Diretrizes para um modelo de atenção em saúde mental

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Diretrizes para um modelo de atenção integral em saúde mental

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  • 1

    DIRETRIZES PARA UM MODELO DE

    ATENO INTEGRAL EM SADE

    MENTAL NO BRASIL

    2014

    ASSOCIAO BRASILEIRA DE PSIQUIATRIA - ABP

    ASSOCIAO MDICA BRASILEIRA - AMB

    CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA - CFM

    FEDERAO NACIONAL DOS MDICOS - FENAM

  • 3

    SUMRIO

    I. INTRODUO

    II. PRINCPIOS TICOS, FILOSFICOS E CIENTFICOS

    III. PROPOSTA DE DIRETRIZES PARA UM MODELO DE ATENO INTEGRAL EM SADE MENTAL NO BRASIL

    NVEL PRIMRIO - PROMOO E PREVENO - UNIDADES DE ATENO BSICA DE SADE (UABS) NVEL SECUNDRIO

    - CENTROS DE ATENO PSICOSSOCIAL (CAPS) - AMBULATRIOS GERAIS DE PSIQUIATRIA - AMBULATRIOS MDICOS ESPECIALIZADOS (AME)

    EM PSIQUIATRIA NVEL TERCIRIO

    - UNIDADES DE EMERGNCIA PSIQUITRICA EM PRONTOS-SOCORROS GERAIS

    - EQUIPES DE PSIQUIATRIA NO SAMU - CENTROS DE ATENO INTEGRAL EM SADE

    MENTAL (CAISM) - HOSPITAIS PSIQUITRICOS ESPECIALIZADOS - LEITOS DE LONGA PERMANNCIA PROTEO SOCIAL SERVIO DE RESIDNCIA TERAPUTICA I (LAR

    ABRIGADO) SERVIO DE RESIDNCIA TERAPUTICA II (PENSO

    PROTEGIDA) CENTRO DE CONVIVNCIA PROGRAMAS ESPECFICOS DE SADE MENTAL

    - CRIANAS E ADOLESCENTES - IDOSOS - LCOOL E DROGAS - DOENTES MENTAIS CUMPRINDO MEDIDA DE

    SEGURANA E POPULAO PRISIONAL DISTRIBUIO DE MEDICAMENTOS PREVENO AO SUICDIO REABILITAO E REINSERO SOCIAL

    IV. FINANCIAMENTO

    V. AVALIAO E CONTROLE

    VI. FORMAO E QUALIFICAO PROFISSIONAL

    VII. CONCLUSES

    VIII.CRDITOS

    IX. BIBLIOGRAFIA

  • 4

    I. INTRODUO A Associao Brasileira de Psiquiatria (ABP), como

    representante legtima de 12.000 psiquiatras brasileiros,

    defende, veementemente, a melhor assistncia possvel em

    sade mental para a populao, seguindo os princpios do

    Sistema nico de Sade e da Lei 10.216/2001.

    Os transtornos mentais so doenas crnicas altamente

    prevalentes no mundo e contribuem para morbidade,

    incapacitao e mortalidade precoces. Calcula-se que 25%

    da populao geral apresente um ou mais transtornos

    mentais ao longo da vida (Rodriguez et al., 2009). Somados

    aos transtornos neurolgicos, eles representam 14% da

    carga global de doenas, e 21% na Amrica Latina (OMS,

    2007). Nos pases em desenvolvimento, a defasagem no

    tratamento (proporo dos que necessitam de tratamento e

    no o recebem) chega a 75%. Na Amrica Latina, essa taxa

    deve ser maior, pois a qualidade e a efetividade do

    tratamento, como tambm as comorbidades, no so

    estudadas (PAHO, 2009). Um estudo publicado em 2012

    mostrou que, na regio metropolitana de So Paulo, 29,6%

    da populao apresenta transtorno mental, com grau

    moderado ou grave em dois teros dos casos (Andrade et al.,

    2012).

    Desde 1995, a poltica de sade mental dominante no Brasil

    adota como premissa do seu modelo assistencial a

    desvalorizao do saber psiquitrico e a reduo do papel do

    psiquiatra. O psiquiatra vem sendo colocado como profissional

    secundrio e prescindvel psiquiatria. A assistncia sade

    mental implementada pelos governos ao longo desse perodo

    continua baseada nos Centros de Ateno Psicossocial

    (CAPS), cuja eficcia enquanto servio de reabilitao e

    reinsero social ainda no foi demonstrada.

  • 5

    A Lei Federal 10.216/2001 determina o redirecionamento

    do modelo assistencial, garantindo ao paciente o melhor

    tratamento do sistema de sade, consentneo s suas

    necessidades, mas isso no tem sido efetivado no pas.

    A ABP discorda da construo de modelos assistenciais

    em sade mental centrados em um nico equipamento, seja

    ele qual for. A sade mental exige equipamentos diferentes

    para necessidades diferentes. Investe-se na desospitalizao

    sem o concomitante investimento nos equipamentos

    substitutivos (servios hospitalares e extra-hospitalares),

    levando a uma desassistncia generalizada.

    A maior demanda observada hoje, e sem assistncia

    adequada, por atendimento secundrio efetivo aos

    transtornos mentais de alta prevalncia, os quais, em geral,

    tm bom potencial de resposta teraputica. So eles: o

    primeiro episdio psictico, as depresses, o transtorno

    afetivo bipolar, os transtornos ansiosos, somatoformes e

    alimentares, e o abuso e a dependncia de lcool e outras

    substncias. Ateno especial e emergencial deve ser dada

    aos quadros prevalentes em crianas, adolescentes,

    mulheres (principalmente gestantes) e idosos.

    A elaborao de um modelo de assistncia em sade

    mental deve levar em conta a rede de atendimento

    atualmente existente, melhorando sua eficincia. Nesse

    sentido, os ambulatrios de sade mental, com acesso a

    unidades psiquitricas em hospitais gerais ou hospitais

    psiquitricos, so indispensveis para uma rede eficaz. Uma

    unidade psiquitrica em hospital geral (UP-HG) no deve ser

    confundida com simples leitos psiquitricos em hospital

    geral, sem equipes treinadas. Um hospital psiquitrico

    moderno pode ser uma instituio aberta e ter um custo

    operacional menor do que igual nmero de leitos em

    hospitais gerais. Ele pode ter ambientes diversificados e

  • 6

    equipes multiprofissionais dedicadas ao atendimento

    especfico e diferenciado a psicoses, transtornos do humor,

    lcool e drogas, adolescncia, psicogeriatria, etc.

    H demandas que necessitam de maior ateno. Com o

    aumento da expectativa de vida dos doentes mentais, h

    uma demanda cada vez maior de pacientes que necessitam

    de servios que possam propiciar cuidados prolongados de

    enfermagem. A drogadependncia vem se tornando um

    problema crescente e com repercusses alm da rea da

    sade.

    Um problema no planejamento das polticas pblicas

    voltadas para a sade mental que a qualidade e a

    resolutividade dos servios atualmente prestados no so

    avaliadas: o que feito, onde, para quem, por que, como, a

    que custo e com quais resultados.

    A mdio e longo prazo ser necessrio valorizar o ensino

    da psiquiatria nos currculos de graduao, incluindo-a entre

    as grandes reas da medicina. Da mesma forma, os

    enfermeiros, psiclogos e demais profissionais de sade

    mental devero receber informaes atualizadas e

    treinamento especfico em tcnicas de interveno de

    eficcia comprovada cientificamente. Avalia-se que cerca de

    3% do currculo nas faculdades de medicina e 7% nas

    faculdades de enfermagem so dedicados a temas de sade

    mental (psicologia mdica e psiquiatria) (relatrio WHO-

    AIMS, Brasil, 2007).

  • 7

    II. PRINCPIOS TICOS, FILOSFICOS E CIENTFICOS

    Os pressupostos ticos deste documento esto de acordo

    com os definidos pela Lei Federal 10.216, de abril de 2001, e

    pela Resoluo do Conselho Federal de Medicina n

    2.057/2013.

    1. Promoo dos direitos humanos dos indivduos com

    transtorno mental e seus familiares;

    2. tica, que o respeito para com a conceitualizao da

    psiquiatria e do transtorno mental;

    3. tica da responsabilidade do psiquiatra com relao ao

    direito, tratamento e sigilo sobre o paciente que doente

    mental;

    4. tica, que deve sempre educar para a diminuio do

    estigma em relao ao doente mental e suas repercusses;

    5. Garantia do direito do doente mental e seus familiares

    sade integral, com acesso s melhores teraputicas

    disponveis fundamentadas em evidncias cientficas;

    6. Promoo da participao do usurio do servio e seus

    familiares na avaliao do modelo teraputico aplicvel,

    assim como estimulao da superviso e avaliao

    constantes;

    7. Defesa da adequada destinao de recursos financeiros

    para qualificar a assistncia;

    8. Influncia sobre polticas e elaborao de leis.

  • 8

    III. PROPOSTA DE DIRETRIZES PARA UM MODELO DE ATENO INTEGRAL EM SADE MENTAL NO BRASIL

    Qualquer modelo assistencial vivel deve contar com

    objetivos, recursos e outros parmetros compatveis com a

    realidade. O conhecimento da evoluo do processo no

    qual se pretende intervir fundamental, pois dele que

    advm os ensinamentos que no nos permitiro propor

    aes j malogradas e nos possibilitaro consagrar aquelas

    que no contrariem a boa experincia vivida. Tambm se

    deve ter clara noo dos objetivos e metas a serem

    atingidos, dos recursos existentes para faz-lo e da

    possibilidade de assegurar continuidade ao processo

    pretendido.

    Embora possa parecer bvio a princpio, fundamental

    proceder a um levantamento dos servios de sade mental

    existentes, avaliando os recursos fsicos, humanos e

    interfaces com outros recursos da comunidade, pois os

    dados geralmente esto defasados e no incluem todos os

    recursos disponveis.

    Cientes das dimenses continentais do Brasil e de suas

    diferenas socioeconmicas e culturais locais e regionais, a

    ABP apresenta as Diretrizes para um Modelo de Assistncia

    Integral em Sade Mental. Levamos em conta a realidade de

    nosso pas e as necessidades da populao, e observamos

    fielmente o que preceitua a Lei 10.216/2001, que contempla

    a integralidade na assistncia em sade mental, assim como

    a Resoluo do Conselho Federal de Medicina n

    2.057/2013. No propomos um modelo rgido, mas diretrizes

    para um modelo de assistncia integral que possa ser

    aperfeioado continuamente na busca do ideal.

  • 9

    Os diversos servios devem contar com equipes

    multiprofissionais, e seus componentes devem atuar de

    forma interativa e integrada, cada um exercendo o papel

    que prprio de sua profisso, fazendo aparecer as relaes

    de colaborao existentes entre todos, sempre em benefcio

    dos pacientes e do compromisso com a ateno sanitria

    integral que lhes devida.

    Um modelo de assistncia integral em sade mental

    deve contar com o princpio de integrao entre os diversos

    servios, constituindo um sistema de referncia e

    contrarreferncia no qual as unidades devem funcionar de

    forma harmnica, complementando-se, no se opondo nem

    se sobrepondo uma outra, no concorrendo nem

    competindo entre si. Para isso, fundamental a definio

    clara das funes de cada servio e dos meios a serem

    adotados nos procedimentos de referncia e

    contrarreferncia.

    De modo geral, a diviso dos servios hoje se d pela

    distribuio no territrio e pelo grau de especificidade dos

    recursos investidos. As necessidades do paciente definem

    onde ele receber o cuidado (o paciente no pertenceria a

    nenhum servio, passaria por todos de que necessitasse).

    Na prtica, as aes so pouco precisas, o que, pelo lado

    positivo, apontaria para versatilidades e tentativa de

    resolubilidade de cada servio, que pretende fazer tudo. No

    entanto, o resultado pfio: o sistema faz pouco, sem

    efetividade, e de forma desordenada e redundante. A

    proposta aperfeioar o que existe e equipar as redes

    regionais com servios que produzam os resultados

    esperados. Os servios que comporo a rede so descritos a

    seguir.

  • 10

    NVEL PRIMRIO

    Promoo e preveno

    - Campanhas para reduzir o estigma dos portadores de

    transtornos mentais, incluindo orientao populao em

    relao s doenas mentais e apoio criao e ao

    fortalecimento de associaes de familiares e portadores de

    transtornos mentais.

    - Aes de preveno do suicdio em funo de sua

    prevalncia (em torno de 10.000 mortes/ano no Brasil) e do

    seu crescimento entre a populao jovem, sendo uma causa

    de morte amplamente prevenvel.

    - Orientao educacional contnua para os integrantes de

    comunidades especficas, tais como escolares e religiosas,

    de grupos responsveis por resgate e atendimento pr e ps-

    hospitalar e outros.

    - Programas de orientao, esclarecimento e suporte s

    famlias de doentes mentais, especialmente crianas,

    adolescentes e idosos, mas tambm de pacientes adultos

    incapacitados, que dependem da famlia social, emocional e

    financeiramente.

    - Ampla divulgao dos servios de sade mental, assim

    como orientao sobre a forma como procur-los e utiliz-

    los, proporcionando a deteco e tratamento precoce dos

    acometidos de transtornos mentais.

    - Para que os servios de cuidados primrios (Unidades

    Bsicas de Sade e Equipes de Sade da Famlia) possam

    dar assistncia psiquitrica s pessoas com os transtornos

    mentais mais prevalentes e de menor complexidade, ser

    necessrio capacitar os mdicos de famlia e generalistas

    para diagnosticar e tratar os transtornos mentais comuns e

    dar atendimento inicial s crises ou criar Ncleos de Apoio

    Sade da Famlia (NASF). Sabe-se que as capacitaes

    convencionais mostram-se pouco efetivas, podendo estar

    distantes da prtica diria; no garantem a quebra de

  • 11

    resistncias nem o engajamento dos profissionais, e no h

    continuidade de superviso ou garantias de encaminhamento

    dos casos mais graves. A proposta de capacitao

    continuada, balizada por diretrizes no atendimento dos

    transtornos mentais contendo especificaes tanto das

    condutas bsicas como das competncias e fluxos de

    encaminhamento na rede de assistncia. As diretrizes de

    cuidado utilizadas para os principais transtornos em seus

    diferentes nveis de atendimento tero como ponto de partida

    as do Projeto Diretrizes da AMB/CFM (Marques et al., 2012),

    que fomentam a discusso contnua dos padres de

    tratamento e de encaminhamento, envolvem pela cobrana

    de competncias, estimulam prticas baseadas em

    evidncias e possibilitam indicadores de processo e de

    resultados.

    Unidades de Ateno Bsica de Sade (UABS)

    - Treinamento de mdicos integrantes de Equipes de Sade

    da Famlia e de UABS, de acordo com os critrios

    estabelecidos pelas diretrizes da ABP, AMB e CFM, para

    identificar, tratar e encaminhar aos servios especializados

    os casos de transtornos mentais que no consigam tratar,

    construindo um sistema de referncia e contrarreferncia.

    - Esse sistema de referncia e contrarreferncia deve ser

    estruturado atravs da ao de equipes matriciais ligadas

    rede de sade mental (servio de sade mental de referncia

    para uma determinada populao), que ser responsvel por

    dar suporte tcnico e de superviso, atravs das tcnicas de

    interconsulta e consulta conjunta para um determinado nmero

    do Equipes de Sade da Famlia e UABS.

    - Criar programas de promoo, preveno e intervenes

    teraputicas em sade mental especficas para a ateno primria,

    elaborando diretrizes a serem implantadas conjuntamente pelas

    equipes de ateno primria e equipes matriciais.

  • 12

    NVEL SECUNDRIO

    ATENDIMENTOS AMBULATORIAIS

    Centros de Ateno Psicossocial (CAPS), focos de

    grande investimento pelos municpios nessa ltima dcada.

    Os CAPS existentes concentram grande parte dos recursos

    humanos em sade mental e devem prover assistncia

    psiquitrica consoante s necessidades da populao de seu

    territrio. A melhoria de seu funcionamento passa por

    diretrizes que especifiquem o perfil do paciente atendido

    (transtorno mental grave e crnico), uniformizem uma lista

    mnima de intervenes a serem oferecidas e colaborem

    para criar indicadores de funcionamento para a avaliao do

    desempenho das unidades.

    Ambulatrios Gerais de Psiquiatria com equipe de

    sade mental organizada de acordo com as demandas

    existentes em cada local e que faam a distribuio gratuita

    dos medicamentos prescritos. O atendimento ambulatorial

    eficaz no tratamento e controle das doenas mentais em fase

    aguda e, quando combinado com a dispensao de

    medicamentos, mostra uma elevada taxa de resposta

    teraputica com baixo custo.

    Ambulatrios Mdicos Especializados (AME) em

    Psiquiatria, com programas de atendimento e pblico-alvo

    especficos e compostos por equipe multiprofissional

    completa. Um atendimento mais intensivo que o ambulatorial,

    tanto em durao como em frequncia de atendimento, tendo

    a funo de complementar o atual sistema de atendimento

    baseado na ateno bsica e nos CAPS, atuando como

    referncia no matriciamento da rede de ateno em sade

    mental e na capacitao de recursos humanos.

  • 13

    NVEL TERCIRIO

    Dois dos maiores problemas da assistncia em sade

    mental no Brasil so a falta de leitos para internao

    psiquitrica e o precrio atendimento das urgncias

    psiquitricas. O ideal seria que todo grande servio de

    urgncias municipal ou regional tivesse em seu corpo clnico

    psiquiatra de planto e leitos de observao preparados para

    acolher o paciente por pelo menos 48 horas (tempo em que

    grande parte das demandas urgentes pode ser resolvida sem

    a necessidade de encaminhamento para internao). Na

    prtica, o que existe a dificuldade estrutural desses

    servios, que no apresentam profissionais de sade

    capacitados nem espao para a instalao de leitos

    psiquitricos.

    Unidades de Emergncia Psiquitrica em Prontos-

    Socorros Gerais, especficas para atendimento a

    emergncias psiquitricas, abertas em tempo integral, com

    leitos para acolher pacientes em crise, em curtssima

    permanncia (at 24 horas).

    Equipes de Psiquiatria no SAMU, com profissionais

    treinados para o atendimento de sade mental (o primeiro

    atendimento a urgncia psiquitrica, em casa ou mesmo na

    rua, pode ser decisivo para o encaminhamento do caso).

    quase regra geral a observao de que pacientes chegam ao

    servio de urgncia acompanhados de policiais, algemados

    ou amarrados, agitados e, por vezes, feridos. Esse paciente

    tender a ser internado, pois seu grau de agitao impedir

    qualquer acordo para incio de uma medicao, etc.

    Moradores de rua em crise, com transtorno psictico ou

    abuso de lcool e outras drogas, tambm tero com essas

    equipes de socorristas a possibilidade de uma abordagem

    mais adequada, que, casada com internaes mais ou

  • 14

    menos breves e acompanhamento subsequente no CAPS,

    poder mudar radicalmente a evoluo do caso, garantindo

    seu tratamento.

    Centros de Ateno Integral em Sade Mental

    (CAISM), que so servios que devem atuar tanto na

    ateno secundria como na terciria, pois contemplariam

    um atendimento completo em todos os nveis de

    complexidade (ambulatrio, pronto-socorro, CAPS, AME,

    hospital-dia e hospital para internao em tempo integral),

    exercendo papel de formao e capacitao de profissionais

    de sade mental em reas carentes de recursos humanos,

    alm de dar suporte tcnico para os CAPS e as UABS. Os

    CAISM seriam ideais para regies e localidades onde uma

    rede de ateno em sade mental esteja se estruturando.

    Unidades Psiquitricas em Hospitais Gerais,

    destinadas a internaes de pacientes agudos, a priori de

    curta permanncia para pacientes psiquitricos sem

    intercorrncias ou para pacientes psiquitricos com

    intercorrncias clnicas ou cirrgicas que necessitem de

    internao em hospitais gerais.

    Hospitais Psiquitricos Especializados, que so

    servios destinados a atender pacientes que necessitem de

    cuidados intensivos, cujo tratamento no pode ser realizado

    em servios de menor complexidade.

    Leitos de Longa Permanncia, destinados a pacientes

    com comprometimento para a manuteno de atividades

    bsicas de vida diria e que no possuem apoio familiar.

    Esses servios devem ser financiados tambm com verbas

    da assistncia social.

  • 15

    A integrao dos servios a prioridade da poltica

    assistencial de transio, para, a seguir, equipar a rede de

    acordo com as caractersticas regionais e recursos

    disponveis, como mostra a figura a seguir.

    PROTEO SOCIAL

    A doena mental muitas vezes traz uma incapacidade e

    dependncia que exigem polticas pblicas vinculadas

    assistncia social. Solues dignas, humanizadas e custo-

    efetivas so necessrias, a exemplo das adotadas em

    outros pases, como no Reino Unido, que adota o modelo

    de hostels, com apartamentos pequenos e individuais em

    condomnios teraputicos urbanos com suporte assistencial

    24 horas. H ainda experincias de moradias assistidas em

    condomnios rurais. Tambm h bons provedores de

    cuidados de longa permanncia no Brasil, muitos ligados ao

  • 16

    terceiro setor, com expertise em idosos e deficincia

    intelectual. A interface com a assistncia social grande, e

    o trabalho intersetorial se faz necessrio.

    Atualmente existem os Servios Residenciais

    Teraputicos (SRT), mantidos pelos municpios e

    financiados pela rea da sade, sem participao da rea

    da assistncia social. Esses servios no atendem as

    demandas de abrigamento e suporte de toda a populao

    necessitada, por se restringirem apenas a pacientes que se

    encontram internados em instituio psiquitrica h mais de

    2 anos ininterruptamente ou egressos de manicmios

    judicirios. Assim, doentes mentais que venham da

    comunidade no so contemplados.

    A proposta que os SRT sejam financiados com

    recursos da rea social e que no existam restries ao seu

    acesso pelos pacientes que deles necessitam.

    Servio de Residncia Teraputica I (Lar Abrigado)

    Servio destinado a pacientes com autonomia, sem

    necessidades clnicas de internao, que no contam com o

    apoio da famlia. Os moradores tero como referncia um

    servio de sade mental.

    Servio de Residncia Teraputica II (Penso Protegida)

    Servios destinados a pacientes com autonomia

    comprometida, sem necessidades clnicas de internao,

    que no contam com o apoio da famlia. Os moradores tero

    como referncia um servio de sade mental.

  • 17

    Centro de Convivncia

    Servio destinado convivncia de pessoas com

    variados graus de comprometimento, para recreao e

    convvio mantidos pela assistncia social. Os centros de

    convivncia estariam referenciados a um servio de

    assistncia de sade mental de nvel secundrio.

    PROGRAMAS ESPECFICOS DE SADE

    MENTAL

    PROGRAMA DE ATENO ESPECFICA PARA

    CRIANAS E ADOLESCENTES

    Os problemas psiquitricos na infncia e na adolescncia

    atingem entre 15 a 20% da populao, com predomnio dos

    transtornos de comportamento disruptivo e transtornos

    emocionais (Lai, 2000). Seu cuidado depende da prpria

    psicopatologia, bem como das famlias envolvidas.

    Como fatores de risco podem ser considerados aqueles que

    alteram o desenvolvimento da criana, incluindo-se entre eles

    prematuridade, problemas pr e perinatais, atrasos no

    desenvolvimento, problemas comportamentais, doenas

    crnicas ou deficincias. Envolvem tambm patologias

    familiares e dificuldades sociais. Assim, a interao entre a

    vulnerabilidade individual e as adversidades ambientais

    estabelecem o fator de risco. Alguns desses casos podem

    ser considerados de extrema importncia quando da sua

    insero em um hospital geral, escola ou creche.

    Levando-se em conta essas breves consideraes, torna-se

    evidente que um projeto de sade mental ter por meta, em

    primeiro lugar, pensar a criana e o adolescente enquanto

    populaes caractersticas, com universos prprios e

  • 18

    manifestaes comportamentais tpicas.

    Entretanto, mais do que a mera ausncia de doena, a

    sade comporta um assim chamado estado de bem-estar

    biopsicossocial, constituindo-se de um estado ativo para

    onde confluem elementos fsicos, familiares, sociais, pessoais,

    administrativos, escolares e outros, todos em geral

    desembocando naquilo que, de maneira simplista, poderamos

    agrupar sob a denominao genrica de qualidade de vida da

    criana.

    Quanto menor a criana, mais esse processo se torna

    dependente do grupo familiar, principalmente da me, que

    quem habitualmente percebe todo e qualquer desvio nesse

    estado de bem-estar.

    Na medida em que a criana se desenvolve, a escola

    passa tambm a desempenhar esse papel, constituindo-se,

    juntamente com a famlia, no universo da criana.

    Visando implantao de um projeto de sade mental da

    criana e do adolescente, podemos estabelecer os passos

    bsicos listados a seguir.

  • 19

    ATENO PRIMRIA

    1. Insero de mdulo referente a sade mental na formao de

    professores e nas programaes escolares de ensino

    fundamental e mdio, enfocando os principais problemas da rea.

    2. Sistematizao da aplicao de diferentes escalas de

    rastreio para doena mental em sentido amplo, bem como

    para diferentes quadros da infncia e adolescncia nas

    prprias escolas.

    3. Sistematizao da avaliao de qualidade de vida das

    crianas atendidas nos servios escolares.

    4. Avaliao dos eventuais distrbios de aprendizado e de

    comportamento surgidos no ambiente escolar.

    5. Reviso do ambiente escolar visando minimizao dos

    fatores de estresse.

    6. Elaborao de guias de sade mental, visando ao

    esclarecimento de pais e professores quanto aos principais

    problemas da rea, bem como uniformizao de condutas

    a serem estabelecidas. Esses guias podem ser utilizados em

    escolas e creches (visando estimulao de bebs), com

    treinamento para uso e superviso peridica das equipes de

    retaguarda.

    ATENO SECUNDRIA

    Ambulatrio Infantil

    O ambulatrio o ponto central do sistema, a partir do

    qual todos os pacientes so registrados e onde se iniciam os

    processos de diagnstico e tratamento no passveis de

    serem efetuados nos servios bsicos em funo de sua

    complexidade ou gravidade. Atendem, assim,

    preferencialmente, quadros de agitao, casos

  • 20

    psicopatolgicos especficos inacessveis abordagem em

    servios bsicos de sade e psicoses em geral.

    A partir desse atendimento, estabelece-se o diagnstico e

    o encaminhamento aos diferentes setores de atendimento,

    uma vez que tambm so realizados atendimentos

    fonoaudiolgico, psicolgico, psicoterpico e de terapia

    ocupacional.

    Programas de psicoterapia breve, a maior parte das vezes

    dirigidos aos adolescentes, devem estar presentes.

    Brinquedoteca Teraputica

    Tem como objetivo favorecer a melhora da qualidade de

    vida de pacientes registrados em um servio de psiquiatria

    da infncia e da adolescncia, bem como de suas famlias.

    Seu objetivo propiciar a interao grupal e a aceitao de

    regras e limites necessrios ao convvio social atravs do

    brincar, orientando as famlias quanto possibilidade de

    desenvolvimento psicossocial de suas crianas e/ou

    adolescentes. Para tanto, utiliza, enquanto metodologia,

    atividades ldicas que usam o brinquedo como objeto

    intermedirio e facilitador e orienta pais individualmente ou

    em grupo. Atende, assim, crianas at 12 anos ou mais

    velhas se apresentarem dificuldades cognitivas e sociais

    acentuadas.

    Interconsulta

    Supre a demanda de atendimento clnico em enfermaria de

    pediatria e fornece suporte adequado s famlias dos pacientes

    atendidos nesses servios, bem como s diferentes equipes,

    visando minimizao dos efeitos da internao ou mesmo do

    atendimento ambulatorial, bem como melhoria da qualidade

    de vida desses pacientes. Em um hospital geral, essa atividade

    tem fundamental importncia, e por isso deve ser privilegiada.

    Na escola, o atendimento predominantemente psicolgico,

    visando deteco dos principais problemas de aprendizado

  • 21

    ou comportamentais que dificultam o desempenho ou a

    insero da criana, sendo essas questes discutidas com a

    equipe escolar e as sugestes de interveno propostas e

    supervisionadas pelo profissional responsvel.

    ATENO TERCIRIA

    Hospital-Dia Infantil

    Servios onde se desenvolvem programas caracterizados

    pela flexibilidade, pela diminuio do trauma de separao da

    criana de suas famlias, pelo envolvimento dos servios na

    comunidade e pela possibilidade concomitante de

    manipulao do ambiente infantil. Esses servios so

    indicados para observao, manipulao das condutas e

    determinao dos nveis de desenvolvimento, e propiciam

    ambiente teraputico que possibilita a reduo de transtornos

    comportamentais. Assim, destinam-se a crianas pr-

    escolares com transtornos comportamentais, vtimas de abuso

    infantil e problemas familiares, psicoses na infncia e

    transtornos de desenvolvimento.

    Enfermaria Infantil

    Servios que so utilizados em poucos casos, inabordveis

    sob quaisquer outras formas, de carter agudo e por pequeno

    perodo de tempo, at que os problemas mais emergentes

    sejam minimizados e os pacientes possam ser inseridos em

    outros programas. As internaes so realizadas quando no

    h condies mdicas de tratamento ambulatorial, sendo a

    indicao avaliada pela superviso da enfermaria. Dessa

    maneira, na medida em que outros modelos teraputicos

    mostram sua eficcia (ambulatrio, brinquedoteca, hospital-dia

    e outros), o ndice de internaes diminui, sem a necessidade

    de sua regulamentao.

    As indicaes para o tratamento hospitalar podem ser

  • 22

    resumidas da seguinte maneira (Green, 1995): distrbios

    graves e persistentes que constituem ameaa vida

    (depresso, suicdio, distrbios alimentares, distrbios

    obsessivos, encoprese intratvel, psicoses, converso

    histrica); esclarecimento diagnstico ou das indicaes

    teraputicas; distrbios emocionais graves; avaliao dos

    cuidados maternos quando h risco para a criana (sndrome

    de Mnchausen); estados de crise.

    Os pacientes so internados juntamente com um familiar,

    para que seja preservado o vnculo me-filho, importante sob

    o ponto de vista teraputico. Tal atitude mostra-se de grande

    importncia na diminuio do nmero de internaes, bem

    como do ndice de reinternaes.

    Um programa assim, por sua abrangncia, deve possuir

    uma equipe complexa, fato este que nos defronta com nossa

    realidade, extremamente carente na formao de psiquiatras

    da infncia e da adolescncia devido ao pequeno privilgio

    que a especialidade tem tido nos programas de formao em

    nvel de graduao e ps-graduao.

    Para a implementao dessas diretrizes, torna-se

    necessria a determinao de que o atendimento a crianas

    e adolescentes seja realizado por especialistas na rea,

    devendo estes ser formados a partir de programas bsicos,

    com um mnimo de estrutura terica e prtica referendada

    pela ABP e ligados a servios especializados e

    reconhecidos. impossvel sua realizao a partir de cursos

    livres, ou que o programa seja realizado por mdicos

    (inclusive psiquiatras) sem formao na rea, fato observado

    cotidianamente em nosso pas neste momento.

    PROGRAMA DE ATENO ESPECFICA PARA IDOSOS

    Com o aumento da expectativa de vida e do nmero de

  • 23

    pessoas acima de 65 anos de idade, o impacto sobre gastos

    previdencirios e com sade adquire capital importncia, visto

    que idosos so responsveis por uma ampla fatia dos custos

    envolvidos com oferecimento de servios de sade. No caso

    especfico da psiquiatria geritrica, conhecido o aumento

    progressivo da prevalncia de transtornos cognitivos, mais

    acentuadamente os transtornos demenciais, medida que

    avana a idade. A prevalncia de doena de Alzheimer de 1%

    aos 65 anos e alcana at 20% a partir de 85 anos, apenas

    para citar um exemplo. Outro tema de igual importncia e

    magnitude a depresso no idoso, to prevalente quanto a

    doena de Alzheimer. Na verdade, a depresso em idosos o

    que se conhece como um dos quatro gigantes de geriatria,

    sendo os outros trs a demncia, quedas e infeces.

    A dependncia para atividades de vida diria , ao lado

    dos quadros de agitao e agressividade, a principal causa de

    institucionalizao de idosos, contribuindo tambm para o

    aumento dos gastos pblicos e da famlia com sade e

    trazendo srias consequncias para o cuidador, seja ele

    familiar ou profissional, em termos de estresse e qualidade de

    vida.

    Todos esses fatores e, como j dito anteriormente, a

    demanda crescente por especializao na rea especfica

    fazem com que seja necessria a estruturao de formao e

    atendimento especializado em psiquiatria geritrica em todos

    os nveis no Brasil.

    Os profissionais envolvidos, sempre em atividades

    integradas, englobam a equipe de mdicos, psiclogos,

    fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, enfermeiros,

    assistentes sociais e musicoterapeutas.

    O atendimento a idosos com transtornos psiquitricos em

    trs nveis de complexidade deve seguir os seguintes

  • 24

    passos:

    1. Reconhecimento de casos de depresso e demncia,

    alm de quadros de ansiedade e psicoses pelas equipes de

    sade no servio primrio, incluindo o treinamento dessas

    equipes em instrumentos bsicos de rastreio e quantificao

    de transtornos, com escalas validadas em nosso meio.

    2. Encaminhamento desses casos para os ambulatrios,

    onde os diagnsticos dos casos suspeitos podem ser

    refinados e o tratamento institudo. Esses casos sero

    contrarreferidos para a rede primria, na qual dever se dar

    seu acompanhamento.

    3. Organizao de aulas e equipes de educao sobre temas

    referentes a idosos na comunidade, juntamente com

    associaes de idosos e de parentes de pessoas idosas com

    doenas psiquitricas.

    4. Estabelecimento de uma rede integrada de atendimento

    tercirio e quaternrio para casos que necessitem de

    internao.

    5. Formao de unidades intermedirias de atendimento,

    desenhadas para cuidados dirios de pacientes com

    transtornos psiquitricos, tais como centros-dia para

    depresso, onde o paciente possa receber ateno e

    orientao para tarefas ao longo do dia, evitando internao

    em tempo integral. Inclui unidades de atendimento em

    centros de ateno diria para demncia, visando

    reabilitao cognitiva e socializao desses sujeitos.

    PROGRAMA DE ATENO ESPECFICA PARA A REA

    DE LCOOL E DROGAS

    Por todos os problemas sociais que o consumo de drogas

    causa, costuma-se considerar o uso de substncias como

  • 25

    um problema social, e no como um problema de sade em

    geral ou um problema relacionado sade mental em

    particular.

    Com o objetivo de discutir as melhores formas de

    tratamento para a dependncia qumica (DQ), necessrio

    firmar uma premissa que no tem sido suficientemente

    ressaltada: a DQ uma doena crnica, grave, e no

    somente um problema social ou psicolgico.

    Ao firmar essa posio, pode-se defender de forma mais

    organizada e eficaz que o modelo do sistema de tratamento

    da DQ deve assemelhar-se ao de outras doenas crnicas.

    A DQ tem diagnstico, explicao gentica, etiologia e

    fisiopatologia prprias. Com relao ao diagnstico, tanto o

    sistema americano do Diagnostic and Statistical Manual of

    Mental Disorders (DSM) quanto a Classificao Internacional

    de Doenas (CID) da Organizao Mundial de Sade deixam

    claros os elementos para considerar algum dependente de

    uma substncia psicotrpica. A ao aguda do lcool e de

    qualquer droga produtora de dependncia, o abuso e a

    dependncia so padres bastante diferentes e devem ser

    elucidados quando se inicia o contato com o paciente. A

    cada padro deve ser aplicada uma interveno, sempre a

    mais eficiente disponvel.

    Apesar dessas dificuldades inerentes etiologia da DQ, o

    tratamento funciona. McLellan et al. (2000), em reviso de

    mais de 100 ensaios clnicos sobre tratamento da DQ,

    mostraram que a maioria dos tratamentos produz diminuio

    do uso de substncias, melhora da qualidade de sade fsica

    e mental, muito embora sem a necessria cura da doena. O

    importante a continuidade dos cuidados pelo sistema de

    sade. O Projeto Diretrizes da AMB/CFM (Marques et al.,

  • 26

    2012) fornece recomendaes para definir modelos de

    tratamento para cada uma delas.

    A poltica assistencial para DQ deve ser articulada com as

    demais polticas necessrias ao manejo do fenmeno, como a

    preveno e o controle da oferta. Diminuir os danos que as

    substncias causam s pessoas e sociedade um dos

    objetivos de uma poltica integral, necessria para reduzir o

    impacto do problema. Portanto, no estabelecimento de uma

    poltica assistencial para DQ, deve-se ter em mente que o que

    est sendo tratado uma enfermidade grave que, embora

    crnica, pode ser tratada adequadamente. H que diminuir os

    danos que as substncias causam s pessoas e sociedade

    como um todo e investir ao mximo para que as pessoas que

    estejam dependentes dessas substncias possam ter todas

    as chances possveis para interromper o consumo. Somente

    com a abstinncia que o dependente volta a um nvel

    satisfatrio de sade fsica e mental. Isso no quer dizer que

    no se possam utilizar estratgias de reduo de consumo

    sem abstinncia, com resultados inferiores ao ideal. Mas no

    se pode oferecer populao exclusivamente uma poltica de

    reduo de consumo, chamada de reduo de danos, como se

    isso fosse o melhor para os pacientes.

    O tratamento visando abstinncia pode ser caro, longo e

    trabalhoso, mas ainda o melhor que a medicina pode

    oferecer.

    Em relao estrutura do tratamento da DQ, vale a pena

    ressaltar:

    1. No existe tratamento nico e ideal para DQ. O ideal seria a

    organizao de um sistema de servios que levasse em

    conta a diversidade de problemas (sade fsica, sade

    mental, social, familiar, profissional, conjugal, criminal, etc.),

    buscando a proporcional diversidade de solues.

  • 27

    2. Devido natureza da DQ, alguns pacientes podem

    beneficiar-se de intervenes breves, enquanto outros

    podem necessitar de tratamentos mais sistematizados e

    com diferentes nveis de complexidade e variedade de

    recursos.

    3. Um sistema de tratamento efetivo deveria ter vrios tipos de

    locais onde as aes teraputicas pudessem ocorrer:

    Tratamentos genricos, relacionados sade fsica geral,

    assistncia social adequada, orientao profissional;

    Tratamentos sistematizados ambulatoriais, como terapias

    cognitivas, motivacionais, treinamentos de habilidades

    sociais, grupos de apoio psicolgico, grupos de autoajuda

    (Alcolicos Annimos, Narcticos Annimos, Amor

    Exigente), manejo de contingncias e preveno de recada;

    Tratamentos intensivos e especializados, com internaes

    em hospital geral, clnicas especializadas, moradias

    assistidas para dependentes qumicos.

    4. O objetivo do tratamento buscar a correspondncia entre

    a natureza e a intensidade dos problemas com a melhor

    estratgia de tratamento, bem como o melhor local e

    intensidade do tratamento. Deve-se buscar tambm um

    ecletismo esclarecido, onde diferentes doutrinas e escolas

    de tratamento possam conviver harmonicamente, desde

    que baseadas nas melhores evidncias cientficas

    disponveis. Como a tendncia o tratamento ser feito por

    tempo prolongado, a sociedade no pode custear

    intervenes que no tenham suficientes evidncias de

    resultados satisfatrios.

    Na tabela a seguir, descrevemos nveis de servios para

    DQ e formas e tratamento que podem ser associados a

    esses nveis.

  • 28

    Tabela - Nvel de servio, forma de tratamento e

    servio

    Nvel Forma Servio

    Primrio Cuidados Primrios de

    Sade

    - Servio de acompanhamento

    mdico por clnico geral

    - Servio de cuidados psiquitricos

    gerais

    - Tratamento das principais

    complicaes somticas

    - Preveno de doenas

    transmissveis pelo uso de substncias

    causadoras de dependncias

    - Emergncias e acidentes

    - Desintoxicao ambulatorial

    - Orientao familiar

    - Interveno/orientao breve

    - Encaminhamento para servios

    mais complexos

    Secundrio

    Ambulatrio com

    Acesso Facilitado

    (Comunitrio) ou

    Ambulatrio Mdico

    Especializado

    - Orientaes psicolgicas baseadas

    em evidncias (terapias cognitivo-

    comportamental, motivacionais,

    treinamentos de habilidade social)

    - Grupos teraputicos para facilitar a

    abstinncia

    - Grupos de orientao profissional

    - (reabilitao psicossocial)

    - Programa de facilitao de acesso

    ao tratamento

    - Avaliao e orientao de

    comorbidades psiquitricas

    - Desintoxicao ambulatorial

    medicamentosa

    - Orientao familiar estruturada

    Ambulatrio

    Especializado em DQ

    - Tratamento de comorbidades

    psiquitricas complexas

    - Tratamentos psicolgicos

    estruturados associados com

    orientao familiar

    - Desintoxicao complexa

    - Hospital-dia

  • 29

    - Interveno estruturada em crise

    - Ncleo de ateno a pacientes com

    duplo diagnstico

    Tercirio

    Programa de Internao

    em Hospital Geral

    - Internao em unidade

    especializada

    - Desintoxicao complexa e com

    comorbidade somtica e/ou

    psiquitrica

    - Tratamento de intercorrncias

    somticas

    - Tratamento de comorbidades

    psiquitricas

    Programa de Internao

    em Unidades

    Especializadas

    - Programas estruturados para

    avaliao e tratamento de

    comorbidade psiquitrica e DQ

    - Programas complexos de

    reabilitao psicossocial com longa

    durao (mais de 3 meses)

    - Moradias assistidas

    SERVIOS DE ATENO ESPECFICA PARA DOENTES

    MENTAIS CUMPRINDO MEDIDA DE SEGURANA E

    POPULAO PRISIONAL COM TRANSTORNOS

    MENTAIS

    Cada estabelecimento prisional deve contar com equipe

    de sade completa para atendimento em nvel de ateno

    bsica, dimensionada proporcionalmente sua populao

    prisional e preferencialmente capacitada para o atendimento

    das doenas mentais mais prevalentes. Assim, no prprio

    ambiente prisional, poderia ser prestado atendimento a casos

    mais leves que no necessitassem remoo para hospitais

    forenses ou para a rede de mdia complexidade local. Isso

    tem dupla vantagem: o atendimento seria prestado mais

    rapidamente, pois os profissionais estariam mais prximos

    do apenado, e o risco do duplo estigma seria diminudo

    (condio de criminoso e doente mental que acompanha

  • 30

    todo aquele que tem passagem por hospitais forenses). No

    entanto, casos de doena mental grave devem ter seu

    tratamento realizado em servios adequados, de acordo com

    indicao tcnica, seguindo a Lei 10.216/2001, o Cdigo

    Penal e o Cdigo de Processo Penal.

    necessria a criao de pelo menos um hospital

    psiquitrico forense por estado, com pessoal qualificado, em

    nmero adequado e devidamente treinado para lidar com

    esse tipo de paciente, nos moldes da psiquiatria forense

    moderna. Destaca-se a importncia de equipes de sade

    mental completas, compostas por mdico psiquiatra, mdico

    clnico, psiclogo, assistente social, enfermeiro, auxiliares de

    enfermagem e terapeuta ocupacional. Unidades existentes

    no pas, frequentemente criticadas e criticveis, necessitam

    de reformas estruturais, modernizao de rea fsica, novas

    contrataes e reviso de seus protocolos e projetos de

    tratamento. Somente com investimentos elas sero custo-

    efetivas no tratamento e reabilitao do doente mental

    infrator com indicao de tratamento internado.

    indispensvel que o Sistema nico de Sade tenha

    participao no custeio das despesas decorrentes do

    atendimento desses pacientes, o que proporcionaria

    melhores condies de funcionamento dessas instituies.

    Os servios penitencirios devem desenvolver programas

    especficos para a preveno do suicdio e para o manejo

    do abuso e dependncia de substncias psicoativas.

    Quando da proximidade de livramento condicional ou soltura,

    as equipes de sade mental devem estabelecer contato com

    unidades extra-hospitalares (CAPS, ambulatrios de sade

    mental, etc.), de forma a garantir a continuidade do

    tratamento psiquitrico fora do ambiente prisional para os

    indivduos que dele necessitem.

  • 31

    Considerando que no h evidncias cientficas da

    relao entre doena mental e periculosidade, torna-se

    necessrio desenvolver campanhas para quebrar esse

    estigma e excluir, no Cdigo Penal, o doente mental da

    condio de perigoso, pelo simples fato de padecer de uma

    enfermidade psiquitrica.

    DISTRIBUIO DE MEDICAMENTOS Sobre a distribuio de medicamentos essenciais e de alto

    custo, encontra-se no Relatrio de avaliao de programa:

    aes de ateno sade mental, do Tribunal de Contas da

    Unio, a seguinte afirmao: Entrevistas com gestores

    estaduais e municipais, com responsveis pelos CAPS e

    SRT, alm de relatos de familiares e pacientes,

    evidenciaram deficincias na distribuio dos

    medicamentos destinados aos portadores de transtornos

    mentais, traduzidas pela descontinuidade na distribuio

    dos medicamentos essenciais e demora na distribuio

    dos medicamentos de alto custo. Nas respostas aos

    questionrios dos CAPS, 41,3% dos respondentes

    informaram que os pacientes no obtm os

    medicamentos sempre que solicitam.

    A dispensao gratuita de medicamentos deve ser

    garantida a todos os pacientes que deles necessitam, sem

    interrupo do fluxo. Nas unidades de ateno primria,

    seriam dispensados medicamentos da cesta bsica,

    composta por frmacos de baixo custo, que necessitam ser

    ampliados e periodicamente atualizados, dando-se

    preferncia aos genricos. A escolha do frmaco

    competncia do mdico assistente.

    Nas unidades de ateno secundria, alm dos

    medicamentos da cesta bsica, devem ser dispensados

    medicamentos de alto custo. Nesse caso, a ABP,

  • 32

    respaldada pela AMB e pelo CFM, far as propostas dos

    protocolos para prescrio, atualizando-os periodicamente,

    respeitando os princpios ticos do receiturio mdico

    estabelecidos pelo CFM.

    Nas unidades de ateno terciria, deve-se garantir a

    manuteno do acesso gratuito aos medicamentos de alto

    custo, inclusive em se tratando de servios contratados, pois

    o direito assistncia farmacutica do paciente, e no do

    servio onde ele atendido.

    PREVENO AO SUICDIO

    A ABP prope que uma estratgia nacional para a

    preveno ao suicdio deva ter um programa especial que

    observe os seguintes preceitos:

    1. Promover a educao dos profissionais de sade das

    unidades de ateno bsica, inclusive do Programa Sade

    da Famlia, dos servios de sade mental, das unidades de

    urgncia e emergncia, de acordo com os princpios da

    integralidade e da humanizao em relao a fatores de risco

    e preveno ao comportamento suicida.

    2. Garantir que todos os pacientes atendidos pelo sistema de

    sade, aps uma tentativa de suicdio (que j de

    notificao obrigatria), sejam encaminhados para

    acompanhamento prioritrio nos servios especializados e

    atendidos nas primeiras 72 horas aps o ocorrido por, pelo

    menos, um mdico psiquiatra.

    3. Elaborar projetos estratgicos fundamentados em estudos

    de custo-efetividade, eficcia e qualidade, bem como em

    processos de organizao da rede de ateno e intervenes

    nos casos de tentativas de suicdio.

  • 33

    Para isso, a ABP prope que se faa nos trs nveis de

    ateno preveno, como descrito a seguir.

    PREVENO PRIMRIA

    1. Realizao de atividades referentes ao 10 de setembro,

    Dia Mundial de Preveno do Suicdio: caminhadas,

    simpsios, exibies ou outros, com o intuito de informar a

    populao geral sobre essa preveno, contribuindo via

    desmitificao e competncias adquiridas pela populao.

    2. Garantia de formao de professores e educadores para

    que possam estar aptos a identificar possvel risco de

    suicdio em estudantes e realizar os encaminhamentos

    necessrios.

    3. Elaborao de guias e cartilhas de preveno do suicdio,

    tanto para a populao geral quanto para os profissionais de

    diversos mbitos, como professores, clnicos, profissionais

    de mdias, entre outros.

    4. Maior regulamentao da comercializao de agentes

    txicos, gerando maior restrio em sua disponibilidade e

    possibilidades de comrcio.

    5. Incentivo para maior gerao de indicadores locais e

    nacionais de casos de tentativas de suicdio e suicdios, para

    que as aes possam ser mais focais e eficazes.

    6. Regulamentao do suicdio como caso de notificao

    compulsria, considerando-se que existe um grande

    problema de subnotificao desses casos, o que dificulta a

    realizao de estudos confiveis e condizentes com a

    realidade e, consequentemente, prejudica as possveis aes

    a serem realizadas.

    7. Efetiva implantao do Plano Nacional de Preveno do

    Suicdio, contemplando os diversos mbitos da sociedade.

  • 34

    8. Formao de uma equipe de ateno primria capacitada

    para identificar casos de risco de suicdio e saber os

    possveis e melhores encaminhamentos.

    PREVENO SECUNDRIA

    1. Priorizao, para atendimento, de pacientes em risco de

    suicdio, considerando o carter grave e, muitas vezes,

    urgente dessa condio, de forma que esses pacientes no

    precisem esperar muito pelo incio de seu acompanhamento.

    2. Criao de um mdulo bsico de preveno do suicdio,

    do qual todos os profissionais na rede de sade devero ter

    domnio, para que possam estar aptos a lidar com esses

    pacientes e realizar a preveno do suicdio. Como

    competncias bsicas, podem ser listadas: como abordar e

    entrevistar pacientes em risco de suicdio; avaliao de risco

    suicida; identificao de fatores de risco e de proteo ao

    suicdio; como promover a preveno primria, secundria e

    terciria do suicdio.

    3. Criao de um protocolo de atendimento para pacientes

    em risco de suicdio.

    PREVENO TERCIRIA

    1. Garantia de que todos os pacientes atendidos pelo

    sistema de sade, aps uma tentativa de suicdio (que j

    de notificao obrigatria), sejam encaminhados para

    acompanhamento prioritrio nos servios especializados e

    atendidos nas primeiras 72 horas aps o ocorrido por, pelo

    menos, um mdico psiquiatra.

    2. Acompanhamento e monitoramento, pelas autoridades de

    sade, para certificar que os indivduos que fizeram uma

    tentativa de suicdio esto efetivamente sendo tratados,

    realizando buscas ativas para os casos em que isso no

    esteja ocorrendo.

  • 35

    3. Aparelhamento das instituies com medidas de proteo

    ao suicdio no ambiente institucional, possibilitando

    internamentos que sero seguros para esses pacientes.

    4. Realizao de atendimentos especializados e qualificados

    para intervir na crise do paciente em risco de suicdio, a fim

    de reestabelecer sua sade.

    REABILITAO E REINSERO SOCIAL Hoje no existe uma poltica do Ministrio da Sade para

    combater o estigma ao doente psiquitrico, ou seja,

    comprometida com sua reabilitao e reinsero social.

    As limitaes ou perdas de capacidades operativas para

    o desempenho social e laboral decorrentes do adoecer

    mental ou comportamental devem ser objeto de estratgias

    de reabilitao dirigidas aos recursos dos pacientes, aos

    talentos existentes e s possibilidades para lidar com a

    doena de forma a minimizar a incapacidade. Reabilitao

    psiquitrica um conjunto de aes dirigidas a pessoas com

    doenas mentais, transtornos comportamentais e dficits

    funcionais graves.

    A ajuda s pessoas com incapacidades decorrentes de

    um transtorno psiquitrico para aumentar o nvel de seu

    desempenho de tal forma que possam sentir-se bem-

    sucedidas e satisfeitas deve ser feita atravs de alternativas

    residenciais, facilitao do transporte, programas de suporte

    comunitrio (centros de convivncia), oficinas de trabalho

    protegidas, suporte atividade escolar, grupos de autoajuda

    e defesa de direitos.

  • 36

    IV. FINANCIAMENTO

    O Brasil investe, em mdia, 2% do oramento total dos

    recursos do Ministrio da Sade na sade mental, no

    considerando aqui programas especficos, como os

    relacionados ao crack, que envolvem investimentos

    compartilhados com outros ministrios. Isso significa menos

    de R$ 5,00 per capita ao ano. Os pases desenvolvidos

    investem entre 5 e 12% do oramento da sade em sade

    mental. O Reino Unido e o Canad investem em torno de

    US$ 200,00 dlares per capita ao ano em sade mental.

    Embora seja claro que o Brasil no tenha condies

    econmicas de investimento como as dos pases

    desenvolvidos, tambm evidente que o financiamento atual

    baixo.

    Os recursos escassos so aplicados sem a transparncia

    necessria, tornando difcil a obteno de estimativas

    precisas. No h uma rubrica especfica da rea de sade

    mental no oramento do Ministrio da Sade, e os recursos

    esto pulverizados sob a forma de verbas inseridas em

    aes de outras reas. Isso dificulta o planejamento e a

    avaliao da efetividade e do custo-benefcio dos programas

    e iniciativas.

  • 37

    V. AVALIAO E CONTROLE O controle da qualidade e da eficincia dos diversos

    servios deve ser feito por intermdio de fiscalizaes

    peridicas em todos os servios, nos diversos nveis de

    assistncia, com o mesmo rigor.

    Os parmetros para avaliao devem ser estabelecidos

    com critrios cientficos em todos os nveis de ateno;

    devem ser claros e compatveis com a remunerao. As

    modificaes dos instrumentos de avaliao devem ter como

    objetivo o aperfeioamento da qualidade dos servios. As

    avaliaes devem ser peridicas, realizadas em intervalos

    predefinidos, oferecendo-se aos servios tempo suficiente

    para as modificaes.

    As equipes de avaliao, nos nveis municipal, estadual ou

    federal, em suas composies, necessariamente contaro

    com especialistas nas respectivas reas, experientes em

    assistncia, representantes da ABP, do CRM, dos familiares

    e do Conselho Nacional de Sade. A equipe de profissionais

    que trabalha no servio avaliado deve acompanhar a

    avaliao para oferecer esclarecimentos sobre o trabalho

    desenvolvido e suas peculiaridades. Ao final, a equipe

    avaliadora deve apresentar o relatrio a todos os tcnicos do

    servio para que possam discutir e opinar, uma vez que o

    intuito deve ser o de preservar o bom atendimento, sanando

    falhas e buscando sempre o aperfeioamento.

  • 38

    VI. FORMAO E QUALIFICAO PROFISSIONAL

    Consideramos que recursos humanos tecnicamente

    capacitados, segundo as melhores evidncias cientficas

    disponveis, so o eixo central de um sistema de sade de

    qualidade.

    Nesse sentido, consideramos fundamental uma poltica de

    formao e educao continuada que tenha a universidade,

    principalmente a pblica, como o local privilegiado de

    formao e capacitao do profissional de psiquiatria e

    sade mental, em todos os nveis, do tcnico ao superior.

    Do ponto de vista mais especfico do psiquiatra, a

    formao de referncia deve ser a residncia mdica,

    realizada em instituio credenciada pelo Ministrio da

    Educao, segundo diretrizes amplamente discutidas pela

    sociedade.

  • 39

    VII. CONCLUSES

    1. A ABP, como representante de 12.000 psiquiatras

    brasileiros, vem defendendo, desde os anos 1960, a

    reformulao do modelo da assistncia em sade mental no

    Brasil. Ao longo de seus 48 anos de existncia, a ABP

    sempre lutou por um atendimento eficaz, eficiente, de

    qualidade e digno para os doentes psiquitricos,

    contribuindo, assim, para a elaborao da Lei 10.216/2001.

    2. A criao do Sistema nico de Sade, com seus

    princpios e diretrizes de universalidade, equidade,

    integralidade, descentralizao, hierarquizao e controle

    social, constituiu-se em extraordinrio avano para toda a

    populao brasileira, significando muito para os doentes

    psiquitricos. Mas, lamentavelmente, no foram criados

    servios de nvel primrio e secundrio em sade mental de

    acordo com as necessidades. Os servios de nvel tercirio

    criados so insuficientes em formato e nmero e tm se

    deteriorado progressivamente, com grave comprometimento

    da qualidade da assistncia.

    3. A Lei 10.216/2001, que dispe sobre a proteo e os

    direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e

    redireciona o modelo assistencial em sade mental,

    abrangente e moderna em todos os aspectos, acolhe as

    necessidades dos doentes mentais em seus mais diversos

    graus de complexidade e cria condies para que a

    burocracia governamental aperfeioe a assistncia existente,

    o que ainda no est sendo feito em tempo e forma

    adequados.

  • 40

    4. O modelo assistencial que vem sendo implantado e

    executado pelo Ministrio da Sade no respeita a Lei

    10.216/2001 no seu todo. Portanto, nossa posio que tal

    implantao no pode nem deve prosseguir.

    5. O modelo assistencial adotado vem progressivamente

    excluindo o mdico psiquiatra da assistncia ao doente

    mental e a ele tem atribudo as mazelas do sistema. Por isso,

    a ABP reitera a importncia da atuao efetiva do psiquiatra

    na ateno aos doentes mentais, ressaltando que seu

    trabalho imprescindvel.

    6. imperativa a criao de uma rede de ateno integral

    em sade mental que efetivamente atenda as necessidades

    dos pacientes em todos os nveis de assistncia, que conte

    com estabelecimentos e equipes de interveno capazes de

    atuar na promoo, preveno, ateno e reabilitao.

    7. A desassistncia aos pacientes psiquitricos pode ser

    observada nas longas filas para marcao de consultas

    psiquitricas, na superlotao das emergncias psiquitricas,

    na ocupao de leitos acima de 100% e no grande nmero

    de enfermos nos crceres e nas ruas.

    8. Recomenda-se a incluso da eletroconvulsoterapia (ECT)

    nas listas de procedimentos do Sistema nico de Sade,

    considerando sua slida base cientfica, eficcia e

    efetividade.

    9. A excluso do hospital psiquitrico especializado da rede

    de assistncia no se sustenta cientificamente e est

    gerando desassistncia aos doentes mentais.

    10. A atual poltica de medicamentos do Ministrio da

    Sade precisa ser aperfeioada para garantir que a

    dispensao gratuita da cesta bsica de medicamentos

  • 41

    tenha qualidade, seja periodicamente atualizada e mantenha

    a continuidade do fluxo de distribuio. preciso garantir

    tambm a dispensao gratuita de medicamentos de alto

    custo, deixando de privilegiar indicaes para determinados

    diagnsticos e de promover reserva de mercado, revisando

    periodicamente seus critrios, dispensando os medicamentos

    para pacientes em qualquer servio em que estejam sendo

    tratados, seja em nvel ambulatorial ou de internao, e

    garantindo a continuidade do fluxo de distribuio.

    11. A parcela do oramento anual da sade destinada

    sade mental de 2%. Os recursos atuais so insuficientes,

    e seu emprego pouco transparente.

    12. necessrio incentivar a migrao de psiquiatras do

    setor privado para o pblico, motivando-os com remunerao

    adequada e programas nos quais acredite, nos moldes do

    Programa Sade da Famlia.

    13. A ABP, no mbito de sua competncia e objetivando

    contribuir efetivamente para a implantao, com xito, do

    modelo ora proposto, assume o compromisso de auxiliar a

    estabelecer parmetros de necessidades para a adequada

    assistncia em sade mental no Brasil, de definir e atualizar

    critrios tcnicos de indicao dos medicamentos de alto

    custo, assim como de participar de maneira efetiva na

    capacitao em sade mental dos mdicos generalistas e na

    educao continuada dos psiquiatras.

    14. A ABP continuar acompanhando, avaliando e

    exigindo a implantao e implementao de uma poltica de

    sade mental para o Brasil, com bases em evidncias

    cientficas, em compromissos ticos e sociais, com a efetiva

    participao dos mdicos e baseada na Lei 10.216/2001 e

    em resolues do Conselho Federal de Medicina.

  • 42

    VIII. CRDITOS Diretoria Executiva da Associao Brasileira de Psiquiatria: Antnio Geraldo da Silva (DF) Presidente Itiro Shirakawa (SP) Vice-Presidente Claudio Meneghello Martins (RS) Diretor Secretrio Maurcio Leo de Rezende (MG) Diretor Secretrio Adjunto Joo Romildo Bueno (RJ) Diretor Tesoureiro Alfredo Jos Minervino (PB) Diretor Tesoureiro Adjunto

    Grupo de Avaliao: Antnio Geraldo da Silva (DF) - Coordenador Srgio Tamai (SP) - Relator Ana Cecilia Petta Roselli Marques (SP) Co-relatora Humberto Corra da Silva Filho (MG) Coordenador dos trabalhos presenciais Agenor Pares de Lima (SP) Itiro Shirakawa (SP) Carlos Eduardo Kerbeg Zacharias (SP) Claudio Meneghello Martins (RS) Eduardo Mylius Pimentel (SC) Emmanuel Fortes Silveira Cavalcanti (AL) Joo Maurcio Castaldelli Maia (SP) Joo Romildo Bueno (SP) Kalil Duailibi (SP) Luiz Carlos Illafont Coronel (RS) Marcelo Ortiz de Souza (SP) Maurcio Leo de Rezende (MG) Miguel Ximenes de Rezende (SP) Otvio Jos Figueira Verreschi (SP) Paulo Roberto Repsold (MG) Quirino Cordeiro Junior (SP) Rafael Bernardon Ribeiro (SP) Ronaldo Ramos Laranjeira (SP) Salomo Rodrigues Filho (GO) Snia Augusta Leito Saraiva (SC) Valentim Gentil Filho (SP)

    Comisso Revisora: Antnio Geraldo da Silva (DF) Srgio Tamai (SP)

  • 43

    Associados que enviaram sugestes: Adriana Mendona Rodrigues (AM) Alexandre Martins Valena (RJ) Carlos Alberto Sampaio Martins de Barros (RS) Fabio Gomes de Matos e Souza (CE) Francisco Baptista Assumpo Junior (SP) Juberty Antonio de Souza (MS) Katia Mecler (RJ) Lisieux Elaine de Borba Telles (RS) Mauricio Viotti Daker (MG) Osvaldo Luiz Saide (RJ) Paulo Knapp (RS) Rafael Moreno Ferro de Arajo (RS) Raimundo Alonso Batistade Aquino (CE) Renan Boeira Rocha (SC) Ricardo Barcelos Ferreira (MG) Tbor Rilho Perroco (SP) Valeska Marinho Rodrigues (RJ)

  • 44

    IX. BIBLIOGRAFIA

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    ser humano, defesa do ato mdico privativo de psiquiatras

    e aos critrios mnimos de segurana para os

    estabelecimentos hospitalares ou de assistncia psiquitrica

    de quaisquer naturezas, definindo tambm o modelo de

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