DISCURSO PARA UMA ARTE RELACIONAL: Analise de Caso , Lisete Lagnado, Nicolas Bourriaud e a 27°...

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1 SUSAN BRODHAGE SANT ´ ANNA DISCURSO PARA UMA ARTE RELACIONAL: ANÁLISE DE CASO, LISETE LAGNADO, NICOLAS BOURRIAUD E A 27ª BIENAL DE SÃO PAULO Projeto de monografia apresentado como requisito parcial par obtenção da graduação no Curso de Licenciatura em Artes Visuais da Faculdade de Artes do Paraná. Prof. Orientador: Dr.Artur Freitas CURITIBA 2010

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Monografia apresentada como requisito para a conclusão do Curso de graduação em Licenciatura em Artes Visuais, da Faculdade de Artes do Paraná. 2010. Orientador: Dr. Artur Freitas

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SUSAN BRODHAGE SANT ´ ANNA

DISCURSO PARA UMA ARTE RELACIONAL: ANÁLISE DE CASO, LISETE LAGNADO, NICOLAS BOURRIAUD E A 27ª BIENAL DE SÃO

PAULO

Projeto de monografia apresentado como requisito parcial par obtenção da graduação no Curso de Licenciatura em Artes Visuais da Faculdade de Artes do Paraná.

Prof. Orientador: Dr.Artur Freitas

CURITIBA2010

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos aqueles que colaboraram para realização deste trabalho de forma

direta ou indireta. Principalmente a Flora, minha filha por dividir seu dia a dia e minha

atenção com as horas de estudo e dedicação, em que não pude estar tão perto quanto gostaria.

A meus pais, Helga Brodhage e Dauri Machado Sant´Anna por acreditarem em mim e

fornecerem a base necessária em minha formação formal e humana.

A meus amigos, em especial, Katia Villagra, Francisco Cardoso, Edson Macalini,

Luhanna Salata e o Coletivo “Quê?”. Com o apoio, a alegria e as conversas esclarecedoras,

estar presente e chegar até o fim pôde ser mais prazeroso.

A Sizumi Suzuki, pelos conselhos e as horas acolhedoras.

A Professora Dra. Celina Murasse Mizuta por me iniciar e incentivar no caminho da

pesquisa acadêmica.

Ao professor André Rigati integrante da minha banca examinadora, e a professora

Carmem Spanhol por nos fazer enxergar menos dificuldades e mais objetivos.

Ao professor Dr. Artur Freitas, orientador deste projeto. Agradeço não só pela

paciência e fé no meu trabalho, mas por todo o percurso de conhecimento e exemplo, traçado

em sua disciplina, durante minha formação acadêmica.

Susan Brodhage Sant´Anna

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O próprio conceito de arte vacila, se não o tomamos na acepção fundamental de experiência primeira.

Ferreira Gullar

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RESUMO

Esta pesquisa teve como objetivo a análise de discurso curatorial contemporâneo, com o foco de investigação voltado a esclarecer, identificar e analisar as possíveis relações da curadoria específica, de Lisete Lagnado, “Como viver junto?” (2006) referente a 27ª Bienal Internacional de São Paulo, com a Estética Relacional de Nicolas Bourriaud, crítico francês, que representa um dos principais vértices teóricos e filosóficos no debate artístico contemporâneo.

O trabalho visa estabelecer relações de aproximação e divergências entre as curadorias brasileiras e as teorias estéticas de Nicolas Bourriaud. Neste contexto a pesquisa torna-se uma análise documental de fontes primárias considerando como objeto de pesquisa o discurso curatorial de Lisete Lagnado de 2006. Porém também adentra a análise do discurso, considerando como base para a discussão a teoria Estética Relacional de Nicolas Bourriaud.

Esta estruturação metodológica, permitiu ampliar a compreensão do estado de espetaculização da arte no contexto das mega exposições, partindo de um olhar nacional para um contexto global. Desta forma as decisões curatoriais contemporâneas são contextualizadas e ampliam-se as possibilidades de interpretações e análise das demais.

Palavras Chaves: Curadoria contemporânea, Bienal de São Paulo e Estética Relacional.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.....................................................................................................................6

2 CONCEITOS PRELIMINARES : A RELAÇÃO ARTE E VIDA NA ARTE DO SÉCULO XX

2.1 Relações entre arte e vida no contexto das vanguardas........................................................9

2.2 Os períodos de transição das vanguardas............................................................................13

3 DA ESTÉTICA RELACIONAL DE NICOLAS BOURRIAUD: AS CONDIÇÕES DA ARTE CONTEMPORÂNEA NUM CONTEXTO RELACIONAL

3.1 A Estética Relacional de Nicolas Bourriaud.......................................................................16

3.2 Arte colaborativa e a forma da arte contemporânea............................................................24

4 ANÁLISE DE CASO: LISETE LAGNADO, A BIENAL DE SÃO PAULO E O DISCURSO PARA UMA ARTE RELACIONAL.

4.1 A aproximação arte - vida através das exposições de arte.................................................28

4.2 Curadoria ou autoria?..........................................................................................................30

4.3 Lisete Lagnado : “Como Viver Junto?”..............................................................................34

5 CONCLUSÃO.....................................................................................................................49

6 REFERÊNCIAS..................................................................................................................51

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1 INTRODUÇÃO

O discurso curatorial da Bienal Internacional de São Paulo, referente ao ano de 2006 e

a Estética Relacional de Nicolas Bourriaud estabelecem o tema desta pesquisa.

A relevância para a escolha desta edição específica – 2006: Como viver Junto – , é a

enorme repercussão que obteve pela inovação curatorial, as quais indicam possíveis relações

com o discurso relacional de Nicolas Bourriaud. Em 2006, a edição foi considerada um marco

histórico para a instituição por optar pela busca de novos valores na arte contemporânea, pela

gratuidade no acesso com o objetivo de promover a inclusão e a democratização cultural e

pela elaboração de um projeto educativo. Visava os alunos do ensino fundamental e médio da

periferia, que receberam mediação dos professores das redes públicas e privadas. Mas o que

se torna realmente relevante para esta pesquisa é a escolha do tema pela curadora Lisete

Lagnado: “Como Viver Junto” , expressão título dos Seminários de Roland Barthes e conceito

que constantemente esta contido, de maneira direta ou indireta, nos textos do crítico francês,

Nicolas Bourriaud.

Estes contextos parecem ser relevantes para a análise a partir das obras teóricas de

Nicolas Bourriaud, que podem contribuir para a compreensão da Arte e seus possíveis

“novos” paradigmas contemporâneos.

A princípio a pesquisa acadêmica justifica-se pelo seu fim: a produção do

conhecimento. No entanto sendo necessário ressaltar a importância ou relevância da escolha

do tema em relação ao curso, e por se tratar de um projeto de conclusão do mesmo (TCC),

acredito que a escolha deste tema para pesquisa de um trabalho de monografia do curso de

Licenciatura em Artes visuais, justifica-se pelo entendimento de que o licenciando deve não

somente dominar as didáticas e metodologias necessárias para um bom aproveitamento de

aprendizado do aluno, mas deve dominar e estar preparado para mediar as relações entre o

aluno e a arte de seu tempo concordando com as orientações dos Parâmetros Curriculares

Nacionais para o Ensino das Artes.(BRASIL, 1998, passim)

Para tanto a escolha da 27ª Bienal Internacional de São Paulo, possibilita um olhar

para a arte contemporânea mundial partindo de uma concepção nacional. De acordo com

Laura de Castro (Os Museus e os Curadores, S/D) a ação curatorial tem se tornado importante

ferramenta facilitadora de uma experiência estética, na relação arte e público, fazendo com

que o espaço expositivo deixe de ser apenas um espaço de armazenamento e cuidado de obras

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artísticas e passe a ser um espaço que propõem um nível de experiência sensorial total,

aproximando as relações do público com as possíveis significações da arte, nestes termos a

curadoria passa a ser um instrumento mediador.

Investigar a aplicabilidade das teorias de Bourriaud na curadoria de Lisete Lagnado

significa, relacionar as possíveis conexões entre as ações curatoriais contemporâneas

brasileiras, com um dos mais importantes vetores das teorias de arte contemporânea, que é a

Estética Relacional.

Os livros de Nicolas Bourriaud , publicados em 1998 e 2004 na França, tiveram suas

edições traduzidas para o Brasil somente em 2009, o que não impediu que os conceitos

relacionais fossem antes mesmo desta data conhecidos e questionados no âmbito nacional.

Estes textos elaborados a partir da análise de artistas europeus da década de 1990, teorizam

sobre os novos paradigmas pertinentes a arte contemporânea. No entanto conceitos como

interatividade, hibridização das linguagens, e discussões sobre o conceito de obra de arte,

também se aplicam a arte brasileira desde a década de 1960, com as contribuições de Hélio

Oiticica e seu Programa Ambiental. Bourriaud porém desconhece o trabalho dos artistas

brasileiros responsáveis pela utilização desses recursos, por este fato é ao mesmo tempo

considerado e repudiado pelos críticos nacionais.

Contudo suas teorias parecem corresponder às questões e sintomas da arte

contemporânea e seu entendimento se torna indispensável para um maior aprofundamento das

questões pertinentes a Curadoria de Lisete Lagnado: Como Viver junto, Bienal Internacional

de São Paulo,2006.

Com estas considerações fica então estabelecido o problema da pesquisa da seguinte

forma:

Tendo em vista a generalizada espetacularização institucional da relação entre “arte e

vida” nas mega exposições de arte contemporânea dos anos 2000, é possível identificar, nos

discurso curatorial da Bienal de São Paulo de 2006, alguma aproximação com o discurso

geral da chamada estética relacional, conforme defendida pelo crítico francês Nicolas

Bourriaud? De que forma e em que medida o discurso da curadora dessa exposição

eventualmente se aproxima e/ou se distancia dos conceitos elaborados por Bourriaud? E, por

fim, é possível que essa aproximação entre o discurso curatorial brasileiro e o pensamento

estético relacional seja compreendida como um sintoma possível do entendimento mais geral

de arte contemporânea no Brasil durante os anos 2000?

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Para esclarecer estas questões, traço como objetivo geral, identificar as possíveis

aproximações entre o discurso curatorial de Lisete Lagnado na Bienal de São Paulo (2006) e a

Teoria da Estética Relacional de Nicolas Bourriaud. Para tanto foi necessário:

- Contextualizar a Estética Relacional a partir das Vanguardas Históricas de 1920;

- Conhecer a Teoria da Estética Relacional;

- Analisar o discurso Curatorial da 27ª edição da Bienal Internacional de São Paulo;

- Confrontar os argumentos curatoriais de Lisete Lagnado(2006) com os conceitos da Estética

Relacional;

- Reconhecer aproximações e divergências entre o discurso curatorial da 27ª Bienal de São

Paulo e os conceitos da chamada Estética Relacional.

Desta forma o trabalho fica estruturado em três capítulos, sendo o primeiro um

apanhado histórico necessário para a compreensão da relação Arte-vida, conceito fundamental

das teorias Relacionais de Nicolas Bourriaud, que recebe o título: “Conceitos Preliminares: a

relação arte e vida”. Este capítulo tem como apoio as obras de Michael Archer, Arte

Contemporânea (2001), Gianni Vattimo, O fim da Modernidade: niilismo e hermenêutica na

cultura pós-moderna (2007); e Peter Bürger, Teoria da Vanguarda (2008).

No segundo capítulo a Teoria de Bourriaud é analisada, e descrita através da leitura

das duas obras disponíveis em português de Nicolas Bourriaud , Estética Relacional e Pós

Produção : como a arte reprograma o mundo contemporâneo (2009), com o alicerce crítico

do artigo do Professor Doutor Ricardo Fabrini “Arte relacional e regime estético: a cultura da

atividade dos anos 1990” (2010). Este capítulo então recebe o nome: “Da Estética Relacional

de Nicolas Bourriaud: as condições da arte contemporânea num contexto relacional”.

Por fim a análise de caso. Têm como objeto de pesquisa, a análise da curadoria da

Bienal internacional de São Paulo do ano de 2006, de Lisete Lagnado, e ainda todo o contexto

curatorial contemporâneo pertinente, relacionado a curadoria contemporânea e a aproximação

arte e vida. Para tanto foram necessários o referencial sobre curadoria Cenário da arquitetura

da arte: montagens e espaços de exposições de Sonia Salcedo del Castilho (2008); Bienais de

São Paulo: da era do Museu à era dos curadores, de Polyana Canhetê e Francisco Alambert

(2004). Além dos artigos de Laura de Castro , “O museu e os curadores”, e Marilúcia Bottalo

“A curadoria de exposições de arte moderna e contemporânea e sua relação com a

museologia e os museus”, e toda coleta de artigos, periódicos que contribuiram para a análise

do discurso curatorial específico, incluindo o Guia da 27ª Bienal de São Paulo.

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2 CONCEITOS PRELIMINARES : A RELAÇÃO ARTE E VIDA NA ARTE DO SÉCULO XX

2.1 RELAÇÕES ENTRE ARTE E VIDA NO CONTEXTO DAS VANGUARDAS

A tentativa de vinculação entre arte e vida, não é um aspecto pertinente somente à

contemporaneidade. A imposição desta relação como um preceito para a produção artística,

aparece na história da arte desde as Vanguardas Artísticas de 1920.

Para exemplificar estas tentativas de conciliação entre arte e vida , as referências e as

descrições históricas contidas em Arte Contemporânea: uma história concisa (2001) de

Michael Archer, tornam-se necessárias. De acordo com este autor, Marcel Duchamp, já em

1913 com seus ready mades1 : a Roda de Bicicleta (1913) e Fonte (1917), materializou o

questionamento sobre a obra de arte como algo singular, em meio a multiplicidade de todos os

demais objetos pertencentes ao mundo cotidiano: questionava a segregação, da obra de arte da

vida.

1 Definição para o processo de apropriação de objetos já existentes, e sua apresentação como proposta de arte.

Marcel Duchamp, Roda de Bicicleta, 1913.

Marcel Duchamp, Fonte, 1917.

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No mesmo período a Assemblage2, apropriava-se de elementos e materiais

pertencentes a este cotidiano, e os desapropriava de suas realidades funcionais. Por outro lado

estes objetos / fragmentos, apresentados e agrupados na produção de uma obra artística, e

apreciados como tal, não deixavam de vincular a leitura da obra aos elementos da vida, da

praxis vital3.

Estas propostas incorporadas pela instituição artística permitiram a abertura para

ilimitadas formas, técnicas e linguagens, para se fazer arte. Desta forma, as relações estéticas

com a arte e sua aura singular, segregada da vida, passam a se modificar. Teorias sobre a

Morte da Arte, fundada no fim da filosofia estética tradicional, tomaram conta dos debates

teóricos – críticos.

Em A Teoria da Vanguarda de Peter Bürger (2008) , redigido em 1974, período das

neovanguardas, mas que trata ainda da problemática das vanguardas artísticas de 1920,

percebemos como este autor considerava a vinculação entre arte e vida de forma crítica.

Acreditava ser possível através da arte, proporcionar uma possibilidade da construção do

autoconhecimento e da autocrítica para o burguês, sujeito de sua sociedade.

O significado metodológico da categoria autocrítica, consiste em apontar, também para os subsistemas da sociedade, a condição de possibilidades de uma “compreensão objetiva” dos estágios passados de seu desenvolvimento. Aplicada a arte, isso quer dizer: só quando a arte entra no estágio da auto crítica é que se torna possível a “compreensão objetiva” de épocas passadas do seu desenvolvimento. (BÜRGER, 2008, p.57)

Neste sentido, acredita em uma “função” da arte na sociedade burguesa, que teria a

finalidade de uma formação integral do homem, “unindo as metades” (BÜRGER, 2008, p.99),

que foram separadas pela dinâmica capitalista da relação com o trabalho e do consumo. Para

estas fundamentações, utiliza em sua obra os discursos de Schiller e Marx, e ainda, ao tratar

dos aspectos específicos da Arte, analisa o discurso de Adorno, Kant, entre outros. No entanto

condena a apropriação estética dos elementos de consumo, característica das neovanguardas

dos anos 1960 e 1970, presentes como exemplo na Pop Art. Sobre este aspecto acredita que:

“Uma arte não mais segregada da práxis vital, mas que é inteiramente absorvida por esta,

perde – juntamente com a distância – a capacidade de criticá- la.” (BURGER, 2008, p. 107)

2 Técnica de colagem, que agrega objetos reais ao plano da tela. Ver Cubismo e Dadaísmo.3 Termo marxista utilizado para se referir a dinâmica cotidiana na sociedade capitalista.

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Bürger considera portanto que o projeto da vanguarda – de ataque a instituição “arte”

– fracassou pela impossibilidade de realizar tal projeto nas condições sociais vigentes, e pela

capacidade de resistência da Instituição, pertencente e desenvolvida nesta sociedade. Porém

considera que:

O fracasso do projeto vanguardista não significa um retrocesso às condições de partida; antes, traz como conseqüência uma transformação da instituição arte, que talvez possa ser assim formulada: a instituição arte continua existindo, mas como uma instituição abalada. (BÜRGER, 2008, p. 18)

Para Bürger além da função crítica direta, a arte também tinha uma função, como já foi

dito, de ressarcir o homem dos prazeres e dos desejos inibidos pelo cotidiano do trabalho. Ao

se concretizar na aparência fictícia de uma ordem melhor da sociedade, ou um espaço em que

as emoções e os desejos humanos pudessem ser expressos, a arte “alivia a sociedade

estabelecida da pressão das forças voltadas para a transformação” (BÜRGER, 2008, p. 107).

Esta transformação seria o processo contínuo da industrialização e dos avanços

tecnológicos. Neste sentido haveriam aqueles grupos de artistas que assumiriam uma postura

crítica que se relaciona com o discurso de Bürger, como os dadaístas. Porém houve também

aqueles que encontraram na modernidade um terreno poético a ser explorado, numa

ostentação do dinamismo, da tecnologia e dos novos padrões estéticos associados a

aceleração, crescimento econômico e tecnocientífico. A este caso poderíamos associar os

manifestos Futuristas.

O projeto utópico das vanguardas artísticas do início do século XX, fracassou.

Evidente, pois a arte como instituição pertencente ao sistema social vigente, fortalecia-se

juntamente com as novas formas de trabalho, e as novas relações de consumo. Desta forma a

produção artística adaptou-se a nova realidade, transformando seus padrões estéticos.

Gianni Vattimo (2007), em 1985 publica O fim da Modernidade: Niilismo e

hermenêutica na cultura pós-moderna. Este autor, de certa forma complementa os estudos de

Bürger, pois passa a tratar da problemática arte e vida nas neovanguardas da década de 1960 e

1970.

No capítulo específico, Morte ou Ocaso da Arte (VATTIMO, 2007, p. 39-55), trata do

conceito hegeliano de morte da Arte, que afirma ter se concretizado na modernidade,

resultado do desenvolvimento de uma sociedade efetivamente industrial (VATTIMO, 2007,

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p.39). Considera que este processo não é desassociado do projeto das vanguardas históricas,

do inicio do século XX, ao contrário vê como uma continuação histórica.

É antes, um evento, que constitui a constelação histórico-ontológica na qual nos movemos. Essa constelação é uma trama de eventos históricos-culturais e de palavras que lhes pertencem, os descrevem e os co-determinam. Neste sentido geschicklich4 , destinal, a morte da arte é algo que nos concerne e que não podemos deixar de encarar. Antes de tudo, como profecia-utopia de uma sociedade em que a arte não existe mais como fenômeno específico, suprimida e hegelianamente superada numa estetização geral da existência.(VATTIMO, 2007, p.41)

Para Vattimo(2007, p.42), “A Morte da Arte” não se dá no sentido literal, mas é apenas

um processo de transformação. Migra de uma estética filosófica tradicional, para uma estética

de consumo, em que a Arte passa a se apropriar da mídia, da tecnologia e da própria

instituição como meio de manter-se ativa e inserida nesta sociedade burguesa-industrial.

Nesta perspectiva, um dos critérios de avaliação da obra de arte parece ser, em primeirissimo lugar, a capacidade de a obra por em discussão seu estatuto, seja de forma direta e, com freqüência, então, um ato rudimentar, seja de modo indireto, por exemplo: como a ironização dos gêneros literários, como reescrita, como a poética da citação, como uso da fotografia entendida não como meio para a realização de efeitos formais, mas em seu significado simples de duplicação. (VATTIMO, 2007, p.42)

Com o advento da reprodutibilidade técnica, da explosão do estético generalizado pela

mass-mídia, “não apenas as obras do passado perdem sua aura de arte” , como algo separado

do resto da existência ( VATTIMO, 2007, p.43). Desta forma a importância autoral, a

originalidade, perdem sua função, e liquidam qualquer discurso sobre o gênio. Para

VATTIMO (2007, p. 45)) a morte da arte significa: (1) o fim da arte como fato específico e

separado do resto da existência , e (2) a estetização como extensão do domínio do mass-

mídia.

Neste contexto, fica claro que para Gianni Vattimo a relação “arte e vida” continua

existindo, e permanece como preceito para a produção artística também nas vanguardas

neomodernas, no entanto estas relações se diferem das vanguardas históricas do início do

século XX.

4 Palavra alemã que tem o sentido de algo que leva jeito para; que esta pré destinado à.

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No neomodernismo a Arte se apropriava da práxis vital industrial, num

comportamento irônico-icônica em que critica e ao mesmo afirma o domínio da estética de

consumo. Ao mesmo tempo une-se e ironiza a sua instituição, e desta forma, nesta dicotomia,

a sua “morte” é sempre adiada. (VATTIMO, 2007, p.48)

2. 2 OS PERÍODOS DE TRANSIÇÃO DAS VANGUARDAS

No paradoxo entre uma arte que se apropriava da estética de consumo, e outra que

procurava formas de se posicionar contra a comercialização extrema – de negação da arte

como mercadoria – , a arte ganhou formatações cada vez mais diversas no período de

transição dos anos 1960 e 1970.

Nos anos 1960, a relação entre o homem e o objeto industrializado, assim como suas

relações de consumo, ficam claramente estabelecidos como poéticas possíveis . A Pop Art

talvez seja o principal vértice na exploração e apropriação desta estética de consumo.

Na legendária frase de Andy Wahrol, em que afirmava que todos poderiam ter seus 15

minutos de fama, deixa evidente sua estratégia de produção. Wahrol se apoderava dos

mecanismos de produção assim como das imagens icônes de personalidades e produtos de

alto consumo. Emprestava o sucesso e a comerciabilidade destas imagens para suas obras, que

eram rapidamente absorvidas e desejadas pelo público em geral.

Nesta nova relação entre a obra e o público, as possibilidades de interação com a arte

se ampliavam ao mesmo passo que a arte era banalizada como objeto de consumo, de moda e

tendência. No contexto da Guerra Fria, da disputa silenciosa entre o capitalismo e o

socialismo, de acordo com Archer ( 2001, p. 117), qualquer coisa que alimentasse o mercado

e com isso contribuísse para o bem- estar comercial das econômicas ocidentais era percebida

por alguns artistas norte-americanos como um apoio disfarçado, informal, mesmo que

indireto, “ao envolvimento dos EUA, entre outras coisas na Guerra do Vietnã.” Desta forma

ao mesmo tempo em que alguns se aproveitavam do novo comportamento de consumo, outros

encontravam formas para tornar incomercialisáveis suas obras. Neste sentido encontramos as

performances, que na década de 1970 em especial, tornam-se o fio condutor das produções

deste período.

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Para Uberto Eco ( 1989, p. 94) no período da vanguarda entre as décadas de 60 e 70,

haviam duas possibilidades de produção coexistindo. A uma ele denomina de

experimentalismo e a outra de vanguarda. A diferença essencial entre esta e aquela é que no

primeiro caso, “da obra extrapola-se uma poética”; e no segundo, “da poética extrapola-se a

obra.” Diante desta colocação entendo que no experimentalismo, a obra ainda esta em

processo de criação e questiona sua própria forma, investiga suas possibilidades. Já nas obras

que Eco chama de vanguarda, a relação entre o público – obra, é direta. Crítica a instituição

que a recebe, ao mesmo tempo que incorpora-se a ela.

As relações: artista – obra; obra – público; e arte – mundo, estavam mais uma vez

sofrendo transformações. “ Os artistas tradicionalmente vistos como individualistas avessos às

associações, começaram a organizar-se em grupos de pressão, que levavam diante a idéia

predominante do Conceitualismo, de que era de responsabilidade do artista tanto estabelecer o

contexto para sua obra quanto fazer sua própria obra.”( ARCHER, 2001, p.118)

A arte torna-se cada vez mais política e engajada, chamando o público e a sociedade a

participar, a vivenciar junto com os artistas suas poéticas. O que leva as “obras” ficarem cada

vez mais abertas, e o conceito de obra acabada, de obra como algo terminado e muito bem

executado, havia se perdido desde o primeiro momento que tentou-se romper com quaisquer

tradições da arte, no início do século XX ( BÜRGER, 2008, passim).

O formato obra de arte como categoria, segundo Bürger – no dadaísmo – não deixa

de existir mas é totalmente transformada, sendo assim prefere chamá-las ao invés de obras,

manifestações. Isto comprova a historicidade do processo relacional na arte.

Em meados dos anos sessenta até uma parcela dos anos setenta, o que percebemos é

uma preocupação com a banalização da arte visual, sendo transformada em um espetáculo.

Em 1963, (apud ARCHER, 2001, p. 60) Thomas Hess ao comentar sobre a Pop Art , presume

que a presença de uma grande platéia é indispensável para estas obras, caracterizando uma

transformação teatral. Desta forma a produção de uma pintura Pop torna-se impossível sem

que se tracem planos para sua exposição. Ou seja, a obra passa a interagir e por vezes só fazer

sentido em um determinado contexto expositivo.

Archer ( 2001, p. 60) ainda considera que o demasiado afrouxamento das categorias, e

o “desmantelamento das fronteiras interdisciplinares”, permitiu que a arte neste período

assumisse variadas formas e nomes diferentes. Para citar alguns: Conceitual, Arte Povera,

Processo, Anti-forma, Land, Ambiental , Body, Performance e Política. Todos estes e outros

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ainda, segundo o autor tem suas raízes no Minimalismo (1950-1960) e nas várias ramificações

do Pop e do novo Realismo.

Percebemos nestes novos modos de se fazer arte, uma transição poética que antes

vinculava-se ao mundo material, os objetos, uma discussão acerca das formas para a

materialidade das coisas, inclusive do corpo humano e suas relações com o mundo. Na Body

arte, e nas performances notamos claramente a aproximação da arte com a vida no processo

de criação do artista que passa muitas vezes ser considerado como a própria obra. De um

modo ou de outro a Instituição Arte sempre achou soluções para tornar comercializável, ou

ao menos compilar, catalogar, essas manifestações, através por exemplo, do registro

fotográfico.

Com esta desmaterialização suscetível da forma da arte, o que predomina no período

que Archer (2001, p.155) chama de Pós Moderno, é uma volta as formas tradicionais da

pintura, que buscavam o “restabelecimento da habilidade manual por meio do prazer da

execução.” Com isto deixa de ter importância a idéia do progresso em arte, o que possibilitou

uma liberdade de busca de referências e inspirações em toda parte, permitindo que a arte da

Transvanguarda (1980) citasse qualquer período que desejasse. Por esta característica alguns

acusavam que o pós modernismo era desprovido de senso histórico, o que levou alguns a crer

que a arte pós moderna era constituída de simples apelos estéticos, superficiais e evocativos.

O pluralismo do pós moderno, impedia que se generalizasse como um movimento. O

que podemos notar é que os artistas da década de 1980 passaram a servir-se dos exemplos e

da herança deixada pelas décadas anteriores para tratar de poéticas pessoais e discussões

locais. Percebemos então a arte voltando-se gradativamente, e cada vez mais, para o

indivíduo, inserido numa sociedade moderna, que serve-se de sua própria história.

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3 DA ESTÉTICA RELACIONAL DE NICOLAS BOURRIAUD: AS CONDIÇÕES DA

ARTE CONTEMPORÂNEA NUM CONTEXTO RELACIONAL

3.1 A ESTÉTICA RELACIONAL DE NICOLAS BOURRIAUD

Esclarecidos os aspectos e o contexto histórico que a Teoria da Estética Relacional de

Nicollas Bourriaud se estabelece, posso agora elencar os conceitos de maior relevância para

mais tarde estabelecer ou não vínculos com a curadoria da 27 ªBienal de São Paulo, 2006.

Nicolas Bourriaud atualmente um dos críticos atuais mais comentados no universo

das Artes Visuais, publicou na França dois livros Estética Relacional (1998) e Pós –

Produção: como a arte reprograma mundo contemporâneo (2004), em que teorizou as

“novas” práticas artísticas eminentes na década de 1990 e início do século XXI. Porém seus

livros foram publicados no Brasil somente em 2009, tendo antes versões lançadas em

Português (Portugal) e Espanhol. Nicolas Bourriaud foi curador das Bienais de Veneza

(1993), de Lyon (2005) e Moscovo (2005 e 2006). Dirigiu juntamente com Jerôme Sens, o

Palais de Tokyo – lugar dedicado a criação contemporânea parisiense – de 2001 a 2004; em

2009 foi curador da Trienal da Tate, o que demonstra sua relevância para o universo da Arte

Contemporânea. Bourriaud construiu seu discurso com base em sua experiência como

curador, ao observar a produção de arte dos anos 1990.

Para Bourriaud ( 2009 , p.41-42): “a história da arte pode ser lida como uma história

dos sucessivos campos relacionais externos, que mudam de acordo com as práticas

determinadas por sua própria evolução interna”. Bourriaud, assim como os críticos anteriores,

percebe uma mudança nestas relações da arte de seu tempo.

Essa história, hoje, parece ter tomado um novo rumo: depois do campo das relações entre humanidade e divindade, a seguir entre humanidade e objeto, a prática artística agora se concentra na esfera das relações inter-humanas, como provam as experiências em curso desde o começo dos anos 1990. (BOURRIAUD, 2009 , p. 41-42)

Ou seja a relação entre arte e vida, neste contexto, não se dá através de sua relação

formal mas de sua interação entre obra e expectador. É a partir dos anos noventa que

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Bourriaud percebe uma forte preocupação cada vez mais eminente dos artistas para com seu

público, preocupando-se como este público irá receber sua obra. Nestas circunstâncias , essas

produções específicas determinam não só um campo ideológico e prático, mas também novos

domínios formais, estes domínios formais de acordo com o autor, extrapolam a barreira do

espaço expositivo tradicional.

Em outras palavras, além do caráter relacional intrínseco da obra de arte, as figuras de referência da esfera das relações humanas agora se tornaram “formas” integralmente artísticas: assim, as reuniões, os encontros, as manifestações, os diferentes tipos de colaboração entre pessoas, os jogos, as festas, os locais de convívio, em suma, todos os modos de contato e de invenção de relações representa hoje objetos estéticos passíveis de análise enquanto tais. (BOURRIAUD, 2009, p. 40)

Bourriaud admite que as formações de relação de convívio são fatores históricos desde

os anos 1960. No entanto, mesmo a geração dos anos 1990 retomando esta questão, não

retomaria junto com ela a problemática sobre definição da arte, evidente nos anos 1960 e

1970. “A questão não é mais ampliar os limites da arte, e sim testar sua capacidade de

resistência dentro do campo social global.”(BOURRIAUD, 2009, p. 43) Esta resistência se

deve ao rompimento na tentativa utópica de uma transformação social direta. A arte

contemporânea resiste a globalização e a estetização generalizada, pois passou a atuar nas

microestruturas individuais ou coletivas. “A função crítica e subversiva da arte

contemporânea agora se cumpre na invenção de linhas de fuga individuais ou coletivas”.

(BOURRIAUD, 2009, p. 44)

O Professor Doutor Ricardo Fabrini, em seu artigo, Arte Relacional e regime estético:

a cultura da atividade dos anos 1990, publicado na Revista da FAP (2010), procura esclarecer

em suas próprias palavras: “se na tentativa de suprir a ausência de políticas sociais, o que

teríamos nos espaços de arte relacional é uma sociabilidade glamourizada, fictícia – um

simulacro da sociabilidade dita real […] fundada na imprevisibilidade e nos conflitos.”

( FABRINI, 2010, p.1) Ou seja para Fabrini a arte relacional, colaborativa como a define,

citando o próprio Bourriaud, pode não passar de um simulacro.

Neste contexto dois pontos valem ser melhor explicados. Para Fabrini (2010) e para

Bourriaud (2009), o procedimento contemporâneo de propor situações que possibilitem uma

alteração do sensível, embasado em discussões políticas, sociais, comunitárias e sobretudo

interpessoais de nada se assemelham ao procedimento vanguardista utópico descrito por

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Bürger de uma transformação efetiva da sociedade, em um sentido macro-estrutural pela ação

artística. O “embaralhamento” arte e vida contemporâneo, tem a ver com uma resposta ao

estado atual da modernidade, uma resposta a “sociedade do espetáculo”, num contexto

multicultural globalizado caracterizado pelo destaque de dois procedimentos : ações

colaborativas e trans-disciplinares e da relação arte – sociedade – comunicação. (FABRINI,

2010, p.6)

Outro ponto é esta apropriação dos objetos, espaços, linguagens, de relações em que o

artista agrega e reorganiza elementos disponíveis em função do desenvolvimento de sua idéia.

Fabrini esclarece que a apropriação contemporânea em nada se assemelha a proposta

Duchampeana do início do século XX, e seria um equivoco olhar para os procedimentos

atuais como meras continuidades de uma ação vanguardista, que só estabelece sentido em sua

realidade histórica. No entanto os processos contemporâneos, a produção, é um processo

histórico, neste sentido devemos distinguir o que seria um estado de evolução ou continuidade

– que não seria o caso – de uma arte que não nega suas referências, e portanto resulta de um

processo histórico.

O procedimento e a problemática no uso de materiais para os artistas contemporâneos

é visto por Bourriaud (2009, p. 41) com um grau de proximidade das operações tecnológicas,

em rede, das tecnologias da pós produção. É por isto que para Nicolas Bourriaud o

comparativo entre arte contemporânea e a cultura do Mp3 e do Deejay (DJ) podem ser

esclarecedoras, pois ambas desenvolvem-se em um procedimento de reciclagem frenético,

reorganizando e resignificando signos.

Para exemplificar esta diferença de sentido nas apropriações contemporâneas, gostaria

de citar uma das obras de Felix Gonzalez-Torres, que se apropria de objetos e imagens do

cotidiano, a serviço de uma poética extremamente pessoal mas que se torna a apresentação de

uma realidade possível e ao mesmo diversa dentro da sociedade capitalista.

O número dois está sempre presente, a dupla. Na representação da figura do casal,

figura clássica na história da arte, em que não se trata mais da soma de duas parte

heterogêneas complementares. O casal de Torres caracteriza-se como unidade dupla e serena,

retratando a realidade vivida por ele e seu companheiro falecido, na condição da

homossexualidade, que passa a apresentar como uma possibilidade relacional através da

organização justaposta de dois relógios idênticos que marcam exatamente a mesma hora,

retratada no registro de Untitled ( Perfect Lovers),(Sem título [ Amantes Perfeitos]) de 1991.

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Bourriaud utiliza o trabalho deste artista como referência e exemplo de uma

característica primordial da arte relacional : a co-presença , pela evocação indicial destas

apropriações e a disponibilidade das formas do contemporâneo. Além disso a condição de

apreciação destas obras, pode ser considerada como um simulacro de coabitação entre as

diferenças, entre realidades possíveis.

Na introdução do livro intitulado Estética Relacional ( BOURRIAUD, 2009, p.10)

considera que o primeiro aspecto a ser analisado por um crítico é a forma material das obras

deste período, que apresentam-se “aparentemente inapreensíveis, quer sejam processuais ou

comportamentais – em todo caso, estilhaçadas segundo os padrões tradicionais. ”

Citando vários exemplos destas produções como Rirkrit Tiravanija, Carsten Holler e

Vanessa Beecroft, conclui que em todos estes casos as condições interativas, conviviais e

Felix Gonzalez-Torres, Untitled (Perfect Lovers). 1991. Clocks, paint on wall. (35.6 x 71.2 x 7 cm). Gift of the Dannheisser Foundation. © 2006 The Felix Gonzalez-Torres Fundação, Cortesia Andrea Rosen Gallery.

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relacionais (BOURRIAD, 2009, p. 11) se repetem intensamente. É sobre estes aspectos, que

poderíamos pensar, a condição relacional como um possível sintoma da arte contemporânea.

Além disso as relações de consumo passam a ditar os comportamentos. A arte coexiste

nesta realidade. Nas palavras de Bourriaud o que não pode ser comercializado – entenda-se

consumido – esta fadado a morrer. Inclua-se nestes produtos de consumo o espaço, e o tempo

assim como os vínculos sociais, cada vez mais padronizados, que passam a fazer parte do

procedimento artístico como linguagem. De acordo com Fabrini (2010, p. 9) a figura do

espectador vanguardista é substituído pelo consumidor cultural num comportamento

extremamente eclético e dinâmico a serviço de um mundo tecnocientífico acelerado.

Num mundo regulado pela divisão do trabalho e pela superespecialização, pela mecanização humana e pela lei do lucro, aos governos importa tanto que as relações humanas sejam canalizadas para vias de saída projetadas para essa finalidade quanto que elas se processem segundo alguns princípios simples, controláveis e repetíveis. (BOURRIAUD, 2009, p.12)

Esta mudança comportamental se relaciona com o auge da produção industrial

vinculado ao consumo de massa. ( BOURRIAUD, 2009a, p. 97) Usando como referência

Guy Debord, Bourriaud afirma que a separação suprema que afeta os canais relacionais – ou

seja o distanciamento humano próprio de uma realidade tecnológica – constitui a última etapa

da transformação para uma “sociedade do espetáculo”, “em que as relações humanas não são

mais diretamente vividas, mas se afastam em sua representação espetacular.”(BOURRIAUD,

2009, p. 12)

É nessa realidade espetacular que a arte atual irá se posicionar questionando as

possibilidades de gerar relações no mundo. Porém a tradição na história da arte procurou

representar estas relações possíveis, e não propôs a sua prática real. No século XXI a arte

além da evocação pela apropriação de imagens e objetos, passa a propor vivências,

experiências, trocas ativas. A arte funcionava como um palco de representações e não de

proposições. Neste sentido a prática artística para Bourriaud ( 2009, p. 13) torna-se um campo

fértil de experimentação social, sem se ater a padronizações comportamentais, mas também

sem deixar de ser utopias de proximidades.

Para exemplificar, Fabrini (2010, p. 09) cita em seu texto a obra de Rirkrit Tiravanija,

em que problematizava situações de comunicação “através da disponibilização de mesas de

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negociação, estranhas plataformas de discussão, cenas vazias, painéis de cartazes, pranchetas,

telas, salas de informação – estruturas coletivas abertas a participação do público.”

A relação arte e vida proposta por artistas relacionais, seriam apropriações de

determinadas realidades sociais, evidenciando-as como linguagens. No entanto estas

propostas colaborativas não implicam necessariamente em uma “linguagem artística de

arranjo formal”, ou de uma construção de um espaço plástico. “A questão do artista relacional

não seria portanto, fazer com que uma nova forma artística, ou um gesto inaugural, indiciasse

uma alteridade radical, outra sociedade; mas mobilizar elementos dados no presente para

alterar a partilha do sensível dos habitantes de um determinado território.” ( FABRINI , 2010,

p.7)

Seguindo o conselho do próprio autor , descrevo agora “para facilitar a compreensão

da obra [Estética Relacional] ” (BOURRIAUD, 2009, p. 13), a definição dada por ele para a

palavra Arte, que consta em seu Glossário:

Arte : 1- Termo genérico que designa um conjunto de objetos apresentados no âmbito de um relato chamado a história da arte. Esse relato estabelece uma genealógica crítica e problematiza os campos desses objetos através de três subconjuntos : pintura, escultura e arquitetura. 2- A palavra arte hoje aparece apenas como resíduo semântico desses relatos. Sua definição mais precisa seria a seguinte: a arte é uma atividade que consiste em produzir relações com o mundo com o auxílio de signos, formas, gestos ou objetos. ( BOURRIAUD, 2009, p. 147)

Na definição, destaco o conceito fundamental para compreendermos a Arte

Contemporânea de um ponto de vista relacional. A utilização de signos, formas, gestos ou

objetos, reorganizados ou organizados a serviço do artista que procura estabelecer vínculos

entre estes signos, e ainda criar outras possibilidades de significações, com a interação com o

ambiente expositivo e com o público, estabelecem a base da estruturação do pensamento de

Nicolas Bourriaud e portanto de sua teoria da Estética Relacional. No entanto estas relações

não se dão ao acaso, devemos considerar os aspectos históricos, políticos e culturais que

sempre interferiram direta ou indiretamente na produção do artista de seu tempo.

Tendo isso, ao olharmos para a arte atual percebemos, concordando com Bourriaud

( 2009, p. 15), “um certo aspecto do programa da modernidade”, contudo parte deste

programa moderno – negação da tradição, busca pelo novo, rompimento com a instituição – é

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considerado encerrado, ou fracassado como Peter Bürger e Gianni Vattimo já declararam. O

contexto contemporâneo de arte é resultado das transformações sociais, políticas e das

relações de trabalho, provenientes do acelerado avanço tecnológico e dos meios de

comunicação, que promoveram a globalização.

“O projeto emancipador moderno foi substituído por inúmeras formas de melancolia.”

( BOURRIAUD, 2009, p.16) Uma busca ideológica libertadora era o que alimentava este

projeto. A Arte de hoje, ainda permanece com esta essência ideológica. Propõe modelos

perceptivos, experimentais, críticos e participativos. A arte continua existindo nesta realidade

hipermoderna, capitalista, em que, em teoria, não teria motivos para tal, concordando com

Vattimo ( 2004, passim). Porém, para isso, teve de se inserir, se adaptar e se apropriar dos

novos meios de interação e produção. Então o que morre não é a modernidade, pois

continuamos modernos. E se modernidade pode ser entendido como um sintoma capitalista e

de avanços tecnológicos, somos ainda mais modernos do que antes, hipermodernos5.

A arte, que antes lutava contra a modernidade social, assumindo posturas críticas, ou

que deslumbrava-se com as novas possibilidades modernas, pretendia de um modo ou de

outro, preparar ou anunciar o mundo futuro. O que vivemos hoje nada mais é do que este

“futuro” almejado ou odiado por nossos precursores, e nesta realidade a arte passa a

apresentar “universos possíveis”, ocupando-se de aprender a habitar melhor o mundo, ao

invés de tentar modificá-lo .

As obras já não perseguem a meta de formar realidades imaginárias ou utópicas, mas procuram construir modos de existência ou modelos de ação dentro da realidade existente, qualquer que seja a escala escolhida pelo artista. […] o artista habita circunstâncias dadas pelo presente para transformar o contexto de sua vida ( sua relação com o mundo sensível ou conceitual) num universo duradouro. Ele toma o mundo em andamento: é um locatório da cultura , para retomar a expressão de Michel de Certeau. Hoje a modernidade prolonga-se em práticas de bricolagem e reciclagem do dado cultural, na invenção do cotidiano e na ordenação do tempo vivido, objetos tão dignos de atenção e estudo quanto as utopias messiânicas ou novidade formais que caracterizavam no passado. (BOURRIAUD, 2009, p. 18-19)

Por outro lado esta possibilidade relacional da arte , em que prevalece uma estética do 5 Hipermodernidade é o termo criado pelo filósofo francês Gilles Lipovetsky para delimitar o momento atual da sociedade humana. O termo “hiper” é utilizado em referência a uma exacerbação dos valores criados na Modernidade, atualmente elevados de forma exponencial. (LIPOVETSKY, Gilles; CHARLES, Sebastian.Os tempos Hipermodernos. São Paulo: Barcarolla, 2004)

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encontro, da vivência, pode ser o resultado radical dos objetivos estéticos, culturais e políticos

do projeto das vanguardas artísticas modernas. De fato estaríamos num processo de

estetização de tudo e de todos, desde os anos 1960. Mas de acordo com o professor Dr.

Ricardo Fabrini6, o projeto moderno de estetização da vida não pode ser considerado

totalmente fracassado, pois hoje vivemos num mundo totalmente visual em que as imagens da

arte, como por exemplo os esquemas geométricos de Mondrian, podem ser vistas a qualquer

instante, estampados, citados, apropriados por objetos de consumo. A arte foi de fato

consumida e neste sentido também não teria sido banalizada?

Voltamos a discussão de uma possível morte da arte, já que o que vemos, hoje, na arte

contemporânea é um terreno de infinitas possibilidades de formatações e apropriações

impensáveis, livres de parâmetros estéticos que regulem sua produção. Numa arte em que

parece estar isenta de qualquer critério crítico, o que Bourriaud tenta fazer é organizar os

6 De acordo com palestra proferida pelo Professor Dr. Ricardo Fabrini, na Semana Acadêmica do Curso de Licenciatura em Artes Visuais, na Faculdade de Artes do Paraná, Curitiba, 2010.

Tenis Nike® Inspirado nas obras de Piet Mondrian, lançado em 2008/2009

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esquemas, permitindo a compreensão do estado atual da arte partindo de concepções

materialistas7. Neste sentido para Bourriaud a arte sempre foi relacional em diferentes graus

como um fator de sociabilidade e fundadora de diálogo. (BOURRIAUD, 2009, p. 21)

Lembremos Vattimo já citado neste texto, que considera que a arte não morre, apenas

transforma-se, adaptando-se a realidade vigente.

A arte, para Bourriaud ( 2009, p. 22), ocupa um lugar de “interstício social” , além de

seu caráter comercial ou de seu valor semântico, numa sociedade contemporânea,

economicamente global. Seguindo as definições de Karl Marx (apud BOURRIAUD, 2009,

p.23), “o interstício é um espaço de relações humanas que , mesmo inserido de maneira mais

ou menos aberta e harmoniosa no sistema global sugere outras possibilidades de troca além

das vigentes nesse sistema”. A ação curatorial neste contexto, tem grande importância nas

relações inter- humanas possíveis através da arte. Em uma de suas tipologias: Colaborações e

contratos, Bourriaud (2009, p. 46) considera que a exploração destas relações existentes entre

artista e seu galerista podem determinar formas e projetos, e afirma que o binômio

artista/curador, inscrito na instituição, é apenas a primeira etapa das relações humanas capazes

de determinar uma produção artística. (BOURRIAUD, 2009, p. 46-47)

3.2 ARTE COLABORATIVA E A FORMA DA ARTE CONTEMPORÂNEA

Procurando esclarecer o que Bourriaud chama de Pós – Produção, este termo estaria

ligado ao mundo da televisão, do cinema e do vídeo, a “procedimentos de montagem,

acréscimo de outras fontes visuais ou sonoras, as legendas, vozes off, os efeitos especiais.”

(BOURRIAUD, 2009, p.7). Neste contexto as possibilidades seriam: Reprogramar obras

existentes; Habilitar estilos e formas historicizadas; Utilizar a sociedade como um repertório

de formas; Usar imagens, Recorrer a moda e a outros meios de comunicação.

( BOURRIAUD, 2009a, passim)

Em um primeiro momento a questão que Bourriaud relaciona com a democratização 7 Bourriaud afirma que a base filosófica que sustenta a estética relacional foi definida por Louis Althusser como um materialismo de encontro fortuito ou materialismo aleatório. “ Assim, a essência da humanidade é puramente transindividual, formada pelos laços que unem os indivíduos em formas sociais sempre históricas ( Marx: a essência humana é o conjunto das relações sociais) Não há 'fim da história' nem 'fim da arte' possíveis, porque a partida sempre é retomada em função do contexto, isto é em função dos jogadores e do sistema que eles constroem ou criticam.”(BOURRIAUD, 2009 , p.25)

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da informática e o surgimento do sampleamento8, “cujas figuras emblemáticas são os Djs9 e

os programadores”, inicia-se na década de 1990. Com a disponibilidade técnica, as

possibilidades de montagens e produções, passam a pertencer a todos. Este universo

democrático da utilização das formas, fez com que a Arte abrisse mão da propriedade das

formas. Os artistas abrem mão do copyright em troca do direito do acesso as obras. Seria essa

uma postura de consumo adaptada a arte? É neste contexto que Fabrini define a arte

colaborativa.

Essas ações, além disso, realizadas com freqüência em espaços públicos – como em ocupações de edifícios abandonados – com a colaboração de agentes sociais, quando o próprio artista não assume esta função, como na invenção de Javier Tellez, podem ser confundidas com iniciativas de ordem social, ou assistencialista, que implicam uma estética difusa, apaziguada, conciliatória muito distinta da beleza intensa ou inquietante senão vertiginosa que parece, frente a essa arte colaborativa, renegada a outra época. ( FABRINI, 2010, p.13)

Para Ranciere ( apud Fabrini, 2010, p. 13) na falta de uma forma artística ou do gesto

estético, estas ações transpostas a realidade existente, “resultam de colaborações de artistas,

curadores, mass- mídia e terceiro setor, entre outros parceiros”. Desta forma o artista deixa de

lado o atestado de gênio presente e passa a atuar como um organizador, podendo ainda

assumir papéis de editor ou empregador. Ou seja a produção contemporânea aproxima-se cada

vez mais dos parâmetros que regem uma empresa.

No entanto Bourriaud afirma que a estética relacional não constitui uma teoria da arte,

“ que suporia o enunciado de uma origem e de um destino e sim uma teoria da forma.” Mas

afinal que forma é esta já que o mesmo autor considera todas as possibilidades de relações

interpessoais, de encontros, que não assumem formas concretas tradicionalmente aceitas na

arte como dignas de uma produção estética?

Bourriaud (2009, p. 29) afirma que “observando as práticas artísticas contemporâneas,

deveríamos falar mais em 'formações' do que em 'formas'.” Considera que ao contrário de uma

obra fechada em si mesma – conceito tradicional da obra de arte – a arte contemporânea é

8Samplear :[Neologismo] v. 1. Ato de capturar e registrar digitalmente sons, frases musicais ou timbres sonoros, por meio de um sampler, com o propósito de manipulá-los e recombiná-los.

9Um disc jockey (DJ ou dee jay) é um artista profissional que seleciona e roda as mais diferentes composições, previamente gravadas para um determinado público alvo.

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resultado e só existe na “ relação dinâmica de uma formação artística com outras formações,

artísticas ou não .” [...] “A arte é um estado de encontro fortuito”(BOURRIAUD, 2009, p.27)

Descordando da estética tradicional , em que a forma artística é intermediada por uma

obra, Bourriaud considera que a forma artística assume consistência, somente neste aspecto:

quando coloca em jogo interações humanas; a forma de uma obra de arte nasce de uma negociação com o inteligível que nos coube. Através dela, o artista inicia um diálogo. A essência da prática residiria, assim, na invenção de relações entre sujeitos. Cada obra de arte particular seria a proposta de habitar um mundo em comum[...] (BOURRIAUD, 2009, p. 30-31)

Esses encontros não se apresentam como representações, mas criam modelos. Estes

modelos criam “domínios de trocas “ particulares. Para criar um mundo , uma possibilidade ,

um modelo, este encontro considerado fortuito deve se tornar duradouro. “Os elementos que

constituem devem se unificar numa forma, isto é, os elementos têm de dar liga.”

( BOURRIAUD, 2009, p.27) Então além dos vínculos entre estas formas a relação tempo

espaço exercem um papel determinante na formação da obra relacional.

Compreendendo melhor esta forma subjetiva da arte contemporânea, entendo,

concordando com Bourriaud, que como resultado de uma sociedade regada por imagens,

fotográficas, midiáticas e cinematográficas, a percepção e a experiência visual torna-se mais

complexa. A experiência de se apreender um conjunto de tomadas de cenas , um plano de

seqüências formando a unidade do vídeo, permite-nos entender que mesmo relações entre

elementos e signos aparentemente diversos podem se unir em uma forma única, ligados por

um leque de relações criadas pela interação e o tempo de duração destes encontros, “que não

estão ligados por nenhuma matéria unificadora, nenhum bronze.” (BOURRIAUD, 2009,

p.28).

A forma da arte hoje é eclética, mas não um ecleticismo pejorativo, e sim entendam

público e artistas num mesmo patamar de consumo de um grande banquete cultural e

histórico. “A chave do dilema encontra-se na instauração de processos e práticas que nos

permite passar de uma cultura de consumo para uma cultura de atividade, da passividade

diante do estoque [eclético] disponível de signos para práticas de responsabilização.”

(BOURRIAUD, 2009a, p.108)

Usar as infindáveis possibilidades imagéticas em uma sociedade movida pelas

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informações visuais é não assumir uma postura de depósito. Os artistas reativam as formas,

habitando-as. Para Bourriaud ( 2009a, p. 110) se hoje esta reutilização e esta apropriação das

imagens do mundo de uma forma geral é uma questão importante, “ é porque elas convidam a

considerar a cultura mundial como uma caixa de ferramentas, e não como um espaço

narrativo aberto, unívoco, e uma gama de produtos acabados.”

Numa sociedade regida pelo poder tecno-mercantil, a padronização dos gostos da

estética em geral, ou seja, dos desejos de consumo, representam uma ameaça a liberdade de

juízo. Por outro lado permitem um estreitamento das relações globais, facilitando o universo

da comunicação e das linguagens que tendem a se formatar em conceitos generalistas e

“totais”.

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4 ANÁLISE DE CASO: LISETE LAGNADO, A BIENAL DE SÃO PAULO E O

DISCURSO PARA UMA ARTE RELACIONAL.

4.1 A APROXIMAÇÃO ARTE - VIDA ATRAVÉS DAS EXPOSIÇÕES DE ARTE

Para Sonia Salcedo del Castilho (2008, p. 42) já no início do século XX, os

procedimentos artísticos modernos exigiam das exposições novos padrões que atendessem as

necessidades de montagem, de modo que facilitassem as possíveis interpretações do público.

Como exemplo que atendia esses novos padrões, Castilho cita a exposição “concebida

como acontecimento”, a Secessão de Viena em 1902. Sua formatação permitia que o

espectador assumisse o papel de “vetor ou veículo” de um campo estético em um espaço

“como um teatro mudo” (CASTILHO, 2008, p.43). Para termos idéia da importância da

montagem desta exposição, a autora afirma que possivelmente a Secessão de Viena de 1902 ,

anunciava o que mais tarde, em 1950, viria a ser os Happenings10.

Tendo isso podemos afirmar que os critérios expositivos adaptavam-se aos novos

modos de produção da arte, e propunham junto as obras uma nova maneira de se relacionar

com o público, preocupando-se com um conceito de obra de arte total, com o mesmo

princípio de se unir arte e vida.

Para Castilho esta tentativa de vinculação entre arte e vida é ainda mais remota: estaria

presente já nas idéias Românticas do século XVIII. No entanto esta expressão “total” da arte,

concebida através da montagem e curadoria, segundo Ekehard Mai ( apud CASTILHO, 2008,

p.46), permitiu que se iniciasse uma forma de exposição que ao se preocupar com o todo

espacial, “tornava vulnerável a independência de cada objeto” e ainda, Mai considerou este

10 “O termo happening é criado no fim dos anos 1950 pelo americano Allan Kaprow para designar uma forma de arte que combina artes visuais e um teatro sui generis, sem texto nem representação. Nos espetáculos, distintos materiais e elementos são orquestrados de forma a aproximar o espectador, fazendo-o participar da cena proposta pelo artista. Os eventos apresentam estrutura flexível, sem começo, meio e fim. As improvisações conduzem a cena - ritmada pelas idéias de acaso e espontaneidade - em contextos variados como ruas, antigos lofts, lojas vazias e outros. O happening ocorre em tempo real, como o teatro e a ópera, mas recusa as convenções artísticas. Não há enredo, apenas palavras sem sentido literal, assim como não há separação entre o público e o espetáculo. Do mesmo modo, os "atores" não são profissionais, mas pessoas comuns.” ( Itaú Cultural. Enciclopédia do Itaú Cultural: Artes Visuais.

Disponível em http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=3647, acesso em 12-08-2010.

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formato, um terreno perigoso “uma vez que sua fruição era guiada por uma espécie de

mediação expressiva e interpretativa, que privilegiava a unidade do conjunto” e não as

especificidades de cada obra.

“Os temas curatoriais, assim como Bethoven [ tema da Sucessão de 1902], buscando

unidade visual, conciliam toda a lógica expositiva, impulsionando a sintaxe espacial de

diferentes expressões artísticas, principalmente nas mega exposições. (CASTILHO, 2008,

p.46)” Este sentido de unidade, sem dúvidas, concordando com Castilho, esta presente nas

ações curatoriais nos dias de hoje. O que as tornam “mega eventos”, e não somente

exposições ou mostras de cunho contemplativo.

Na transição do século XIX para o XX, a discussão da funcionalidade do artista numa

sociedade em extremo desenvolvimento econômico era constantemente discutida. A burguesia

de modo geral não tinha interesse pela arte, mas consumia como status social. Os artistas

numa tentativa incessante de transgressividade, eram tidos como problemáticos e muitas

foram as frentes que se abriram para tentar incorporá-los no âmbito das artes liberais.

“Conscientes de que o artista rejeitado pela crítica poderia, no futuro, alcançar preços mais

elevados, muitas vezes esses mercadores se antecipavam à critica em busca de novos 'valores'

artísticos.” ( CASTILHO, 2008, p. 47)

Estas relações de arte e mercado, influenciaram definitivamente na funcionalidade das

exposições. Passaram de mostras a eventos, que pretendiam envolver o público mais do que

informar ou mostrar as produções artísticas.

Considerando que até hoje as políticas socioeconômicas interferem nos limites institucionais da arte, influenciando a frequência de suas exposições e de seus milhares de visitantes, supomos que a afirmação do circuito artístico moderno se vincule a esse processo de consumo cultural, pois, desde os primeiros salões, é por meio dessa lógica que a arte se materializa na sociedade. (CASTILHO , 2008, p.99)

Neste mesmo processo de interesses incluem-se as mostras coletivas. Num contexto

vanguardista a aceitação do “novo” significava aceitar o progresso, comportamento

característico desta época. As mostras coletivas propunham o acesso a estas “novidades”,

porém a formatação destas mostras era fundamentada num mesmo critério de unidade, o que

mais uma vez afirmamos que qualquer particularidade da obra era anulada ao ser colocada

lado a lado com outras tantas que procuravam, por sua disposição, criar um enredo comum.

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30

Desta forma as exposições coletivas retiravam a fruição particular das obras em prol de um

valor coletivo.(CASTILHO, 2008, p.75)

Para compreendermos as curadorias atuais, devemos voltar o olhar atentamente para

esses interesses das mostras coletivas do passado, e considerar a abertura de possibilidades e

linguagens possíveis numa contemporaneidade do consumo.

No Brasil a história das mega exposições de arte, inicia-se com a primeira Bienal de

São Paulo em 1951, que objetivava transformar São Paulo num centro artístico nacional ao

mesmo tempo que atualizava culturalmente, as concepções de arte moderna provenientes do

circuito internacional. Para Francisco Alambert e Polyanna Canhetê, de 1951, até o fim dos

anos 1960 – assediada pela ditadura – a Bienal representou o processo de formação cultural

no Brasil. “ A mostra mudou continuamente, às vezes para o bem, as vezes para o mal , mas

sempre marcando época , passo a passo com as mudanças na arte e na cultura de São Paulo,

do Brasil e do mundo.” (ALAMBERT; CANHETÊ, 2004, p. 12)

Ainda nas palavras destes autores, (Idem, p.13) nenhuma edição da Bienal passou sem

causar fervor, críticas, polêmicas e discussões e desta forma se estabeleceu como um

acontecimento único na cultura brasileira. “Olhar para a história da Bienal de São Paulo é

também caracterizar o estado da arte e a história do Brasil.”

A princípio Ciccilio Matarazzo, empresário e idealizador da Bienal de São Paulo,

inspirado na Bienal de Veneza, primava pela formação de um acervo de arte moderna no

Brasil. Com o tempo as Bienais passaram a atender interesses econômicos e políticos,

variando sua formatação principalmente pela ação dos curadores.

Mas é somente na história mais recente, nas duas décadas finais do século XX e no

início do século XXI que a ação curatorial torna-se crucial para o desenvolvimento das

mostras. Em meio a problemas administrativos, políticos, e boicotes, as curadorias a partir da

década de 80 deixaram suas assinaturas definitivas na maneira de se olhar a arte e se pensar a

Bienal.

4.2 CURADORIA OU AUTORIA?

De acordo com Laura de Castro (Os Museus e os Curadores, S/D) a ação curatorial

tem se tornado, importante ferramenta facilitadora de uma experiência estética, na relação arte

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e público, fazendo com que o espaço expositivo deixe de ser apenas um espaço de

armazenamento e cuidado de obras artísticas e passe a ser um espaço que propõem um nível

de experiência sensorial total, aproximando as relações do público com as possíveis

significações da Arte, nestes termos a curadoria passa a ser um instrumento mediador.

Para Marilúcia Bottallo, é a partir dos anos 80 que ganha destaque a figura do

chamado curador independente, e sobretudo durante os anos 90, torna-se o centro de muitos

debates de caráter ideológico e ético. (Bottallo, 2004, p. 41)

Ao contrario do que Castilho (2008, passim) afirma sobre a perda de identidade das

obras em exposições no âmbito internacional histórico, que visavam uma forma total, Bottalo

(2004) nos esclarece que no Brasil, a figura do curador independente, surge de forma

“auspiciosa” quando Walter Zanini aceita o convite para assumir a curadoria das Bienais de

São Paulo de 1981 e em sequência de 1983:

Zanini concebeu aquelas duas edições da Bienal a partir de analogias por linguagens, permitindo ao público vivenciar uma interpretação da arte contemporânea, onde as divisões geopolíticas foram suplantadas por territórios poéticos constituídos com profunda argúcia e sensibilidade. Esta transformação conceitual, no entanto, em nenhum momento colocou em segundo plano as obras de arte apresentadas.(BOTTALLO, 2004, p. 41)

Contudo, admite que o curador ao pretender criar vínculos entre as verdades

permanentes ou imanentes das obras de arte em função de um evento curatorial, assume uma

postura artística e cria linguagens próprias num processo tão particular que poderíamos

compará-lo ao processo de criação artística.

Assume, uma postura a-histórica, quebrando qualquer vínculo cronológico, para que

possam ser salientados os vínculos temáticos, sígnicos, ou criados pelo próprio curador. Não

seria este, um processo de apropriação? Ou ainda de sampleamento ao qual se refere Nicolas

Bourriaud em Pós Produção : como a arte reprograma o mundo contemporâneo (2009)?

O curador, concorda Bottalo (2004) com Castilho (2008), também assume uma

postura artística. “Dessa forma, o curador pretende o lugar do artista ao criar ‘teses’ artísticas

que defende com autoridade institucional, tanto para determinar valores pessoais como se

fossem princípios ou verdades soberanas ou ‘formais’, e, ao fazê-lo, retira do público a

capacidade de recriar conteúdos simbólicos.” (BOTTALO, 2004, p.43)

Talvez poderíamos considerar a própria teoria de Bourriaud, por ser ele também

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curador, um destes valores pessoais transformados e impostos ao público de maneira tirana,

como Bottallo coloca. Porém para este trabalho não entrarei na análise do discurso por este

vertente. O que nos importa é entender as relações da produção contemporânea com as ações

curatoriais ditas autorais.

“Nossa hipótese é de que a exposição se tornou a unidade de base a partir da qual é

possível pensar as relações entre a arte e a ideologia gerada pelas técnicas em detrimento da

obra individual.” (BOURRIAUD, 2009, p.100) Para Bourriaud é no contexto neomoderno

que a evolução da forma exposição passa de exposição-vitrine para exposição-cenário. Mais

especificamente ao citar a obra de Marcel Broodthaers, que em 1975, pinta a parede

expositiva de verde. Este seria o primeiro passo para o museu ter sua função estabelecida

como cenário a serviço do artista.

Esta relação de cenário também é fruto de um pensamento comparativo da

organização das exposições dos anos 1990 com o cinema. A exposição passa de uma

totalidade espacial a ser percorrida, para uma duração temporal a ser atravessada. O tempo

como principal linguagem do cinema é utilizado como peça fundamental para a formatação da

arte a partir dos anos 1990. Parafraseando Bourriaud, (2009, p.102) a exposição deixa de ser

um campo espacial percorrido pelo olhar, propõem ao contrário, percurso a ser experimentado

pela totalidade do expectador.

Voltemos as Bienais de São Paulo. A proposta de Zanini era organizar a montagem das

obras divididas por linguagens e não mais por áreas destinadas as delegações dos países

participantes. Zanini defendia demonstrar um sentido universal da Arte. Para tanto dividiu a

exposição em 3 núcleos, que davam conta de (1) obras representativas contemporâneas, (2)

obras que extrapolavam os meios tradicionais e (3) Arte postal e a Arte incomum.

Maria Alice Milliet defenderia a postura de Zanini na concepção dessa mostra como uma contribuição decisiva para a compreensão da arte contemporânea. Ao abandonar a divisão das obras por países e propor a montagem por analogia de linguagem, Zanini teria conseguido desgarrar-se “do modelo instituido pela Bienal de Veneza.” […] Esta concepção foi apoiada pelo crítico francês Pierre Restany, que viu nela um “marco histórico” e até mesmo “um modelo para ser seguido” por outras mostras internacionais. Assim segundo Maria Alice Milliet, a Bienal de São Paulo recuperou o prestígio, trazendo artistas importantes que há doze anos recusavam participar do certame.” ( ALLAMBERT; CANHÊTE, 2004, p. 162)

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A curadoria de Zanini, não seria portanto considerada ofensiva ou autoral, no sentido

de pormenorizar os valores individuais das obras, pela maioria dos críticos e artistas

participantes. Diferentemente da ação curatorial de Sheila Leirner na XVIII Bienal, que

ocorreu imediatamente após as duas edições consagradas de Walter Zanini ( 1981 e 1983).

A história então segue com “A Grande Tela” como ficou conhecida a montagem

“inovadora” de Sheila Leirner para a XVIII Bienal de São Paulo que recebeu como tema ou

título, Homem e Vida. Partiu de uma visão otimista da curadora em que declarava ser a “mais

universal de todas as Bienais” , por abolir as barreiras do tempo e do espaço. Este conceito de

universalização na década de noventa, seria conhecido como globalização. As pretensões da

exposição eram definidas pela autora da seguinte forma:

O objetivo é trazer ao público um novo conjunto de valores desenvolvidos a partir de problemas sociais, movimentos da mulher, importância da personalidade (vida, biologia, antropomorfismo), autobiografia, (onde persona, psique, condição humana e arte estão entrelaçadas de alguma forma), culto teatral e temporalidade. [..] um espaço virtual de vivência, experiência e compreensão didática da arte pelo público.( LEIRNER apud ALLAMBERT; CANHETÊ, 2004, p. 174)

Estes conceitos evidentemente se relacionam com a descrição anteriormente citada de

Estética Relacional de Nicolas Bourriaud, e com as tentativas de aproximação arte/vida. No

entanto o museu, ou espaço expositivo não funciona como cenário para valorização das obras

como sugere Bourriaud. Neste caso serviu talvez como suporte para uma “obra maior.”

O fato é que Sheila Leirner colocou em discussão a autoridade curatorial quando, à

serviço desta tentativa de “universalização” da arte dispôs as inúmeras pinturas características

da retomada a técnica dos anos 80 , dispostas em um grande corredor central, lado a lado com

apenas um palmo de distância umas das outras, proporcionando uma leitura coletiva e não

individual das obras, quase um instalação.

Sua postura autoral foi declarada abertamente em seu discurso curatorial, inclusive na

XIX Bienal, também de sua “autoria”, em que afirmava ser o curador um crítico colaborador

do artista, com o papel de ser agente mediador entre o mundo exterior e o interior, “entre a

vida cotidiana e a criação artística” ( LEIRNER apud ALLAMBERT; CANHETÊ, 2004, p.

179). Além disso ainda no caso da “Grande Tela”, Leirner organizou a mostra como uma nave

sacra, com um ambiente central onde encontravam-se as pinturas eleitas por ela e nos salões

laterais, as instalações. Claramente adotando uma postura crítica e privilegiadora em relação

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as pinturas.

Estas foram os dois grandes marcos curatorias, referências das Bienais de São Paulo,

para podermos compreender o processo que resultou nas curadorias atuais, como exemplo a

de Lisete Lagnado , objeto desta pesquisa, possibilitando identificarmos aproximações ou

divergências desta realidade brasileira com as teorias relacionais do crítico francês

contemporâneo Nicolas Bourriaud.

4.3 LISETTE LAGNADO : “COMO VIVER JUNTO?”

Fato é que as concepções relacionais, organizadas por Bourriaud, já estavam presentes

nas produções brasileiras desde o nosso neoconcretismo. Assim como nas vanguardas, da

história geral da arte internacional. Porém segundo Ana Letícia Fialho (2006) para o crítico

francês, haveria uma diferença significativa entre a produção dos anos 90 e a produção dos

anos 60. Fialho (2006) destaca o posicionamento de Lagnado, sobre as diferenças entre os

conceitos relacionais adotados por ela e os contidos na teoria de Bourriaud, em que estaria

Vista Parcial da XVIII Bienal de São Paulo

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pautada principalmente na aceitação da história prescindente a Estética Relacional.

Lisette Lagnado tem razão ao afirmar que a obra, o pensamento, a teoria inventiva de Hélio Oiticica, que serviu para conceber o projeto da 27ª Bienal, é fundamental para se pensar sobre troca e interatividade no campo das artes. No entanto, sublinhou Lagnado durante o seminário [Seminário Trocas11, 27º Bienal de São Paulo, 2006] que, no seu livro Esthétique Relationnelle, Bourriaud não cita Hélio Oiticica nem mesmo na bibliografia. Na verdade, o livro não possui uma bibliografia, e sim um índice remissivo de artistas e autores.(FIALHO, 2006)

Hélio Oiticica e Ligia Clark exploravam as relações arte e vida através de formas

interativas e dinâmicas que extrapolavam as concepções tradicionais da forma. Por isso a

convergência conceitual entre a teoria de Bourriaud e a curadoria de Lisete Lagnado, não

pode ser vista como uma mera aplicação prática das teorias do critico francês. Lagnado

considera, que o programa ambiental de Oiticica e seu sentido ético-social, “repercute hoje,

mais do que quando foi elaborado, nas práticas artísticas contemporâneas. Algumas idéias,

como a passagem do museu para o mundo, refletem o modo como as pessoas se organizariam

cotidianamente na esfera social” (LAGNADO apud: FIALHO, 2006)

Acredito que Lagnado, como sujeito de um mesmo mundo globalizado, tenha em suas

experiências estéticas, fatores próximos a que Bourriaud obteve. E mesmo sendo objetos de

histórias geograficamente distantes, partilham concepções relacionais convergentes.

Fialho(2006), acredita que a divergência entre Lagnado e Bourriaud sobre os

antecedentes de uma estética relacional, surgem na verdade em uma questão mais ampla, de

ordem geo-política, que é a compreensão da história da arte de forma geral.

A posição de Lagnado, ao defender a importância histórica da produção de Oiticica e a contemporaneidade de suas idéias, e a de Bourriaud, que não reconhece tal importância e que mal sabe pronunciar o nome do artista, são determinadas pelo contexto em que atuam. A “falha” no repertório de Bourriaud, ao não incluir Oiticica, é só mais um exemplo de que a história da arte e a teoria crítica escritas no eixo Estados Unidos - Europa ocidental, ainda nos anos 90, ignoravam em boa parte as investigações desenvolvidas fora do eixo por artistas originários das "zonas de silêncio” (FIALHO, 2006)

11 Trocas, organizado por Rosa Martinez (09-10/10/06), defende a idéia de intercâmbio como uma maneira mais otimista de relação entre as pessoas, e integra o conjunto de seis seminários que fazem parte do projeto educativo da 27ª Bienal de São Paulo. Estes seminários eram abertos ao público e visavam proporcionar um entendimento mais crítico e menos estético, de maneira acessível a todo o público.

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Esta colocação se torna importante para que possa prosseguir com a análise curatorial

de Lagnado, sem que o leitor conclua que a obra de Bourriaud interfere ou interferiu de

maneira direta nos acontecimentos artísticos contemporâneos, como Clement Greemberg e

sua “planaridade” em certa fatia da vanguarda moderna.

Pelo contrário, foi a partir da observação das produções contemporâneas que Nicolas

Bourriaud pode construir seu pensamento. E a partir do legado da arte brasileira

contemporânea, e os conceitos experimentalistas de Oiticica, que Lagnado concebeu sua

curadoria da 27ª Bienal de São Paulo.

O que procuro, são convergências, proximidades que possibilitem talvez, medir o

quanto os conceitos contemporâneos de arte podem estar unificados no sentido de partilharem

um mesmo propósito. E então, como exemplo, olhamos Borriaud e a Bienal de Lisete.

Em 2006 , Lisete Lagnado, curadora independente, é convidada para curar a 27°

edição da Bienal de São Paulo. Em seu texto de introdução do Guia desta Bienal, Lagnado,

inicia afirmando a novidade de sua proposta: “A 27a Bienal de São Paulo propõe uma

abordagem inovadora dentro da tradição da Fundação Bienal, excluindo as chamadas

representações nacionais, sem colocar-se sob a legislação da grande máquina geopolítica que

rege as decisões dos gabinetes culturais.”(LAGNADO, 2006a , p. 16)

Neste trecho notamos dois pontos interessantes. O que Lagnado chama de inovador na

história das Bienais, na verdade trata-se de um rompimento com a história recente da Bienal,

pois depois das curadorias de Walter Zanini e Sheila Leirner, que foram os pioneiros neste

tipo de “inovação”, houve uma tendência geral a retomada dos moldes tradicionais da mostra,

– divisão por países, premiações, etc. – mas não podemos afirmar que neste aspecto Lisete

Lagnado trouxe algo de “novo”.

O procedimento na verdade se assemelha a própria concepção da idéia de Estética

Relacional de Bourriaud, quando a define como uma linguagem de sampleamento.

( BOURRIAUD, 2009a , passim). Não obstante, percebemos, uma preocupação com a

ruptura, uma quebra neste contexto de inovação, especificamente com o macro-social, que ela

define como “máquina geopolítica que rege as decisões dos gabinetes culturais.”

Na matéria sobre a 27ª Bienal de São Paulo, da Revista Bravo!(2006, p. 26-33),

Fernando Oliva, destaca a abertura da Bienal com 118 artistas, seminários, ciclos de filmes,

lançamentos de livros e pólo de debates na periferia, o que confirma a grandiosidade do

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evento e o uso do conceito ambiental de Oiticica, expandindo temporal e territorialmente o

evento. Mas salienta que mesmo sendo umas das maiores exposições do mundo ( e a segunda

mais antiga depois da Bienal de Veneza), a Bienal de São Paulo, enfrentaria agora o desafio

de reinventar-se.

Numa cultura hipermoderna, nada mais coeso, já que sabemos que o inaugural já não

faz mais parte da nossa cultura, mas sim a novidade, que vem da idéia de novo mas que não

significa exatamente algo original. Esta mais para a idéia de recapagem, de inovação.

Este é também o embate encontrado na Teoria de Bourriaud. Pois define que a arte

relacional é algo “novo”, mas assume o uso das formas, citações, frequentemente

identificadas no modernismo, como ferramentas disponíveis para uso.(BOURRIAUD, 2009a,

passim). Para resolver este impasse, Bourriaud aproxima o estado da arte atual com a cultura

globalizada e os comportamentos resultantes da interação com as novas tecnologias, que

modificaram as relações de consumo e principalmente as relações interpessoais. Neste sentido

é que sua teoria recebe o nome de Relacional.

Como já dito antes, de acordo com esta teoria, o objeto de discussão da arte

contemporânea que permite se distanciar do modernismo é a enfase nas relações de trocas, de

tempo e espaço interpessoais, ou coletivas. Ao contrário do modernismo, europeu e norte-

americano, que mesmo havendo a preocupação com o espaço expositivo, as relações serviam

aos interesses dos objetos, das obras. Na arte a partir dos anos 1990, os artistas

compartilhariam de uma forma de sensibilidade voltada para a preocupação com seu entorno e

com seu público “Essa preocupação é muito próxima daquela proposta pela 27ª Bienal de São

Paulo, ‘Como viver junto’, e, não por acaso, alguns dos artistas citados por Bourriaud estavam

também presentes na Bienal.” (FIALHO, 2006)

Portanto a idéia de Lagnado se diverge também de Walter Zanini, pois o conceito

mesmo que semelhante tem outros fundamentos. Zanini tinha a preocupação com a ocupação

do espaço, numa estética da forma. Lagnado preocupa-se com a coletividade, num projeto que

se estende além das paredes expositivas e torna-se, de acordo com suas palavras, um “Evento

Propositor.” Contudo, Lagnado, assim como Bourriaud12, não nega a interferência moderna.

12 Ana Letícia Fialho (2006) considera que Bourriaud “faz muito pouca referência aos antecedentes de sua estética relacional. [...]o problema mais grave nas propostas de Bourriaud não se refere à estética que ele defende, mas à fragilidade de seus fundamentos teóricos. Existe no livro um certo eurocentrismo somado a uma ausência de perspectiva histórica, além de uma utilização superficial e utilitária de certos autores, como Marx, Deleuze e Guattari, Lyotard.”

O problema seria uma falta de referenciação e embasamento teórico histórico e não o desprezo total com o modernismo, mesmo que considere somente a história internacional.

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Para tanto cita Mario Pedrosa, quando afirma que “o Brasil é um país condenado ao

moderno.” Mas considera que no contexto desta Bienal , “moderno significa a reinvenção

permanente”.( LAGNADO, 2006a, p. 16)

As idéias de Lagnado, se aproximam de uma estética relacional principalmente na

maneira em que ela estrutura o evento Bienal. De acordo com o Professor Cauê Alves (2006,

p.16) para a revista Bien ´Art, a pergunta que mais se ouviu nos corredores da 27ª Bienal de

São Paulo, foi a tradicional: “Mas isto é arte?”

Para Cauê, esta questão, nesta Bienal, seja intensamente retomada pela escolha

curatorial de artistas que tendem a se distanciar da arte apenas como uma experiência estética.

O caminho perseguido por vários deles é o de tentar aproximar a arte do cotidiano e de questões explicitamente políticas.[...] Assim o “conteúdo” ou a mensagem, em geral com um jargão sociológico e politicamente correto, nesta bienal prevalece sobre a “forma”, ou melhor, sobre certa noção cristalizada de arte. (ALVES, 2006, p. 16)

Fica claro que no recorte curatorial estão presentes as concepções estéticas propostas

por Bourriaud, em que a estética contemporânea não esta intimamente ligada a forma , mas a

formações. Mas também é claro que só percebemos esta congruência, pela aproximação dos

conceitos de Oiticica e Roland Barthes, – fundamentais para um entendimento na relação Arte

e Vida, e utilizados por Lagnado, – com a percepção relacionada a arte dos anos 1990 de

Bourriaud. Não é por acaso, como já foi dito, que artistas citados como exemplos relacionais

em Bourriaud estão presentes com seus trabalhos na Bienal de Lagnado. Entre eles:

Domenique Gonzalez-Foster e Felix Gonzales-Torres.

Reconhecidas as proximidades, entre o pensamento de Lisette Lagnado e Nicolas

Bourriaud, temos que considerar seus aspectos históricos locais diferenciados.

Lisete Lagnado ( 2006a, p. 16) afirma que : “o conceito da 27ª Bienal, situa-se no

cruzamento de duas linhas de pensamento que estão na base do Programa Ambiental de Hélio

Oiticica : o sentido de 'construção', próprio da experiência neoconcreta brasileira, e um 'adeus

ao esteticismo'.” Ou seja a concepção brasileira de uma estética relacional estaria ligada a

nossa própria realidade histórica. Principalmente ao Neoconcretismo e as contribuições

estéticas de Hélio Oiticica desde a década de 1960.

Ao continuarmos a leitura do texto de Lagnado, presente no Guia da 27ª Bienal de São

Paulo, ela traduz sua concepção em duas linhas que ela denomina: Projetos Construtivos e

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Programas para a Vida. Lembramos então a descrição de Bourriaud para a nova forma da arte

relacional, em que são propostos realidades possíveis, ambientes de experimentações de

outras sociabilidades, e por que não “programas para a vida”.

A curadora Lisette Lagnado acredita que Hélio Oiticica é capaz de ser integrado ao universo conceitual de Barthes, visto que a obra de Oiticica atesta o vinculo indissociável entre vida e arte, convocando o espectador a sair de sua passividade e a interagir com a obra. Além disso, o seu conceito de “Projetos Construtivos” relaciona os vários aspectos de como as pessoas constroem o seu espaço social; e seu outro conceito “Programas para a vida”, fala de como as pessoas colocam em prática relações comunitárias. (ACIOLI e BOTELHO, 2006)

A 27° Bienal por si só poderia ser considerada uma “formação”, por ser um evento de

cunho cultural que promove relações de trocas e serve-se das diferentes propostas artísticas

contemporâneas, em boa parte interativas.

A 27 ° Bienal de São Paulo, é considerada um marco histórico, pela própria Fundação

Tomás Saraceno. Foto detalhe de sua obra interativa. 27ª Bienal de São Paulo, 2006

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Bienal. Em texto, Manoel Francisco Pires da Costa , presidente da Fundação Bienal ( 2006,

p.5), afirma que os resultados desta Bienal têm importância histórica por consolidar todos os

critérios adotados pela Fundação Bienal , que seriam:

• Arte contemporânea na busca de novos valores;

• Gratuidade com o objetivo de democratização e inclusão cultural;

• Tema abrangente e audacioso Como Viver Junto acoplado a

fundamentos sociopolíticos e propositivos;

• Projeto educativo trazendo a população da periferia e estudantes dos

ensinos fundamental e médio, ansiosos por conhecimento e orientados

previamente por professores das redes pública e privada.

( COSTA, 2006, p. 5)

O Projeto educativo demostrou na prática a preocupação em aproximar a realidade da

Bienal – a arte – da população em geral. Mas a escolha do tema expressou sem dúvida toda a

problemática desta edição.

Como Viver Junto , segundo Lisete Lagnado é um tema emprestado dos cursos e

seminários de Roland Barthes no Collége de France ( 1976 -77). Barthes ( apud OLIVA,

2006, p.33) abriu o curso com a seguinte fala, “Desejamos explorar um imaginário particular:

não todas as formas do viver-junto (sociedades, famílias, casais), mas principalmente o viver-

junto de grupos muito restritos, nos quais a coabitação não exclui a liberdade individual.”

Talvez com esta citação somente, desse conta de responder a problemática desta pesquisa, em

que busco aproximações entre uma estética relacional e o discurso de Lisette Lagnado.

A grande diferença curatorial de Lagnado foi permitir que a ação curatorial desse

conta de um todo maior, que é o “Evento Propositor”, como ela denomina. Onde fazem parte

eventos educativos, culturais, musicais, sociais, mostras cinematográficas, residências

artísticas, que caracterizam a multiplicidade global a serviço de uma unidade, que é a Bienal.

Porém sem se renderem a um estética padronizada. Estavam todos estes eventos, obras,

formatações, contidos em uma forma maior. No entanto cada um dono de seu próprio espaço

ambiental, de sua própria realidade provisória.

Tomo como exemplo a obra de Tomas Hirschhorn, uma instalação penetrável e ao

mesmo tempo isolada, com seguranças que alertavam para o conteúdo forte13. Mesmo assim 13 Experiência pessoal:Fato ocorrido quando eu, visitando a Bienal de São Paulo em 2006, ao me

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durante toda a Bienal se formavam filas para poder visitar a obra. Entrar ou não era uma

escolha.

O expectador, ou o público que se propôs participar deste grande evento, a 27ª Bienal

de São Paulo, pode ter suas escolhas. Criou seu próprio roteiro, foi dono de sua experiência

propondo trocas a medida de seus interesses. Este aspecto que não é descrito através de uma

forma, e sim de um contexto, que é o que torna possível considerarmos a 27ª Bienal de São

Paulo, Como Viver Junto , um exemplo pontual da Estética Relacional resultante da sociedade

contemporânea globalizada.

Os conceitos de coexistências e coabitações, tão citadas por Bourriaud contemplam

posicionar na fila para poder entrar na obra de Hirchhorn – na ocasião estava grávida – , fui alertada pelo segurança que a obra continha cenas fortes de violência. É que junto com toda a instalação de ferramentas e livros de filosofia, fotografias de pessoas mutiladas e mortas de maneira brutal, pela barbárie das Guerras e atentados, dialogavam com todo o contexto da instalação e davam sentido as formas.

Detalhe da instalação Restore Now, de Thomas Hirschhorn, na 27ª Bienal de São Paulo, 2006 e foto do exterior da obra no canto inferior direito.

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todo o trabalho de Lagnado. A curadora parece querer ao mesmo tempo quebrar com a força

tradicionalista da organização por representações nacionais, dando mais autonomia a mostra ,

e sair de cena, para dar o primeiro plano para a exposição.

Autonomia parece ser a palavra chave, e ao mesmo tempo o segredo para que os

diferentes organismos possam sobreviver coabitando o mesmo espaço. Lagnado assume um

papel autoral que podemos aproximar da figura do artista contemporâneo quando divide ou

fragmenta seu trabalho com outros curadores e cria núcleos de interesses para atender

diferentes áreas do evento.

Esta bienal se desdobra em seis: os seminários que tiveram início em janeiro e se estendem até novembro, a Quinzena de Filmes; as obras de dez artistas residentes, resultado de suas vivências no país; os pólos de discussão e palestras localizados em cinco pontos diferentes da periferia paulistana; as quatro publicações “livros de arte”; e por fim os trabalhos de artistas de todo o mundo, expostos no pavilhão. (OLIVA, In.: Bravo, 2006, p.32)

Em sua equipe Lisete contou não somente com outros curadores, mas com uma equipe

multidisciplinar, composta por educadores, psicanalistas, cientistas-políticos, antropologistas

e historiadores de arte. ( ALCIOLI; BOTELHO, 2006) A própria ação curatorial neste sentido

ganha ares relacionais. Destaque para a proposta das residências artísticas internacionais, em

que dez artistas de diferentes países, puseram em confronto suas experiências pessoais com a

cultura brasileira. Estreitando as barreiras geopolíticas, não somente nos termos expositivos,

mas também nos processos de criação.

Outro ponto forte do evento, é a valorização de projetos artísticos que trabalham

concomitantemente a comunidade em que estão inseridos, como o JAMAC14 ( Jardim Mirian

Arte Clube). “Operar na dimensão social e dar um resposta pública aos acontecimentos

políticos são características das práticas artísticas contemporâneas.”(LAGNADO, 2006a,

p.16) E para Bourriaud,“um clube, uma escola ou uma rua não são lugares melhores, são

14 Jardim Miriam Arte Clube: “misto de ateliê coletivo, escola, oficina de estamparia e minibiblioteca integrados em um único, limpo, claro e amplo galpão – há um cartaz com a foto e uma frase de Maratma Gandhi: ' Nos devemos ser a mudança que queremos ver no mudo'” ( MORAES, 2006, p. 40) O JAMAC foi fundado em 2003 por Mônica Nador, no Jardim Miriam , Periferia de São Paulo. Participou da 27ª Bienal de São Paulo com obras no pavilhão de exposições, intervenções na Galeria Vermelho (SP) e como núcleo de debates e ações artísticas da zona leste, onde Jarbas Lopes promoveu um Happening em que convidava artistas brasileiros a interagirem com a comunidade. ( MORAES, 2006, p. 40)

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simplesmente outros lugares para mostrar a arte.” ( BOURRIAUD, 2009 a , p. 83) Bourriaud

considera não existir mais um lugar certo para o acontecimento arte, visto sua consideração

sobre a estética das relações possíveis e interpessoais, qualquer lugar torna-se um ambiente de

trocas possíveis.

O que costuma chamar “realidade” é uma montagem . Mas a montagem em que vivemos será a única possível? A partir do mesmo material ( o cotidiano), pode-se criar diferentes versões da realidade. Assim, a arte contemporânea apresenta-se como uma mesa de montagem alternativa que perturba, reorganiza ou insere as formas sociais em enredos originais. O artista desprograma para reprogramar, sugerindo que existem outros usos possíveis das técnicas e ferramentas à nossa disposição. ( BOURRIAUD, 2009 a , p. 83-84)

Considerando todos estes aspectos podemos listar em que termos a ação curatorial de

Lisete, entra em convergência com o discurso da teoria Estética Relacional de Nicolas

Bourriaud.

Em primeiro lugar encontramos o principal vértice da proposta relacional que é a

alteração do sensível embasado em discussões políticas, sociais, comunitárias e sobretudo

interpessoais. Promovendo linhas de fuga individuais ou coletivas. Respostas ao estado atual

Duas fotos da “Casa da Andrea”. Arquivo Pessoal de Mônica Nador ( JAMAC)

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da modernidade por ações colaborativas e transdisciplinares, incitando a relação arte-

sociedade-comunicação, como já foi antes esclarecido por Fabrini (2010) e Bourriaud (2009).

As obras de Thomas Hirchhorn; da sul africana Jane Alexander; e do esloveno Tadej

Pogacar, que escolheu o trabalho da grife Daspu ( núcleo de produção de moda coordenada

pela ONG Dadiva), em que organizou um desfile protagonizado por mulheres, auto

declaradas prostitutas, e ligadas a instituição; atendem a estas considerações de maneiras

diferentes.

O forte teor político, de muitos trabalhos encontrados no pavilhão da Bienal de 2006,

podem ser, como Ricardo Fabrini ( 2010) ao analisar o discurso de Bourriaud (2009) define,

uma reação a nossa hipermodernidade. De acordo com Oliva, (2006, p. 30) correspondem, a

realidade recentemente vivida da queda das torres gêmeas(11 de setembro de 2001), conflitos

e atentados.

Maria Galindo. Detalhe da sala de exposição de suas fotografias. 27ª Bienal de São Paulo, 2006

Jane Alexander. Foto da obra baseada nos genocídios africanos. 27ª Bienal de São Paulo, 2006.

Guy Tillim . Série Leopold e Mobutu. Fotografia. 27ª Bienal de São Paulo, 2006.

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Ainda podem se relacionar as denúncias políticas e sociais, Guy Tillim, sul-africana,

que retrata o impacto social da herança colonial do Congo; Maria Galindo, boliviana, com

suas fotografias recuperadas do início do século 20 de índios e índias condenados a prisão; e

Mario Navarro, argentino, com seus painéis murais a carvão, de cenas protagonizadas por

Opalas, carro-símbolo das ações policiais do governo militar de Augusto Pinochet.

Outros trabalhos ainda vinculam-se a cultura do consumo , como no vídeo de Minerva

Cuevas, que se apropria do personagem Ronald Mc Donalds, da rede de fast food símbolo do

capitalismo, e promove intervenções na frente das lanchonetes com a satirização do

personagem e a abordagem de consumidores sendo alertados sobre o consumo do produto, a

interferência na agricultura, e as condições de trabalho dos funcionários.

Mario Navarro. Opala. Detalhe do Painel , desenho a carvão/ Instalação. 27ªBienal de São Paulo, 2006

Minerva Cuervas. Imagem do Vídeo apresentado a 27ª Bienal de São Paulo, 2006.

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O lugar de interação entre obra e público, considerados como características

recorrentes nas obras relacionais estão presentes tanto na concepção do evento, em sua

gratuidade, nas ações educativas e sociais, o que presume que a mostra depende da

participação do público. Mas também está nitidamente presente na escolha de artistas como

Tomas Saraceno, Laura Lima e Antoni Miranda, que propõem obras intensamente interativas.

Outros fatores como, o espaço-tempo como linguagem, o expectador como um

consumidor cultural, e o encontro fortuito, fazem parte tanto das obras isoladas, mas também

de toda a concepção da Bienal, que extrapola estas novas possibilidades de interação, com o

público, indicando percursos, permitindo trocas, ampliando seu espaço (levando o evento para

fora do pavilhão, ganhando a cidade) e tempo ( considerando o começo dos seminários, esta

Bienal se estendeu de janeiro a dezembro de 2006, algo inédito).

Todas estas práticas artísticas, embora muito heterogêneas em termos formais, compartilham o fato de recorrer a formas já produzidas. Elas mostram uma vontade de inscrever a obra de arte numa rede de signos e significações, em vez de considerá-la como forma autônoma ou original. Não se trata mais de fazer tábula rasa ou de criar a partir de um material virgem, e sim de encontrar um modo de inserção nos inúmeros fluxos da produção. […] A pergunta artística não é mais : “O que fazer de novidade?” e sim : “O que fazer com isso?” (BOURRIAUD, 2009a, p. 12-13)

Para Lagnado a prática do Como Viver Junto, permitiu uma curadoria inovadora, que

ao mesmo tempo deixa sua marca autoral transformando o evento em algo maior, em uma

totalidade, sem que as barreiras individuais sejam quebradas.

Laura Lima vestida com sua obra. 27ª Bienal de São Paulo, 2006

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Tratando da questão do espaço, além da Bienal ampliar sua extensão rompendo com a

formalidade do espaço expositivo, procurando aproximar o público em geral, numa busca

principalmente em acabar com a elitização da arte, e com a exclusão social do conhecimento,

o espaço também foi trabalhado em questões que discutiam as relações entre arte e

arquitetura. Fialho (2006), ao relatar a palestra proferida por Bourriaud no Seminário Trocas,

pertencente ao programa da Bienal, destaca esta relação considerada por Bourriaud, como um

dos principais nortes da arte relacional. Este pensamento estaria intimamente ligado ao

sistema de reaproveitamento das formas: “É preciso recusar a natureza das coisas, a idéia de

que não há nada a ser mudado. A estética relacional recusa essa idéia de não mudar a natureza

das coisas. Ao mesmo tempo, há a idéia de que podemos usar o mundo, (reaproveitar) as

formas que estão disponíveis no mundo.” (BOURRIAUD , apud: FIALHO, 2006)

Isto também nos leva a pensar sobre as questões políticas. Fialho (2006), afirma que

Bourriaud frequentemente é acusado pela crítica, por supostamente, sua Estética Relacional

propôr uma “despolitização” da arte. Porém, “para ele, há um valor político na estética

relacional que deriva de dois fatores basicamente: 1) A realidade social é produto de

negociações; 2) A democracia é, ela mesma, uma combinação de formas”. (FIALHO , 2006)

Bourriaud, apoia-se principalmente nas questões políticas relacionadas a forma, o que

me faz lembrar de outro artista escalado para esta Bienal que trabalha as questões urbanas de

espaço. Marcelo Cidade, em sua entrevista para o Guia da Bienal (FUNDAÇÃO BIENAL DE

SÃO PAULO, 2006, p.152), afirma que para ele o importante é deixar claro que, “qualquer

discussão sobre o espaço, é sempre uma discussão política”.

Para Ana Letícia Fialho, uma das questões mais interessantes da produção de

Bourriaud, é a aplicação do seu conceito de estética relacional ao campo institucional. E é

neste sentido que percebemos a maioria das aproximações e possíveis utilizações da teoria da

Estética Relacional.

Foi à frente do Palais de Tokyo, em Paris, que ele desenvolveu, na prática e de forma mais clara, alguns dos temas centrais de sua estética relacional: interatividade, recuperação, reapropriação, reciclagem, precariedade, relação entre arquitetura e novas formas de sociabilidade.[...] Mais do que um espaço expositivo, o museu, ou laboratório, como prefere Bourriaud, se consolidou como um lugar de encontros, trocas, discussões, controvérsias, enfim, um lugar extremamente vivo e estimulante. sugere uma “estética do efêmero”, recusando a “sacralização” do espaço e o distanciamento do público; o funcionamento em horários alternativos (até a meia noite); ingressos a preços muito

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abaixo da média dos museus; gratuidade para estudantes de arte e artistas; o funcionamento de um café-lounge também com preços muito abaixo dos praticados em outros museus; um programa internacional de residência para artistas; um programa de exposições de escalas diversas (recusa a espetacularização); valorização das relações de proximidade através de um bom programa de mediação, etc. [...]No contexto da insípida cena contemporânea francesa, o Palais de Tokyo se estabeleceu como espaço singular, capaz de provocar uma nova dinâmica no âmbito nacional e reposicionar a França na competitiva cena contemporânea internacional. (FIALHO, 2006)

Estas posturas geraram um grande sucesso de público para o Palais de Tokyo. E até

hoje, mesmo Bourriaud e Jerôme Sens tendo deixado sua direção, estes fatores continuam

contribuindo para que a estética relacional se consolide como um conceito interessante para se

pensar a arte contemporânea, sobretudo no plano institucional. ( FIALHO , 2006)

Lagnado talvez, tenha implantado ao menos um pouco desta visão diferenciada do

papel Institucional da Arte no Brasil. As aproximações aqui sugeridas entre Bourriaud e

Lagnado, tem apenas o intuito de se fazer pensar em um possível papel da arte em nossa

sociedade, e a responsabilidade atribuída ao artista e ao curador.

“Como viver junto é também saber dosar uma justa distância com o outro”

(LAGNADO, 2006 , p.5). Lagnado criou um grande arquipélogo, termo que empresto de

Agnaldo Farias, quando procura entender a arte contemporânea, na Introdução do seu livro

Arte Brasileira Hoje (2002). Arquipélogo porque parte da idéia da valorização das

individualidades. “Um arquipélogo porque cada obra engendra uma ilha, com topografia,

atmosfera e vegetação particulares, eventualmente semelhante a outra ilha, mas sem

confundir-se com ela. Percorrê-la com cuidado equivale a vivenciá-la, perceber o que só ela

oferece.”( FARIAS, 2002, p.20)

Este talvez tenha sido o grande trunfo de Lisete Lagnado para com a arte

contemporânea, a Bienal de São Paulo e o panorama cultural nacional. Sua contribuição na

história das Bienais talvez ainda não seja totalmente visível, mas ao olharmos para as edições

posteriores, de Ivo Mesquita em 2008 com o tema Em Vivo Contato, conhecida também como

a “Bienal do Vazio”, e para a edição atual de Agnaldo Farias e Moacir dos Anjos (2010) que

traz o tema Há sempre um copo de mar para um homem navegar, podem demonstrar certas

reações e/ou continuidades do projeto Como viver Junto de 2006.

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5 CONCLUSÃO

Em uma contemporaneidade que passou por períodos anti estéticos, carentes de

parâmetros críticos, percebemos em Nicolas Bourriaud uma preocupação em organizar um

novo paradigma possível para a arte resultante do nosso tempo.

Muitas foram as vezes que se falou em uma Morte da Arte, como vimos em Peter

Bürger e Gianni Vattimo, porém o que posso perceber é que a arte nunca esteve tão viva e

institucionalizada. O que parecia inviável, em concepções tradicionais e elitizadas da arte,

agora parece ser um dos caminhos mais prováveis de seu desenvolvimento. A aproximação da

arte com a vida já esta consumada, e isto não acabou com seu status, ou sua relevância para a

sociedade, nem a afastou da instituição. Por ser um organismo fruto de sua própria

historicidade a arte se adaptou e continua a ocupar seu espaço estético ou sensível também na

hipermodernidade. A condição relacional da arte, é sem dúvida um dos sintomas da arte

contemporânea, mas não podemos tomá-lo como único. Aliás, é na pluralidade de

possibilidades que as relações são possíveis e vetar qualquer outro entendimento estético

corresponderia a dar passos para trás.

Lisete Lagnado sem dúvida realizou um dos marcos curatoriais na Bienal de São

Paulo. A repercussão de seu trabalho, vinculada a herança poética de Hélio Oiticica talvez

ainda não seja perceptível, por ser uma história recente, mas com certeza as edições que

sucederam-na : Em vivo Contato , de Ivo Mesquita (2008) e Há sempre um copo de mar para

um homem navegar, de Agnaldo Farias e Moacir dos Anjos (2010), já demonstraram uma

certa resposta ou continuidade a proposta de 2006 de Lisete Lagnado.

A proposta relacional em Lisete Lagnado é evidente, mas o relacional faz parte da

história da arte brasileira e até mesmo da nossa cultura. Afirmar que esta idéia foi

desenvolvida somente no contexto da arte dos anos 1990, da Europa Ocidental e dos Estados

Unidos, em que Nicolas Bourriaud se apoia, é desconsiderar as contribuições de Hélio

Oiticica, é desapropriar a validade e a autonomia da arte brasileira num contexto global.

Temos nossa história, e esta história faz parte de um aldeia global sintonizada.

Por outro lado a obra de Nicolas Bourriaud estruturou de maneira organizada, os

conceitos relevantes que servem como base para uma análise de boa parte dos eventos

contemporâneos em arte.

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O que podemos concluir de fato é que os conceitos relacionais aplicados ao contexto

das mega exposições, contribuem para pensarmos de maneira mais ampla a instituição arte, e

de que forma ela deve se posicionar na sociedade.

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