências ao concubinato.

De acordo com essa interpretação, a lei procura aproximar-se mais da realidade social das famílias, adotando novos conceitos e modelos. Como afirma Francisco José Ferreira Muniz "as formas de vida familiar à margem dos quadros legais revelam não ser essencial o nexo família-matrimônio: a família não se funda necessariamente no casamento, o que significa que o casamento e família são para a

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Constituição realidades distintas. A Constituição apreende a família por seu aspecto social (família sociológica). E do ponto de vista sociológico inexiste um conceito unitário de família".

A Constituição passa a reconhecer, então, a multiplicidade de formas de famílias presentes na sociedade, ao afirmar que ela pode ou não ser fundada no casamento, pode ou não ser nuclear (como no caso das famílias monoparentais, por exemplo). Mesmo assim, expressa claramente que tais uniões devem ser incentivadas pela lei a se converterem em casamento. Aqui se encontra a idéia de que a família deve ser tutelada pelo Estado, atuando no sentido de proteger as organizações familiares. Agora, porém, partindo de uma noção ampliada de família.

As uniões estáveis ou extramatrimoniais, conquanto socialmente existentes em todos os tempos, são recentemente normatizadas, sobretudo a partir da Constituição de 1988, que as contempla como base de família. É facultado às pessoas escolherem um modelo de família.

A diversidade no tratamento jurídico de tais modelos começa no aspecto da sua própria forma de constituição.

ROLF MADALENO40 - Família larga ou estreita, de formatação variada, conforme os costumes, crenças, e ideologias de cada tempo. Qual a sua melhor e mais apropriada definição? Melhor expressa conceituá-la como família legítima ou legítima família ? Absorveu traços da família romana, carregou conotações da Revolução Industrial e galgou estágios de uma modernidade e de pós modernidade. Durante muito tempo família de respeito no Brasil era aquela formada sob os bons desígnios da lei, através do casamento civil e sempre quando possível, fazia gosto fosse acrescido da cerimônia religiosa, num entusiástico acontecimento envolvendo duas animadas famílias. Como legítima modelagem familiar desse extenso território pátrio, pelo menos, a última Carta da República espantou a trava cultural de a família ser legítima por ter sido construída pela união do casamento civil, como também divorciou-se da noção nociva de que família só poderia ser formada por pais que tivessem se recebido em justas núpcias, dela advindo a prole. Jogava para a marginalidade a família natural, largamente difundida e sem levar em linha mínima de consideração, ignorava solenemente a gritante realidade da família monoparental.

Vive-se uma nova configuração familiar, de diferentes matizes, todos sob o manto protetor da atual Constituição da República a lhes atestar a devida maioridade civil, tão necessária para computar créditos que lhe autorizem empreender jornada que caminhe para o seu livre desenvolvimento moral, social e jurídico.

Embora siga a família sendo um tema de dois, já não é tratada como matéria prioritária de duas famílias, mas sim, interesse de duas pessoas - o homem e a mulher - e que necessariamente não precisam ser marido e esposa, podendo a união ser configurada pelo concubino e sua concubina.

É a cartilha da pluralidade familiar dessacralizando a família matrimonial, para, desse modo, ampliar e dignificar realidades que, embora sedimentadas por gêneses diversas, retratam a mesma consistência de nítida e sólida comunidade familiar. A referência legal não mais se limita à eleição única do matrimônio como instrumento legítimo de constituição familiar, como a propósito pode ser conferido na exposição de FOSAR BELLOCH, citado por REINA E MARTINELL, ao delinear que: “ os traços do matrimônio, desde o ponto de vista constitucional, não está magnificado, nem convertido em coisa sacra, diante de cujo altar tenham que ser oferecidos sacrifícios humanos desta instituição. Qualquer intento de considerar mais vantajosa a união conjugal viola a igualdade dos não casados ante os casados e perante a lei.”

ROLF MADALENO41 - Estamos frente a uma época de grandes mutações familiares que requerem categorias conceptuais expressas em novos termos, ausentes no nosso linguajar. São realidades complexas, para as quais não são suficientes os vocábulos atuais. Vivemos uma cadeia complexa e dinâmica de transações familiares. Estas trajetórias familiares variam segundo a idade, o sexo e a condição social de seus protagonistas, e ao lado dos núcleos familiares baseados na convivência, agregam-se outras formas de intimidade e de coabitação onde a relação de casal descansa essencialmente no nexo afetivo.

Hoje em dia estas famílias recebem designações distintas, como família reconstituída, família recomposta, segunda família, como um remedo das chamadas segundas núpcias. Contudo, o que importa ter presente é que esta nova família, de modo algum significa um retorno, uma reparação, ou uma revisão da família anterior, senão que se trata de uma família com a sua própria identidade.

Dentre estes novos modelos, encontrar famílias formadas pela união fática de um casal, onde um ou ambos os integrantes têm filhos provenientes de um casamento ou relação precedente.

Nestes arranjos o marido da mãe recebe o nome de padrasto, e a esposa do pai, o de madrasta. Os filhos são denominados de enteados, e se cria neste entorno familiar um parentesco por

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mera afinidade. Convém ter presente que por força cultural, sempre se tem em mente que padrastos e madrastas só são concebidos quando originários do falecimento de um dos cônjuges, ignorando que esta designação também abarca o vínculo que se cria entre um cônjuge e os filhos do outro, por causa do divórcio. E o que diz o artigo 1.595 do CC de 2002, ao estabelecer que cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo vínculo de afinidade e, de acordo com o seu § 1°, o parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou companheiro.

GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA42 - Diante do surgimento do Cristianismo, a Igreja Católica passou a tratar de alguns temas com o estabelecimento de normas, denominadas cânones, para diferenciá-las das leis que provinham do Estado e, no decorrer do tempo, um dos assuntos mais freqüentemente cuidados através dos cânones, passou a ser a família e, em especial, o matrimônio. Importante observar que, originariamente, não havia qualquer proibição à constituição de famílias fora do casamento, apesar deste ser considerado um sacramento, tal como o batismo, a comunhão e outros. O matrimônio era considerado a graça necessária que o homem recebia de Deus para se afastar da concupiscência, conservando-se dentro do amor cristão. Nesse contexto, o homem deixa sua família original, unindo-se à esposa, quando serão dois em uma só carne; portanto, aquilo que Deus uniu o homem não separa, ou seja, o sacramento da indissolubilidade do vínculo matrimonial. Assim, para o direito canônico, somente era importante o elemento subjetivo - consensus - no momento inicial do casamento, sendo irrelevante a sua continuidade, ao passo que o elemento objetivo passou a ser a cópula entre o casal. Não houve adoção de medidas contrárias aos companheiros, a não ser em época posterior, quando o poder material da Igreja Católica começou a sofrer abalo.

Durante a Idade Média, houve grande influência do Direito bárbaro em matéria de casamento, já que nos agrupamentos germânicos primitivos a celebração do casamento era feita perante a reunião de homens livres, para, posteriormente, ocorrer perante juízes e, finalmente, somente na presença de um juiz, na condição de representante da comunidade. Há desenvolvimento, por influência eclesiástica, da teoria dos impedimentos matrimoniais, e a adoção de procedimentos, tal como a sindicância prévia, para evitar a constituição de uniões viciadas. Alguns acontecimentos históricos, como o movimento cultural renascentista e, em especial, as Reformas Religiosas passaram a negar a natureza sacramental e eclesiástica do casamento, abrindo horizontes para o reconhecimento, e posterior aceitação, do casamento civil, transferindo para o Estado a regulamentação e o controle das uniões de pessoas através do casamento.

EDUARDO DE OLIVEIRA LEITE aponta o movimento religioso da Reforma luterana e, imediatamente, a Revolução Francesa, como sendo os acontecimentos que tiveram papel marcante ao casamento civil, tal como ele é concebido nas codificações, transferindo as questões relativas ao controle das uniões entre pessoas não-parentes para a competência do Estado: "À doutrina científica coube separar o casamento da religião, mostrando o caráter temporal da instituição, que os Estados acabaram por adotar, chamando a si a regulamentação e inserindo-a nas codificações realizadas a partir do séc. XIX, como elemento cardeal na edificação do Direito de Família. Assim, com a interferência do Estado no tratamento normativo da organização familiar, a família jurídica somente poderia apresentar sua conformação com a lei, por meio dos elementos predominantemente legais, geralmente voltados aos valores patrimoniais. O CODE CIVIL, de 1804, atribuiu os contornos da estrutura familiar legal, de índole hierarquizada, patriarcal, centralizadora na pessoa do seu chefe, excluindo de legitimidade qualquer outra espécie de união.

Diante das fontes históricas do Direito brasileiro e levando em conta a marcante influência do CODE CIVIL no movimento das codificações, inclusive na formulação do Código Civil brasileiro, podem-se apontar os seguintes e mais importantes princípios como sendo prevalentes no Direito de Família brasileiro durante quase todo o período de um século (1890 a 1988): a) o da qualificação como legítima apenas à família fundada no casamento, em obediência ao modelo civilista imposto; b) o da discriminação dos filhos, com desconsideração de qualquer filho espúrio da estrutura familiar; c) o da hierarquização e patriarcalismo na direção da família; d) o da preservação da paz familiar, ainda que em detrimento dos seus integrantes; e) o da indissolubilidade do vínculo matrimonial; f) o da imoralidade do "concubinato" .

GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA43 - Como acentua GUSTAVO TEPEDINO, o conceito de família é relativo, altera-se continuamente, renovando-se como ponto de referência do indivíduo na sociedade e, assim, qualquer análise não pode prescindir de enfocar o momento histórico e o sistema normativo em vigor. A família, antes de mais nada, é uma realidade, um fato natural, uma criação da natureza, não sendo resultante de uma ficção criada pelo homem. Daí o comentário lapidar de Virgílio de SÁ PEREIRA: "Agora, dizei-me: que é que vedes quando vedes um homem e uma mulher, reunidos sob o mesmo teto, em torno de um pequenino ser, que é o fruto de seu amor? Vereis uma família. Passou por

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lá o juiz, com a sua lei, ou o padre, com o seu sacramento? Que importa isto? O acidente convencional não tem força para apagar o fato natural.”

O termo "família" é objeto de referência expressa em diversas passagens da normativa legal brasileira, não apenas no âmbito da legislação civil. Muitas vezes, a sua significação não é a mesma, razão pela qual deve-se sempre buscar o seu verdadeiro alcance mediante o trabalho hermenêutico. Tal circunstância não é exclusiva do Direito brasileiro, conforme se verifica nos escritos de CARBONNIER e BELLUSCIO, respectivamente, nos Direitos francês e argentino.

Algumas classificações doutrinárias, como a família em sentido amplo, a família em sentido estrito – pequena família, na Argentina-, família nuclear, atualmente não possuem mais a importância d'outrora, diante do contexto valorativo que deve ser feito através da interpretação da norma. Outras, como família legítima, família ilegítima, família adotiva, por exemplo, perderam seu fundamento constitucional de validade no Direito brasileiro, pois fundamentalmente levavam em consideração a qualificação dos filhos, para efeito de distingui-los no tocante à atribuição de direitos ou não.

De acordo com RODRIGO DA CUNHA PEREIRA, a família é uma estruturação psíquica onde cada integrante possui um lugar definido, independente de qualquer vínculo biológico: "Assim, a partir do momento em que considerarmos a família como estrutura, veremos que a sua importância está antes e acima das normas que determinam sobre as formalidades de um casamento, por exemplo “. Com efeito, é fato o alvorecer dos novos tempos, em matéria de família jurídica. Ao modelo da família formal, tutelada pelo Direito em todo o mundo, acrescenta-se a concepção jurídica remodelada de uma nova família, célula essencial da civilização humana, com maior ênfase nas pessoas dos familiares do que na instituição familiar. Há, indubitavelmente, uma função primordial e permanente da nova família: a de viabilizar a constituição e o desenvolvimento das melhores potencialidades humanas; a de atuar em prol do aperfeiçoamento das instituições sociais com aspecto marcadamente funcional e instrumental. E, dentro de tal contexto, a família contemporânea deve ser fundamentar em valores e princípios diversos daqueles que alicerçaram o modelo tradicional e oitocentista da família matrimonial, sendo o casamento antigamente encarado como espaço público único para a formação de uma família, como instituição que garantia a ordeira transmissão de bens.

O saudoso ORLANDO GOMES, mesmo no período anterior à Constituição de 1988, anunciava a chegada de um novo renascer do organismo familiar para o Direito, esclarecendo que a proteção estatal à família não poderia mais se resumir às famílias fundadas no casamento, mas deveria estender-se também às famílias constituídas sem o ato solene e formal do casamento: "... o interesse do Estado em que se legalizem as uniões sexuais se desenvolve juridicamente no sentido da certeza que oferecem quanto às relações que originam". No início da década de oitenta, e com o mesmo sentido, JOÃO BAPTISTA VILLELA observava que é impossível apontar o modelo ideal de família: "Tantas são as variáveis culturais, éticas, políticas, econômicas e religiosas que a pressionam e modelam, mas sobretudo tantas são as imponderáveis aspirações e inspirações do homem na situação de família que nenhum modelo cerrado atenderia a umas e a outras. Só a família fundada na aptidão para responder aos mistérios de amor e comunicação que habita cada ser humano o pode livrar do vazio e da solidão. O modelo há de ser, por conseguinte, aberto...".

As famílias devem espelhar a própria formação democrática do convívio em sociedade, sob o prisma político-ideológico, fundando-se em valores existenciais e psíquicos, próprios do ser humano, como os sentimentos de solidariedade, afeto, respeito, compreensão, carinho e aceitação, que afastam os valores autoritários, materialistas, patrimonialistas e individualistas que nortearam a família matrimonial. Qualquer abordagem contemporânea em matéria de família jurídica deve levar em conta tal mudança de eixo. Assim, as transformações jurídicas exigem a funcionalização de qualquer aspecto patrimonial nas relações familiares ao atendimento das necessidades existenciais dos integrantes da família, voltadas aos valores e princípios encampados pelo documento constitucional de 1988 que, nessa matéria, merece acentuado destaque.

SÉRGIO SÉRVULO DA CUNHA 44- MALINOWSKI mostra que a formação da família depende da estrutura e da cultura de uma sociedade (Sexo e Repressão da Sociedade Selvagem). T. PARSONS, por sua vez, diz que os norte-americanos, empenhando-se num particular tipo de sociedade, empenham-se automaticamente no tipo de família apropriado. e devem dedicar-se a fazê-lo funcionar da melhor maneira possível, pois não há outro caminho a seguir ("A estrutura social da família", in A Família, Sua Função e Destino, p. 299). Em Raízes do Brasil, p. 101, SÉRGIO BUARQUE DE HOLANDA assinala que "o Estado não é uma ampliação do círculo familiar, e ainda menos uma integração de certos agrupamentos, de certas vontades particularistas. de que a família é o melhor exemplo. Não existe, entre o círculo familiar e o Estado. uma gradação, mas antes uma descontinuidade e até uma oposição. A indistinção fundamental entre as duas formas é prejuízo romântico que teve os seus adeptos mais entusiastas

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durante o século XIX. De acordo com esses doutrinadores, o Estado e suas instituições descenderiam em linha reta, e por simples evolução, da família. A verdade, bem outra, é que pertencem a ordens diferentes em essência. Só pela transgressão da ordem doméstica familiar é que nasce o Estado e que o simples indivíduo se faz cidadão, contribuinte, eleitor, elegível, recrutável e responsável, ante as leis da cidade".

O modelo institucional filtra-se em algumas regras conscientes, e, entre essas, várias regras que são de natureza jurídica. Apesar de serem regras jurídicas estatais e, portanto, de conhecimento público, os agentes da união conjugal só sentem a sua força constritiva quando, abandonados aos impulsos individuais, tentam reagir às situações nascidas do casamento, segundo os mesmos padrões adotados ao buscá-lo: os padrões individuais instintivos, intuitivos, ou utilitários. Nesse momento, os laços jurídicos apertam-se como tenazes, e o indivíduo sente-se vítima da instituição.

Entre as demais regras que estruturam a família, devemos distinguir quais são externas e quais são internas, e, entre estas, quais são de natureza jurídica.

Aquilo que é comum a todas as famílias, embora não seja imposto pelo Direito estatal, pode-se dizer que lhes é externo. A faixa de variação nos poderá indicar o que é interno.

Mencionemos algumas regras externas não jurídicas: a que diz respeito à constituição, com o casamento, de um grupo familiar autônomo; a que diz respeito à diferença de idade entre marido e mulher; a relativa à idade núbil (não se confunda com capacidade núbil); a relativa à composição do sobrenome; as que regulam o parentesco; as que modelam a família como grupo primário.

SÉRGIO SÉRVULO DA CUNHA 45- A diferença de idade entre marido e mulher também obedece a regras que variam com o tempo. Nas sociedades patriarcal e gerontocrática era maior do que atualmente, sendo o noivo, geralmente, bem mais velho que a noiva.

São regras costumeiras as que, entre nós, fazem compor o sobrenome com o apelido do avô materno (parte final do sobrenome da mãe) precedendo ao apelido do avô paterno (,parte final do sobrenome do pai). Essas regras, embora geralmente observadas, podem ser infringidas sem que haja qualquer sanção mesmo difusa. Trata-se de regras costumeiras.

Não se perca a importância dos nomes de família como símbolo de status. As expressões pater familias e filius familias são designativas de status, e passaram mesmo para a nossa linguagem usual, ou vulgar, com esse sentido. A pensão diz-se familiar, e a mulher de má vida designa como família a moça direita.

PONTES DE MIRANDA lembra que "enquanto não apareceu a propriedade individual, o conceito de sucessão a causa de morte não podia corresponder ao dos tempos de hoje. Os filhos já eram titulares do direito em comum. Telêmaco, ao falar dos bens de Ulisses, dizia que eram bens "seus", bens próprios (Odisséia, XVI, 128). Está em PLUTARCO (LICURGO, 16) o que se passava no Direito espartiata.

HELDER MARTINEZ DAL COL46 - A família existe desde tempos imemoriais, constituída sob as mais variadas formas, segundo os costumes de cada povo e influenciada pelos valores sócio-culturais, políticos e religiosos de cada época.

Em algumas sociedades não-ocidentais os parceiros conjugais são escolhidos pelos pais, só vindo a conhecer-se no momento da celebração das núpcias. No Egito antigo, como exceção à regra universalizada que veda o casamento entre membros da mesma família, o casamento entre irmãos era admitido, para assegurar a manutenção da pureza do sangue da família do Faraó.

Na China tradicional, ao contrário, a proibição do casamento no meio familiar estende-se a vários graus de parentesco.

Algumas culturas, como a brasileira e praticamente todo o resto do ocidente, só aceitam um casamento (monogamia); outras, permitem vários casamentos concomitantes (poligamia). No Islã, os muçulmanos têm o direito de possuir até quatro esposas ao mesmo tempo. Trata-se da forma de poligamia conhecida como poliginia, onde há duas ou mais mulheres.

Também ocorrem hipóteses de poliandria (uma mulher com dois ou mais maridos), situação bastante comum nas fronteiras entre o Tibet e o Nepal. Em Mustang, uma dessas localidades, a terra fértil é muito escassa e se os homens de uma mesma família se casarem com mulheres diferentes, terão que dividir a propriedade, que se tornará insuficiente para o sustento de todos. A solução comumente aceita e institucionalizada é casarem-se dois ou mais irmãos com uma mesma mulher. Compartilham-se a terra e a esposa, que passa um certo número de noites com cada um dos maridos, convivendo o grupo familiar em perfeita harmonia. Não se sabe quem é o pai das crianças. Portanto, o irmão mais velho é chamado de pai e o mais novo de tio.

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Em Roma, as pessoas componentes da família encontravam-se sob o patria potestas do ascendente masculino mais velho. Assim, se um casal só tivesse filhas mulheres adultas e um menino, de qualquer idade, este seria o pater famílias, caso o pai viesse a faltar.

Não havia correlação direta com a consangüinidade. O pater familias tinha poder sobre todos os descendentes não emancipados e sobre as mulheres casadas com manus com os descendentes.

Havia em Roma dois tipos de parentesco. A agnação, consistente no vínculo entre pessoas sujeitas ao mesmo pater, mesmo que não fossem consangüíneos e a cognação, que era o parentesco sangüíneo sem sujeição ao mesmo pater.

Narrando a vida dos cidadãos na Roma antiga, FUSTEL DE COULANGES explica que o casamento fazia parte do contexto religioso da família. Cada grupo familiar possuía sua própria religião, suas próprias orações e formulações, em torno do fogo doméstico e dos antepassados.

Mas o casamento tinha um caráter de certo modo traumático. A jovem esposa, criada sob a religião paterna, adorava o fogo doméstico e participava de todas as celebrações diárias. Ao casar-se, renunciava ao fogo doméstico da casa paterna para aderir ao fogo doméstico da casa do marido. Era como se mudasse de família, passando a ser como que uma filha de seu marido, sob orientação religiosa deste. Para o marido, o ato de casar também tinha a sua gravidade, pois importava em aproximar do fogo doméstico uma pessoa estranha e com ela celebrar as cerimônias misteriosas do seu culto, revelando-lhe os ritos e as fórmulas que eram patrimônio exclusivo de sua família.

A jovem era conduzida à casa do esposo e após se lhe apresentar o fogo e a água, que simbolizavam o emblema da divindade doméstica e também a água lustral, para uso nos atos religiosos, o marido deveria tomá-la nos braços, simulando o rapto, e carregá-la através da soleira da porta, sem que os pés da moça a tocassem. Depois a conduzia até o fogo doméstico e juntos comiam um bolo de farinha-flor, na presença e sob os olhos das divindades domésticas. A partir daí estavam casados e a mulher passava a ter os mesmos deuses, as mesmas orações e as mesmas festas do marido.

Além da simulação do rapto (na confarreatio), também era conhecido o casamento pela simulação da compra da mulher pelo marido (coemptio) e aquele que decorria do transcurso de um ano de coabitação, sem interrupção pela ausência do lar conjugal por três noites seguidas (usus).

Na antiguidade, em quase todos os povos, a união se dava geralmente por uma cerimônia de cunho religioso, celebrada pelo pater e sem qualquer participação do Estado. Aos olhos da sociedade, esta união de um homem e uma mulher atendia aos imperativos culturais e a família era reconhecida como tal.

HELDER MARTINEZ DAL COL47 - ÁLVARO VILLAÇA AZEVEDO, em palestra proferida na 16ª Reunião do Fórum Permanente sobre o Direito de Família, realizada em 31/05/1999, teve suas observações registradas em ata, nos seguintes termos:

O casamento de fato existiu no Direito Romano. Em 450 a.C., já dizia-se que havendo posse continuada entre homem e mulher, esta passava, após um ano de convivência ininterrupta, a fazer parte da família de seu marido, sob o poder protetivo deste ou do pai deste, conforme fosse um ou outro o pater familias. O casamento era um fato, apesar das teorias contrárias. O elemento da coabitação romana era a coabitação física. Quando o marido ficava separado mais de 5 anos da mulher, sem que esta soubesse de seu paradeiro, havia o divórcio bona gratia, que era automático. (...) No Direito Romano, como visto, nunca houve necessidade de celebração para haver o matrimônio; nas Ordenações nós encontramos três tipos de união matrimonial: o casamento religioso católico, o casamento de fato (usus romano), e o casamento por escritura, que não era casamento civil, mas realizado por documento ad probationem tantum. Estes institutos têm quase 4.000 anos e foram torpedeados pelo nosso legislativo, no Decreto 181 de 1890. Com este decreto secularizou-se o casamento, passando a existir, somente, o casamento civil, reconhecido pelo Estado. Na Constituição de 1967, mesmo depois da emenda de 1969, o artigo 175 dizia que a família era constituída pelo casamento, certamente civil, tendo a proteção do Poder Público. Um texto constitucional não pode cometer esta discriminação, dizendo como um povo deva constituir sua família. Não pode fechar os olhos à realidade. O projeto de lei de 1988, antes da edição da Constituição, teve o intuito de acabar com essa discriminação. A par da Constituição de 1967, a jurisprudência tentou equilibrar a situação dando direitos à concubina. Até hoje existem decisões tentando ajudá-la, como: participante de relações domésticas, prestadora de serviços do lar etc. A lei de Previdência Social equipara a concubina no concubinato adulterino à esposa, com o mesmo direito desta à pensão. O STF criou a súmula 380, que diferiu o concubinato da sociedade de fato. Além da convivência era necessária a aquisição de patrimônio comum, com esforço de natureza econômica, o que era muito difícil provar. Surgiu a LEI NELSON CARNEIRO, em 1994, e a lei de 1996, que é uma síntese do projeto originário do palestrante.

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Com esse breve passeio pela história, percebe-se que houve uma grande transformação no conceito de família em todo o mundo, até chegarmos à Família contemporânea, especialmente aquela que se encontra disciplinada nos moldes do Direito Brasileiro, com uma amplitude nunca antes reconhecida pela lei.

Com o disciplinamento da "União Estável", como forma de constituição familiar, nosso ordenamento abriu ensejo a uma nova era de direitos da personalidade, reafirmando a dignidade da pessoa humana como valor fonte. Tudo passa a convergir para a pessoa, que é a razão de ser do próprio Direito.

MARIA BERENICE DIAS48- Cada vez mais a idéia de família se afasta da estrutura do casamento. A possibilidade do divórcio e o estabelecimento de novas formas de convívio revolucionaram o conceito sacralizado de matrimônio. A existência de outras entidades familiares e a faculdade de reconhecer filhos havidos fora do casamento operaram verdadeira transformação na própria família. Assim, na busca do conceito de entidade familiar, é necessário ter uma visão pluralista, que albergue os mais diversos arranjos vivenciais. É preciso achar o elemento que autorize reconhecer a origem do relacionamento das pessoas. O grande desafio dos dias de hoje é descobrir o toque diferenciador das estruturas interpessoais que permita inseri-las em um conceito mais amplo de família.

Esse ponto de identificação é encontrado no vínculo afetivo. É o envolvimento emocional que leva a subtrair um relacionamento do âmbito do direito obrigacional – cujo núcleo é a vontade – para introduzi-lo no direito das famílias, cujo elemento estruturante é o sentimento de amor, o ele afetivo que funde as almas e confunde os patrimônios, fazendo gerar responsabilidades e comprometimentos mútuos.

A evolução dos direitos de família segue a trajetória da própria família. A tentativa de manter a estrutura da sociedade pela sacralização do vínculo matrimonial levou ao engessamento do afeto em um casamento indissolúvel. O modelo hierarquizado, conservador e patriarcal foi desastroso e sofreu severo golpe quando as uniões extramatrimoniais passaram a desempenhar significativo papel social, o que ensejou o rompimento de alguns paradigmas.

Emerge agora novo conceito de família, que tem como elemento identificador a afetividade. O alargamento do conceito de família para além do casamento acabou permitindo o reconhecimento de outras entidades familiares. Assim, também as uniões de pessoas do mesmo sexo, as chamadas uniões homoafetivas, passo a passo, buscaram inserção no âmbito do Direito das Famílias.

Todavia, ninguém duvida do compromisso ético da família na formação do cidadão. Não é mais possível confundir moralismo com família. Muito menos, pode-se admitir que a justiça, em nome da preservação da moral, chegue a resultados totalmente afastados da ética, referendando posturas maliciosas e chancelando o enriquecimento injustificado.

MARIA BERENICE DIAS49 - Ainda que as normas éticas e morais variem no tempo e no espaço, são elas que dão substrato ao direito, emprestam conteúdo de validade à legislação. Assim, o direito não pode afastar-se da ética, sob pena de perder efetividade.

A ideologia da família patriarcal converteu-se em ideologia do Estado, levando-o a invadir a liberdade individual, para impor condições que constrangem as relações de afeto. Elege um modelo de família e o consagra como única forma aceitável de convívio. A lei, através de comandos intimidatórios e punitivos, busca estabelecer paradigmas comportamentais por meio de normas cogentes e imperativas, na esperança de gerar comportamentos alinhados com o padrão moral majoritário. Na tentativa de desestimular atitudes que se afastem do parâmetro reconhecido como aceitável, nega-se juridicidade a quem afronta o normatizado. Mas com essa postura negam-se não só direitos – nega-se a existência de fatos. Tudo que surgem à margem do modelo posto como correto não merece regulamentação. A desobediência é condenada à invisibilidade. O transgressor é punido com a negativo de inserção no âmbito do sistema jurídico. Só que situações reais não desaparecem simplesmente porque o legislador não as regulamenta, e a única conseqüência é a exclusão de direitos.

Em nome da moral e dos bons costumes, a história do direito das famílias é uma história de exclusões, e, como diz RODRIGO DA CUNHA PEREIRA, em nome dessa moral, muita injustiça já se fez.

MARIA BERENICE DIAS50 - A família assim tutelada pelo Estado sempre teve um perfil patriarcal, sendo uma relação hierarquizada, patrimonializada, verticalizada e, é claro, heterossexual. O homem era o chefe da sociedade conjugal, o cabeça do casal, o administrador dos bens da família. Tudo isso assegurava a supremacia masculina, o que acabava chancelando a violência doméstica.

Outro efeito perverso da necessidade de mantença da família era tanto a vedação do reconhecimento dos filhos ilegítimos como a negativa de direitos às uniões extramatrimoniais.

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Também a imposição da fidelidade – diga-se, a bem da verdade, imposição feita só às mulheres – é que gera a presunção de paternidade, com a só finalidade de garantir os aspectos patrimoniais do casamento. Se todos os filhos de uma mulher são filhos do marido, fica assegurada a mantença da titularidade do patrimônio ao núcleo familiar.

Mas o modelo patriarcal da família vem sofrendo duros golpes. Primeiro, foi o movimento feminista. As mulheres passaram de objeto de prazer a sujeitas de desejo. Deixaram de ser reféns da gravidez e conquistaram a liberdade sexual. Caiu o mito da virgindade, e elas adquiriram o direito de escolher seus parceiros, de sair do casamento, de constituir uniões sem o selo da oficialidade.

Tal levou a Constituição Federal a emprestar juridicidade ao afeto. Ao ser reconhecida como família a união estável, ou seja, a união entre duas pessoas constituídas pelo laço da afetividade, houve o alargamento conceitual do que é família. Deixou de ser casamento, sexo e reprodução para ser identificada como o fruto de um elo de afetividade.

Igualmente o movimento homossexual levou à quebra do paradigma da união sacralizada com fins procriativos. Não mais cabe a naturalização da heterossexualidade. Afinal, o que não é fruto de uma escolha não pode ser considerado um fracasso.

MARIA BERENICE DIAS51 - A secularização ou laicização da sociedade - assim entendido o afastamento do Estado em relação à Igreja - revolucionou os costumes e, especialmente, os que regiam a família. A dessacralização do casamento provocou profundas mudanças no conceito de família. Sobreveio o pluralismo de entidades familiares, as quais se desajustaram do ordenamento vigente, escapando às normações existentes.

Reagindo à evolução histórica, o legislador arvora-se o papel de guardião dos bons costumes. Busca a preservação de uma moral conservadora. Cada vez mais se refugia nos preconceitos. É o grande ditador, que edita como as pessoas devem proceder, impondo pautas de conduta afinadas com a moralidade vigente. Limita-se a regulamentar institutos socialmente aceitáveis. Qualquer ação diversa do parâmetro estabelecido é tida por inexistente.

A técnica legislativa sempre aspirou a estabelecer paradigmas comportamentais por meio de normas cogentes e imperativas. Elege um modelo de família e o consagra como única forma aceitável de convívio. A postura é intimidadora e punitiva, na esperança de gerar comportamentos alinhados com os comandos legais. Na tentativa de desestimular atitudes que se afastem do parâmetro comportamental reconhecido como aceitável, a lei nega juridicidade ao que se afasta do normatizado.

Mas negam-se não só direitos. Nega-se a existência de fatos. Situações e posturas que são reais, costuma-se dizer que simplesmente não ocorreram. Tudo que surge à margem do modelo posto como correto não merece regulamentação. A desobediência é condenada à invisibilidade. O transgressor é punido com a negativa de inserção no âmbito do sistema jurídico.

Os exemplos são vários. Basta lembrar a vedação de reconhecimento dos filhos “espúrios”, a indissolubilidade do casamento, a rejeição às uniões extramatrimoniais.

A negativa de reconhecer os filhos havidos fora do casamento possuía nítida finalidade sancionatória, visando a impedir a procriação fora dos “sagrados laços do matrimônio”. Igualmente afirmar a lei que o casamento era indissolúvel servia como verdadeira advertência aos cônjuges de que não se separassem. Também negar a existência de vínculos afetivos extramatrimoniais não almejava outro propósito senão o de inibir o surgimento de novas uniões. O desquite - estranha figura que rompia, mas não dissolvia o casamento - tentava manter a todos no seio das famílias originalmente constituídas. Desatendida a recomendação legal, mesmo assim era proibida a formação de outra família.

Essa rigidez normativa possui um efeito perverso. Além de não alcançar o desiderato pretendido, não consegue impedir que as pessoas conduzam sua vida da forma que melhor lhes agrade. A exclusiva regulamentação dos comportamentos reconhecidos como aceitáveis deixa à margem da jurisdição tudo que não é cópia do modelo ditado como único. Olvida-se o legislador de que negar a existência de fatos existentes, deixando de atribuir-lhes efeitos, acaba fomentando irresponsabilidades. A punição não possui qualquer conteúdo repressivo, pois se transforma em fonte de privilégios indevidos. A lei acaba sendo conivente com o infrator.

Voltando aos exemplos. Negar a existência de prole ilegítima, como fazia o Código Civil anterior, em sua versão original, simplesmente beneficiava o genitor e prejudicava o filho. Ainda que tenha sido o pai quem infringiu o dever de fidelidade e cometeu o delito de adultério, o filho era o grande perdedor. Singelamente a lei fazia de conta que ele não existia. Era punido pela postura do pai, que se safava dos ônus do pátrio poder. Negar reconhecimento ao filho é excluir-lhe direitos, punir quem não tem culpa, brindar quem infringiu os ditames legais.

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Antes do divórcio, a indissolubilidade do casamento não possuía outro efeito senão o de vedar a possibilidade de constituição de outra família. A lei, ao preservar intacto o vínculo matrimonial, ainda quando já desfeito o vínculo afetivo, negava a realidade da vida. Manter o casamento após o desquite era uma ficção com o único objetivo de tentar impedir a constituição de novas uniões. O legislador, assumindo o papel de paladino da justiça, da moral e dos bons costumes, simplesmente recusava qualquer direito a quem ousasse constituir relacionamentos extramatrimoniais.

O silêncio da lei, no entanto, não foi suficiente para arrefecer a velha mania do ser humano de buscar a felicidade. Os egressos de relações findas enlaçavam-se em novas uniões. Mesmo sem nome, mesmo sem lei, as pessoas uniam-se e acabavam batendo às portas do Judiciário para resolver eventuais conflitos. Tímida e preconceituosa, a Justiça encontrou uma saída que gerou enorme distorção: ver em tais relacionamentos uma sociedade de fato, expurgando-os do âmbito do Direito de Família. Simulando que a origem não era uma aproximação da ordem da afetividade, o chamado concubinato ou união livre era definido como mera associação lucrativa. Obviamente, um absurdo. O magistrado arvorando-se qualidades mágicas, buscou transformar uma sociedade de afeto em uma sociedade de fato. Tentando engessar um vínculo familiar no Direito das Obrigações, impunha as regras do Direito Societário destinadas às sociedades irregulares.

Ainda que haja a Constituição Federal posto fim a essa verdadeira alquimia, enlaçando as relações afetivas no conceito de entidade familiar, não perdeu a Justiça o hábito de fingir que não vê situações que estão diante de seus olhos.

Cabe trazer novos exemplos. É enorme a dificuldade de visualizar como entidade familiar as relações de pessoas do mesmo sexo. Contudo, não há por que duvidar – senão por puro preconceito – de que as uniões chamadas de homoafetivas têm origem em um elo de afetividade. Mas a jurisprudência, infelizmente ainda majoritária, insiste em rotulá-las como sociedades de fato. Nega o seu conteúdo afetivo e não as insere no âmbito do Direito de Família.

Igualmente os relacionamentos simultâneos recebem denominações pejorativas e, com o nome de concubinagem, concubinato adulterino, impuro ou de má-fé, são condenados à invisibilidade. Simplesmente a tendência é não reconhecer sequer sua existência. A depender do conhecimento da duplicidade de vidas do par, tais vínculos são alocados no Direito Obrigacional e lá tratados como sociedades de fato. Assim, infringir o princípio da monogamia assegura privilégios. A mantença de duplo relacionamento gera a irresponsabilidade de quem foi infiel. Uniões que persistem por toda uma existência, muitas vezes com extensa prole e reconhecimento social, são simplesmente expulsas da tutela jurídica. Com isso, pune-se geralmente a mulher, que resta sem nada, a não ser a pecha de “traidora”, embora também haja sido traída pelo companheiro. A essa “amante” somente se reconhecem direitos se ela alegar que desconhecia a infidelidade do companheiro. Para ser amparada pelo Direito precisa valer-se da mentira, pois, se ela confessa que desconfiava ou sabia da traição, recebe da Justiça um solene: bem feito! É condenada por cumplicidade, punida como co-autora do crime de adultério, enquanto o autor do delito é absolvido. O varão, por manter relacionamento concomitante com outra pessoa, sai premiado. Quem foi infiel e desleal permanece com a titularidade patrimonial, além de ser desonerado da obrigação de sustento de quem lhe dedicou a vida, mesmo sabendo da desonestidade do parceiro. Paradoxalmente, se o parceiro foi fiel e leal a uma única mulher, é reconhecida a união estável com os ônus de divisão de bens e de obrigação alimentar. A conclusão é uma só: a Justiça está favorecendo e incentivando a infidelidade e o adultério!

Quem não acompanha a evolução social, jurídica e científica do seu tempo conduzir-se-á em desarmonia com as necessidades das partes envolvidas no litígio, comprometendo sobremaneira a efetividade da prestação jurisdicional, causando um desserviço à sociedade.

As questões de direito das famílias estão sempre em torno do eterno desafio que é a essência da vida: dar e receber amor. Quem bate às portas do Judiciário chega fragilizado, cheio de mágoas, incertezas, medos. Precisa ser recebido por um juiz consciente de que deve ser muito mais um pacificador, um apaziguador de almas e, principalmente, despido de qualquer atitude moralista ou crítica. Em matéria de família, mais do que a letra fria ou o rigorismo do texto legal, a norma que deve ser invocada é a de que apela à sensibilidade jurídica (LICC, 5º): “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.”

LUCIANO LOPES PASSARELLI52 - A Constituição dá um sentido amplo para a família. A família pode ser formada pelo casamento com ou sem filhos, pela união estável com ou sem filhos, pelas sociedades monoparentais – quando somente um dos pais convive com os filhos. Larga parcela da doutrina e da jurisprudência, não sem muitas críticas e resistências, afirma que as uniões homoafetivas também constituem família e devem ser protegidas pelo Estado. Mas será que até pessoas solteiras podem constituir família? Isso parece contraditório porque são necessárias, ao menos, duas pessoas para

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constituir uma família. No entanto, em decisão recente que merece nossa ponderação, o STJ reconheceu que o único imóvel residencial onde reside uma pessoa solteira é bem de família.

LUCIANO LOPES PASSARELLI53 - A preocupação atual do direito de família é com a felicidade dos lares, deixando em segundo plano o elemento patrimonial, de sorte que o constituinte deu um comando ao Estado para que não embarace as relações familiares, não crie problemas dentro da família, legislando de forma a colocar o elemento patrimonial acima do elemento afetivo. Ou seja, o Estado não deve criar situações – mediante leis, normas ou decretos – que criem embaraços à plena concepção da felicidade dos lares. O comando do legislador constituinte é para o Estado não legislar, não decidir de maneira a criar embaraços à felicidade dentro dos lares, porque cabe aos cônjuges regular suas relações patrimoniais como melhor lhes convier. Deve haver essa liberdade aos cônjuges.

6) NATUREZA JURÍDICA DA FAMÍLIA

SILVO DE SALVO VENOSA54 - Em nosso direito e na traição ocidental, a família não é considerada uma pessoa jurídica, pois lhe falta aptidão e capacidade para usufruir direitos e contrair obrigações. Os pretensos direitos imateriais a ela ligados, o nome, o poder familiar, a defesa da memória dos mortos, nada mais são do que direitos subjetivos de cada membro da família. Com maior razão, da mesma forma se posicionam os direitos de natureza patrimonial. A família nunca é titular de direitos. Os titulares serão sempre seus membros individualmente considerados.

A doutrina majoritária, longe de ser homogênea, conceitua família como instituição. Embora essa conclusão seja repetida por muitos juristas, trata-se de conceito por demais vago e impreciso. Essa teoria foi enunciada na França por MAURICE HAURIOU e desenvolvida em seguida. Como instituição, a família é uma coletividade humana subordinada à autoridade e condutas sociais. Uma instituição deve ser compreendida como uma forma regular, formal e definida de realizar uma atividade.

CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA55 – A nova tendência de prestigiar a família como organismo social, como instituição, e como núcleo fundamental da sociedade desborda do direito legislado e alcança dos doutrinadores, tendo mesmo inspirado toda uma corrente que sustenta hoje a sua personalidade jurídica. Foi SAVATIER quem sustentou basicamente a idéia de ser a família sujeito de direitos, com autonomia em relação aos seus membros, e conseqüentemente achar-se investida da condição de pessoa moral. A concepção, arrojada, encontrou seguidores. Um projeto de lei foi redigido pela Société d´Études Législatives, em 1941, acreditando alguns que uma reforma neste sentido teria bons resultados.

Sem que se lhe reconheça propriamente personalidade jurídica, diversa da de seus componentes, não se pode recusar a estes o exercício de certas faculdades em função essencialmente de sua condição de membros da família.

7) ESTADO DE FAMÍLIA

SILVO DE SALVO VENOSA56 - O estado de família é um dos atributos da personalidade das pessoas naturais. É atributo personalíssimo. É conferido pelo vínculo que une uma pessoa às outras: casado, solteiro. Também pode ser considerado sob o aspecto negativo: ausência de vínculo conjugal, familiar, filho de pais desconhecidos. Esses vínculos jurídicos familiares são de duas ordens: vínculo conjugal, que une a pessoa com quem se casou, e vínculo de parentesco, que a une com as pessoas de quem descende (parentesco em linha reta), com as que descendem de um ancestral comum (parentesco colateral), com os parentes do outro cônjuge (parentesco por afinidade), além de com o parentesco adotivo. Desse estado de família decorrem deveres e direitos disciplinados pelo direito de família com reflexos em todos os campos jurídicos (processual, penal, tributário, previdenciário etc.).

O estado de família apresenta características distintas que se traduzem em: 1. intransmissibilidade: esse status não se transfere por ato jurídico, nem entre vivos nem

por causa da morte. É personalíssimo, porque depende da situação subjetiva da pessoa com relação à outra. Como conseqüência da intransmissibilidade, o estado de família também é intransigível;

2. irrenunciabilidade: ninguém pode despojar-se por vontade própria de seu estado. O estado de filho ou de pai depende exclusivamente da posição familiar. Ninguém pode renunciar ao pátrio poder, agora denominado poder familiar, por exemplo;

3. imprescritibilidade: o estado de família, por sua natureza, é imprescritível, como decorrência de seu caráter personalíssimo. Não se pode adquirir por usucapião, nem se perde pela prescrição extintiva;

4. universalidade: é universal porque compreende todas as relações jurídico-familiares;

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5. indivisibilidade: o estado de família é indivisível, de modo que será sempre o mesmo perante a família e a sociedade. Não se admite, portanto, que uma pessoa seja considerada casada para determinadas relações e solteira para outras;

6. correlatividade: o estado de família é recíproco, porque se integra por vínculos entre pessoas que se relacionam. Desse modo, ao estado de marido antepõe-se o de esposa; ao de filho, o de pai, e assim por diante;

7. oponibilidade: é oponível pela pessoa perante todas as outras. O casado assim é considerado perante toda a sociedade.

A definição de estado de família tem grande importância, principalmente para estabelecer a capacidade e os vícios do casamento.

8) DA FAMÍLIA SOB O DIREITO CIVIL CONSTITUCIONAL – DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA57 - Na fase contemporânea da evolução do Direito Civil, em especial no Brasil, incontestavelmente vinculada aos valores e princípios alçados ao texto constitucional, aparece o tema relacionado à família não-fundada no casamento. A matéria é de instigante atualidade e relevância, diante dos incomparáveis reflexos que as normas constitucionais produziram na ordem jurídica, no campo do Direito de Família, mormente diante da coragem constitucional. Na ordem jurídica brasileira, desde o texto constitucional de 1934, a família passou a ser expressamente tratada em nível constitucional, a despeito das críticas feitas por alguns ao legislador constituinte, sob o argumento de que tal assunto não era materialmente constitucional. Não foi postura exclusivamente adotada no direito nacional brasileiro, conforme noticiam JEAN CARBONNIER E PAOLO BISCARETTI DI RUFFIA. Contudo, a proteção especial do Estado, prevista no texto constitucional, apenas tinha como destinatária a família matrimonial, porquanto apenas o casamento era reconhecido como instituto formador e legitimador da família brasileira.

O tratamento dado à família pela Constituição de 1934, posto que manifestada em momento diverso do advento do Código Civil de 1916, seguia ideologia carregada de fundo preconceituoso e conservadorista, consoante a qual o dogma da indissolubilidade do vínculo matrimonial - atrelado à paz familiar - era indiscutível e absoluto. A família, como instituição, era merecedora de tutela constitucional, ao passo que seus integrantes, como pessoas, não gozavam de tal proteção, ainda que a convivência fosse altamente prejudicial ao casal e, com maior freqüência, à descendência resultante de tal vínculo formal. O reconhecimento jurídico da família natural a partir de textos legislativos posteriores, ou seja, aquela resultante de parentalidade extramatrimonial (desde que não adulterina) não representou qualquer abalo nos alicerces da família tutelada pela Constituição, já que manteve-se inalterado o sistema tradicional das relações familiares envolvendo o controle quanto à sexualidade das uniões apenas no campo matrimonial. É importante notar, no período anterior ao advento do texto de 1988, a proposital omissão normativo-constitucional acerca da existência de outras famílias, aquelas fundadas não no vínculo formal do casamento, mas sim no convívio diuturno, more uxorio, sem ferir qualquer valor ético-filosófico (ausência de impedimentos matrimoniais, como o incesto, a bigamia, a coação, v.g.).

Atualmente, qualquer norma jurídica de Direito de Família requer a verificação do fundamento de validade constitucional, não podendo ser olvidada a lição de GUSTAVO TEPEDINO, com base na combinação dos princípios da isonomia dos filhos e do pluralismo dos modelos familiares, com o fundamento da República do Brasil da dignidade da pessoa humana. Assim, tais valores "informam toda a disciplina familiar, definindo a nova tábua de valores em que exsurgem, no ápice do ordenamento, três traços característicos em matéria de filiação:

1. A funcionalização das entidades familiares à realização da personalidade de seus membros, em particular dos filhos;

2. A despatrimonialização das relações entre pais e filhos; 3. A desvinculação entre a proteção conferida aos filhos e a espécie de relação dos genitores. " A Constituição Federal permitiu, na linha da evolução proporcionada por determinados

fenômenos de mudanças, a abertura do sistema em matéria de Direito de Família. Ou, como já foi dito: o mérito da Constituição Federal de 1988 foi o de "obrigar a interpretação das leis infraconstitucionais a uma nova realidade material: a de igualdade entre familiares nas suas relações de convívio", permitindo que todos os familiares sejam reconhecidos e devidamente tratados como sujeitos de direitos, autorizando "o reconhecimento de suas individualidades e de um maior respeito a seus direitos fundamentais. "

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PEDRO THOMÉ DE ARRUDA NETO58 - A compreensão do direito civil transmudou-se com a promulgação da Constituição Federal de 1988. A partir desse momento referencial operou-se uma verdadeira revisão ontológica no seio deste ramo da ciência jurídica que passou a privilegiar uma interpretação constitucionalizada de suas normas, reafirmando-se a idéia de que as determinações principiológicas da Lei Maior são fontes hermenêuticas vinculantes.

A promulgação da Constituição Cidadã redesenhou a moldura axiológica que enforma o sistema normativo pátrio, provocando uma real necessidade de construir posturas hermenêuticas que viabilizassem a proteção dos bens jurídicos constitucionalmente tutelados.

Nesse sentido, na doutrina e, posteriormente, na jurisprudência viu-se colocar uma "pá de cal" na visão monossistêmica do direito civil e o ideário contido na vetusto paradigma "código civil como constituição o direito privado".

Buscando sua raiz antropocêntrica, o direito civil deixou de prestigiar ultrapassadas posturas consagradas aos séculos XVIII e XIX, fazendo-se operar uma "imprescindível e urgente releitura do Código Civil e das leis especiais à luz da Constituição”.

Como consectário lógico do exposto, pode-se constatar que foi, justamente, no direito das famílias, na feliz expressão construída pela ilustrada MARIA BERENICE DIAS, que ecoaram as mais profundas e marcantes mudanças hermenêuticas constitucionalizantes, com a revisão de paradigmas agora empregados em fina sintonia com os direitos humanos e com os princípios consagrados na Lei Maior.

PEDRO THOMÉ DE ARRUDA NETO59 - Nesse contexto, a moderna doutrina do direito das famílias logrou (re)construir os fundamentos teóricos desta disciplina jurídica, consagrando conceitos como os de democratização da família, igualdade entre os cônjuges e entre os filhos, poder familiar, tutela protetiva do melhor interesse da criança (de há muito consagrada nas expressões the best interest of the child do direito norte-americano e Kindeswoh do direito germânico), direitos dos familiares idosos, planejamento familiar, proteção à união estável e às famílias monoparentais como entidades familiares, garantia do direito à ancestralidade, dentre tantos outros.

Mas, sem sombra de dúvidas, é na expressão "repersonalização do ente familiar" que podemos encontrar a base epistemológica sobre a qual se assentam as principais discussões sobre as famílias, na atualidade.

O termo (e a idéia por ele traduzida) "repersonalização" das relações civis no âmbito do direito das famílias foi sugerido, pela primeira vez, por PAULO LUIZ NETTO LÔBO, na aclamada obra "O Direito de família e a Constituição de 1988", publicada em 1989, sob a coordenação de CARLOS ALBERTO BITTAR.

Para o ilustre professor alagoano, repersonalizar significa, antes de tudo, que no seio familiar se "valoriza o interesse da pessoa humana mais do que suas relações patrimoniais". Por decorrência lógica, constrói-se a noção de "despatrimonialização" do direito familiar.

Outrossim, como pretendemos demonstrar, subjaz na moderna visão do direito das famílias outra noção de extrema importância: a despenalização.

Baseando-se em uma técnica legislativa diferenciada de promoção de valores (rechaçando-se a risível onipotência do legislador do código civil de 1916, que recheou este diploma legal de cláusulas regulamentares, com a previsão de situações-tipo, verdadeiros "tipos civis", que supostamente abarcariam todas as condutas ensejadoras de uma dicção legislativa), parte-se da idéia de que a família é um instrumento de promoção da dignidade humana de seus membros (artigos 226 e 230 da Carta Magna), e não um mero produto condicionado pela instituição formal do casamento.

Em atenção ao princípio maior (e valor-fonte do nosso sistema normativo) que identifica a dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil (CF, artigo 1°, inciso III), supera-se a excessiva proteção à coesão formal e rigidez da família baseada no matrimônio, em nome da efetiva realização pessoal e afetiva de cada um de seus componentes. Estes se tornam o centro das destinações jurídicas em matéria de direito das famílias.

É fato que o direito das famílias sempre teve sua atenção voltada para o casamento e para as relações patrimoniais dele decorrentes. O código civil de 1916 concentrava a maioria dos artigos do livro "Do Direito de Família" aos interesses patrimoniais ou econômicos.

Nesse diapasão, pode-se constatar que pouca mudança se operou no código civil de 2002 que preferiu preservar a estrutura do código anterior. Além de ignorar por completo novas entidades familiares não decorrentes do casamento (como a família monoparental e as uniões homoafetivas, por exemplo), prestigiou o cunho patrimonializante das relações familiares (do total de 273 artigos do livro específico - IV - reservou 112 às questões patrimoniais - 4).

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Visível, destarte, é o descompasso entre a realidade fática constatável nas famílias contemporâneas e o ideário prestigiado pelo legislador do novo (?) código civil, demandando do aplicador do Direito a construção de novos instrumentos teóricos de molde a evitar a falência do modelo posto, completamente fora de sintonia com o ambiente humano e social em que está inserido.

Nesse contexto, é que se quer, por meio do presente texto, chamar atenção para outro fenômeno de extrema importância: a despenalização do direito das famílias.

Acreditamos que a terminologia "despenalização" do direito das famílias seja original e adequada aos fins a que se propõe. Todavia não temos a pretensão de sermos completamente originais já que muitas das idéias aqui defendidas já foram trabalhadas por inúmeros e renomados doutrinadores, posto que de forma pontual.

No presente, queremos abordar a questão da forma mais ampla possível, com o escopo de sistematizar a matéria e conferir um caráter de generalidade às nossas conclusões, de molde a emprestar a esse nosso esforço uma nota de utilidade na práxis judiciária.

ROLF MADALENO60 - A Carta Política de 1988 cedeu espaço, proteção e, portanto, conferiu status e identidade civil à realidade sociológica que encarna diversificadas modelagens de constituição, estrutura e de formatação familiar existentes nesse imenso País e assim procedeu ao retirar do porão de armazenagem das categorias excluídas, as famílias naturais, assim chamadas por terem nascido da informalidade de uma relação afetiva, outrora denominada de concubinato e modernamente rebatizada com a denominação jurídica de união estável. Igual atitude teve ao alçar também para o plano da validade jurídica, a grande massa de famílias monoparentais expressamente lembradas no § 4º do artigo 226 da Constituição Federal.

Paira, portanto, no seio da esperançada sociedade brasileira uma nova e mais extensa concepção social e jurídica de família, democratizada pelo Constituinte de 1988, quando ponderou estender a sua proteção além da tradicional família conjugal, também a família de fato e a entidade monoparental e reconhecer assim, sem vacilações, como observa e reforça Eduardo de Oliveira Leite, a existência de um fenômeno social, uma nova forma familiar com a qual será necessário, bom o mal grado, conviver e legislar daqui para o futuro.

Não mais fala o Constituinte de uma família celular, estreitada na quantificação de seus integrantes e que do campo migrou para os grandes centros urbanos com a monumental Revolução Industrial iniciada no século XVIII. As uniões familiares não são mais restritas ao vínculo conjugal, mas alargam para o reconhecimento das uniões estáveis entre o homem e a mulher e aos grupos informais chefiados por um homem ou uma mulher sem cônjuge ou companheiro.

Como disse GUSTAVO TEPEDINO,61 a Constituição de 1988 altera o objeto da tutela jurídica e deixa de enaltecer, como sempre fizera em nome da paz doméstica, apenas a família conjugal e passa a dar proteção a qualquer das entidades familiares constitucionalmente credenciadas, independentemente da formalidade ou informalidade de sua origem e até quando constituída por apenas um dos pais, devendo qualquer comunidade familiar ser preservada apenas como instrumento de tutela da dignidade da pessoa humana.

A nova organização da família segue o fenômeno social da chamada lei de contínuo estreitamento familiar responsável pela transformação dos grandes grupos familiares na família nuclear de nossos tempos. Não chega a ser um modelo único, absoluto, confirma MIZRAHI, devido à grande pluralidade de tipos familiares existentes e tutelados pela Constituição da República, que em outubro de 1988 terminou decodificando o Código Civil como centro das relações de direito privado, especialmente as relações de Direito de Família.

Para GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA62 “dentro de uma visão constitucionalizada, como exige o Direito Civil moderno, podem se enunciar os seguintes princípios gerais reconhecidos no texto constitucional brasileiro de 1988, em matéria de Direito de Família (ainda que não excluídos desse segmento do conhecimento jurídico):”

a) o princípio e fundamento da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III); b) o princípio da tutela especial à família independentemente da espécie (art. 226, caput); c) o princípio e fundamento do pluralismo e da democracia no âmbito dos organismos

familiares, bem como da escolha da espécie de família (art. 1º, V); d) o princípio da igualdade em sentido material de todos os partícipes da família (art. 5º e

inciso I); e) os princípios e objetos da liberdade, da justiça e do solidarismo nas relações familiares (art.

3º, I) o princípio e objetivo da beneficência em favor dos partícipes do organismo familiar (art. 3º, IV)”.

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Além destes, há outros princípios especiais (ou específicos) de Direito de Família, que exsurgem da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – sendo que alguns deles são implícitos a partir da normativa constitucional:

a) princípio da paternidade responsável, vinculado ao método interpretativo the best interest of the child (art. 226, § 7º);

b) princípio da prevalência do elemento anímico da affectio nas relações familiares (em decorrência da previsão do divórcio, com prazos diminuídos, e do expresso reconhecimento da perda da affectio maritalis diante da separação de fato por dois anos), nos termos do art. 226, § 6º;

c) princípio do pluralismo das entidades familiares (art. 226, §§ 1º, 3º e 4º); d) princípios da liberalidade restrita e beneficência à prole em matéria de planejamento

familiar (art. 226, § 7º); e) princípio e dever da convivência familiar (art. 227, caput); f) princípio da prioridade da proteção absoluta e integral da criança e do adolescente (art.

227, caput), incluindo a sua colocação em família substituta (art. 227, § 3º, VI, e § 5º); g) princípio da isonomia entre os cônjuges (art. 226, § 5º) e, implicitamente, entre os

companheiros; h) princípio da isonomia entre os filhos, independentemente da origem (art. 227, § 6º); i) princípio da não-equiparação entre o casamento e o companheirismo (art. 226, § 3º).”

Razão de se poder concluir que a Constituição Federal impregnou o Direito de Família com vários princípios importantes:

a) Publicização compreende o processo de crescente intervenção estatal, especialmente no âmbito legislativo, característica do Estado Social do século XX. Identificável com o processo de intervenção legislativa infraconstitucional; No direito de família, há um acentuado predomínio das normas imperativas, isto é, normas que são inderrogáveis pela vontade dos particulares. Significa tal inderrogabilidade que os interessados não podem estabelecer a ordenação de suas relações jurídicas familiares, porque esta se encontra expressa e imperativamente prevista na lei (ius cogens). Com efeito, não se lhes atribui o poder de fixar o conteúdo do casamento (por exemplo, modificar os deveres conjugais, art. 231); ou sujeitar a termo ou condição o reconhecimento o filho (art. 361); ou alterar o conteúdo do pátrio poder (art. 384).63

b) Assiste-se ao fenômeno da despatrimonialização ou repersonalização do Direito Civil para deixar de lado os direitos do proprietário e focar-se no direito da pessoa humana em sociedade. A repersonalização tem sentido em repor a pessoa humana como centro do direito civil, passando o patrimônio para segundo plano. O fenômeno da despatrimonialização não quer significar a redução quantitativa do conteúdo patrimonial no sistema jurídico civilístico, mas sim, conforme PIETRO PERLIGIERI, a passagem de uma jurisprudência civil dos interesses patrimoniais a uma mais atenta aos valores existenciais.” Descortina-se ainda, uma concentração em torno do fenômeno humano, pessoal e afetivo, o que TERESA ARRUDA ALVIM PINTO chama de REPERSONALIZAÇÃO, explicando: ‘isto significa, basicamente, que as alterações havidas têm por escopo fazer com que o direito de família passe a girar fundamentalmente em torno de fenômenos humanos, ligados à esfera afetiva, espiritual e psicológica de pessoas envolvidas e não de facetas de natureza predominantemente patrimonial.’ Daí o natural incremento das separações ou divórcios, posto que é o enlace afetivo o fator determinante das uniões, vindo como força secundária o convívio conjugal e os interesses patrimoniais, sendo que outrora dominavam ou decidiam quase sempre a efetivação do casamento.64

c) A democracia no âmbito da família também constitui novidade em que as famílias são funcionalizadas em razão da dignidade de cada partícipe; há um redirecionamento das relações familiares para buscar nas relações pessoais os ideais e valores de pluralismo, solidarismo, democracia, igualdade, liberdade e humanismo.

d) A funcionalização da família à realização da personalidade seus membros constituem conseqüência da CF na família já que aquela é a lei fundamental

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portadora de valores, expressos positivamente através dos princípios constitucionais. Dentre eles o princípio da dignidade da pessoa humana é o mais importante.’ A família é considerada a base da sociedade pelo art. 226 da nossa CF. De fato, o seio familiar apresenta-se com “o local próprio para o desenvolvimento pessoal em todos os sentidos.” Neste mesmo sentido, o texto constitucional impõe ao Estado, ao lado da concessão de proteção especial à família (art. 226), a assistência às pessoas que dela participam, mediante a instituição de mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações (§ 8º do art. 226). Estabelece, outrossim, como de livre decisão do casal o planejamento familiar, cabendo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o seu exercício (§ 7º do art. 226), respeitado o princípio da paternidade responsável.”65

e) IGUALDADE estabelecida pela desvinculação entre a proteção conferida aos filhos e a espécie de relação dos genitores; proteção à paternidade responsável; prevalência da affectio nas relações familiares sem preponderância de um membro sobre o outro; administração e co-gestão dos interesses familiares pelo casal; obrigatoriedade de ambos os genitores contribuírem, proporcionalmente aos seus rendimentos, para a manutenção da família e dos filhos.

JOSÉ CARLOS TEIXEIRA GIORGIS66 - As constituições brasileiras sempre revelaram as mudanças sociais que ocorreram em sua sociedade civil, bem como as idiossiocrasias ideológicas, que naturalmente, transparecem da elaboração e fomento das leis.

Após a Proclamação da Independência, a religião católica era o culto oficial, havendo um vInculo estreito entre a Igreja e o Império, razão da existência apenas do casamento religioso, e nenhuma referência relevante ao direito de familia na Carta de 1824.

Já a Constituição de 1891, sob a influência do ideário republicano, proclamou o casamento civil, dizendo-o gratuito e isso nas disposições sobre os direitos individuais, representando uma diáspora que desvinculou a instituição matrimonial do caráter religioso existente.

A Carta de 1934, impregnada de influxos sociais, deu ao Estado a obrigação de socorrer as familias de prole numerosa, estimou a indissolubilidade do casamento, salvo desquite ou anulação, que continuava civil e gratuito, embora aceitando os efeitos do conúbio religioso, recomendou exame de sanidade física e mental para os nubentes e ordenou a gratuidade do reconhecimento dos filhos naturais, garantias que foram repetidas na Constituição de 1937, com o acréscimo da igualdade entre filhos naturais e legítimos e proteção da infância e da juventude pelo Estado.

A Constituição de 1946 renovou tais direitos, apenas adicionando a vocação hereditária de brasileiros, em relação a bens deixados por estrangeiros no País.

A Emenda nº 1, de 1969, manteve o casamento indissolúvel. o que logrou modificação com a Lei do Divórcio de 1977, estatuindo-se que o casamento podia ser dissolvido após prévia separação judicial por três anos (CF, artigo 175, § 1º), e, mais tarde, pela Emenda nº 2, de 1977, permitiu o divórcio direto, para separações de fato por mais de cinco anos, se anteriores; outras prescrições cuidaram do casamento civil com celebração gratuita, do religioso com efeitos civis, assistência à maternidade, à infância, à adolescência e aos excepcionais.

A instituição do divórcio e a aceitação de novos paradigmas como a independência da mulher e sua fixação em nichos sociais antes relegados, uma nova consciência sobre a sexualidade, o crescimento de movimentos reivindicatórios, as parcerias civis, a abertura política, foram alguns vetores que desembocaram no processo constituinte, com ampla discussão de todos os setores nacionais, e na construção da base da pirâmide onde se apóiam todos os ordenamentos.

A Constituição de 1988 representou radical mudança, com a nova conceituação de entidade familiar, para efeitos da proteção do Estado, passando a família a ser vista e aceita de forma mais ampla, por sua origem no Direito Natural, com reflexos nos âmbitos civil e penal.

A entidade familiar estrutura-se ou pelo casamento civil ou religioso com efeitos civis, mantido como instituto básico, em torno de que gira o sistema, confirmando-se a chamada família legítima (CF, artigo 226, §§ 1º e 2º), pela união estável entre homem e mulher, que teria facilitado sua conversão ao casamento (CF, artigo 226, § 3º), e pela comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes ou família monoparental (CF, artigo 226, § 4º).

JOSÉ CARLOS TEIXEIRA GIORGIS67 - A Carta Magna ainda ampliou as hipóteses de dissolução do casamento pelo divórcio, estabelecendo a forma direta, após dois anos de separação de fato e a conversão da separação judicial em divórcio após um ano de ruptura (CF, artigo 226, § 6º).

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Assentou-se a igualdade de direitos entre o homem e a mulher (CF, artigo 5º, I), a vedação de qualquer preconceito (CF, artigo 3º, IV) e que os direitos referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente por um e outro (CF, artigo 226, § 5º), regra que deriva do Direito Natural e da Declaração Universal dos Direitos Humanos, prerrogativas que, historicamente, foram antecedidas pela edição do Estatuto da Mulher Casada (Lei n. 4.121/62).

A idéia da igualdade, todavia, não pode ser extremada e deve considerar as naturais diferenças entre o homem e a mulher, oriundas de um testamento cultural de séculos de dominação e subserviência realizando-se os acertamentos em cada caso, quando se controvertam as situações familiares ou pessoais.

Esta isonomia se considera contingente e relativa, eis que a mulher ainda não logrou sua emancipação financeira, apesar de expor-se ao mercado de trabalho, havendo o constituinte acolhido uma tendência à igualização jurídica homem-mulher, mas não a decretou em termos categóricos e de universal espectro, pois não goza do privilégio de operar metamorfoses, diante de realidades díspares.

Por outro lado, fixou-se a igualdade entre os filhos, havidos ou não do casamento, ou por adoção, todos com os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer discriminações relativas à filiação (CF, artigo 227, § 6º).

Não se falou mais em filhos ilegítimos, naturais, espúrios, bastardos, clandestinos ou incestuosos, nomes que tinham vezo preconceituoso. etapa que veio a ser completada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que declarou o estado de filiação como direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo o reconhecimento do filho havido fora do casamento ser feito através de procedimentos voluntário (registro, testamento, escritura pública, documento particular, declaração no processo), administrativo (indicação do suposto pai pela mãe, no registro) ou judicial (investigação de paternidade), pretendendo-se, em resguardo à Justiça, o esplendor da verdade na tessitura do organismo familiar, por exigido respeito a seus componentes e fortalecimento da própria sociedade.

Em arremate, operou-se com a Constituição um novo dimensionamento e valoração do núcleo familiar, tratando-se igualitariamente pais e filhos, cônjuges e parceiros, protegendo-se outras formas de união, que foram favorecidas com a possibilidade de dissídio em vista do divórcio.

EDSON TEIXEIRA DE MELO68 - A Constituição Federal de 1988 provocou uma revolução no

sistema jurídico brasileiro. O foco do legislador constituinte, sempre voltado para a organização do próprio Estado, desloca-se para o indivíduo e, mais ainda, para a coletividade, contemplando amplamente os direitos individuais sem repousar seu campo de abrangência sobre os direitos difusos e coletivos.

O legislador constituinte deu especial atenção aos direitos e garantias fundamentais, pois abordou inicialmente estes temas, para depois pensar na organização do Estado. Apenas para termos um elemento concreto de comparação, a Constituição de 1824 iniciava tratando do Império do Brasil, seu território, governo, dinastia e religião, e só vai abordar os direitos dos cidadãos brasileiros no artigo 173, sob o título 8º, que tratava das disposições gerais, e garantias dos direitos civis.

Por outro lado, a família foi reconhecida como base da sociedade e recebe proteção do Estado, nos termos dos artigos 226 e seguintes.

A família como formação social, na visão de PIETRO PERLINGIERI, é garantida pela Constituição não por ser portadora de um direito superior ou superindividual, mas por ser o local ou instituição onde se forma a pessoa humana.

A família teve o reconhecimento do legislador constituinte como base da sociedade, e a sua importância na formação das pessoas mereceu todo o aparato jurídico estatal, formado por normas e princípios, isto para aqueles que não os consideram norma jurídica.

FLÁVIO TARTUCE69 - Deve-se entender que o Direito de Família, necessariamente, merece ser analisado sob o prisma da Constituição Federal, o que traz uma nova dimensão de tratamento dessa disciplina. Assim sendo, é imperioso analisar os institutos de Direito Privado tendo como ponto origem a Constituição Federal de 1988, o que leva ao caminho sem volta do Direito Civil Constitucional.

Em suma, deve-se reconhecer também a necessidade da constitucionalização do Direito de Família, pois "grande parte do Direito Civil está na Constituição, que acabou enlaçando os temas sociais juridicamente relevantes para garantir-lhes efetividade. A intervenção do Estado nas relações de direito privado permite o revigoramento das instituições de direito civil e, diante do novo texto constitucional, forçoso ao intérprete redesenhar o tecido do Direito Civil à luz da nova Constituição".

A) PRINCÍPIO DE PROTEÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – ART. 1º, III, CF/88

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EDSON TEIXEIRA DE MELO70 - Este princípio está plasmado no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal e demonstra uma nova ótica do Direito Constitucional e do Direito de Família em especial.

As Constituições passadas, bem como o Código Civil de 1916, só reconheciam a família decorrente do casamento, como instituição de produção e reprodução dos valores sociais, culturais, éticos, religiosos e econômicos. A Constituição de 1988 e o Código Civil de 2002 colocam a família sob o enfoque da tutela individualizada dos seus membros, ou seja, a visão constitucional antropocêntrica já abordada neste trabalho, coloca o homem como centro da tutela estatal, valorizando o indivíduo e não apenas a instituição familiar.

Ainda que se entenda a dignidade da pessoa humana como um direito metaindividual, posição adotada por alguns juristas, e, neste sentido, a proteção seria da coletividade, que estaria sendo violentada como um todo, com a ofensa individual perpetrada a um único cidadão, este princípio no direito de família pode assegurar outros tantos direitos e garantias.

Constituição Federal de 1988 destaca como princípio fundamental, dentre outros que enumera, a Dignidade da Pessoa Humana. RIZAZATO NUNES destaca em sua obra sobre o tema que o respeito à dignidade da pessoa humana pressupõe assegure-se concretamente os direitos sociais previstos no artigo 6º da Constituição Federal, que por sua vez está atrelado ao artigo 225, normas essas que garantem como direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, assim como o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Acrescento a esta lista a proteção estatal à família como base da sociedade.

Assim, seja na visão religiosa, em que o casamento religioso, que para a Igreja Católica foi elevado à comunidade mais nobre entre todas as comunidades humanas, à categoria de sacramento, ultrapassa, por vontade de Cristo, todos os conceitos e possibilidades naturais, conferindo-lhe uma dignidade e grandeza verdadeiramente inaudita (ALVES, Martins Antonio, 1976), ou na visão de Cormac Burke (In tradução de Gabriel Périsse, 1991), onde o amor conjugal não está destinado a permanecer apenas como o amor entre duas pessoas e provavelmente não sobreviverá se não ultrapassar este estágio, tornando-se amor familiar, a família tem reconhecida a sua importância no seio da sociedade, ganhando proteção com status constitucional.

FLÁVIO TARTUCE71 - Prevê o art. 1º, inc. III, da Constituição Federal de 1988 que o nosso Estado Democrático de Direito tem como fundamento a dignidade da pessoa humana. Trata-se daquilo que se denomina princípio máximo, ou superprincípio, ou macroprincípio, ou princípio dos princípios. Diante desse regramento inafastável de proteção da pessoa humana é que está em voga, atualmente entre nós, falar em personalização, repersonalização e despatrimonialização do Direito Privado. [06] Ao mesmo tempo que o patrimônio perde importância, a pessoa é supervalorizada.

Ora, não há ramo do Direito Privado em que a dignidade da pessoa humana tenha mais ingerência ou atuação do que o Direito de Família. De qualquer modo, por certo é difícil a denominação do que seja o princípio da dignidade da pessoa humana. Reconhecendo a submissão de outros preceitos constitucionais à dignidade humana, INGO WOLFGANG SARLET conceitua o princípio em questão como "o reduto intangível de cada indivíduo e, neste sentido, a última fronteira contra quaisquer ingerências externas. Tal não significa, contudo, a impossibilidade de que se estabeleçam restrições aos direitos e garantias fundamentais, mas que as restrições efetivadas não ultrapassem o limite intangível imposto pela dignidade da pessoa humana".

O princípio de proteção da dignidade da pessoa humana é o ponto central da discussão atual do Direito de Família, entrando em cena para resolver várias questões práticas envolvendo as relações familiares. Concluindo, podemos afirmar, que o princípio da dignidade humana é o ponto de partida do novo Direito de Família brasileiro.

B) PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE FAMILIAR – ART. 3º, I, CF/88

FLÁVIO TARTUCE72 - A solidariedade social é reconhecida como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil pelo art. 3º, inc. I, da Constituição Federal de 1988, no sentido de buscar a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Por razões óbvias, esse princípio acaba repercutindo nas relações familiares, já que a solidariedade deve existir nesses relacionamentos pessoais. Isso justifica, entre outros, o pagamento dos alimentos no caso de sua necessidade, nos termos do art. 1.694 do atual Código Civil.

Mas vale lembrar que a solidariedade não é só patrimonial, é afetiva e psicológica. Assim, "ao gerar deveres recíprocos entre os integrantes do grupo familiar, safa-se o Estado do encargo de prover

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toda a gama de direitos que são assegurados constitucionalmente ao cidadão. Basta atentar que, em se tratando de crianças e adolescentes, é atribuído primeiro à família, depois à sociedade e finalmente ao Estado (CF 227) o dever de garantir com absoluta prioridade os direitos inerentes aos cidadãos em formação".

Entretanto, mesmo assim, "O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações" (art. 226, § 8º, da CF/88) – o que consagra também a solidariedade social na ótica familiar.

Por fim, vale frisar que o princípio da solidariedade familiar também implica respeito e consideração mútuos em relação aos membros da família.

C) PRINCÍPIO DA IGUALDADE ENTRE FILHOS – ART. 227, § 6º, CF/88 E ART. 1.596 DO CC

FLÁVIO TARTUCE73 - Prevê o art. 227, § 6º, da Constituição Federal que "os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação". Complementando o texto constitucional, o art. 1.596 do Código Civil em vigor tem exatamente a mesma redação, consagrando, ambos os dispositivos, o princípio da igualdade entre filhos.

Esses comandos legais regulamentam especificamente a isonomia constitucional, ou igualdade em sentido amplo, constante do art. 5º, caput, do Texto Maior, um dos princípios do Direito Civil Constitucional. Em suma, juridicamente, todos os filhos são iguais, havidos ou não durante o casamento. Essa igualdade abrange também os filhos adotivos e aqueles havidos por inseminação heteróloga (com material genético de terceiro). Diante disso, não se pode mais utilizar as expressões filho adulterino ou filho incestuoso, as quais são discriminatórias. Também não podem ser utilizadas, em hipótese alguma, as expressões filho espúrio ou filho bastardo. Apenas para fins didáticos utiliza-se a expressão filho havido fora do casamento, já que, juridicamente, todos os filhos são iguais.

Isso repercute tanto no campo patrimonial quanto no pessoal, não sendo admitida qualquer forma de distinção jurídica, sob as penas da lei. Trata-se, portanto, na ótica familiar, da primeira e mais importante especialidade da isonomia constitucional.

EDSON TEIXEIRA DE MELO74 - Plasmado na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227, § 6º, e repetido no Código Civil de 2002, nos artigos 1.596 a 1.629, e, ainda, decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana, iguala a condição dos filhos havidos ou da relação do casamento, ou por adoção, não mais admitindo-se qualquer diferenciação entre os mesmos.

O referido princípio não admite distinção entre os filhos legítimos, naturais e adotivos, quanto ao nome, poder familiar, alimentos e sucessão; permite o reconhecimento a qualquer tempo de filhos havidos fora do casamento; proíbe que conste no assento do nascimento qualquer referência à filiação ilegítima e veda designações discriminatórias relativas à filiação.

D) PRINCÍPIO DA IGUALDADE ENTRE CÔNJUGES E COMPANHEIROS – ART. 226, § 5º, CF/88 E ART. 1.511 DO CC

EDSON TEIXEIRA DE MELO75 - A revolução provocada pela Constituição Federal de 1988 já foi abordada neste trabalho, e este princípio insere mais uma inovação que cortou no cerne a vigência de inúmeros dispositivos legais do Código Civil de 1916.

O artigo 226, § 5º, da Constituição Federal de 1988 traz plasmado que os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

A isonomia conjugal estatuída pela Magna Carta provocou a ira de alguns juristas que vêm na medida a desagregação conjugal como resultado. MARIA HELENA DINIZ, ao contrário, assevera que a regulamentação instituída no aludido dispositivo acaba com o poder marital e com o sistema de encapsulamento da mulher, restrita a tarefas domésticas e à procriação. E continua destacando que o patriarcalismo não se coaduna com a época atual, em que grande parte dos avanços tecnológicos e sociais está diretamente vinculados às funções da mulher na família e referendam a evolução moderna, confirmando verdadeira revolução social.

CARLOS ROBERTO GONÇALVES, em obra já citada, comenta que com esse princípio desaparece o poder marital, e a autocracia do chefe de família é substituída por um sistema em que as decisões devem ser tomadas de comum acordo entre conviventes ou entre marido e mulher, pois os tempos atuais requerem que a mulher e o marido tenham os mesmos direitos e deveres referentes à sociedade conjugal.

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O Código Civil de 2002, seguindo aos ditames constitucionais, corrigiu as distorções advindas de ultrapassada legislação, já revogadas em sua maioria pelo advento da Magna Carta.

Na verdade, a evolução tecnológica muito contribuiu para a atualização da legislação e correção de distorções que vitimavam as mulheres ao longo de séculos. No entanto, entendo que a mulher conquistou esta isonomia quando saiu para o mercado de trabalho, assumindo uma carreira, uma casa, filhos, enfim, uma família, e provou ter capacidade, não raro muito maior que a dos homens, pois talento e capacidade não têm dependência com o sexo da pessoa, e a mulher sofria com o preconceito de que era inferior.

Assim, ao ganhar independência financeira, e muitas vezes sustentar a família, nela incluído o próprio marido, ora vítima do desemprego, ora de salário inferior ao da esposa, conquistou a isonomia jurídica conjugal, pois a isonomia social ela já havia conquistado há muito tempo. Em uma sociedade capitalista como a nossa, o aumento do poder aquisitivo da mulher é que lhe deu condições de igualdade, igualdade esta que em situações em que a mulher é desprovida de cultura e de renda própria, é muito mais tênue ou desapercebida.

FLÁVIO TARTUCE76 - Assim como há igualdade entre filhos, o Texto Maior reconhece a igualdade entre homens e mulheres no que se refere à sociedade conjugal formada pelo casamento ou pela união estável (art. 226, §§ 3º e 5º, da CF/88). Lembramos que o art. 1º do atual Código Civil utiliza o termo pessoa, não mais homem, como fazia o art. 2º do Código Civil de 1916, deixando claro que não será admitida qualquer forma de distinção decorrente do sexo.

Especificamente, prevê o art. 1.511 do Código Civil de 2002 que o casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges. Por óbvio, essa igualdade deve estar presente na união estável, também reconhecida como entidade familiar pelo art. 226, § 3º, da Constituição Federal, e pelos arts. 1.723 a 1.727 do atual Código Civil.

Diante do reconhecimento dessa igualdade, como exemplo prático, o marido/companheiro pode pleitear alimentos da mulher/companheira ou vice-versa. Além disso, um pode utilizar o nome do outro livremente, conforme convenção das partes (art. 1.565, § 1º, do CC). Vale lembrar que o nome é reconhecido, pelo atual Código Civil, como um direito da personalidade (arts. 16 a 19).

Quanto aos alimentos, reconhecendo essa igualdade, há julgados do Tribunal de Justiça de São Paulo apontando que a mulher apta a trabalhar não terá direito a alimentos em relação ao ex-cônjuge. Em alguns casos, a jurisprudência paulista entende que haverá direito à pensão somente por tempo razoável para sua recolocação no mercado de trabalho.

Ressalte-se, entretanto, que o Superior Tribunal de Justiça tem reformado essas decisões, que merecem análise caso a caso. Como se pode perceber, a grande dificuldade reside em saber até que ponto vai essa igualdade no plano fático.

E) PRINCÍPIO DA IGUALDADE NA CHEFIA FAMILIAR – ART. 226, § 5º, 227, § 7º, CF/88 E ARTS. 1.566, III E IV, 1.631 E 1.634 DO CC

FLÁVIO TARTUCE77 - Como decorrência lógica do princípio da igualdade entre cônjuges e companheiros, temos o princípio da igualdade na chefia familiar, que deve ser exercida tanto pelo homem quanto pela mulher em um regime democrático de colaboração, podendo, inclusive, os filhos opinarem (conceito de família democrática).

Assim sendo, pode-se utilizar a expressão despatriarcalização do Direito de Família, já que a figura paterna não exerce o poder de dominação do passado. O regime é de companheirismo ou colaboração, não de hierarquia, desaparecendo a figura do pai de família (patter familias), não podendo ser utilizada a expressão pátrio poder, substituída, na prática, por poder familiar.

No Código Civil de 2002, o princípio em questão pode ser percebido pelo que consta dos incs. III e IV do art. 1.556. Isso porque são deveres do casamento a assistência mútua e o respeito e consideração mútuos, ou seja, prestados por ambos os cônjuges, de acordo com as possibilidades patrimoniais e pessoais de cada um.

Complementando, prevê o art. 1.631 do atual Código Civil que durante o casamento ou união estável o poder familiar compete aos pais. Na falta ou impedimento de um deles, o outro exercerá esse poder com exclusividade. Em casos de eventual divergência dos pais quanto ao exercício do poder familiar, é assegurado a qualquer um deles recorrer ao juiz para a solução do desacordo.

Esse exercício de forma igualitária também consta do art. 1.634 do Código Civil, que traz as suas atribuições, a saber: a) dirigir a criação e a educação dos filhos; b) ter os filhos em sua companhia e guarda; c) conceder aos filhos ou negar-lhes consentimento para casarem; d) nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou se o sobrevivo não puder

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exceder o poder familiar; e) representar os filhos, até aos 16 anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; f) reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; g) exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.

Quanto à última atribuição, ela deve ser exigida com moderação, sem que a relação entre pais e filhos seja uma relação ditatorial, violenta ou explosiva. Qualquer abuso cometido, como se sabe, pode gerar a suspensão ou a destituição do poder familiar.

F) PRINCÍPIO DA PATERNIDADE RESPONSÁVEL E DO PLANEJAMENTO FAMILIAR – ART. 226, § 7º, CF/88

EDSON TEIXEIRA DE MELO78 - O artigo 226, § 7º, da Constituição Federal dispõe que o planejamento familiar é livre decisão do casal, fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável.

Em um país de dimensões gigantes como o nosso, não se poderia admitir qualquer restrição impositiva à procriação.

A Lei nº 9.253/96 regulamentou a questão, principalmente no tocante à responsabilidade do Poder Público. O Código Civil de 2002, no artigo 1.565, traçou diretrizes asseverando que o planejamento familiar é de livre decisão do casal e que é vedado qualquer tipo de coerção por parte de instituições públicas e privadas.

G) PRINCÍPIO DO PLURALISMO FAMILIAR OU DA LIBERDADE DE CONSTITUIÇÃO DE UMA COMUNHÃO DE VIDA FAMILIAR - PRINCÍPIO DA NÃO-INTERVENÇÃO OU DA LIBERDADE

– ART. 1.513 DO CC

FLÁVIO TARTUCE79 - Prevê o art. 1.513 do Código Civil em vigor que "É defeso a qualquer pessoa de direito público ou direito privado interferir na comunhão de vida instituída pela família". Trata-se da consagração do princípio da liberdade ou da não-intervenção na ótica do Direito de Família. Por certo que o princípio em questão mantém relação direta com o princípio da autonomia privada, que também deve existir no âmbito do Direito de Família. A autonomia privada é muito bem conceituada por Daniel Sarmento como o poder que a pessoa tem de auto-regulamentar os próprios interesses. A autonomia privada não existe apenas em sede contratual ou obrigacional, mas também em sede familiar. Quando escolhemos, na escalada do afeto, com quem ficar, com quem namorar, com quem ter uma união estável ou com quem casar, estamos falando em autonomia privada, obviamente.

Retornando ao art. 1.513 do Código Civil em vigor, é importante frisar que se deve ter muito cuidado na sua leitura. Isso porque, o real sentido do texto legal é que o Estado ou mesmo um ente privado não pode intervir coativamente nas relações de família. Entretanto, o Estado poderá incentivar o controle da natalidade e o planejamento familiar por meio de políticas públicas. Vale lembrar, também, que a Constituição Federal de 1988 incentiva a paternidade responsável e o próprio planejamento familiar, devendo o Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desses direitos, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais e privadas (art. 227, § 7º, da CF/88).

Além disso, o Estado deve assegurar a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integra, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações (art. 227, § 8º, da CF/88). Tudo isso consagra o princípio da não-intervenção. Mas vale lembrar que esse princípio deve ser lido e ponderado frente a outros princípios, caso do princípio do melhor interesse da criança, que passamos a analisar.

EDSON TEIXEIRA DE MELO80 - CARLOS ROBERTO GONÇALVES destaca que a Constituição Federal permite que a constituição de uma comunhão de vida familiar seja pelo casamento ou pela união estável, sem qualquer imposição ou restrição de pessoa jurídica de direito público ou privado.

MARIA HELENA DINIZ chama este princípio de pluralismo familiar, uma vez que a norma constitucional abrange a família matrimonial e as entidades familiares (união estável e família monoparental), ressaltando que o novo Código Civil nada fala sobre a família monoparental, formada por um dos genitores e a prole, esquecendo-se que 26% de brasileiros, aproximadamente, vivem nessa modalidade de entidade familiar.

SILVIO DE SALVO VENOSA ministra que a Constituição Federal de 1988 consagra a proteção à família no artigo 226, compreendendo tanto a família fundada no casamento, como a união de fato, a família natural e a família adotiva. De há muito, diz o mestre, o país sentia necessidade de reconhecimento da célula familiar independentemente da existência de matrimônio: "A família à margem do casamento é uma formação social merecedora de tutela constitucional porque apresenta as

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condições de sentimento da personalidade de seus membros e a execução da tarefa de educação dos filhos. As formas de vida familiar à margem dos quadros legais revelam não ser essencial o nexo família-matrimônio: a família não se funda necessariamente no casamento, o que significa que casamento e família são para a Constituição realidades distintas. A Constituição apreende a família por seu aspecto social (família sociológica). E do ponto de vista sociológico inexiste um conceito unitário de família".81

O Direito é norma da conduta social; a família, base da sociedade; a evolução desta não pode escapar à evolução do Direito, sob pena de termos normas jurídicas legítimas, mas ineficazes.

H) PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA – ART. 227, CAPUT, CF/88 E ARTS. 1.583 E 1.584 DO CC

FLÁVIO TARTUCE82 - Prevê o art. 227, caput, da Constituição Federal de 1988 que "é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão". Essa proteção é regulamentada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069/90), que considera criança a pessoa com idade entre zero e doze anos incompletos, e adolescente aquele que tem entre 12 e 18 anos de idade. Em reforço, o art. 3º do próprio ECA prevê que a criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e as facilidades, a fim de facultar-lhes o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Na ótica civil, essa proteção integral pode ser percebida pelo princípio do melhor interesse da criança, ou best interest of the child, conforme reconhecido pela Convenção Internacional de Haia, que trata da proteção dos interesses das crianças. O Código Civil de 2002, em dois dispositivos, acaba por reconhecer esse princípio de forma implícita. O primeiro dispositivo é o art. 1.583 do Código Civil em vigor, pelo qual, no caso de dissolução da sociedade ou do vínculo conjugal pela separação judicial por consentimento mútuo ou pelo divórcio direto consensual, será observado o que os cônjuges acordarem sobre a guarda de filhos.

Segundo o Enunciado n. 101 do Conselho da Justiça Federal, aprovado na I Jornada de Direito Civil, a expressão guarda de filhos constante do dispositivo deve abarcar tanto a guarda unilateral quanto a compartilhada, sempre atendido o melhor interesse da criança. Se não houver acordo entre os cônjuges, a guarda deverá ser atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la (art. 1.584 do CC). Certamente, a expressão melhores condições constitui uma cláusula geral, uma janela aberta deixada pelo legislador para ser preenchida pelo aplicador do Direito caso a caso. Como se pode perceber, no caso de dissolução da sociedade conjugal, a culpa não mais influencia quanto à guarda de filhos, devendo ser aplicado o princípio que busca a proteção integral ou o melhor interesse do menor, conforme o resguardo do manto constitucional.

I) PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE

FLÁVIO TARTUCE83 - O afeto talvez seja apontado, atualmente, como o principal fundamento das relações familiares. Mesmo não constando a palavra afeto no Texto Maior como um direito fundamental, podemos dizer que o afeto decorre da valorização constante da dignidade humana.

No que tange a relações familiares, a valorização do afeto remonta ao brilhante trabalho de JOÃO BAPTISTA VILELLA, escrito no início da década de 1980, tratando da Desbiologização da paternidade. Na essência, o trabalho procurava dizer que o vínculo familiar seria mais um vínculo de afeto do que um vínculo biológico. Assim, surgiria uma nova forma de parentesco civil, a parentalidade socioafetiva, baseada na posse de estado de filho.

A defesa da aplicação da paternidade socioafetiva, hoje, é muito comum entre os atuais doutrinadores do Direito de Família. Tanto isso é verdade que, na I Jornada de Direito Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Federal sob a chancela do Superior Tribunal de Justiça, foi aprovado o Enunciado n. 103, com a seguinte redação: "O Código Civil reconhece, no art. 1.593, outras espécies de parentesco civil além daquele decorrente da adoção, acolhendo, assim, a noção de que há também parentesco civil no vínculo parental proveniente quer das técnicas de reprodução assistida heteróloga relativamente ao pai (ou mãe) que não contribuiu com seu material fecundante, quer da paternidade socioafetiva, fundada na posse do estado de filho".

Na mesma Jornada, aprovou-se o Enunciado n. 108, prevendo que: "No fato jurídico do nascimento, mencionado no art. 1.603, compreende-se à luz do disposto no art. 1.593, a filiação

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consangüínea e também a socioafetiva". Em continuidade, na III Jornada de Direito Civil, idealizada pelo mesmo STJ e promovida em dezembro de 2004, foi aprovado o Enunciado n. 256, pelo qual "a posse de estado de filho (parentalidade socioafetiva) constitui modalidade de parentesco civil".

Na jurisprudência nacional, o princípio da afetividade vem sendo muito bem aplicado, com o reconhecimento da parentalidade socioafetiva, predominante sobre o vínculo biológico. Para nós, o princípio da afetividade é importantíssimo, pois quebra paradigmas, trazendo a concepção da família de acordo com o meio social. É sobre o princípio da função social da família que passamos a expor, para encerrar este breve trabalho.

J) PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DA FAMÍLIA

FLÁVIO TARTUCE84 - Há algum tempo se afirmava, nas antigas aulas de Educação Moral e Cívica, que "a família é a célula mater da sociedade". Apesar de as aulas serem herança do período militar ditatorial, a frase ainda serve como luva no atual contexto, até porque o art. 226, caput, da Constituição Federal de 1988 dispõe que a família é a base da sociedade, tendo especial proteção do Estado.

Assim, as relações familiares devem ser analisadas dentro do contexto social e diante das diferenças regionais de cada localidade. Sem dúvida, a socialidade também deve ser aplicada aos institutos do Direito de Família, assim como ocorre com outros ramos do Direito Civil.

A título de exemplo, a socialidade pode servir para fundamentar o parentesco civil decorrente da paternidade socioafetiva. Pode servir também para afastar a discussão desnecessária da culpa em alguns processos de separação. Pode servir, ainda, para a admissão de outros motivos para a separação-sanção em algumas situações práticas (v.g., infidelidade pela internet). Isso tudo porque a sociedade muda, a família se altera e o Direito deve acompanhar essas transformações.

A jurisprudência, por diversas vezes, reconhece a necessidade de interpretação dos institutos privados de acordo com contexto social. Em suma, não reconhecer função social à família e à interpretação do ramo jurídico que a estuda é como não reconhecer função social à própria sociedade!

9) DA NATUREZA JURÍDICA DO DIREITO DE FAMÍLIA

O Direito de Família trata dos direitos individuais projetados dentro do grupo familiar, com aspectos patrimoniais que devem atender aos interesses pessoais e familiares e se organiza em razão de seus membros e opera através da atuação deles, individualmente considerados, tendo sempre em vista o interesse do Estado. Segundo SÍLVIO DE SALVO VENOSA,85 o “Direito de Família possui forte conteúdo moral e ético. As relações patrimoniais nele contidas são secundárias, pois são absolutamente dependentes da compreensão ética e moral da família. O casamento ainda é o centro gravitador do direito de família, embora as uniões sem casamento tenham recebido parcela importante dos julgados nos tribunais, nas últimas décadas, o que se refletiu decididamente na legislação. Pode ainda ser considerada a família sob o conceito sociológico, integrado pelas pessoas que vivem sob um mesmo teto, sob a autoridade de um titular. Essa noção, sempre atual e freqüentemente reconhecida pelo legislador, coincide com a clássica posição do pater famílias do Direito Romano, descrita no Digesto por ULPIANO. Temos clara noção dessa compreensão quando, por exemplo, o art. 1.412, § 2º, do novo Código, ao tratar do instituto do uso, dentro do livro de direitos reais, descreve que "as necessidades da família do usuário compreendem as de seu cônjuge, dos filhos solteiros e das pessoas de seu serviço doméstico".

Vale ressaltar com MARIA HELENA DINIZ86 que, “a maioria das normas do direito de família são cogentes ou de ordem pública, insuscetíveis de serem derrogadas pelo simples arbítrio do sujeito, devendo ser, por isso, interpretadas restritivamente (SALVAT). Convém esclarecer que as relações jurídicas, como o casamento, a união estável, a adoção, o reconhecimento de filho, nascem de atos voluntários, que se submetem às normas regentes dos atos jurídicos, mas a vontade só se manifesta na sua realização, uma vez que seus efeitos já estão preestabelecidos na lei (PLANIOL, RIPERT E BOULANGER). Como pondera RUGGIERO, ‘todo direito de família repousa nesta idéia: os vínculos se estabelecem e os poderes se outorgam não tanto para criar direitos, como para impor deveres’. De forma que o poder familiar, a tutela, a curatela não são direitos, mas direitos-deveres, ou melhor, poderes-deveres.”

Muito se tem discutido sobre a natureza jurídica do Direito de Família: mantém-se a natureza de direito privado diante da grande ingerência do Estado nesta seara. A determinação da natureza dos direitos de família é problema que recebe soluções diferentes, conforme o ponto de vista de que seja encarado. Assim:

a) DIREITO PRIVADO

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Os que defendem que o Direito de Família ainda é um ramo do Direito Privado argumentam que:

a) a penetração dos princípios de norma cogente ou ordem pública não é estranha aos demais compartimentos jusprivatísticos e nem por isso o Direito Civil se publica todo ou se extingue como direito privado;

b) incluir o direito de família na seara jurispublicística implicaria admitir excessiva e nefasta ingerência do Estado no grupo familiar, conforme CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA87;

c) suas leis regulam e asseguram direitos individuais, a vida familiar funda-se na autonomia, a intervenção dos órgãos públicos tem caráter excepcional e não visa a realizar diretamente um interesse público;

d) a intervenção estatal não vai além de mera tutela, não acarretando responsabilidade direta do Estado na observância ou não das regras correspondentes;

e) a estrutura do direito de família é constituída de relações jurídicas entre indivíduos e para tutela de interesses individuais e não envolve diretamente uma relação entre o Estado e o cidadão, daí porque pondera ORLANDO GOMES88 que "não adianta ladear o problema. Necessário determinar se o Direito de Família é público ou privado, à luz dos critérios tradicionais de distinção, que, embora falhos, são geralmente aceitos, quando menos por interesse didático. Pelos sujeitos das relações que disciplina, pelo conteúdo dessas relações, pelos fins de seu ordenamento e pelas formas de atualização, o direito de família é direito privado, e parte integrante do direito civil. Pertencem, com efeito, a este termo do Direito porque, na exposição de TRIMARCHI - suas leis regulam e asseguram direitos individuais, a vida familiar funda-se na autonomia, a intervenção dos órgãos públicos tem caráter excepcional e não visa a realizar diretamente um interesse público, em suma, a estrutura do direito de família é constituída de relações jurídicas entre indivíduos e para tutela de interesses individuais.";

f) ramo do direito civil menos individualista, dado o reduzido e limitado papel da vontade, “pois as normas jurídicas fixam-lhe todos os efeitos, salvo nas raras exceções em que se apresentam como normas permissivas ou supletivas, em matéria de regime de bens, deixando margem à autonomia da vontade”.” [...] Assim no direito de família a regra é o princípio estatutário e a exceção, a autonomia da vontade, porque o interesse individual está sujeito ao da família. Como pontifica RUGGIERO, ‘através do interesse familiar exige e recebe proteção um interesse mais alto: o do Estado, cuja força de desenvolvimento e de vitalidade depende da solidez do núcleo familiar’. Conseqüentemente, o Estado, consciente de seus objetivos, não pode entregar ao indivíduo a sorte da família. Logo, os efeitos do matrimônio, do companheirismo e da filiação, a extensão do poder familiar e do poder tutelar não podem submeter-se ao arbítrio individual, por manifestarem um interesse da comunidade política, já que a sólida organização da família, segurança das relações humanas, constitui a base ou alicerce de toda a estrutura da sociedade e da preservação e fortalecimento do Estado,” − conforme assinala MARIA HELENA DINIZ.89

Revela SÍLVIO DE SALVO VENOSA90 que, “embora o Direito de Família se utilize

majoritariamente de normas imperativas para ordenar as relações entre seus membros, como afirma GUILLERMO A. BORDA, ‘a pretensão de deslocar a família do Direito Privado representa um contra-senso. Não se pode conceber nada mais privado, mais profundamente humano do que a família, em cujo seu o homem nasce, vive, ama, sofre e morre. O Direito de Família visto como direito público prepara o terreno para um intervencionismo intolerável do Estado na vida íntima, como tantos que ocorrem ordinariamente.’ Acrescenta o autor, com propriedade, ser sintomático que os únicos regimes que trataram da família como direito público foram os falecidos e não saudosos regimes comunistas da Rússia, Iugoslávia, Bulgária e a extinta Tchecoslováquia. Desse modo, ‘não há como se admitir o Direito de Família como direito público em um Estado democrático, porque cabe a ele tutelar e proteger a família, intervindo de forma indireta’”. apenas quando essencial para sua própria estrutura.”

Pondera ainda MARIA HELENA DINIZ91 que a “intervenção protetora do Estado é um fato universal, pois o poder público de todas as nações pretende garantir a família, protegendo-a, evitando abusos, propiciando melhores condições de vida às novas gerações, ajudando-a a exercer beneficamente seus poderes, criando órgãos sociais que a tutelam, como os Conselhos de Família e de Tutela, o Ministério Público, o Juizado da Infância e da Juventude etc. Porém não se deve inserir o direito de família na seara juspublicística, pois isso ‘implicaria admitir excessiva e nefasta ingerência do Estado no grupo familiar’ (LIMONGI FRANÇA) e, além do mais, como escreve ORLANDO GOMES, pelos sujeitos das relações que disciplina, pelo conteúdo dessas relações, pelos fins de seu ordenamento e pelas formas de atuação, o direito de família é direito privado e parte integrante do direito civil (ORLANDO GOMES; LUIZ EDSON FACHIN).”

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Apesar de realçar que há tendência de alguns estudiosos em querer classificar o Direito de Família como ramo do direito público, face aos princípios de ordem pública nele refletidos e ao caráter institucional, que se verifica quanto a certas relações jurídicas oriundas de manifestação de vontade, mas submetidas a efeitos preestabelecidos em lei, a ponto de os sujeitos não poderem alterá-las da maneira como lhes convém, − MARIA ALICE ZARANTIN LOTUFO92 considera “que ele pertence ao direito privado, devendo ser estudado onde se encontra, no Direito Civil. As relações de família, embora envolvam direitos e interesses que são protegidos pelo Estado, acontecem entre os particulares, no próprio grupo familiar, não importando que a maioria das normas que as circundam seja cogente e de natureza estatuária. Não se pode desconsiderar que as relações nascem de atos de vontade e interessam diretamente aos particulares, que são as partes envolvidas, e só indiretamente devem interessar à sociedade.”

Finalmente, pondera SÍLVIO DE SALVO VENOSA93 que “o que confere a um ato a natureza contratual não é a determinação , de seu conteúdo pelas partes, mas sua formação por manifestação de vontade livre e espontânea. ORLANDO GOMES conclui que o casamento é, porém, um contrato com feição especial, "a que não se aplicam as disposições legais dos negócios de direito patrimonial que dizem respeito: (a) à capacidade dos contraentes; (b) aos vícios de consentimento; (c) aos efeitos". Em uma síntese das doutrinas, pode-se afirmar que o casamento-ato é um negócio jurídico; o casamento-estado é uma instituição.”

b) DIREITO PÚBLICO

Devido à grande intervenção do Estado94 no Direito de Família, juristas há (CICU, RUGGIERO) que o consideram parte do direito público e argumentam que:

a) várias de suas normas são cogentes ou imperativas devido a intervenção do poder público num interesse protetor do Estado;

b) tem em vista mais do que o indivíduo, a tutela de toda a sociedade; c) suas normas são de ordem pública (SAVATIER) − mais que o indivíduo, interessa toda sociedade; d) suas normas não podem ser derrogadas pelo simples arbítrio do sujeito. Como ramo do direito

público se posicionam SÍLVIO RODRIGUES95 e SAN TIAGO DANTAS96 de quem se extrai a seguinte exposição: “quando se contrata na vida privada, contrata-se o que se quer; a vontade é a norma que define os objetivos; mas, no Direito de Família, como os atos jurídicos não têm outro fim senão conferir status, eles são atos de pura adesão; o indivíduo não os pode modelar deste ou daquele modo, tem apenas que, através do ato jurídico, aderir às características de um determinado estado de família. Não se admitem modalidades. Não se admite que as partes introduzam elementos acidentais ao tipo do negócio; não se pode contrair casamento submetido a condição, a modo ou a termo; não se pode reconhecer o filho sob condição, não se pode adotar nem praticar nenhum ato de Direito de Família sujeito a termo. Outro caso é a representação, que é comum a todos os negócios jurídicos, mas geralmente se exclui no Direito de Família. Aqui abre-se a exceção contrária. Não se admite a representação nos atos que importam exercício de um poder inerente ao status, porque a lei confere um poder em razão de pessoa, e não em razão de capacidade jurídica.”

Segundo SILVIO RODRIGUES97, “o interesse do Estado pela família faz com que o ramo do direito que disciplina as relações jurídicas que se constituem dentro dela se situe mais perto do direito público que do direito privado. Dentro do direito de família o interesse do Estado é maior do que o individual. Por isso, as normas de direito de família são, quase todas, de ordem pública, insuscetíveis, portanto, de serem derrogadas pela convenção entre particulares. [...] Com efeito, não são poucos os deveres impostos que surgem sob a máscara de direitos. Assim, por exemplo, o poder familiar. Se no Direito Romano era uma prerrogativa concedida ao pater, de conteúdo quase ilimitado, no direito atual representa um dever imposto ao seu titular, de zelar pela pessoa e bens dos filhos, com severas sanções pelo descumprimento dessa obrigação [...] Daí a razão por que se nota uma intervenção crescente do Estado no campo do direito de família, visando conceder-lhe maior proteção, melhorar o padrão racial, propiciar melhores condições de vida às gerações novas etc. A começar pela norma constitucional já citada, segundo a qual a família fica sob a proteção especial do Estado, encontram-se regras igualmente importantes, reveladoras da apontada vocação.”

Explica MARIA RITA DE HOLANDA SILVA OLIVEIRA98 que não há que se falar na invasão da esfera pública sobre a privada, mas sim de "estrutural transformação do conceito de Direito Civil, que abrigou, na tutela das atividades e dos interesses da pessoa humana, técnicas e instrumentos

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tradicionalmente próprios do direito público, como, por exemplo, a aplicação direta das normas constitucionais nas relações jurídicas de caráter privado".

Destas discussões relativas à natureza jurídica do Direito de Família, podem ser extraídas as principais CARACTERÍSTICAS deste ramo do Direito:

a) não é estático: uma vez que o direito serve à vida e é regramento da vida onde o movimento não para por estarem os indivíduos per si e nas suas relações em constante mutação, se vê aqui grande dinamismo para acompanhar às exigências sociais, variáveis no tempo e no espaço;

b) é um direito personalíssimo por se ligar à pessoa; c) dado o seu caráter social e de apelo de interesse público, quase sempre será irrenunciável,

intransferível e intransmissível por herança, como regra geral; d) de forma global, suas normas não admitem condição ou termo; e) como norma genérica não admite seu exercício por procurador, salvo previsões expressas em lei; f) e há o predomínio de direitos imprescritíveis apesar da caducidade de determinadas ações

quando previsto de forma específica na lei. Talvez a razão esteja com CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, bem como com SÍLVIO DE SALVO

VENOSA99 quando pondera que “levando em conta suas particularíssimas características, talvez seja melhor considerar, no futuro bem próximo, o direito de família como um microssistema jurídico, integrante do denominado direito social, embora essa denominação seja redundante, na zona intermediária entre o direito público e o privado, possibilitando a elaboração de um Código de Família, como em outras legislações. Daí por que legislativamente seria melhor, já atualmente, que tivéssemos um estatuto da família, que albergasse todos os seus princípios, bem como regulasse também o direito do menor e institutos correlatos. Não foi a posição do Código de 2002 que manteve o compartimento dedicado a esse campo jurídico. De qualquer forma, sente-se na atualidade que o Direito de Família desgarra-se cada vez mais do Direito Civil, ganhando autonomia de estudos e conseqüentemente de especialistas. Como regra geral, os novos mestres e autores de direito de família que surgem em nosso país, a exemplo do que já ocorria em países estrangeiros, tendem a especializar-se exclusivamente nesse campo, não se dedicando mais aos outros campos do direito privado. A essa situação agrega-se o fato de que o juiz de uma Corte de família deve ter vocação e preparo emocional diverso do magistrado que decide questões exclusivamente patrimoniais. Daí por que, sempre que possível, a organização judiciária dos Estados cria varas especializadas em direito de família, com serviços auxiliares de ordem sociológica e psicológica. A mediação deve ganhar espaço e converter-se na grande corte de soluções para os problemas da família.”

10) NOVOS RUMOS DO DIREITO DE FAMÍLIA

Para o prof. EDUARDO DE OLIVEIRA LEITE,100 o constante devenir que caracteriza a organização familiar é responsável pelas incessantes transformações que, na ótica de JEAN CARBONNIEER se resumem em seis nítidos rumos:

1. a ESTATIZAÇÃO: se manifesta na crescente ingerência do Estado nas relações familiares, isto é, a tendência de publicização em disciplina sempre pautada pelo mais intenso privativismo;

2. a RETRAÇÃO: é nítida na redução do grupo familiar aos pais e filhos, ou, a substituição da família patriarcal pela família nuclear;

3. a PROLETARIZAÇÃO: o grupo doméstico perde sua característica plutocrática (dominado pelo dinheiro) fixando-se em relações do tipo alimentar, traduzível em direitos e obrigações incidentes em salários;

4. a DESENCARNAÇÃO: ou seja, a substituição do elemento carnal ou biológico, pelo elemento psicológico ou afetivo;

5. a DESSACRALIZAÇÃO: o desaparecimento do elemento sagrado e a valorização do público com larga margem à vontade individual;

6. a DEMOCRATIZAÇÃO: a sociedade familiar transforma-se numa sociedade igualitária; substituição da hierarquia pelo companheirismo.

11) DA ESTRUTURA DO DIREITO DE FAMÍLIA NO CC/02

A Lei n. 1.046 de 10.1.2002 (CC/02) revogou a Lei n. 3.071 de 1o.1.1916, instituindo um novo Código Civil, que deslocou o Direito de Família do Livro I para o IV, onde parece melhor colocado por pressupor muitas das definições dos livros anteriores.

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O instituto da ausência deixou de ser tratado no Livro destinado ao Direito de Família, deslocado agora para o Livro I que se refere à Parte Geral, abrangendo os arts. 22 a 39, nos quais aborda também questões que alcançam o Direito das Sucessões. Justifica-se a modificação pelos importantes reflexos que a ausência produz no campo da capacidade para os atos da vida civil e negocial.

O Direito de Família está abordado nos arts. 1.511 a 1.783 do CC/02 (ou seja, em 272 dispositivos, quando no CC/16 abrangia, originalmente, um total de 304 artigos – do art. 180 ao 484), dividido em quatro Títulos, dos quais apenas dois contém Subtítulos, divididos em Capítulos.

O TÍTULO I é dedicado ao DIREITO PESSOAL que contém apenas dois Subtítulos: I - Do Casamento (arts. 1.511 a 1.590); II - Das Relações de Parentesco (arts. 1.591 a 1.638). O TÍTULO II trata do DIREITO PATRIMONIAL em quatro Subtítulos: I – Do regime de bens entre os cônjuges (arts. 1.639 a 1.688); II – Do usufruto e da administração dos bens de filhos menores (arts. 1.689 a 1.693); III – Dos alimentos (arts. 1.694 a 1.710); IV – Do bem de família (arts. 1.711 a 1.722); O TÍTULO III aborda exclusivamente a UNIÃO ESTÁVEL, nos arts. 1.723 a 1.727. E o TÍTULO IV contém as normas DA TUTELA E DA CURATELA em dois capítulos: I – Da tutela (arts. 1.728 a 1.766) e II – Da curatela (arts. 1.767 a 1.783). Não há justificativa para a família constituída pelo casamento ser objeto do Direito Pessoal

enquanto a união estável é tratada como um título apartado, o III, que não se enquadrou no direito pessoal nem no patrimonial. Na verdade, a união estável não deveria ser objeto de um Título exclusivo que a isolou do instituto da família constituída pelo casamento. O conteúdo pessoal da união estável deveria estar no Título I, ao lado do casamento ou em um Subtítulo próprio, enquanto suas conseqüências patrimoniais deveriam ser abordadas dentro do Título II, que trata do direito patrimonial em todo o Direito de Família. Assim, por coerência, após o Subtítulo I, deveria haver um relativo ao “regime de bens entre os companheiros”.

Em um balanço geral, no Direito de Família, há regras novas que apenas consagram o que já estava incorporado e absorvido na teoria e na prática (a isonomia no tratamento dos filhos, proibidas discriminações; a igualdade dos direitos do homem e da mulher considerando-se, por exemplo, não recepcionada a hipótese de anulação de casamento por desvirginamento da mulher anterior ao casamento e desconhecido do marido, dentre outros); há regras realmente novas que são inovações que realmente a sociedade ansiava e está pronta para elas (elevação da relação entre marido e mulher como consortes que estabelecem uma comunhão plena de vida; co-administração e co-sustento da família; e disciplina pormenorizada do casamento por procuração imprescritibilidade da negatória de paternidade com ampliação das hipóteses de sua aplicação); mas há, também, normas que ainda são polêmicas e discutíveis no campo jurídico-filosófico, e a respeito das quais teme-se que a sociedade não esteja tão pronta para elas, correspondendo a inovações que impostas pelos teóricos para a vida real da família, e que poderão levar a uma reação incerta (manutenção do dever alimentar independentemente da culpa do cônjuge necessitado; possibilidade de se pedir alimentos renunciados na separação, por exemplo). Por outro lado, ainda perdeu-se oportunidade para fazer inovações que passam da hora de acontecer (por exemplo, eliminar a necessidade de publicação de editais no processo de habilitação para o casamento civil que só o encarece e o torna mais demorado) e acrescente-se ainda que se instituíram burocracias que só dificultam o casamento (como exigência de homologação da habilitação ou o prazo de 90 dias, decadencial, para registro do casamento religioso com efeitos civis).

É necessário salientar que o novo Código, consagrando os efeitos e as conseqüências que a separação de fato dos cônjuges gera, passou a prever, agora, em diversos dispositivos, tal situação que não caracteriza um "estado civil" nem tem o condão de por fim à sociedade conjugal, mas é abordada de forma expressa como situação jurídica apta a gerar eficácia, como se pode exemplificar:

a) art. 25: “O cônjuge do ausente, sempre que não esteja separado judicialmente, ou de fato por mais de dois anos antes da declaração da ausência, será o seu legítimo curador.”

b) art. 793: “É válida a instituição do companheiro como beneficiário, se ao tempo do contrato o segurado era separado judicialmente, ou já se encontrava separado de fato.”

c) art. 1.585: “Em sede de medida cautelar de separação de corpos, aplica-se quanto à guarda dos filhos as disposições do artigo antecedente.”

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d) art. 1.642: “Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quanto a mulher podem livremente: V - reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo outro cônjuge ao

concubino, desde que provado que os bens não foram adquiridos pelo esforço comum destes, se o casal estiver separado de fato por mais de cinco anos;”

e) art. 1.723: ... “§ 1º - A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.”

f) art. 1.775: “O cônjuge ou companheiro, não separado judicialmente ou de fato, é, de direito, curador do outro, quando interdito.”

g) art. 1.801: “Não podem ser nomeados herdeiros nem legatários: III - o concubino do testador casado, salvo se este, sem culpa sua, estiver separado de fato do

cônjuge há mais de cinco anos;” h) art. 1.830: “Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da

morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.”

12) DAS DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS DO LIVRO COMPLEMENTAR E DAS LEIS REFERENTES AO DIREITO DE FAMÍLIA AFETADAS PELO CC/02

Ensina CARLOS ROBERTO GONÇALVES101 que "a lei passa por três fases: a da elaboração, a da promulgação e a da publicação. Embora nasça com a promulgação, só começa a vigorar com sua publicação no Diário Oficial. A vigência da lei compreende três momentos: o início, a continuidade e a cessação. Com a publicação, tem-se o início da vigência, tornando-se obrigatória, pois ninguém pode escusar-se de cumpri-la alegando que não a conhece (art. 3o)."

Nos termos do caput do art. 2º da Lei de Introdução ao Código Civil (Dec. Lei 4.657, de 4.9.42) a norma poderá ter vigência temporária ou permanente, o que ocorre quando se destina para o futuro sem prazo determinado. É nesse caso que se enquadra o CC/02 cujo caráter permanente é indiscutível e por isso, deverá ter vigência até que seja modificado ou revogado por outra da mesma hierarquia ou de hierarquia superior. Dai afirma MARIA HELENA DINIZ102 que, em relação à lei permanente, como é a hipótese do CC/02, “jurisprudência, costume, regulamento, decreto, portaria, avisos não poderão revogar a lei, não prevalecendo nem mesmo na parte em que com ela conflitarem.”

A revogação é um termo genérico que indica a perda de eficácia de uma lei. Segundo CARLOS ROBERTO GONÇALVES103 "é a supressão da força obrigatória da lei, retirando-lhe a eficácia", ou seja constitui a perda de obrigatoriedade da norma. A revogação admite duas espécies: a) a ab-rogação, ocorre quando há supressão total da norma anterior, que deixa de ter eficácia por ser substituída inteiramente pela lei revogadora.

Pode a revogação ser expressa ou tácita, nos termos do § 1o, do art. 2o da LICC que dispõe que “a lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.”

A revogação expressa foi disciplinada no art. 2.045 do CC/02 que, originalmente revogava "toda a legislação civil e mercantil abrangida por este Código, ou com ele incompatível", e teve sua redação final alterada por emenda proposta pelo Deputado RICARDO FIUZA, que objetivou "sanar incorreção de técnica legislativa do texto do projeto quando previu a revogação genérica de lei. Como assinalado por NELSON NERY JUNIOR E ROSA NERY,104 "que não é mais admissível cláusula legal revogadora genérica (“revogam-se as disposições em contrário”)" em razão do disposto no art. 9o Lei Complementar 95/98, com a redação dada pela Lei Complementar 107/01 que determina que da norma revogadora tem de constar expressamente a norma revogada. Em consonância com a exigência de menção expressa dos dispositivos ou leis que revoga, foi aprovada a previsão do art. 2.045 de que o CC/02 revogou de maneira expressa apenas a Lei n. 3.071, de 1.1.1916, que continha o Código Civil, assim como de toda a Parte Primeira do Código Comercial - Lei n. 556, de 5.6.1850. O art. 2.045 ab-rogou o CC/16 e derrogou o Código Comercial.

A revogação tácita é prevista em duas hipóteses na parte final do § 1o do art. 2o da LICC, do que se deduz: a) o CC/02 revogou tacitamente as normas anteriores que com ele tornaram-se incompatíveis, explícita ou implicitamente; e, b) o CC/02 revogou ainda de maneira tácita, matéria inteiramente por ele regulada, de que tratava lei anterior. Em teoria, o CC/02 buscou tratar de toda

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matéria concernente a todos os institutos de Direito de Família, com o que, estritamente sob esse ângulo, seria forçoso concluir que a Lei 6.515/77 estaria totalmente revogada porque tratava da disciplina da dissolução da sociedade conjugal e do casamento, matéria que foi integralmente regulamentada pelo Capítulo X, do Título I, do Livro IV do CC/02. No entanto, foi ressaltado no art. 2.043 que "até que por outra forma se disciplinem, continuam em vigor as disposições de natureza processual, administrativa ou penal, constantes de leis cujos preceitos de natureza civil hajam sido incorporados a este Código.” Por conseqüência, na medida em que a referida Lei 6.515/77 contém disposições de natureza processual, essas continuarão em vigência, com o que não se poderá considerar que tal Lei tenha sido integralmente revogada apesar da disciplina da dissolução da sociedade e do vínculo conjugal estar regida, na sua totalidade, pelos arts. 1.571 a 1.582 do CC/02. O referido art. 2.043, observam COSTA LOURES E TAÍS GUIMARÃES,105 "nos remete diretamente a dois princípios fundamentais de direito intertemporal: o da força revogadora da lei posterior sobre lei anterior, nos casos indicados no § 1o do artigo 2o da Lei de Introdução; é o expresso no § 2o do mesmo artigo, segundo o qual a lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior. Muito cautelosamente interposto entre os dois princípios, um de ordem geral, outro de ordem particular, o dispositivo do presente artigo estabelece seguem em vigor os dispositivos de natureza processual administrativa ou penal, constantes de leis especiais ou extravagantes cujos preceitos de natureza civil tenham sido incorporados ao presente Código, enquanto por outra forma não sejam disciplinados."

Dada a dificuldade de identificação precisa sobre as normas revogadas tacitamente, cabe argumentar ainda com MARIA HELENA DINIZ106 que, “lei nova que vier a contemplar disposição geral ou especial, a par das já existentes, não revogará, nem alterará a lei anterior, se a lei apenas estabelecer disposições especiais ou gerais, sem conflitar com a antiga, não a revogará. A disposição especial não revoga a geral, nem a geral revoga a especial, senão quando a ela se referir alterando-a explícita ou implicitamente. [...] Se a lei nova for norma geral, e a antiga, especial, ou vice-versa, ambas poderão ter vigência, desde que numa não venha a colidir com a outra.”

Ponderada a colocação de GALDINO AUGUSTO COELHO BORDALLO107 segundo a qual “há que se verificar qual o papel deste novo texto no sistema legislativo brasileiro. Como vem a substituir o Código Civil de 1916, figurará como constituição do direito privado? Não vivemos mais numa sociedade individualista como a existente nos fins do séc. XIX e início do séc. XX. É impossível que o Novo Código Civil queira ter a pretensão de trazer em seu bojo integral regulamentação do direito privado, sob pena de virmos a ter grande retrocesso nas conquistas alcançadas no último lustro. Não se deve temer que o Novo Código Civil queira ser a única lei a regular as relações jurídicas privadas, pois como se verifica pela exposição de motivos do mesmo, temos que compreendê-lo como lei básica, mas não global, do direito privado. [...] Assim, o Novo Código Civil, por não ter a pretensão de regular todo o direito privado, deverá conviver pacificamente com toda a legislação extravagante existente, desde que esta não lhe seja contrária.”

Com razão MARIA HELENA DINIZ,108 quando considera que, mesmo diante da redação final dada ao art. 2.045, esse dispositivo “tornou-se inócuo, pois louvável seria que tivesse tido o cuidado de indicar, minudentemente, quais as leis civis ou mercantis que foram ab-rogadas ou derrogadas. Apenas dessa forma seria possível eliminar as várias dúvidas, que poderão advir com a entrada em vigor do novel Código Civil, sobre quais das normas vigentes foram revogadas. A omissão legislativa irá requerer do jurista e do aplicador certa argúcia para suprir a falta de uma completa revogação expressa, averiguando quais as normas ainda vigentes, traçando o novo perfil do Código Civil.”

Buscando solucionar as discussões previsíveis sobre as normas que tacitamente foram revogadas pelo novo CC, no PROJETO DE LEI 6.960/02 que apresentou, o Dep. RICARDO FIÚZA sugeriu alteração do referido art. 2.045 para prever mais detalhadamente as normas revogadas, passando a ter a seguinte redação: “Revogam-se a Lei n. 3.071, de 1o de janeiro de 1916 - Código Civil, a Parte Primeira do Código Comercial, Lei n. 556, de 25 de junho de 1.850, as Leis n. 4.121, de 27/8/1962, 8.971, de 29/12/1994 e 9.278, de 10/05/1996, e ainda os arts. 1o a 27 da Lei n. 4.591, de 16/12/1964, os arts. 71 a 75 da Lei n. 6.015, de 31/12/1973, os arts. 1o a 33, art. 43, art. 44, art. 46, da Lei n. 6.515, de 26/12/1977, os arts. 39 a 52, da Lei n. 8.069, de 13/07/1990.” Tal enumeração expressa sobre as leis ou dispositivos revogados é muito bem-vinda para evitar as intermináveis discussões, já previsíveis, das normas das várias leis específicas que continuam ou não em vigência com o CC/02.

No entanto, parece ter havido omissão, neste ponto, quanto a parte da Lei 6.015 relativa à habilitação de casamento (arts. 67 a 69 - que constam dos arts. 1.525 a 1.532 do CC/02), da legitimação adotiva (arts. 95 e 96 - abordada nos arts. 1.627 a 1.629) e do bem de família (arts. 260 a 265 - agora tratados nos arts. 1.711 a 1.714). Por sinal, a Lei de Registros Públicos exigirá revisão total, a mais rápida possível. Há omissão quanto à revogação das Leis relativas à filiação e que são as de nos 883, de 21.10.49,

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7.250 de 1984, 8.560, de 29.12.92 e os arts. 26 e 27 da 8.069 de 13.7.90 (ECA). Quanto à Lei 6.515/77 deveria ser expresso que a revogação daqueles dispositivos inclui a das leis posteriores que modificaram a redação original (em especial as Leis de nos 7.841/89 e 8.408/92).

Outras leis ou dispositivos revogados pelo novo CC e não mencionados na redação proposta pelo PROJETO DE LEI 6.960/02 para o art. 2.045 podem aqui ser exemplificados:

a) Dec. Lei 3.200/41 - seus dispositivos mais importantes (arts. 1º a 3º) que não haviam sido repetidos no novo CC estão sendo supridos pela introdução do parágrafo único ao art. 1.521;

b) art. 32 da Lei 6.015 ficou incompatível com o art. 1.544. c) art. 34, § 2º da Lei 6.515/77 é incompatível com o § único do art. 1.574 porque na Lei do Divórcio o

juiz poderia deixar de homologar apenas a cláusula lesiva, decretando a separação. Pelo novo CC, está obrigado a recusar a decretação da própria separação enquanto toda a convenção não preservar suficientemente os interesses dos filhos ou de um dos cônjuges.

d) art. 31 da Lei 6.515/77 porque o art. 1.581 não exige partilha prévia em qualquer modalidade de divórcio.

Detalha NELSON NERY JUNIOR109 que, em várias passagens, ao contrário de revogação, "há

numerosas referências no CC, no sentido de declarar expressamente estarem em vigor disposições constantes de lei especial, como é o caso, vg, da impenhorabilidade do imóvel residencial (CC 1.711), da locação de prédio urbano (CC 2.036), da lei de sociedades anônimas (CC 1.089) etc. O CC regula as relações jurídicas civis e, na parte obrigacional, as relações jurídicas empresariais. Não foi objeto de regulação pelo CC as relações jurídicas de consumo. Estas últimas são regidas completamente pelo CDC.” Importante abordar ainda o princípio da irretroatividade da lei consagrado no art. 6o da Lei de Introdução ao Código Civil (Dec. Lei 4.657, de 4.9.42) ao dispor que “a lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”, institutos definidos em seus parágrafos:

a) “reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou”.” (§ 1º);

b) “consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo prefixo, ou condição preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem.” (§ 2º);

c) “chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso.” (§ 3º). Salientam NELSON E ROSA NERY110 que "a lei nova tem efeito imediato e geral (LICC 6º caput), atingindo somente os fatos futuros (facta futura) que se realizarem já sob sua vigência, não abrangendo os fatos pretéritos (facta praeterita), estes últimos protegidos pela cláusula inconstitucional.”

Outra disposição geral importante do CC/02, com reflexo também no Direito de Família, está contida no art. 2.028, que disciplina a contagem dos prazos estabelecendo que “serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.” Explicam COSTA LOURES E TAÍS GUIMARÃES 111 que “assegura-se a manutenção dos prazos fixados no Código anterior, em beneficio da segurança e estabilidade das relações jurídicas, desde que, na data de entrada em vigor deste Código - 11.01.2003 -, já houver transcorrido mais da metade do prazo anteriormente previsto, incluídos os de leis especiais." Didaticamente, exemplificam JORGE FRANKLIN FELIPE ALVES E GERALDO ALVES112 que, “o prazo ordinário prescricional dos direitos pessoais, que era de 20 anos (Código de 1916, art. 177), foi reduzido para 10 anos (novo Código, art 205). Se, por ocasião da vigência do novo Código, já houver passado mais de 10 anos, o prazo prescricional continuaria sendo o de 20 anos da lei anterior, sob pena de já haver se consumado a prescrição. Mas, mesmo que houvessem decorrido, por exemplo, nove anos e meio, o prazo restante, aplicada a nova lei, seria apenas de seis meses, o que se afigura exíguo e injusto.”

Acrescente-se, pela importância, que o art. 2.035 dispõe que: “a validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da entrada em vigor deste Código, obedece ao disposto nas leis anteriores, referidas no art. 2.045, mas os seus efeitos, produzidos após a vigência deste Código, aos preceitos dele se subordinam, salvo se houver sido prevista pelas partes determinada forma de execução.” Estabelecendo o seu parágrafo único que “nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a função social da propriedade e dos contratos.” Este dispositivo busca coerência com o princípio constitucional consagrado no art. 5º, XXXVI da CF/88 que garante a irretroatividade da lei para não ferir o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, estabelecendo que a lei vigente quando da celebração do ato ou negócio jurídico é a que regula a sua validade. No entanto, os efeitos do ato ou negócio

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jurídico que forem praticados após a vigência do CC/02, subordinam-se aos seus preceitos, salvo previsão em contrário pelas partes quanto a forma de execução. A liberdade de contratar assegurada no caput acaba por sofrer limitação quando no parágrafo único retira validade de convenção que contrariar preceitos de ordem pública previstos no CC/02, dentre os quais chama a atenção para aqueles que asseguram a função social da propriedade e dos contratos (arts. 1.228, § 1º, e 421).

JORGE FRANKLIN FELIPE ALES E GERALDO ALVES113 lembram que "a propriedade tem, segundo a Constituição Federal, uma função social (art 5o, inciso XXIII). Também a posse denota dita função, ao se perceber a tendência de redução dos prazos de usucapião, especialmente quando o ocupante faz a terra produtiva ou utiliza o imóvel como sua moradia. O art 5o, inciso XXVI, da Constituição, proíbe penhora para pagamento de débitos decorrentes da atividade produtiva do imóvel. E o art. 186 fala da função social da propriedade rural. Todo o Código se inspira nesse basilar principio constitucional. Daí a razão do dispositivo que veda sejam burladas as regras que atribuem função social à propriedade e ao contrato. A Emenda Constitucional no 26/2000 alterou o art. 6o da constituição, para incluir, entre os direitos sociais, o da moradia.” Finalmente, quanto ao art. 2.039, segundo o qual “o regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei n. 3.071, de 1o de janeiro de 1916, é o por ele estabelecido”, reserva-se a sua análise para o capítulo destinado à abordagem da disciplina referente aos regimes de bens.

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1. ESTRUTURA DO DIREITO DE FAMÍLIA NO CC/02

CÓDIGO CIVIL DE 1916 CÓDIGO CIVIL DE 2002

LIVRO I – DO DIREITO DE FAMÍLIA LIVRO IV – DO DIREITO DE FAMÍLIA

TÍTULO I – DO CASAMENTO • com 7 capítulos – abrangia os arts. 180 a 228; no CC/02 perde o status de “Título” e passa a constituir mero “Subtítulo” do Título I, que aborda o Direito Pessoal.

TÍTULO I – DO DIREITO PESSOAL • com 2 Subtítulos, alcança os arts. 1.511 a 1.638: • I – DO CASAMENTO – arts. 1.511 a 1.590, dividido em 11 Capítulos, destinado o 9o à eficácia do casamento, que era objeto do Título II do CC/16 e o 11o à proteção dos filhos, antes tratado no Título IV que abordava a dissolução da sociedade conjugal;.

• II – DAS RELAÇÕES DE PARENTESCO – arts. 1.591 a 1.638, contendo 5 Capítulos, o último com 3 Seções; passou a abranger a proteção aos direitos de conteúdo pessoal dos filhos, estes constantes do Título da IV da dissolução da sociedade conjugal, no CC/16.

TÍTULO II - DOS EFEITOS JURÍDICOS DO CASAMENTO

• com 3 capítulos – arts. 229 a 255 − no CC/02 é rebaixado a mero Subtítulo do Título I relativo ao Direito Pessoal.

TÍTULO II – DO DIREITO PATRIMONIAL • com 4 Subtítulos - arts. 1.639 a 1.722: • I – DO REGIME DE BENS ENTRE OS CÔNJUGES – arts. 1.639 a 1.688, dividido em 6 Capítulos - no CC/02 perdeu o status de “Título III” que tinha no CC/16 (era o n. III);

• II – DO USUFRUTO E DA ADMINISTRAÇÃO DOS BENS DE FILHOS MENORES – arts. 1.689 a 1.693 − deslocado do Título IV do CC/16 uma vez que o atual abordou separadamente a relação pessoal da patrimonial dos pais em relação aos filhos;

• III – DOS ALIMENTOS – arts. 1.694 a 1.710 − deslocado do Título V que tratava apenas das relações oriundas de parentesco;

• IV – DO BEM DE FAMÍLIA – arts. 1.711 a 1.722 − que se encontrava no Capítulo V, do Livro II que se referia aos bens no CC/16.

TÍTULO III – DO REGIME DOS BENS ENTRE OS CÔNJUGES

• com 6 capítulos – arts. 256 a 314 − passa a ser apenas um dos 4 “Subtítulos” que compõem o Título II do Livro de Direito de Família, referindo-se ao Direito Patrimonial.

TÍTULO III – DA UNIÃO ESTÁVEL • arts. 1.723 a 1.727 (sem subtítulos).

TÍTULO IV - DA DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE CONJUGAL E DA PROTEÇÃO DA PESSOA DOS

FILHOS • com apenas 2 capítulos, abrangia os arts. 315 a 329, observando-se que o 1º destes foi integralmente revogado pela Lei do Divórcio (n. 6.515/77)

TÍTULO IV – DA TUTELA E DA CURATELA • arts. 1.728 a 1.783 - dividido em 2 Capítulos, o primeiro contendo 7 Seções e o segundo com 3 Seções; foi excluída do Livro do Direito de Família, a ausência, agora abordada na parte geral, Livro I.

TÍTULO V – DAS RELAÇÕES DE PARENTESCO • com 7 capítulos – arts. 330 a 405 - destinava o último deles à disciplina Dos Alimentos, agora matéria versada no Título II do Livro do Direito de Família, expressamente destinado ao Direito Patrimonial.

TÍTULO VI – DA TUTELA, DA CURATELA E DA

AUSÊNCIA • com 3 capítulos – arts. 406 a 484, abordava, dentre os institutos assistenciais, a “ausência”.

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2. ORGANOGRAMA – CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO DE FAMÍLIA

FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS GERAIS DO DIREITO DE FAMÍLIA

a) princípio e fundamento da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III); b) princípio da tutela especial à família independentemente da espécie (art. 226, caput); c) princípio e fundamento do pluralismo e da democracia no âmbito dos organismos familiares,

bem como da escolha da espécie de família (art. 1º, V); d) princípio da igualdade em sentido material de todos os partícipes da família (art. 5º e inciso I); e) princípios e objetos da liberdade, da justiça e do solidarismo nas relações familiares (art. 3º, I) o

princípio e objetivo da beneficência em favor dos partícipes do organismo familiar (art. 3º, IV)”. FUNDAMENTOS ESPECÍFICOS DO DIREITO DE FAMÍLIA

a) princípio da paternidade responsável, vinculado ao método interpretativo the best interest of the child (art. 226, § 7º);

b) princípio da prevalência do elemento anímico da affectio nas relações familiares (em decorrência da previsão do divórcio, com prazos diminuídos, e do expresso reconhecimento da perda da affectio maritalis diante da separação de fato por dois anos), nos termos do art. 226, § 6º;

c) princípio do pluralismo das entidades familiares (art. 226, §§ 1º, 3º e 4º); d) princípios da liberalidade restrita e beneficência à prole em matéria de planejamento familiar

(art. 226, § 7º); e) princípio e dever da convivência familiar (art. 227, caput); f) princípio da prioridade da proteção absoluta e integral da criança e do adolescente (art. 227,

caput), incluindo a sua colocação em família substituta (art. 227, § 3º, VI, e § 5º); g) princípio da isonomia entre os cônjuges (art. 226, § 5º) e, implicitamente, entre os companheiros; h) princípio da isonomia entre os filhos, independentemente da origem (art. 227, § 6º); i) princípio da não-equiparação entre o casamento e o companheirismo (art. 226, § 3º).

CONSTITUIÇÃO

FEDERAL DE 1988

Fundamento do Estado

Democrático de Direito

� Dignidade da pessoa humana � Liberdade � Igualdade

� ETICIDADE: preocupação com a probidade, boa-fé e correção � SOCIALIDADE: superar caráter individualista da lei, função

social � OPERABILIDADE: facilitar interpretação e aplicação, flexibilidade

PRINCÍPIOS NORTEADORES CC/02 (MIGUEL REALI)

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3. ORGANOGRAMA – ENTIDADE FAMILIAR - CONCEITOS

� Namoro íntimo tipo “amizade colorida” ou união livre ou relacionamento do gênero – não recebe

proteção do Estado por não chegar a constituir família propriamente dita pelo seu caráter descompromissado; é fruto da liberdade de amar, de se relacionar intimamente com quem quiser.

FAMÍLIA =

ENTIDADE

FAMILIAR

� casamento = família civil ou matrimonializada, atender exigências impostas imperativa/pela Lei;

� informal ou de fato ou

funcionalizada existe para o

desenvolvimento dos seus membros

� anaparental: constituída sem a presença dos pais – ex.: entre irmãos;

� monoparental: qualquer dos pais e seus descendentes; recebe a proteção do Estado para todos os fins (art. 226, § 4º CF/88);

� concubinato ”indenização” por serviços domésticos prestados (art. 1.216 CC/16; arts. 593 a 609 ou os arts. 927 e 944 e ss. CC/02) + art. 1.727 CC/02, é diferente de indenização por prejuízo ou dano causado;

� sociedade de fato - partilha proporcional ao esforço comum (Súmula 380 STF – art. 1.363 CC/16; art. 981 CC/02), exige prova da participação direta ou indireta cujo ônus probandi é do autor;

� união estável - alimentos (art. 1º Lei 8.971/94, art. 7º, caput Lei 9.278/96 e art. 1.694 CC/02); herança (art. 2º Lei 8.971/94, art. 7º, § único Lei 9.278/96 e art. 1.790 CC/02); presunção do regime da comunhão parcial de bens na falta de contrato em contrário (art. 5º lei 9.278/96 e art. 1.725 CC/02); importa a data da ruptura da relação.

RELAÇÃO

HOMOAFETIVA

� Adoção – vários precedentes concessivos. � Previdenciário – proteção hoje é legal. � Alimentos – poucos os precedentes têm concedido. � Patrimonial/meeiro – em geral, como sociedade de fato, exigindo

esforço direto, de competência do direito das obrigações. � Sucessão – poucas decisões, muitos teóricos; é possível instituição

do par como herdeiro ou legatário por testamento. � Seguro de vida – nenhum impedimento à instituição em favor do

companheiro.

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DIREITO DE FAMÍLIA ENTIDADE FAMILIAR

(FAMÍLIA) CASAMENTO UNIÃO ESTÁVEL CONCUBINATO

EDUARDO D

E O

LIV

EIR

A

LEIT

E114

Conjunto de regras aplicáveis às relações entre pessoas ligadas pelo casamento, pela união estável, pelo parentesco, pela afinidade e pela adoção.

A palavra família é de origem romana e tem diversas acepções no mundo jurídico. Sentido amplo: é o conjunto de pessoas ligadas por vínculo de sangue. Sentido mais limitado: abrangeria apenas os parentes sucessíveis (até o 4° grau). Sentido restrito: a família se reduziria aos pais e sua prole.

Casamento é o vínculo jurídico entre homem e a mulher que se unem material e espiritualmente para constituírem família.

Refere-se à união livre entre homem e mulher desimpedidos com a possibilidade da conversão em casamento.

É a união de homem e de mulher fora do casamento. O concubinato não se confunde com união estável uma vez que nele há sempre impedimento, enquanto nesta, a convivência pode ser convertida em casamento uma vez que não há impedimento.

EUCLID

ES D

E O

LIV

EIR

A115

Primeira e principal forma de agrupamento humano, a família preexiste à própria organização jurídica da vida em sociedade, por isso que lhe dá origem, sendo considerada a celula mater de uma nação. Sua formação decorre, primordialmente, das regras do direito natural, até mesmo pelo fenômeno instintivo da preservação e perpetuação da espécie humana. Por assim entender e proclamar, a Constituição da República situa a família como “base da sociedade”, digna de especial especial proteção do Estado, conforme os princípios básicos que anuncia.

O casamento civil é ato solene em que o Estado intervém desde a habilitação, para controle da inexistência de impedimentos, até a celebração por autoridade competente. Caracteriza-se como contrato, porque resultante do necessário consentimento dos contraentes, mas depende, ainda, da final declaração do celebrante, de que se acham casados na forma da lei. Para ter eficácia erga omnes, efetua-se o registro do casamento no Cartório do Registro Civil das Pessoas Naturais, extraindo-se certidão que constitui prova do ato.

A denominação união estável faz concluir que a união protegida não é qualquer uma, passageira, fugaz, intermitente. Ao contrário, exige que a união seja duradoura, com certa permanência no tempo, a fim de que se configure como ente familiar.

O concubinato envolve ligação amorosa com terceiro, de pessoa casada, em situação de adulterinidade, formando o chamado “triângulo amoroso”, ou outras situações de convivência com impedimentos absolutos para o casamento.

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DIREITO DE FAMÍLIA ENTIDADE FAMILIAR

(FAMÍLIA) CASAMENTO UNIÃO ESTÁVEL CONCUBINATO

JOÃO B

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6

A família não é um fato natural, como entendem os que defendem a tese da natureza institucional do matrimônio, mas uma estrutura. Não se pode ter o casamento como um regulador de uma organização natural, mas regulador de uma organização estruturada, de caráter cultural. Somente assim pensando é que se pode compreender, por exemplo, a possibilidade do casamento de pessoas do mesmo sexo.

Toda e qualquer definição sobre o casamento sofrerá, ao longo do tempo, alteração significativa, seja em face do enfoque que a ele se dê: como instituição, como contrato ou como ato; seja em razão das modificações sofridas pela própria família, e logicamente da própria sociedade. Assim é que numa sociedade que só aceite a forma monogâmica das relações interpessoais, o conceito de casamento não poderá ser o mesmo de uma sociedade que aceite as relações poligâmicas. De igual modo se a estrutura familiar se apresenta diferente, estas alterações passam a ter influência na compreensão do instituto do matrimônio.

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DIREITO DE FAMÍLIA ENTIDADE FAMILIAR

(FAMÍLIA) CASAMENTO UNIÃO ESTÁVEL CONCUBINATO

MARIA

BERENIC

E D

IAS

Dispondo a família de várias formatações, também o direito das famílias precisa ter espectro cada vez mais abrangente. Como esse ramo disciplina a organização da família, conceitua-se o direito de família como o próprio objeto a definir. O direito das famílias, por voltado à tutela da pessoa, é personalíssimo, adere indelevelmente à personalidade da pessoa em virtude de sua posição na família durante toda a vida. Em sua maioria são direitos intransmissíveis, irrevogáveis, irrenunciáveis e indisponíveis.

Faz-se necessário ter uma visão pluralista da família, abrigando os mais diversos arranjos familiares, buscando-se a identificação do elemento que permita enlaçar no conceito de entidade familiar todos os relacionamentos que têm origem em um elo de afetividade, independente de sua conformação.

Casamento significa tanto o ato de celebração do matrimônio como a relação jurídica que dele se origina: a relação matrimonial. O sentido da relação matrimonial melhor se expressa pela noção de comunhão de vidas, ou comunhão de afetos.

Nasce a união estável da convivência, simples fato jurídico que evolui para a constituição de ato jurídico, em face de direitos que brotam dessa relação.

A palavra concubinato carrega consigo um estigma e revela relacionamento alvo de preconceito. Historicamente, sempre traduziu relação escusa e pecaminosa, quase uma depreciação moral (...). O chamado doutrinariamente de concubinato adulterino é a união paralela.”

MARIA

HELENA D

INIZ

117 Direito de família é o complexo

de normas que regulam a celebração do casamento, sua validade e os efeitos que dele resultam, as relações pessoais e econômicas da sociedade conjugal, a dissolução desta, a união estável, as relações entre pais e filhos, o vínculo de parentesco e os institutos complementares da tutela e curatela.

Família é o grupo fechado de pessoas, composto dos pais e filhos, e para efeitos limitados, de outros parentes, unidos pela convivência e afeto numa mesma economia e sob mesma direção.

O casamento é o vínculo jurídico entre o homem e a mulher que visa o auxílio mútuo material ou espiritual, de modo que haja uma integração fisiopsíquica e a constituição de uma família.

É a união duradoura de pessoas livres e de sexos diferentes, que não estão ligadas entre si por casamento civil.” Também a considera como “concubinato puro.”

O concubinato é gênero do qual a união estável é espécie. A união de fato ou o concubinato, didaticamente, pode ser puro ou impuro. Será impuro adulterino se um dos concubinos for casado e será impuro incestuoso se houver parentesco próximo entre os amantes.

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(FAMÍLIA) CASAMENTO UNIÃO ESTÁVEL CONCUBINATO

PAULO LÔBO

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O direito de família é um conjunto de regras que disciplinam os direitos pessoais e patrimoniais das relações de família. Abrande as seguintes matérias: a) o direito das entidades familiares, que diz respeito ao matrimônio e aos demais arranjos familiares sem discriminação; b) o direito parental, relativo às situações e relações jurídicas de paternidade, maternidade, filiação e parentesco; c) o direito patrimonial familiar, relativo aos regimes de bens entre cônjuges e companheiros, ao direito alimentar, à administração dos bens dos filhos e ao bem de família; d) o direito tutelar, relativo à guarda, tutela e curatela.

São características das entidades familiares: a) afetividade, como fundamento e finalidade da entidade; b) estabilidade, excluindo-se os relacionamentos casuais; c) convivência pública e ostensiva. A constituição de família é o objetivo da entidade familiar, para diferenciá-la de outros relacionamentos afetivos, como a amizade, a camaradagem entre os colegas de trabalho, as relações religiosas

O casamento é um ato jurídico negocial solene, público e complexo, mediante o qual um homem e uma mulher constituem família, pela livre manifestação de vontade e pelo reconhecimento do Estado. A liberdade matrimonial é um direito fundamental, apenas limitado nas hipóteses de impedimento, como o incesto ou a bigamia. O termo casamento abrange, par muitos, o ato constitutivo e, também, a entidade ou instituição que dele se constitui.

É a entidade familiar constituída por homem e mulher que convivem em posse do estado de casado, ou com aparência de casamento (more uxorio). É um estado de fato que se converteu em relação jurídica em virtude da Constituição e a lei atribuírem-lhe dignidade de entidade familiar própria, com seu elenco de direitos e deveres. Ainda que o casamento seja sua referência estrutural, é distinta deste; cada entidade é dotada de estatuto jurídico próprio, sem hierarquia ou primazia.

Tendo sido a união livre elevada à condição de entidade familiar, sob a denominação de união estável, restou ao concubinato adulterino, no qual se unificou a denominação concubinato, como tipo excludente e sem um estatuto próprio como a primeira. O que difere a primeira do segundo é, respectivamente, a inexistência e a existência de impedimentos para casar, salvo a hipótese do não divorciado separado de fato ou judicialmente.

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(FAMÍLIA) CASAMENTO UNIÃO ESTÁVEL CONCUBINATO

RODRIG

O D

A C

UNHA PEREIR

A119

A família deixou de ser apenas um núcleo econômico e de reprodução, para ser o espaço de companheirismo, camaradagem e livre expressão do amor e do afeto. Sexo, casamento e reprodução desatrelaram-se, pois se tornou possível uma coisa sem outra. Não é mais necessário sexo para reprodução e não se exige mais casamento para relacionamentos sexuais.”

Contrato de família, solene e especial, entre duas pessoas, que visam uma comunhão de vidas. Nasce com a vontade das partes de constituírem uma família, exigindo tal consentimento. Não basta o consentimento, é necessário a sua conformação, que sejam observadas as normas e os procedimentos próprios, traçados pela lei, de molde a se aperfeiçoar. Veja-se que o elemento acidental, de sexo diverso, não importa à definição, posto que a natureza especial do contrato vinculada a relação aos termos da lei, a qual pode exigir ou não a diversidade de sexos. Quanto ao elemento da permanência da relação, não é essencial, posto tratar de um contrato e os contratos podem ser por prazo determinado ou indeterminado.

A união estável é a relação afetivo-amorosa entre um homem e uma mulher, não adulterina e não-incestuosa, com estabilidade e durabilidade, vivendo sobre o mesmo teto ou não, constituindo família sem o vínculo do casamento civil.

Entre leigos, principalmente, a palavra concubina não denota simplesmente uma forma de vida, a indicação de estar vivendo com outra pessoa. Quando não é motivo de deboche, é alusiva a uma relação desonesta. (...) Assim, entendemos que a expressão união estável, adotada pela atual Constituição brasileira, veio substituir a expressão concubinato. Podemos dizer que concubinato é um gênero que comporta duas espécies: o concubinato adulterino, a que se tem denominado simplesmente de concubinato, e o não-adulterino, que se pode denominar união estável.

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1 Citados nominalmente pelo Dep. Ricardo Fiuza no CC Comentado por ele coordenado: Miguel Reale, Min. José

Carlos Moreira Alves, Silvio Rodrigues, Yussef Said Cahali, Álvaro Villaça Azevedo, Des. Jones Figueirêdo Alves,

Des. José Antônio Macedo Malta, Alexandre Assunção, Mário Luiz Delgado Régis, Regina Beatriz Tavares da Silva,

Zeno Veloso, Carlos Alberto Dabus Maluf, Joel Dias Figueira Jr. e Benjamim Garcia de Matos. (FIUZA, Ricardo.

Novo Código Civil comentado. FIUZA, Ricardo (Coord.). São Paulo: Saraiva, 2002, p. XIII e XIV).

2 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil – parte geral. v. 1. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 9. 3 REALE, Miguel. Diretrizes na elaboração do anteprojeto. Jornal O Estado de São Paulo, edições de 19, 20 e 21.08.01

4 FIUZA, Ricardo. Novo Código Civil comentado. FIUZA, Ricardo (Coord.). São Paulo: Saraiva, 2002, p. XV-XVI.

5 FIDA, Orlando. J. B. Torres de Albuquerque. Investigação de Paternidade, 5ª ed., Ed. de Direito, p. 15.

6 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de Família – Uma Abordagem Psicanalítica. Belo Horizonte: Del Rey, p. 24.

7 CÂNDIDO, João Batista de Oliveira. Direito de Família Contemporâneo. Rodrigo da Cunha Pereira. Belo Horizonte:

Livraria Del Rey Editora, 1997, p. 38.

8AURVALLE, Luiz Alberto D’Azevedo. A evolução do Direito de Família. Rio de Janeiro: COAD, Seleções Jurídicas, n.

3, 1998, p. 73.

9 GRINBERG, Keila. Codigo civil e cidadania. Rio de Janeiro: Zahaar, 2001, p. 47.

10 PEREIRA, Caio Mário da. Instituições de Direito Civil – Direito de Família. v. V. 14. ed. Rio de Janeiro: Editora Del

Rey. 2004, p. 7.

11 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A reforma do Direito de Família. Revista Del Rey, n. 1, dez. 1997, p. 14 .

12 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito de Família brasileiro. Introdução – Abordagem sob a perspectiva

civil-constitucional. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2001, p. 15.

13 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito de Família brasileiro. Introdução – Abordagem sob a perspectiva

civil-constitucional. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2001, p. 16.

14 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Filiação e reprodução assistida: introdução ao tema sob a perspectiva

do direito comparado. In: Revista dos Tribunais nº 776. Junho de 2000, 89º ano. São Paulo: RT, 2000, p. 65.

15 NEVARES, Ana Luiza Maia. Entidades familiares na Constituição: críticas à concepção hierquizada. In: Diálogos

sobre direito civil: construindo uma racionalidade contemporânea. RAMOS, Carmem Lucia Silveira et al (Organ.) Rio

de Janeiro-São Paulo: Renovar, 2002, p. 295.

16 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Filiação e reprodução assistida: introdução ao tema sob a perspectiva

do direito comparado. In: Revista dos Tribunais nº 776. Junho de 2000, 89º ano. São Paulo: RT, 2000, p. 63-64.

17 PERLINGIERI, Pietro. Perfins de dirito civil: introdução ao direito civil constitucional. 3. ed. CICCO, Maria Cristina de

(Trad.). Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 243.

18 TEPEDINO, Gustavo. O novo Código Civil: duro golpe na recente experiência constitucional brasileira. Revista

Trimestral de Direito Cvil, v. 7, Editorial, p. IV.

19 NEVARES, Ana Luiza Maia. Entidades familiares na Constituição: críticas à concepção hierquizada. In: Diálogos

sobre direito civil: construindo uma racionalidade contemporânea. RAMOS, Carmem Lucia Silveira et al (Organ.) Rio

de Janeiro-São Paulo: Renovar, 2002, p. 301.

20 OLIVEIRA FILHO, Bertoldo Mateus de. Relacionamento interfamilial. Del Rey Revista Jurídica, p. 32.

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21 OLIVEIRA FILHO, Bertoldo Mateus de. Relacionamento interfamilial. Del Rey Revista Jurídica, p. 32.

22 FACHIN, Luis Edson. Família cidadã. Del Rey Revista Jurídica, p. 11.

23 DIAS, Maria Berenice. Estatização do afeto. Del Rey Revista Jurídica, p. 17. Também pode ser extraído do site

www.mariaberenicedias.com.br

24 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Del Rey Revista Jurídica, p. 5.

25 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Del Rey Revista Jurídica, p. 5.

26 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Del Rey Revista Jurídica, p. 7.

27 CZAJKOWSKI, Rainer. União livre. Curitiba: Juruá Editora, 1997, p. 23.

28 PEREIRA, Caio Mário da. Instituições de Direito Civil – Direito de Família. v. V. 14. ed. Rio de Janeiro: Editora Del

Rey. 2004, p. 5

29 FIGUEIREDO, Sálvio. et all. Comentários ao Novo Código Civil - Do Direito Pessoal. v. XVII. Rio de Janeiro:

Editora Forense, p. 1.

30 FIGUEIREDO, Sálvio. et all. Comentários ao Novo Código Civil - Do Direito Pessoal. v. XVII. Rio de Janeiro:

Editora Forense, p. 5.

31 FIGUEIREDO, Sálvio. et all. Comentários ao Novo Código Civil - Do Direito Pessoal. v. XVII. Rio de Janeiro:

Editora Forense, p. 7.

32 FIGUEIREDO, Sálvio. et all. Comentários ao Novo Código Civil - Do Direito Pessoal. v. XVII. Rio de Janeiro:

Editora Forense, p. 9.

33 FIGUEIREDO, Sálvio. et all. Comentários ao Novo Código Civil - Do Direito Pessoal. v. XVII. Rio de Janeiro:

Editora Forense, p. 11.

34 FIGUEIREDO, Sálvio. et all. Comentários ao Novo Código Civil - Do Direito Pessoal. v. XVII. Rio de Janeiro:

Editora Forense, p. 11.

35 FIGUEIREDO, Sálvio. et all. Comentários ao Novo Código Civil - Do Direito Pessoal. v. XVII. Rio de Janeiro:

Editora Forense, p. 15.

36 FIGUEIREDO, Sálvio. et all. Comentários ao Novo Código Civil - Do Direito Pessoal. v. XVII. Rio de Janeiro:

Editora Forense, p. 18.

37 FIGUEIREDO, Sálvio. et all. Comentários ao Novo Código Civil - Do Direito Pessoal. v. XVII. Rio de Janeiro:

Editora Forense, p. 22.

38 FIGUEIREDO, Sálvio. et all. Comentários ao Novo Código Civil - Do Direito Pessoal. v. XVII. Rio de Janeiro:

Editora Forense, p. 27.

39 FIGUEIREDO, Sálvio. et all. Comentários ao Novo Código Civil - Do Direito Pessoal. v. XVII. Rio de Janeiro:

Editora Forense, p. 33.

40 MADALENO, Rolf. Direito de Família constituição e constatação. extraído do site www.rolfmadaleno.com.br,

acessado em 17/2/06.

41 MADALENO, Rolf. Direito de Família em pauta. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora. 2004, p. 15.

42 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito de Família brasileiro. Introdução – Abordagem sob a perspectiva

civil-constitucional. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2001, p. 18.

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43 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito de Família brasileiro. Introdução – Abordagem sob a perspectiva

civil-constitucional. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2001, p. 21.

44 CUNHA, Sérgio Sérvulo da. Direito de Família – Mudanças, p. 38.

45 CUNHA, Sérgio Sérvulo da. Direito de Família – Mudanças, p. 40. 46 DAL COL, Helder Martinez. União estável e contratos de namoro no Código Civil de 2002 . Jus

Navigandi, Teresina, ano 9, n. 759, 2 ago. 2005. Disponível em:

<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7100>. Acesso em: 06 dez. 2006. 47 DAL COL, Helder Martinez. União estável e contratos de namoro no Código Civil de 2002 . Jus

Navigandi, Teresina, ano 9, n. 759, 2 ago. 2005. Disponível em:

<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7100>. Acesso em: 06 dez. 2006. 48 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 3. ed. São Paulo: RT, 2006, p. 8. 49 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 3. ed. São Paulo: RT, 2006, p. 63. 50 DIAS, Maria Berenice. A evolução da família e seus direitos. www.mariaberenicedias.com.br – acesso em 26/2/07. 51 DIAS, Maria Berenice. Família, ética e afeto. www.mariaberenicedias.com.br – acesso em 26/2/07. 52 PASSARELLI, Luciano Lopes. Regime de bens e o registro de imóveis. Palestra no VIII Seminário de Direito Notarial e

Registral: alteração no regime de bens. In Boletim Eletrônico Irib nº 2859, de 2/3/07.

http://www.irib.org.br/notas_noti/boletimel2859.asp - acesso em 8/3/07 53 PASSARELLI, Luciano Lopes. Regime de bens e o registro de imóveis. Palestra no VIII Seminário de Direito Notarial e

Registral: alteração no regime de bens. In Boletim Eletrônico Irib nº 2859, de 2/3/07.

http://www.irib.org.br/notas_noti/boletimel2859.asp - acesso em 8/3/07

54 VENOSA, Silvo de Salvo. Direito Civil – Direito de Família. 3. ed. rev. e atual. de acordo o novo Código Civil.

Estudo comparado com o Código Civil de 1916. São Paulo: Editora Atlas S/A. 2003, p. 21.

55 PEREIRA, Caio Mário da. Instituições de Direito Civil – Direito de Família. v. V. 14. ed. Rio de Janeiro: Editora Del

Rey. 2004, p. 7.

56 VENOSA, Silvo de Salvo. Direito Civil – Direito de Família. 3. ed. rev. e atual. de acordo o novo Código Civil.

Estudo comparado com o Código Civil de 1916. São Paulo: Editora Atlas S/A. 2003, p. 32.

57 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Direito de Família brasileiro. Introdução – Abordagem sob a perspectiva

civil-constitucional. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2001, p. 28.

58 ARRUDA NETO, Pedro Thomé de. A “despenalização” do Direito das Famílias. In: BASTOS, Eliene Ferreira.

SOUZA, Asiel Henrique de (Cood.) Família e Jurisdição. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2006, p. 257.

59 ARRUDA NETO, Pedro Thomé de. A “despenalização” do Direito das Famílias. In: BASTOS, Eliene Ferreira.

SOUZA, Asiel Henrique de (Cood.) Família e Jurisdição. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2006, p. 258.

60 MADALENO, Rolf. Direito de Família constituição e constatação. extraído do site www.rolfmadaleno.com.br,

acessado em 17/2/06.

61 TEPEDINO, Gustavo. A disciplina civil-constitucional das relações familiares, In A nova família: problemas e

perspectivas, Coord. Vicente Barreto, Renovar, Rio de Janeiro, 1998, pp.56-59.

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62 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da. Filiação e reprodução assistida: introdução ao tema sob a perspectiva

do direito comparado. In: Revista dos Tribunais nº 776. Junho de 2000, 89º ano. São Paulo: RT, 2000, p. 63 e 65-67.

63 José Lamartine Corrêa de Oliveira e Francisco José Ferreira Muniz - p. 17

64 Arnaldo Rizzardo - p. 6

65 Carlos Alberto Bittar - p. 64.

66 GIORGIS, José Carlos Teixeira. O Direito de Família e as Constituições Brasileiras. COAD/ADV, Seleções Jurídicas,

jan/06, p. 79.

67 GIORGIS, José Carlos Teixeira. O Direito de Família e as Constituições Brasileiras. COAD/ADV, Seleções Jurídicas,

jan/06, p. 79. 68 MELO, Edson Teixeira de. Princípios constitucionais do Direito de Família . Jus Navigandi,

Teresina, ano 10, n. 1213, 27 out. 2006. Disponível em:

<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9093>. Acesso em: 06 fev. 2007. 69 TARTUCE, Flávio. Novos princípios do Direito de Família brasileiro . Jus Navigandi, Teresina, ano

10, n. 1069, 5 jun. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8468>.

Acesso em: 06 fev. 2007. 70 MELO, Edson Teixeira de. Princípios constitucionais do Direito de Família . Jus Navigandi,

Teresina, ano 10, n. 1213, 27 out. 2006. Disponível em:

<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9093>. Acesso em: 06 fev. 2007. 71 TARTUCE, Flávio. Novos princípios do Direito de Família brasileiro . Jus Navigandi, Teresina, ano

10, n. 1069, 5 jun. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8468>.

Acesso em: 06 fev. 2007. 72 TARTUCE, Flávio. Novos princípios do Direito de Família brasileiro . Jus Navigandi, Teresina, ano

10, n. 1069, 5 jun. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8468>.

Acesso em: 06 fev. 2007. 73 TARTUCE, Flávio. Novos princípios do Direito de Família brasileiro . Jus Navigandi, Teresina, ano

10, n. 1069, 5 jun. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8468>.

Acesso em: 06 fev. 2007. 74 MELO, Edson Teixeira de. Princípios constitucionais do Direito de Família . Jus Navigandi,

Teresina, ano 10, n. 1213, 27 out. 2006. Disponível em:

<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9093>. Acesso em: 06 fev. 2007. 75 MELO, Edson Teixeira de. Princípios constitucionais do Direito de Família . Jus Navigandi,

Teresina, ano 10, n. 1213, 27 out. 2006. Disponível em:

<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9093>. Acesso em: 06 fev. 2007. 76 TARTUCE, Flávio. Novos princípios do Direito de Família brasileiro . Jus Navigandi, Teresina, ano

10, n. 1069, 5 jun. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8468>.

Acesso em: 06 fev. 2007.

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77 TARTUCE, Flávio. Novos princípios do Direito de Família brasileiro . Jus Navigandi, Teresina, ano

10, n. 1069, 5 jun. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8468>.

Acesso em: 06 fev. 2007. 78 MELO, Edson Teixeira de. Princípios constitucionais do Direito de Família . Jus Navigandi,

Teresina, ano 10, n. 1213, 27 out. 2006. Disponível em:

<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9093>. Acesso em: 06 fev. 2007. 79 TARTUCE, Flávio. Novos princípios do Direito de Família brasileiro . Jus Navigandi, Teresina, ano

10, n. 1069, 5 jun. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8468>.

Acesso em: 06 fev. 2007. 80 MELO, Edson Teixeira de. Princípios constitucionais do Direito de Família . Jus Navigandi,

Teresina, ano 10, n. 1213, 27 out. 2006. Disponível em:

<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9093>. Acesso em: 06 fev. 2007. 81 Muniz, Francisco José Ferreira. In: Teixeira, 1993: 77 82 TARTUCE, Flávio. Novos princípios do Direito de Família brasileiro . Jus Navigandi, Teresina, ano

10, n. 1069, 5 jun. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8468>.

Acesso em: 06 fev. 2007. 83 TARTUCE, Flávio. Novos princípios do Direito de Família brasileiro . Jus Navigandi, Teresina, ano

10, n. 1069, 5 jun. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8468>.

Acesso em: 06 fev. 2007. 84 TARTUCE, Flávio. Novos princípios do Direito de Família brasileiro . Jus Navigandi, Teresina, ano

10, n. 1069, 5 jun. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8468>.

Acesso em: 06 fev. 2007.

85 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Direito de Família. 3ª ed. São Paulo: Editora Atlas S/A, 2003, p. 16.

86 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro. De acordo com o novo Código Civil. v.5. 17. ed. São Paulo:

Saraiva, 2002, p. 26-28

87 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. vol. I, 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 2.

88 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil – parte geral. v. 1. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 6.

89 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro. De acordo com o novo Código Civil. v.5. 17. ed. São Paulo:

Saraiva, 2002, p. 26-28

90 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Direito de Família. 3ª ed. São Paulo: Editora Atlas S/A, 2003, p. 25.

91 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro. De acordo com o novo Código Civil. v.5. 17. ed. São Paulo:

Saraiva, 2002, p. 26-28

92 LOTUFO, Maria Alice Zarantin. Curso avançado de Direito Civil. v. 5. São Paulo: RT, 2002, p.23-25.

93 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Direito de Família. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 41.

94 MARIA HELENA DINIZ, cita como exemplo dessa intervenção: a Constituição Federal, art. 226, §§ 4º e 6º, prescreve

que a entidade familiar é a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, sendo que o

casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de 1 ano, nos casos

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UUNNAA –– PROFA JJUULL II AANNAA GGOONNTT II JJOO –– 22 ºº SSEEMMEESSTTRREE//22000088

Rua Guajajaras, n. 1944, Barro Preto, CEP 30180-101 – Belo Horizonte – MG - Tel. (31) 2112.4114 - Fax 2112.4108 site: www.direitodefamilia.adv.br – e-mail: [email protected][email protected]

expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de 2 anos. Ainda a Constituição Federal, no art. 226, §

8º, trata da assistência estatal à família; o Decreto-lei n. 3.200/41 dispõe sobre a organização e proteção da família; o

Decreto n. 12.299/43 ampara as famílias de prole numerosa; o Decreto n. 9.999/91 dispõe sobre a concessão de

abono familiar incentivando a procriação; a Constituição Federal, art. 226, § lº, democratiza o planejamento

familiar; o Decreto-lei n. 3.284/41 e a Lei n. 8.112/90 proclamam a preferência de nomeação ou promoção de

funcionário público para os chefes de família numerosa; o Decreto-lei n. 1.764/39 cria a Comissão Nacional de

Proteção à família; a Lei n. 201/48 dispõe sobre salário-família; o Código Civil, art. 1.596, a Constituição Federal de

1988, art. 227, § 6º, a Lei no 8.069/90, art. 20, e a Lei n. 8.560/92 reconhecem os mesmos direitos aos filhos havidos

ou não do matrimônio, ou por adoção, proibindo designações discriminatórias relativas à filiação. (DINIZ, Maria

Helena. Curso de Direito Civil brasileiro. De acordo com o novo Código Civil. v. 5. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p.

26-28).

95 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil – Direito de Família. v. 6. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 12.

96 DANTAS, San Tiago. Direito de Família e das Sucessões. Rio de Janeiro: Forense, 1991, p. 103.

97 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Direito de família. Com anotações sobre o novo Código Civil. v. 6. 27. ed. São

Paulo: Saraiva, 2002, p. 11-14.

98 OLIVEIRA, Maria Rita de Holanda Silva. Reflexos da Constitucionalização nas Relações de Família. In: LOTUFO,

Renan (Coord.). Direito Civil Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2002, Caderno 3, p. 287.

99 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Direito de Família. 3ª ed. São Paulo: Editora Atlas S/A, 2003, p. 25. 100 LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito Civil Aplicado. Direito de Família. v. 5. São Paulo: RT, 2005, p. 33.

101 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil – Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2002, v. 1, p. 3-43.

102 DINIZ, Maria Helena. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 65.

103 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil – Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2002, v. 1, p. 3-43.

104 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Novo Código Civil e Legislação Extravagante Anotados. São

Paulo: RT, 2002, p. 658.

105 LOURES, José Costa; GUIMARÃES, Taís Maria Loures Dolabela. Novo Código Civil Comentado. Belo Horizonte:

Del Rey, 2002, p. 879.

106 DINIZ, Maria Helena. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 75-

77. 107 BORDALLO, Galdino Augusto Coelho. Da adoção. O Novo Código Civil do Direito de Família, Coordenadora Geral Heloísa Maria Daltro Leite, Ed. Freitas Bastos, 2002, p.237-247.

108 DINIZ, Maria Helena. In: Novo Código Civil Comentado. FIÚZA, Ricardo (Coord.). São Paulo: Saraiva, 2002, p.

1.845.

109 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Novo Código Civil e Legislação Extravagante Anotados. São

Paulo: RT, 2002, p. 658.

110 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Novo Código Civil e Legislação Extravagante

Anotados. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,março de 2002, p. 656.

111 LOURES, José Costa; GUIMARÃES, Taís Maria Loures Dolabela. Novo Código Civil Comentado. Belo Horizonte:

Del Rey, 2002, p. 874.

62

UUNNAA –– PROFA JJUULL II AANNAA GGOONNTT II JJOO –– 22 ºº SSEEMMEESSTTRREE//22000088

Rua Guajajaras, n. 1944, Barro Preto, CEP 30180-101 – Belo Horizonte – MG - Tel. (31) 2112.4114 - Fax 2112.4108 site: www.direitodefamilia.adv.br – e-mail: [email protected][email protected]

112 FELIPE, Jorge Franklin Alves; ALVES, Geraldo Magela. O Novo Código Civil Anotado. Rio de Janeiro: Forense

2002, p. 397.

113 FELIPE, Jorge Franklin Alves; ALVES, Geraldo Magela. O Novo Código Civil Anotado. Rio de Janeiro: Forense

2002, p. 397. 114 LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito civil aplicado: direito de família. São Paulo: RT, 2005. 5 v. 115 OLIVEIRA, Euclides de.União estável: do concubinato ao casamento. 6ª ed. São Paulo: Editora Método, 2003. 116 CÂNDIDO, João Batista de Oliveira. Direito de Família Contemporâneo. Rodrigo da Cunha Pereira. Belo Horizonte: Livraria Del Rey Editora, 1997, p. 38. 117 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. 22ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. 5 v. 118 LÔBO, Paulo. Direito civil: famílias. São Paulo: Saraiva, 2008. 119 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. A reforma do Direito de Família. Revista Del Rey, n. 1, dez. 1997.