DOLZ & SCHNEUWLY_2004[1996]

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    2. GNEROS E PROGRESSO EM EXPRESSO ORAL E ESCRITA -ELEMENTOS PARA REFLEXES SOBRE UMA EXPERINCIA

    SUA (FRANCFONA)1

    Joaquim Dolz2 & Bernard Schneuwly

    Como acontece freqentemente em Didtica, este artigo nasceu de uma

    demanda, expressa tanto pelos professores como pela instituio escolar na Suia

    francfona, que queriam dispor de meios de ensino da expresso oral e escrita na

    escola obrigatria3. Mesmo que uma tal demanda no leve imediatamente a

    conceber um programa detalhado ou um currculo que d conta do conjunto das

    sries, ela leva a elaborar um modelo de ensino modular, aplicvel em toda a

    seriao em questo (ver Quadro 2), e a uma investigao geral para organizar a

    progresso atravs dos diferentes ciclos4 do Ensino Fundamental5. O presente

    artigo pretende exatamente expor os primeiros esboos desta investigao -

    1 Dolz, J. & B. Schneuwly (1996) Genres et progression en exprssion orale et crite lments de

    rflexions propos dune exprience romande. Enjeux, 37-38: 49-75 [NT].

    2 Joaquim Dolz tambm professor e pesquisador em Didtica do Francs/Lngua Materna, daFaculdade de Psicologia e Cincias da Educao (FAPSE) da Universidade de Genebra(UNIGE), Sua, e membro do Grupo Graf Grupo Romnico de Anlise do Francs Ensinado .[NT]

    3 No caso da Suia francfona, o fim da escola obrigatria equivale ao fim de nosso EnsinoFundamental (8 srie/15 anos). [NT]

    4 Como mais recentemente, no ensino oficial brasileiro, tambm a escolaridade na Suiafrancfona organizada por Ciclos, que, entretanto, no equivalem exatamente aos Ciclos de

    seriao no Brasil. [NT]5 Encontramo-nos aqui numa situao, a uma s vez, confortvel e desconfortvel: confortvel,

    pois devemos dar, custe o que custar e rapidamente, as respostas demandadas pela instituioe, assim, temos desculpas para nossas dificuldades tericas de resoluo em profundidade decertos problemas (que, alis, provavelmente, no podem ser resolvidos s por respostastericas, o que aumenta ainda mais nosso conforto); desconfortvel, justamente porque estasrespostas que deveramos dar so, por princpio, parciais e podem, portanto, ter efeitosimprevistos, porque imprevisveis. A anlise destes efeitos no desejados ser uma dasmaneiras de conhecer melhor as restries que a realidade em que agimos nos apresenta.

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    baseada essencialmente na noo de gnero - e desenvolv-la, sistematizando-a,

    no sentido de assegurar sua base terica. Trata-se tambm de demonstrar no

    sua exeqibilidade - que verificar-se- ou no a posteriori, por seus efeitos

    eventuais sobre o sistema escolar francfono -, mas sua coerncia terica com

    certos postulados de base de nossa concepo sobre a didtica.

    Currculo e progresso

    Estamos utilizando aqui a noo de currculo por oposio de programa

    escolar. Enquanto que o programa escolarsupe uma centrao mais exclusiva

    sobre a matria a ensinar e recortado segundo a estrutura interna dos

    contedos, no currculo, esses mesmos contedos disciplinares so definidos em

    funo das capacidades e das experincias necessrias ao aprendiz. Alm disso,

    os contedos so sistematicamente postos em relao com os objetivos de

    aprendizagem e os outros componentes do ensino.

    Segundo Coll (1992), as principais funes de um currculo so as

    seguintes: descrever e explicitar o projeto educativo (as intenes e o plano de

    ao) em relao s finalidades da educao e as expectativas da sociedade;

    fornecer um instrumento que oriente as prticas dos professores; levar em conta

    as condies nas quais se realizam estas prticas; analisar as condies de

    exeqibilidade, de modo a evitar uma descontinuidade excessiva entre os

    princpios e as restries colocadas pelas situaes de ensino. Um currculo para

    o ensino da expresso deveria fornecer aos professores, para cada um dos nveis

    de ensino, informaes concretas sobre os objetivos visados pelo ensino, sobre as

    prticas de linguagem6 que devem ser abordadas, sobre os saberes e habilidades

    implicados em sua apropriao. No existe, at o momento, para a expresso oral

    6 Estamos optando, neste texto, por traduzir o termo langagire, na medida do possvel, pela

    locuo de linguagem, por acreditarmos ser esta a traduo mais ampla possvel. J a maisjusta seria discursivo(a). [NT]

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    e escrita, um currculo como este, que apresente uma diviso dos contedos de

    ensino e uma previso das principais aprendizagens.

    Entre os diversos componentes do currculo, a progresso ou seja, a

    organizao temporal do ensino para que se chegue a uma aprendizagem tima -

    permanece como um problema complexo, difcil de se resolver. preciso que nos

    lembremos de que as decises relativas ordem temporal que se deve seguir no

    ensino situam-se essencialmente em dois nveis. Segundo Coll (1992, p. 66), elas

    dizem respeito tanto diviso dos objetivos gerais entre os diferentes ciclos do

    ensino obrigatrio (progresso interciclos) como seriao temporal dos

    objetivos e dos contedos disciplinares em cada ciclo (progresso intraciclo).

    Alm disso, parte a questo do currculo, o problema da progresso coloca-se

    igualmente no nvel das seqncias concretas de ensino realizadas em sala de

    aula, isto , no momento em que o professor decide sobre a seqncia de

    atividades e operaes com que ele pretende fazer avanarem os alunos:

    definio e decomposio das tarefas a serem realizadas; caminho e etapas a

    serem seguidas para aproximar-se de um fim; ordem dos diversos elementos do

    contedo etc.

    Contra o solipsismo - Construo conjunta intencional

    Na gnese social e instrumental de uma funo superior como a

    linguagem, fundamental que se considere a relao existente entre a

    aprendizagem - a saber, os mecanismos pelos quais os fatores externos

    modificam os comportamentos - e o desenvolvimento. Num texto precursor,

    Vygotsky (1935) criticava tanto o objetivismo reducionista quanto as concepesendgenas da psicologia idealista. Para o objetivismo, o desenvolvimento reduz-se

    a uma aprendizagem por associao e acmulo de respostas, desvalorizando-se,

    assim, o papel ativo e transformador do sujeito. Por outro lado, as concepes

    endgenas distinguem o desenvolvimento da aprendizagem, mas consideram

    esta ltima um processo externo que no est implicado ativamente no

    desenvolvimento. Para esta segunda corrente, a aprendizagem no uma

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    condio fundamental do desenvolvimento das funes superiores. Como

    ressalta notavelmente Rivire (1990, pp. 89-95), Vygotsky prope uma concepo

    radicalmente diferente, segundo a qual a aprendizagem uma condio prvia

    necessria s transformaes qualitativas que se produzem ao longo do

    desenvolvimento e ope-se s duas concepes anteriormente citadas, por uma

    nica e mesma razo: ambas as orientaes partem de uma concepo essencialmente

    solipsista do sujeito (p. 91). Nos dois casos, o sujeito est sozinho e no se v o

    plo ativo que representa sua relao com os outros. Num dos casos, ele est

    reduzido a um complexo de mecanismos reativos; no outro, est reduzido a

    competncias internas. Para Vygotsky (1934: 88), a aprendizagem humana

    pressupe uma natureza social especfica e um processo por meio do qual as crianas

    acedem vida intelectual daqueles que as cercam.

    Quando nos damos conta de que o termo russo utilizado por Vygotsky

    obouchenie, que implica tanto os processos de ensino como os de aprendizagem

    (Schneuwly, 1995), a posio do psiclogo parece ainda mais radical. O

    desenvolvimento na idade escolar s se torna possvel graas ao ensino e

    aprendizagem intencionais, que supem um pr-enquadre da situao e uma

    tomada de conscincia por parte dos participantes: o professor e seus alunos.

    Tanto a aprendizagem incidental, advinda acessoriamente no curso da realizao

    de uma ao, como a aprendizagem intencional, onde o sujeito est implicado

    numa situao que visa um efeito, so construes sociais. A aprendizagem

    intencional freqentemente se realiza em meio institucional. No que concerne s

    prticas de linguagem, sua apropriao comea no quadro familiar, mas certas

    prticas, em particular aquelas que dizem respeito escrita e ao oral formal,

    realizam-se essencialmente em situao escolar na nossa sociedade, graas ao

    ensino, por meio do qual os alunos conscientizam-se dos objetivos relativos

    produo e compreenso. Aqui, mais ainda que em outras aprendizagens, a

    cooperao social o fator determinante das transformaes e dos progressos

    que ocorrem.

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    Neste contexto, o que podemos dizer sobre o mote do pedocentrismo a

    criana no corao da ao pedaggica? Metfora significante de um algo caduco ou

    emblema de uma nova forma de solipsismo? Em todo caso, nas representaes

    dos professores (Perrenoud-Aebi, 1995), esta frmula aparece sistematicamente

    associada a uma viso de aprendizagem na qual a dinmica interna

    inconsciente dos aprendizes que estrutura os comportamentos. Certamente, a

    frmula consensual. Mas nos resta perguntar, como o faz Rochex (1996: 33) se

    este consenso no repousa, pelo menos em parte, sobre uma espcie de lugar comum

    pedagogicamente correto , cuja freqncia de uso poderia perfeitamente ser

    inversamente proporcional ao rigor conceitual. Se podemos nos alegrar de ver assim

    reconhecido que no haveria aprendizagem sem atividade e engajamento do sujeito, a meu

    ver, convm reafirmar na esteira, dentre outros, de Wallon, de Vygotsky ou de

    Meyerson , que o objeto mesmo sobre o qual se exerce esta atividade confere-lhe um

    carter normatizado (o que no quer dizer normalizado) e demanda ao sujeito que saia de

    si mesmo para se defrontar com normas e significaes partilhadas e, logo, para

    confrontar-se com e expor-se alteridade.

    Qual interacionismo?

    Podemos reencontrar o debate aqui delineado, no interior do campo da

    didtica do francs lngua materna. No se trata, como no caso de outras

    didticas, de uma controvrsia entre os defensores do interacionismo lgico e do

    interacionismo social. O primeiro, que parece ignorar que as relaes humanas

    so sempre mediadas por objetos do mundo cultural (cf. Bronckart, 1996), no

    pode mais fornecer um quadro interpretativo interessante para se refletir sobre o

    ensino de lnguas. Para o interacionismo social, a conscincia de si e a construo

    das funes superiores so estreitamente dependentes da histria de relaes do

    indivduo com sua sociedade e da utilizao da linguagem. O fato de pertencer a

    uma comunidade de interpretao das unidades de representao permite a

    compreenso e a antecipao das atividades de outrem; permite, igualmente, a

    modificao de seu prprio comportamento, levando-se em conta o ponto de

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    vista do outro. Considerando-se a ao recproca dos membros do grupo e os

    sistemas de comunicao que a tornam possvel como os principais fenmenos

    explicativos da aprendizagem, esse quadro terico convm perfeitamente para

    interpretar e compreender os problemas em jogo na didtica do francs lngua

    materna. E deixa, pelo menos, duas opes estratgicas em aberto.

    Duas contribuies feitas no colquio sobre as interaes leitura-escrita

    (Reuter, 1994) ilustram-nas perfeio. A primeira, defendida por Vinson &

    Privat (1994), insiste sobre as interaes entre o aprendiz e as propriedades

    culturais do texto num projeto de construo direta de uma pessoa livre, criativa e

    autnoma. A outra, proposta por Dolz (1994), considera que o desenvolvimento

    da autonomia do aprendiz , em grande parte, conseqncia da mestria7 do

    funcionamento da linguagem em situaes de comunicao. O objetivo primeiro

    o de instrumentalizar o aprendiz para que ele possa descobrir, com seus

    camaradas, as determinaes sociais das situaes de comunicao assim como o

    valor das unidades lingsticas no quadro de seu uso efetivo. Nesta segunda

    opo estratgica, as intervenes sistemticas do professor desempenham um

    papel central para a transformao das interaes entre o aprendiz e o texto.

    A primeira posio, a que chamaremos interacionismo intersubjetivo,

    prioriza a dinmica transacional das trocas na aprendizagem. uma teoria scio-

    cognitiva da aprendizagem, que centra sua ateno sobretudo nos contextos de

    interao, de influncia mtua, de trocas verbais e de atividades de construo

    conjunta em situaes naturais, relegando a um plano acessrio as

    intervenes ditas artificiais e intencionais, ditadas pelo meio social. Arrisca-se,

    assim, a perder de vista os ingredientes de ensino que desempenham um papel

    catalisador no desenvolvimento. Os discursos so considerados como objetos de

    aprendizagem e como instrumentos a servio da aprendizagem, mas so

    7Poderamos aqui ter escolhido as palavras domnio ou controle, mais freqentes no cenrio

    vygotskiano. Optamos, entretanto, por mestria, por duas razes: fidelidade ao texto original esinalizao para as elaboraes mais recentes de J. Wertsch sobre a questo. [NT]

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    raramente abordados como objetos de ensino. Uma progresso baseada numa

    teoria como essa tenderia a selecionar objetos e situaes naturais, cada vez mais

    complexas, que seriam, potencialmente, fontes de aprendizagem. Procuraria

    antecipar seqncias possveis e diferenciadas de aprendizagem, sem selecionar

    objetivos e objetos progressivos de ensino, sem formalizar a ordem das

    intervenes do professor.

    A segunda posio, a que chamaremos interacionismo instrumental,

    insiste sobre as relaes ensino-aprendizagem e sobre os diferentes instrumentos

    que podem ser construdos para permitir a transformao dos comportamentos.

    Uma teoria social do ensino-aprendizagem enfoca as influncias sociais a que os

    alunos esto submetidos, ao mesmo tempo em que leva em conta as

    caractersticas do lugar social no qual as aprendizagens se realizam: a escola. Ela

    leva em considerao as necessidades e finalidades que fazem com que os

    diferentes participantes busquem uma forma de interao na qual os modelos

    retidos dependem de sua valorizao social. Ela analisa as intervenes

    intencionais dos professores em funo de um projeto, distinto da esfera

    cotidiana de experincia do aluno, e estuda no s os ajustes retrospectivos para

    assegurar a continuidade das aprendizagens, mas sobretudo o efeito dos ajustes

    prospectivos, em funo do modelo buscado, das novidades introduzidas e do

    pr-enquadre proposto. As antecipaes predispem a uma ateno seletiva que

    consiste em tratar certos componentes do modelo e em ignorar outros. As

    interaes so reguladas pelos professores, que so responsveis por ajudar o

    aluno a assimilar as novidades. A progresso curricular derivada de uma tal

    teoria considerada como uma elaborao artificial, uma construo de

    instrumentos, destinada a melhor controlar os diversos componentes que

    integram os processos de ensino-aprendizagem.

    Quais so as conseqncias desta ltima perspectiva para uma concepo

    global da progresso?

    Primeiramente, o currculo deve fornecer uma viso de conjunto dos

    objetos de ensino e dos objetivos limitados a atingir face a estes objetos. Estes

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    objetos culturais so abordados em toda sua complexidade, isto , do ponto de

    vista das normas e das significaes partilhadas que veiculam, mas so tambm

    decompostos para o ensino.

    Em segundo lugar, coloca-se para o currculo o problema da progresso

    de grupos heterogneos de alunos trabalhando conjuntamente. Ele no tem por

    funo estabelecer expectativas relativas ao desenvolvimento singular dos

    alunos, mesmo que cuide de respeit-lo. Ele define expectativas mnimas da

    sociedade para todos.

    Em terceiro lugar, o currculo deve antecipar os obstculos tpicos da

    aprendizagem, nos diferentes ciclos escolares e no interior destes ciclos, assim

    como as novas etapas pelas quais os alunos podem passar. Fornece aos

    professores as grandes orientaes de trabalho como referenciais e hipteses a

    adaptar, de acordo com os grupos de alunos e com as restries das situaes

    concretas de ensino.

    Em quarto lugar, o currculo precisa as situaes de colaborao entre

    alunos do mesmo ciclo e/ou de diferentes ciclos, que facilitam uma construo

    conjunta de novas capacidades.

    Em quinto lugar, o currculo fornece os instrumentos e as estratgias de

    interveno para transformar as capacidades iniciais apresentadas pelos alunos

    (resultados da aprendizagem espontnea, mas sobretudo do ensino intencional

    anterior). Traz consigo, portanto, elementos que permitem aos alunos passar a

    uma nova etapa no seu complexo processo de socializao.

    A tenso entre as exigncias externas e as possibilidades internas

    A organizao de uma progresso no ensino da expresso na escola

    obrigatria exige, como vimos, um esclarecimento das finalidades. Estas fazem

    parte de um contrato social constantemente atualizado pelos parceiros do

    sistema educativo. No quadro da renovao do francs na Suia francfona, a

    frmula geral aprender uma lngua aprender a comunicar constitui um dos

    princpios em vigor na metodologia de referncia adotada pelos diversos

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    cantes. Inspirando-nos numa concepo interacionista, podemos explicitar da

    seguinte maneira em que consiste dar prioridade ao funcionamento

    comunicativo dos alunos:

    prepar-los para dominar a lngua em situaes variadas, fornecendo-lhesinstrumentos eficazes;

    desenvolver nos alunos uma relao com o comportamento discursivoconsciente e voluntria, favorecendo estratgias de autoregulao;

    ajud-los a construir uma representao das atividades de escrita e de fala emsituaes complexas, como produto de um trabalho e de uma lenta elaborao.

    As situaes de ensino so concebidas, fundamentalmente, para permitiraos alunos que ultrapassem seus prprios limites na direo definida pelas

    finalidades. Deste ponto de vista, uma progresso curricular global centra-se em

    contedos disciplinares que se supe que coloquem problemas para os

    aprendizes de um ciclo. Ela visa a tenso entre as possibilidades internas dos

    aprendizes e as exigncias externas fontes de toda aprendizagem (Schneuwly,

    1994; 1995), mas, por seu carter geral, somente pode dar uma viso de conjunto

    das exigncias externas e das etapas necessrias para atingi-las. Sugere, portanto,

    formas ideais externas com as quais os alunos devem se confrontar ao longo da

    escolaridade obrigatria de maneira a se assegurar a aprendizagem da expresso.

    Se, para as atividades gramaticais, o professor dispe de uma descrio

    precisa dos contedos que os alunos devem adquirir a cada srie; para as

    atividades de expresso escrita e oral, onde os saberes a se construir so

    infinitamente mais complexos, ele tem tido de se contentar com indicaes muito

    sumrias. Tudo se passa como se a capacidade de produzir textos fosse um saber

    que a escola deve encorajar, para facilitar a aprendizagem, mas que nasce e se

    desenvolve fundamentalmente de maneira espontnea, sem que pudssemos

    ensin-la sistematicamente.

    A operacionalizao da zona proximal de desenvolvimento (ZPD),

    introduzida por Vygotsky, exige um nvel de concretizao maior que a

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    progresso curricular global. Tal como a analisam Besson & Bronckart (1995: 46)

    a ZPD no determinvel a priori; o ensino, em sua lgica educativa prpria

    (sobretudo, lgica dos programas), s pode propor situaes de interao que julga serem

    eficazes; e estas somente o sero se os elementos interativos forem assimilveis ao estado

    de desenvolvimento efetivo do aluno. Portanto, o sucesso na criao de uma ZPD nunca

    est assegurado e depende grandemente da experincia profissional do professor. A

    criao de um espao potencial de desenvolvimento deve ser encarada no nvel

    local, no quadro da realizao de seqncias didticas que tm por objeto

    gneros.

    Progresso, seqncia didtica e gneros

    A concepo de conjunto proposta neste trabalho funda-se sobre o

    postulado de que comunicar-se oralmente ou por escrito pode e deve ser

    ensinado sistematicamente. Ela se articula por meio de uma estratgia, vlida

    tanto para a produo oral como para a escrita, chamada seqncia didtica8, a

    saber, uma seqncia de mdulos de ensino, organizados conjuntamente para

    melhorar uma determinada prtica de linguagem. As seqncias didticas

    instauram uma primeira relao entre umprojeto de apropriaode uma prtica de

    linguagem e os instrumentos que facilitam esta apropriao. Desse ponto de vista,

    elas buscam confrontar os alunos com prticas de linguagem historicamente

    construdas, os gneros textuais, para dar-lhes a possibilidade de reconstru-las e

    delas se apropriarem. Esta reconstruo realiza-se graas interao de trs

    fatores: as especificidades das prticas de linguagem que so objeto de

    aprendizagem; as capacidades de linguagem dos aprendizes e as estratgias de

    ensino propostas pela seqncia didtica.

    8 Para uma bibliografia completa das pesquisas sobre as seqncias didticas da equipe de

    didtica de lnguas da Universidade de Genebra, ver Dolz & Schneuwly, 1996 [NA]. Vertambm os captulos 4 e 6 deste volume [NT].

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    As prticas de linguagem so consideradas como aquisies acumuladas pelosgrupos sociais no curso da Histria. Numa perspectiva interacionista, so, a

    uma s vez, o reflexo e o principal instrumento de interao social. devido a

    essas mediaes comunicativas, que se cristalizam na forma de gneros, que as

    significaes sociais so progressivamente reconstrudas. Disso decorre um

    princpio que funda o conjunto de nosso enfoque: O trabalho escolar, no

    domnio da produo de linguagem, faz-se sobre os gneros, quer se queira ou

    no. Eles constituem o instrumento de mediao de toda estratgia de ensino e

    o material de trabalho, necessrio e inesgotvel, para o ensino da textualidade.

    A anlise de suas caractersticas fornece uma primeira base de modelizao

    instrumental para organizar as atividades de ensino que estes objetos de

    aprendizagem requerem.

    O que umgnero? Em outro texto (Schneuwly, 1994)2, desenvolvemos a

    idia metafrica do gnero como (mega-)instrumento para agir em situaes de

    linguagem. Uma das particularidades deste tipo de instrumento - como de

    outros, alis - que ele constitutivo da situao: sem romance, por exemplo,

    no h leitura e escrita de romance. Sem dvida, esta uma das particularidades

    do funcionamento da linguagem em geral (e, logo, um limite da metforainstrumental...). A mestria de um gnero aparece, portanto, como co-constitutiva

    da mestria de situaes de comunicao. Situando-nos na perspectiva

    bakhtiniana, consideramos que todo gnero se define por trs dimenses

    essenciais: 1) os contedos que so (que se tornam) dizveis atravs dele; 2) a

    estrutura (comunicativa) particular dos textos pertencentes ao gnero; 3) as

    configuraes especficas das unidades de linguagem, que so sobretudo traos

    da posio enunciativa do enunciador, e os conjuntos particulares de seqnciastextuais e de tipos discursivos que formam sua estrutura.

    2 Ver captulo 1 deste volume. [NT]

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    A noo de capacidades de linguagem (Dolz, Pasquier & Bronckart, 1993)

    evoca as aptides requeridas do aprendiz para a produo de um gnero numa

    situao de interao determinada: adaptar-se s caractersticas do contexto e do

    referente (capacidades de ao); mobilizar modelos discursivos (capacidades

    discursivas) e dominar as operaes psicolingsticas e as unidades lingsticas

    (capacidades lingstico-discursivas). O desenvolvimento das capacidades de

    linguagem constitui-se, sempre, parcialmente, num mecanismo de reproduo,

    no sentido de que modelos de prticas de linguagem esto disponveis no

    ambiente social e de que os membros da sociedade que os dominam tm a

    possibilidade de adotar estratgias explcitas para que os aprendizes possam se

    apropriar deles. A descrio das etapas da ontognese, a anlise das capacidades

    de linguagem dos aprendizes assim como o estudo dos processos subjacentes

    implicados constituem referncias que podem ajudar a compreender as

    transformaes que se produzem ao longo da aprendizagem e contribuem para

    fixar os contornos das intervenes dos professores. A observao das

    capacidades de linguagem, antes e durante a realizao de uma seqncia

    didtica, destina-se a delimitar um espao de trabalho possvel de ser adotado

    nas intervenes didticas. As capacidades atestadas pelos comportamentos dos

    alunos so consideradas como produtos de aprendizagens sociais anteriores e

    fundam as novas aprendizagens sociais.

    Finalmente, as estratgias de ensino supem a busca de intervenes no

    meio escolar que favoream a mudana e a promoo dos alunos a uma melhor

    mestria dos gneros e das situaes de comunicao que lhes correspondem.

    Trata-se, fundamentalmente, de se fornecerem aos alunos os instrumentos

    necessrios para se progredir. Para faz-lo, as atividades comunicativas

    complexas que os alunos ainda no esto aptos a realizar de maneira autnoma

    sero, de certa maneira, decompostas, o que permitir abordar um a um,

    separadamente, os componentes que colocam problemas para os alunos. As

    intervenes sociais, a ao recproca dos membros do grupo e, em particular, as

    intervenes formalizadas nas instituies escolares so fundamentais para a

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    organizao das aprendizagens em geral e para o processo de apropriao de

    gneros em particular. Neste sentido, as seqncias didticas so instrumentos

    que podem guiar as intervenes dos professores.

    Numa primeira etapa de nosso trabalho, o problema da progresso

    colocou-se principalmente a partir da elaborao e da experimentao das

    seqncias didticas (cf. Besson & Bronckart, 1995; Dolz, Pasquier & Bronckart,

    1993; Pasquier & Dolz, 1996; Schneuwly, 1991). A definio dos objetivos de uma

    seqncia didtica devia adaptar-se s capacidades e s dificuldades dos alunos

    nela engajados. Tratava-se sobretudo de promover mudanas associadas a uma

    situao especfica de aprendizagem. Para faz-lo, era preciso no s analisar

    estas capacidades (assim como os obstculos e as insuficincias, muito variveis

    de um grupo de alunos a outro) antes de ensinar, mas tambm durante o ensino.

    Por exemplo, o esforo de elaborao de seqncias didticas do Servio de

    Francs3 nestes ltimos anos exerceu-se fundamentalmente na organizao de

    uma seqncia de atividades e de exerccios que permitissem a transformao

    gradual das capacidades iniciais dos alunos para dominarem um gnero -

    transformao esta gerada pelo desejo de resolver a contradio entre o que eles

    so capazes de produzir e as novidades que esto descobrindo com seus

    camaradas. As estratgias privilegiadas neste tipo de progresso so as

    seguintes:

    1. adaptar a escolha de gneros e de situaes de comunicao scapacidades de linguagem apresentadas pelos alunos;

    2. antecipar as transformaes possveis e as etapas que poderiam sertranspostas;

    3 Servio de Didtica do Francs da Direo do Ensino Primrio genebrino, encarregado da

    elaborao de meios de ensino e da formao contnua dos professores [NA].Unidade da Faculdade de Psicologia e Cincias da Educao, ligada ao Departamento deDidtica de Lnguas da Universidade de Genebra, responsvel pela prestao de servios aosCursos regulares de Formao de Professores de Francs (lngua materna) e aos Cursos deFormao em Servio oferecidos Rede Pblica de Genebra, em processo de expanso para aRede Pblica da Suia francfona [NT].

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    3. simplificar a complexidade da tarefa, em funo dos elementos queexcedem as capacidades iniciais das crianas;

    4. esclarecer com os alunos os objetivos limitados visados e o itinerrioa percorrer para ating-los;

    5. dar tempo suficiente para permitir as aprendizagens;6. ordenar as intervenes de maneira a permitir as transformaes;7. escolher os momentos de colaborao com os outros alunos para

    facilitar as transformaes;

    8. avaliar as transformaes produzidas.Um certo nmero de problemas de progresso pode ser resolvido no

    quadro de uma classe, isto , no quadro da interao entre o professor, que

    intervm para tornar possveis as aprendizagens; um grupo de alunos, que

    trabalha; e os gneros, que constituem o objeto de ensino. Entretanto, as prprias

    possibilidades de se realizar seqncias didticas que visam uma progresso do

    ensino-aprendizagem dependem das restries postas pelo sistema de ensino e

    pelo sistema educativo. A generalizao (e a prpria prtica) das seqncias

    didticas que esto sendo teorizadas permanece aleatria, enquanto os novos

    objetos de ensino propostos - os gneros - no tenham um lugar mais claro nos

    guias curriculares do primrio e do secundrio obrigatrios4 e enquanto no for

    proposta uma concepo de conjunto da progresso curricular da expresso.

    A progresso na tradio escolar

    Propor que se organize a progresso em torno dos gneros no ser um

    retrocesso tradio escolar centenria de ensino da redao e da composio?Como mostram os trabalhos sobre a histria deste ensino (Chartier & Hbrard,

    1994; Chervel, 1988; Schneuwly, 1986; Ludwig, 1988), foram, com efeito, os

    4 Equivalentes ao nosso antigo primrio e ginsio. [NT]

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    gneros as primeiras unidades de construo das progresses nos guias

    curriculares. Trata-se, sobretudo e nesta ordem - citamos aqui a ttulo de exemplo

    Schne & Mortreux (1940) -, da descrio, domnio de observao mais fcil de

    abordar; da composio vista de gravura5, mais difcil [porque] o detalhamento

    necessariamente mais minucioso; da narrao, que se apoia sobre a descrio e a

    composio vista de gravura e da dissertao, que tem o rigor de uma

    demonstrao matemtica e, como ela, chega a uma concluso (p. 125s).

    Os gneros tratados no quadro do ensino da redao e da composio tm

    diversas particularidades6. Mesmo tendo sido originados da tradio retrica, ao

    mesmo tempo, esto deformados, na medida em que a funo que assumiam em

    seu quadro de origem no est mais presente. No servindo mais a uma causa

    jurdica ou poltica, tornam-se, assim, exclusivamente modos de apresentao da

    realidade tal e qual e, logo, puros produtos escolares para os quais no h

    verdadeiras referncias textuais exteriores, j que toda a escrita social extra-

    escolar tem evidentemente tambm uma dimenso comunicativa. A escola cria,

    assim, sua prpria norma textual, alis pouco explcita: os gneros escolares.

    Quanto progresso, esta definida por uma seqncia quase imutvel de

    gneros, baseada ou em consideraes sobre a complexidade do objeto a ser

    descrito (descrio vs. composio vista de gravura; narrao vs. dissertao),

    ou em consideraes de incluso (descrio e composio vista de gravura

    esto contidos na narrao). Tendo-se definido a escrita como ato de

    representao perfeita do mundo, a progresso concebida como a construo

    passo a passo, aditiva, desta capacidade nica que a arte de escrever, sempre

    idntica a si prpria, qualquer que seja sua finalidade, coroamento do esforo

    pedaggico no ensino de lngua materna, como o dizem numerosos guias

    curriculares.

    5Portrait, no original. [NT]

    6 Ver o prximo captulo, a respeito. [NT]

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    Ao lado desta pedagogia do coroamento dominante, existe, tambm desde

    sempre, uma tradio minoritria no sistema escolar que no aparece nos guias

    curriculares e nos manuais, mas que est presente nas prticas em graus

    variados. A ttulo emblemtico, citaremos as prticas de escrita diversificadas

    introduzidas na escola por Freinet ou por ele sistematizadas: textos livres, jogos

    dramticos, romances coletivos, poemas, correspondncia, jornal de classe ou de

    escola, conferncia. Poderamos definir sua estratgia dizendo que ele levou a

    srio as situaes escolares como situaes de comunicao e, por isso,

    desenvolve ou adapta os gneros existentes. A importncia do enfoque de

    Freinet - e de numerosas prticas que a ele se referem de perto ou de longe - no

    pode ser subestimada no contexto francfono. Prova disso que a renovao do

    ensino de francs, preparada nos anos sessenta com a introduo explcita da

    dimenso comunicativa nos objetivos e guias curriculares, concretamente, no

    prope seno - e Vourzay (1966), em sua tese notvel, demonstra isso - a

    introduo oficial das prticas freinticas nas salas de aula da escola pblica,

    embora desligadas de seu contexto funcional, a saber o funcionamento

    cooperativo da classe (Clanch, 1988).

    O enfoque de Freinet abre as portas dimenso comunicativa da

    linguagem, ausente dos enfoques dominantes da pedagogia do coroamento.

    Parece-nos que ele pode e deve ser desenvolvido em dois pontos que se

    constituem como pontos cegos na maneira de Freinet conceber o trabalho com

    textos: a pouca ateno que ele d aos gneros existentes socialmente e sobre os

    quais, de fato, modelam-se subrepticiamente os gneros que ele desenvolve em

    sala de aula e a ausncia de reflexo sistemtica sobre os problemas de

    progresso na mestria dos gneros, devida, sem dvida, sua concepo de

    aprendizagem como processo natural.

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    Agrupamentos de gneros: Um instrumento para construir a

    progresso

    Do ponto de vista terico, um dos paradoxos dos gneros, dentre outros,

    reside no fato de que eles so mais ou menos imediatamente referenciveis e

    referenciados cotidianamente nas prticas de linguagem - de tal forma que

    podemos freqentemente nome-los sem muita hesitao e, na comunicao

    quotidiana, sempre o fazemos -, mas nunca se prestam definio sistemtica e

    geral, sem dvida por causa de seu carter multiforme, malevel, espontneo.

    Sua descrio se faz, portanto, sempre a posteriori, como explicitao da evidncia

    cotidiana que permite seu reconhecimento e por meio de enfoques locais que no

    podem visar a descrio ou mesmo a explicao de regularidades mais gerais da

    linguagem. Disto decorre que eles no podem fornecer princpios para a

    construo de uma progresso e de um currculo, mas, apesar disso, devem

    constituir os ingredientes de base do trabalho escolar, pois, sem os gneros, no

    h comunicao e, logo, no h trabalho sobre a comunicao.

    A prpria diversidade dos gneros, seu nmero muito grande, sua

    impossibilidade de sistematizao impedem-nos, pois, de tom-los como

    unidade de base para pensarmos uma progresso. No h eixo de continuidade

    que permitiria pensar a construo de capacidades, seno aquele de dominar

    cada vez melhor um gnero, e outro, e outro e, atravs deles, a arte de escrever

    em geral - o que constitui precisamente a pedagogia do coroamento descrita

    anteriormente. J que, visivelmente, as progresses no podem ser construdas

    no nvel imediato da unidade gnero, necessrio, ento, recorrermos a outras

    conceitualizaes lingsticas e psicolgicas.

    As tipologias do discurso elaboradas em lingstica e psicologia, durante

    um certo tempo, puderam ser consideradas como uma sada promissora. Muito

    rapidamente, verificou-se que, mesmo trazendo importantes conhecimentos

    novos sobre o funcionamento da linguagem e, logo, elementos que devem ser

    levados em considerao no trabalho com textos, estas tipologias sofriam, do

    ponto de vista de sua aplicao didtica, de duas limitaes importantes

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    (Schneuwly, 1991): a) seu objeto no o texto, e ainda menos o gnero do qual

    todo texto um exemplar, mas operaes de linguagem constitutivas do texto,

    tais como a ancoragem enunciativa e a escolha de um modo de apresentao ou

    de tipos de seqencialidades; b) por isso mesmo, a anlise se exerce sobre

    subconjuntos particulares de unidades lingsticas que formam configuraes,

    traduzindo as operaes de linguagem postuladas. As tipologias discursivas no

    podem, por si s, fornecer uma base suficientemente ampla para elaborarmos

    progresses, que ficariam forosamente parciais, tocando somente em certos

    aspectos do funcionamento da linguagem.

    Sem negarmos a contribuio essencial destas proposies tericas,

    optamos por um enfoque de agrupamentos de gneros. Sabemos e assumimos seu

    carter parcialmente ad hoc, mas estes respondem, apesar disso, a trs critrios

    essenciais no que diz respeito construo de progresses, para a qual

    constituem um instrumento indispensvel. preciso que os agrupamentos:

    1. correspondam s grandes finalidades sociais legadas ao ensino,respondendo s necessidades de linguagem em expresso escrita e oral,

    em domnios essenciais da comunicao em nossa sociedade (inclusive a

    escola)7;

    2. retomem, de modo flexvel, certas distines tipolgicas que j figuramem numerosos manuais e guias curriculares;

    3. sejam relativamente homogneos quanto s capacidades de linguagemdominantes implicadas na mestria dos gneros agrupados.

    Os agrupamentos assim definidos no so estanques uns com relao aos

    outros; no possvel classificar cada gnero de maneira absoluta em um dos

    7 Estas necessidades de linguagem no se definem somente, ou mesmo essencialmente, sobre a

    base de uma viso utilitarista estreita que afirmaria que preciso ensinar o que pode servirmais tarde ao aluno. Estamos convencidos do contrrio. Sabemos mesmo que, em certos casos,a escrita uma via particularmente eficaz para melhor compreender o funcionamento dostextos e para assim adquirir uma melhor mestria da leitura e da anlise de textos.

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    agrupamentos propostos; no mximo, seria possvel determinar certos gneros

    que seriam os prottipos para cada agrupamento e, assim, talvez particularmente

    indicados para um trabalho didtico. Trata-se, mais prosaicamente, de dispor de

    um instrumento suficientemente fundado teoricamente para resolver

    provisoriamente problemas prticos (ver nossa nota 5 sobre o conforto e o

    desconforto do didtico).

    O Quadro 1 apresenta os cinco agrupamentos de gneros que estamos

    atualmente utilizando como base de nosso trabalho8 e, para cada agrupamento,

    os trs critrios que nos servem para determinar a coerncia mnima da proposta

    com as referncias externas. De sada, devemos notar que a originalidade da

    estratgia no reside absolutamente nos agrupamentos propostos, que, ao

    contrrio, so semelhantes a muitos outros, mas antes de tudo no fato de

    trabalharmos no nvel dos gneros e na tentativa de definirmos as capacidades de

    linguagem globais em relao s tipologias existentes.

    QUADRO 1:PROPOSTA PROVISRIA DE AGRUPAMENTO DE GNEROS9

    Domnios sociais de comunicao

    ASPECTOS TIPOLGICOS

    Capacidades de linguagem dominantes

    Exemplos de gneros orais e escritos

    Cultura literria ficcional

    NARRARMimesis da ao atravs da criao da intriga

    no domnio do verossmil

    conto maravilhosoconto de fadasfbulalendanarrativa de aventuranarrativa de fico cientficanarrativa de enigmanarrativa mticasketch ou histria engraada

    8 Ignoramos propositadamente a poesia, que no pode, absolutamente, ser tratada comoagrupamento de gneros. Para um tratamento interessante, ver Jolibert, Sraiki & Herbeaux,1992.

    9 J que os gneros e sua circulao so prticas reconhecidamente culturais, tomamos a liberdadede inserir no Quadro 1 alguns gneros que circulam com freqncia em nossa sociedade e queno figuram no Quadro original. Tambm aproximamos ou adptamos a designao de algunsdeles. Uma proposta revista destes agrupamentos, figura em Dolz & Schneuwly (1997) [NT].

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    biografia romanceadaromanceromance histriconovela fantsticacontocrnica literriaadivinhapiada

    Domnios sociais de comunicao

    ASPECTOS TIPOLGICOS

    Capacidades de linguagem dominantes

    Exemplos de gneros orais e escritos

    Documentao e memorizao das aes humanas

    RELATAR

    Representao pelo discurso de experinciasvividas, situadas no tempo

    relato de experincia vivida

    relato de viagem

    dirio ntimo

    testemunho

    anedota ou caso

    autobiografia

    curriculum vitae

    ...

    notcia

    reportagemcrnica social

    crnica esportiva

    ...

    histrico

    relato histrico

    ensaio ou perfil biogrfico

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    biografia

    ...

    Discusso de problemas sociais controversos

    ARGUMENTAR

    Sustentao, refutao e negociao detomadas de posio

    textos de opinio

    dilogo argumentativo

    carta de leitor

    carta de reclamaocarta de solicitao

    deliberao informal

    debate regrado

    assemblia

    discurso de defesa (advocacia)

    discurso de acusao (advocacia)

    resenha crtica

    artigos de opinio ou assinados

    editorial

    ensaio...

    Domnios sociais de comunicao

    ASPECTOS TIPOLGICOS

    Capacidades de linguagem dominantes

    Exemplos de gneros orais e escritos

    Transmisso e construo de saberes

    EXPOR

    Apresentao textual de diferentes formas dossaberes

    texto expositivo (em livro didtico)

    exposio oralseminrio

    conferncia

    comunicao oral

    palestra

    entrevista de especialista

    verbete

    artigo enciclopdico

    texto explicativo

    tomada de notas

    resumo de textos expositivos e explicativosresenha

    relatrio cientifico

    relatrio oral de experincia

    instrues de montagem

    receita

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    Instrues e prescries

    DESCREVER AES

    Regulao mtua de comportamentos

    regulamento

    regras de jogo

    instrues de uso

    comandos diversos

    textos prescritivos

    ...

    Estes agrupamentos parecem ser suficientemente diferentes uns dos

    outros para que seja possvel definir, para cada um deles, algumas capacidades

    globais que se deve construir ao longo da escolaridade. No prximo item,

    exemplificaremos isso para o terceiro domnio. O princpio sobre o qual a

    progresso est elaborada muito simples: trata-se de construir, com os alunos,

    em todos os graus de escolaridade, instrumentos, visando o desenvolvimento

    das capacidades necessrias para dominar os gneros agrupados. A hiptese de

    trabalho subjacente a de que h uma afinidade suficientemente grande entre os

    gneros agrupados, para que transferncias se operem facilmente de um a outro,

    hiptese fundada sobre a idia de uma dominncia no que concerne s

    capacidades psicolgicas implicadas em cada agrupamento. Dito isso, h

    tambm capacidades de produo de linguagem que atravessam os diferentes

    agrupamentos e, logo, possibilidade de transferncia transagrupamentos, que

    ainda no estamos levando em conta em nossa proposta.

    De um ponto de vista curricular, propomos que cada agrupamento seja

    trabalhado em todos os nveis da escolaridade, atravs de um ou outro dos

    gneros que o constituem. Pelo menos, as seguintes razes militam em defesa de

    um tal encaminhamento:

    ele oferece aos alunos vias diferentes de acesso escrita e, assim, realiza oprincpiopedaggico de diferenciao (Schneuwly, Rosat, Pasquier & Dolz,

    1993). Podemos, com efeito, supor que as capacidades de escrita de cada

    aluno no se distribuem uniformemente nos diferentes agrupamentos;

    determinado aluno ter mais facilidade para argumentar, um outro para

    narrar e assim por diante. A escrita no aparece como um nico obstculo,

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    difcil de transpor, mas como um domnio que se pode abordar por

    diversos caminhos, mais ou menos fceis;

    de um ponto de vista didtico, a diversificao dos gneros trabalhados,regulada pelos agrupamentos, oferece a possibilidade de definirmosespecificidades de funcionamento dos diferentes gneros e tipos, para um

    trabalho de comparao de textos. Trata-se de um princpio elementar de

    construo por confronto com o mesmo e o diferente;

    psicologicamente , numerosas operaes de linguagem, necessrias, porexemplo, para dominar a narrao no sentido em que a definimos, esto

    intimamente ligadas a um agrupamento de gneros e exigem um ensino-

    aprendizagem direcionado que, alm disso, necessrio que se faa emdiferentes nveis de mestria. Isto no exclui transferncias de um

    agrupamento a outro ou a transformao mais global da relao do aluno

    com sua prpria linguagem;

    finalmente, as finalidades sociais do ensino da expresso impem umtrabalho especfico para desenvolver as capacidades dos alunos em

    domnios to diversos quanto a linguagem como instrumento de

    aprendizagem ou como mimesis da ao a servio da reflexo sobre a

    relao do homem com o mundo e consigo mesmo.

    Elaborar progresses: Exemplo de um encaminhamento

    Vamos ilustrar o encaminhamento utilizado para tentarmos construir

    progresses, por meio de um exemplo desenvolvido para o terceiro agrupamento

    do Quadro 1. De maneira geral, este encaminhamento pode ser caracterizado

    pelos seguintes passos:

    a) para cada um dos agrupamentos, levando-se em conta especialmente osaspectos tipolgicos e as capacidades de linguagem dominantes, possvel

    definirmos objetivos a atingir de complexidade varivel, ou, dito de outra

    maneira, problemas de linguagem de diferentes nveis de dificuldade.

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    Estes se relacionam com trs nveis fundamentais de operaes de

    linguagem em funcionamento (ver Bronckart et al., 1985; Schneuwly, 1988;

    Bain & Schneuwly, 1994):

    representao do contexto social ou contextualizao (capacidades deao);

    estruturao discursiva do texto (capacidades discursivas); escolha de unidades lingsticas ou textualizao (capacidades

    lingstico-discursivas);

    b)estes objetivos so buscados (ou estes problemas de linguagem soabordados) no quadro de seqncias didticas, atravs do trabalho sobreum ou vrios gneros do agrupamento, em seqncias didticas do tipo

    das descritas acima;

    c)o enfoque potencialmente espiral, ao menos em dois nveis: objetivos semelhantes so abordados em nveis de complexidade cada

    vez maior ao longo da escolaridade;

    um mesmo gnero pode ser abordado diversas vezes ao longo daescolaridade, com graus crescentes de aprofundamento.

    O modelo dominante subjacente concepo no , portanto, o de uma

    construo passo a passo, elemento por elemento, mas o de uma reorganizao

    fundamental das capacidades de linguagem dominantes, em funo da

    interveno de novos elementos (novas operaes dominadas; novos saberes

    adquiridos). Toda a arte de conceber uma progresso - na verdade, muito pouco

    dominada - a de definir um certo nmero de elementos-chave, particularmente

    propcios a iniciar transformaes importantes no modo de funcionamento da

    linguagem, no sentido de uma melhor mestria de seus processos prprios. Isto

    particularmente difcil pelo fato de que estes elementos-chave no so os mesmos

    nem para todos os agrupamentos de gneros, nem para todos os grupos de

    alunos.

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    Ilustremos este encaminhamento por um exemplo concreto de esboo

    de uma progresso para o agrupamento de gneros argumentar. O Quadro

    2 mostra os elementos constitutivos deste trabalho: os objetivos ou

    problemas de linguagem esto agrupados em funo dos trs nveis

    essenciais de operaes de linguagem; estes objetivos esto organizados em

    ciclos, tais como funcionam na escola suia francfona, em funo de sua

    suposta complexidade; so propostos gneros particularmente propcios para

    se trabalhar estes objetivos que poderiam constituir objetos privilegiados de

    trabalho nos diferentes graus.

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    CICLOEXEMPLOS DE GNEROS DETEXTOS QUE PODERIAM SER

    ESCOLHIDOS

    REPRESENTAO DO CONTEXTOSOCIAL

    ESTRUTURAO DISCURSIVA DO TEXTO ESCOLHA DE UNIDADES LINGSTICAS

    1-2 ORAL: dar sua opinio e

    justific-la debate coletivo em

    classe

    dar sua opinio em situaesprximas da vida cotidiana

    dar sua opinio com um mnimo desustentao (um ou mais argumentos deapoio)

    perceber as diferenas entre pontos devista

    utilizar expresses de responsabilizaoenunciativa10 para dar opinies

    utilizar organizadores de causa parasustentar opinies

    formular questes da ordem do porqu3-4 ESCRITA:

    imprensa (revistainfantil): carta de leitorORAL:

    defender sua opiniodiante da classe

    reconstruir a questo e oassunto que desencadearam odebate

    identificar e levar em conta odestinatrio do texto

    precisar a inteno de um textoargumentativo

    levar em conta o lugar e omomento onde o texto ser lido

    hierarquizar uma seqncia deargumentos (3) em funo de umasituao

    produzir uma concluso coerente comos argumentos precedentes

    ligar diferentes argumentos e articul-los com a concluso

    reconhecer e utilizar diversas expressesde responsabilizao enunciativa emuma opinio a favor ou contra

    utilizar organizadores enumerativos distinguir organizadores que marcam

    argumentos dos que marcam concluso utilizar frmulas de interpelao e

    fechamento da carta

    5-6 ESCRITA: imprensa (revista para

    jovens): carta de leitor correspondncia: carta

    de reclamao(destinada aautoridade)

    ORAL: debate pblico regrado

    representar globalmenteuma situao polmica (por

    jogo de papis) e analisarseus parmetros:oargumentador e seu papel

    socialodestinatrio e seu papel

    socialo finalidade: convencero

    lugar de publicao dotexto antecipar as respostas

    adotar a forma de uma carta no oficiale estar atento diagramao; idem paracarta oficial

    apresentar o tema da controvrsia naintroduo

    desenvolver os argumentos,sustentando-os por um exemplo

    formular objees aos argumentos doadversrio

    dar uma concluso

    utilizar organizadores argumentativosmarcando:o o encadeamento dos argumentoso a concluso

    utilizar verbos de opinio utilizar frmulas para se opor e exprimir

    objees introduzir: uma experincia pessoal, um

    exemplo

    formular um ttulo com um gruponominal

    10 Estamos traduzindo por responsabilizao enunciativa a expresso francesa prise en charge nonciative. [NT]

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    possveis do(s)adversrio(s)

    CICLOEXEMPLOS DE GNEROS DETEXTOS QUE PODERIAM SER

    ESCOLHIDOS

    REPRESENTAO DO CONTEXTOSOCIAL

    ESTRUTURAO DISCURSIVA DO TEXTO ESCOLHA DE UNIDADES LINGSTICAS

    7-8 ESCRITA: imprensa local: carta

    de leitor, carta aberta,artigo de opinio

    correspondncia: cartade solicitaoORAL:

    dilogo argumentativo deliberao informal

    discernir as posiesdefendidas num texto edelinear a situaopolmica subjacente

    compreender as crenasalheias e atuar sobre elas analisar as caractersticas

    do receptor do texto paraadaptar-se a elas

    antecipar posiescontrrias

    citar a palavra alheia distinguir lugares sociais e

    gneros argumentativos

    escolher um plano de texto adaptadoao gnero argumentativo trabalhado

    definir a tese a defender, elaborarargumentos e agrup-los por tema

    distinguir entre argumento/noargumento e entre argumentocontra/ contra-argumento

    prever diferentes tipos de argumentoe hierarquiz-los em funo dafinalidade a atingir

    selecionar as palavras alheias queapoiam sua prpria tese

    organizar o texto em funo daestratgia argumentativa

    utilizar organizadoresargumentativos marcando: refutao,concesso, oposio

    utilizar verbos declarativos neutros,apreciativos, depreciativos

    utilizar frmulas introduzindocitaes

    em funo da orientaoargumentativa: reconhecer e utilizardiversos meios para exprimir dvida,probabilidade, certeza (advrbios,verbos auxiliares, emprego dostempos)

    distinguir modalidades deenunciao: questes retricas;frmulas interrogativas; exclamativas

    8-9 ESCRITA: imprensa: editorial correspondncia: carta de

    pedido de emprego publicidade: encarte

    publicitrio ensaio, composio de

    idias rplica de defesa ouacusao (advocacia)

    ORAL: debate pblico regrado

    levar em conta um destinatriomltiplo

    tomar para si a palavra alheia discernir restries institucio-

    nais da situao deargumentao

    classificar gneros argumenta-tivos em funo das situaesde argumentao

    identificar a facetaargumentativa dos gneros noargumentativos

    delimitar o objeto da discusso escolher o gnero e as estratgias

    argumentativas definir as diferentes teses possveis

    sobre a questo explorar os argumentos e as

    conseqncias de cada uma das teses antecipar e refutar as posiesadversrias

    elaborar contra-argumentos adotar um ponto de vista em funo do

    papel social e escolher o tom adequado discernir a dimenso dialgica da

    argumentao num texto

    identificar o papel argumentativo decertos conectivos: j que, se, alm disso

    implicar o receptor utilizando diticos depessoa: eu, ns, a gente, voc(s)

    inserir diferentes formas de discursoreportado

    utilizar termos apreciativos: pejorativos,ameliorativos

    empregar vocabulrio conotativo utilizar anforas conceituais reconhecer e utilizar diversas marcas

    modais

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    reconstituir os raciocnios implcitosQUADRO 2:ELEMENTOS PARA UMA PROGRESSO CURRICULAR NO DOMNIO ARGUMENTAR ; GNEROS SUSCETVEIS DE SEREM TRABALHADOS EM FUNO DOS CICLOS ; OBJETIVOS PARA OS TRS NVEIS DE OPERAES

    DE LINGUAGEM

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    Embora baseada sobre numerosas pesquisas no domnio da argumentao

    (Brassard, 1990; Chartrand, 1994; Dolz, 1996; Golder, 1996; Schneuwly, 1988), a

    proposta ainda permanece grandemente intuitiva, especulativa mesmo, e isso,

    por duas razes: porque os conhecimentos so ainda muito pouco avanados no

    domnio do desenvolvimento das capacidades argumentativas; mas, ainda mais

    fundamental, porque, conforme os postulados enunciados no comeo do

    presente artigo, a interao entre ensino-aprendizagem e desenvolvimento, que

    est no cerne de nossa concepo, faz supor que a prpria mudana do quadro

    de interveno sobre as capacidades de linguagem transforma fortemente o

    rumo e o ritmo de desenvolvimento destas ltimas.

    guisa de concluso: Validade didtica como nico critrio da

    progresso

    A organizao de uma progresso temporal do ensino, tal como aqui

    esboada, construda sobre a base de um agrupamento de gneros e levando em

    conta os diferentes nveis de operaes de linguagem, somente uma proposta

    provisria de um currculo aberto e negociado. Aberto, pois no recobre a

    totalidade das atividades possveis em expresso oral e escrita; aberto, pois no

    pode antecipar todos os problemas de aprendizagem e, assim, os professores

    devem adapt-lo e complet-lo em funo de situaes concretas de ensino. Esse

    carter aberto de um currculo pede contnuos ajustes no somente no nvel local,

    mas tambm no da progresso interciclos e intraciclos. Negociado, pois

    diferentes atores participam nas diferentes fases de elaborao e, depois, de

    ajuste.

    Neste processo, o critrio a privilegiar para tomar decises o da validade

    didtica: as possibilidades efetivas de gesto do ensino proposto; a coerncia dos

    contedos ensinados; assim como os ganhos de aprendizagem. A progresso

    curricular resultante da estratgia discutida acima ainda dever ser testada:

    entrar nas prticas e ser avaliada do ponto de vista da validade didtica.

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