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DIREITOS TRABALHISTAS NO BRASIL: CONCESSÃO OU CONQUISTA?
Autor: Paulo Kubiaki
Orientador: Nilceu Jacob Deitos
1. Introdução
Na Abordagem temática deste artigo objetivou-se ampliar o estudo feito no
projeto inicial do PDE “A Revolução de 1930 e a luta de classes” cujo estudo trata da
luta da classe operária nas primeiras décadas do século XX e as mudanças
provocadas na vida do trabalhador a partir dos acontecimentos da Revolução de
1930 e as transformações decorrentes que se efetivaram neste período, tendo sua
culminância na promulgação da Consolidação das Leis Trabalhistas durante o
Estado Novo.
Nesse artigo aprofundamos a abordagem histórica das relações trabalhistas
no Brasil, cujo objetivo visa refletir o caminho percorrido que resultaram na conquista
ou na concessão destes direitos, pois durante a implementação do projeto inicial no
estabelecimento de ensino, o estudo direcionou-se no sentido de perceber através
das pesquisas desenvolvidas junto aos alunos e seus familiares, a relação de
conhecimento que os mesmos tinham sobre os direitos trabalhistas na realidade
vivenciada, onde se demonstrou que o conhecimento era mínimo, aparecendo
alguns direitos contemplados na CLT, mas historicamente não se mencionava a luta
da classe operária que possibilitou a concessão destes direitos no período de Vargas
durante o Estado Novo.
O embasamento teórico conta com a o obra de José Murilo de Carvalho
“Cidadania no Brasil – O longo caminho” onde se demonstrou a evolução dos
direitos sociais no Brasil a partir da garantia dos direitos trabalhistas na construção
da cidadania, pois a questão dos direitos trabalhistas nos parece de grande
relevância para a discussão, pois perpassa por esse tema na atualidade, a inclusão
de mais de 25 milhões de brasileiros que vivem na profunda pobreza, o crescimento
econômico pelo qual passa atualmente o país, que não vem acompanhado da
melhoria da distribuição de renda pelo salário mínimo que o trabalhador recebe, a
falta dele agrava ainda mais a miséria dos trabalhadores desempregados ou
daqueles que estão na informalidade, ficando de fora das mínimas garantias
oferecidas somente àqueles que estão protegidos pela legislação trabalhista.
No desenvolvimento deste tema nossa preocupação inicial baseou-se na
possibilidade de ampliar o debate sobre a temática proposta, que levasse a
percepção junto aos alunos, de que os avanços trabalhistas foram possibilitados
pela contínua luta dos trabalhadores, mas que também é concessão do Estado, por
isso, entender que todo o embate está no parlamento, pois toda e qualquer
concessão está cercada pelos interesses daqueles que dominam o poder
econômico, e a questão do aumento do salário mínimo, para incluir milhões de
brasileiros a uma vida digna, atendendo o que determina o artigo sétimo da
Constituição Federal, é uma questão economicamente política.
2. DIREITOS TRABALHISTAS NO BRASIL: CONCESSÃO OU CONQUISTA?
A questão dos direitos trabalhistas no Brasil nos remete, num primeiro
momento, a análise das relações de trabalho iniciadas aqui a partir da segunda
metade do século XVI com a transposição do mercantilismo Europeu, levado a cabo
pela Coroa Portuguesa. A ocupação de parte da costa Leste da América meridional
teve início em um momento em que a Coroa portuguesa via suas lucrativas rotas
comerciais com o Oriente estagnarem-se pelo aumento da concorrência com outros
reinos europeus.
A colonização lusa engendra um modelo salvador para ocupar e explorar as
terras no Novo Mundo através das capitanias hereditárias num processo
terceirizado, onde os donatários deveriam bancar com os recursos necessários para
o empreendimento. A exploração inicial das riquezas naturais com mão de obra
compulsiva dos indígenas originou no Brasil as relações de trabalho. Na medida em
que avançava a ocupação, a Coroa implementou um sistema administrativo para
garantir viabilidade econômica de sua colônia.
A produção açucareira, baseada na mão de obra escrava do negro africano,
com predomínio das grandes plantações, possibilitou o começo do surgimento de
núcleos populacionais ao longo da costa atlântica. A partir das últimas décadas do
século XVII, a mineração de aluvião no interior da colônia, principalmente em Minas
Gerais, foi o predecessor do povoamento do interior e fez nascerem várias cidades
ligadas à atividade aurífera e de diamantes.
Pouco era o trabalho livre, na sua maioria era escravo, e quanto mais lucro se
conseguia com o ouro, mais escravos, aos milhares eram introduzidos na colônia.
José Murilo de Carvalho nos aponta a situação social, política e das atividades
econômicas no período do Brasil colônia:
Por outro lado, a exploração do ouro e do diamante sofreu com maior força a presença da máquina repressiva e fiscal do sistema colonial. As duas coisas, maior mobilidade e maior controle, tornaram a região mineradora mais propícia à rebelião política. A pecuária era menos concentrada do que o latifúndio usava menos mão de obra escrava e tinha sobre a mineração a vantagem de fugir ao controle das autoridades coloniais. Mas, do lado negativo, gerava grande isolamento da população em relação ao mundo da administração e da política. O poder privado exercia o domínio inconteste. (Carvalho, José Murilo, 2008, p. 19)
O poder privado é que exercia o controle sobre a mão de obra escrava e livre,
portanto, aqui nesse momento, as lutas e rebeliões populares (não a luta dos
Inconfidentes, ou da Confederação do Equador, que eram elitistas, pois não
mencionavam o fim da escravidão), era contra os maus tratos sofridos pelos
escravos e pelo domínio que os homens pobres livres sofriam contra a opressão dos
senhores ricos colonizadores.
A situação das relações trabalhistas no Brasil praticamente não se alterou até
a Abolição da Escravatura em 1888, mas o fim da escravidão fez surgir uma enorme
exploração da mão de obra dos recém libertos, pois não tinham qualquer
perspectiva de mudanças na condição que viviam até então, ficando a mercê de
uma sociedade que era escravocrata e de um Estado totalmente incapacitado para
promover qualquer inserção social. Esta situação é apontada por José Murilo de
Carvalho:
No Brasil, aos libertos não foram dadas nem escolas, nem terras, nem empregos. Passada a euforia da libertação, muitos ex-escravos regressaram a suas fazendas, ou a fazendas vizinhas, para retornar o trabalho por baixo salário. Dezenas de anos após a abolição, os descendentes de escravos ainda viviam nas fazendas, uma vida pouco melhor do que a de seus antepassados escravos. Outros se dirigiram às cidades, como o Rio de Janeiro, onde foram engrossar a grande parcela da população sem emprego fixo. Onde havia dinamismo econômico provocado pela expansão do café, como em São Paulo, os novos empregos, tanto na agricultura como na indústria, foram ocupados pelos milhares de imigrantes
italianos (...) lá, os ex-cravos foram expulsos ou relegados aos trabalhos mais brutos e mais mal pagos (Carvalho, José Murilo, 2008, p. 52).
Da dura realidade enfrentada pelos operários nas fábricas com longas
jornadas de trabalho de até quinze horas, de segunda a sábado, trabalho infantil,
Figura 1.Trabalho infantil em Curitiba nas primeiras décadas do século XX.
salários miseráveis, insalubridade no ambiente fabril e a ausência de qualquer
proteção de leis trabalhistas refletiam na vida social dos operários, pois as condições
eram mais que desumanas. A esta situação degradante do operariado brasileiro, o
Estado aristocrático respondia com violência e repressão aos operários grevistas.
Nas últimas décadas do século XIX, o Estado promove o incentivo da
imigração para substituir a mão-de-obra escrava que havia acabado. Muitos destes
imigrantes eram anarquistas vindos da Itália e da Espanha para o Brasil no fim do
século XIX e início do século XX. Aliados nas lutas pelos direitos trabalhistas
colaboravam na organização dos operários para o movimento de resistência e
greve. Ideologicamente os anarquistas eram contra a propriedade privada, o Estado
e qualquer forma de organização política e religiosa, mas defendiam a união na luta
da classe operária para que o indivíduo pudesse viver numa sociedade livre. José
Murilo de Carvalho nos apresenta a situação da pauta de luta da classe operária nas
primeiras décadas do século XX:
Sob o ponto de vista da cidadania, o movimento operário significou um avanço inegável, sobretudo no que se refere aos direitos civis. O movimento lutava por direitos básicos, como o de organizar-se, de manifestar-se, de escolher o trabalho, de fazer greve. Os operários lutaram também por uma legislação trabalhista que regulasse o horário de trabalho, o descanso semanal, as férias, e por direitos sociais como o seguro de acidentes de trabalho e aposentadoria (Carvalho, José Murilo, 2008, p. 60).
Porém aos pouco os comunistas foram aumentando a influência sobre a
classe operária, chegando ao ponto de controlarem os sindicatos, as associações e
as confederações das categorias trabalhistas através da direção centralizada dos
sindicatos, conseguido com isso o afastamento e posterior enfraquecimento dos
anarquistas na organização da luta operária. Como destaca Tronca:
Não é demais recordar que, desde o início do século até os anos vinte, o anarco-sindicalismo constituiu-se na principal corrente doutrinária a influenciar o movimento operário brasileiro. Entretanto, o endurecimento da repressão durante o governo de Artur Bernardes (1922 -1926), de um lado, e a hostilidade do recém-fundado PCB, que ostentava a legenda da vitoriosa Revolução Russa de 1917, de outro, contribuíram para o enfraquecimento da presença anarquista (TRONCA, 1986, p.17).
Esse controle dos comunistas sobre a organização operária contribuiu para o
fortalecimento do Partido Comunista Brasileiro (PCB) possibilitando sua participação
no jogo político através da ação parlamentar. Essa atuação era uma armadilha, pois
o parlamento era dominado pela aristocracia agrária e pelos incipientes interesses
dos industriais, portanto bem opostos aos dos trabalhadores. Qualquer lei que fosse
proposta para a melhoria dos ínfimos direitos trabalhistas existentes, não contavam
com a aprovação, as pequenas conquistas conseguidas através das lutas e das
greves operárias estavam estagnadas.
O Estado Brasileiro que surgiu após a Revolução 1930 estabeleceu leis para
intermediar as relações de empregados e patrões. Na implantação desse processo
Vargas vai fortalecer o papel desempenhado pelo Estado frente à sociedade. Leis
que permitem o Estado ser o regulador entre as demandas da classe operária e o
capital industrial, são elaboradas e postas em prática com o decreto Nº 19770 de
março de 1931, que permite ao Estado direcionar e controlar a ação dos sindicatos
dos trabalhadores, proibindo as greves para evitar conflitos com os patrões, esse
papel tutelar do Estado acabou por silenciar as lutas operárias, como destaca De
Decca “com relação à classe operária, esta sim, estava completamente isolada e
silenciada pela desmontagem sistemática de todas as suas formas de organização
autônoma” (1988, p. 134).
Figura 2. Trabalhadores do setor mineral e carvão recepcionam Vargas.
Em contra partida, são aprovadas leis que garantem aos trabalhadores alguns
direitos secularmente negados como, férias, jornadas de trabalho regulamentadas e
melhores condições de trabalho no ambiente fabril.
Os direitos trabalhistas seriam ampliados a partir da década de 1940, como
concessão do Estado através da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT),
promulgada por Getúlio Vargas em 1943. As leis trabalhistas estabelecidas pelo
Estado regulamentavam a ação da luta operária, pois a legislação proibia as greves
e o Estado era o mediador para negociar os conflitos e as pendências entre patrões
e empregados.
Figura 3. Foto de Getúlio Vargas alusiva a promulgação da CLT em 1943.
Segundo José Murilo de Carvalho “A CLT, introduzida em pleno Estado Novo,
teve longa duração: resistiu à democratização de 1945 e ainda permanece até hoje
em vigor com poucas modificações de fundo” (2008, p. 110).
Os direitos trabalhistas contemplavam somente os trabalhadores urbanos, e
sua concessão foi amplamente usada por Getúlio Vargas para atrair o apoio eleitoral
da grande maioria desses trabalhadores, mesmo deixando o poder executivo em
1945, foi eleito senador por dois estados, e voltou triunfante nas eleições
presidenciais de 1950. O populismo mostrava sua força, o presidente Vargas era
chamado de “o pai dos pobres”. Mas essa “proteção” não chegou até as demais
categorias de trabalhadores, como os autônomos, as empregadas domésticas e aos
trabalhadores rurais que eram explorados secularmente desde o Brasil Colônia.
Essa situação pode ser explicada pelo grande domínio exercido pelos
latifundiários, conforme nos aponta José Murilo de Carvalho:
Em toda essa legislação houve um grande ausente: o trabalhador rural. Embora não fossem explicitamente excluídos, exigia-se lei especial para sua sindicalização, que só foi introduzida em 1963. A extensão da legislação social ao campo teve que esperar os governos militares para ser implementada. Esse grande vazio na legislação indica com clareza o peso que ainda possuíam os proprietários rurais. O governo não ousava interferir em seus domínios levando até eles a legislação protetora dos direitos dos trabalhadores. O receio de atingir a classe média urbana pode também ter influenciado o esquecimento dos trabalhadores domésticos. Quanto aos autônomos, talvez não apresentassem naquele momento problemas políticos nem econômicos que justificassem preocupação do governo em cooptá-los e controlá-los (Carvalho, José Murilo, 2008, p. 123).
Desde o fim do Estado Novo, do segundo governo Vargas ao período dos
governos populistas, Juscelino, Jânio e Goulart, os avanços na legislação
trabalhista se mantiveram. Se por um lado não houve retrocessos, também não
ocorreram avanços significativos, com exceção da Lei Orgânica da Previdência
Social de 1960 que visava unificar as normas previdenciárias.
O duro golpe, o retrocesso legislativo que impossibilitava qualquer ampliação
dos direitos trabalhistas foi estabelecido pela ditadura militar a partir de 1964,
poucas foram as concessões, foi trocada a estabilidade no emprego pelo fundo de
garantia por tempo de serviço (FGTS). Em 1971 foi criado o Fundo de Assistência
Rural (Funrural) objetivando inserir os trabalhadores rurais na previdência, cujos
ainda não tinham qualquer proteção previdenciária.
Porém as reuniões, assembléias e manifestações não eram permitidas, as
greves estavam proibidas, pois qualquer aglomeração pública assustava a ditadura,
os trabalhadores estavam desamparados de qualquer forma de organização. Os
sindicatos sofreram intervenções e expurgos, para frear o movimento operário, como
nos aponta José Murilo de Carvalho:
Órgãos estudantis e sindicais também foram alvo da ação repressiva. Existem dados apenas para as intervenções nos sindicatos ocorridas de 1964 a 1970. Foram ao todo 536 intervenções, sendo 483 em sindicatos, 49 em federações e quatro em confederações. Quase todas se concentravam em 1964 e 1965, indicação de que, eliminada a cúpula sindical, pouco restou do movimento. Quando recomeçaram as greves, em 1968, elas se fizeram à margem da estrutura sindical oficial (Carvalho, José Murilo, 2008, p. 164-5).
O capital estava protegido e intocado pelo regime ditatorial, o Estado grande
arquitetado pelos generais não aceitaria que as “grandes obras” do período fossem
paralisadas por possíveis greves, por reivindicações exigindo melhores salários.
Outro grande golpe do período em fins da década de 70 e 80 foram as perdas
salariais sofridas no salário mínimo pelos galopantes e altos índices de inflação, que
corroíam os ganhos dos trabalhadores.
As greves, ainda proibidas, só vão retornar como instrumento de garantia na
manutenção dos direitos trabalhistas no início do mandato do último general
presidente João Baptista Figueiredo, iniciadas pelos metalúrgicos do ABC paulista a
partir de 1979, sob liderança de Luís Inácio Lula da Silva. José Murilo de Carvalho
nos aponta:
O movimento começou em 1977, com uma campanha por recuperação salarial, e culminou em 1978 e 1979, com grandes greves que se estenderam a outras partes do país. Em 1978, cerca de 300 mil operários entraram em greve; em 1979, acima de três milhões, abrangendo as mais diversas categorias profissionais, inclusive trabalhadores rurais. Eram as primeiras greves desde 1968 (Carvalho, José Murilo, 2008, p. 180).
Com o fim do Regime Militar em 1985 e a volta da redemocratização, a mais
recente Constituição do Brasil, em 1988, considerada a “Constituição Cidadã”
referendou os direitos trabalhistas consagrados na CLT de Vargas, indo além um
pouco, legitimou o direito de greve como instrumento válido para que o trabalhador
possa forçar os patrões, as empresas e o Estado a negociar melhores salários e
melhorias nas condições de trabalho, ou para garantir que algum direito
estabelecido pela legislação trabalhista não seja diminuído ou suprimido. Concedeu
ainda o seguro desemprego, atrelado há algumas normas que só beneficiam
aqueles que estão na formalidade da Legislação Trabalhista e o vale transporte para
garantir uma maior assiduidade do trabalhador. Sobre a conquista da constituição
de 1988, José Murilo de Carvalho destaca:
A força do corporativismo manifestou-se mesmo durante a Constituinte de 1988. Cada grupo procurou defender e aumentar seus privilégios. Apesar das críticas à CLT, as centrais sindicais dividiram-se quanto ao imposto sindical e à unicidade sindical, dois esteios do sistema montado por Vargas. Tanto o imposto como a unicidade foram mantidos. Os funcionários públicos conseguiram estabilidade no emprego. Os aposentados conseguiram o
limite de um salário mínimo nas pensões, os professores conseguiram aposentadoria cinco anos mais cedo, e assim por diante (Carvalho, José Murilo, 2008, p. 223).
Com a estabilização econômica, a partir da segunda metade da década de
1990, as demandas dos trabalhadores ficam mais claras e apresentam-se na
histórica pauta da luta do movimento operário, como aumento real do salário
mínimo, redução da jornada de trabalho, melhores condições de trabalho,
capacitação e participação nos lucros das empresas conforme a produção
alcançada.
Desde a década de 1940, junto com a CLT, foi criada a justiça do trabalho,
para orientar, mediar e julgar os conflitos trabalhistas, pois em diversas situações os
direitos trabalhistas não são respeitados ou implantados conforme estabelece a
legislação vigente, neste sentido José Murilo de Carvalho nos aponta “O único setor
do Judiciário que funciona um pouco melhor é o da justiça do trabalho. (...) essa
justiça só funciona para os trabalhadores do mercado formal (...). Os outros, que são
cada vez mais numerosos, ficam excluídos” (2008, p. 215).
A carteira de trabalho assinada é sem dúvida a garantia suprema esperada
pelo trabalhador, de que a legislação trabalhista, consagrada na CLT, vai assegurar
todo o amparo e proteção. Esse direito básico está sedimentado para todos os
trabalhadores, ainda que cotidianamente vejamos situações que fogem a essa
regra, gerando a exploração do trabalhador e em outras situações a degradante
utilização do trabalho infantil e do trabalho escravo, constantemente denunciado em
muitos lugares do Brasil.
A informalidade é a grande questão atual do trabalho no Brasil, nela estão
inserido milhões de brasileiros que não contam com os mínimos direitos
previdenciários estendidos aos trabalhadores que estão no mercado formal, mas ela
é também o resultado mais visível do desemprego que atormenta os trabalhadores.
Outra questão historicamente que nunca foi esquecida é sobre o poder
aquisitivo do salário mínimo, pois os índices que regulamentam seu reajuste são
definidos pelo governo, trata-se portanto de uma questão política.
O salário mínimo surgiu no Brasil a partir da década de 1930. A Lei nº 185 de
janeiro de 1936 e o Decreto-Lei nº 399 de abril de 1938 regulamentaram a instituição
do salário mínimo, e o Decreto-Lei nº 2162 de 1º de maio de 1940 instituiu seu valor
inicial de 240 mil Réis, cujo objetivo era atender as necessidades básicas do
trabalhador e de sua família, com a alimentação, moradia, saúde e educação. Com o
passar do tempo, esse valor foi gradativamente sendo corroído pela inflação e pela
baixa reposição dos aumentos repassados ao valor do salário.
Atualmente o seu valor é de 622,00 Reais, por uma jornada de 08 horas
diárias. Já o salário dos parlamentares, estando ou não no Congresso Nacional, é
superior a R$ 103 mil entre salários e verbas de gabinete, além de diversos auxílios
remunerados como moradia gratuita e transporte pago pelos impostos dos
brasileiros contribuintes.
Figura 4. Plenário da Câmara Federal em sessão parlamentar no dia
18/05/2011.Foto: Gustavo Lima.
A titulo de justificar o pequeno aumento do salário mínimo, muitos
parlamentares que também são grandes empresários, tentam justificar que a carga
tributária (pagamento de encargos sociais ao Estado), é um empecilho para
remunerar um salário maior, ou argumentam que os gastos do governo com
aposentadorias e seguridade social dos trabalhadores impede que o salário tenha
um reajuste maior. Muitos deputados e senadores usam politicamente seus cargos
para conter o aumento real do salário mínimo, pois são eles que aprovam ou não, já
que os mesmos são os “grandes patrões”.
Historicamente o salário mínimo em alguns momentos teve aumento superior
ao índice de inflação do período, mas nunca chegou perto do ganho inicial de
quando foi instituído na década de 1940. Atualmente o seu poder de compra não
garante assegurar as mínimas condições de sobrevivência de um trabalhador e de
sua família, sabemos que sempre vai faltar muito para que o trabalhador e sua
família possam sobreviver com dignidade.
Para tentar minimizar os efeitos do baixo salário, o governo federal tem criados
alguns mecanismos de auxílios sociais vinculados aos que ganham até um salário,
mesmo assim esses auxílios ficam muito aquém das reais necessidades. Vejamos,
segundo a Constituição da República Federativa do Brasil, o que o salário mínimo
deveria garantir ao trabalhador:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que
vivem sem à melhoria de sua condição social:
IV – salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender
às suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação,
educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com
reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua
vinculação para qualquer outro fim.
O valor estabelecido não é capaz de atender as mínimas necessidades de um
trabalhador, e muito menos de sua família, obrigando-o em inúmeras vezes a uma
dupla jornada de trabalho para aumentar a sua renda. Assim o salário mínimo em
seu valor atual, não é um fator que propicia a tão esperada distribuição de renda
para os que vivem dele.
A desigualdade social no Brasil tem historicamente suas raízes na
concentração de renda, onde uns poucos privilegiados tem quase tudo, e uma
grande maioria não tem quase nada, vivendo apenas do mísero salário ou das
parcas subvenções oferecidas criteriosamente pelo governo. José Murilo nos aponta
A desigualdade é a escravidão de hoje, o novo câncer que impede a constituição de uma sociedade democrática. (...) A precária democracia de hoje não sobreviveria a espera tão longa para extirpar o câncer da desigualdade (Carvalho, José Murilo, 2008, p. 223).
A concessão do Estado na maioria dos direitos trabalhistas no Brasil, teve e
tem um alto preço para o avanço destes direitos, quase em sua totalidade, os
sindicatos, as confederações e as centrais sindicais ficaram atreladas ao poder e
aos benefícios ofertados pelo próprio Estado, derivando daí presidentes que
agradavam os trabalhadores com algum benefício, e outros que nada ofereciam, o
termômetro da concessão ajudava ou não a eleição deste ou daquele candidato.
O atrelamento dos líderes sindicais ao poder estatal enfraqueceu a luta na
base, esse distanciamento sempre foi um retrocesso para o avanço e para as
conquistas. Os primeiros e mais importantes direitos trabalhistas, concedidos por
Vargas na década de 1940, colocaram o sindicalismo sob o controle do Estado,
prática essa que se perpetua até hoje.
Por outro lado também, os interesses do capital sempre atentaram para que
alguns direitos não fossem concedidos, e que outros fossem suprimidos. A tática tem
seu embate no parlamento, onde as leis são criadas ou extintas.
Atualmente o Estado Brasileiro aprovou a lei nº 12.618 de 30 de abril de
2012, que obriga os novos funcionários públicos federais a uma contribuição para
quem estiver interessado em receber acima do teto do Instituto Nacional do Seguro
Social (INSS), vai ter de pagar uma contribuição à parte, para manter o salário
integral na aposentadoria, as regras são mexidas com o jogo em andamento,
quando se trata de restringir direitos, o Estado também faz a sua parte.
Desde sua criação, a CLT vem sofrendo constantes ataques que visam o seu
desmonte, atualmente, em nome de reduzir o desemprego, a norma é a
flexibilização da legislação trabalhista, conforme nos aponta Santos:
Nesse contexto é que se apresenta a flexibilização da norma trabalhista como instrumento de auxílio ao combate ao desemprego e o aumento da competitividade das empresas brasileiras no mercado econômico globalizado. O fenômeno consiste, basicamente, no afastamento do Estado da tutela das relações trabalhistas transferindo-a para os entes laborais, os quais podem negociar seus interesses conforme as imposições do Mercado (Dos Santos, Daniel Moita Zechlisnki, 2005, p. 10).
Alguns direitos são reduzidos para que aumente a contratação, a redução da
carga semanal de trabalho é vista como onerosa, pois aumentaria os custos para o
empregador, que necessita novas contratações para manter a produção. O viés
também serve para combater o desemprego, pois possibilitariam novas vagas de
trabalhos, mas os interesses da especulação financeira e dos lucros falam mais alto.
As demandas da classe trabalhadora ainda são muitas, o trabalhador ainda
não é valorizado no Brasil, e muito menos ainda o seu trabalho. A mão de obra
brasileira é uma das mais baratas, pois muitas empresas transnacionais vem aqui
produzir em função do baixo custo desta mão de obra, reflexo disso são as
minguadas aposentadorias que o trabalhador recebe, obrigando milhões a continuar
na ativa para aumentar a sua renda.
Neste exato momento observamos na Europa como um todo, por um lado,
uma onda de direitos trabalhistas sendo restringidos e minguados e, por outro, o
avanço do desemprego e subemprego. É triste verificar cotidianamente pelo
telejornal e pela internet, que milhões de trabalhadores em todo o mundo, estão
sendo jogados na sarjeta pelo desemprego provocado pela globalização.
Estamos assistindo ao fim de algo que nunca tivemos no Brasil, isto é, ao fim
do Estado de Bem Estar Social criado no pós Segunda Guerra Mundial na Europa e
EUA. Estas regiões do planeta estão voltando-se para a regra, estão “abrasileirando-
se”. Isso já está jogando combustível na luta de classe: jovens se rebelam em vários
países de capitalismo central.
Mas é sempre bom lembrar, com a ajuda de Marx, que a luta parlamentar, no
interior dos marcos postos pela democracia burguesa, é limitada, não rende grandes
frutos.
Mas embora nunca tivéssemos um Estado de Bem Estar Social, não significa
que cortes nos ínfimos direitos que temos, não nos possa abater. Portanto é sempre
bom estarmos em alerta. Sempre há um projetinho engavetado de um deputado,
prontinho para ser votado propondo o fim da CLT.
3. Conclusão
O estudo nos mostrou que os ataques desferidos contra a CLT tem
aumentado em volume e velocidade, a atual luta dos trabalhadores e dos sindicatos
não é pautada na ampliação ou na conquista de novos direitos, mas sim para tentar
frear a redução ou supressão dos direitos existentes. A situação é mais
desesperadora no que tange a possibilidade do alcance da Legislação Trabalhista
contemplar a todos, pois a terceirização e a flexibilização não permitem o mínimo de
amparo legal para o trabalhador.
Historicamente os direitos trabalhistas no Brasil foram concedidos num
primeiro momento sob a tutela do Estado durante o primeiro governo de Getúlio
Vargas e posteriormente pela aprovação do Congresso Nacional, onde o governo
conta com a base governista para controlar possíveis avanços e para manter os
ínfimos aumentos para o salário mínimo.
Em ambos os momentos, a concessão obedeceu a inúmeros interesses
econômicos de plantão. No período de Vargas, ao dotar o país das mínimas
condições de infra-estrutura para o desenvolvimento industrial e urbano, era
necessário também ter um grande número de trabalhadores para abastecer com
mão-de-obra os postos de trabalho que surgiam com o aumento da produção
industrial nacional, decorrente da política de substituição das importações. Assim
sendo, esse imenso contingente de trabalhadores deveria ser agradado com alguns
direitos até então inexistentes, e principalmente com a garantia de renda assegurada
pela instituição do salário mínimo.
A concessão dos direitos assegurava dividendo político a Getúlio, que na
História recente do Brasil passou a ser chamado pelos trabalhadores de “o pai dos
pobres” aquele que direcionou o olhar do Estado para os necessitados, esse
também era o seu discurso durante a Revolução de 1930 que o colocou no poder.
Os governos que sucederam a Getúlio continuaram com a política populista
iniciada por ele, porém sem fazer grandes concessões aos trabalhadores, nada
porém superou a CLT, pois os direitos assegurados em leis motivou a busca
constante pela manutenção, ampliação e pela conquista de novos direitos, a luta só
foi interrompida durante o governo dos generais nos longos anos da ditadura militar
no Brasil. No ocaso deste período, as greves dos trabalhadores, principalmente dos
metalúrgicos do ABC Paulista, ainda que proibidas, o foco era direcionado na luta
pela conquista de melhorias salariais.
Na redemocratização do país em fins da década de 1980, a demanda
reprimida na pauta de reivindicações da classe trabalhadora era extensa, o que
forçou a Assembléia Nacional Constituinte a aprovar alguns direitos que permitiram
melhorias para várias categorias, contempladas na Constituição de 1988.
Atualmente uma grande preocupação do trabalhador é manter-se no emprego
com carteira assinada, para assegurar os direitos garantidos na Legislação
Trabalhista, porém os ataques constante da globalização da economia, afetam o
nível de crescimento do emprego e a constante tendência pela redução dos custos
tem impactado na redução da renumeração da mão-de-obra, onde os direitos
trabalhistas são suprimidos e alterados pela flexibilização, para atender o apetite
voraz do mercado pelo aumento dos lucros.
Outro fator decorrente da ausência dos direitos é a informalidade, presente no
momento da implantação da CLT e aumentada em volume na atualidade, deixando
milhões de trabalhadores sem as garantias da Legislação Trabalhista, e mantendo-
os fora de qualquer distribuição de renda proporcionada pelo salário mínimo, que
também devido a sua baixa remuneração não é capaz de melhorar
substancialmente a vida dos trabalhadores que estão amparados pela CLT.
REFERÊNCIAS
CARVALHO, José Murilo. Cidadania no Brasil O Longo Caminho: 11ª Ed. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2008
SANTOS, Daniel Moita Zechlisnki. Flexibilização da norma trabalhista no Brasil:
Universidade de Caxias do Sul: Rio Grande do Sul, 2005
DE DECCA, E. 1930 O Silêncio dos vencidos. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1988
TRONCA, Í. Revolução de 30: a dominação oculta. São Paulo: Ed. Brasiliense,
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Fotos de domínio público disponibilizadas no site:
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Gustavo Lima