Direito Penal e o Seu Histórico

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DIREITO PENAL E O SEU HISTÓRICO ORIGENS Por força do impulso da associação, que marca de maneira tão profunda o destino dos homens, o que encontramos na história e na pré-história da humanidade são grupos humanos e não indivíduos isolados, e dentro desses grupos, desde logo, normas de comportamento social. Grupos que se formam natural e precocemente e conjunto de normas de limitação das atividades de cada socius, dos seus interesses e apetite, no sentido de paz social. A esse conjunto normativo se poderia dar por extensão o nome de Direito, segundo a velha fórmula ubi societas ibi jus, embora não apresente as notas essenciais que a ciência moderna atribui ao jurídico e seja ainda um complexo indiferenciado, no qual só mais tarde irão definir-se, como corpos distintos, a Moral, o Direito, a Religião, apoiadas todas essas normas, de caráter costumeiro, anônimas, criadas e crescidas por impulso espontâneo da consciência coletiva, na religião e na magia. Por essas normas, ajusta-se a conduta dos socii a um padrão comum, o padrão que convém à unidade e coesão do grupo. Tempos Primitivos A história do Direito Penal é a história da humanidade. Ele surge com o homem e o acompanha através dos tempos, isso porque o crime, qual sombra sinistra, nunca delle se afastou. Claro é que não nos referimos ao Direito Penal como sistema orgânico de princípios, o que é conquista da civilização e data de ontem. A pena, em sua origem, nada mais foi que vindita, pois é mais que compreensível que naquela criatura, dominada pelos instintos, o revide à agressão sofrida devia ser fatal, não havendo preocupações com a proporção, nem mesmo com sua justiça. Em regra, os historiadores consideram várias fases da pena: a vingança privada, a vingança divina, e vingança pública e o período humanitário. Todavia, deve advertir-se que esses períodos não se sucedem integralmente, ou melhor, advindo um, nem por isso o outro desaparece logo, ocorrendo então, a existência concomitante dos princípios característicos de cada um: uma fase penetra a outra e, durante tempos, esta ainda permanece ao seu lado. - Fase da Vingança Privada – nesta fase quando um crime era cometido, ocorria a reação da vítima, dos parentes e do grupos social, que agiam sem proporção à ofensa, atingindo não só o ofensor como também todo o seu grupo. Se o transgressor fosse membro da tribo, poderia ser punido com a “expulsão da paz” (banimento), que invariavelmente levava à morte. Caso a violação fosse praticada por um elemento estranho à tribo, a reação era a “vingança de sangue”, considerada como obrigação religiosa e sagrada, verdadeira guerra movida pelo grupo ofendido àquele que pertencia o ofensor, culminando, não

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DIREITO PENAL E O SEU HISTÓRICO

ORIGENS

Por força do impulso da associação, que marca de maneira tão profunda o destino dos homens, o que encontramos na história e na pré-história da humanidade são grupos humanos e não indivíduos isolados, e dentro desses grupos, desde logo, normas de comportamento social. Grupos que se formam natural e precocemente e conjunto de normas de limitação das atividades de cada socius, dos seus interesses e apetite, no sentido de paz social.

A esse conjunto normativo se poderia dar por extensão o nome de Direito, segundo a velha fórmula ubi societas ibi jus, embora não apresente as notas essenciais que a ciência moderna atribui ao jurídico e seja ainda um complexo indiferenciado, no qual só mais tarde irão definir-se, como corpos distintos, a Moral, o Direito, a Religião, apoiadas todas essas normas, de caráter costumeiro, anônimas, criadas e crescidas por impulso espontâneo da consciência coletiva, na religião e na magia. Por essas normas, ajusta-se a conduta dos socii a um padrão comum, o padrão que convém à unidade e coesão do grupo. 

Tempos Primitivos

A história do Direito Penal é a história da humanidade. Ele surge com o homem e o acompanha através dos tempos, isso porque o crime, qual sombra sinistra, nunca delle se afastou. Claro é que não nos referimos ao Direito Penal como sistema orgânico de princípios, o que é conquista da civilização e data de ontem. 

A pena, em sua origem, nada mais foi que vindita, pois é mais que compreensível que naquela criatura, dominada pelos instintos, o revide à agressão sofrida devia ser fatal, não havendo preocupações com a proporção, nem mesmo com sua justiça. Em regra, os historiadores consideram várias fases da pena: a vingança privada, a vingança divina, e vingança pública e o período humanitário. Todavia, deve advertir-se que esses períodos não se sucedem integralmente, ou melhor, advindo um, nem por isso o outro desaparece logo, ocorrendo então, a existência concomitante dos princípios característicos de cada um: uma fase penetra a outra e, durante tempos, esta ainda permanece ao seu lado. 

- Fase da Vingança Privada – nesta fase quando um crime era cometido, ocorria a reação da vítima, dos parentes e do grupos social, que agiam sem proporção à ofensa, atingindo não só o ofensor como também todo o seu grupo. Se o transgressor fosse membro da tribo, poderia ser punido com a “expulsão da paz” (banimento), que invariavelmente levava à morte. Caso a violação fosse praticada por um elemento estranho à tribo, a reação era a “vingança de sangue”, considerada como obrigação religiosa e sagrada, verdadeira guerra movida pelo grupo ofendido àquele que pertencia o ofensor, culminando, não raro, com a eliminação completa de um dos grupos. 

Surge neste período a Lei do Talião, que limita a reação à ofensa a um mal idêntico praticado (sangue por sangue, dente por dente, olho por olho). Adotado no Código de Hamurábi (Babilônia), no Êxodo (povo hebraico) e na Lei das XII Tábuas (Roma), foi um grande avanço na História do Direito Penal, por reduzir abrangência da pena. 

- Fase da Composição – era uma forma alternativa de repressão aplicada no caso de a morte do delinqüente ser desaconselhável, em virtude da natureza do delito, ou porque o interesse do ofendido ou dos membros de seu grupo fosse favorável à reparação do dano causado pela ação delituosa. Dotada

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também no Código de Hamurábi, pelo Pentateuco e pelo Código de Manu, foi a composição largamente aceita pelo Direito Germânico, sendo a origem remota das formas modernas de indenização do Direito Civil e da multa no Direito Penal. 

- Fase da Vingança Divina – a repressão tinha a finalidade de aplacar a ira da divindade ofendida pelo crime, bem como

castigar o infrator. O castigo era aplicado pelos sacerdotes, que em quase toda a antigüidade se converteram em encarregados da justiça. Estes imprimam penas severas cruéis e desumanas, visando especialmente a intimidação. Legislação típica desta fase é o Código de Manu, mas esses princípios foram adotados na Babilônia, no Egito (Cinco Livros), na China (Livro das Cinco Penas), na Pérsia (Avesta) e pelo povo de Israel (Pentateuco). 

- Fase da Vingança Pública – foi através da maior organização social que se atingiu esta fase. No sentido de se dar maior estabilidade ao Estado, visou-se à segurança do príncipe ou soberano pela aplicação da pena, ainda severa e cruel. Também em obediência ao sentido religioso, o Estado justificava a proteção ao soberano que na Grécia, por exemplo, governava em nome de Zeus, e era seu intérprete e mandatário. O mesmo ocorreu em Roma, com a aplicação da Lei das XII Tábuas. Em fase posterior, porém, libertou-se a pena de seu caráter religioso, transformando-se a responsabilidade do grupo em individual (do autor do fato), impositiva contribuição ao aperfeiçoamento de humanização dos costumes penais. 

DIREITO PENAL DOS HEBREUSDominado profundamente pela razão religiosa é o sistema penal dos hebreus, como, aliás, todas as manifestações da cultura nesse povo, a vida privada como a vida pública. Mas na sua longa história podemos colher exemplos de várias transformações que foi sofrendo a pena, desde vingança primitiva até, que encontramos nos mais antigos costumeiros incluídos no Pentateuco, até as práticas mais apuradas dos últimos tempos. Vemos isso no livro da Bíblia e em particular no Êxodo, no Levítico e sobretudo no Deuteronômio e, por fim, na elaboração jurídica final do Talmud. 

DIREITO PENAL GREGOFaltam notícias seguras, de fontes jurídicas, sobre o Direito Punitivo entre os gregos. O mais importante que sabemos nos veio da sua literatura – dos seus poetas, oradores, ou filósofos. Na Grécia, num primeiro momento dominou a vingança privada e a pena ia além da pessoa do delinqüente, atingindo sua família. Após surge o período religioso onde o Estado, em nome de Júpiter, teria por fim delegar a pena, qualquer que seja ela, substituindo-se ao ofendido. 

Num período denominado histórico, a pena era baseada na moral enquanto os delitos comuns eram castigados individualmente as ofensas de caráter religioso e político davam margem a expiações coletivas. 

Assim, vê-se que os gregos foram extraordinários na Filosofia, porém, no Direito realizaram uma obra apenas mediana, não alcançando um alto grau de desenvolvimento. Finalmente, os filósofos gregos trouxeram a debate uma questão geralmente ignorada dos povos anteriores, a da razão, e fundamento do Direito de punir e da finalidade da pena, questão que preocupou pensadores diversos e veio a ser mais detidamente considerada no movimento iniciado por Sócrates, com o particular interesse que então se tomou pelos problemas éticos.. Deve-se observar que não houve

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Ciência do Direito na Grécia antiga. 

DIREITO PENAL ROMANO

Conjunto de normas do povo romano, desde a origem de Roma até a morte de Jutiniano em 565 a.C. É uma das fontes mais importantes do Direito Civil moderno. Os Romanos construíram uma monumental obra jurídica, cujos institutos, práticas e entendimentos doutrinários perduram através dos tempos, sendo ainda hoje a base dos sistemas jurídicos modernos (Lei das XVII Tábuas). 

No campo do Direito Penal evoluiu-se das fases de vingança, por meio do Talião e da composição, bem como da vingança divina na época da realeza, Direito e Religião separaram-se. Divide-se o delito, em Roma, em crimina pública (segurança da cidade, parricidium), ou crimes majestatis e delicta privata (infrações consideradas menos graves, reprimidas por particulares). Seguiu-se

a eles a criação dos crimina extraordinárias (entre as outras duas categorias) finalmente, a pena torna-se, em regra, pública. As sanções são mitigadas, e é praticamente abolida a pena de morte, substituídas pelo exílio e pela deportação. 

Contribuiu o Direito Romano decisivamente para a evolução do direito Penal com a criação de princípios penal sobre o erro, culpa (leve e lata), dolo (bonus e malus), imputabilidade, coação irresistível, agravantes, legítima defesa etc. 

O romanos que foram grandes juristas, não cuidavam de doutrina sistemática de conceitos fundamentais. O seu direito era uma prática do justo em relação a fatos cotidianos. Ars boni et aequi. Ou, como diria Spengler, “a sua jurisprudência é uma ciência empírica dos fatos particulares.” Em oradores e filósofos, porém, encontramos, embora sob influência de pensadores helênicos, sobretudo Platão, inteligentes tentativas de fundamentação da pena, que atingem, às vezes, as nossas concepções mais atuais. Seneca, toma idéias do filósofo das leis e as desenvolve, insistindo sobre o tema do caráter preventivo, e não repressivo da pena.

DIREITO PENAL GERMÂNICONos costumes germânicos primitivos, o problema penal resolvia-se pela vingança ou pela perda da paz. Formas primárias de reação anticriminal. 

O tom religioso, que certamente impregnava as primitivas reações anticriminais germânicas, não está bem claro nas fontes. Nos primeiros tempos, dentro do grupo gentilício (Sippe) vigoram a disciplina do chefe e a perda da paz(Friedlosigkeit), em que o violador é posto para fora da proteção jurídica do grupo, podendo ser perseguido e morto por qualquer um. De modo que a Friedlosigkeit se torna uma modalidade de pena de morte, a mais velha e persistente das formas de reação anticriminal – também a mais absurda, nas condições do Direito Penal moderno. 

Entre os grupos, é a vingança de sangue(Blutrache), que se apresenta mais como um dever do que como um direito. Depois a vingança de sangue foi superada pela composição, voluntária a princípio e finalmente legal, e mesmo a Friedlosigkeit veio a ser resgatada pelo pagamento de um preço de paz. Foi uma conseqüência da instituição de um poder público, representante da vontade coletiva, e da consolidação da sua autoridade. 

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O uso primitivo de resolver pela força as questões criminais não desapareceu: a prática da vingança recrudesceu com a queda da monarquia franca, quando a influência do Direito Romano cedeu novamente espaço aos velhos costumes germânicos, sendo preciso para combatê-la a instituição das tréguas de Deus, do asilo religioso, das pazes territoriais. Penetrou mesmo nas práticas do processo penal. Depois das ordálias, o juízo de Deus acabou prevalecendo sob a forma do duelo judiciário, que reaparece, levando o julgador a reconhecer a razão do mais forte, na realidade tomando a sorte das armas e , portanto, a força como prova do Direito. Era uma conseqüência, talvez, da predominância do individualismo no Direito germânico, que levou a fazer persistir nos regimes jurídicos sob sua influência, como o dominante no maior trecho da Idade-Média, a vingança privada e a composição entre as partes, ou acentuando a pena pecuniária e tomando em consideração, na apreciação do crime, mais o dano do que o elemento subjetivo do crime. 

DIREITO CANÔNICO

Na idade média, a Igreja, à proporção que crescia em domínio e poder, estendia a sua disciplina a fatos considerados crimes de ordem a princípio meramente espiritual e depois mista, praticados por eclesiásticos ou profanos. O conjunto dessas normas, emanadas do poder pontifício, sobretudo do século XII, veio a construir o Direito Penal canônico, que teve influência na prática da justiça punitiva, principalmente por decisões eclesiásticas recebiam execução por tribunais civis e muitas daquelas normas tornaram-se obrigatórias, com a

conquista do poder temporal pela Igreja, mesmo para a autoridade civil. Desde seu reconhecimento pelo Império Romano em 325 d.C a Igreja começou a exercer poderosa influência no Direito Penal. 

Entre a época dos direitos romano e germânico e a do direito moderno, estendeu-se o direito Canônico, ou o direito Penal da Igreja, com influência decisiva do cristianismo na legislação penal. 

Um dos primeiros efeitos da intervenção da Igreja em tais domínios, consistiu na humanização das penas. A máxima “Ecclesia abhorret a sanguine”, deu origem a instituições como o direito de asilo e as tréguas de Deus. 

Assimilando o Direito Romano e adaptando este às novas condições sociais, a Igreja contribuiu de maneira relevante para a humanização do Direito Penal embora politicamente sua luta metódica visasse obter o predomínio do Papado sobre o poder temporal para proteger os interesses religiosos da dominação. Proclamou-se a igualdade entre os homens, acentuou-se o aspecto subjetivo do crime e da responsabilidade penal e tentou-se banir as ordálias e os duelos judiciários (próprios do direito germânico). Promoveu-se a mitigação das penas que passaram a ter como fim não só a expiação, mas também a regeneração do criminoso pelo arrependimento e purgação da culpa, o que levou, paradoxalmente, aos excessos da Inquisição. A jurisdição penal eclesiástica, entretanto, era infensa à pena de morte, entregando-se o condenado ao poder civil para a execução. 

DIREITO MEDIEVALA queda do Império Romano no ano de 476 é vista como o início de uma nova era histórica, esperava-se que a Idade Média trouxesse uma nova concepção punitiva, fazendo transparecer a nova estrutura sócio-econômica e política que ia substituir aquela vivente entre os romanos e os germânicos. Mas este período se caracterizou por ser de intolerância, de crueldade, de guerras, ódios, perseguições e torturas que sem dúvidas repercutiram no campo jurídico. 

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No período medieval, as práticas penais entrelaçaram-se e influenciaram-se reciprocamente nos direitos romano, canônico e germânico. O direito penal, pródigo na cominação da pena de morte, executada pelas formas mais cruéis (fogueira, afogamento, soterramento, enforcamento etc.), visava especificamente à intimação. As sanções penais eram desiguais, dependendo da condição social e política do réu, sendo comuns o confisco, a mutilação, os açoites e as penas infamantes. Prescrito o sistema de composição, o caráter público do direito penal é exclusivo, sendo exercido em defesa do Estado e da religião. 

PERÍODO HUMANITÁRIOTal estado de coisas suscitava na consciência comum a necessidade de modificações e reformas no direito repressivo. É no decorrer do Iluminismo que se inicia o chamado Período Humanitário do Direito Penal, movimento que pregou a reforma das leis e da administração da justiça penal no fim do século XVIII. É nesse momento que o homem moderno toma consciência crítica do problema penal como problema filosófico e jurídico que é. Os temas em torno dos quais se desenvolve a nova ciência são, sobretudo, os do direito de punir e da legitimidade das penas. 

Césare Bonesana Beccaria, foi uma das primeiras vozes a repercutir na consciência pública para a reforma da sistemática penal operada no fim do século XVIII, estendendo-se até o início do século XIX, culminando com a consolidação da Escola Clássica. Seus princípios básicos foram: a legalidade dos crimes e das penas, a indistinção das pessoas perante a lei penal, a lei penal deveria ser tão completa e minuciosa que ao juiz não restasse lugar para interpretações ou criações de tipos incriminadores ou de penas não-cominadas e proporcionalidade das penas aos delitos, propondo também um novo fundamento à justiça penal. Firmo também Beccaria muitos dos princípios adotados pela Declaração dos Direitos do Homem, da Revolução Francesa: 1. Os cidadãos, por viverem em sociedade, cedem apenas uma parcela de sua liberdade e direitos. Por essa razão, não se podem aplicar penas que atinjam direitos não cedidos, como acontece nos casos da pena de morte e das sanções cruéis. 

2. Só as leis podem fixar as penas, não se permitindo ao juiz interpretá-las ou aplicar sanções arbitrariamente.

3. As leis devem ser conhecidas pelo povo, redigidas com clareza, para que possam ser compreendidas e obedecidas por todos os cidadãos. 

4. A prisão preventiva somente se justifica diante da prova da existência do crime e de sua autoria. 

5. Devem ser admitidas em Juízo todas as provas, inclusive a palavra dos condenados (mortos civis). 

6. Não se justificam as penas de confisco, que atingem os herdeiros do condenado, e as infamantes, que recaem sobre toda a família do criminoso. 

7. Não se deve permitir o testemunho secreto, a tortura para o interrogatório e os juízos de Deus que não levam à descoberta da verdade. 

8. A pena deve ser utilizada como profilaxia social, não só para intimidar o cidadão, mas também recuperar o delinqüente.

ESCOLAS PENAIS

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Os tempos modernos viram nascer essas correntes do pensamento filosófico-jurídico em matéria penal, chamadas escolas penais, que se formaram e distinguiram uma das outras, como corpo de doutrina mais ou menos coerentes sobre os problemas em relação com o fenômeno do crime e, em particular, sobre os fundamentos e objetivos do sistema penal. 

Dentre essas escolas, duas se destacaram, porque representaram posições lógica e filosoficamente bem definidas, cada uma delas correspondendo, na realidade, a uma distinta concepção do mundo. São a escola clássica e positiva. As outras em geral, posições de compromisso, que participam, com maior ou menor coerência das duas principais. 

ESCOLA CLÁSSICAA denominação clássica se deve a suas figuras representativas, não sem um certo desejo de sarcasmo, posto que clássico é algo consagrado, o ilustre, o excelso. 

César Bonesana Beccaria, no dizer de João Farias Júnior (1990), foi uma das primeiras vozes a repercutir na consciência pública para a reforma da sistemática penal operada no fim do século XVIII, estendendo-se até o início do século XIX, culminando com a consolidação da Escola Clássica. Seus princípios básicos foram: a legalidade dos crimes e das penas, a indistinção das pessoas perante a lei penal, a lei penal deveria ser tão completa e minuciosa que ao juiz não restasse lugar para interpretações ou criações de tipos incriminadores ou de penas não-cominadas e proporcionalidade das penas aos delitos. Francesco Carrara, outro precursor dessa Escola, disserta que "o homem é submetido às leis criminais, por causa de sua natureza moral; por conseguinte, ninguém pode ser socialmente responsável por seu ato se não moralmente responsável". 

O crime não é propriamente "um fato, mas uma entidade jurídica, não uma ação, mas uma infração (Carrara, 1876). 

Para Carrara, delito é a infração da lei do Estado, promulgada para proteger a segurança dos cidadãos, resultante de um ato externo do homem, positivo ou negativo, moralmente imputável e politicamente danoso. 

Aos criminosos que agem conscientemente, cabe plena imputabilidade moral e, portanto, inteira responsabilidade pelos seus atos. Têm eles liberdade de ação na escolha entre o bem e o mal. Daí, naturalmente, deverem sofrer as conseqüências do que fizerem. 

O crime é uma relação jurídica entre o homem delinqüente e a lei escrita. 

A pena é castigo, conseqüência lógica e razoável da ação de quem, podendo e devendo, não quis evitar o mal feito. 

A doutrina clássica preocupa-se com a legalidade e a justiça, principalmente a penal, não conta com a pessoa do delinqüente. 

ESCOLA POSITIVAA escola foi chamada positiva, não porque aceitasse o sistema filosófico de Comte, mas pelo seu mérito. A escola sofreu a influência de Charles Darwin, Spencer e Haeckel, com as novas concepções da

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natureza e do homem. 

Cesar Lombroso, médico, professor de medicina Legal da Universidade de Turim, foi o pioneiro desta Escola. A primeira edição da obra de Lombroso foi em 1876, alterando o rumo dos estudos penais. O professor lastreou suas pesquisas com o aparecimento, em 1859, da obra Origem das espécies, de Charles Darwin, donde se afirma a profunda relação do homem com os demais animais e enfatiza a semelhança e a influência dos impulsos biológicos. Lombroso demonstrou a necessidade de estudar a personalidade do delinqüente para surpreender a origem biológica do delito. 

Porém a grande figura da Escola Positiva foi Enrique Ferri, com seus livros Sociologia criminal e Princípios do direito criminal, inaugurando a fase sociológica da Escola. Pelos estudos de Ferri, as análises do crime e do criminoso passaram do plano antropológico para o plano sociológico. Completando os pioneiros desta Escola, citamos Rafael Garófalo, que dividiu seu livro, Criminologia, dividido em três partes: o delito, o delinqüente e a repressão penal. 

Garófalo trouxe para a Escola Positiva o conteúdo jurídico, definindo como crime natural a ofensa feita à parte do senso moral formada pelos sentimentos altruístas de piedade e probidade. 

O método utilizado é o indutivo, da observação e da experimentação. A responsabilidade é social. O criminoso age independentemente de sua vontade, forçado por circunstâncias inerentes à sua estrutura físico-psíquica ou ao meio, mas prejudica e abala a sociedade perante a qual é responsável, perigoso e temível. 

A pena não é castigo ou medida aflitiva, mas defesa social. 

A doutrina positivista preocupa-se com a pessoa do criminoso, buscando saber quais os fatores que o levaram ao crime. 

Com a Escola Positiva surgiu a Criminologia, que estuda os criminosos e a criminalidade sob os mais variados ângulos, procurando-se uma explicação para o crime. 

ESCOLAS MISTAS E TENDÊNCIA CONTEMPORÂNEAProcurando conciliar os princípios da Escola Clássica e o tecnicismo jurídico com a Escola Positiva, surgiram escolas ecléticas, mistas, como a Terceira Escola e a Escola Moderna Alemã. Aproveitando as idéias de clássicos e positivistas, separava-se o Direito Penal das demais ciências penais, contribuindo de certa forma para a evolução dos dois estudos. Referiam-se os estudiosos À causalidade do crime e não a sua fatalidade, excluindo, portanto, o tipo criminal antropológico, e pregavam a reforma social como dever do Estado no combate ao crime> Da moderna escola alemã resultou grande influência no terreno das realizações práticas, como a elaboração de leis, criando-se o instituto das medidas de segurança, o livramento condicional, o sursis etc. 

Hoje, como reação ao positivismo jurídico, em que se pregava a redução do Direito ao estudo da lei vigente, os penalistas passaram a preocupar-se com a pessoa do condenada em uma perspectiva humanista, instituindo-se a doutrina da Nova Defesa Social. Para esta, a sociedade apenas é defendida à medida que se proporciona a adaptação do condenado ao convívio social. 

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DIREITO PENAL BRASILEIROAntes de estudarmos a história do direito brasileiro independentemente de Portugal com autonomia legislativa, é necessário observamos a influência que as leis portuguesas tiveram em nosso país visto ser estas utilizadas aqui, enquanto colônia. 

Com as invasões bárbaras no séc.V, a Península Ibérica passou a ser controlada por bárbaros. Após passar pelo domínio dos Álanos, Suevos e Vândalos, os Visigodos foram o povo que realmente estabeleceram moradia permanente naquela região.As primeiras leis escritas dos visigodos foram escritas no ano de 466 d.C. e por seu rei Eurico, nas Gálias. Estas leis resultaram no Código de Alariciano, mandado fazer por seui rpimo Alarico. Foi com base nesta lei que Chindasvindo e seu filho Rescesvinto fizeram na Península Ibérica o corpo de leis que se chamou de Codex legum ou lex Wisigothorum. Este é o primeiro corpo de leis que vigora pela Península. Como a Igreja tinha grande influência, neste código é consagrada a intolerância religiosa, principalmente contra os judeus. "Estão previstas penas corporais... mas admite-se a composição" afirma Fragoso. 

Com a independência de Portugal, abandonam-se os códigos visigóticos e os cânones da Igreja e passa-se a adotar a legislação foral, ou seja, leis adotadas pelas diversas regiões do Reino e que se baseavam em costumes locais. As primeiras leis gerais foram elaboradas por Dom Afonso II, em 1211, e Dom Afonso III, em 1251. Por essa época o direito canônico adquiriu forma definitiva, a partir da publicação das Decretais de Gregório IX, e o direito romano renasce pela obra de estudiosos do direito, glosadores, em Bolonha. No reinado de Dom Diniz (1279-1325), a influência desse direito foi enorme em Portugal. 

Este era o direito em vigor na época de Dom João I (1384-1433), quando este determinou a reforma e compilação das leis num corpo orgânico. A compilação é publica em 1446 sob o reinado de D. Afonso V, então menor, sendo rei regente seu tio D. Pedro. A esta compilação se de o nome de Ordenações Afonsinas, que são divididas em 5 livros. É no livro V que está estão o direito e processo penais. Observamos neste código que a preocupação da pena com a sua proporção (do delito), mas sim em apenas "conter os homens por meio do terror e do sangue". A pena capital é aplica em ampla escala, dando continuísmo as diferenças de classes (plebeus e nobres). 

Apesar da violência aplicada, esta obra é de grande importância visto ser ela o primeiro código a surgir na Europa e ainda por fixar no poder público o ius puniendi. 

Logo após em 1505, D. Manuel ordena uma revisão nas Ordenas e as reedita e as promulga em 1521 e chama-as de Ordenações Manuelinas. Quando Portugal passa ao domínio da Espanha em 1580, ocorre uma reforma legislativa levada a cabo por Felipe II. Esta reforma na legislação vigente é uma codificação que é chamada de Ordenações Filipinas. Este código ficou em vigor até depois que Portugal readquiriu sua independência.