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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES / AVM
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
A INTELIGÊNCIA SOB A PERSPECTIVA DA NEUROCIÊNCIA -
UMA QUEBRA DE PARADIGMA NA EDUCAÇÃO DO SÉCULO
XXI
Ana Maria Kruel Cassano Negrão
ORIENTADOR: Prfª Marta Relvas
Rio de Janeiro 2017
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES / AVM
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
Apresentação de monografia à AVM como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Neurociência Pedagógica. Por: Ana Maria Kruel Cassano Negrão
A INTELIGÊNCIA SOB A PERSPECTIVA DA NEUROCIÊNCIA
UMA QUEBRA DE PARADIGMA NA EDUCAÇÃO DO SÉCULO
XXI
Rio de Janeiro 2017
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AGRADECIMENTOS
A Deus, pelo milagre da vida e pelo dom
destinado a cada um de nós. Aos meus pais,
Aloysio e Maria Luiza, e aos meus irmãos,
Maurício e Mariele, pela nossa união. Ao meu
marido, Luiz Felipe, pelo suporte dado neste
momento da minha vida acadêmica. À minha mãe
e ilustre professora, pela revisão e incentivo a
este trabalho. À conceituada Doutora e Mestre,
Marta Relvas, por me apresentar este novo saber,
orientando-me com dedicação.
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DEDICATÓRIA
Para a minha carinhosa mãe, Maria Luiza,
Professora e Mestre em Educação que, com seus
mais de 50 anos de magistério, demonstrou ser
uma mulher muito à frente do seu tempo.
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RESUMO
Pesquisas relevantes em Neurociência, a cada dia, apresentam excelentes
contribuições para diversas áreas do conhecimento humano e a área da
Educação deve ser a primeira a se beneficiar desse vasto conhecimento
científico.
Deste modo, a memória, a aprendizagem, as emoções e a motivação devem
ser objeto de estudo por aqueles que desejam aprofundar-se na vasta
complexidade funcional do cérebro humano como um sistema dinâmico, com o
objetivo de conhecer melhor seus mecanismos, decifrando seu funcionamento.
Com o progresso das ciências cognitivas, os educadores devem entender
intensamente o processo de aprendizagem, através de áreas multidisciplinares
onde o cérebro e o seu funcionamento têm papel central.
Estudos recentes têm apontado para novos ensinamentos sobre a
neuroplasticidade cerebral, demonstrando, deste modo, a relevância da
estimulação ambiental para o desenvolvimento do sistema nervoso.
Observam-se, também, os diversos tipos de inteligência, ainda que inexista
para a Ciência, atualmente, uma definição exata sobre o termo. Logo, cada vez
mais busca-se compreender a inteligência humana, a motivação, os estímulos
adequados, já se conhecendo que é possível aprender durante toda a
existência.
Palavras-chave: Cérebro – Educação – Inteligência - Neurociência
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METODOLOGIA
Inicialmente, e com o objetivo de enriquecer este trabalho, foi utilizada extensa
pesquisa bibliográfica de livros dos mais renomados cientistas, professores e
pesquisadores sobre o que há de mais atual acerca das Neurociências e
Educação.
Foram analisados artigos acadêmicos, entrevistas com estudiosos
conceituados, além de pesquisas, relatórios e sites de instituições
reconhecidas, assim como artigos de revistas consagradas como as
publicações da Mente e Cérebro.
Entre os autores estudados, foram pesquisados livros de: Buckingham &
Clifton, Cosenza & Guerra, Damásio, Davidson, Gardner, Kandel, Lent, Relvas,
Seligman, Snyder & Lopez.
Por meio de uma análise teórica, foram destacados valiosos conceitos sobre as
Neurociências e sua aplicabilidade na Educação, ao propiciar um olhar
reflexivo com o objetivo de quebrar paradigmas existentes.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I
O Funcionamento do Cérebro e sua Importância para o Educador 09
CAPÍTULO II
Inteligência e Talento 34
CAPÍTULO III
Educação, Perspectivas e o Futuro 52
CONCLUSÃO 69
ANEXO 71
BIBLIOGRAFIA 72
WEBGRAFIA 74
ÍNDICE 75
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INTRODUÇÃO
Desde a antiguidade, a curiosidade e o interesse pelo comportamento
humano foi um tema fundamental para estudiosos de diversos campos. A cada
século, a cada década, presencia-se uma evolução significativa nas ciências
humanas.
A célebre frase ‘só sei que nada sei’ estimula a todos nós a continuar a
fazer perguntas e, hoje em dia, a Neurociência, com suas recentes pesquisas
avançadas, traz um olhar para as mudanças fundamentais que precisam ser
feitas na área educacional.
O Capítulo I conceitua as Neurociências e versa sobre o funcionamento
do cérebro, enfatizando a emoção, a memória e o processo da aprendizagem,
que são questões fundamentais para o constante aprimoramento do educador,
além de apresentar as últimas pesquisas pioneiras que utilizam avançadas
tecnologias de imagem cerebral.
O Capítulo II versa sobre a concepção de inteligência e da ausência de
uma reposta completamente exata e definitiva, até para a Ciência, do que é
aceito a propósito das inteligências humanas até os dias atuais. Logo, é dado
enfoque ao que se acredita sobre os entendimentos do assunto até o presente
momento, ao expor a Teorias das Inteligências Múltiplas e o conceito de
Talento, de acordo com a contribuição dos recentes estudos da Psicologia
Positiva.
O Capítulo III faz uma explanação sobre a neuroplasticidade e sua
importância no processo de aprendizagem, apresenta uma correlação da
Neurociência com a Educação ao enfatizar a necessidade do educador
contemporâneo aprofundar-se na complexidade do funcionamento cerebral
bem como traz contribuições para que a escola de hoje e do futuro propicie
uma educação onde exista cuidado, confiança e respeito pela diversidade e
que chame a atenção do educador para que as crianças e os jovens também
tenham seus talentos e habilidades identificados e valorizados desde muito
cedo, de tal modo, que possam aprender durante a vida inteira.
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CAPÍTULO I
O FUNCIONAMENTO DO CÉREBRO E SUA
IMPORTÂNCIA PARA O EDUCADOR
“Aprender é a única coisa de que a mente nunca se cansa, nunca tem medo e nunca
se arrepende”.
Leonardo da Vinci, anatomista, cientista, escultor, inventor, pintor.
É considerado um dos maiores gênios da humanidade.
Neste capítulo, será abordado o que vem a ser a Neurociência e o
crescente interesse dessa disciplina pelo educador contemporâneo que, se
alinhado às novas demandas, está ávido por novas aprendizagens. São
abordados temas atraentes como emoção, memória e aprendizagem, além das
últimas pesquisas de Richard Davidson, diretor do Centro de Investigação de
Mentes Saudáveis na Universidade de Wisconsin-Madison, detentor das mais
avançadas tecnologias de imagem cerebral que quebrou um paradigma ao
constatar, através de pesquisas pioneiras, que o córtex também determina os
estados e humores emocionais, ao passo que durante muito tempo se pensou
que somente o sistema límbico fosse a sede cerebral das emoções.
1.1. As Neurociências e o Educador
Durante a 2ª metade do Século XX, o foco central da biologia foi o
gene. Atualmente, na primeira metade do século XXI, o foco moveu-se para as
neurociências e especialmente para a biologia da mente. Portanto, é
indispensável compreender os processos pelos quais os seres humanos
percebem, agem, aprendem e lembram conforme afirmam Kandel, Schwartz,
Jessel, Siegelbaum, Hudspeth (2014).
O encéfalo humano é uma rede de mais de 100 bilhões de células
nervosas individuais interconectadas em sistemas – circuitos neurais – que
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constroem a percepção do mundo externo, fixam a atenção e controlam a
maquinaria das ações humanas (KANDEL, SCHWARTZ, JESSEL,
SIEGELBAUM, HUDSPETH, 2014).
“Como o encéfalo – um órgão pesando pouco mais de 1kg – concebe o infinito, descobre novos conhecimentos e produz a notável individualidade dos pensamentos, sentimentos e ações humanos? ” (KANDEL et al., 2014)
A definição de Neurociência é, portanto, um conjunto de matérias
que estudam o sistema nervoso, surgiu da busca das bases cerebrais da
mente humana, seja ela expressa tão somente mediante a encarnação cerebral
de um espírito imaterial, como nas primeiras teorias ou puro resultado do
funcionamento do cérebro, segundo teorias recentes. (LENT, 2016).
Sob a ótica de Kandel, Schwartz, Jessel, Siegelbaum, Hudspeth
(2014), o objetivo das Neurociências é o entendimento de como o fluxo de
sinais elétricos através de circuitos neurais origina a mente – como se percebe,
age, pensa, aprende, lembra e, para estudá-los, é preciso desenvolver novos
enfoques e esquemas conceituais, a fim de para entender o comportamento de
sistemas que vão de células nervosas individuais ao substrato da cognição.
De acordo com Lent (2010), Neurociência, de fato, é no plural, ou
seja, Neurociências. Observa-se as cinco grandes disciplinas científicas: as
Neurociências molecular, celular, sistêmica, comportamental e cognitiva.
Sabe-se, no entanto, que os limites dessas especialidades não são
claros, o que se faz navegar entre uma disciplina e outra ao estudar o
funcionamento do sistema nervoso. Além dos neurocientistas, que realizam
pesquisas científicas em Neurociência e os profissionais de saúde
(neurologistas e psiquiatras, entre outros) que têm como propósito preservar e
restabelecer o desempenho funcional do sistema nervoso, atualmente outros
profissionais como engenheiros, especializados em informática e
programadores estão mais próximos das Neurociências, tendo em vista que
robôs mais modernos apresentam uma arquitetura projetada conforme as
considerações determinados das Neurociências. (LENT, 2010).
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Atualmente, educadores e pedagogos estão estudando o
funcionamento do sistema nervoso no que tange a capacidade de selecionar e
armazenar informações, característica essencial aos processos de
aprendizagem. (LENT, 2010).
Sob a ótica de Lent (2010), compreender o sistema nervoso exige
múltiplas abordagens e por esse motivo a multidisciplinaridade torna-se cada
vez mais imprescindível, uma vez que os trabalhos científicos modernos em
Neurociência compreendem a cooperação de diferentes especialistas.
Por conseguinte, de acordo com Carvalho (2011), é enfatizada a
necessidade de aprimorar o conhecimento do educador para aprender e
estudar “as ciências do cérebro”, pois a Neurociência é um tema atual que
deve estar presente como uma disciplina essencial à atualização do professor
que deve se aperfeiçoar cada vez mais sobre a forma como se aprende e como
se ensina.
Assim sendo, a memória, as emoções e os estímulos também
devem ser objetos de estudo para aqueles que desejam aprofundar-se na
complexidade funcional do cérebro como um sistema dinâmico para conhecer
melhor seus mecanismos e assim compreender seu funcionamento.
Segundo Carvalho (2011), uma vez entendido como o cérebro
funciona, é permitido uma melhor compreensão da aprendizagem e o
consequente aperfeiçoamento da transposição didática. Logo, enfatiza-se a
necessidade de revisão das estruturas curriculares dos cursos de formação de
professores, visando desta forma propiciar a interlocução entre neurociência,
ensino e aprendizagem.
Deste modo, transferir para a educação a concepção da
aprendizagem como acoplamento estrutural envolve uma nova visão do
aprender, a qual passa a estar fundamentada no fato de que experiências de
aprendizagem em contextos pedagógicos provocam alterações na estrutura do
indivíduo. (ASSMANN apud CARVALHO, 2011).
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É essencial que o educador possa conhecer cada vez mais sobre as
neurociências com o objetivo de compreender a importância desse novo saber
na adequação de metodologias de ensino. A compreensão do cérebro é crucial
para o ato pedagógico, emergindo daí a necessidade de se considerar um novo
saber disciplinar fundamentado nos conhecimentos neurocientíficos, os quais
poderiam ser vinculados às disciplinas direcionadas à aprendizagem humana.
Logo, a prioridade deveria ser a de acrescentar informações científicas e
subsidiar futuras ações práticas, não se constituindo exclusivamente em mais
um saber disciplinar, mas em um saber útil para a prática profissional da
docência. (CARVALHO, 2011).
Portanto, enfatiza-se que, desde os tempos mais remotos, a
compreensão do comportamento humano foi central para as culturas civilizadas
(KANDEL, SCHWARTZ, JESSEL, SIEGELBAUM, HUDSPETH, 2014), fazendo
com que o interesse pelo conhecimento humano não se esgote.
1.2. Emoção, Memória e Aprendizagem
1.2.1. Emoção
O que é, precisamente, emoção? Alegria, compaixão, tristeza, nojo,
medo e raiva são exemplos de emoções.
Não é fácil definir o conceito de emoção e é frequente encontrar-se
vários conceitos diferentes conforme o enfoque dado de cada autor ou escola
de pensamento.
Frequentemente, o termo emoção é usado, de maneira imprecisa,
de duas formas. Refere-se a respostas fisiológicas a certos estímulos como
que quando em situação de perigo, os músculos se tencionam e aumentam os
batimentos cardíacos, e o indivíduo também pode sentir-se amedrontado. Mas
esse termo também se refere a experiências conscientes, designados
sentimentos, que habitualmente, mas não sempre acompanham essas
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respostas do organismo. Logo, é imprescindível diferenciar esses dois estados
(KANDEL et al., 2011).
Já o termo sentimento se refere à experiência consciente dessas
alterações somáticas e cognitivas. Destarte, sentimentos são significados que o
encéfalo cria para representar os fenômenos fisiológicos gerados pelo estado
emocional. (KANDEL et al., 2011).
Assim sendo, o termo emoção acena ao primeiro desses dois
estados: o conjunto de respostas fisiológicas que acontece mais ou menos
inconscientemente quando o encéfalo detecta certas situações desafiadoras.
Essas respostas fisiológicas automáticas ocorrem tanto no encéfalo quanto no
resto do corpo. No encéfalo, compreendem mudanças nos níveis de alerta e
nas funções cognitivas, como atenção, processamento da memória e
estratégias de decisão. (KANDEL et al., 2011).
Sob a ótica de Kandel, Schwartz, Jessell, Siegelbaum, Hudspeth
(2011), emoções são respostas comportamentais e cognitivas automáticas,
geralmente inconscientes, disparadas quando o encéfalo detecta um estímulo
significativo, positiva ou negativamente carregado. Sentimentos são as
percepções conscientes das respostas emocionais.
De acordo com Lent (2016), do ponto de vista biológico, a emoção
pode ser definida como um conjunto de reações químicas e neurais
subjacentes à organização de certas respostas comportamentais básicas e
necessárias à sobrevivência dos animais.
Este conceito pode ser amplo e incompleto, mas versa sobre dois
enfoques importantes:
� A emoção possui um substrato neural que organiza tanto as
respostas aos estímulos emocionais quanto a própria
percepção da emoção.
� As emoções têm uma função biológica, ou seja, são
importantes para que os animais apresentem respostas
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comportamentais adequadas a certas situações, aumentando
suas chances de sobrevivência.
Esta última observação é importante e pode ser observada mesmo
no caso de emoções negativas. Se um animal não apresentasse respostas
comportamentais de medo diante de um predador quando ele teria que
inevitavelmente fugir ou lutar, as chances de sobrevivência seriam mínimas e
dificilmente esse animal chegaria à idade necessária para que seus genes
fossem passados adiante. No caso dos seres humanos, o fato também é
verdadeiro, pois é possível perceber quais as emoções que fazem alterar o
comportamento para aumentar as chances de sucesso. Exemplo: se não nos
sentirmos frustrados ao receber uma nota baixa em uma prova, será mais difícil
que nosso comportamento seja analisado e que nos esforcemos para estudar
mais no futuro. (LENT, 2016).
Este autor enfatiza que, em seres humanos, os sistemas neurais
mais sofisticados admitem respostas bem variadas, promovendo, portanto, a
adaptação ao ambiente. Assim sendo, o comportamento emocional pode ser
mais criativo e menos previsível do que o descrito por outros animais.
Consequentemente, para os humanos a emoção tem uma dimensão subjetiva
que a transforma em uma experiência singular, diferenciando-se da dimensão
comportamental observável demonstrada para os outros animais.
Ainda de acordo com Lent (2016), as emoções humanas podem ser
classificadas em três tipos:
1. Emoções primárias.
2. Emoções secundárias.
3. Emoções de fundo.
As emoções primárias são consideradas inatas ou não-aprendidas,
ou seja, são emoções comuns a todos os indivíduos da espécie humana,
independentemente de fatores socioculturais.
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Não obstante as divergências entre os estudiosos, pelo menos seis
emoções são consideradas primárias: alegria, tristeza, medo, nojo, raiva e
surpresa.
Charles Darwin (1809-1882), em sua obra intitulada ‘A expressão
das emoções no homem e nos animais’, apresenta um dos primeiros relatos
desse tipo de emoção. Ele observou que certos padrões de expressões
emocionais, notadamente as faciais, eram semelhantes entre as diferentes
culturas, o que indicava uma natureza hereditária, não-aprendida, dessas
expressões. (LENT, 2016).
Segundo Lent (2016), as expressões faciais são um meio pelo qual
os estados emocionais internos e intenções “ocultas” dos indivíduos se tornam
acessíveis como sinais externos, exercendo um papel importante na cognição
social.
As emoções secundárias são mais complexas e dependem de
fatores socioculturais. Culpa e vergonha são exemplos de emoções que
modificam vastamente de acordo com a cultura, com a experiência anterior e
com a época em que o indivíduo faz parte.
As emoções de fundo, que foram mais recentemente propostas pelo
famoso neurologista português António Damásio, estão relacionadas com o
bem-estar ou com o mal-estar, com a calma ou com a tensão. Os estímulos
que induzem essas emoções são geralmente internos, gerados por processos
físicos ou mentais contínuos que levam a um estado de tensão ou relaxamento,
fadiga ou energia, bem-estar ou mal-estar, ansiedade ou apreensão.
Sob a ótica de Damásio (2011), inicialmente é importante distinguir
os termos “emoção” e “sentimento” à luz da neurobiologia atual.
“O que é um sentimento? O que me leva a não usar indistintamente os termos ‘emoção’ e ‘sentimento’? Uma das razões é que, apesar de alguns sentimentos estarem relacionados com as emoções, existem muitos que não estão: todas as emoções originam sentimentos, se se estiver desperto e atento, mas nem todos os sentimentos provêm de emoções.
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Chamo sentimentos de fundo (background) aos que não têm origem nas emoções”. (DAMÁSIO, 2012, p.138)
Emoções são programas de ações complexos e em grande termo
automatizados, concebidos pela evolução. As ações são concluídas por um
programa cognitivo que inclui determinadas ideias e modos de cognição, mas o
mundo das emoções é nomeadamente produzido de ações realizadas no
corpo, desde expressões faciais e posturas até mudanças nas vísceras e meio
interno (DAMÁSIO, 2011).
Os sentimentos emocionais são as percepções compostas daquilo
que ocorre no corpo e na mente quando uma emoção está em andamento. No
que diz respeito ao corpo, os sentimentos são imagens de ações, e não ações
propriamente ditas. O mundo dos sentimentos é feito de percepções
executadas em mapas cerebrais. Em resumo, enquanto as emoções
estabelecem ações seguidas por ideias e determinados modos de pensar, os
sentimentos emocionais são sobretudo percepções daquilo que o corpo faz
durante a emoção, com percepções do estado de espírito durante esse mesmo
lapso de tempo. (DAMÁSIO, 2011).
1.2.2. Memória e Aprendizagem
A memória e a aprendizagem estão intrinsecamente inter-
relacionados e neste subtema serão abordadas resumidamente suas principais
formas e seus mecanismos neurais, temas de grande importância para o
conhecimento do educador ao estudar as neurociências.
De acordo com Relvas (2010), memória e aprendizagem caminham
juntas. A aprendizagem é a modificação do comportamento, como resultado da
experiência ou aquisição de novos conhecimentos acerca dos meios, e a
memória é a retenção deste conhecimento por um tempo determinado.
Segundo Lent (2010), a memória é a capacidade que tem o homem
e os animais de armazenar informações que possam ser recuperadas e
utilizadas posteriormente. Difere da aprendizagem, pois esta é tão-somente o
processo de aquisição das informações que irão ser armazenadas.
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São vários os processos da memória. O primeiro é a aquisição –
aprendizagem – em seguida a retenção durante tempos variáveis. A retenção
por tempos curtos pode ser transformada em retenção de longa duração pelo
processo da consolidação da memória. Nos dois casos, porém, pode haver
evocação (lembrança) ou esquecimento das informações memorizadas (LENT,
2010).
Lent (2016) afirma que é mais sensato falar de memórias e não de
memória, já que existem tantas memórias quantas experiências possíveis.
Quiçá, seja mais adequado reservar o uso da palavra memória para denominar
a capacidade geral do sistema nervoso central de adquirir, guardar e evocar
informações e usar a palavra memórias para designar cada uma ou cada tipo
delas que será demonstrado neste subtema mais adiante.
De acordo com Lent (2016), a palavra memória se refere ao
processo mediante o qual se adquire, forma, conserva e evoca informação. A
fase da aquisição é comumente chamada aprendizagem, enquanto a evocação
recebe também as denominações expressão, recuperação e lembrança.
É importante considerar que apenas se consegue lembrar o que, de
certa forma, é gravado, aquilo que é aprendido. É possível afirmar que os seres
humanos são fruto do que se recorda, pois não é possível comunicar algo que
não se conhece. O acervo das memórias faz com que cada pessoa seja o que
é, um ser para o qual não existe outro semelhante. Ao mesmo tempo, pode-se
dizer que os indivíduos são o que se resolve esquecer, pois o esquecimento
voluntário estabelece um processo ativo em si mesmo que abrange uma
prática da memória: o cérebro é capaz de lembrar quais são as memórias que
não se quer evocar e assim realiza um esforço frequentemente inconsciente
para fazê-lo. Com atenção elege as más lembranças e evita evocá-las (LENT,
2016).
Segundo Lent (2016), a memória humana é parecida com as de
outros mamíferos no que se refere a seus mecanismos principais, mas não ao
seu conteúdo. Um ser humano é capaz de se lembrar de melodias e letras de
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músicas. Já um animal não. Os seres humanos empregam a linguagem para
adquirir, codificar, guardar e evocar memórias, mas as outras espécies não.
De acordo com Lent (2016), as memórias são codificadas por
neurônios, armazenadas em redes neurais e evocadas por essas mesmas
redes ou por outras. São moduladas pelas emoções, pelo nível de consciência
e pelos estados de humor. Todos sabem como é fácil aprender ou evocar algo
quando se está alerta e com bom humor e também como é difícil aprender
qualquer coisa, ou até mesmo lembrar de uma pessoa ou algo quando se está
ansioso, cansado ou deprimido.
Tendo como ponto de partida esta afirmação, é fundamental para o
educador entender este conceito para uma melhor prática pedagógica, com o
objetivo de ensinar conhecendo a importância das emoções de bem-estar para
provocar e manter a atenção e o bom estado de humor.
Levando-se em consideração o conteúdo das memórias, é possível
diferenciar dois grandes tipos de memórias: as declarativas ou explícitas e as
memórias procedimentais ou implícitas, também designadas como hábitos, e
que são evocadas de forma mais automática. Portanto, de acordo com Lent
(2016), seguem os tipos e subtipos de memórias e suas principais
características:
� Memória declarativa: contém informação adquirida de
maneira explícita e que há consciência. Subdivide-se em dois
tipos:
1. Memória episódica: contém informação de fatos e
eventos particulares de um contexto determinado.
Permite a codificação de informação e relativa a
associações e eventos de caráter pessoal.
2. Memória semântica: contém informação de fatos e
eventos que é independente do contexto em que foi
adquirida. Permite a codificação e conhecimentos
abstratos sobre o mundo.
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� Memória procedimental: contém informação que não se tem
consciência de possuir e que foi adquirida de forma implícita:
1. Aprendizado motor (exemplo, dirigir um automóvel).
2. Condicionamento e habituação.
De acordo com Lent (2016), do ponto de vista funcional, há um tipo
de memória que é crítica no momento da aquisição e da evocação de toda e
qualquer memória: a memória de trabalho ou operacional. A título de
comparação, a memória de trabalho representa a função que a memória RAM
(random-access memory) desempenha em um computador: manter a
informação viva disponível enquanto está sendo percebida ou processada. A
memória de trabalho não deixa traços: depende somente da atividade neuronal
on-line.
Lent (2016) afirma que as memórias que duram no tempo
denominam-se memórias de curta e de longa duração. As de curta duração
duram entre trinta e sessenta minutos. Já as de longa duração persistem
durante muitas horas, dias ou até anos, denominando-se também memórias
remotas.
Após um breve resumo sobre a definição da memória, tipos e
subtipos, se faz necessário definir o conceito de aprendizagem.
Sob a ótica de Lent (2010), o repertório de aptidões mnemônicas de
tipos diferentes inicia com a obtenção de informações, ou seja, com a entrada
dos dados escolhidos para o sistema de armazenamento da memória. O
processo de aquisição das novas informações que vão ser guardadas na
memória é chamado aprendizagem. Através dele é presumível ser capaz de
orientar o comportamento e o pensamento. A aprendizagem pode ser vista
como um conjunto de comportamentos que viabilizam os processos
neurobiológicos e neuropsicológicos da memória.
“A aprendizagem é um fenômeno extremamente complexo, envolvendo aspectos cognitivos, emocionais, orgânicos, psicológicos, sociais e culturais. A aprendizagem é resultado do desenvolvimento de aptidões e de conhecimentos, bem como
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da transferência destes para novas situações”. (RELVAS, 2010 p. 91)
Conforme Relvas (2010), segundo a definição do dicionário Aurélio:
aprendiz (1) + agem (2), onde (1) = aquele que aprende (tomar conhecimento)
e (2) = ação ou resultado de ação, sendo portanto, aprendizagem o ato de
tomar conhecimento, a ação de aprender.
Segundo Relvas (2010), aprender está relacionado, entre outros
fatores, a um clima emocional em que o processo de compartilhar saberes
promove o desenvolvimento do indivíduo por meio da qualidade construída da
relação.
De acordo com Relvas (2010), existem cinco fatores que influenciam
o processo de aprendizagem:
1. Sensação: é o nível mais primitivo do comportamento,
referindo-se exclusivamente à ativação de estruturas
sensoriais. É a partir das sensações que o indivíduo percebe
o mundo ao seu redor.
2. Percepção: é constituída na tomada de consciência relativa à
sensação em progresso. A eficiência da percepção depende
de que o aparato neurológico seja capaz de converter,
adequadamente, as sensações em impulsos elétricos e por
meio da percepção que ocorrerá a formação das imagens.
3. Memorização: a competência que o homem e os animais
apresentam de armazenar informações que possam ser
recuperadas e usadas posteriormente chama-se memória.
Durante a aquisição dos eventos ocorre a seleção dos fatos
mais marcantes, que focalizaram atenção sensorialmente ou
foram priorizados. O registro dos aspectos das experiências
vividas e as informações recebidas: tudo o que é percebido
está relacionado ao processo de memorização.
4. Atenção: é uma das mais fundamentais competências
cognitivas que garantirá o sucesso dos estudantes. É uma
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habilidade cognitiva indissociável de um conjunto de funções
cerebrais controladas pelo lobo frontal denominadas de
funções executivas, que são funções mentais superiores e
complexas que habilitam o indivíduo a tomar decisões e
ações orientadas no processo da aprendizagem.
5. Motivação: o diferente interesse percebido entre os
estudantes permite a aceitação que nem todos fazem a
mesma coisa pelas mesmas razões, e é nessa diversidade
que reside a fonte de entendimento dos aspectos que buscam
a motivação dos seres humanos.
Como as pessoas são diferentes umas das outras, em função ao
aspecto biológico, à genética e ao emocional, os bons estímulos recebidos e as
vivências adquiridas ao longo das etapas do amadurecimento fazem a
distinção dos enfoques que estimulam e determinam a busca pela
aprendizagem (RELVAS, 2009).
Sob a ótica de Relvas (2010), e segundo as pesquisas sobre
Neurociência Cognitiva, destacam-se alguns fatores que são essenciais para
que a aprendizagem ocorra: a memória, a atenção e o interesse.
Por conseguinte, seguem algumas dicas interessantes apresentadas por
este autor para os educadores reconhecerem como o cérebro assimila as
informações para transformá-las em aprendizado e conhecimento.
1. Frequência: os caminhos neurais necessitam ser construídos e
crescer fortalecidos e consolidados por uma exposição repetida à
aprendizagem.
2. Intensidade: aprendizagem requer prática rigorosa. Apenas se
consegue construir uma consolidação ou fortalecer as conexões
neurais para a habilidade de um assunto praticando
profundamente em determinado período de tempo.
3. Treinamento conectado: a aprendizagem solicita conexões
neurais fortes já existentes para serem conectadas às outras
novas redes de informações que surgirão. Essas conexões
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neurais devem ser diversificadas e viabilizadas em diferentes
tipos de recursos e habilidades relacionadas aos significados já
existentes.
4. Adaptabilidade: significa que o assunto deve ser adaptado à
situação da aprendizagem da necessidade do grupo, logo, ao
potencial de aprendizagem de cada um. Essa adaptação deve ser
organizada com recursos e metodologias pedagógicas diversas,
considerando-se que as pessoas são diferentes e respondem aos
estímulos desigualmente e que têm uma neuropsicofisiologia
própria.
5. Motivação e atenção: são fatores que alimentam o interesse na
aprendizagem. Abordagens diferenciadas nutrem os estudantes
envolvidos na atividade sugerida, desde que o tema desperte a
vontade de aprender. Portanto, a tarefa do educador é expor o
encantamento do assunto com afeto e emoção e, assim,
correlacionar o tema com a vida prática do estudante. Atividades
lúdicas podem ser utilizadas para dar significado à questão.
Compreende-se, portanto, que todas as pessoas são capazes de
aprender, e evidenciam isso por meio de mudanças de comportamento em
resposta às influências ambientais.
1.3. O Cérebro Emocional
O conceituado Richard J. Davidson PH.D. é professor e diretor do
Centro de Investigação de Mentes Saudáveis na Universidade de Wisconsin-
Madison. Ele ressalta que uma das grandes virtudes desse Centro é o fato de
não limitar o trabalho exclusivamente às pesquisas e sim aplicar os resultados
dessas investigações com o objetivo de fazer a diferença na vida das pessoas.
Logo, foi elaborado um currículo voltado aos alunos da pré-escola e do ensino
fundamental, especificamente, para incentivar a gentileza e a atenção, com o
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propósito de avaliar o impacto desse treinamento no desempenho acadêmico,
na concentração, na empatia e na cooperação.
Sua obra intitulada O Estilo Emocional do Cérebro - Como o
funcionamento cerebral afeta sua maneira de pensar, sentir e viver - escrita em
parceria com a jornalista Sharon Begley, é o resultado de mais de 30 anos de
pesquisa da disciplina que ele chama de “Neurociência Afetiva”, que é o estudo
dos mecanismos cerebrais que estão por trás das emoções e a busca por
formas de melhorar a sensação de bem-estar e, também como as qualidades
mentais positivas podem ser estimuladas.
Através dos estudos de Richard J. Davidson, foi possível quebrar um
paradigma, uma questão que já estava estabelecida. Há algumas décadas
atrás, acreditava-se que as emoções estariam situadas, unicamente, no
sistema límbico, ao passo que Davidson entendia que as emoções também
estavam localizadas no córtex pré-frontal onde estão as funções corticais mais
elevadas, a área mais avançada em termos evolutivos, fundamentais para as
emoções (DAVIDSON E BEGLEY, 2013).
É de suma importância entender que cada dimensão do estilo emocional
está associada a um padrão específico de atividade cerebral. Elas estão
relacionadas com uma atividade biológica mensurável, que ocorre sobretudo
no córtex e no sistema límbico. Por muito tempo se pensou que o sistema
límbico fosse a sede cerebral das emoções. No entanto, o córtex também
determina os estados e humores emocionais (DAVIDSON E BEGLEY, 2013).
Davidson e Begley (2013) afirmam que a classificação das seis
dimensões é fruto de mais de trinta anos de pesquisas de Richard J. Davidson
em neurociência afetiva. Elas correspondem a propriedades do cérebro e a
seus modos de funcionamento e são imprescindíveis a qualquer modelo das
emoções e do comportamento humano. Somente através de experimentos
metódicos e rigorosos é possível desvendar o funcionamento do mundo e dos
seres humanos.
24
A obra O Estilo Emocional do Cérebro, como o funcionamento
cerebral afeta sua maneira de pensar, sentir e viver aborda a investigação
científica de Richard Davidson, desde seus tempos de estudante de psicologia,
sobre as interações do córtex pré-frontal e as amígdalas cerebrais na
regulação das emoções. O autor comprovou em estudos realizados com
meditadores e monges budistas, que é possível modificar o cérebro através da
prática de exercícios e meditação.
Para o educador sintonizado com o mundo contemporâneo é
importante conhecer os estilos emocionais identificados pelo autor, através de
pesquisas científicas, com a finalidade de compreender que cada pessoa tem
um cérebro singular e, portanto, especial.
Sob a ótica de Davidson e Begley (2013), cada ser humano é
caracterizado pelo seu “estilo emocional”.
Contudo, antes de resumir os componentes do estilo emocional, os
autores explicam de que forma o estilo emocional se relaciona com outros
sistemas de classificação e distinguem conceitos esclarecendo a grande
diversidade da existência humana: estados e traços emocionais, personalidade
e temperamento.
� Estado emocional: é a menor e mais efêmera das unidades
das emoções. Geralmente, dura poucos segundos e tende a
ser desencadeado por uma experiência. Enfatiza-se que os
estados emocionais também podem aparecer simplesmente
através da atividade mental como sonhar acordado, na
introspecção e quando se antevê o futuro.
Independentemente de haverem sido desencadeados através
de experiências mentais ou do mundo real, os estados
mentais tendem a se dissipar, deixando espaço para novos
estados.
� Humor: é um sentimento que prossegue e se mantém
consistente ao longo de minutos, de horas, ou até de dias.
25
� Traço emocional: é o que caracteriza uma pessoa não só
durante dias, mas também durante anos.
� Personalidade: consiste em um conjunto de qualidades que
compreendem traços e estilos emocionais específicos.
� Estilo emocional: é uma maneira consistente de responder
às experiências de vida. É dirigido por circuitos cerebrais
específicos e identificáveis e pode ser medido por meio de
métodos laboratoriais objetivos. O estilo emocional influencia
a possibilidade de apresentar certos estados emocionais,
traços e humores. Os estilos emocionais têm correlação muito
mais próxima como sistemas cerebrais subjacentes do que os
traços e, por isso, podem ser considerados os átomos da vida
emocional, seus elementos constituintes fundamentais.
Segundo Davidson e Begley (2013), a Psicologia manifesta grande
interesse em designar sistemas de classificação, alegando que há quatro tipos
de temperamento, cinco componentes da personalidade e diversos tipos de
caráter. No entanto, esses sistemas não têm grande validade científica, pois
não se baseiam na análise rigorosa dos mecanismos cerebrais que existem por
trás deles. É importante esclarecer que qualquer assunto que esteja
relacionado ao comportamento humano, aos sentimentos e às formas de
pensar surgem no cérebro. Assim sendo, os sistemas de classificação também
devem se basear no cérebro, logo, ao estilo emocional.
De acordo com Davidson e Begley (2013), o estilo emocional apresenta
seis dimensões que derivam de descobertas da pesquisa neurocientífica
moderna e são:
1. Resiliência: velocidade com que se recupera das adversidades.
2. Atitude: por quanto tempo se consegue manter as emoções
positivas.
3. Intuição social: facilidade com que se capta os sinais sociais
emitidos pelas pessoas ao redor.
26
4. Autopercepção: capacidade de perceber as sensações corporais
relacionadas com as emoções.
5. Sensibilidade ao contexto: competência para regular as
respostas emocionais para que haja correspondência ao contexto
social existente.
6. Atenção: quanto aguçada e clara é a concentração.
Estilos emocionais são constelações de reações e estratégias
emocionais que se distinguem segundo o tipo, a intensidade e a duração. As
seis dimensões nasceram de estudos sistemáticos sobre as bases neurais e
têm, cada uma delas, uma área neural específica e identificável, um bom sinal
de que são dimensões reais e não somente construtos teóricos. Por haverem
diversas formas de combinar as seis dimensões, existem incalculáveis estilos
emocionais e, por isso, cada pessoa tem um estilo singular (DAVIDSON E
BEGLEY, 2013).
De acordo com Davidson e Begley (2013), existe uma pergunta
essencial a ser feita. De que forma o cérebro cria os diferentes estilos
emocionais? Esses estilos estão inscritos fisicamente nos circuitos neurais ou
há algo que se possa realizar para mudá-los e, assim, modificar a forma como
se lida com os prazeres e eventualidades da vida?
No capítulo III deste estudo, será abordado um subtema específico
sobre a neuroplasticidade, devido a relevância desse tema para o educador.
No entanto, é necessário já antecipar e afirmar, segundo Davidson e Begley
(2013), que o estilo emocional deriva de circuitos cerebrais criados, logo no
início da vida, pelos genes herdados dos pais e também pela experiência
vivida. Mas esse circuito não se conserva fundamentalmente, ainda que o estilo
emocional permaneça muito estável ao longo do tempo, podendo ser
transformado por experiências aleatórias e também por um esforço consciente
e intencional em alguma fase da vida, pelo aperfeiçoamento determinado de
qualidades e de hábitos mentais específicos, através de exercícios que serão
detalhados adiante.
27
De acordo com os estudos dos autores, descobriu-se que cada pessoa é
uma combinação das seis dimensões, deste modo, uma união exclusiva de
como se percebe o mundo e se reage a ele.
Davidson e Begley (2012) recomendam alguns exercícios inspirados na
neurologia para, caso se deseje, modificar seu estilo emocional. Ressalta-se,
contudo, que o objetivo dos autores não é argumentar que todas as pessoas
devam se mover para o ponto médio de cada dimensão, mas que é possível
modificar, por exemplo, a dimensão Atenção ou qualquer outra se isso estiver
prejudicando o alcance dos objetivos desejados. A capacidade de regular o
estilo em cada uma das dimensões de acordo com a própria vontade possibilita
a capacidade de se responder às situações apresentadas eficazmente. É fato
que existem limites para essa mudança, sendo importante esclarecer que
nenhum extremo do espectro é, basicamente, melhor ou pior que o seu oposto.
É certo considerar quem se é, o que funciona, os valores e as circunstâncias
de cada um.
Uma outra alternativa assinalada na obra “O Estilo Emocional do
Cérebro”, sugere que ao invés de modificar o estilo emocional, é possível
promover mudanças no ambiente em que se está inserido para que ele, sim,
seja mais adequado ao estilo emocional de cada indivíduo. Como exemplo,
cita-se uma pessoa que não sendo sensível ao contexto social pode encontrar
dificuldades de se comportar adequadamente em sua rotina, então poderia
escolher um emprego em regime de home office. Entretanto, sabe-se que
essas adaptações nem sempre são possíveis.
Nesse trabalho, se optou por destacar, apenas, alguns exercícios
descritos para aqueles que querem ir em direção a determinada dimensão.
Como por exemplo, se determinada pessoa é desatenta e se ela entender que
ser mais atenta é útil em determinadas situações, ela irá se beneficiar de tais
práticas. É necessário, contudo, primeiramente, conhecer o estilo emocional e,
caso se deseje, modificá-lo. O Educador poderia se beneficiar de tais práticas,
bem como qualquer outro profissional que se interesse pelo assunto.
28
De acordo com Davidson e Begley (2013), seguem alguns exercícios
para cada uma das seis dimensões:
1. Atitude: “Técnica chamada terapia do bem-estar”, criada por Giovanni
Fava, da Universidade de Bolonha. Esse exercício serve para fortalecer
as conexões entre o córtex e o estriado ventral.
� Escreva uma característica positiva que observa em si
mesmo e uma de outra pessoa com quem interaja
habitualmente.
� Expresse gratidão muitas vezes.
� Elogie as outras pessoas repetidamente.
2. Autopercepção: é uma das estratégias mais eficazes para aumentar a
atividade da ínsula, tornando-se, de tal modo, mais auto perceptivo,
através da prática da meditação da consciência plena ou Mindfulness1
como é atualmente mais conhecida. Em 2008, foi realizado um estudo
em que se revelou que pessoas que haviam praticado a meditação da
consciência plena todos os dias durante, aproximadamente, 8 anos
apresentavam uma ínsula maior do que indivíduos do mesmo sexo e
idade que não meditavam. Orienta-se que para as melhores instruções
para a prática dessa técnica sejam através de cursos de redução do
estresse ensinada em centros médicos existentes na atualidade, mas é
possível, se desejar, começar por conta própria ao fazer exercícios de
respiração.
� Escolha o momento do dia em que estiver mais
acordado e alerta. Sente-se no chão ou em uma
cadeira, mantendo a coluna ereta e uma postura
relaxada, porém erguida, de forma a não ficar com
sono.
� Concentre-se na respiração e nas sensações
provocadas no corpo. Observe como o abdômen se
movimenta a cada inspiração e expiração.
1 Termo em inglês para também designar atenção plena, consciência, observação vigilante.
29
� Se concentre na ponta do nariz, atentando as
diferentes sensações a cada respiração.
Ao notar que está distraído por outros pensamentos e sensações que
possam ter aparecido, meramente volte à concentração novamente para a
respiração. É possível praticar com os olhos abertos ou fechados, o importante
é se sentir confortável. É recomendado praticar por cinco a dez minutos de
cada vez, duas vezes ao dia e, assim que se sentir mais confortável, é possível
aumentar a duração das sessões. Quando perceber que já se domina a prática
da atenção plena, deixe de usar a respiração como âncora de atenção e admita
que o foco repouse em qualquer que seja o conteúdo dominante da mente
consciente a cada momento, seja um pensamento, um sentimento, uma
sensação corporal. Adquira a percepção do que está acontecendo sem pensar
no fato e também sem fazer julgamentos.
Em suma, a meditação da consciência plena tem um efeito regulador
sobre a mente.
3. Atenção: para melhorar a concentração também se recomenda a
meditação da consciência plena e uma vez já se familiarizado com essa
técnica, é recomendada a meditação de atenção focada ou
unidirecional. Em pesquisas recentes realizadas em laboratório, se
revelou que os praticantes experientes, ao se concentrarem em um
determinado objeto, foram atingidos níveis mais altos de ativação nos
córtices pré-frontal e parietal.
� Em um ambiente no qual não haja distrações, sente-se
tranquilamente com os olhos abertos. Encontre um
objetivo pequeno, como uma moeda. É importante que
o objeto de atenção seja visual e não a própria
respiração ou imagem corporal ou outros objetos
mentais.
� Concentre toda a atenção no objeto. Fixe os olhos nele.
� Se a atenção perambular, deve ser trazida calmante ao
objeto.
30
Essa técnica deve ser realizada diariamente, inicialmente, durante dez
minutos. Ao se perceber que é possível manter a concentração durante a maior
parte do tempo, aumente o tempo da prática até chegar a uma hora.
4. Resiliência: para se recuperar mais rapidamente das adversidades,
também é recomendada a meditação da consciência plena, por
promover equilíbrio emocional e enfraquecer as associações em série
que fazem pensar, de forma obsessiva, em problemas e desse modo
paralisar frente aos obstáculos. Essa meditação fortalece as conexões
entre o córtex pré-frontal e a amígdala, promovendo um equilíbrio que
visa a evitar um círculo vicioso.
� Além da meditação, o treinamento em reavaliação
cognitiva pode ajudar. Essa técnica, que é uma forma
de terapia cognitiva, ensina a repensar as adversidades,
de forma que passam a acreditar que elas não são
extremas nem duradouras. Complementa-se que a
terapia cognitiva deve ser realizada por um profissional
da área de saúde capacitado, como psicólogos e
terapeutas.
5. Intuição social: uma pessoa socialmente intuitiva tem altos níveis de
ativação do giro fusiforme e a atividade da amígdala que varia de baixa
a moderada, o que confere a habilidade de captar sinais sociais muito
sutis. Para melhorar a intuição social, é imprescindível aumentar a
atividade do giro fusiforme e diminuir a atividade da amígdala. Ainda que
a pesquisa sobre a eficácia desse treinamento para melhorar a
capacidade de captar sinais sociais seja recente, o primeiro passo é
prestar atenção. Para detectar as pistas sociais, é preciso se concentrar
nos acontecimentos ao redor: o tom da voz, a linguagem corporal, a
expressão facial. Trata-se, basicamente, de uma questão de prática.
� Inicia-se a prática com estranhos. Em público, deve
escolher um grupo de amigos para observá-los com
discrição. A atenção deve ser prestada, sobretudo, na
face que transmite diversas informações. Lembre-se de
31
olhar para o rosto das pessoas ao observá-las e,
principalmente, ao interagir.
� Aproxime-se discretamente para ouvir a conversa. A
recomendação é que se faça a prática em um local
onde estejam presentes várias pessoas. Deve ser
observado se o tom de voz corresponde à linguagem
corporal dos envolvidos dos indivíduos além da
expressão facial.
� Quando houver o entendimento que de já é capaz de
observar o que as pessoas estão sentindo, recomenda-
se a prática com outros grupos.
Esse simples exercício poderá aumentar a sensibilidade quanto aos
sinais sociais.
� Sensibilidade ao contexto: pessoas muito antenadas com o
contexto tendem a ter fortes conexões entre o hipocampo e áreas do
córtex pré-frontal que controlam as funções executivas e registram as
memórias de longo prazo no neocórtex. Encontra-se poucas
pesquisas sobre como fortalecer ou enfraquecer essas conexões. As
melhores pistas vêm de estudos sobre o transtorno do estresse pós-
traumático, principalmente, a “terapia de exposição", que consiste em
uma exposição, progressiva, mais direta a sinais específicos
associados a um trauma, todavia em um contexto seguro. Com base
no sucesso da terapia de exposição, os autores supõem que uma
estratégia geral para melhorar a sensibilidade ao contexto é a
habituação gradual aos sinais que deixam as pessoas mais ansiosas
ou irritadas.
� Inicia-se com uma respiração simples com os olhos
fechados, prestando atenção na respiração,
contando a duração de cada respiração e expiração.
Após a contagem de sucessivas respirações,
aumenta-se a duração de seu ciclo respiratório, para
que dure um segundo a mais. Deve-se aumentar a
32
duração enquanto se sentir confortável e então se
mantém essas respirações prolongadas por cinco
minutos.
� Observa-se se a inspiração e a expiração têm a
mesma duração. Se uma delas for mais longa,
procura-se prolongar a outra, para que durem o
mesmo tempo. Deve se prosseguir por cinco
minutos e então pode abrir os olhos.
Sob a ótica de Davidson e Begley (2013), todos os exercícios propostos
trabalham a mente para modificar o cérebro devido a capacidade de alterar os
sistemas neurais que existem na base das seis dimensões do estilo emocional.
A decisão de modificar o estilo em qualquer das dimensões, requer
análise cautelosa de cada pessoa. É importante conhecer o perfil emocional de
si próprio e dos demais com a finalidade de se viver a vida que se deseja e por
esse motivo a relevância do autoconhecimento.
No livro O Estilo Emocional do Cérebro, no capítulo III – Avaliando seu
Estilo Emocional, é oferecido um assessment2 onde é possível avaliar o seu
estilo emocional sendo possível, portanto, analisar onde se encontra situado
em cada dimensão (através dos extremos, lado positivo ou negativo). Basta
seguir as instruções e responder aos questionários.
Qualquer que seja o estilo emocional, conhecê-lo é o primeiro passo
para entender como ele afeta a saúde, as relações e assim decidir se existe o
desejo de modificá-lo em qualquer das seis dimensões.
Para mais informações sobre o trabalho do autor é possível acessar seu
site Richard J. Davidson disponível em inglês: http://richardjdavidson.com/.
Acesso em 11 julho 2017.
Ao encerrar este capítulo, destaca-se a importância das Neurociências
para a formação multidisciplinar do Educador frente às mudanças na sociedade
2 Termo em inglês, que significa avaliação.
33
atual e a relevância de temas tão atraentes que trazem luz a questão da
possibilidade da modificação do cérebro para os que desejam florescer e viver
uma vida plena de significado, em harmonia com os valores e crenças de cada
ser humano que traz em si sua singularidade.
34
CAPÍTULO II
INTELIGÊNCIA E TALENTO
“Inteligência pode ser desenvolvida por meio de atividades prazerosas”.
Marta Relvas, Consultora em Neurociência Aplicada à Aprendizagem Cognitiva e Emocional no
Desenvolvimento Escolar
Há algum tempo, era comum especificar alguém como ‘inteligente’
devido a sua capacidade de raciocínio lógico e boas notas em matemática,
bem como em linguística, expressão conhecida como ‘inteligência escolástica’,
sem que fosse percebido que existem múltiplos tipos de inteligência, de acordo
com a Teoria das Inteligências Múltiplas, tema que vem sendo pesquisado há
anos por Howard Gardner.
Neste capítulo, além do tema que versa sobre inteligência, se faz
necessária a reflexão sobre a existência das diversas habilidades, assim como
também é abordado o conceito de talento, segundo os recentes estudos da
Psicologia Positiva, com o objetivo de refletir sobre o dom especial que existe
em cada ser humano e o grande valor desse conhecimento para o educador.
2.1. Empregando Inteligência
É fato que até hoje o significado de inteligência não é tão preciso,
sendo difícil medir e até definir. Nomenclaturas como aptidões, habilidades e
talentos também são consideradas por autores e estudiosos que se dedicam
exaustivamente ao tema. No entanto, devido a sua complexidade e interesse,
haverá cada vez mais necessidade de pesquisas científicas sobre o tema.
De uma forma geral, pode-se falar que uma pessoa dotada de
inteligência demonstra um conjunto de características intelectuais que
possibilitam compreender, aprender, raciocinar, refletir, interpretar e solucionar
problemas de diversas ordens. Etimologicamente, a palavra tem origem no
latim intelligentia, oriundo de intelligere, em que o prefixo inter significa “entre”,
35
e legere quer dizer “escolha”. Logo, faz referência à possibilidade de fazer
escolhas. Em seu sentido mais amplo, significa a capacidade cerebral pela qual
se consegue penetrar na compreensão das coisas escolhendo o melhor
caminho. A formação de ideias, o juízo e o raciocínio são frequentemente
apontados como atos essenciais à inteligência, pois para decidir é necessário
entender a situação, considerar hipóteses, avaliar, pensar e arcar com os
riscos. Por isso, não é de se surpreender que entre as faculdades que formam
a inteligência também estão a memória, a ponderação, a abstração e a
imaginação. Todavia, o conceito de inteligência não é único. (MENTE &
CERÉBRO, setembro 2016).
A inteligência é uma das capacidades mais vantajosas e também
atraentes. Não obstante se saiba que esse recurso, somente, não é suficiente
para ocasionar saúde e bem-estar, ao longo dos séculos ela tem sido
valorizada e uma das grandes ambições humanas é ampliá-la. (MENTE &
CERÉBRO, setembro 2016).
Nos anos 90, o psicólogo Daniel Goleman3, pesquisador da
Universidade de Harvard, alcançou progressos quando sistematizou e
apresentou o conceito de ‘inteligência emocional’ com apelo intuitivo, acenando
com as experiências do cotidiano, na educação e no universo organizacional.
(MENTE & CERÉBRO, setembro 2016).
De acordo com Cosenza & Guerra (2011), a inteligência emocional
referida por Goleman seria a habilidade de perceber os próprios sentimentos e
emoções de maneira inequívoca, de expressar emoções e lidar com elas de
forma positiva, de distinguir as emoções nos outros e assim facilitar os
relacionamentos e o desenvolvimento pessoal. Porém, as pesquisas realizadas
até hoje, na tentativa de legitimar essa teoria, têm resultados controversos, pois
não dão suporte à existência de uma inteligência emocional como entidade
isolada, ainda que com a notoriedade a ela obtidos nos meios de comunicação.
3 Autor do livro Emotional Intelligence.
36
Robert J. Sternberg4, psicólogo e psicometrista, é o criador da Teoria
Triárquica, segundo a qual a inteligência se manifesta em três modalidades
distintas: analítica, criativa e prática. Tentou relacionar esta teoria no âmbito de
sua pesquisa, porém os resultados suscitaram dúvidas (MENTE & CÉREBRO,
2016).
Sternberg alega que quase não existe correlação entre inteligência
geral, medida pelos testes, e a inteligência prática, que seria usada para
resolver a maior parte dos problemas do dia-a-dia. Ele sugere uma teoria
alternativa de Inteligência, que compreende os três aspectos mencionados e
que ele nomeia de inteligência bem-sucedida ou inteligência plena, ou seja,
habilidade de conseguir sucesso em um certo contexto sociocultural, valendo-
se das potencialidades e contrabalançando as desvantagens viventes, de
modo a adaptar, selecionar, porém também modelar o ambiente, através de
uma combinação de habilidades analíticas, criativas e práticas. Ele propõe a
existência de uma inteligência, prática e criativa. Por conseguinte, três
habilidades básicas seriam consideráveis: analíticas - saber analisar e avaliar
os problemas e as opções disponíveis; criativas – ser competente para
engendrar soluções para os problemas identificados, e práticas – ser capaz de
fazer funcionar as opções escolhidas (Cosenza & Guerra, 2011).
De acordo com Cosenza & Guerra (2011), apesar de haver
tentativas de validar e construir testes exclusivos para a teoria da inteligência
plena, ela ainda não se consolidou como alternativa na área acadêmica.
Segundo Relvas (2014), a inteligência pode ser considerada como
sobrevivência da espécie, pois todos os humanos herdaram parte da
inteligência dos nossos ancestrais, ou seja, decodificado na base da molécula
de DNA evoluído. Todos os animais são inteligentes, mas apenas o homem é
capaz de usá-la a partir das funções cognitivas do cérebro e aplicá-las seja
para o bem ou para o mal.
“A inteligência é uma capacidade intrínseca do ser humano, pois o homem é o único animal apto a desenvolver potencialidades a partir
4 Foi professor de Psicologia na Yale University e presidente da American Psychological Association.
37
dos desejos subjetivos, pertinentes aos seus interesses, prazeres e recompensas”.
(RELVAS, 2014 p.19)
De acordo com Relvas (2014), a inteligência é o potencial biológico,
psicológico cognitivo, emocional e social que o humano desenvolve como
ferramenta para elaborar soluções para certos tipos de situações classificadas
como complexas, transformando-as em úteis, podendo, portanto, ser
despertadas e potencializadas, com tanta frequência, no ambiente familiar e
escolar.
Os testes de inteligência sempre despertaram interesse devido a
curiosidade para “medir” a inteligência humana. No entanto, atualmente se
sabe que existem diversas abordagens, saberes e motivações, o que se leva a
questionar de tais medições.
Os testes de inteligência surgiram na China, ainda no século V. O
começo do seu uso de forma científica se deu na França, no início do século
XX, quando autoridades francesas recorreram a Alfred Binet5, um talentoso
psicólogo, para que produzisse um instrumento pelo qual eles pudessem
prever quais crianças teriam êxito nos liceus parisienses. Em 1905, Binet e
Theodore Simon desenvolveram a Escala de Binet-Simon, utilizada para
identificar estudantes que necessitassem de ajuda adicional na aprendizagem
escolar. (RELVAS, 2010). Os autores da Escala admitiram que baixos
resultados apontavam para a necessidade de uma maior intervenção dos
professores quanto ao ensino destes alunos e não necessariamente que os
estudantes tivessem incapacidade de aprendizagem. Este instrumento testava
os educandos nas áreas verbais e lógicas, uma vez que os currículos
acadêmicos dos liceus estimulavam principalmente a linguagem e a
matemática. Esta Escala deu origem ao primeiro teste de inteligência: o
Standford-Binet Intelligence Scale. (RELVAS, 2010).
Testes de inteligência seguintes tiveram grande influência sobre a
ideia de que se tem de inteligência, apesar do próprio Binet ter revelado que
38
um único número, proveniente de uma performance em um teste, não pode
retratar um assunto tão complexo quanto a inteligência humana (RELVAS,
2010).
Os resultados dos testes de inteligência, por convenção, são
expressos em uma escala que tem média 100. Cerca de 95% da população
aufere resultados que ficam entre 70 e 130. Na maioria das vezes, o resultado
adquirido é o QI6, porque os primeiros testes calculavam esse índice dividindo
a “idade mental” pela idade cronológica e multiplicando por 100. Ainda que
esse procedimento não seja mais empregado, a denominação QI prosseguiu
em curso. (COSENZA & GUERRA, 2011).
No século XX, o pesquisador Charles Spearman7 constatou que os
resultados obtidos por uma pessoa em diversas tarefas são estatisticamente
correlacionados. Ele estudou esse fenômeno com a ajuda de um instrumento
matemático, a análise fatorial, o que lhe permitiu concluir que a correlação
existente entre os diferentes resultados sugeria a presença de uma habilidade
comum, que foi chamada de inteligência geral ou fator g. (COSENZA &
GUERRA, 2011).
Segundo estes autores, embora os testes de Inteligência sejam
criticados estes parecem ser fidedignos, pois a correlação é clara entre os
diversos resultados obtidos ao longo da vida dos indivíduos. Do mesmo modo,
os dados obtidos em estudos genéticos e em pesquisas que utilizam técnicas
de neuroimagem têm corroborado uma boa correlação com os resultados dos
testes de inteligência, o que reforça a validade dessas avaliações, contestando
os que afirmam que eles não têm significado. Entretanto, sabe-se que as
pessoas são diferentes em suas habilidades. Assim sendo, o fator g parece ser
uma medida pouco discriminativa. Os indivíduos, geralmente, apresentam
áreas de força ou fraqueza em relação ao funcionamento cognitivo.
5 Psicólogo francês que ficou conhecido por sua contribuição no campo da psicometria, sendo considerado o inventor do primeiro teste de inteligência, a base dos atuais testes de QI. 6 Significa quociente de inteligência ou quociente intelectual. 7 Psicólogo inglês, conhecido pelo seu trabalho na área de Estatística. Foi pioneiro da análise fatorial e pelo coeficiente de correlação de postos de Spearman.
39
De acordo com Cosenza & Guerra (2011), por não se conhecer
exatamente a natureza de g, muitos pesquisadores costumam dividir a
inteligência geral em dois componentes, um g fluido e um g cristalizado:
� Inteligência fluida: seria a capacidade de lidar com
problemas novos, que exigem velocidade e flexibilidade
mental. É prejudicada pelo uso de drogas, a fadiga, o
envelhecimento e a depressão.
� Inteligência cristalizada: se refere às habilidades já
existentes e ao conjunto de informações acumuladas, que se
aplicam para resolver problemas semelhantes aos que já
foram encontrados em outras ocasiões. Tende a aumentar
com a idade.
Segundo Cosenza & Guerra (2011), a inteligência como é
conceituada e medida em nossa cultura, é possível dizer que os
conhecimentos biológicos são fundamentais para entendê-la. Sabe-se que ela
sofre influências genéticas e, também, que se correlaciona com a estrutura e o
funcionamento do cérebro. Quanto às influências genéticas, as pesquisas têm
revelado que há correlação entre QI de pais e filhos biológicos, assim como de
irmãos. Calcula-se que a hereditariedade da inteligência geral tem influência de
30% na infância, atingindo até 70% nos adultos.
Sabe-se que existe uma influência genética expressiva no volume e
na estrutura de muitas regiões cerebrais, tanto de substância branca quanto de
cinzenta. Isso se reflete no funcionamento do cérebro em relação à capacidade
de processamento da informação e, assim, pode-se deduzir que as influências
genéticas na inteligência agem através da sua influência na estrutura e
funcionamento cerebrais. Os fatores ambientais, contudo, são extremante
relevantes. Sabe-se que o ambiente pode controlar a manifestação e o impacto
da ação dos genes. Assim, a genética não pressupõe inevitabilidade ou
destino. A contribuição genética para a inteligência altera conforme o ambiente
e não pode ser considerada como fator determinante (Cosenza & Guerra,
2011).
40
Pesquisas atuais em desenvolvimento cognitivo e neuropsicológico
indicam que as habilidades cognitivas são bem mais diferenciadas e mais
específicas do que se esperava. Neurologistas têm documentado que o
sistema nervoso humano não é um órgão com propósito único e também não é
infinitamente plástico. Hoje em dia, acredita-se que o sistema nervoso seja
altamente diferenciado e que diferentes centros neurais processem diferentes
tipos de informações (RELVAS, 2010).
De acordo com Relvas (2010), há de se conhecer que os saberes
são múltiplos e que o potencial de cada pessoa é fruto da influência mútua das
competências, habilidades, sensibilidade e oportunidades que surgem em
diversos momentos ao longo da vida de uma mesma pessoa.
Conforme Cosenza & Guerra (2011), embora a abordagem
psicométrica seja a mais acatada nos meios acadêmicos, há aqueles que
argumentam que muitas capacidades cognitivas importantes não são
adequadamente avaliadas pelos testes de inteligência. Acredita-se que a
habilidade de resolver algumas questões está fortemente ligada à educação ou
ao contexto cultural. Daí existirem propostas alternativas a esse conceito de
Inteligência.
Sob o ponto de vista da correlação entre a inteligência e a
neurobiologia, de acordo com Cosenza & Guerra (2011), destacam-se alguns
pontos interessantes, a saber: o tamanho relativo do cérebro em relação ao
peso corporal é uma informação relevante, além da quantidade de córtex
cerebral. Nesses aspectos, a espécie humana leva vantagem em relação aos
outros animais; os valores descobertos pelas pesquisas estão correlacionados
com a inteligência e apontam um aumento da capacidade de processamento
das informações; quando se parcela o cérebro em regiões, percebe-se maior
correlação da inteligência no lobo frontal, que envolve a memória operacional,
a atenção e as funções executivas (capacidades de escolher os objetivos e as
prioridades de maneira apropriada). No entanto, a inteligência não tem uma
localização específica, mas é produto do funcionamento de sistemas cerebrais
41
interconectados que dependem da eficiência da substância branca, que
promove a conexão entre os diversos centros nervosos.
Sob a ótica de Cosenza & Guerra (2011), a verdade é que existem
diversas formas de ser inteligente, por isso o conceito de inteligência sofre
variações, inclusive dependendo do contexto cultural. É verdade que existem
outros fatores que colaboram para o êxito educacional, como a motivação,
ambiente escolar e fatores culturais. Ao mesmo tempo, a dedicação e o esforço
podem mudar as condições herdadas por fatores genéticos uma vez que
seguramente é possível sobressair-se em determinada atividade através da
dedicação, disciplina e persistência. Ambientes enriquecidos e o esforço de
cada pessoa pode fazer uma enorme diferença, mas é preciso advertir que eles
irão atuar em um potencial que não deixa de ser predeterminado.
Consequentemente, será exposto nos subtemas a seguir, outras
abordagens sobre inteligência. A primeira e mais conhecida é a Teoria das
Inteligências Múltiplas e a segunda, ainda menos conhecida no universo
acadêmico, é a compreensão de Talento segundo a Psicologia Positiva.
2.2. Inteligências Múltiplas
O psicólogo norte-americano Howard Gardner8, criador da Teoria
das Inteligências Múltiplas, é reconhecido mundialmente por ter causado uma
revolução nos conceitos sobre conhecimento humano, aprendizado e
educação.
Suas pesquisas têm avançado pelo campo das ciências sociais,
seguindo caminhos diversos da física ou da biologia, em busca do que o
psicólogo considera, atualmente, em definições novas e mais adequadas.
(MENTE & CÉREBRO, 2016).
Sob a ótica de Gardner (1995), todas as definições de inteligência
são moldadas pela época, lugar e cultura em que elas evoluem. Ainda que
42
essas definições possam diferir entre as sociedades, acredita-se que a
dinâmica por trás delas é influenciada pela mesma matriz de forças: domínio de
conhecimentos necessários para a sobrevivência da cultura; os valores
inseridos nesta cultura; o sistema educacional que instrui e estimula as várias
competências dos indivíduos.
“A palavra inteligência foi usada por indivíduos comuns em uma tentativa de descrever os seus próprios poderes mentais e os das outras pessoas. “Inteligência” era usada de diversas formas, exceto de modo preciso. Os indivíduos ocidentais eram considerados “inteligentes” quando apresentavam uma compreensão rápida, ou eram cientificamente perspicazes ou sábios. Já em outras culturas, não há nenhum termo que traduza, naturalmente, a noção ocidental de inteligência”. (GARDNER, 1995 p. 183)
Para Gardner (1994), inteligência é o potencial biopsicológico de
processar informações para resolver problemas e criar produtos valorizados em
uma cultura ou comunidade.
Para este autor, os testes de ‘QI’9 medem exclusivamente as
capacidades lógica e linguística, que até hoje são exigidas nas escolas e
valorizadas pela sociedade. Ele defendeu uma visão plural da inteligência,
partindo da premissa que não se pode ser excelente em tudo, e apresentou um
critério explícito para identificar uma inteligência distinta.
“Não existe nada de mágico na palavra “inteligência”. Eu a escolhi intencionalmente para entrar na controvérsia com aqueles que consideram o raciocínio lógico ou a competência linguística como estando num plano diferente do da solução de problemas musicais ou da aptidão corporal-cinestésica. Colocar a lógica e a linguagem num pedestal reflete os valores de nossa cultura ocidental e a grande importância dada aos conhecidos testes de inteligência. Uma visão mais holística considera todas as inteligências válidas”. (GARDNER, 1994)
Sob a ótica de Gardner, são oito as Inteligências segundo a sua teoria:
1. Linguística ou verbal (área cerebral hemisfério esquerdo):
sensibilidade aos significados e funções da linguagem.
2. Lógico-matemática (área cerebral lobos parietais esquerdos):
capacidade para lidar com séries de raciocínios, a fim de
reconhecer problemas e resolvê-los.
8 Professor da Universidade de Harvard. 9 QI – Quociente de Inteligência
43
3. Espacial (área cerebral hemisfério direito): capacidade para criar
imagens visuais ou espaciais e transformá-las.
4. Musical (área cerebral hemisfério direito): habilidade de produzir
e organizar sons de acordo com tom e ritmo.
5. Corporal-cinestésica (área cerebral hemisfério esquerdo):
domínio cinestésico sobre os movimentos do corpo.
6. Naturalística (área cerebral hemisfério direito): extraordinária
sensibilidade para identificar e apreender a paisagem nativa.
Capacidade do ser humano de relacionar-se com a natureza.
7. Interpessoal (área cerebral lobo frontal): é a habilidade para
perceber e responder adequadamente a humores,
temperamentos, motivações e anseios de outras pessoas.
8. Intrapessoal (área cerebral lobo frontal): é próprio
reconhecimento de habilidades, necessidades, desejos.
Autorreflexão.
De acordo com Gardner (1994), a exata natureza e extensão de cada
estrutura individual não foi até o momento suficientemente apurada, nem o
número preciso de inteligências foi determinado. No entanto, está cada vez
mais difícil negar a crença de que há pelo menos algumas inteligências que
são relativamente independentes umas das outras e que podem ser
combinadas em uma multiplicidade de formas adaptativas por indivíduos e
culturas.
Uma das principais oposições à teoria de Gardner tem sido a
impossibilidade de mensurar as formas de inteligência referidas por ele. O
próprio psicólogo reconhece que se trata de uma crítica plausível. Entretanto
assegura que o desenvolvimento de ferramentas capazes de medir as várias
inteligências nunca foi sua prioridade. Apesar da falta de instrumentos para
medir a eficácia da Teoria das Inteligência Múltiplas, os argumentos de
Gardner são difíceis de se refutar: ele dá como exemplo, a existência de
pessoas dotadas de grande talento artístico ou com habilidade para números e
xadrez que, no entanto, são incapazes de compreender os outros e manter
relacionamentos. (MENTE & CÉREBRO, 2016).
44
Ultimamente, Gardner admite a possibilidade de outras inteligências
como existencial e moral. No entanto, as avaliações nesse sentido ainda não
são conclusivas.
Para ele a teoria das Inteligências Múltiplas elucida que os seres
humanos vivem em conjunturas diversas, e que esses contextos
concomitantemente exigem e estimulam diferentes arranjos e grupos de
inteligência.
Conforme entrevista de Howard Gardner à publicação Mente & Cérebro
de agosto de 2007, logo depois da publicação das suas obras sobre a Teoria
das Inteligências Múltiplas, Gardner se mantém fiel à sua teoria e pesquisas e,
assim, corrobora que a inteligência tem suas bases na predisposição genética
e também nas experiências infantis capazes de estimular e potencializar o
‘computador mental’ de que dispõe todas as pessoas.
“Não deveria valer apenas a nota tirada na prova de matemática, mas o tipo de ser humano que nos tornamos”. (GARDNER, 2007)
O autor afirmou ser mais importante estimular do que medir os
recursos mentais, declarando-se mais interessando em incentivar virtudes e
talentos humanos do que em medi-los.
Entrevista disponível na íntegra no site:
http://www2.uol.com.br/vivermente/reportagens/multiplas_inteligencias.html
Acesso em 11 julho 2017.
De acordo com Cosenza & Guerra (2011), a Teoria das Inteligências
Múltiplas tem a importância de chamar atenção para outros campos de
aplicação da inteligência em que, frequentemente, presta-se pouca atenção,
como o controle motor ou mesmo as habilidades musicais. A teoria tem sido
aplicada em muitos ambientes educacionais e, quem sabe, o seu sucesso
esteja unido ao fato de que introduz atividades alternativas e promove o
entusiasmo, portanto, fatores que facilitam a aprendizagem.
Para o educador contemporâneo é indispensável conhecer a Teoria
das Inteligências Múltiplas a fim de identificar a qualidade especial que existe
em cada aluno.
45
2.3. O Talento sob a Perspectiva da Psicologia Positiva
Destaca-se que a Psicologia Positiva, por se tratar de uma nova
ciência, estudada acerca dos últimos 20 anos, é fundamentada nos mais
recentes e mais rigorosos métodos experimentais, construída a partir de
princípios científicos. É verdade que ela representa uma nova forma de pensar
no século XXI e por esse motivo continuará a ascender e haverá cada vez mais
necessidade de pesquisas e publicações sobre as qualidades das pessoas e
seu potencial, sobretudo no universo escolar onde é possível detectar desde
cedo o talento que existe em cada ser humano.
Primeiramente destaca-se alguns conceitos acerca da abordagem da
Psicologia Positiva, uma nova ciência, sendo um movimento iniciado pelo
psicólogo americano, Martin Seligman10, no final da década de 90, que visa
estudar as potencialidades e virtudes humanas. Seligman é considerado o pai
da Psicologia Positiva.
Atualmente e graças aos esforços de Martin Seligman e sua admirável
disposição, este contribuiu para garantir que a Psicologia Positiva pudesse
florescer ainda mais. Ao avaliar o seu sucesso hoje em dia, é defendido que ela
deva ser submetida aos mais elevados padrões da lógica da ciência.
Consequentemente, a Psicologia Positiva precisa passar pelas análises de
mentes céticas, porém abertas. (SNYDER & LOPEZ, 2009).
É imprescindível elucidar que, enquanto ciência, a Psicologia Positiva
seja descritiva e não-prescritiva. Não é sua função lhes dizer que seja, por
exemplo, otimista ou generoso, mas, sim descrever as consequências dessas
qualidades.
“O que há de certo com as pessoas? Essa interrogação está no centro da psicologia positiva, que é o enfoque científico e aplicado da descoberta das qualidades das pessoas e da promoção de seu funcionamento positivo.
(SNYDER & LOPEZ, 2009, p.17).
Ressalta-se, contudo, que foi Abraham Maslow quem realmente
cunhou o termo ‘Psicologia Positiva’ pela primeira vez, quando o usou como
10 Martin E.P. Seligman, Principal Fundador da Psicologia Positiva. Ph.D. in Psychology at University of Pennsylvania. Foi Presidente da American Psychological Association em 1998.
46
título em seu livro Motivação e Personalidade, em 1954. (SNYDER & LOPEZ,
2009).
Sob a ótica de Seligman (2002), a Psicologia é muito mais do que uma
filial da medicina, preocupada exclusivamente com a doença. O novo enfoque
envolve o trabalho com a educação, o afeto positivo, o crescimento e a
superação. É preciso nutrir o que existe de melhor nas pessoas.
Conforme Snyder & Lopez (2009), a ciência e a prática da Psicologia
Positiva estão direcionadas para a identificação e a compreensão das
qualidades e virtudes humanas, assim como para o auxílio no sentido de que
as pessoas tenham vidas mais felizes e produtivas.
De acordo com Snyder & Lopez (2009), antes da Segunda Guerra
Mundial, a Psicologia tinha três missões fundamentais, a saber:
1. Curar as doenças mentais.
2. Tornar a vida das pessoas mais satisfatórias.
3. Identificar e cultivar talentos superiores.
Assim, após a Guerra, dois eventos caracterizaram a Psicologia da
época. Em 1946, foi criada a ‘Veterans Administation’ para os veteranos de
Guerra nos EUA e em 1947, foi criado o ‘National Institute of Mental Health’.
Snyder & Lopez (2009) afirmam que o resultado desses eventos
representou a compreensão e o tratamento da doença mental, a fim de que
várias pessoas tivessem seus problemas melhorados pelos psicólogos. No
entanto, o outro lado da moeda decorreu que as duas outras missões
fundamentais da Psicologia, melhorar a vida das pessoas e estimular os
talentos superiores, foram implacavelmente esquecidas.
Conclui-se, portanto, que a Psicologia Positiva recebeu influência de
diversos teóricos. Desde os filósofos gregos como Aristóteles e Epicuro até
psicólogos humanistas como Abraham Maslow e Carl Rogers, inclusive Howard
Gardner que, como apresentado no início deste capítulo, inovou ao considerar
a inteligência com diversas facetas que são exatamente tópicos da Psicologia
Positiva, como os talentos, capacidades e habilidades mentais chamadas por
Gardner (1994) como Inteligências Múltiplas, o que inspirou Martin Seligman a
usar a mesma estratégia, embora não os critérios em seus estudos.
47
Segundo Snyder & Lopez (2009), Donald Clifton11, conhecido como avô
da Psicologia Positiva, teve grande contribuição em desenvolver a ideia de que
as qualidades das pessoas devem ocupar um lugar de destaque da Psicologia
contemporânea.
Partindo-se da premissa que se refuta a ideia de uma inteligência geral
e que existem “múltiplas inteligências” em um sistema único de inteligência
numa área específica de habilidade, é enfatizado, a seguir, o conceito de
talento e sua origem conforme a obra ‘Descubra seus pontos fortes’ de
Buckingham e Clifton (2008), que consiste em um programa revolucionário, que
envolveu dois milhões de pessoas, que mostra como desenvolver os talentos
especiais de cada indivíduo baseado em estudos da Gallup Organization12.
Esse instituto tem realizado pesquisas há mais de 30 anos sobre a melhor
maneira de maximizar o potencial de uma pessoa.
O que seria um talento? É usual a referência a certas pessoas
talentosas, como por exemplo, o atleta de grande desempenho, o brilhantismo
do gênio da computação e da matemática, o músico que emociona ao tocar
com maestria um instrumento, as artes, o professor que inspira ao lecionar,
dentre outros inúmeros modelos.
Neste subtema, inicialmente, serão investigados o significado de
conhecimentos, técnicas, talento e pontos fortes sob a ótica de Buckingham e
Clifton (2008).
Buckingham e Clifton (2008) afirmam que é necessário distinguir o que
é inato do que se pode adquirir com a prática.
� Talentos: são padrões naturalmente recorrentes de pensamento,
sentimento ou comportamento.
� Conhecimento: consiste em fatos e lições aprendidos.
� Técnicas: são os procedimentos de uma atividade.
� Pontos fortes: talentos, conhecimentos e técnicas se combinam
para a formação dos pontos fortes.
11 Foi um psicólogo americano e professor de Psicologia Educacional na Universidade de Nebraska-Lincoln. Ele recebeu um elogio da American Psychological Association em 2003, no qual é retratado como o ‘Pai da Psicologia Baseada em Forças e o avô da Psicologia Positiva’. 12 É uma empresa americana, com mais de 80 anos de experiência, de consultoria de gerenciamento de desempenho global baseada em pesquisas.
48
Conforme Buckingham e Clifton (2008), embora tudo seja importante
no desenvolvimento de um ponto forte, a principal dessas três matérias-primas
é o talento, enquanto técnicas e conhecimento podem e devem, portanto, ser
adquiridos através do aprendizado e da técnica. A chave para desenvolver um
genuíno ponto forte é identificar os talentos dominantes e assim refiná-los com
conhecimentos e técnicas.
“O que é o talento? E por que seus talentos são tão importantes para o desenvolvimento dos pontos fortes? O talento é frequentemente descrito como uma aptidão ou capacidade natural especial, mas para os propósitos do desenvolvimento dos pontos fortes sugerimos uma definição mais precisa. O talento é qualquer padrão recorrente de pensamento, sensação ou comportamento que possa ser usado produtivamente”. (BUCKINGHAM & CLIFTON, 2008 p.55)
Por essa definição acima, mesmo traços claramente negativos podem
ser denominados de talentos se puderem ser utilizados produtivamente.
Na obra ‘Descubra seus Pontos Fortes’, estes autores ilustram diversos
exemplos de talentos que visivelmente poderiam passar despercebidos. No
entanto, ao serem identificados, é possível serem usados produtivamente. Um
exemplo de um caso raro e extremo é de um advogado do governo dos EUA,
chamado David Boies, no processo antitruste movido contra a Microsoft, a
gigante do software. Boies é disléxico e foi ele quem convenceu o juiz com uma
clara exposição das suas alegações. Sua dislexia o faz se esquivar de palavras
compridas e complicadas e essa necessidade de se apoiar em palavras
simples torna sua argumentação muito mais fácil de ser seguida. Assim sendo,
mesmo uma ‘fragilidade’ como neste exemplo específico da dislexia, pode ser
um talento se for possível encontrar uma maneira de usá-lo produtivamente.
De acordo com Buckingham e Clifton (2008), os talentos são únicos e
permanentes, pois os padrões recorrentes são criados pelas conexões no
cérebro. Uma sinapse é a conexão entre duas células do cérebro, também
chamadas neurônios, que as habilita para comunicarem-se entre si. Cada
neurônio se estende, literalmente, ‘estende’ um filamento chamado axônio e
tenta fazer uma conexão. Sempre que é realizada uma conexão bem-sucedida,
forma-se uma sinapse e, durante os três anos de vida, os neurônios mostram-
se admiravelmente bem-sucedidos em fazer tais conexões. Portanto, o padrão
de filamentos, extenso, intricado e único está tecido.
49
Contudo, não é verdade que quanto mais conexões sinápticas tiver,
mais inteligente será. Na verdade, a inteligência ou eficiência dependem do
sucesso em tirar proveito das conexões mais fortes. A natureza obriga a
paralisar bilhões de conexões precisamente para que se fique livre para se
explorar as restantes. Perder conexões não é algo com que alguém deva se
preocupar. Perder conexões é o objetivo. Inicialmente, a natureza oferece mais
conexões do que se precisa, porque, durante os primeiros anos de vida,
existem muitas coisas para se absorver. A herança genética e as primeiras
experiências infantis ajudam a encontrar algumas conexões mais regulares e
mais fáceis de usar do que de outras. (BUCKINGHAM & CLIFTON, 2008).
Sob a ótica de Buckingham & Clifton (2008), a comprovação de um
ponto forte é que se é possível concretizá-lo de forma consistente e quase
perfeita. Ao se definir os talentos como as mais fortes conexões sinápticas,
pode-se constatar que é impossível desenvolver um ponto forte sem um talento
subjacente. A sensação de usar um talento é prazerosa, estimulando de tal
modo a sempre se reagir dessa forma outra vez, ad infinitum.
Os 34 temas de talento apreendem os padrões mais frequentes no
estudo da excelência levantados pelo Gallup Organization, tornando-se a
linguagem para descrever os talentos humanos e, assim, explicar os pontos
fortes.
Para as pessoas interessadas no assunto, é possível realizar um
Assessment13 no Clifton StrenghtFinder, que tem como finalidade descobrir
onde cada pessoa tem maior potencial para um ponto forte. Este ‘teste’ foi
efetuado para identificar os cinco talentos dominantes. Contudo, é importante
enfatizar que este instrumento não tem como objetivo ‘rotular’ as pessoas,
sabendo-se da complexidade existente em cada ser humano que é único. Seu
objetivo pretende mostrar os cinco temas mais potentes que ainda podem não
ser um ponto forte.
É necessário, no entanto, adquirir o livro ‘Descubra Seus Pontos
Fortes’ de Buckingham & Clifton, onde no verso da quarta capa encontra-se um
código de identificação pessoal que deverá ser registrado no site da Gallup.
13 Avaliação em inglês.
50
Até hoje, 16.572.675 pessoas ao redor do mundo realizaram o
Assessment– Strengths Finder disponível em
https://www.gallupstrengthscenter.com/ acesso em 18/07/2017. Existe uma
versão em português neste site.
A Organização Gallup desenvolveu um novo sistema de classificação
de talentos, adequados para crianças e adolescentes (entre 10 e 14 anos).
Chamado de Clifton Youth Strengths Explorer, lançado em 2006. Seus
formuladores acreditam que o conhecimento sobre as qualidades dos jovens
irá auxiliar a direcionar suas energias para maximizar seus potenciais. Ao
preencher a medida, os respondentes recebem um caderno de exercícios,
Youth Workbook, resumindo os três principais temas contendo ações e
exercícios que, se finalizados, podem ajudar esses jovens a tirar proveito das
suas qualidades. Estão disponíveis também guias para pais e educadores, de
maneira que os cuidadores possam ajudar os jovens a desenvolver suas
características positivas. (SNYDER & LOPEZ, 2009, p.64-65).
A seguir, é apresentado, através da figura abaixo, os 34 temas de
talentos do sistema Clifton StrenghtsFinder de classificação do Instituto Gallup.
Ativação Pensamento Estratégico Individualização
Disciplina Realização Responsabilidade Contexto
Organização Harmonia Inclusão Excelência Carisma Empatia Autoafirmação Crença Positivo Analítico
Foco Conexão Desenvolvimento Estudioso
Input Relacionamento Prudência Ideativo
Comunicação Significância Intelecção Futurista
Comando Adaptabilidade Competição
RESTAURAÇÃO Imparcialidade Quadro 1: Elaborado com base no livro Descubra Seus Pontos Fortes, Buckingham
e Clifton, 2008.
51
Para Buckingham & Clifton (2008), a escola deveria provavelmente ser:
uma busca concentrada às áreas de maior potencial das crianças assim como
o trabalho deveria ser: um esforço intencional para descobrir como cada
profissional pode se aproximar de níveis de desempenho de gabarito mundial.
Infelizmente, nem a escola nem o trabalho parecem estar à altura da tarefa.
Ambos continuam tão preocupados em transferir conhecimento e suprir
lacunas de aptidões que o desenvolvimento da percepção dos talentos naturais
é negligenciado.
Ao encerrar este capítulo, o leitor é convidado a fazer uma reflexão
acerca do que é ser inteligente, levando-se em consideração a complexidade
do termo. E fica aqui registrada a pergunta: você saberia identificar o potencial
e a singularidade de cada um dos seus educandos e assim conseguir estimulá-
los eficazmente para uma vida com bem-estar e significado?
Logo, acredita-se que é possível aprender a vida inteira desde que haja
motivação para se aprender o que se ensina.
52
CAPÍTULO III
EDUCAÇÃO, PERSPECTIVAS E O FUTURO
“Aprender a valorizar e alcançar o bem-estar deve começar cedo – nos primeiros anos de
escolarização – e é essa nova prosperidade, alimentada pela Educação Positiva, que o mundo
pode agora escolher”
Dr. Martin E. P. Seligman, ph.D. Psicólogo
Professor da Universidade da Pensilvânia, Ex-Presidente da Associação Americana de
Psicologia.
Neste capítulo faz-se uma explanação sobre a plasticidade neuronal,
assinalando que a neuroplasticidade é a companheira da aprendizagem. Ao
apresentar uma correlação da Neurociência com a Educação, é enfatizada a
necessidade de o educador contemporâneo aprofundar-se na complexidade
funcional do cérebro para melhor compreensão dos seus alunos.
E, finalmente, trazer à tona a responsabilidade e seriedade do
educador em propiciar um ambiente acolhedor dentro da sala de aula que
possibilite uma melhor aprendizagem, reconhecendo nos alunos, desde muito
cedo, o potencial existente em cada um para que os melhores talentos muitas
vezes submersos e negligenciados possam vir à tona e permitam que possam
progredir em suas vidas em prol de mais bem-estar.
3.1. Neuroplasticidade e Aprendizagem
De acordo do Lent (2016), define-se neuroplasticidade como a
propriedade do sistema nervoso de modificar a sua função ou a sua estrutura
em resposta às influências ambientais que o atingem. Tanto as alterações
plásticas quanto as influências ambientais que as provocam podem variar
consideravelmente, de muito fortes a extremamente sutis.
Todo tecido nervoso tem plasticidade, que é a capacidade de
modificar de modo mais ou menos prolongado a sua função e a sua forma. A
neuroplasticidade decorre dos fenômenos do desenvolvimento ontogenético,
53
que pode se estender até a maturidade. Durante o desenvolvimento, no
entanto, é mais expressiva do que na fase adulta. (LENT, 2016).
O sistema nervoso é ‘construído’ durante o desenvolvimento
embrionário e pós-natal, obedecendo a regras básicas expressas pelo genoma
de cada espécie, contudo de maneira muito suscetível a modulações por parte
do ambiente. Essa interação entre as informações do genoma e as
informações do ambiente resulta na plasticidade ontogenética14, quiçá a mais
notável variabilidade individual nos animais, bem expressiva na espécie
humana. Essa fase de maior suscetibilidade ao ambiente, que caracteriza o
sistema nervoso imaturo, é chamada período crítico. (LENT, 2016).
De acordo com Lent (2016), a plasticidade adulta é diferente da
plasticidade ontogenética, pois tem um caráter mais celular e molecular,
incidindo sobre a sinapse, região em que acontecem a transmissão e o
processamento das informações com que o sistema nervoso lida o tempo todo,
codificadas em impulsos nervosos. A plasticidade sináptica é a base da
memória e, consequentemente, da capacidade cognitiva que os cérebros
propiciam.
A plasticidade sináptica é a forma de plasticidade que prevalece no
cérebro adulto normal. Dela provém a espantosa capacidade que o cérebro
tem, principalmente o cérebro humano, de armazenar informação. As
informações mais básicas que percorrem o sistema nervoso o fazem em forma
de potenciais de ação, que são unidades ‘bits’ de um código digital que
representa os parâmetros mais simples dos estímulos oriundos dos ambientes
externo e interno. Quanto maior a intensidade, maior a frequência dos
potenciais de ação que percorrem os nervos correspondentes em direção ao
sistema nervoso central. Ao chegar às sinapses centrais, no entanto, essa
informação codificada não passa incólume para os neurônios seguintes: é
processada, ou seja, mudada de acordo com outras informações que estejam
chegando concomitantemente a esses neurônios, procedentes de regiões
14 Etapa da vida em que há um período maior de neuroplasticidade, chamado período crítico, que ocorre por meio da plasticidade axônica ou ontogenética.
54
ligadas a percepção, à atenção, à cognição, à emoção entre diversas outras
funções. (LENT, 2016).
“Plasticidade cerebral é a denominação das capacidades adaptativas do Sistema Nervoso Central (SNC) e sua habilidade para modificar sua organização estrutural própria e funcionamento. Ela é propriedade do sistema nervoso que permite o desenvolvimento de alterações estruturais em resposta à experiência, e como adaptação a condições mutantes e a estímulos repetidos. (RELVAS, 2010 pp.32 e 33)
De acordo com Relvas (2010), o desenvolvimento cerebral ocorre ao
longo da vida e dele depende todo processo de aprendizagem e reabilitação
das funções motoras e sensoriais. Seguem os tipos de Neuroplasticidade:
� Neuroplasticidade de desenvolvimento: acontece ao longo
da vida dos neurônios, para provocar o desenvolvimento do
cérebro. Ocorre em diversos estágios.
� Neuroplasticidade como resposta à experiência: surge a
partir de novas experiência, desafios e aprendizagem. Muda
as capacidades, ampliando e fixando na memória.
� Neuroplasticidade após lesão cerebral: acontece após
lesão. Ocorre uma autorreparação nos tecidos que continuam
intactos após uma lesão no cérebro.
� Neurogênese: ocorre a partir do nascimento de novos
neurônios no cérebro.
Segundo Relvas (2010), a Neurociência descobriu que o cérebro
humano muda durante a vida, e essa mudança é favorável. Experiências
mostram que situações desafiadoras e ambientes complexos, agradáveis e
divertidos proveem capacidade extra de que o cérebro necessita para
reconfigurar-se. Essa plasticidade dispara um mecanismo pelo qual o cérebro
se remodela para aprender a sentir-se melhor, ou para ser induzido e a se
autorreparar ao ser estimulado.
Bases fundamentais da Neurociência sobre Plasticidade neural, por
Relvas (2010):
55
� O cérebro tem capacidade ilimitada de aprendizagem e pode
renovar a si mesmo.
� O cérebro responde com eficiência à atividade física (correr,
pedalar, andar, nadar entre outras atividades), ao treino
mental e ao estilo de vida, podendo manter-se ágil por toda a
vida.
De acordo com Relvas (2010), a habilidade de aprender é ampla e
por isso a plasticidade é essencial para a aprendizagem, pois as áreas do
cérebro que são destinadas à função específica podem assumir outras funções
quando precisas, além da interdisciplinaridade cerebral, quando o
conhecimento de uma área é aproveitado em outra. A aprendizagem acontece
pela criação de novas memórias e pela ampliação das redes neuronais que
armazenam o que já foi trabalhado, através das aprendizagens e das
metodologias que irão estabelecer ou ampliar estas memórias.
De acordo com Cosenza & Guerra (2011), durante muito tempo
acreditou-se que não se formavam novos neurônios após o nascimento e que
existia uma perda progressiva na população neuronal à medida que se
envelhece. Atualmente sabe-se que algumas regiões do cérebro mantêm a
capacidade de produzir novas células pela vida inteira, ainda que esse
fenômeno seja mais limitado. O sistema nervoso é extremamente plástico nos
primeiros anos de vida. A capacidade de formação de novas sinapses é
enorme, o que é explicável pelo longo período de maturação do cérebro, que
se desenvolve até a adolescência.
Sob a ótica de Cosenza & Guerra (2011), o cérebro adulto não tem a
mesma facilidade de promover tão grande modificação. No passado havia a
crença equivocada que a capacidade de aprendizagem era pequena nos
adultos e quase nula na velhice. Já hoje em dia, é possível afirmar que o
conhecimento contemporâneo admite que a plasticidade nervosa, ainda que
menor, permanece pela vida toda. Assim, felizmente a capacidade de
aprendizagem é mantida. A grande plasticidade no fazer e desfazer as
associações existentes entre as células nervosas é a base da aprendizagem e
56
continua por toda a vida, ainda que diminua com o passar dos anos,
demandando mais tempo para acontecer e requerendo um maior esforço para
que o aprendizado de fato ocorra. Na fase adulta da vida, diminui a taxa de
aprendizagem de novas informações, mas em contrapartida aumenta a
capacidade de usar e elaborar o que já foi aprendido.
Segundo Cosenza & Guerra (2011), pesquisas têm mostrado que a
estimulação ambiental é extremamente importante para o desenvolvimento do
sistema nervoso. O treino e a aprendizagem podem levar à criação de novas
sinapses e à facilitação do fluxo da informação dentro de um circuito nervoso. A
aprendizagem leva não unicamente ao aumento da complexidade das ligações
em um circuito neuronal, mas também à associação de circuitos até então
independentes. É o que acontece quando se aprende novos conceitos, a partir
de conhecimentos prontamente existentes.
Para concluir e de acordo com Relvas (2010), os estudos da
Inteligência Humana e da Plasticidade Cerebral apontam que não existem
limites para o desenvolvimento humano.
3.2. Educação: Uma Integração com a Neurociência
São inúmeras as contribuições do estudo da Neurociência para a
Educação. Conhecimento sobre a evolução do cérebro e do comportamento,
funcionamento do sistema nervoso, cognição e funções executivas, emoção,
aprendizagem, memória, percepção, inteligência, neuroplasticidade, motivação
dentre outros, são assuntos fundamentais para o avanço na área Educacional
do século XXI, visto que os saberes provenientes das neurociências podem
sinalizar novos caminhos conquanto que não há nenhuma fórmula pré-
concebida para tal e assim sugere-se uma integração entre as disciplinas.
O estudo da emoção, especialmente, é de grande contribuição para
a prática pedagógica, pois ao conhecer esse assunto é possível construir
ambientes mais favoráveis ao aprendizado.
57
De acordo com Cosenza & Guerra (2011), já é de conhecimento que
ao experimentar uma carga emocional as pessoas ficam mais vigilantes e a
atenção volta-se para detalhes vistos como relevantes, pois é notório que as
emoções controlam os processos motivacionais. Entende-se que a amígdala
interage no hipocampo e assim influencia o processo de consolidação das
memórias. Consequentemente, uma excitação mesmo que pequena pode
ajudar a conservar uma lembrança. Apesar disso, é bom advertir que em
contrapartida as emoções também podem ser prejudiciais, pois a ansiedade e
o estresse por períodos muito longos têm um efeito contrário na aprendizagem
uma vez que a própria atenção pode ser prejudicada. Por isso, é necessário
ponderar sobre as emoções no processo educacional, sendo muito importante
que o ambiente escolar seja concebido para mobilizar as emoções positivas, a
saber: entusiasmo, curiosidade, comprometimento, desafio entre outras,
enquanto as negativas como ansiedade, apatia, medo e frustração devem ser
evitadas com o objetivo de não interferir na aprendizagem.
Sob a ótica de Cosenza & Guerra (2011), o ambiente escolar deve
ser estimulante e alegre e as pessoas devem se sentir reconhecidas.
Paralelamente, as ameaças devem ser identificadas e reduzidas ao mínimo
para que se possibilite o relaxamento e torne mínima a ansiedade. Em sala de
aula, também são recomendados momentos de descontração e bom-humor,
incluindo atividades com artes e música.
“A serotonina é o hormônio do prazer, da felicidade e das emoções. Não há fórmulas mágicas para se obter um aprendizado eficiente, usando a união entre a razão e a paixão, mas o mais importante é conhecer a realidade dos estudantes, estar presente naquilo que o interessam, isto é, trabalhar o emocional, visto que o educador consegue estabelecer vínculos com seus estudantes e os mesmos jamais serão rompidos”. (RELVAS, 2010, p.146)
Segundo Cosenza & Guerra (2011), habitualmente o estresse é
determinado em situações em que os indivíduos se consideram desamparados,
quando encontram dificuldades que não conseguem superar ou que entendem
ser incontornáveis. Ameaças ou chacotas vindas dos colegas ou do próprio
professor bem como excessos nas matérias, no processo de avaliação e
dificuldades acadêmicas podem ser fonte de estresse.
58
Sob a ótica destes autores, é aconselhável para o educador estar
atento não somente às emoções dos alunos, mas sobretudo às próprias
emoções.
3.3. Uma Perspectiva Positiva sobre o Futuro da Educação
“A Educação é, entre as obras divinas, a mais divina”
Santa Júlia Billiart
Fundadora da Congregação das Irmãs de Notre Dame.
O mundo está em constante mudança devido, especialmente, ao
grande avanço tecnológico gerado nos últimos anos.
A forma como se ensina nos dias de hoje é, basicamente, a mesma
ensinada no passado. A tecnologia que faz com que se use atualmente o
powerpoint já substituiu, em grande parte, o giz e o quadro negro. Mas esse
exemplo traduz apenas uma facilidade no dia a dia. É necessário refletir a
respeito de um novo enfoque de ensino, que desperte o que cada educando
tem guardado dentro de si. Entretanto, sublinha-se que a responsabilidade pelo
processo de aprendizagem não é de caráter exclusivo do educador. É verdade
que cabe ao docente estudar, se atualizar constantemente para aplicar sempre
a melhor prática pedagógica, mas cabe aos estudantes sua parcela de
responsabilidade neste percurso. O processo ensino-aprendizagem demanda,
uma boa interação entre o mestre e os seus discípulos, nesta longa
caminhada.
Sabe-se que os desafios são muitos, principalmente em nosso país,
porém, neste subtema é feito um recorte, de vários autores já mencionados ao
longo deste trabalho, do que pode ser feito pelo próprio educador em prol de
uma educação mais colaborativa, com mais propósito, entusiasmo e
significado.
59
Em 1993, na primeira edição da sua obra, Inteligências Múltiplas – A
Teoria na Prática, Howard Gardner destinou um capítulo com o seguinte título:
‘Uma escola do futuro’.
Passados 24 anos, pergunta-se: a escola do futuro chegou?
No decorrer desse subtema são destacados tópicos que chamaram
a atenção do autor na época e acredita-se que até hoje esses assuntos sejam
de grande valor para a reflexão da Educação contemporânea. São eles:
� Proceder a uma reforma educacional.
� Reexaminar a qualidade e missão das escolas, no mínimo, a
cada geração.
� Tecer críticas aos testes de inteligência que o autor denomina
´pensamento estilo QI´ uma vez que os primeiros testes já
foram elaborados há quase um século com o objetivo de
predizer quais alunos possivelmente teriam dificuldades com
currículos escolares padronizados.
� Repensar o Sistema Educacional para que esta abrace a
‘instrução centrada no indivíduo´.
Para Gardner (1995), já está estabelecido, de modo muito
convincente, que as pessoas têm mentes bem diferentes umas das outras,
portanto, a educação deveria adaptar-se de maneira a responder a essas
diferenças ao invés de ignorá-las, supondo que todos os indivíduos têm (ou
deveriam ter) o mesmo tipo de mente. Assim se necessitaria que cada pessoa
recebesse uma educação que elevasse ao máximo o potencial intelectual de
cada um.
Para o autor, existe a convicção de que nenhum indivíduo pode
dominar inteiramente nem mesmo um único corpo de conhecimento, quiçá toda
a série de disciplinas e competências. Sua Teoria das Inteligências Múltiplas
não necessita ser empregada para determinar um curso de estudos ou carreira,
mas estabelece uma base possível para sugestões e escolha de disciplinas
opcionais.
60
Segundo Gardner (1995), segue uma maneira interessante de
planejar uma escola centrada no indivíduo de acordo com três papeis ou
estruturas que poderiam ser implementados e incorporados à escola do futuro:
1. Especialista em avaliação: consiste em oferecer uma visão
atualizada das potencialidades, inclinações e dificuldades de
cada criança na escola.
2. Agente do currículo para o aluno: com base no perfil
intelectual do aluno, este agente recomendaria os cursos que
o aluno precisaria escolher. No caso do currículo uniforme,
indicaria a melhor forma de o aluno dominar esses materiais.
Na medida que se oferecem disciplinas eletivas, é viável que
o aluno conheça suas próprias inclinações. Deste modo, o
conhecimento das próprias potencialidades poderia auxiliar os
alunos a escolherem cursos apropriados ao seu estilo de
aprendizagem.
3. Agente da escola-comunidade: o organizador da escola-
comunidade buscaria oportunidades educacionais para o
aluno dentro de uma comunidade mais ampla. Essa ação
teria como objetivo aumentar a probabilidade para que os
alunos descubram um papel profissional ou ocupacional que
combine com seu próprio perfil de inteligências. Para os
alunos com configurações intelectuais incomuns (leia-se não
acadêmico), poderia ser encontrada a oportunidade, que
talvez modificasse a vida do indivíduo, de empenhar-se numa
atividade que combina com uma configuração de talentos
específica.
“Ao falar de uma sala de aula ou escola centrada no indivíduo, é importante mencionar aquilo que eu não estou querendo dizer. Não há nenhuma conotação de egocentrismo, auto centrismo ou narcisismo. De fato, as abordagens envolvendo uma aprendizagem cooperativa geralmente são valorizadas num ambiente educacional centrado no indivíduo. O que eu realmente desejo enfatizar é a importância de levar muito a sério as inclinações, interesses e objetivos de cada criança, e, na medida do possível, ajudá-la a realizar esses potenciais”. Se esta educação centrada no indivíduo fosse buscada, ela levaria a uma situação feliz – uma situação em
61
que uma crescente porcentagem de alunos encontraria seu métier, sente-se bem consigo mesma e tem uma probabilidade maior de se tornar um membro positivo de sua comunidade”. (GARDNER, 1995, p.68)
Essa perspectiva de Gardner é bem interessante devido ao seu
caráter de inclusão.
Frequentemente alunos que apresentam inteligências linguística e
lógico-matemática passam pela vida acadêmica sem maiores dificuldades e
provavelmente terão mais oportunidades no mercado de trabalho. Já os
estudantes dotados de inteligências incomuns podem ter chances únicas nas
suas vidas se esse talento especial for detectado desde cedo (GARDNER,
1995).
Existem diversos exemplos no mundo dos esportes, nas artes e na
música.
Em sua obra, ‘Inteligências Múltiplas, a Teoria na Prática’ Howard
Gardner se coloca aberto a críticas e reservas a respeito da educação centrada
no indivíduo. No entanto, relata que existe uma crítica que ele rejeita de forma
inequívoca: é a afirmação de que a educação centrada no indivíduo é utópica.
Sob a ótica de Gardner (1995), os obstáculos concretos à educação
centrada no indivíduo não são as restrições financeiras ou as limitações de
conhecimento, mas, ao invés disso, as questões de vontade. Uma vez escolher
em acreditar que a abordagem centrada na pessoa não é apropriada, ou
mesmo que seja válida, meramente não é prática, ela parecerá utópica.
Contudo, se decidir adotar os objetivos e os métodos da educação centrada no
indivíduo, não existirá dúvida que é possível se fazer progressos nessa
direção.
Após conhecer e estudar a Teoria das Inteligências Múltiplas, agora,
poderia ser feita uma correlação de uma nova abordagem, ao dar enfoque, à
perspectiva da Psicologia Positiva que já foi abordada no capítulo II deste
trabalho monográfico.
62
Como uma das alternativas ao processo educacional contemporâneo
poderia ser realizada a implementação de uma “Escolarização Positiva”15, que
segundo Snyder & Lopez (2009) é uma abordagem à Educação que consiste
em um alicerce de cuidado, confiança e respeito pela diversidade, em que os
docentes ajustam os objetivos para que cada aluno conceba a aprendizagem e,
assim, trabalham em parceria para desenvolver os planos e a motivação para
alcançar esses objetivos.
De acordo com Snyder & Lopez (2009), alguns dos principais
educadores, a seguir, abriram caminho para essa abordagem. São eles:
filósofos de destaque, como Benjamim Franklin, John Stuart Mill, Herbert
Spencer e John Dewey, que trataram dos recursos dos estudantes. Alfred Binet
que também enfatizou o aperfeiçoamento das habilidades dos estudantes em
lugar de prestar atenção somente na solução das fragilidades. Elizabet Hurlock
acentuou o estímulo como sendo mais importante do que a crítica. Lewis
Terman dedicou sua carreira pesquisando o pensamento de alunos brilhantes.
Arthur Chickering buscou compreender a evolução dos talentos dos estudantes
e, mais recentemente, Donald Clifton, apresentado no capítulo II, que
identificou e posteriormente aprofundou os talentos específicos dos estudantes,
ao invés de se concentrar apenas nas fragilidades.
Sob a ótica de Snyder & Lopez (2009), a seguir apresenta-se os
principais componentes de uma Escolarização Positiva16:
15 Uma palavra menos utilizada para ‘educação’, que transmite a importância da comunidade toda no ensino das crianças. Figura: Psicologia Positiva, uma abordagem científica e prática das qualidades humanas. Snyder & Lopes, p. 347, 2009) 16 Figura extraída da obra Psicologia Positiva, uma abordagem científica e prática das qualidades humanas. Snyder & Lopez, p.347, 2009.
63
1. Cuidado, confiança e respeito pela diversidade: é o alicerce
crucial que sustenta uma atmosfera de apoio, baseada em
cuidado e confiança, porque os estudantes prosperam neste tipo
de ambiente. Esse cuidado por parte dos professores
proporcionam a base segura que permite que crianças e jovens
explorem e encontrem formas de alcançar seus próprios
objetivos acadêmicos e de vida. Os bons professores sabem
quando ser solidários e ajudar alunos que estejam enfrentando
crises. Outro aspecto desse alicerce para as escolas é a
importância da diversidade das origens e das opiniões dos
estudantes em sala de aula. É fundamental se certificar de que
as visões de todos os públicos em uma turma tenham voz na
sala de aula. A premissa da Psicologia Positiva na educação é
estimular um ponto de vista ‘Nós/Eu’, ou seja, um ambiente
64
apropriado para o coletivo em que a sala de aula ensina a
cooperação ao invés da competição.
2. Objetivos (conteúdo): objetivos desafiadores geram
aprendizagem. O sucesso dos objetivos de aula, demanda que
se torne o material relevante em relação às experiências da vida
real dos alunos pois isso aumenta a expectativa de que eles
venham a se envolver com o material e aprendê-lo. Cumprir
apenas as metas, pode transformar os alunos em caçadores de
notas, mas atraídos com seus desempenhos em buscar se sair
melhor do que os colegas do que com aprender pode ter o seu
espírito de competição despertado. A definição de objetivos é
facilitada quando os professores consentem que parte das notas
dos alunos seja determinada por atividades coletivas, nas quais
a cooperação com outros estudantes seja essencial.
3. Planos: planos e motivação, ambos devem interagir com os
objetivos educacionais, destacando que a motivação é a
companheira do planejamento. Outra faceta a ser levada em
consideração ao se aumentar a motivação dos alunos é tornar o
material relevante, fazendo com que o aluno tenha mais
chances de ir à aula, de prestar atenção e de fazer comentários
e perguntas durante as exposições. Os educadores podem
desenvolver demonstrações em sala de aula e trabalhos para
fazer em casa com diversos fenômenos aplicáveis a situações
com que os alunos se deparam fora da sala de aula.
4. Motivação: os professores devem estar entusiasmados em
relação a seus conteúdos para que consigam aplicar as aulas
que prepararam. Os professores são modelos de entusiasmo
para seus alunos, a fim de que quando tornam os objetivos e os
planos de aula atraentes para si mesmos, os alunos também
captam essa energia. Objetivos coletivos podem gerar
motivação aos alunos conforme eles trabalham juntos. O elogio
também é muito motivador. Aconselha-se fazê-lo em privado
65
pois o elogio público pode aumentar a propensão dos alunos a
competirem entre si.
5. Esperança: uma vez instalado um ambiente de cuidado e
confiança com objetivos, planejamento e motivação aplicados
dentro de sala de aula, haverá sido criado um espírito de
investigação e quando os alunos adquirem essa essência, a
aprendizagem se amplia, se fortalece e os alunos se tornam
solucionadores de problemas para toda a vida. A ‘aprendizagem
de como aprender’ se fundamenta em pensamento voltado a
objetivos, em caminhos, na sensação de ‘ser capaz’ ao
transmitir, exclusivamente, os conteúdos disciplinares, como
também uma sensação de esperança. Um estudante
esperançoso acredita que continuará aprendendo muito tempo
depois que já tiver saído da sala de aula e que não haverá
limites para continuar a aprender.
6. Contribuições da sociedade: os alunos devem entender que
fazem parte de um esquema social mais amplo, em que
compartilham aquilo que aprenderam com outras pessoas.
Essas contribuições da sociedade representam as
compensações duradouras que uma pessoa educada oferece
aos que estão ao seu redor, compartilhando visões com
entusiasmo com outras pessoas com as quais ela tem contato
durante toda a vida. Assim sendo, os benefícios do processo de
aprendizagem são retransmitidos a uma ampla gama de outras
pessoas.
Segundo Snyder & Lopez (2009), os professores que têm como
alicerce a Escolarização Positiva desencadearam o entusiasmo e a alegria de
aprender nos estudantes. Muitos desses educadores consideram seus esforços
como uma vocação em lugar de um trabalho em que demonstram um amor
profundo e intenso por ensinar.
“Uma vocação se define como uma forte motivação na qual a pessoa repetidamente assume uma atitude intrinsecamente satisfatória” (SNYDER & LOPEZ, 2009, p.356).
66
O leitor é convidado a realizar um ‘mini experimento pessoal’ que é
incluído neste trabalho em um anexo, com o objetivo de agradecer a um bom
professor que tenha feito diferença em sua vida. Esta atividade é sugerida por
Snyder & Lopez (2009), em sua obra Psicologia Positiva – Uma abordagem
científica e prática das qualidades humanas.
De acordo com Wilbert Mckeachie apud Snyder & Lopez (2009),
atualmente na educação as expressões da moda são ‘centrado no aprendiz’ e
‘aprendizagem ativa’ onde é difundida a necessidade de uma Educação
centrada no aprendiz. No entanto, o autor aponta que não se trata de uma ideia
tão revolucionária assim, pois que, William James17 em 1899 na introdução de
‘Talks to teachers on psychology: and to students on some of life´s ideals’,
afirmou: que seu principal desejo tinha sido fazer com que os professores
concebessem e, se possível, reproduzissem simpaticamente, na imaginação, a
vida mental de seus alunos com toda dinâmica que o aluno vivencia.
De acordo com os estudos de Mckeachie18 apud Snyder & Lopez
(2009), ficou evidente que o ensino que funciona para alguns estudantes pode
não funcionar para outros. O autor escreveu Teaching tips com o propósito de
dar aos professores um grande repertório de estratégias para capacitá-los a
alcançar vários aprendizes.
Segundo Mckeachie apud Snyder & Lopez (2009), destacam-se
algumas questões que mudaram desde William James e da 1ª edição de
Teaching tips:
� O que se sabe hoje sobre aprendizagem e memória.
� As atuais concepções de aprendizagem dos pesquisadores
percorreram um longo caminho da simples repetição ao
reforço.
� A maior parte do comportamento humano não é
conscientemente determinada e, sim, automática.
� Mudanças nos objetivos cognitivos.
17 Filósofo, psicólogo, educador. Foi considerado o pai da Psicologia americana. 18 Partes de um artigo do professor McKeachie em Teaching Psychology, 1999.
67
� Mudanças nos objetivos afetivos e comportamentais.
“Em 1899, James disse: que ‘noventa centésimos ou, possivelmente, e noventa centésimos e noventa e nove milésimos de nossa atividade são puramente automáticos e habituais...o importante em educação é fazer de nosso sistema nervoso um aliado em lugar de um inimigo” (SNYDER & LOPEZ, 2009, p.362).
Snyder & Lopez (2009), concluíram que o que não mudou ao longo
de 10 Edições do Talks to teachers foram quatro temas que permaneceram
estáveis:
1. A importância de que os estudantes sintam que o professor
se preocupa com sua aprendizagem e com eles como
indivíduos.
2. O valor de fazer com que os estudantes participem da
discussão.
3. O papel dos testes e das notas na motivação e no
aprendizado dos estudantes.
4. O valor de ter feedback para melhorar uma disciplina.
De acordo com Snyder & Lopez (2009), foi finalizada a 1ª edição de
Teaching tips (Mckeachie e Kimble, 1950) com uma teoria de ensino. Na sua
releitura, impressiona ao se constatar que ela ainda é válida para o século XXI.
Ressalta-se três temas:
1. A faculdade (escola) faz parte de uma cultura. Nos dias de
hoje, o contexto é destacado no conjunto da psicologia e da
educação.
2. O poder que o professor tem de dar notas pode ser um
importante fator de motivação para o bem ou para o mal.
Muita ênfase nas notas aumenta a ansiedade dos alunos, que
pode ser prejudicial ao desempenho.
3. O ensino centrado no aluno, coletivo e com clareza em
relação às tarefas, aos objetivos, com mais motivação e
melhor tomada de decisões.
68
E o futuro?
A Educação Positiva, em si mesma, é uma forma lenta e gradual de
espalhar o bem-estar por todo o planeta. Está limitada pelo número de
professores treinados e pelo número de escolas dispostas a adotá-la.
(SELIGMAN, 2011, p.107).
69
CONCLUSÃO
É notável o avanço da Ciência no último século. Avanços tecnológicos
apresentam descobertas significativas e abrem novos e amplos caminhos.
Como não poderia deixar de ser, o mesmo acontece na Educação.
Com a pesquisa científica surgem novas ciências, algumas ainda dando seus
primeiros passos. Com o interesse que despertam, cientistas, renomados
autores e estudiosos debruçam-se sobre temas que ainda merecem reflexão,
interpretação e aprofundamento, visando solucionar problemas diversos.
Um desses temas que merece destaque pela sua importância é o
estudo do funcionamento cerebral. Portanto, tornou-se relevante estabelecer
relação entre a Neurociência e a Educação.
Neste trabalho foram focalizados temas que se relacionam com a
neurociência, buscando-se construir uma ponte entre ela e a educação.
Após as leituras e os estudos realizados para este trabalho, considera-
se imprescindível que os profissionais que estão envolvidos com o processo
ensino-aprendizagem conheçam os fundamentos neurocientíficos desse
processo.
O professor tem papel central como facilitador da mudança, ao mostrar
que a disseminação, o compartilhamento e a inovação são fatores
multiplicadores do conhecimento, contribuindo para a valorização da relação
aluno-professor onde há estímulo para a aprendizagem contínua.
Um dos grandes desafios para os professores, principalmente no nosso
país, ao lidar com as adversidades do dia a dia, é estimular o potencial dos
estudantes para um melhor desempenho individual, adotando uma política
mais inclusiva ao entender a singularidade de cada um, ao invés de uma
política mais padronizada onde todos aprendem da mesma forma.
A escola e a universidade são ambientes que podem fazer a diferença
na vida de cada pessoa para que se forme, de fato, cidadãos éticos,
responsáveis, generosos e, sobretudo, inteligentes e talentosos à sua maneira,
inclusive para perceberem novas abordagens e, assim, respeitar a diversidade
cultural existente, a fim de reconhecer o direito do outro a uma opinião que
difere da sua.
70
Deve haver uma verdadeira inclusão para que na fase da adolescência
e na vida adulta se tenha maior satisfação, autorrealização e bem-estar,
sabendo-se que é possível aprender a vida toda desde que haja motivação.
Através da pesquisa científica, pode-se ratificar que a plasticidade
nervosa no decorrer da vida vai diminuindo, mas permanece durante a vida
inteira, donde se pode inferir que a possibilidade da pessoa aprender é mantida
ao longo da sua existência.
A união da Neurociência com a prática da Educação proporcionará
uma ponte que nos levará a um futuro mais promissor da compreensão do
complexo cérebro humano, onde a plasticidade cerebral, estímulos, motivação,
talentos e inteligência nos levará a uma reflexão sobre novas abordagens que,
quiçá, terá como foco uma Educação baseada no cuidado, na confiança e
respeito às singularidades de cada ser humano.
Ao concluir este trabalho, enfatiza-se o quanto ainda se está distante
de atingir uma escola com professores atualizados e voltada para um
estudante atendido em suas particularidades.
Constata-se que, desde 1899, William James já mostrava em seus
trabalhos a preocupação com o ensino centrado no aluno e na aprendizagem
ativa, sendo um grande engano pensar-se que são ideias atuais.
Fica muito clara a necessidade de melhor preparar-se os professores
para bem cumprirem com as sérias responsabilidades, a começar pelo estudo
constante e permanente sobre temas relevantes que levem mestres e alunos a
percorrerem, com sucesso, o longo caminho que se lhes apresenta.
Desde longa data, percebe-se que os estudantes mais inteligentes são
esquecidos em nossas escolas, priorizando-se o atendimento aos alunos que
não estão sendo bem-sucedidos em seus estudos. Não que estes desmereçam
atenção, mas esquecer os alunos talentosos, achando-se que eles seguirão em
frente sem um olhar especial é um grande equívoco, pois se seus interesses,
habilidades, aptidões, aspirações e pontos fortes forem negligenciados, isso
poderá trazer às suas vidas vazios e prejuízos, na maioria das vezes
irreversíveis.
Este é um paradigma que, sem dúvida, precisa ser quebrado.
71
ANEXO
MINI EXPERIMENTO PESSOAL
Uma atividade para você: agradecendo a um bom professor19.
Inicialmente, lembre-se dos tempos de escola (faculdade, pós) e, após, procure
recordar daqueles professores que foram ótimos. Eles eram tão bons que havia vontade de ir
às aulas, havia grande prazer em aprender com esses professores.
Então, agora, pegue uma folha de papel em branco ou se preferir use o computador.
Escreva o nome desse professor na parte de cima e depois escreva tudo que conseguir se
lembrar sobre esse professor. Escreva como era sua aparência, a série (semestre ou ano), o
lugar em que se conheceram e como ele se dirigia à turma.
Quais são as coisas mais positivas de que você consegue se lembrar desse
professor?
Quando você já tiver feito um resumo, vire a folha ou se estiver utilizando
computador, use outra página e escreva o que aprendeu naquelas aulas com esse educador
para o resto de sua vida. Há mensagens que ainda estão em sua mente hoje em dia, que
tenham sido cultivadas na aula desse professor? Esse professor lhe fornecia feedback quando
você se saiu bem? Ele realmente se preocupava com você para que tivesse sucesso na vida?
Talvez esse professor tenha feito com que você se sentisse inteligente ou especial.
Quando completar essa atividade para um ou mais professores, procure saber se é
possível localizá-los atualmente. Alguns ainda podem estar lecionando, outros podem já estar
aposentados. Com as redes sociais e correio eletrônico, ficou mais fácil entrar em contato com
as pessoas que conhecemos.
Vá em frente e escreva um bilhete ou e-mail de agradecimento para cada um desses
professores especiais. Você possivelmente se sentirá muito bem por ter feito isso e o professor
se sentirá muito valorizado com sua mensagem.
Não há nada mais gratificante para um professor do que ouvir que cumpriu um papel
relevante na vida de um ex-aluno. Com a vida corrida, não temos tempo para agradecer às
pessoas que foram legitimamente preciosas em nossas vidas pelas coisas que fizeram por nós.
Seus ex-professores vão dar imenso valor à sua mensagem, principalmente se você
descrever casos específicos em que eles o auxiliaram. Certamente eles também irão gostar de
ouvir sobre seus êxitos e conquistas em sua vida.
19Atividade Mini experimento pessoal - Psicologia Positiva – Uma abordagem prática das qualidades humanas - Snyder & Lopez p.344 (2009).
72
BIBLIOGRAFIA
BUCKINGHAM, Marcus & CLIFTON, Donald O. Descubra Seus Pontos
Fortes. Rio de Janeiro: Sextante, 2008.
CARVALHO, Fernanda A.H. Neurociência e Educação: Uma Articulação
Necessária na Formação Docente. Trab. Educ. Saúde. Rio de Janeiro, v.8
n.3, p.537-550, nov 2010/fev2011.
COSENZA, Ramon M. & GUERRA, Leonor B. Neurociência e Educação.
Como o Cérebro Aprende. Porto Alegre: Artmed, 2011.
DAMÁSIO, António R. E o Cérebro Criou o Homem. São Paulo: Companhia
das Letras, 2011.
__________________. O Erro de Descartes. Emoção, Razão e o Cérebro
Humano. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.
DAVIDSON, Richard J. & SHARON, Begley. O Estilo Emocional do Cérebro.
Rio de Janeiro: Sextante, 2013.
GARDNER, Howard. Estruturas da Mente. A Teoria das Inteligências
Múltiplas. Porto Alegre: Artmed, 1994.
_________________. Inteligências Múltiplas. A Teoria na Prática. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1995.
KANDEL, Eric R., SCHWARTZ, James H., JESSEL, Thomas M.,
SIEGELBAUM, Steven A., HUDSPETH, A.J. Princípios de Neurociências. 5ª
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LENT, Roberto. Cem bilhões de Neurônios? Conceitos Fundamentais de
Neurociência. 2ª Edição. São Paulo: Editora Atheneu, 2010.
73
_____________. Neurociência da Mente e do Comportamento. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2016.
MENTE & CÉREBRO. Especial: Os Limites da Inteligência. Ano XII Nº284
São Paulo: Segmento, Setembro 2016 p.57-63.
RELVAS, Marta P. Neurociência e Educação: potencialidades dos gêneros
humanos na sala de aula. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2010.
_______________. Sob o Comando do Cérebro: entenda como a
Neurociência está no seu dia a dia. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2014.
SELIGMAN, Martin E. P. Florescer: Uma nova compreensão sobre a
natureza da felicidade e do bem-estar. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011.
SNYDER, C.R. & LOPEZ, Shane J. Psicologia Positiva: Uma abordagem
científica e prática das qualidades humanas. Porto Alegre: Artmed, 2009.
74
WEBGRAFIA
DAVIDSON, RICHARD J. Web site. Para mais informações sobre o trabalho
do autor é possível acessar seu site disponível em inglês:
http://richardjdavidson.com/. Acesso em 11 julho 2017.
MENTE & CÉREBRO. Múltiplas Inteligências. Disponível em:
http://www2.uol.com.br/vivermente/reportagens/multiplas_inteligencias.html
Acesso em 11 julho 2017.
STRENGTHS GALLUP. GALLUP Strengths Center. Disponível em:
https://www.gallupstrengthscenter.com/
Acesso em 18 julho 2017.
75
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 02 AGRADECIMENTOS 03 DEDICATÓRIA 04 RESUMO 05 METODOLOGIA 06 SUMÁRIO 07 INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I
O Funcionamento do Cérebro e sua Importância para o Educador 09
1.1. As Neurociências e o Educador 09
1.2. Emoção, Memória e aprendizagem 12
1.2.1 Emoção 12
1.2.2 Memória e Aprendizagem 16
1.3. O Cérebro Emocional 22
CAPÍTULO II
Inteligência e Talento 34
2.1. Empregando Inteligência 34
2.2. Inteligências Múltiplas 41
2.3. O Talento sob a Perspectiva da Psicologia Positiva 45
CAPÍTULO III
Educação, Perspectivas e o Futuro 52
3.1. Neuroplasticidade e Aprendizagem 52
3.2. Educação: Uma Integração com a Neurociência 56
3.3. Uma Perspectiva Positiva sobre o Futuro da Educação 58
CONCLUSÃO 69 ANEXO 71 BIBLIOGRAFIA 72 WEBGRAFIA 74 ÍNDICE 75