Doutrina Vol unico -Pavione et al-TJSP-2ed · de papéis ligados à arrecadação de tributos,...

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DOS CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA 1 4 1

C APÍTULO I

DOS CRIMES CONTR A A FÉ PÚBLIC A

1. NOÇÕESO título X da Parte Especial do Código Penal trata dos crimes contra a fé pública.

Este título é dividido em quatro capítulos: I) da moeda falsa (não abrangido pelo edital do concurso); II) da falsidade de títulos e outros papéis públicos; III) da falsidade documental; IV) de outras falsidades.

A fé pública é a crença, pelos indivíduos, em determinados atos praticados em sociedade e pelo Poder Público. Estes atos consistem, por exemplo, na emissão de moeda, emissão de papéis ligados à arrecadação de tributos, autenticação de atos oficiais pela aposição de selos públicos, emissão de sinais públicos por tabeliões, informações constantes em Carteira de Trabalho, em atestados médicos, informações constantes nos documentos públicos e particulares etc.

Os crimes contra a fé pública violam a autenticidade e veracidade da moeda (os crimes de moeda falsa não são abrangidos pelo edital do concurso), dos papéis públicos e dos documentos públicos ou particulares nos quais a sociedade tem confiança.

A violação da fé pública pode ocorrer por falsidade material e falsidade ideológica. Também, há a possibilidade de a fé pública ser atingida pela destruição, supressão ou ocul-tação do documento, o que veremos no final deste capítulo.

A falsidade material ocorre através de fabricação e alteração de papéis públicos e documentos públicos ou particulares. Está ligada ao objeto material, ao papel.

Já a falsidade ideológica não implica na falsificação do papel (material), mas somente da informação que ele traz, podendo ocorrer pela inserção de informações falsas ou omissão de informações verdadeiras. O documento é emitido por quem legitimamente deve fazê-lo, pessoa esta que falsifica ou que é induzida a falsificar.

2. CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE PAPÉIS PÚBLICOSCada crime possui um nome dado pelo Código, e o nome do crime previsto no art.

293 do Código Penal é “falsificação de papéis públicos”.

Os papéis públicos, objetos deste crime, estão arrolados no art. 293 do Código Penal, incisos do caput.

Denominamos caput a parte do artigo que descreve a principal conduta criminosa. Pode haver parágrafos (§ 1º, § 2º etc.), incisos (I, II, III etc.) e alíneas (a, b, c, etc.) ligados ao caput do artigo. Nos parágrafos do artigo também há a possibilidade de haver descrição de condutas criminosas, com a aplicação da mesma pena ou penalidade diversa.

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Assim, as condutas que configuram crime de falsificação de papéis públicos estão descritas nos incisos I a VI do caput do artigo 293. Importante se faz transcrever o artigo de forma mais didática:

Art. 293, caput:“falsificar,

fabricando-os

ou alterando-os:

Pena – reclusão,

de dois a oito

anos, e multa”

“I – selo destinado a controle tributário, papel selado ou qualquer papel de emissão legal destinado à arrecadação de tributo; II – papel de crédito público que não seja moeda de curso legal; III – vale postal; IV – cautela de penhor, caderneta de depósito de caixa econômica ou de outro estabe-lecimento mantido por entidade de direito público; V – talão, recibo, guia, alvará ou qualquer outro documento relativo a arrecadação de rendas

públicas ou a depósito ou caução por que o poder público seja responsável; VI – bilhete, passe ou conhecimento de empresa de transporte administrada pela União, por Estado ou por Município.”

Art. 293, § 1º:

Incorre na

mesma pena

quem:

“I – usa, guarda, possui ou detém qualquer dos papéis falsificados a que se refere este artigo; II – importa, exporta, adquire, vende, troca, cede, empresta, guarda, fornece ou restitui à circulação selo falsificado destinado a controle tributário; III – importa, exporta, adquire, vende, expõe à venda, mantém em depósito, guarda, troca, cede, empresta, fornece, porta ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, produto ou mercadoria: a) em que tenha sido aplicado selo que se destine a controle tributário, falsificado; b) sem selo oficial, nos casos em que a legislação tributária determina a obrigatoriedade de sua aplicação.”

O § 5º deste artigo determina que é equiparado à atividade comercial qual-quer forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercido em vias, praças ou outros logradouros públicos e em residências.

Art. 293, § 2º:

Pena – reclusão,

de um a quatro

anos, e multa.

Suprimir, em qualquer desses papéis (quando legítimos), carimbo ou sinal indicativo de sua inutilização, com o fim de torná-los novamente utilizáveis.

O § 3º diz que incorre na mesma pena quem usa, depois de alterado, qual-quer destes papéis dos quais foram suprimidos carimbo ou sinal indicativo de sua inutilização.

Atenção: o § 2º criminaliza a conduta do agente que suprimiu o carimbo ou sinal indicativo da inutilização dos papéis, enquanto o § 3º pune a conduta de quem reutilizou estes papéis.

Art. 293, § 4º

Pena – detenção,

de seis meses

a dois anos, ou

multa.

Quem usa ou restitui à circulação, embora recebido de boa-fé, qualquer dos papéis falsificados ou alterados a que se refere este artigo e o seu § 2º, depois de conhecer a falsidade ou alteração.

Repare que a pena é menor, pois o recebimento do papel foi de boa-fé, isto é, o agente não sabia que ele era falsificado ou alterado. Todavia, após tomar conhecimento disso, decidiu usá-lo ou restitui-lo à circulação (para não arcar com o prejuízo, por exemplo).

MUITA

ATENÇÃO

As penas previstas para os crimes podem ser de reclusão, detenção ou multa. Muitas vezes, a multa pode vir de forma cumulada com a reclusão ou detenção. Outras vezes, a multa pode ser alternativa à detenção (o juiz pode aplicar a pena de detenção ou o pagamento da multa).

DICA

IMPORTANTE

A prova de Direito Penal exige do candidato o conhecimento da lei, nos exatos termos escritos no Código Penal. O artigo 293 é extenso, mas possui muitos ele-mentos que não foram cobrados nas últimas quatro provas. As questões costumam exigir o conhecimento básico do crime de falsificação de papéis públicos.

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3. CRIME DE PETRECHOS DE FALSIFICAÇÃOO art. 294 prevê como crime a conduta de “fabricar, adquirir, fornecer, possuir ou

guardar objeto especialmente destinado à falsificação de qualquer dos papéis referidos no artigo 293”, dando-lhe o nome de “petrechos de falsificação”.

Estas condutas constituem uma preparação para o cometimento do crime de falsi-ficação de papéis públicos, previsto no art. 293. Muitas vezes, para falsificar um papel público, há algum objeto especialmente destinado a esta falsificação. Isso não significa que este objeto não possa ser utilizado para outra finalidade, mas a finalidade precípua é a prática de qualquer das falsificações previstas no art. 293.

A pena prevista para este crime é de reclusão, de um a três anos, e multa.

O art. 295 prevê que se o agente é funcionário público, e comete o crime de petrechos de falsificação prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte.

MUITA

ATENÇÃO!

As provas costumam cobrar as causas de aumento de pena (as quais estão pre-sentes em vários artigos), e em que quantidade aumentam. Na parte do Código Penal que nos diz respeito, relativa aos crimes contra a fé pública, as causas de aumento se relacionam com o fato de o autor do crime tê-lo cometido no exercício

de função pública, em razão de função pública ou prevalecendo-se do seu

cargo, e, toda vez que isso ocorre, a pena é aumentada de sexta parte. Exceção ocorre no crime de “fraudes em certames de interesse público”, em que a pena é aumentada de 1/3 se o fato é cometido por funcionário público (a lei, em sua interpretação literal, exige apenas, para a configuração da causa de aumento, que o agente seja funcionário público, mas a interpretação mais acertada é que o agente público deva ter cometido o crime em razão da sua função pública).

4. CRIME DE FALSIFICAÇÃO DO SELO OU SINAL PÚBLICOO artigo 296, caput, prevê como crime a conduta de falsificar, fabricando-os ou alte-

rando-os: I – selo público destinado a autenticar atos oficiais da União, de Estado ou de Município; II – selo ou sinal atribuído por lei a entidade de direito público, ou a autoridade, ou sinal público de tabelião (ex.: aqueles que autenticam documentos e reconhecem firma). A pena é de reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.

Observe que o inciso II se refere a entidades de direito público ou a autoridade. Já o inciso I se refere apenas à União, Estado e Município.

Note que o objetivo principal dos selos ou sinais objetos deste crime é a autenticação e reconhecimento do caráter oficial e veracidade dos documentos.

O § 1º prevê a aplicação das mesmas penas para: “I – quem faz uso do selo ou sinal falsificado; II – quem utiliza indevidamente o selo ou sinal verdadeiro em prejuízo de outrem ou em proveito próprio ou alheio; III – quem altera, falsifica ou faz uso indevido de marcas, logotipos, siglas ou quaisquer outros símbolos utilizados ou identificadores de órgãos ou entidades da Administração Pública”.

Ressaltamos que o caput do artigo descreve as condutas criminosas de falsificar, fabri-cando ou alterando, selo ou sinal público. Já o § 1º tipifica (descreve as condutas criminosas no artigo de lei), em seu inciso I, o uso desse selo ou sinal falsificado e, no inciso II, a

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utilização indevida do selo ou sinal verdadeiro (em prejuízo de outrem ou em proveito próprio ou alheio).

O § 2º traz uma causa de aumento de pena: se o agente é funcionário público e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte.

Não se pode confundir este crime de falsificação do selo e sinal público, previsto no art. 296, com o crime de falsificação de papéis públicos, previsto no art. 293 (explicado no item 2). Atenção, pois o caput dos dois artigos é “falsificar, fabricando-os ou alterando-os”. Ademais, os dois artigos tratam dos selos públicos (embora o art. 293 não mencione o termo “público”), além de outros objetos.

A dica é memorizar que o art. 296 tem as palavras chaves “autenticar”, “sinal”, “au-toridade”, “tabelião” – estas palavras não aparecem no artigo 293.

O artigo 296, em seu caput, diz respeito apenas a selo ou sinal público, enquanto que o artigo 293 diz respeito a selos destinados a controle tributário e papéis públicos destinados à arrecadação de tributos, além de outros objetos.

MUITA

ATENÇÃO!

Cuidado com a diferença entre o crime previsto no art. 293 e o crime de falsificação de papéis públicos, previsto no art. 296.

O art. 293 prevê o crime de falsificação de papéis públicos, os quais podem

ser: a) selo destinado a controle tributário, papel selado ou qualquer papel de emissão legal destinado à arrecadação de tributo; b) papel de crédito público que não seja moeda de curso legal; c) vale postal; d) cautela de penhor, caderneta de depósito em caixa econômica ou de outro estabelecimento mantido por entidade de direito público; e) talão, recibo, guia, alvará, ou qualquer outro documento relativo à arrecadação de rendas públicas ou a depósito ou caução por que o poder público seja responsável; f ) bilhete, passe ou conhecimento de empresa de transporte administrada pela União, por Estado ou por Município.

Já o art. 296 prevê o crime de falsificação de selo ou sinal público, e tem por objeto: a) selo público destinado a autenticar atos oficiais da União, Estado e

Município; b) selo ou sinal atribuído por lei a autoridade ou entidade de direito

público; c) sinal público de tabelião.

5. CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICOO art. 297 prevê como conduta criminosa “falsificar, no todo ou em parte, docu-

mento público, ou alterar documento público verdadeiro”. A pena é de reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa”.

Primeiramente, documento público é um objeto, geralmente consistente em papel, que carrega em sua escrita informações emanadas de algum ente público.

A primeira conduta criminosa consiste em falsificar todo o documento público ou falsificar apenas parte dele, e a segunda consiste em alterar documento público verdadeiro.

Mas qual a diferença entre falsificar parte do documento público e alterar documento público?

A falsificação total implica na criação de todo o material escrito que representa o documento. Já a falsificação parcial significa que houve uma criação de uma parte falsa do documento público verdadeiro, a qual pode dele ser individualizada. Outrossim, alterar

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documento público é inserir ou suprimir falsamente informações escritas no próprio corpo do documento verdadeiro, após a sua criação.

Desta forma, a alteração difere da falsificação parcial porque: na alteração, a falsi-dade diz respeito às informações falsamente inseridas ou retiradas do papel, o que ocorre posteriormente à criação do documento; já na falsificação parcial parte do documento (que dele pode ser individualizada) é criada falsamente.

MUITA

ATENÇÃO!

A alteração é falsificação material, ou seja, o sujeito inclui ou retira informações do documento verdadeiro já emitido – diferente da falsidade ideológica, que veremos adiante, que atinge o momento da criação do objeto. Na falsidade ideo-lógica, no momento da criação do documento, informações falsas são inseridas ou verdadeiras são omitidas.

Como dissemos acima, documento público é um objeto que carrega em sua escrita informações emanadas de um ente público. O § 2º equipara a documento público, somente para os fins penais (para considerar objeto do cometimento deste crime), o documento emanado de entidade paraestatal (empresas públicas, sociedades de economia mista, entidades do terceiro setor etc.), o título ao portador ou transmissível por endosso (ex.: cheque), as ações de sociedade comercial (ex.: ações de sociedades anônimas), os livros mercantis (que contêm informações das empresas) e o testamento particular.

O § 1º deste artigo prevê uma causa de aumento de pena: “se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte”. Como já dito, na parte dos crimes contra a fé pública que é abordada no edital deste con-curso, toda vez que o agente comete o crime prevalecendo-se do cargo, a pena é aumentada de sexta parte (com uma exceção: no crime de “fraudes em certames de interesse público” a pena é aumentada de um terço).

Relembrando, a falsidade material ocorre através de fabricação e alteração de papéis públicos e documentos públicos ou particulares, estando ligada ao objeto material, ao papel.

Já a falsidade ideológica não implica na falsificação do papel (material), mas somente da informação que ele traz, podendo ocorrer pela inserção de informações falsas ou omissão de informações verdadeiras. O documento é emitido por quem legitimamente deve fazê-lo, pessoa esta que falsifica ou que é induzida a falsificar.

Até agora o artigo 297 trata da falsidade material. Todavia, o panorama muda no seu § 3º, que prevê condutas específicas, diversas das previstas no caput, as quais constituem falsidade ideológica.

O § 3º diz que incorre nas mesmas penas quem insere ou faz inserir: I – na folha de pagamento ou em documento de informações que seja destinado a fazer prova perante a Previdência Social, pessoa que não possua a qualidade de segurado obrigatório (ex.: em-pregado); II – na Carteira de Trabalho e Previdência Social do empregado ou em documento que deva produzir efeito perante a Previdência Social, declaração falsa ou diversa da que deveria ter sido escrita; III – em documento contábil ou em qualquer outro documento relacionado com as obrigações da empresa perante a Previdência Social, declaração falsa ou diversa da que deveria ter constado.

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Note que as condutas do § 3º estão todas ligadas a informações falsas que atinjam a Previdência Social. Assim, o principal sujeito prejudicado pela conduta criminosa é a Previdência Social.

O inciso I do § 3º tem como objeto material do delito: a) folha de pagamento (registra a remuneração paga aos empregados); b) documento de informações que seja destinado a fazer prova perante a Previdência Social.

Já o inciso II tem como objeto da conduta criminosa: a) Carteira de Trabalho e Previdência Social; b) qualquer outro documento que produza efeitos perante a Pre-vidência Social.

Os efeitos indevidos que estes documentos podem produzir perante a Previdência Social são, por exemplo, a falsa contagem de tempo de serviço para obtenção de aposentadoria; a concessão de benefícios previdenciários (ex.: auxílio-doença) a quem não é segurado da Previdência Social; a falsa qualidade de segurado de pessoa falecida para a obtenção indevida de pensão por morte por seus dependentes etc.

Finalmente, o inciso III tem como objeto: a) documento contábil; b) qualquer outro documento relacionado com as obrigações da empresa perante a Previdência Social. Estes documentos, que servem para registrar as atividades econômicas da empresa, ates-tam, por exemplo, fatos que geram a obrigação de a empresa pagar contribuições sociais à Previdência Social.

Note que o § 3º trata das ações de inserir ou fazer inserir. Já o § 4º pune a omis-são: incorre nas mesmas penas quem omite, nos documentos mencionados nos incisos I, II e III: a) nome do segurado e seus dados pessoais; b) a remuneração; c) a vigência do contrato de trabalho ou de prestação de serviços. Estas condutas omissivas podem resultar principalmente em exclusão dos direitos dos segurados perante a Previdência Social.

6. CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PARTICULARO art. 298 do Código Penal prevê como conduta criminosa “falsificar, no todo ou

em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro”, com pena de reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.

Observe que a pena é menor que a pena do crime de falsificação de documento público, que é de reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.

Primeiramente, documento particular é um objeto, geralmente um papel, que carrega em sua escrita informações emanadas de uma pessoa física ou jurídica que não seja ente público ou equiparado a ele.

Sobre a diferença entre falsificar parte e alterar documento particular, servem as mesmas explicações do documento público: a falsificação total implica na criação total do material escrito que representa o documento. Já a falsificação parcial significa que houve uma criação de uma parte falsa do documento particular verdadeiro, a qual pode dele ser individualizada. Outrossim, alterar documento particular é inserir ou suprimir falsamente informações escritas no próprio corpo do documento verdadeiro, após a sua criação.

Desta forma, a alteração difere da falsificação parcial porque: na alteração, a falsi-dade diz respeito às informações falsamente inseridas ou retiradas do papel, o que ocorre

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posteriormente à criação do documento. Na falsificação parcial, parte do documento (que dele pode ser individualizada) é criada falsamente.

Finalmente, o parágrafo único deste art. 298 dispõe sobre o crime de “falsificação de cartão”, equiparando a documento particular o cartão de crédito ou débito. Assim, quem falsifica, no todo ou em parte, um cartão de crédito ou débito ou altera suas informações originais, pratica o crime de falsificação de documento particular.

7. CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICAO art. 299 prevê, com o nome de “falsidade ideológica”, a conduta de “omitir, em

documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante”.

Na tabela abaixo será mais fácil visualizar as condutas do crime:

FALSIDADE IDEOLÓGICA:

OMITIR

Em documento público ou

particular

Declaração que dele devia constar

COM O FIM DE:

a) PREJUDICAR DIREITO;

OU

b) CRIAR OBRIGAÇÃO;

OU

c) ALTERAR A VERDADE SOBRE FATO JURIDICAMENTE

RELEVANTE

INSERIR

Em documento público ou

particular

Declaração falsa

Declaração diversa da que devia ser escrita

FAZER INSERIR

Em documento público ou

particular

Declaração falsa

Declaração diversa da que devia ser escrita

A falsidade ideológica pode ser de documento público ou particular.

Na falsidade ideológica o que é falsificado não é o corpo do documento, pois elaborados por pessoa legítima para fazê-lo. O que é falso são as informações que o documento público ou particular traz desde o início de sua constituição.

Atenção que o crime também é cometido se há a inserção de declaração diversa da que deveria ser escrita, mesmo que essa declaração seja verdadeira.

A conduta de fazer inserir é praticada por pessoa que não tem a atribuição de elaborar o documento. Neste caso, o autor do crime faz (conduz) a pessoa que elabora o documento inserir as informações falsas ou diversas das que deveriam ter sido escritas.

A pena é de reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos e multa, se o documento é público, e de reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos e multa, se o documento é particular. Assim, do mesmo modo que ocorre com a falsificação material, na falsidade ideológica as penas são maiores se tem como objeto documento público.

O artigo prevê, em seu parágrafo único, o aumento de pena de sexta parte se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo.

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Também, o dispositivo prevê aumento de pena de sexta parte se a falsificação ou alteração do documento é de assentamento de registro civil (escrituração feita no registro civil das pessoas naturais e das pessoas jurídicas).

8. CRIME DE FALSO RECONHECIMENTO DE FIRMA OU LETRAO art. 300 prevê como conduta criminosa “reconhecer, como verdadeira, no exercício

de função pública, firma ou letra que o não seja”.

A pena prevista é de reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa, se o documento é particular – penais iguais às do crime de nome “falsidade ideológica”, previsto no artigo 299.

Este crime é uma espécie de falsidade ideológica. É cometido por pessoa que tem a legitimidade de reconhecer como verdadeira firma (assinatura) ou letra (escrito), ou seja, essa pessoa tem de estar investida desta função pública (Oficiais de Registro Civil de pessoas naturais e de pessoas jurídicas, tabelião de notas etc.).

Repare que estar no exercício da função pública não é, neste crime, causa de aumento da pena (acréscimo de determinada fração à pena base). Estar no exercício da função pública faz parte da descrição do tipo penal (descrição da conduta criminosa) básico previsto no caput e, por isso, ao autor é aplicada somente a pena base prevista para o caput.

Neste crime, o reconhecimento de firma ou letra é feito por pessoa legítima e, portanto, o sinal utilizado para o reconhecimento é verdadeiro (por isso a falsidade é ideológica; se o sinal utilizado fosse falso, constituiria uma falsidade material).

9. CRIME DE CERTIDÃO OU ATESTADO IDEOLOGICAMENTE FALSOO art. 301, caput, prevê como crime a seguinte conduta: “atestar ou certificar falsa-

mente, em razão de função pública, fato ou circunstância que habilite alguém a obter cargo público, isenção de ônus ou de serviço de caráter público, ou qualquer outra vantagem”.

O crime exige que a conduta seja praticada para a finalidade de possibilitar a alguém a obtenção de cargo público, ou isenção de ônus, ou isenção de serviço de caráter público ou qualquer outra vantagem (desde que esta outra vantagem tenha semelhança com as condutas já arroladas).

A pena é de detenção, de 2 (dois) meses a 1 (um) ano. A pena de detenção é mais branda que a pena de reclusão, pois esta exige o cumprimento inicial no regime fechado, e a pena de detenção tem seu cumprimento iniciado no regime semiaberto ou aberto.

Repare que, de forma semelhante ao crime de falso reconhecimento de firma ou letra, praticar o crime em razão de função pública não é causa de aumento da pena. Prati-car a conduta em razão de função pública faz parte da descrição do tipo penal básico previsto no caput.

Veja que, pelo fato de o autor do crime agir em razão da função pública, tem ele le-gitimidade para emitir a certidão ou atestado. Desta forma, este crime é uma espécie de

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falsidade ideológica, mas com uma pena bem mais branda: detenção, de 2 (dois) meses a 1 (um) ano.

No § 1º do art. 301 está prevista uma conduta que configura falsidade material, e não falsidade ideológica, de nome “falsidade material de atestado ou certidão”: “falsificar, no todo ou em parte, atestado ou certidão, ou alterar o teor de certidão ou de atestado verdadeiro, para prova de fato ou circunstância que habilite alguém a obter cargo público, isenção de ônus ou de serviço de caráter público, ou qualquer outra vantagem”.

A pena é de detenção de 3 (três) meses a 2 (dois) anos – uma pena maior que a prevista para o crime do caput. Ressaltamos que continua sendo pena de detenção, e não de reclusão.

O crime de falsidade material de atestado ou certidão não prevê que o agente pratique o crime em razão de função pública. Para falsificar materialmente, pode ser qualquer pessoa (para falsificar ideologicamente, tem de ser sujeito legitimado para a emissão da certidão ou atestado).

Não é a primeira vez que a lei trouxe em um mesmo artigo condutas que configuram crimes de falsidade material e ideológica. Relembre que o artigo 297 traz em seu caput o crime de falsificação de documento público na modalidade falsidade material e no seu § 3º traz algumas condutas de falsificação de documento público na modalidade de falsidade ideológica.

Esta conduta prevista no § 1º, por ser um crime de falsidade material, exige a falsifi-cação, no todo ou em parte, ou a alteração do atestado ou certidão verdadeiros. Todavia, por ser uma falsidade material específica, exige que o objeto seja atestado ou certidão. Exige também, da mesma forma que o caput, as mesmas finalidades específicas: provar fato ou circunstância que habilite alguém a obter cargo público, ou isenção de ônus, ou isenção de serviço de caráter público, ou qualquer outra vantagem (desde que esta outra vantagem tenha semelhança com as condutas já arroladas).

O § 2º deste artigo (aplicável ao caput e ao § 1º) determina que, se o crime é praticado com o fim de lucro, aplica-se, além da pena privativa de liberdade, a pena de multa. Assim, as penas cominadas para as condutas previstas no caput e no § 1º serão acrescidas de multa se o autor praticá-las com a finalidade de obter lucro.

É bom observar que a pena de multa geralmente está relacionada com a finalidade de obter vantagem ou com a existência de dano ou prejuízo.

Ressaltamos, ainda, que as penas de reclusão e detenção são espécies do gênero pena privativa de liberdade, sendo a primeira mais grave.

10. CRIME DE FALSIDADE DE ATESTADO MÉDICOO art. 302 do Código Penal tipifica como crime a seguinte conduta: “dar o médico, no

exercício da sua profissão, atestado falso”. A pena é de detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano.

Da mesma forma que no artigo anterior, o parágrafo único deste artigo determina que, se o crime é praticado com o fim de lucro, aplica-se, além da pena privativa de liberdade (que no caso é a detenção), a pena de multa.

Este crime somente pode ser praticado por médico no exercício de sua profissão (seja ou não funcionário público).

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11. CRIME DE REPRODUÇÃO OU ADULTERAÇÃO DE SELO OU PEÇA FILATÉLICAEstá previsto no art. 303 do Código Penal, que diz: “reproduzir ou alterar selo ou

peça filatélica que tenha valor para coleção, salvo quando a reprodução ou a alteração está visivelmente anotada na face ou no verso do selo ou peça”.

Acreditamos que este artigo não será abordado na prova, pois foi revogado tacitamente pelo art. 39 da Lei 6.538/78, que dispõe sobre os serviços postais. Todavia, vale memorizar os verbos e elementos do dispositivo.

O selo destina-se a comprovar o pagamento aos correios. A peça filatélica é o objeto de valor para a coleção de selos.

12. CRIME DE USO DE DOCUMENTO FALSOO art. 304 prevê como crime: “fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alte-

rados, a que se referem os arts. 297 a 302”. A pena é a mesma cominada à falsificação ou à alteração.

Isso quer dizer que as mesmas penas são aplicadas para quem falsifica e para quem usa, mesmo que o usuário não tenha falsificado.

Veja a tabela a seguir, que possibilita um panorama geral dos artigos 297 a 302:

Condutas

criminosasPenas

Causas de aumento

de penaUso

Falsificação de

documento Público

Art. 297, §§ 3º e 4º

Reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa

§ 1º: Se o agente é funcionário público, e comete o crime preva-

lecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de

sexta parte

Mesma pena para o uso dos documentos públicos falsificados ou alterados

Falsificação

de documento

particular e

falsificação de

cartão

Art. 298 e parágrafo único

Reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa.

Mesma pena para o uso dos documentos particulares falsifica-dos ou alterados

Falsidade

ideológica

Art. 299

Reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e mul-ta, se o documento é público, e reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa, se o documento é particular.

Parágrafo único:

Se o agente é fun-cionário público, e comete o crime pre-valecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assenta-mento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte.

Mesma pena para o uso dos documentos públicos ou particula-res falsificados

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Condutas

criminosasPenas

Causas de aumento

de penaUso

Falso

reconhecimento de

firma ou letra

Art. 300

Reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e mul-ta, se o documento é público; e de 1 (um) a 3 (três) anos, e mul-ta, se o documento é particular.

Mesma pena para o uso da firma ou letra

Certidão ou

atestado

ideologicamente

falso

Art. 301

Detenção, de 2 (dois) meses a 1 (um) ano.

Mesma pena para o uso da certidão ou atestado

Falsidade material

de atestado ou

certidão

Art. 301, § 1º

Detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos.

§ 2º: Se o crime é pra-ticado com o fim de lucro, aplica-se, além da pena privativa de liberdade, a de multa

Mesma pena para o uso do atestado ou certidão

Falsidade de

atestado médico

Art. 302

Detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano.

Parágrafo único: Se o crime é cometido com o fim de lucro, aplica--se também multa.

Mesma pena para o uso do atestado mé-dico

O art. 304 tipifica (descreve a conduta criminosa) o crime de uso dos papéis falsos constantes destes artigos 297 a 302. Observe que ele não inclui o art. 296, que dispõe sobre a falsificação de selo ou sinal público. Isso ocorre porque o próprio art. 296, em seu § 1º, torna crime o uso e utilização dos documentos falsos nele contidos.

Atenção: o crime de uso dos papéis falsificados ou alterados indicados acima pode ser praticado por quem fabricou ou alterou, ou por qualquer outra pessoa, desde que esta outra pessoa saiba que está utilizando documentos falsificados (desde que tenha dolo, que é a consciência e vontade de praticar o crime).

Quem fabrica ou altera estes papéis e, após, os usa, responderá apenas pela pena da falsificação, pois o uso será uma consequência do primeiro fato criminoso. Desta forma, quem falsifica e usa não terá aplicada contra si as duas penalidades, apenas uma.

13. CRIME DE SUPRESSÃO DE DOCUMENTO

O artigo 305 do Código Penal prevê como crime: “Destruir, suprimir ou ocultar, em benefício próprio ou de outrem, ou em prejuízo alheio, documento público ou particular verdadeiro, de que não podia dispor”.

O dispositivo possui três verbos: a) destruir (eliminar); b) suprimir (fazer desaparecer elementos do documento que inviabilizem a sua utilização, como por exemplo, fazer borrar as palavras, tornando-as ilegíveis); c) ocultar (esconder de modo que não possa ser utilizado).

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Estas condutas podem ser praticadas alternativamente, ou seja, basta praticar apenas um verbo para que se configure o crime.

Deve haver uma finalidade específica para a configuração do crime (dolo específico). A destruição, supressão ou ocultação devem ser praticadas com o objetivo de: a) obter be-nefício para si mesmo; b) obter benefício para outrem; c) em prejuízo alheio. Não se exige que o sujeito queira estes três resultados, bastando um só.

DICA

IMPORTANTE

Em todo crime doloso, o sujeito ativo tem a finalidade de realizar a conduta (ação ou omissão) prevista no tipo penal. Em muitos tipos penais, há também a previsão de uma finalidade específica (dolo específico) que o tipo penal exige para que o crime seja caracterizado. Por exemplo, para caracterizar-se o crime de supressão de documento, não basta que o sujeito tenha o dolo de destruir documento público de que não podia dispor; também é necessária uma finalidade específica prevista no tipo penal: a finalidade de obter benefício para si mesmo ou para outrem, ou para causar prejuízo alheio.

O objeto do delito é documento público ou particular verdadeiro.

Há um último elemento no tipo penal: o sujeito ativo do crime não pode dispor de tal documento. Se o sujeito tiver permissão para destruir, suprimir ou ocultar o documento, não se configura o crime.

A pena é de reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa, se o documento é público, e reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa, se o documento é particular. O legisla-dor puniu com mais rigor no caso de o objeto do crime ser documento público, da mesma forma que fez com os crimes de falsificação de documento público e particular, falsidade ideológica e falso reconhecimento de firma ou letra.

DICA

IMPORTANTE

O tipo penal descreve a conduta criminosa: verbos e todos os seus elementos objetivos, subjetivos e normativos. O fato, para ser criminoso, precisa ter todos os verbos e elementos exigidos no tipo penal. Quando dizemos que a conduta é atípica, quer dizer que ela não se amolda a toda a descrição da conduta criminosa, e, portanto, não é infração penal (crime ou contravenção).

Por exemplo, no crime de supressão de documento, o tipo penal é: “destruir, suprimir ou ocultar, em benefício próprio ou de outrem, ou em prejuízo alheio, documento público ou particular verdadeiro, de que não podia dispor”. Se o sujeito pratica a conduta de destruir, em benefício próprio, documento público de que PODIA dispor, a conduta é atípica. Da mesma forma, se o sujeito destrói documento público de que não podia dispor, mas NÃO praticou a conduta em benefício próprio ou de outrem, ou em prejuízo alheio, não configurará crime de supressão de documento, sendo o fato atípico.

14. CRIME DE FALSA IDENTIDADEO art. 307 prevê como crime “atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para

obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem”.

O sujeito ativo do crime atribui a falsa identidade para si ou para terceiro.

Deve haver finalidade específica para a configuração do crime: a) obter vantagem em proveito próprio; b) obter vantagem em proveito alheio; c) causar dano a outrem. Veja que

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são finalidades alternativas – não é necessário que o autor do crime pratique o ato com estas três intenções, bastando uma só para a configuração do crime.

O crime não exige que a vantagem tenha sido efetivamente obtida ou que o dano a outra pessoa tenha ocorrido. Basta, para caracterizar o crime, a prática da conduta com a intenção de produzir tais resultados.

A pena para a prática deste crime é de detenção, de três meses a um ano, ou multa. Isso quer dizer que o juiz pode aplicar apenas a pena de multa. Quando a pena é de detenção (regime menos grave que a pena de reclusão), às vezes a lei pode prever a aplicação da pena de multa de forma alternativa.

Atenção: na aplicação da pena, o preceito diz que deve ser cominada a pena de de-tenção ou a pena de multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave (com pena mais gravosa).

Isso quer dizer que a conduta do crime de falsa identidade pode estar agregada a outras condutas e outros elementos que, conjuntamente, tornam-se outro crime mais grave. Por exemplo: alguém pode atribuir-se falsa identidade para enganar alguém e obter vantagem econômica ilícita, causando prejuízo à vítima. Neste caso, o agente praticou os elementos do crime de falsa identidade, mas realizou outros que, conjuntamente, configuraram o crime de estelionato, com pena mais grave.

Ora, se o agente realizou, em sua conduta, os elementos que caracterizam um crime menos grave (no caso, a falsa identidade), além de outros que, conjuntamente, caracterizam um crime mais grave (no caso, o estelionato), responderá pelo crime mais grave.

Outra forma do crime de “falsa identidade”, porém, sem nome dado pelo Código Penal, está prevista no art. 308 do Código Penal, que consiste em “usar, como próprio, passaporte, título de eleitor, caderneta de reservista ou qualquer documento de identidade alheia ou ceder a outrem, para que dele se utilize, documento dessa natureza, próprio ou de terceiro”.

O crime abrange as seguintes condutas: a) o uso, como próprio, de documento de iden-tidade alheia; b) a cessão de documento de identidade próprio a outrem (para a utilização); c) a cessão de documento de identidade de terceiro a outrem (para a utilização).

Repare que deve haver, nas condutas de cessão de documento de identidade, a finali-dade da utilização do documento por outrem. O autor do crime cede documento seu ou de terceiro (com ou sem o consentimento deste terceiro) para que outrem dele se utilize.

A simples cessão do documento sem a finalidade de utilização, apenas para a guar-da, não configura o crime. Não é necessário haver o uso efetivo do documento por terceiro, pois o dispositivo exige apenas a cessão e a finalidade de que seja utilizado por outrem.

Por outro lado, na primeira conduta (uso de documento de identidade alheia como próprio), exige-se o efetivo uso para a configuração do crime. Desta forma, o crime pune quem cede o documento de identidade (próprio ou de terceiro) e quem o utiliza.

A pena prevista é a de detenção, de quatro meses a dois anos, e multa. Dessa vez, a multa é aplicada cumulativamente com a pena, e não alternativamente, como no art. 307.

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Igualmente ao art. 307, o legislador fez a seguinte ressalva: é aplicada a pena de de-tenção, de quatro meses a dois anos, e multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave. Vale a explicação do artigo anterior. Mas ressaltamos: se forem praticados os elementos do tipo penal (descrição da conduta criminosa) necessários para a caracterização do crime de falsa identidade, caracterizado este crime está; todavia, se houver elementos que possam, em somatório com as condutas já praticadas, constituir outro crime mais grave, é este que restará configurado (o crime de falsa identidade é absorvido pelo crime mais grave).

15. CRIME DE FRAUDES EM CERTAMES DE INTERESSE PÚBLICOO artigo 311-A do Código Penal prevê como crime “utilizar ou divulgar, indevi-

damente, com o fim de beneficiar a si ou a outrem, ou de comprometer a credibilidade do certame, conteúdo sigiloso de: I: concurso público; II: avaliação ou exames públicos; III: processo seletivo para ingresso no ensino superior; ou IV: exame ou processo seletivo previstos em lei”.

O dispositivo tem como conduta criminosa a utilização ou a divulgação indevida de conteúdo sigiloso destes certames de interesse público.

O agente deve ter a finalidade de: a) obter benefício para si; b) obter benefício para outrem; c) comprometer a credibilidade do certame.

Os certames objetos do crime são: a) concurso público (meio de investidura em cargos e empregos públicos); b) avaliação ou exames públicos; c) processo seletivo para ingresso no ensino superior (vestibulares para ingresso em faculdades ou universidades públicas e particulares, dentre outros); d) exame ou processo seletivo previstos em lei (ex.: exame da OAB para o exercício da advocacia).

A pena cominada é de reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

O § 1º deste artigo determina incorrer nas mesmas penas quem permite ou facilita, por qualquer meio, o acesso de pessoas não autorizadas às informações mencionadas no caput.

Desta forma, para incorrer no crime, o sujeito deve (caput e § 1º): a) utilizar-se do conteúdo sigiloso; ou b) divulgar o conteúdo sigiloso; ou c) permitir, por qualquer meio, o acesso de pessoas não autorizadas ao conteúdo sigiloso; ou d) facilitar, por qualquer meio, o acesso de pessoas não autorizadas, ao conteúdo sigiloso.

O § 2º prevê: “Se da ação ou omissão resulta dano à Administração Pública” a pena é de reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos e multa.

O § 2º deixa claro que as condutas previstas nos verbos podem ser realizadas por meio de ação ou omissão. Dispõe que, se da ação ou omissão resulta dano para a Administração Pública, será aplicada outra pena: 2 (dois) a 6 (seis) anos de reclusão.

Isso quer dizer que não é necessário ocorrer qualquer dano à Administração Pública para que a conduta prevista no caput seja caracterizada; se ocorrer dano, a pena prevista será outra, maior, caracterizando um crime (tipo penal incriminador) qualificado (com a incidência de uma qualificadora). A lei prevê um crime qualificado quando eleva os limites mínimo e/ou máximo da pena prevista no caput do artigo. Ao fazer isso, a lei considera o crime qualificado mais grave que o crime previsto no caput.

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DICA

IMPORTANTE

A alteração, para maior, dos limites mínimo e máximo (ou somente um dos dois) da pena previstos no caput não é denominado “causa de aumento de pena”. A causa de aumento de pena é exteriorizada quando o Código aumenta a pena base em determinada fração (ex.: aumento de um terço se o fato é cometido por funcionário público, como previsto no § 3º do artigo em comento). No modo em que a pena está prevista no § 2º, configura-se uma qualificadora – a pena é outra, considerada mais grave. Se a previsão da qualificadora ocorreu, a conduta

denomina-se crime qualificado.

O § 3º prevê outra causa de aumento de pena: “aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o fato é cometido por funcionário público”.

MUITA

ATENÇÃO!

Com relação aos crimes abordados pelo edital do concurso, toda vez que o agente comete o crime prevalecendo-se do cargo, no exercício de função pública ou

em razão de função pública, a pena é aumentada de sexta parte. Todavia, neste crime de “fraudes em certames de interesse público”, a pena aumenta-se de 1/3

se o fato é cometido por funcionário público. Embora a lei, em sua interpretação literal, exija apenas, para a configuração da causa de aumento, que o agente seja funcionário público, a interpretação mais acertada é que o agente público deva praticar a conduta em razão de sua função pública.

EM RESUMO: Crimes contra a fé pública

Capítulo II – da falsidade

de títulos e outros papéis

públicos

Art. 293 – Falsificação de papéis públicos

Art. 294 – Petrechos de falsificação

CAPÍTULO III – da

falsidade documental

Art. 296 – Falsificação do selo ou sinal público

Art. 297 – Falsificação de documento público

Art. 298 – Falsificação de documento particular

Art. 298, Parágrafo único – Falsificação de cartão

Art. 299 – Falsidade ideológica

Art. 300 – Falso reconhecimento de firma ou letra

Art. 301 – Certidão ou atestado ideologicamente falso

Art. 301, § 1º – Falsidade material de atestado ou certidão

Art. 302 – Falsidade de atestado médico

Art. 303 – Reprodução ou adulteração de selo ou peça filatélica

Art. 304 – Uso de documento falso

Art. 305 – Supressão de documento

CAPÍTULO IV – de outras

falsidadesArt. 307 e 308 – Falsa identidade

CAPÍTULO V – das fraudes

em certames de interesse

público

Art. 311-A – Fraudes em certames de interesse público