DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL · A concepção reprodutivista não apresentava...
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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
INSTITUTO DE PESQUISAS SÓCIO PEDAGÓGICAS
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
RENOVANDO PARADIGMAS NO PROCESSO ENSINO-
APRENDIZAGEM
Por: Alciléa Ribeiro Pessôa
Orientador:
Prof. Ms. Marco A. Larosa
Rio de Janeiro
2002
DOCUMENTO PROTEGID
O PELA
LEI D
E DIR
EITO AUTORAL
II
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
INSTITUTO DE PESQUISAS SÓCIO-PEDAGÓGICAS
PÓS- GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
RENOVANDO PARADIGMAS NO PROCESSO ENSINO
APRENDIZAGEM
Apresentação de monografia ao conjunto
Universitário Cândido Mendes como condição
prévia para a conclusão do curso de pós-
graduação “lato sensu” em Administração
Escolar.
Por: Alciléa Ribeiro Pessôa
III
AGRADECIMENTOS
... a Deus, fonte de motivação para realização
deste trabalho, a meu pai, que, se entre nós,
gostaria de ser o primeiro a ler estas páginas, a
minha mãe pelo referencial de caráter e
dedicação, a meu querido esposo e adoráveis
filhas pelo incentivo e compreensão a mim
dispensados ...
IV
DEDICATÓRIA
... dedico este trabalho a todos os educadores
que não se acomodam à sombra da
mediocridade Pedagógica, que não se cansam
de aprender e, acima de tudo, sonham com
uma escola que tenha como prioridade, formar
cidadãos que saibam dar respostas às diversas
situações que ao longo da vida, a eles se
apresentem ...
V
RESUMO
Por várias vezes, questões ligadas à crise vivida no dia-a-dia escolar onde
se repete uma visão limitada do que realmente deve ser o papel da escola, têm norteado
discussões entre comunidades escolares de maneira geral, levando-nos a refletir sobre a
importância de se renovar paradigmas, repensar estratégias e promover mudanças
eficazes no que diz respeito ao fazer pedagógico. Ao observar e muitas vezes vivenciar
questões que são longamente discutidas em reuniões, cursos, seminários, porém pouco
experimentadas em sala de aula, fez-nos refletir, neste trabalho, algumas indagações:
Como a escola pode acompanhar as mudanças e transformações vividas pela pós-
modernidade? O que fazer para despertar o interesse pela Leitura em alunos que vivem
“antenados” e sabem tudo sobre a tecnologia e os computadores? Como a escola pode
contribuir para que este aluno faça-se cidadão capaz de interagir na sociedade? Que
saber a escola socializa e a serviço de quem está este saber? Tentando responder ou
apenas contribuindo para a reflexão, o conteúdo dos capítulos tem por objetivo
promover um visão histórica sobre antigos paradigmas educacionais, passando pelos
motivos que levaram a novas posturas na Educação, e finalmente, após análise de
alguns importantes tópicos da Lei de Diretrizes e Bases e do PCN, lançaremos
sugestões de propostas de mudanças a partir de trabalhos com projetos.
VI
METODOLOGIA
Os métodos que levaram à resposta do problema proposto- novos
paradigmas educacionais foram efetivados pelas pesquisas quotidianas, onde vivenciou-
se a urgência da adequação da teoria X prática, a observação do exercício de antigos
Paradigmas no fazer pedagógico e a análise bibliográfica sobre o assunto.
VII
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................. 08
CAPÍTULO I - REFLEXÕES SOBRE ALGUNS IMPORTANTESPARADIGMAS EDUCACIONAIS BRASILEIROS ......................................... 10
CAPÍTULO II - CONCEITOS E MOTIVOS QUE LEVARAM A NOVOSPARADIGMAS .................................................................................................. 152.1 Por que mudar? Os novos paradigmas e a Pós Modernidade ....................... 16
CAPÍTULO III - ILUMINANDO A PRÁTICA COM A TEORIA ................... 18
CAPÍTULO IV - ALTERNATIVAS DE AÇÃO PARA O FAZERPEDAGÓGICO ...................................................................................................................... 214.1 Trabalho com Projetos: um novo olhar sobre a escola ................................. 34
CONCLUSÃO ........................................................................................................................ 38
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ................................................................................. 39
BIBLIOGRAFIA CITADA ................................................................................................ 40
ANEXOS ............................................................................................................ 41
8
INTRODUÇÃO
Retomando historicamente as concepções de educação, vimos que, ao
longo dos anos, as finalidades da Educação sofreram mudanças, assumiram posturas
(nem sempre eficazes) no desejo de alcançar uma educação de qualidade.
Segundo Maria José Vale Ferreira, em seu livro concepções de Educação
(MOVA-SP), ao traçar um quadro comparativo das características centrais das posturas
e tendências educacionais, revelou-nos o perfil da Educação ao longo dos séculos.
Tendo como indicador a origem histórica, a concepção tradicional, teve
por objetivo “corrigir” a natureza corrompida do homem e ligá-lo ao “mundo superior”,
por acreditar ser o homem um ser originalmente corrompido. Zela-se, portanto, por uma
relação de obediência para com o professor, a comunicação direta é reduzida,
predomina a cultura do saber consagrado, conteúdos prontos, prêmio e castigo. O aluno
apenas repete, e aplica informações gerais em situações particulares.
Passando pelo Renascimento (século XV-XVI) encontramos uma
concepção de educação em reação à concepção Tradicional: a liberal, que possibilitou
condições para o uso pleno das potencialidades pessoais, algo parecido com o que se
propõe hoje. As experiências, interesses e necessidades eram então valorizadas.
Na metade do século XX (1950) , em meio ao avanço dos modelos
empresariais, surge a concepção Tecnicista, que tinha como paradigma, modificar e
modelar o comportamento do homem; a educação era adaptação do homem à sociedade,
assim, incorrendo em um erro: preocupava-se em ensinar a reproduzir métodos e
técnicas sem explicar o porquê e o para quê.
Revivendo o método dialético de Sócrates e fundamentando o Projeto
Pedagógico da classe trabalhadora, surge, no século XIX, a concepção Dialética que
objetiva a formação e capacitação, a apropriação das capacidades de organização e
direção. Neste contexto, o homem é sujeito, agente do processo histórico.
9
Vale dizer, diante do exposto acima, que a busca por educação de
qualidade e por novos paradigmas não é nova. O que se busca então?
Que modelo de escola queremos?
A grande questão está no exercício da cidadania. Esta seria a finalidade
de mais relevância para a escola hoje, haja vista a urgência do novo milênio, marcado
pela competição e pela excelência, em que progressos científicos e avanços tecnológicos
definem exigências novas para os jovens.
Assim sendo, o que pretendemos? Refletir sobre o novo papel da Escola,
seus paradigmas, as formas pelas quais as diversas tendências expressam práticas e
concepções. Admitimos de antemão o não esgotamento do assunto, mas esperamos abrir
discussões e apontar alguns caminhos que levam à reflexão sobre propostas de
renovação já estabelecidas pelos instrumentos legais (L.D.B/P.C.N).
10
CAPÍTULO I
REFLEXÃO SOBRE ALGUNS IMPORTANTES
PARADIGMAS EDUCACIONAIS BRASILEIROS
“O senhor... Mire veja: o mais importante e bonito do mundo, éisto que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foramterminadas- mas que elas vão sempre mudando. Afinam oudesafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso queme alegra, montão”.
Grande Sertão: Veredas - Guimarães Rosa
(Personagem Riobaldo)
Neste capítulo, pretendemos refletir sobre alguns pensamentos
pedagógicos brasileiros, tendo como ponto de partida, antigos Paradigmas
Educacionais, com a finalidade de elucidar ainda mais as perspectivas com relação à
novas propostas, já apontadas pelos parâmetros curriculares Nacionais.
Objetivando uma visão mais clara sobre a função da escola através dos
anos, tomamos como base a concepção de Carlos Cipriano Luckesi,1 em seu livro
Filosofia da Educação, onde sintetiza as principais características das funções Sociais da
Educação:
Redentora
Reprodutora
Transformadora
1 LUCKESI, Carlos Cipriano. Filosofia da Educação. S. Paulo: Cortez, 1991, p. 42-51.
11
Com o advento do Iluminismo trazido da Europa por intelectuais,
positivistas, liberais, a teoria brasileira começa a galgar novos degraus que, até então
eram suplantados pelo pensamento pedagógico dos Jesuítas que pregava um ensino de
caráter memorístico, repetitivo, estimulando a competição através de prêmios e castigos.
Era uma educação que favorecia mais à classe de Intelectuais e doutores.
A Educação tradicional guiava-se pela certeza de que o ato educativo
destinava-se a reproduzir os valores e a cultura da sociedade.
A figura do professor sente contexto, era de ser o centro de decisão do
processo educativo. É o homem sábio e virtuoso, seu saber é reconhecido e sua
autoridade garantida. Nas relações interpessoais, prevalece a obediência ao mestre. Há
incentivo à competição entre alunos e a comunicação é reduzida devido à disposição
dos alunos na sala de aula.
A concepção tradicional estaria, segundo Luckesi, caracterizada pela
função Redentora por tratar-se de uma visão conservadora de educação, uma vez que
sua função é entendida como a de redimir as possíveis mazelas da sociedade, ajustando
os sujeitos ao previamente estabelecido, sem cogitar de uma possível mudança na
estrutura social que visasse à superação das desigualdades existentes entre os homens.
A concepção liberal surgida no Renascimento, contrasta com o
pensamento Tradicional. Culminando com a emergência da “Escola Nova”, que
apareceu com vigor na obra de Rosseau, desenvolveu-se nesses dois séculos (XV-XVI)
e trouxe numerosas conquistas, sobretudo nas ciências da educação e nas metodologias
de ensino. As técnicas de Freinet, por exemplo, são aquisições definitivas.
O conceito de homem da educação liberal é que o homem é naturalmente
bom, mas pode ser corrompido na vida social, indivíduo capaz de decidir por si mesmo.
O ideal de homem é que ele seja livre, expontâneo, de iniciativa, criativo, auto
determinado, responsável e emprendedor – auto- realizado.
A visão do professor nesta concepção é de um profissional facilitador do
desenvolvimento do aluno. Suas atividades são medidas pela compreensão, empatia,
carinho, atenção, aceitação, autenticidade e confiança.
Segundo Moacir Gadotti, o pensamento pedagógico liberal contou com
grandes contribuições no Brasil. Entre elas as de Roque Spencer Maciel de Barros, João
Eduardo R. Villalobos, Antônio de Almeida Junior, etc...
12
Os tradicionais e os liberais representam grupos diferentes, correntes
históricas opostas, porém não antagônicas. Apesar de a Escola Liberal apresentar
características da visão transformadora, pode-se apontar pontos em comum.
Representavam apenas facções da classe dominante e portanto não questionavam o
sistema econômico que dava origem aos privilégios e à falta de uma escola para o povo.
A mudança apregoada pelos dois grupos estava muito mais preocupada com métodos
do que no real sentido da educação.
Caracterizada pela função reprodutora da Educação, surge a visão
Tecnicista que teve como origem histórica os modelos empresariais.
O conceito de homem nesta concepção é de um ser condicionado pelo
meio –físico-social. O ideal de homem é aquele ser que consegue ser produtivo e se
adapta à sociedade.
No que se refere à Educação, luta por modelar ou ajustar o
comportamento do indivíduo para que ele se adapte à sociedade sem questionamentos.
O papel do professor neste paradigma é administrar as condições de
Transmissão da matéria, conforme um sistema instrucional eficiente e efetivo em termos
de resultados de aprendizagem. A relação professor X aluno visa à valorização da
hierarquia, a ordem, a impessoalidade, às normas fixas e precisas, o pensamento
convergente, a uniformidade, a harmonia.
Quanto ao conteúdo ministrado, supervaloriza-se o conhecimento
técnico, enfatizava-se o saber pronto proveniente dos países desenvolvidos. Por estes
motivos, apresenta-se um ideal de educação Reprodutora, por ser marcada por um
grande pessimismo, não vislumbrando para si, outras alternativas, senão a sua
subordinação aos condicionantes da sociedade. A análise reprodutivista da educação foi
feita por teóricos, entre eles Baudelot e Establet, Bourdier e Passerron e ainda Althusser.
A concepção reprodutivista não apresentava nenhuma proposta
pedagógica, limitando-se a criticar a escola, por outro lado, a visão transformadora da
Educação entende que a Escola pode interagir e contribuir muito mais para a
democratização da sociedade.
A última concepção a ser analisada é a concepção dialética da Educação,
onde o conceito de homem é de sujeito, agente do processo histórico. Tem como ideal
de homem aquele compromissado com as tarefas do seu tempo, que participa do projeto
13
de construção de uma nova realidade social. O homem total que usufrui plenamente dos
bens materiais.
A educação dialética é processo de formação e capacitação, de
apropriação das capacidades de organização e direção para intervir de modo criativo e
consciente na transformação estrutural da sociedade.
A figura do professor é o de mediador do diálogo do aluno com o
conhecimento.
A direção do trabalho pedagógico é proposta com clareza, pelo professor.
Este ideal de educação, valoriza a afetividade no encontro interpessoal
sem a chantagem ou exploração do afetivo. O amor deve aliar-se à competência
profissional, iluminada por um compromisso ético político claro.
O conteúdo valoriza o conhecimento, o lúdico, a apropriação crítica e
sistemática de teorias, de técnicas profissionais, de ler, contar e escrever. Apresenta o
mundo como uma realidade em constante transformação, enfatizando a contradição no
interior de tudo que existe. A disciplina é construída coletivamente com seriedade e
esforço.
Pelo que foi analisado anteriormente, a concepção dialética tem
características da função transformadora por ser crítica, consciente das suas
possibilidades e limitações e exercer o papel de mediador do conhecimento.
A exposição acima, leva-nos à refletir na importância de termos como
modelo de educação, aquela que reflete o que se vive. O que educação de um modo
geral propõe hoje, é fornecer ao homem uma visão fragmentada de mundo e dele
mesmo. Esta fragmentação do saber não lhe permite agir conscientemente para a
transformação da realidade, pois só percebendo a totalidade é que conseguimos ter
consciência a respeito de algo.
A capacidade de modificar a realidade caracteriza explicitamente a idéia
de transformação e portanto a concepção dialética da Educação.
Quando a formação integral dos educandos não é uma preocupação da
escola, deixa-se de enfatizar as relações interpessoais, a solidariedade universal. É
lamentável ver os alunos entrarem na escola, e ao término do curso, saírem sem
perspectivas, sonhos e o que é pior, sem encontrarem o caminho do respeito a si próprio
e aos outros. É preciso, portanto, que a transformação de Paradigmas ocorra, antes de
14
mais nada, nos próprios educadores. A educação tem um grande desafio no que se refere
à transformação individual.
“A história nos faz, refaz e é feita por nós continuamente” (Paulo Freire).
15
CAPÍTULO II
CONCEITOS E MOTIVOS QUE LEVARAM A NOVOS
PARADIGMAS
“Na vida o olhar da opinião, o contraste dos interesses, a lutadas cobiças obrigam a gente a calar os trapos velhos, adisfarçar os rasgões e os remendos, a não estender ao mundo asrevelações que faz à consciência; e o melhor da obrigação équando, à força de embaçar os outros, embaça-se o homem a simesmo, porque em tal caso poupa-se o vexame, que é umasensação penosa, e a hipocrisia, que é um vício hediondo”.
Machado de Assis
Objetivamente, o conceito de paradigma pode ser entendido como regras
e regulamentos que estabelecem limites ou fronteiras, nos dizem como devemos nos
comportar dentro destes limites de forma a sermos bem sucedidos.
Do ponto de vista filosófico, porém, vale observar a visão clássica de
Platão e também a acepção contemporânea de Thomas Kuhn. O professor do
Departamento de Filosofia PUC-RJ, Danilo Marcondes, assegura em seu texto,
publicado no livro “A crise dos Paradigmas e a Educação” (id; p.14) que, na visão
Platônica, um paradigma é um modelo, que se encontra em um mundo abstrato, e do
qual existem instâncias, como cópias imperfeitas, em nosso mundo concreto; designa
aquilo que é real, o ser enquanto causa, determinante do que existe no mundo concreto,
dele derivado.
Segundo Kuhn, o termo designa toda a constelação de crenças, valores,
técnicas, etc., partilhadas pelos membros de uma comunidade. Os paradigmas são vistos
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então como modelos práticos de vivência tendo assim um “caráter exemplar”. Neste
paralelo, avistamos o ponto em comum do elemento: O caráter exemplar do paradigma.
Quando há crise de paradigmas, sabido é que também uma crise de
exemplos, de conceitos que levem à reflexão e aspiração por novos paradigmas.
A renovação científica dos séculos XVI-XVII é um ótimo exemplo do
que foi dito, por Ter sido um dos períodos mais significativos no que diz respeito a
crises de modelos. Todas as mudanças têm repercussões profundas além do plano lógico
epistemológico. Deixa-se uma visão fechada de mundo, modelos ultrapassados de
ordem hierárquica de lugar comum e busca-se uma concepção nova de conhecimento
trazida pela modernidade, caracterizada por uma ruptura com a tradição em busca de
sujeitos pensantes, de novos caminhos para o conhecimento.
2.1 Por que mudar? Os novos paradigmas e Pós-Modernidade
Por que há necessidade de novos paradigmas educacionais?
Qualquer reflexão pobre mudanças ou perspectiva do novo, suscita
resistência e até mesmo rejeição. Gera-se uma reação de desconforto por parte das
pessoas envolvidas no processo.
As mudanças que hoje norteiam a sociedade letrada faz com que se
oportunize transformações profundas de ordem positiva em nível pessoal, acadêmico ou
profissional. Particularmente no campo da Educação. Essas mudanças, oriundas do
advento da Pós-modernidade, tem sido bem aceitas, pois são vistas como trampolim
para o crescimento e desenvolvimento dos educandos.
Jair Ferreira dos Santos descreve a Pós-Modernidade como nome
aplicado às mudanças ocorridas nas ciências, nas artes e nas sociedades avançadas
desde 1950, quando, por convenção se encerra o modernismo. (1900-1950).
Na pós-modernidade, já nem se questiona a dependência entre
Iluminismo e razão como forma de comprovação da verdade. Mas que haja qualquer
verdade. Para essa geração objetividade, absolutos e conceitos universais fragmentaram-
se. Ao longo do tempo, paradigmas até então consolidados foram objeto de reflexão por
toda a sociedade.
17
Na esfera sociológica, as conseqüências da Pós-modernidade foram a
secularização, a privatização e a pluralização, uma vez que as mudanças de paradigmas
ocorreram também nas relações humanas, alterando o convívio e percepção da ética.
Nos últimos tempos, porém, o advento do computador nos trouxe novos
padrões de complexidade. Desafiando inteligências, competitividade e mudanças em
todos os empreendimentos e a saída é a aprendizagem. Apesar de já termos
experimentado mudanças profundas na sociedade, a educação formal continua
inalterada. Continua-se a confundir informação com conhecimento (vide vestibular), a
não valorizar os estilos e competências de cada indivíduo, a exigir a memorização e não
a capacitação cognitiva como interpretação. Julgamento e decisão, a tolerar respostas
prontas.
A globalização é outro fator a ser considerado. Ela tem trazido reações
que mudarão a política e a economia do futuro. Segundo Frederic M. Litto (A Escola do
futuro da USP), a importância de uma nação será determinada pelo valor potencial
daquilo que os seus cidadãos podem acrescentar à economia Global. Associada a esta
idéia, diríamos que será bem sucedido aquele que desenvolver e for capaz de identificar
e solucionar problemas, aqueles que forem capazes de filtrar informações de maneira a
aplicá-las no lugar certo, gerenciar estrategicamente situações emergentes, e para tanto,
as implicações para a Educação atual são óbvias.
Não se deseja mais um sistema de educação que é um espelho de
produção industrial em massa, no qual as crianças passam de uma série a outra numa
seqüência de matérias padronizadas como se estivessem numa industria, como produtos
a serem montados e etiquetados; o olhar sobre elas não deve ser discriminatório, quando
conteúdos diversos são despejados em suas cabeças e algumas com maio “capacidade”
para absorção e melhor “comportamento” são colocadas na linha de montagem mais
veloz, enquanto outras, a maioria, são colocadas na trilha de montagem mediana.
Do novo paradigma em educação, espera-se que se valorize a abstração,
que haja experimentação dos conteúdos estudados, levando os alunos a entenderem os
fatos, suas causas e conseqüências, e que se oportunize a colaboração e o
trabalho em equipe.
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CAPÍTULO III
ILUMINANDO A PRÁTICA COM A TEORIA
“Não precisa dar muito tempo para se perceber que nem todaloucura é genial, como nem toda lucidez é velha”.
Chico Buarque de Holanda.
Ao abordar a questão de novos paradigmas, na verdade não estaremos
teoricamente trazendo nada excepcionalmente diferente do que já foi definido pelas
bases legais da Educação. Entendemos, porém que existe um abismo considerável entre
a prática e a teoria expressa por estes instrumentos; tudo que está exposto só terá sentido
verdadeiro quando a escola, numa ação conjunta, assumir o papel de agente de
transformação das ações humanas, assumindo uma postura não ritualística mas sim,
oportunizando o processo crítico, de interatividade do ser humano com a sociedade.
Sob este prisma, priorizaremos as propostas dos P.C.N. (Parâmetros
Curriculares Nacionais) com relação ao Ensino Médio, embora as mudanças almejadas
devem permear todos os segmentos, entendemos que o Ensino Médio é a etapa final de
uma educação.
Os novos paradigmas emanam da compreensão de que, cada vez mais, as
competências desejáveis ao pleno desenvolvimento humano aproximam-se das
necessárias à inserção no processo produtivo. Entre as competências exigidas para o
exercício da cidadania e para as atividades produtivas, recoloca-se o papel da educação
como elemento de desenvolvimento social.
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No entanto, é preciso compreender que esta aproximação não garante a
igualdade entre oportunidades sociais. Para tanto, a escola, hoje, deve trabalhar por
tornar real o estabelecido nas Bases Legais (L.D.B./ P.C.N- n º 9.394/96), onde : fixam-
se os princípios mais gerais que devem orientar a reformulação curricular do Ensino
médio.
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais, na perspectiva da nova
lei, o Ensino Médio, como parte da educação escolar:
... Deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social (Art 1 º
& 2 º da lei n º 9.394/96).
Diante do exposto na lei, a escola assume uma nova postura, um novo
objetivo educacional, onde devem ser observados os seguintes itens:
A formação da pessoa de maneira a desenvolver valores e competências necessárias
a integração de seu projeto individual ao projeto da sociedade em que se situa;
O aprimoramento do Educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o
desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico;
A preparação e orientação básica para a sua integração ao mundo do trabalho, com
competências que garantam seu aprimoramento profissional e permitam acompanhar
as mudanças que caracterizam a produção no nosso tempo;
O desenvolvimento das competências para continuar aprendendo, de forma
autônoma e crítica, em níveis mais complexos de estudos (Parâmetros Curriculares
Nacionais/ Ensino Médio p.22).
Estamos então a nos perguntar: A escola já não proporciona este saber?
Responderíamos que em tese, sim, porém em ações isoladas, fragmentadas em diversos
conteúdos disciplinares, onde o aluno, na realidade, não entende bem para que estuda
tais conteúdos e no que eles poderão contribuir para sua integração ao mundo do
trabalho. Explora-se muito pouco as inteligências e competências que o indivíduo
enquanto aluno pode produzir. O esforço que se espera é o de centrar a aprendizagem
nestes dois pólos, por ser consenso entre os estudiosos da Educação que o aluno só
interioriza aquilo que o professor ensina, se estiver ligado, de alguma forma, ao
conteúdo por alguma motivação, por um desafio, ou se reconhecer a importância e a
aplicação do conteúdo ministrado.
20
Segundo Ângela Cruz no texto “Breves considerações sobre a
aprendizagem por competências”, o que tornará o aluno um sujeito crítico, capaz de
solucionar problemas e tomar decisões é uma aprendizagem em que ocorra a construção
do conhecimento valorizando-se o saber e o entender do aluno, pelos quais saberá
enfrentar desafios apresentados pelo professor, pelo grupo ou pela sociedade.
O novo paradigma Educacional deve inserir, prioritariamente a prática do
desenvolvimento e ampliação dessa rede de conhecimentos que o aluno possui e
mobilizá-los a serviço do seu êxito pessoal. O que teoricamente se ensina, deve estar
associado aos esquemas mentais de caráter cognitivo, sócio-afetivo ou psicomotor afim
de gerar um “saber fazer”, já que competências são operações e ações mentais que
utilizamos para estabelecer relações com e entre objetos, situações, fenômenos e
pessoas que queremos conhecer (Ruy Berger, 1999). As habilidades são o "saber fazer",
e não o fazer por fazer.
Quando pensamos em objetivos, estamos privilegiando o “resultado”, e
não o processo de construção do conhecimento. Os objetivos referem-se ao que o
professor quer alcançar. Estão vinculados a determinados conteúdos, já o trabalho com
competências não. Sua construção se dará através de qualquer conteúdo, com isso,
quebra-se a linearidade e fragmentação curriculares.
Não se pode mais postergar a intervenção do Ensino Médio, de modo a
garantir a superação de uma escola que em vez de se colocar como elemento central de
desenvolvimento dos cidadãos, contribui para a sua exclusão.
Ao manter uma proposta tradicional e distanciada das mudanças sociais,
a escola como instituição acabará também por se marginalizar. Os novos Paradigmas,
portanto, têm por perspectivas, romper com modelos tradicionais, promover uma
formação continuada tendo a construção da cidadania o elemento central dessa
formação. Dessa forma, priorizam-se a formação ética, a autonomia intelectual e o
pensamento crítico.
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CAPÍTULO IV
ALTERNATIVAS DE AÇÃO PARA O FAZER
PEDAGÓGICO
“Não sabemos para onde estamos indo só sabemos que ahistória nos trouxe até este ponto...Contudo, uma coisa é clara. Se a humanidade quer Ter umfuturo reconhecível, não pode ser pelo prolongamento dopassado ou do presente. Se tentamos construir o terceiromilênio nessa base, vamos fracassar. E o preço do fracasso, ouseja, a alternativa para uma mudança da sociedade, é aescuridão”.
Eric Hobsbawn.
Esta reflexão sobre novos paradigmas não teria sentido se não tivéssemos
como ponto de partida, a sala de aula. No capítulo anterior, procuramos dissertar sobre
teoria x prática e o que se espera alcançar diante dos novos desafios. Neste capítulo,
portanto, deve-se refletir o para que ensinamos? A serviço de quem está este saber?
Nada do que propomos teria sentido se, na sala de aula não vivenciamos a teoria, se a
postura Pedagógica dos profissionais de ensino continuar a resistir às mudanças
necessárias à formação integral do indivíduo.
As alternativas de ação sobre as quais iremos refletir, estão baseadas na
contextualização e na interdisciplinalidade, sem as quais não avistamos ações concretas
e relevantes para o educando.
Não se pode falar em novos paradigmas sem pensar nessa ação conjunta
de disciplinas, a fim de resolver um problema concreto ou compreender um
determinado fenômeno. Se o problema e aspiração dos alunos é saber mais sobre
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sexualidade ou drogas, porque não integrarmos Língua Portuguesa, Matemática,
História, Geografia, Ed. Física, etc. num trabalho significativo?
A aprendizagem significativa pressupõe a existência de um referencial
que permita aos alunos identificar e se identificar com as questões propostas, a fim de
intervir na realidade.
Se nessa perspectiva incorporam-se como diretrizes gerais para
organização curricular do Ensino Médio os seguintes eixos:
Aprender a conhecer
Aprender a fazer
Aprender a viver
Aprender a ser, um leque de possibilidades poderá fazer parte do cotidiano escolar
partindo da sala de aula, melhor utilização do espaço físico até mesmo oportunizar a
participação da comunidade local neste processo. A interdisciplinalidade e a
contextualização são propostas indispensáveis para concretização dos novos
Paradigmas.
Segundo as bases legais para educação básica de qualidade, a
interdisciplinaridade deve ir além da mera justaposição de disciplinas e ao mesmo
tempo evitar a diluição das mesmas em generalidades. De fato será principalmente na
possibilidade de relacionar as disciplinas em atividades ou projetos de estudo, pesquisa
e ação, que a interdisciplinaridade poderá ser uma prática pedagógica e didática
adequada aos objetivos do ensino médio.
O conceito de interdisciplinaridade fica mais claro quando se considera o
fato trivial de que todo conhecimento mantém um diálogo permanente com outros
conhecimentos, que pode ser de questionamento, de confirmação, de complementação,
de negação, de ampliação, de iluminação de aspectos não distinguidos.
Tendo presente este fato é fácil constatar que algumas disciplinas se
identificam e aproximam, outras se diferenciam e distanciam, em vários aspectos: pelos
métodos e procedimentos que envolvem, pelo objeto que pretendem conhecer, ou ainda
pelo tipo de habilidades que mobilizam naquele que a investiga, conhece, ensina ou
aprende.
A interdisciplinaridade também está envolvida quando os sujeitos que
conhecem, ensinam e aprendem, sentem necessidade de procedimentos que, numa única
visão disciplinar podem parecer heterodoxos mas fazem sentido quando chamados a dar
23
conta de temas complexos. Se alguns procedimentos artísticos podem parecer profecias
na perspectiva científica, também é verdade que a foto do cogumelo resultante da
explosão nuclear também explica, de um modo diferente da física, o significado da
bomba atômica.
Nesta multiplicidade de interações e negações recíprocas, a relação entre
as disciplinas tradicionais pode ir da simples comunicação de idéias até a integração
mútua de conceitos diretores, da epistemologia, da terminologia, da metodologia e dos
procedimentos de coleta e análise de dados. Ou pode efetuar-se, mais singelamente, pela
constatação de como são diversas as várias formas de conhecer. Pois até mesmo esta
“interdisciplinaridade singela” é importante para que os alunos aprendam a olhar o
mesmo objeto sob perspectivas diferentes.
É importante enfatizar que a interdisciplinaridade supõe um eixo
integrador que pode ser o objeto de conhecimento, um projeto de investigação, um
plano de intervenção. Nesse sentido ela deve partir da necessidade sentida pelas escolas,
professores e alunos de explicar, compreender, intervir, mudar, prever, algo que desafia
uma disciplina isolada e atrai a atenção de mais de um olhar, talvez vários. Explicação,
compreensão, intervenção, são processos que requerem um conhecimento que vai além
da descrição da realidade e mobiliza competências cognitivas para deduzir, tirar
inferências ou fazer previsões a partir do fato observado.
A partir do problema gerador do projeto, que pode ser um experimento,
um plano de ação para intervir na realidade ou uma atividade, são identificados os
conceitos de cada disciplina que podem contribuir para descrevê-lo, explicá-lo e prever
soluções. Dessa forma o projeto é interdisciplinar na sua concepção, execução e
avaliação, e os conceitos utilizados podem ser formalizados, sistematizados e
registrados no âmbito das disciplinas que contribuem para o seu desenvolvimento. O
exemplo do projeto é interessante para mostrar que a interdisciplinaridade não dilui as
disciplinas, ao contrário, mantém sua individualidade. Mas integra as disciplinas a partir
da compreensão das múltiplas causas ou fatores que intervêm sobre a realidade e
trabalha todas as linguagens necessárias para a constituição de conhecimentos,
comunicação e negociação de significados e registro sistemático de resultados.
Essa integração entre as disciplinas para buscar compreender, prever,
transformar a realidade aproxima-se daquilo que Piaget chama de estruturas
subjacentes. O autor destaca um aspecto importante neste caso: a compreensão dessas
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estruturas subjacentes não dispensa o conhecimento especializado, ao contrário.
Somente o domínio de uma dada área permite superar o conhecimento meramente
descritivo para captar suas conexões com outras áreas do saber na busca de explicações.
Segundo Piaget, a excessiva “disciplinarização”
“…se explica, com efeito, pelos preconceitos positivistas. Emuma perspectiva onde apenas contam os observáveis, quecumpre simplesmente descrever e analisar para então daíextrair as leis funcionais, é inevitável que as diferentesdisciplinas pareçam separadas por fronteiras mais ou menosdefinidas ou mesmo fixas, já que estas se relacionam com adiversidade das categorias de observáveis que, por sua vez,estão relacionadas com nossos instrumentos subjetivos eobjetivos de registro (percepções e aparelhos)... Por outro lado,logo que, ao violar as regras positivistas, .... se procura explicaros fenômenos e suas leis, ao invés de apenas descrevê-los,forçosamente se estará ultrapassando as fronteiras doobservável, já que toda causalidade decorre da necessidadeinferencial, isto é, de deduções e estruturas operatóriasirredutíveis à simples constatação... Nesse caso, a realidadefundamental não é mais o fenômeno observável, e sim aestrutura subjacente, reconstituída por dedução e que forneceuma explicação para os dados observados. Mas, por issomesmo, tendem a desaparecer as fronteiras entre as disciplinas,pois as estruturas ou são comuns (tal como entre a Física e aQuímica...) ou solidárias umas com as outras (como sem dúvidahaverá de ser o caso entre a Biologia e a Físico-Química).”
A interdisciplinaridade pode ser também compreendida se considerarmos
a relação entre o pensamento e a linguagem, descobertas pelo estudos sócio-
interacionistas do desenvolvimento e da aprendizagem. Esses estudos revelam que, seja
nas situações de aprendizagem espontânea, seja naquelas estruturadas ou escolares, há
uma relação sempre presente entre os conceitos e as palavras (ou linguagens) que os
expressam, de tal forma que … uma palavra desprovida de pensamento é uma coisa
morta, e um pensamento não expresso por palavras permanece na sombra. Todas as
linguagens trabalhadas pela escola, portanto, são por natureza “interdisciplinares” com
as demais áreas do currículo: é pela linguagem – verbal, visual, sonora, matemática,
corporal, ou outra – que os conteúdos curriculares se constituem em conhecimentos, isto
é, significados que ao serem formalizados por alguma linguagem, tornam-se conscientes
de si mesmos e deliberados.
25
Sem a pretensão de esgotar o amplo campo de possibilidades que a
interação entre linguagem e pensamento abre para a pedagogia da interdisciplinaridade,
alguns exemplos poderiam ser lembrados: a linguagem verbal como um dos processos
de constituição de conhecimento das ciências humanas e o exercício destas últimas
como forma de aperfeiçoar o emprego da linguagem verbal formal; a matemática como
um dos recursos constitutivos dos conceitos das ciências naturais e a explicação das leis
naturais como exercício que desenvolve o pensamento matemático; a informática como
recurso que pode contribuir para reorganizar e estabelecer novas relações entre
conceitos científicos e estes como elementos explicativos dos princípios da informática;
as artes como constitutivas do pensamento simbólico, metafórico e criativo,
indispensáveis no exercício de análise, síntese e solução de problemas, competências
que se busca desenvolver em todas as disciplinas.
Outra observação feita pelos estudos de Vigotsky refere-se à existência
de uma interdependência entre e a aprendizagem dos conteúdos curriculares e o
desenvolvimento cognitivo. Embora já não se aceitem as idéias herbatianas da
disciplina formal, que supunha um associação linear entre cada disciplina escolar e um
tipo específico de capacidade mental, também não é razoável supor que o
desenvolvimento cognitivo se dá de forma independente da aprendizagem em geral e,
em particular, da aprendizagem sistemática organizada pela escola.
Investigações sobre a aprendizagem de conceitos científicos em crianças
e adolescentes indicam que a aprendizagem funciona como antecipação do
desenvolvimento de capacidades intelectuais. Isso ocorre porque os pré-requisitos
psicológicos para o aprendizado de diferentes matérias escolares são, em grande parte,
os mesmos; o aprendizado de uma matéria influencia o desenvolvimento de funções
superiores para além dos limites dessa matéria específica; as principais funções
psíquicas envolvidas no estudo de várias matérias são interdependentes – suas bases
comuns são a consciência e o domínio deliberado, as contribuições principais dos anos
escolares. A partir dessas descobertas, conclui-se que todas as matérias escolares
básicas atuam como uma disciplina formal, cada uma facilitando o aprendizado das
outras…
Essa “solidariedade didática” foi encontrada por Chervel no estudo que
realizou da história dos “ensinos” ou das disciplinas escolares, no sistema de ensino
francês. Um dado interessante encontrado por esse autor foi o significado diferente que
26
as disciplinas vão adquirindo no decorrer de dois séculos, mesmo mantendo o mesmo
nome nas grades curriculares. Nesse período, várias foram criadas, outras
desapareceram, embora os conteúdos de seu ensino e as capacidades intelectuais que
visavam constituir tenham continuado a ser desenvolvidas por meio de outros conteúdos
com nomes idênticos ou por meio de conteúdos idênticos sob nomes diferentes.
Foi assim que durante quase um século a disciplina “sistema de pêsos e
medidas” fez parte do currículo da escola primária e secundária francesa, até que se
consolidasse o sistema métrico decimal imposto à França no início do Século XIX. Uma
vez cumprido seu papel, desapareceu como disciplina escolar e os conteúdos e
habilidades envolvidos na aprendizagem do sistema de medidas foram incorporados ao
ensino da matemática de onde não mais se separaram. Da mesma forma a disciplina
“redação” apareceu, desapareceu, incorporada a outras, e reapareceu por diversas vezes
no currículo. Essa transitoriedade das disciplinas escolares mostra como é
epistemologicamente frágil a sua demarcação rígida nos planos curriculares e
argumenta em favor de uma postura mais flexível e integradora.
As múltiplas formas de interação que se pode prever entre as disciplinas
tal como tradicionalmente arroladas nas «grades curriculares», faz com que toda
proposição de áreas ou agrupamento das mesmas, seja resultado de um corte que
carrega certo grau de arbitrariedade. Não há paradigma curricular capaz de abarcar a
todas. Neste sentido seria desastroso entender uma proposta de organização por áreas
como fechada ou definitiva. Mais ainda seria submeter uma área interdisciplinar ao
mesmo amordaçamento estanque a que hoje estão sujeitas as disciplinas tradicionais
isoladamente, quando o importante é ampliar as possibilidades de interação não apenas
entre as disciplinas nucleadas em uma área como entre as próprias áreas de nucleação.
A contextualização pode ser um recurso para conseguir esse objetivo.
Contextualizar o conteúdo que se quer aprendido significa em primeiro
lugar assumir que todo conhecimento envolve uma relação entre sujeito e objeto. Na
escola fundamental ou média o conhecimento é quase sempre reproduzido das situações
originais nas quais acontece sua produção. Por esta razão quase sempre o conhecimento
escolar se vale de uma transposição didática para na qual a linguagem joga papel
decisivo.
O tratamento contextualizado do conhecimento é o recurso que a escola
tem para retirar o aluno da condição de espectador passivo. Se bem trabalhado permite
27
que, ao longo da transposição didática, o conteúdo do ensino provoque aprendizagens
significativas que mobilizam o aluno e estabeleçam entre ele e o objeto do
conhecimento uma relação de reciprocidade. A contextualização evoca por isto áreas,
âmbitos ou dimensões presentes na vida pessoal, social e cultural, e mobiliza
competências cognitivas já adquiridas. As dimensões de vida ou contextos valorizados
explicitamente pela LDB são o trabalho e a cidadania. As competências estão indicadas
quando a lei prevê um ensino que facilite a ponte entre a teoria e a prática. É isto
também que propõe Piaget, quando analisa o papel da atividade na aprendizagem:
compreender é inventar, ou reconstruir através da reinvenção, e será preciso curvar-se
ante tais necessidades se o que se pretende, para o futuro, é moldar indivíduos capazes
de produzir ou de criar, e não apenas de repetir.
Alguns exemplos podem ilustrar essa noção. Um deles refere-se ao uso
das língua portuguesa no contexto das diferentes práticas humanas. O melhor domínio
da língua e seus códigos se alcança quando se entende como ela é utilizada no contexto
da produção do conhecimento científico, da convivência, do trabalho ou das práticas
sociais: nas relações familiares ou entre companheiros, na política ou no jornalismo, no
contrato de aluguel ou na poesia, na física ou na filosofia. O mesmo pode acontecer com
a matemática. Uma das formas significativas para dominar a matemática é entendê-la
aplicada na análise de índices econômicos e estatísticos, nas projeções políticas ou na
estimativa da taxa de juros, associada a todos os significados pessoais, políticos e
sociais que números dessa natureza carregam.
Outro exemplo refere-se ao conhecimento científico. Conhecer o corpo
humano não é apenas saber como funcionam os muitos aparelhos do organismo mas
também entender como funciona o próprio corpo e que conseqüências isso tem em
decisões pessoais da maior importância tais como fazer dieta, usar drogas, consumir
gorduras ou exercer a sexualidade. A adolescente que aprendeu tudo sobre aparelho
reprodutivo mas não entende o que se passa com seu corpo a cada ciclo mensal não
aprendeu de modo significativo. O mesmo acontece com o jovem que se equilibra na
prancha de surfe em movimento mas não relaciona isso com as leis da física aprendidas
na escola.
Pesquisa recente com jovens de ensino médio revelou que estes não vêem
nenhuma relação da química com suas vidas nem com a sociedade, como se o iogurte,
os produtos de higiene pessoal e limpeza, os agrotóxicos ou as fibras sintéticas de suas
28
roupas, fossem questões de outra esfera de conhecimento, divorciadas da química que
estudam na escola. No caso destes jovens a química aprendida na escola foi transposta
do contexto de sua produção original, sem que pontes tivessem sido feitas para
contextos que são próximos e significativos. É provável que por motivo semelhante
muitas pessoas que estudaram física na escola não conseguem entender como funciona
o telefone celular. Ou se desconcertem quando têm de estabelecer a relação entre o
tamanho de um ambiente e a potência em “btus” do aparelho de ar condicionado que
estão por adquirir.
O trabalho é o contexto mais importante da experiência curricular no
ensino médio, de acordo com as diretrizes traçadas pela LDB em seus artigos 35 e 36. O
significado desse destaque deve ser devidamente considerado: na medida em que o
ensino médio é parte integrante da educação básica e que o trabalho é princípio
organizador do currículo, muda inteiramente a noção tradicional de educação geral
acadêmica ou, melhor dito, academicista. O trabalho já não é mais limitado ao ensino
profissionalizante. Muito ao contrário, a lei reconhece que nas sociedades
contemporâneas todos, independentemente de sua origem ou destino sócio-profissional,
devem ser educados na perspectiva do trabalho enquanto uma das principais atividades
humanas, enquanto campo de preparação para escolhas profissionais futuras, enquanto
espaço de exercício de cidadania, enquanto processo de produção de bens, serviços e
conhecimentos com as tarefas laborais que lhes são próprias.
A riqueza do contexto do trabalho para dar significado às aprendizagens
da escola média é incomensurável. Desde logo na experiência da própria aprendizagem
como um trabalho de constituição de conhecimentos, dando à vida escolar um
significado de maior protagonismo e responsabilidade. Da mesma forma o trabalho é
um contexto importante das ciências humanas e sociais, visando compreendê-lo
enquanto produção de riqueza e forma de interação do ser humano com a natureza e o
mundo social. Mas a contextualização no mundo do trabalho permite focalizar muito
mais todos os demais conteúdos do ensino médio.
A produção de serviços de saúde pode ser o contexto para tratar os
conteúdos de biologia, significando que os conteúdos dessas disciplinas poderão ser
tratados de modo a serem, posteriormente, significativos e úteis a alunos que se
destinem a essas ocupações. A produção de bens nas áreas de mecânica e eletricidade
contextualiza conteúdos de física com aproveitamento na formação profissional de
29
técnicos dessas áreas. Do mesmo modo as competências desenvolvidas nas áreas de
linguagens podem ser contextualizadas na produção de serviços pessoais ou
comunicação e, mais especificamente, no exercício de atividades tais como tradução,
turismo ou produção de vídeos, serviços de escritório. Ou ainda os estudos sobre a
sociedade e o indivíduo podem ser contextualizados nas questões que dizem respeito à
organização, à gestão, ao trabalho de equipe, à liderança, no contexto de produção de
serviços tais como relações públicas, administração, publicidade.
Conhecimentos e competências constituídos de forma assim
contextualizada constituem educação básica, são necessários para a continuidade de
estudos acadêmicos e aproveitáveis em programas de preparação profissional
seqüenciais ou concomitantes com o ensino médio, sejam eles cursos formais seja a
capacitação em serviço.
O contexto do trabalho é também imprescindível para a compreensão
dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos a que se refere o
artigo 35 da LDB. Por sua própria natureza de conhecimento aplicado, as tecnologias,
sejam elas das linguagens e comunicação, da informação, do planejamento e gestão, ou
as mais tradicionais, nascidas no âmbito das ciências da natureza, só podem ser
entendidas de forma significativa se contextualizadas no trabalho. A este respeito é
significativo o fato de que as estratégias de aprendizagem contextualizada ou “situada”,
como é designada na literatura de língua inglesa, nasceram nos programas de
preparação profissional, dos quais se transferiram depois para as salas de aula
tradicionais. Suas características tal como descritas pela literatura e resumidas por Stein
indicam que a contextualização do conteúdo de ensino é o que efetivamente ocorre no
ensino profissional de boa qualidade: Na aprendizagem situada os alunos aprendem o
conteúdo por meio de atividades em lugar de adquirirem informação em unidades
específicas organizadas pelos instrutores. O conteúdo é inerente ao processo de fazer
uma tarefa e não se apresenta separado do barulho, da confusão e das interações
humanas que prevalecem nos ambientes reais de trabalho.
Outro contexto relevante indicado pela LDB é o do exercício da
cidadania. Desde logo é preciso que a proposta pedagógica assuma o fato trivial de que
a cidadania não é dever nem privilégio de uma área específica do currículo nem deve
ficar restrita a um projeto determinado. Exercício de cidadania é testemunho que se
inicia na convivência cotidiana e deve contaminar toda a organização curricular. As
30
práticas sociais e políticas e as práticas culturais e de comunicação são parte integrante
do exercício cidadão, mas a vida pessoal, o cotidiano e a convivência e as questões
ligadas ao meio ambiente, corpo e saúde também. Trabalhar os conteúdos das ciências
naturais no contexto da cidadania pode significar um projeto de tratamento da água ou
do lixo da escola ou a participação numa campanha de vacinação, ou a compreensão de
porque as construções despencam quando os materiais utilizados não têm a resistência
devida. E de quais são os aspectos técnicos, políticos e éticos envolvidos no trabalho da
construção civil.
Objetivo semelhante pode ser alcançado se a eleição do grêmio estudantil
for uma oportunidade para conhecer melhor os sistemas políticos, ou para entender
como a matemática traduz a tendência de voto por meio de um gráfico de barras, ou
para discutir questões éticas relacionadas à prática eleitoral. Da mesma forma as
competências da área de linguagens podem ser trabalhadas no contexto da comunicação
na sala de aula, da análise da novela da televisão, dos diferentes usos da língua
dependendo das situações de trabalho, da comunicação coloquial.
O contexto que é mais próximo do aluno e mais facilmente explorável
para dar significado aos conteúdos da aprendizagem é o da vida pessoal, cotidiano e
convivência. O aluno vive num mundo de fatos regidos pelas leis naturais e está imerso
num universo de relações sociais. Está exposto a informações cada vez mais acessíveis e
rodeado por bens cada vez mais diversificados, produzidos com materiais sempre
novos. Está exposto também a vários tipos de comunicação pessoal e de massa.
O cotidiano e as relações estabelecidas com o ambiente físico e social
devem permitir dar significado a qualquer conteúdo curricular, fazendo a ponte entre o
que se aprende na escola e o que se faz, vive e observa no dia a dia. Aprender sobre a
sociedade, o indivíduo e a cultura e não compreender ou reconhecer as relações
existentes entre adultos e jovens na própria família, é perder a oportunidade de descobrir
que as ciências também contribuem para a convivência e a troca afetiva. O respeito ao
outro e ao público, essenciais à cidadania, também se iniciam nas relações de
convivência cotidiana, na família, na escola, no grupo de amigos.
Na vida pessoal há um contexto importante o suficiente para merecer
consideração específica que é o do meio ambiente, corpo e saúde. Condutas
ambientalistas responsáveis subentendem um protagonismo forte no presente, no meio
ambiente imediato da escola, da vizinhança, do lugar onde se vive. Para desenvolvê-las
31
é importante que os conhecimentos das ciências, da matemática e das linguagens sejam
relevantes na compreensão das questões ambientais mais próximas e estimulem a ação
para resolvê-las.
As visões, fantasias e decisões sobre o próprio corpo e saúde, base para
um desenvolvimento autônomo, poderão ser melhor orientadas se as aprendizagens da
escola estiverem significativamente relacionadas com as preocupações comuns na vida
de todo jovem: aparência, sexualidade e reprodução, consumo de drogas, hábitos de
alimentação, limite e capacidade física, repouso, atividade, lazer.
Examinados os exemplos dados é possível generalizar a contextualização
como recurso para tornar a aprendizagem significativa ao associá-la com experiências
da vida cotidiana ou com os conhecimentos adquiridos espontaneamente. É preciso no
entanto cuidar para que essa generalização não induza à banalização, com o risco de
perder o essencial da aprendizagem escolar que é seu caráter sistemático, consciente e
deliberado. Em outras palavras: contextualizar os conteúdos escolares não é liberá-los
do plano abstrato da transposição didática para aprisioná-los no espontaneísmo e na
cotidianeidade. Para que fique claro o papel da contextualização é necessário
considerar, como no caso da interdisciplinaridade, seu fundamento epistemológico e
psicológico.
O jovem, não inicia a aprendizagem escolar partindo do zero, mas com
uma bagagem formada por conceitos já adquiridos espontaneamente, em geral mais
carregados de afetos e valores por resultarem de experiências pessoais. Ao longo do
desenvolvimento aprende-se a abstrair e generalizar conhecimentos aprendidos
espontaneamente, mas é bem mais difícil formalizá-los ou explicá-los em palavras
porque, diferentemente da experiência escolar, não são conscientes nem deliberados.
É possível assim afirmar, reiterando premissas das teorias interacionistas
do desenvolvimento e da aprendizagem, que o desenvolvimento intelectual baseado na
aprendizagem espontânea é ascendente, isto é, inicia-se de modo inconsciente e até
caótico, de acordo com uma experiência que não é controlada, e encaminha-se para
níveis mais abstratos, formais e conscientes. Ao iniciar uma determinada experiência de
aprendizagem escolar, portanto, um aluno pode até saber os conceitos envolvidos na
mesma, mas não sabe que os tem porque neste caso, vale a afirmação de que a análise
da realidade com a ajuda de conceitos precede a análise dos próprios conceitos.
32
Na escola, os conteúdos curriculares já são apresentados ao aluno na sua
forma mais abstrata, formulados em graus crescentes de generalidade. A sua relação
com esse conhecimento é portanto mais longínqua, mais fortemente mediada pela
linguagem externa, menos pessoal. Nestas circunstâncias, ainda que aprendido e
satisfatoriamente formulado em nível de abstração aceitável, o conhecimento tem muita
dificuldade para aplicar-se a novas situações concretas que devem ser entendidas nos
mesmos termos abstratos pelos quais o conceito é formulado.
Da mesma forma como foi longo o processo pelo qual os conceitos
espontâneos ganharam níveis de generalidade até serem entendidos e formulados de
modo abstrato, é longo e árduo o processo inverso, de transição do abstrato para o
concreto e particular. Isso sugere que o processo de aquisição do conhecimento
sistemático escolar tem uma direção oposta à do conhecimento espontâneo:
descendente, de níveis formais e abstratos para aplicações particulares.
Ambos processos de desenvolvimento, do conhecimento espontâneo ao
conhecimento abstrato e deliberado e, deste último para a compreensão e aplicação a
situações particulares concretas, não são independentes. Já porque a realidade à qual se
referem é a mesma – o mundo físico, o mundo social, as relações pessoais – já porque
em ambos os casos a linguagem joga papel decisivo como elemento constituidor. Na
prática, o conhecimento espontâneo auxilia a dar significado ao conhecimento escolar.
Este último, por sua vez, reorganiza o conhecimento espontâneo e estimula o processo
de sua abstração.
Quando se recomenda a contextualização como princípio de organização
curricular, o que se pretende é facilitar a aplicação da experiência escolar para a
compreensão da experiência pessoal em níveis mais sistemáticos e abstratos e o
aproveitamento da experiência pessoal para facilitar o processo de concreção dos
conhecimentos abstratos que a escola trabalha. Isto significa que a ponte entre teoria e
prática, recomendada pela LDB e comentada por Castro, deve ser de mão dupla. Em
ambas direções estão em jôgo competências cognitivas básicas: raciocínio abstrato,
capacidade de compreensão de situações novas que é base da solução de problemas,
para mencionar apenas duas.
Não se entenda portanto a contextualização como banalização do
conteúdo das disciplinas, numa perspectiva espontaneísta. Mas como recurso
pedagógico para tornar a constituição de conhecimentos um processo permanente de
33
formação de capacidades intelectuais superiores. Capacidades que permitam transitar
inteligentemente do mundo da experiência imediata e espontânea para o plano das
abstrações e deste para a reorganização da experiência imediata de forma a aprender que
situações particulares e concretas podem tem uma estrutura geral.
De outra coisa não trata Piaget quando, a propósito do ensino da
matemática observa que muitas operações lógico-matemáticas já estão presentes na
criança antes da idade escolar sob formas elementares ou triviais mas não menos
significativas. Mas acrescenta, em seguida: Uma coisa é aprender na ação e assim
aplicar praticamente certas operações, outra é tomar consciência das mesmas para
delas extrair um conhecimento reflexivo e teórico, de tal forma que nem os alunos nem
os professores cheguem a suspeitar de que o conteúdo do ensino ministrado se pudesse
apoiar em qualquer tipo de estruturas naturais.
Para concluir estas considerações sobre a contextualização é interessante
citar a síntese apresentada por Stein sobre as características da aprendizagem
contextualizada: em relação ao conteúdo busca desenvolver o pensamento de ordem
superior em lugar da aquisição de fatos independentes da vida real; preocupa-se mais
com a aplicação do que com a memorização; sobre o processo assume que a
aprendizagem é sócio-interativa, envolve necessariamente os valores, as relações de
poder, a negociação permanente do próprio significado do conteúdo entre os alunos
envolvidos; em relação ao contexto propõe não apenas trazer a vida real para a sala de
aula mas criar as condições para que os alunos (re)experienciem os eventos da vida real
a partir de múltiplas perspectivas.
A reorganização da experiência cotidiana e espontânea tem assim um
resultado importante para a educação pois é principalmente nela que intervêm os afetos
e valores. É com base nela, embora não exclusivamente, que se constroem as visões do
outro e do mundo, pois uma parte relevante da experiência espontânea é feita de
interação com os outros, de influencia dos meios de comunicação, de convivência
social, pelos quais os significados são negociados, para usar o termo de Stein.
Na medida em que a contextualização facilita a significado da
experiência de aprendizagem escolar e a (re) significação da aprendizagem baseada na
experiência espontânea, ela pode – e deve – questionar os dados desta última: os
problemas ambientais, os preconceitos e estereótipos, os conteúdos da mídia, a
violência nas relações pessoais, os conceitos de verdadeiro e falso na política, e assim
34
por diante. Dessa forma, voltando a alguns exemplos dados, se a aprendizagem do
sistema reprodutivo não leva a questionar os mitos da feminilidade e da masculinidade,
além de não ser significativa essa aprendizagem em nada colaborou para reorganizar o
aprendido espontaneamente. Se a aprendizagem das ciências não facilitar o esforço para
distinguir entre o fato e a interpretação ou identificar as falhas da observação cotidiana,
se não facilitar a reprodução de situações nas quais o emprego da ciência depende da
participação e interação entre as pessoas e destas com um conjunto de equipamentos e
materiais, pode-se dizer que não criou competências para abstrair de forma inteligente o
mundo da experiência imediata.
4.1 Trabalho com Projetos: um novo olhar sobre a escola
Se a aprendizagem se dá na relação com objetos e sujeitos, o trabalho
com projetos representa uma ótima oportunidade de propiciar a construção coletiva do
conhecimento, através da vivência de situações de aprendizagem diversificada, em que
o aluno vivencia com o novo, e onde várias competências são desenvolvidas.
Implica então, em romper com paradigmas educacionais que põem o foco
no processo de ensino e não no de aprendizagem.
Projetos, utopias e valores constituem ingredientes fundamentais da
educação. A palavra “projeto” Tem duas dimensões: futuro ou antecipação, e abertura,
ou não-determinação. Projetar é lançar para a frente, é antever sua realização no futuro.
A escola deve definir os valores que vão ser trabalhados prioritariamente
no projeto. A primeira proposta que apresentaremos, promove a valorização da
modalidade escrita da língua, através da atividade de leitura. A palavra escrita tem o
poder de emancipar o aluno, como tem também o poder de reduzi-lo à condição inferior
que a sociedade lhe destina por causa de sua cor, religião, estrato social, dialeto, etc. O
saber ler e escrever, na sociedade contemporânea, não te o mesmo significado de
cinqüenta anos atrás. Assinar o nome e conhecer as letras não é suficiente para ser
considerado alfabetizado. Portanto, colocar a leitura como objetivo central nos projetos
é uma questão ética, cujo objetivo deve levar em conta a preparação para cidadania.
Um projeto organizado por um grupo de professores de São Gonçalo- RJ
“ Lendo o Mundo” foi desenvolvido durante o curso: Contextualizando as grandes áreas
do conhecimento, serve de exemplo por contextualizar o tema “Guerra”, a fim de dar
35
respostas aos questionamentos dos alunos sobre Os sentidos da Guerra. Aplicado à rede
pública de Ensino Médio, teve como competência compreender e usar os sistemas
simbólicos da Língua Portuguesa como meio de organização cognitiva da realidade pela
constituição de significados, expressão, comunicação e informação, confrontar opiniões
e pontos de vista, aplicar o significado dos textos, analisar, interpretar etc.
Os professores, numa ação interdisciplinar, levaram para sala de aula um
assunto que estará na mídia: O atentado de 11 de setembro os E.U.A.
Os alunos levaram vários tipos de textos entre poesias, reportagens, bula
de remédios, artigos científicos, música e etc. Matemática pôde contribuir com
montagem de gráficos, História, com estudo da situação e das conseqüências do fato,
Geografia- localização das áreas onde ocorreu o fato. Os desenhos, canções,
dramatizações ficaram com o professor de Educação Artística; Ciências, estudou com os
alunos as conseqüências da Guerra Biológica e assim, toda a Comunidade Escolar se
mobilizou a fim de entender os sentidos da Guerra, ou seja, ler o mundo.
Um projeto organizado em torno da leitura integra atividades cuja
realização envolve ler para compreender e aprender aquilo que for relevante para o
desenvolvimento de algumas outras atividades, conceito, valor, informação. Quando as
pessoas recebem a informação mastigada da Televisão, dos gibis, da internet, acabam
tendo preguiça de ler, um ato que exige esforço e reflexão. Diante disto, torna-se cada
vez mais necessária a modernização das armas de estímulo à leitura. Contar parte
interessante ou bizarra de um clássico, transformá-lo em peça Teatral, incentivar
atividades lúdicas, podem servir de estímulo para o ato de ler. As estratégias devem
levar em conta o universo dos alunos e o centro de interesse da maioria. Em vez do
mecânico, o lúdico.
Em vez do teórico, o prático contido numa música, num poema de
Drummond, em textos de jornais e revistas, em filmes etc.... São enormes as chances de
que, mais tarde seja um leitor ávido.
Outro projeto que nos servirá de ponto para reflexão, também fruto do
trabalho interdisciplinar de professores da Rede Pública Estadual tem como título:
“Vivenciando a escolha”, a partir do tema Mercado de Trabalho.
Alguns pontos pertinentes observados no dia-a-dia escolar, nos fizeram
voltar a atenção de forma mais objetiva, para a conscientização da importância que tem
36
a escola no que diz respeito à informação, valorização e até mesmo formação
profissional do educando.
Não queremos aqui declarar que a escola tem a função de formar
técnicos. Queremos apenas ressaltar que a escola tem o dever de orientar para a vida,
seja em qualquer área.
A problematização foi então observada nos seguintes tópicos:
A necessidade do aluno em apoiar financeiramente a família;
O desejo de realizar os sonhos de consumo;
O desinteresse do aluno pela formação acadêmica;
A falta de informação vocacional por parte do aluno;
A falta de um trabalho específico da escola voltado para os alunos do Ensino médio
visando à formação terminal.
Diante deste quadro, propomos um projeto que ressaltaria as
competências com relação à vocação profissional, conscientizaria sobre a importância
de se Ter uma ocupação digna através da formação acadêmica.
O trabalho envolveu Língua Portuguesa na leitura e análise de textos,
informativos, classificados, estudo vocabulário de algumas expressões comuns a
algumas profissões, redação oficial: carta, pedido de emprego, dinâmica de grupo,
currículo, entrevistas etc....
Os professores de matemática e informática proporcionariam a
oportunidade do trabalho com pesquisas, estatísticas, questão salarial, custo de vida,
elaboração de gráficos.
Mapear áreas e lugares de maior chances para determinadas profissões,
pesquisar cursos, linha de tempo, são atividades que poderiam ser desenvolvidas pelas
áreas de Geografia e História.
As áreas de Biologia/ E. Física ficariam incumbidas de apresentar um
painel informativo relacionando através dos alimentos, a importância do equilíbrio
alimentar para a resistência física e mental do indivíduo além de esclarecer regras de
postura, atividades com música, relaxamento e descontração, prática esportiva etc....
As áreas de Arte/Filosofia/ Sociologia, trabalhariam com os alunos,
dramatizações de situações que envolvam entrevistas, dinâmicas, oficinas, assim como
atividades que abordem questões sobre ética, cidadania, preconceito, relações
interpessoais.
37
O Projeto ainda contaria com a oferta de estágios, escolhidos pelos
alunos, através de parceria com instituições como centro comunitário, Indústrias,
Comércios, Bancos, Restaurantes, Hospitais, Escolas etc....
Proporcionaria ainda à comunidade local, numa intervenção social,
caminhos a seguir como:
Trabalho voluntário na comunidade;
Palestras proporcionando informação sobre lei trabalhista;
Criação de um banco de empregos visando à necessidade da comunidade local.
Alguns outros projetos foram por nós experimentados com resultados
bastante satisfatórios. O importante é que a interdisciplinaridade esteja em toda proposta
pedagógica da escola. Sendo assim, problemas de ordem social, saúde e outros podem
servir de temas para um trabalho relevante. O problema de Dengue pode ser usado para
trabalhar o Meio Ambiente e através dele, conhecer-se melhor as condições de higiene,
saneamento básico e toda estrutura de um bairro ou cidade. A questão da violência,
seqüestros etc... pode ser o ponto principal para se trabalhar Cidadania e assim, a escola
sai do modelo quadrado e inflexível dos conteúdos para olhar, de forma nova e
significativa o fazer pedagógico.
A contextualização, além de ser efetivada pedagogicamente, também se
realiza numa rede de conhecimento: conceitos e conhecimentos de determinada
disciplina são contextualizados no tempo, no espaço e no próprio universo do
conhecimento.
Na escola conteudista, toda informação “precisa” ser dada, e o programa
não abre espaço para o desenvolvimento de atividades como projetos, discussões,
experimentos, visitas, etc, tornando alunos e professores prisioneiros de espaços e
tempos escolares rígidos.
A escola não pode Ter a pretensão de “Transmitir” todo o conhecimento
que o aluno precisa para prosseguir de modo autônomo.
Esperamos que as alternativas apontadas sejam como luz no caminho de
quem busca mudança efetiva e que assim, contribuamos para que o aluno compreenda
melhor o mundo, saiba fazer questionamentos, mude socialmente e seja feliz.
38
CONCLUSÃO
Finalmente observamos que o antigo paradigma educacional tornou-se
incapaz de lidar com as constantes mudanças ocorridas nos últimos vinte ou trinta anos.
O aumento da complexidade em todos os setores da vida profissional e pessoal; a
dificuldade em lidar com sistemas com maior ou menor grau de integração e a
necessidade de fazer relacionamentos novos entre campos de conhecimentos antes
isolados, tornou-se cada vez mais urgente.
Não se compreende uma escola que se preste ao papel de reprodutora de
modelos que não levem à reflexão do conhecimento, onde o professor é um mero leitor,
o aluno um receptor passivo, a sala de aula um ambiente de escuta. A escola hoje, deve
priorizar a troca de experiências e o trabalho interdisciplinar.
Os desafios dos novos paradigmas foram descritos a fim de ampliar a
reflexão sobre os aspectos Pedagógicos que devem ser mudados. E a solução ainda está
no humano. É a escola em sua totalidade que, ao conhecer e buscar compreender as
aspirações dos alunos, poderá auxiliá-los a encontrar o melhor caminho.
39
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
GARDNER, Howard. O verdadeiro, o belo e o bom. Rio de Janeiro: Objetiva, 1999.
GONDIM, Ricardo. Fim de milênio: Os perigos e desafios da Pós-Modernidade da
Igreja. São Paulo: Editora Abb, 1999.
HERNÁNDES, Fernando. Transgressão e mudança na educação: os projetos de
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HERNÁNDES, Fernando; VENTURA, Montserrat. A organização do currículo por
projetos de trabalho. Porto alegre: Artemd, 1998.
MEIRIEU, Phillipe. Aprender... Sim, mas como? Porto Alegre: Artmed, 1998.
PERRENOUD, Phillipe. Construir as competências desde a escola. Porto Alegre:
Artmed, 1999.
PIAGET, Jean. Seis estudos de psicologia. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1984.
SANTOMÉ, J.T. Globalização e interdisciplinaridade curriculo integrado. Porto
Alegre: Artes Médicas Sul, 1998.
VIGOTSKI, L.S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
40
BIBLIOGRAFIA CITADA
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2000
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Médica e Tecnológica.
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FERREIRA, Vale José Maria. Concepções de educação. São Paulo: Mova.
GAROTTI, Moacir. História das idéias pedagógicas. São Paulo: Ática, 1996.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Filosofia da educação. São Paulo: Cortez, 1991.
41
ANEXOS
42
ÍNDICE
AGRADECIMENTOS .......................................................................................... iii
DEDICATÓRIA ................................................................................................... iv
RESUMO .............................................................................................................. v
METODOLOGIA ................................................................................................. vi
SUMÁRIO ............................................................................................................ vii
INTRODUÇÃO .................................................................................................... 08
CAPÍTULO I - REFLEXÕES SOBRE ALGUNS IMPORTANTESPARADIGMAS EDUCACIONAIS BRASILEIROS ......................................... 10
CAPÍTULO II - CONCEITOS E MOTIVOS QUE LEVARAM A NOVOSPARADIGMAS .................................................................................................. 152.1 Por que mudar? Os novos paradigmas e a Pós Modernidade ....................... 16
CAPÍTULO III - ILUMINANDO A PRÁTICA COM A TEORIA ................... 18
CAPÍTULO IV - ALTERNATIVAS DE AÇÃO PARA O FAZERPEDAGÓGICO ...................................................................................................................... 214.1 Trabalho com Projetos: um novo olhar sobre a escola ................................. 34
CONCLUSÃO ........................................................................................................................ 38
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ................................................................................. 39
BIBLIOGRAFIA CITADA ................................................................................................ 40
ANEXOS ............................................................................................................ 41
43
FOLHA DE AVALIAÇÃO
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
INSTITUTO DE PESQUISA SÓCIO- PEDAGÓGICAS
PÓS-GRADUAÇÃO “LATU SENSU”
Título da Monografia: ____________________________________________________
______________________________________________________________________
Data de entrega: ________________________________________________________
Avaliado por: _________________________________ Grau: __________________
Rio de Janeiro ______ de ___________ de 2002.
__________________________________________
Coordenador do Curso.