Discurso e Corpo

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Textos de análise de discurso em Pêcheux e Orlandi abordando o corpo.Por José Guilherme de A. ALmeida

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Discurso e corpo

José Guilherme Almeida

Orlandi (2012a) discute que o corpo do sujeito está atado ao corpo social. Não se pode pensar o sujeito sem o corpo, nem o corpo sem o sujeito, ou sem um sentido. O corpo tem uma forma história e material. O corpo do sujeito é parte do seu processo de subjetivação, e portanto, quando o indivíduo é interpelado em sujeito pela ideologia, é produzida uma forma sujeito histórica com seu corpo. A ideologia é uma prática, e enquanto prática de um sujeito, afeta e faz parte do processo de significação do sujeito.

Isso implica que, como as palavras, o nosso corpo já vem sendo significado, antes mesmo que nós o tenhamos significado (ORLANDI, 2012a). Mesmo quando o sujeito deixa de proferir discursos verbais, quando se põe em silêncio, “seu corpo significa seu silêncio e se significa nesse silêncio” (ORLANDI, 2012, p. 86).

A autora, ao prefaciar seu livro “Discurso e Texto”, faz uma correlação entre o corpo do texto e corpo do sujeito que escreve o texto e/ou que nele se significa:

É na formulação que a linguagem ganha vida, que a memória se atualiza, que os sentidos se decidem, que o sujeito se mostra (e esconde). Momento de sua definição: corpo e emoções da/na linguagem. (...) Materialização da voz em sentidos, do gesto da mão em escrita, em traço, em signo. Do olhar, do trejeito, da tomada do corpo pela significação. E o inverso: os sentidos tomando corpo. Na formulação – pelo equívoco, falha da língua inscrita na história – corpo e sentidos se atravessam.

Formular é dar corpo aos sentidos. E, por ser um ser simbólico, o homem constituindo-se em sujeito pela e na linguagem, que se inscreve na história para significar, tem seu corpo atado ao corpo dos sentidos. Sujeito e sentido constituindo-se ao mesmo tempo tem sua corporalidade articulada no encontro da materialidade da língua com a materialidade da história. (...) Ora, o corpo do sujeito e o corpo da linguagem não são transparentes. São atravessados de discursividade. (...) Não há corpo que não esteja investido de sentidos e que não seja o corpo de um sujeito que se constitui por processos de subjetivação nos quais as instituições e suas práticas são fundamentais, assim como o modo pelo qual, ideologicamente, somos interpelados em sujeitos. Dessa forma, é que pensamos que o corpo do sujeito é um corpo ligado ao corpo social e isto também não lhe é transparente. (ORLANDI, 2012b, p. 9 e 10).

Nesse desdobramento de significações do corpo, é que pensamos que as práticas do corpo também constroem seus discursos. O homem também se significa em sua práxis, pintando, cantando, dançando... Assim, o movimento humano produz textualidade (ORLANDI, 2012a). O corpo não fala, ele significa.

Partindo de uma mesma inquietação, Courtine (2013), ao se relacionar com o discurso em Foucault, e com o conceito de fato social em Mauss, diz que no fato social

(...) os discursos são imbricados em práticas não verbais, ali o verbo não pode mais ser dissociado do corpo e do gesto, ali a expressão através da linguagem se conjuga com a expressão do rosto, de forma a não ser mais possível separar linguagem e imagem (COURTINE, 2013).

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A partir dessa reflexão, Courtine (2013) propõe que a análise de discurso não pode mais se limitar a caracterizar um corpus a diferentes níveis de funcionamento linguístico (verbal e não-verbal), mas precisa pensar e descrever a maneira como que esses diferentes funcionamentos do discurso se articulam, ou seja, como o discurso corporal e imagético mantém relação dialética com o discurso verbal (seja no texto ou na oralidade).

Referências:

COURTINE, Jean-Jacques. Decifrar o corpo: pensar com Foucault. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.

ORLANDI, Eni P. Discurso em análise: sujeito, sentido e ideologia. 2. ed. Campinas, SP: Pontes, 2012a.

______. Discurso e texto: formulação e circulação de sentidos. 4. ed. Campinas, SP: Pontes, 2012b.