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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE

PROFESSORES PARA UMA

EDUCAÇÃO

NÃO DISCRIMINADORA

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Edição e elaboração dos textosPrograma de Assessoria em Gênero - NEIM/REDOR

Profa. Dra. Ana Alice Costa

Profa. Dra. Cecilia Sardenberg

Profa. Dra. Elizete Passos

Fotolito da Capa: Lio Fotolito

Layout: Fast Design

Impressão e Acabamento : Envelopes & CiaProjeto Gráfico : Ricardo Tosta JúniorIlustrações: Maru

(Revista CUT) Márcio Baraldi(Caderno do Conselho) Alexandre Jubran

Este caderno é parte das ações com o enfoque de gênero que vem sendo desenvolvidapelo Governo do Estado através do Projeto de Desenvolvimento Comunitário do Rio

Gavião - Pro-Gavião.

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APRESENTAÇÃO

A discriminação de sexo tem sido uma das questões menos percebidas no ensino

brasileiro. A internalização de valores sexistas incorporados à mentalidade nacional têm

nos professores/as um dos seus principais veiculadores e reprodutores. É necessário que

o/a educador/a tenha consciência da existência dessa prática para que possa exercer

criticamente sua atividade, em especial no que diz respeito à transformação do cotidiano

da escola e ao questionamento das desigualdades de gênero.

É fundamental, portanto, um trabalho de sensibilização sobre as questões das relações

de gênero, da desigualdade social e da necessidade de seguir uma pedagogia dentro de

um compromisso pela transformação da condição feminina. Conscientizar os/as

professores/as a terem com as crianças atitudes que não passem modelos sexistas,

destinando a alunos e alunas as mesmas atividades ou cuidando para não reforçar por

palavras e ações os modelos machistas.

Nessa perspectiva, o Pró Gavião, reconhecendo a importância dos professores na

transformação da sociedade, está realizando o PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO

DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA em todos

os 13 municípios que são atendidos pelo projeto. Serão aproximadamente 800 professores/

as sensibilizados.

Este Programa tem por objetivo:

Formar a consciência crítica sobre o papel da mulher na comunidade local;v Conscientizar os/as professores/as sobre sua importância enquanto agentes

transformadores na sociedade e, em especial, nas relações de gênero;v Levar os/as professores/as a entenderem que a educação não é neutra e transmite valores

que servem para reforçar desigualdades como as de gênero;

•:^ Transformar os conteúdos ideológicos perpassados pelos/as professores/as em sala de

aula no que se refere ao papel da mulher na sociedade;

Contribuir para o melhoramento das condições de formação e de capacitação dos/as

professores/as para o desenvolvimento de uma educação não sexista;

•:• Contribuir para a eliminação de todos os preconceitos sexistas na escola e,consequentemente, na sociedade.

V

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INDICE

IDENTIDADE DE GÊNERO E PAPÉIS SOCIAIS

01

PROFESSORA PRIMÁRIA: PROFISSÃO FEMININA

09

POR UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA

15

PEDAGOGIA DE GÊNERO

23

A LINGUAGEM. A SOCIEDADE E os LIVROS DIDÁTICOS

25

COMO IDENTIFICAR O SEXISMO NOS LIVROS DE TEXTOS

31

ANEXOS

A HISTÓRIA DO BRASIL NO FEMININO

35

TÉCNICAS DE DINÂMICA DE GRUPO NA PERSPECTIVA DE GÊNERO

43

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA...............................................................

IDENTIDADE DE GÊNERO

E PAPÉIS SOCIAIS

IDENTIDADE DE GÊNERO E PAPÉIS SOCIAIS

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA............................................

As sociedades sempre fizeram diferenças entre homens e mulheres. Tomando por

base as características biológicas, atribuem a elas significados, conceitos e crenças que

servem para delimitar o que uns e outros são, o que podem fazer, como devem comportar-

se, definindo assim sua identidade.

Quando nasce um menino a família compra sapatinhos e roupas de cor

azul e quando nasce unia menina compra cor de rosa.

A cor azul, para os meninos e a rosa para as meninas é para dizer que eles

são diferentes: um é homem e o outro é mulher

Dizem que o homem é o forte, corajoso, tem dinheiro e a mulher a fraca,

chorona e não tem dinheiro, por isso, precisa de alguém para cuidar dela.

Quando nasce uma menina a família acha que é mais uma boca para

sustentar, se for menino é mais um para trabalhar.

Na nossa sociedade, desde bebês, as crianças do sexo feminino são tratadas como

"bonecas" (lindas, frágeis, intuitivas, sensíveis), a quem os pais, os irmãos, a sociedade

devem proteger e defender; enquanto os homens são identificados com a virilidade,

coragem, auto-suficiência, autodeterminação. Esses modelos vão servindo para estruturar

as identidades de homens e mulheres.

Essa trama é tecida em várias instâncias, por exemplo, família, escola, no bairro, na

igreja, nas relações de poder. A socióloga Heleieth Saffioti, (uma estudiosa sobre a mulher)

afirma que os seres humanos nascem apenas machos ou fêmeas e que é através do processo

da educação e da convivência com outras pessoas que vão assumindo tipos de identidade

que os fazem diferentes e desiguais, colocando-se os limites e as possibilidades dos

indivíduos a partir do seu sexo.Ml fiz3 p`x ar srr:,;r

E verdade que tanto homens quanto

mulheres são educados de modo a

enquadrarem-se dentro de modelos

culturalmente tidos como masculinos

ou femininos, os quais definem os

princípios morais a serem seguidos e

a forma como devem se comportar no

mundo, com se vestir e até mesmo

pensar. Tendo-se identificado com ummodelo, o mesmo passará a ser

buscado pela pessoa, controlando os seus impulsos, disciplinando os desejos, estabelecendo

padrões de comportamento e uma forma de ser.

2 IDENTIDADE DE GÊNERO E PAPÉIS SOCIAIS

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA........................................................... ..

Existe uma tendência a se acreditar que esse direcionamento dá-se de forma natural,seguindo as características próprias de cada sexo. O masculino tenderia ao caminho da

criatividade, da agressividade e do mundo externo, em decorrência da sua virilidade;

enquanto o feminino, às atitudes mais passivas, mais leves, menos criativas e racionais,

tudo sacramentado pela idéia de uma natureza inata que delimita e indica o que cada um

deve e pode desempenhar.

Os papéis desempenhados pelos indivíduos têm grande importância para a construção

de sua identidade, pois vão sendo estabelecidos por identificações e, ao imitá-los, os

indivíduos articulam-se no mundo e circunscrevem seu modelo. Nas sociedades

hierarquizadas como a nossa, quase sempre esses papéis são desempenhados de formaalienada, repetitiva e acrítica.

Situação que, muitas vezes, passa desapercebida pois a rotina e a padronização que

marcam o desempenho de papéis não se dá por acaso; muito pelo contrário, visam marcar

a idéia da igualdade e de unidade. Situação idealizada, mas que tem força e traz

conseqüências para quem se coloca de forma contrária. Ser diferente é tornar-se desviante,

desacreditado, estigmatizado. Condição que tem na não aceitação social o seu lado mais

doloroso, e a pessoa, dita defeituosa, não terá outro caminho senão tornar-se vítima eprocurar "corrigir-se".

Papéis de mulheres e de homens - papéis de gênero

Os papéis são as ocupações e as coisas que as pessoas podem fazer,

que representam no seu dia-a-dia. Homens e mulheres fazem coisas

diferentes em casa, na igreja, no trabalho. As mulheres são mães,

irmãs, filhas, professoras, produtoras rurais, juízas, freiras, etc. Os

homens são pais, irmãos, filhos, professores, produtores, juizes,

padres, etc.

Mulheres:

Quando têm filhos pequenos lavam as fraldas, dão de mama, levam para o médico, cuidam

deles até ficarem grandes. Fazem comida para todos da casa, lavam roupa, cuidam da

casa e de quem ficar doente. Se moram na roça, ainda carregam água, lenha, cuidam da

criação. Muitas, cuidam da horta e trabalham na roça. As mulheres que moram na cidade

lavam os pratos, cuidam da limpeza da casa, procuram escola para os filhos e levam ao

posto de saúde quando ficam doentes, fazem compras no mercado e muitas ainda trabalham

nas fábricas, nos escritórios, nas lojas ou são professoras.

Elas quase não descansam, nem se divertem. São as primeiras que acordam e asúltimas que dormem.

IDENTIDADE DE GÊNERO E PAPÉIS SOCIAIS 3

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA.....................................

Homens:

Os homens, quase sempre, não cuidam dos filhos, nem da casa. Trabalhara na rua

ou na roça, participam do partido ou do sindicato, bebem no bar com os amigos, jogam

dominó ou futebol nos fins de semana. Quando chegam em casa acham a comida

pronta, a roupa lavada, a casa arrumada e os filhos bem cuidados.

Quando falamos papéis de gênero, estamos dizendo que são as ocupações do gênero

masculino e do gênero feminino, igual quando aprendemos na escola quando estudarmos

os substantivos. Com gênero queremos dizer que são ocupações que são ensinadas aos

homens e às mulheres. Gênero é tudo aquilo que classifica os seres e as coisas em

masculino , feminino e comum de dois.

GÊNERO

Refere-se a características sociais definidas por uma sociedade determinada para

estabelecer o comportamento, atitudes, papéis e funções de mulheres e homens.

Refere-se à definição social do masculino e do feminino.

Assim, a identidade de gênero não é dada pela de sexo, definida em termos da biologia

da reprodução. Forma-se, ao invés, a partir do sentimento e da convicção que se tem de

pertencer a um sexo. Os sexos masculino e feminino vão recebendo significações que

servem para definir o que é ser homem ou ser mulher, o que podem ou não fazer ou deixar

de fazer.

0 sexo e as características biológicas ganham significados sociais, que determinam

as possibilidades físicas de homens e mulheres, delimitam os espaços onde podem atuar,

estabelecem características, definem papéis, enfim, dizem que eles são desiguais. Partem

do suposto que as desigualdades são normais e naturais e correspondem à "natureza" de

homens e mulheres.

É um aspecto biológico que tem sua expressão nas diferençasgenitais ereprodutivas entre homens en1ullieres

SEXORefere-se a características biológicas,incltórliicas e fisiológicas que estabelecelnlditerenças entre homens e acolheres

GENERf3Refere-se a características clulturaishistoricamente construídas, que estabelecempapéis difcrenciadoa para homens e Innulhcres

4 IDENTIDADE DE GÊNERO E PAPÉIS SOCIAIS

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA.

A

SEXO não é igual a GÉNEROGÊNERO não é igual a MULHER

A identidade de homens e mulheres é uma construção cultural que decorre, entre

outros motivos, do modo como o mundo lhes foi apresentado, da educação recebida, da

cultura dominante, das relações que travam, de como são reconhecidos pelo grupo e como

conduzem seus atos.

A escola reforça e legitima esses modelos na medida em que veicula mensagens onde

o homem firma-se pela audácia e pelo desempenho na vida pública, enquanto a mulher

permanece envolvida no sonho do casamento, da chegada de alguém para protegê-la,

amá-la e decidir sua vida. No Brasil, tradicionalmente, homens e mulheres recebem

educação diferenciada, não em respeito às diferenças entre os sexos e sim para torná-los

desiguais e com isto marcá-los, rotulá-los e destiná-los a lugares e papéis.

Também o conteúdo dos livros didáticos reforça a desigualdade, entre outras situações,

apresentando divisões nas tarefas a serem desempenhadas por homens e mulheres; pela

forma como as relações entre pais e mães são postas; ou ainda, pela indicação de carreiras

a serem seguidas por homens e mulheres.

Esses modelos são ensinados em tenra idade e cobrados pelo social, de modo que as

pessoas tendem a acatá-los e reproduzi-los não só no aspecto concreto, que se exterioriza

através do corpo, dos gestos, do vestuário, das companhias, como, principalmente, nos

sentimentos e emoções. O homem precisa ser frio, determinado, insensível, fechado,

duro; enquanto a mulher dócil, carinhosa, acomodada, sensível, dependente. Romper com

esses modelos faz com que tanto homens quanto mulheres sintam-se pouco à vontade,

distantes do que acham que são e expostos à ridicularização. E simples entendermos isto,basta ver a maneira como a sociedade recebe um homem que fala fino e tem jeitos delicados

ou uma mulher que fala grosso e tem atitudes rudes.

De certo, tanto a masculinidade quanto a feminilidade são construídas no processo

sócio-cultural. Assim como o menino aprende a não maternar, a não exteriorizar seus

sentimentos, a não ser sensível, a ser diferente de sua mãe, da mulher, dos gays e a parecer-

se com o pai, com o macho, concretizado na figura do provedor, seguro e justiceiro; com

a menina acontece o oposto. Ela deve identificar-se com a mãe, e com as características

definidas como femininas.

IDENTIDADE DE GÊNERO E PAPÉIS SOCIAIS 5

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA........................................

No campo dos sentimentos, a primeira coisa que as famílias ensinam aos seus filhos édominá-los, pois os vêem como sintoma de fraqueza, coisa de mulher e de "maricas".

Ensinam: homem que é homem não chora, não tem medo, enfrenta o adversário, se vier

para casa apanhado, apanhará novamente. Entendem que essas são formas de ensinar o

menino a ser homem, o que pode ser traduzido como; não ser homossexual e não sermulher. Enfim, o menino é criado para ser macho, senhor, corajoso e bem sucedido, onde

não há espaço para o fracasso e a capitulação.

0 medo de não garantir a masculinidade leva os homens a verdadeiras manobras que

incluem desde o desprezo a partes de si, até a subjugação do outro. Com os seus pares, os

do mesmo sexo, os homens mantém relações iguais, se desconsiderarmos a variável classe

e marcarmos a variável sexo. Mesmo assim, relacionam-se de forma superficial, sem se

aprofundarem no conhecimento de si, nem estabelecerem verdadeiras relações de trocas,

de ajuda, de solidariedade, em síntese, qualquer tipo de afetividade. Reúnem-se em locais

públicos, envolvendo bebidas, cigarros, jogos de azar e gastam o tempo de convivência

falando de suas aventuras e dos troféus conquistados.

Em síntese, o modelo de masculinidade que vem sendo ensinado aos homens não

deixa espaço para a afetividade, não ensina a lidar com a emoção, apenas, com assuntos

concretos: sexo, esporte, profissão, política. Conversar sobre emoções, ou mesmo

demonstrá-las, sempre foi considerado um sinal de fraqueza, de feminino'.

Assim, a masculinidade é construída socialmente e permanentemente reforçada. Já a

feminilidade é tida como naturalmente dada e o papel biológico de reprodutora é suficiente

' CUSCHNIR, Luiz. Masculino . Rio de Janeiro : Rosa dos Tempos, 1992. p.62.

6 IDENTIDADE DE GÊNERO E PAPÉIS SOCIAIS

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NAO DISCRIMINADORA.

para definir a identidade da mulher. Desde cedo, as meninas são ensinadas que devem

ajudar aos outros, ter atitudes carinhosas, compreensivas, preocupadas com o próximo,

com a segurança e o bem estar das pessoas. Dentro dessa lógica é que o trabalho realizado

pelas mulheres no lar, nunca é considerado como tal e sim como algo de menor importância,

um simples labor que não precisa ser mostrado, porque não possui a dignidade dos feitos

que valem a pena ser lembrados.

É por isso que as atividades das mulheres em casa são sempre vistas como de pouco

valor. Elas não recebem salário, não tem horário para começar nem para acabar. Começam

quando acordam (muito cedo) e acabam quando vão dormir (muito tarde). O que elas

fazem não fica feito e quase nunca aparece, pois cozinham e todos comem e o seu serviço

deixa de existir; lavam os pratos que logo serão utilizados e ficarão sujos outra vez;

arrumam a casa, que será desarrumada.

Dizem que o trabalho do homem é diferente. Ele ganha dinheiro para comprar comida,

roupa, remédios e seu trabalho é sempre visível. Por isso, o que ele faz é mais valorizado.

O trabalho que a mulher faz na roça e na criação dos animais também é pouco valorizado.

Dizem que a mulher ajuda o homem e que o serviço que ela faz em casa não é trabalho.

IDENTIDADE DE GÊNERO E PAPÉIS SOCIAIS 7

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA...............................................

DIVISÃO DE GÊNERO NO TRABALHO

TIPO DETRABALHO

Produtivo

1

TnviVível

T)e,^valori7..ic{c)

NÁn r niilnf'r:i^0

N:1O ii.intificido

Com teCnOl0 13s pouco apro p ri adas J

S11hiciivO OU 1iiI lie n.is (O1 ilíytic.iv

1nj11,1 amc11te reilm eradnn

rAi^lil t ni ninE'IS V niFlliinrc ti OS

^senin(^nha(^O^ n;i usler i (iO,i,é^tici:

honra n.irticina( ,i (l fOe nOt^(^O

chapes de decisão.

ISSO É BOM OU RUIM?

N.a() ' ;1SCtnli1 C'O1Ti(l

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P'11-1 wjn,luâc) em

.11 ividiides recreativas

Não é bom, por muitos motivos:

1°) Não ensina aos homens a cuidarem de si, saber cozinhar, lavar, etc. eles ficam otempo todo precisando de alguém, de uma mulher que cuide deles.

2°) Não deixa os homens serem felizes. Eles não podem chorar, não devem falar que estão

tristes, não podem mostrar suas emoções, precisam mostrar que são fortes e corajosos.

3°) Com as mulheres também não é bom. Elas ficam dependendo dos homens, não são

chamadas para participar dos sindicatos, não participam da política, nem recebeminformações técnicas, sobre plantio, por exemplo.

4°) Elas trabalham demais, não contam com a ajuda das pessoas da casa, no máximo, das

filhas e seu trabalho não tem valor, não é reconhecIdo.

5°) Os homens acham que devem mandar nas mulheres e por isso as fecham em casa,

proíbem que elas participem das atividades das associações não querem que elas

aprendam a tomar decisões.

8 IDENTIDADE DE GÊNERO E PAPÉIS SOCIAIS

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA

PROFESSORA PRIMÁRIA:

PROFISSÃO FEMININA

PROFESSORA PRIMÁRIA: PROFISSÃO FEMININA 9

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PROGRAMA DE SENSIBILIGAÇAO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINA DORA

O magistério primário é uma atividade que vem sendo exercida, basicamente, por

mulheres. É também uma atividade que passa por um processo de desvalorização contínua,

o que tem feito muitas estudiosas perguntarem o que tem uma coisa a ver com a outra. Ou

seja, se a profissão é desvalorizada porque é exercida por mulheres, ou se é exercida pormulheres porque é desvalorizada. Em outros termos: por que as mulheres são dirigidas

para esta profissão? Para entendermos essa questão, mostraremos um pouco da história

da educação feminina e de como as mulheres foram se conduzindo para a carreira do

magistério primário.

Quando o Brasil era colonia de Portugal, não havia escolas para o sexo feminino, sua

educação acontecia em conventos religiosos e restringia-se à aprendizagem de prendas

domésticas . Com a transmigração da Família Real (1808), inicia-se a educação laica para

o sexo feminino, através de senhoras vindas de Portugal, França e da Alemanha,

inicialmente na cidade do Rio de Janeiro. Além das prendas domésticas - bordados, costura,

etc -, elas passaram a ensinar às mulheres, principalmente as mais ricas, rudimentos de

aritmética e língua portuguesa.

Com a Independência do Brasil, a Constituição de 1823 garantia educação para os

dois sexos e não apenas o masculino, como vinha acontecendo. As aulas deviam ser

dadas separadamente para meninos e meninas, com professores homens para os meninos

e mulheres para as meninas.

Havia a exigência de que as mestras das alunas fossem senhoras bem conceituadas e

especialistas em prendas domésticas e os mestres dos meninos soubessem geometria, o

que não era exigido na educação das meninas. Com isso, a própria legislação educacionalcolocou a primeira diferenciação curricular a partir do sexo. 0 ensino da geometria faziacom que o mestre ganhasse mais do que a mestra. As professoras começaram a ganhar

menos a partir daí.

Outro problema que levou as professoras a ganharem menos deu-se em virtude dafalta de mulheres com formação suficiente para ministrar a educação. Por estaremanteriormente impedidas de receberem educação formal, não era fácil encontrar professoraspara as meninas. Com isso, começaram a admitir mestras leigas, que recebiam salários

inferiores aos titulados, situação que se mantém ainda hoje.

A dificuldade de encontrar mestras para as meninas fez com que, no império, fossemcriadas Escolas Normais em alguns estados do Brasil. No início, a sociedade não via combons olhos as mulheres que procuravam essas escolas. Elas não tinham o mesmo valor

dos liceus, nem dos colégios secundários. Pouco a pouco, o conceito de escola normalfoi-se modificando e elas passaram a cumprir o papel que a sociedade lhe concedeu:formar professoras , preparar mães, esposas e donas de casa , dando às mulheres

condições de aumentarem sua cultura.

10 PROFESSORA PRIMÁRIA: PROFISSÃO FEMININA

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• PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇAO NÃO DISCRIMINADORA.

No final do século XIX, foi aceita a co-educação, ou seja, que meninos e meninas

estudassem juntos, sob a regência de professoras. A decisão de deixar as crianças deambos os sexos sob a orientação da mulher era explicada pelas autoridades (presidentes

de províncias, inspetores educacionais, entre outros), por ser uma atividade semelhante a

que as mulheres ocupavam em casa, com seus filhos. Atividade que exigia paciência,

carinho, bondade , enfim, como diziam, " instinto materno".

Diziam que as professoras, com o seu "instinto materno", tinham mais condições de

despertar a atenção das crianças e de fazê-las ficar quietas. Isto porque, as mestras

lembravam suas mães, pessoas boas e dedicadas a quem eles amavam e não iriam aborrecê-

las.

O Curso Normal era tido como adequado também às mulheres, porque entre crianças

elas se sentiriam em casa. As famílias incentivavam suas filhas a cursarem o Normal e

elas, por falta de opção e por convencimento, concordavam, inclusive acreditavam que

aquele era um curso e uma atividade adequadas a elas.

O que significa ser professora primária

Sabendo-se que os homens são sempre vistos como profissionalmente melhores do

que as mulheres, por que acontece o contrário quando se trata do magistério primário?

Por que nele as mulheres são tidas como mais eficientes? Por que poucos homens se

dedicam ao magistério primário?

Primeiro, como vimos acima, diz-se que essa atividade exige "qualidades femininas"

(bondade, paciência, doçura, simpatia, meiguice) e jeito para lidar com crianças . Porém,

sabe-se que homens e mulheres podem ser pacientes ou impacientes, simpáticos ou

antipáticos, ter jeito ou não para lidar com crianças. 0 que faz a mulher ter mais habilidadeé a forma como ela é educada (treinada) para desenvolver atividades que exigem essasqualidades.

Em segundo lugar, dizem que as mulheres são mais adequadas a essa ocupação porqueos salários são baixos e os homens não podem ganhar pouco por serem chefes de família.

De fato, houve um tempo em que os homens eram os principais responsáveis pelo sustento

da família, mas, hoje, não é mais assim. A cada dia mais mulheres responsabilizam-se

pelo sustento dos filhos, ou, no mínimo, são responsáveis pela sua manutenção.

Apesar disto, elas continuam aceitando receber salários baixos, porque acreditam queo seu trabalho é de menor valor , parecido com aquele que desempenham dentro de casae pelo qual nada recebem. As mulheres, quase sempre, desempenham atividades voltadas

para o cuidar dos outros, como as de enfermagem, secretariado ou de professora primária,

PROFESSORA PRIMÁRIA: PROFISSÃO FEMININA 11

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA.............................................................

entre outras . Diante disso, além de aceitarem péssimos salários, trabalham em condições

: ruins, muitas vezes, em locais sem a menor condição de trabalho. Por exemplo, com asprofessoras, é comum encontrá-las trabalhando em salas com janelas quebradas, carteiras

insuficientes, falta de sanitário e de material didático. Assim como fazem em casa, vão

remediando a situação usando o seu próprio dinheiro para comprar giz, ajudar na merenda

dos alunos e, muitas vezes, comprar agasalhos e material didático.

A falta de consciência do valor do seu trabalho, gera outras consequências mais sérias

do que o uso dos seus parcos recursos para suprir algumas necessidades da escola. Assim

como a sociedade não prepara as mulheres para serem mães, também , as preparam muito

pouco para serem professoras primárias.

Outra idéia que se tem do magistério primário, que serve para mantê-lo como ocupaçãode mulher e pouco valorizado é a de vê-lo como sacerdócio , que pode ser traduzido como

algo que se faz por vocação, por amor ou como filantropia. Idéias que são retomadas

sempre que se quer comprometer alguém com a execução de atividades de pouco valor

social e retorno econômico.

A relação da mulher com a ocupação de professora primária, vem sempre ligada àidéia de vocação, e esta, com gostar de lidar com crianças, ter jeito para dar aulas, gostar

de ajudar ao próximo. Entretanto, sabe-se que a destinação das mulheres a essa ocupação

decorre de condicionamentos sociais que vêm nela uma forma de mante-las responsáveis

pelas ocupações domésticas e colocando em primeiro plano os papéis de mãe e esposa.

As próprias mulheres absorvem essa idéia e reafirmam que ser professora é uma

ocupação adequada a elas pois além de ocuparem-se com crianças, o que não ameaça amoral patriarcal, que se preocupa com a honra da mulher, também garante que elas tenham

tempo para a vida doméstica e a prestação de serviço aos outros. A ocupação de professoraprimária, além de poder ser realizada em um turno, o seu expediente se encerra antes dojantar, ou seja, no horário da chegada do marido em casa.

A situação atual da professora primária

Apesar da mudança que ocorreu na formação da professora primária com a criaçãodas faculdades de filosofia, ela continua tendo pouco conhecimento, o suficiente para lhepermitir reger uma classe e tomar conta de crianças, sem perspectivas de crescimento.

Quanto à sua situação salarial, estudos confirmam que houve uma significativa perda

salarial entre os anos de 1966 a 1980.0 processo de desvalorização da profissão tem feitocom que, nos últimos anos, surjam organizações da categoria e alguns movimentos

grevistas, contando com o apoio da população que reconhece as injustiças a que elas têm

estado submetidas.

12 PROFESSORA PRIMÁRIA: PROFISSÃO FEMININA

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Outro fato da atualidade, mas que reflete uma longa tradição, é o da professora primária

ser identificada pelas crianças e pela sociedade como tia. Tradicionalmente, a professora

vem sendo identificada como uma segunda mãe. O papel de tia traz outros significados.

Na prática, a tia é aquela mulher que não conseguiu se casar e, por isso, passa a viver

através da boa vontade do cunhado e como auxiliar da esposa.

O que significa essa identificação para a professora? Para muitos, ela é uma forma de

garantir maior afetividade na relação professor - aluno, para outros, ela é prejudicial à

profissão na medida em que leva à perda da identidade da professora. De fato, mesmo

aceitando-se a tese da afetividade e o seu valor na formação das crianças, acreditamos

que tratar a professora de tia é uma forma de desvalorizar do seu saber, deixando-a com a

tarefa de apenas cuidar dos alunos, situação que não necessitaria de preparo nem de

melhores condições de trabalho.

As docentes do magistério primário precisam superar essa situação, o que só acontecerá

através da tomada de consciência do seu verdadeiro papel na sociedade, da retomada da

sua identidade profissional e da autonomia no seu fazer pedagógico.

PROFESSORA PRIMÁRIA: PROFISSÃO FEMININA 13

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14 POR UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA

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POR UMA

EDUCAÇÃO

NÃO DIsCRIMINADORA1

Este texto tem por base bibliográfica:

MICHEL, Andrée. Não aos estereótipos. Vencer o sexismo nos livros para crianças e nos manuais escolares. São paulo:Conselho Estadual da Condição feminina/UNESCO. 1989.

POR UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA 15

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Hoje, as estatísticas mostram que as mulheres são maioria nos setores ligados a

educação, isto é, as mulheres ocupam a maior parte das vagas do ensino de primeiro e• segundo graus e quase a metade das vagas nas universidades. Elas são também a maioria

absoluta dos professores nos dois primeiros graus do ensino.

Mas, estes dados significativos da presença feminina na área do ensino representamuma longa trajetória de batalhas e mobilizações femininas. No Brasil as mulheres tiveramacesso ao ensino formal apenas no século passado. O direito a educação foi a primeira

luta do movimento de mulheres.

Mas será que é suficiente ter um número grande de mulheres no ensino para garantir

a construção de uma sociedade mais justa, onde mulheres e homens vivam em perfeita

harmonia?

Sabemos da importância do papel da educação na formação e transmissão dos

princípios morais, religiosos, dos valores sociais, na preservação da cultura, tradições e

da história de um povo. A educação estrutura a forma de ser das pessoas e indica os

lugares que elas devem ocupar na sociedade. Ela é, também, o principal instrumento de

transformação nas condições de vida de uma população, podendo conduzir um povo aodesenvolvimento, ao progresso, a melhoria de vida de sua população. Porém, ela pode

ser, também, um instrumento de preservação e reforço de valores antigos, de mentalidades

subalternas e ou autoritárias. Esse tem sido historicamente o papel da educação no que se

refere a condição feminina.

Certamente, tanto homens quanto mulheres submetem-se ao mesmo tipo de

condicionamento imposto pela sociedade através da educação só que valorizados de forma

diferenciada. Na escola, o "bom" é identificado como o sossegado, obediente, acomodado

e o mau, com os seus contrários. Porém, se às mulheres equivalem as primeiras qualidades

e, em consequência, recebem o rótulo de boas alunas, por sua vez, também são tidas como

choronas, servis e dóceis. Enquanto que o "mau," identificado com o perfil masculino,

também é o corajoso, o autônomo e o criativo.

Nessa separação entre bom e mau, entre homens e mulheres, apesar das escolas estarem

interessadas em manter a ordem e em cumprir a rotina educativa, elas cumprem seu papel

de reprodutoras de idéias e acabam valorizando o comportamento masculino em detrimento

do feminino. Assim, as pessoas vão sendo classificadas de acordo com seu sexo, criando

modelos que desenvolvem a desigualdade e a discriminação. Através dessa prática averdade vai sendo alterada, vão sendo estabelecidos diferentes valores para homens e

mulheres .

16 POR UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA• .

Entre as consequências que as atitudes preconceituosas em relação às mulheres

produzem, no campo profissional, elas são levadas a carreiras "... mal remuneradas (mesmo

que o nível escolar exigido seja elevado), limitadoras, de prestígio insignificante e que,

geralmente, são verdadeiros guetos de empregos desprestigiados."'.

Sob o argumento de que as mulheres possuem mais habilidade

manual, são mais frágeis biologicamente, menos inteligentes, etc,

elas são conduzidas a ocupações de menor valor econômico e social,

que não possibilitam tomadas de decisão e o exercício do poder,

atividades quase sempre da área do ensino, do cuidar e do servir.

Assim, temos grande número de secretárias, enfermeiras, professoras,

datilógrafas e digitadoras, funções desempenhadas quase de forma

invisível, enquanto os homens ficam com os cargos de chefia e as

profissões da área da ciência e da tecnologia.

Assim, através da reprodução de estereótipos sexistas, a

educação vem mantendo a mulher numa condição de submissão e opressão, vem

reproduzindo valores e idéias que a mantém excluída da vida política e das esferas de

decisão, não reconhecendo sua importância na sociedade.

SEXISMO - São as práticas, os preconceitos e as idéias que desvalorizam einferiorizam as mulheres em relação aos homens, são as discriminações em relação aosexo feminino.

ESTEREÓTIPO - algo que se repete e se reproduz sem variação, amoldando-se a

um modelo fixo e geral, não distinguindo as qualidades individuais; uma imagem mental

padronizada, que é comum aos membros de um grupo e representa uma opinião

exageradamente simplificada, uma atitude emocional ou um julgamento sem exame. Uma

tendência a padronização, uma distorção da realidade. Uma espécie de modelo.

PRECONCEITO - conceito formado antecipadamente e sem fundamento razoável;

crença, opinião preconcebida, imposta pelo meio, época e educação, está muito próximoao estereótipo.

A utilização do termo ESTEREÓTIPOS SEXISTAS é um sintoma de que a sociedade

já reconhece a existência de um tratamento desigual e injusto imposto as mulheres, baseado

na cultura, e aplicado através da educação. Dizer que uma educação é sexista é dizer que

ela discrimina as mulheres, que valoriza as ações masculinas.

2 MICHEL, Andrée. Não aos estereótipos. Vencer o sexismo nos livros para crianças e nos manuais escolares. São paulo:Conselho Estadual da Condição feminina/UNESCO. 1989.

POR UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA 17

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Quando se trata de representações, os estereótipos sexistas masculinos e femininostendem a desvalorizar as mulheres e as meninas e a valorizar os homens e os meninos. Os

• estereótipos masculinos são baseados em valores positivos como coragem, inteligência,

autoafirmação, espírito de aventura, eficiência e competência, já às mulheres os valores

são de passividade, vaidade, falta de inteligência, emotividade, acomodação, etc.

Os discursos que apresentam as mulheres como meigas, maternais e os homens como

agressivos, racionais são estereótipos sexistas pois não levam em conta que as mulheres

podem ser agressivas e pouco carinhosas e os homens também podem ser maternais e

emocionais.

A idéia, por exemplo, de que as mulheres não aprendem matemática é um estereótipo.

Na verdade é uma espécie de restrição às oportunidades dadas de igual forma a meninos

e meninas para que aprendam matemática. As crianças são orientadas para os cursos de

acordo com os estereótipos sexistas existentes na sociedade independente de sua capacidade

ou aptidão.

Como veremos mais adiante, a escola é um local de aprendizado sexista, devido aos

manuais escolares, à divisão sexual dos papéis na sala de aula, às práticas representativas

dos sexos apresentadas pela professora, etc

Os livros de textos e as estórias infantis são os instrumentos mais eficazes de

transmissão de estereótipos sexistas. Isso ocorre através das ilustrações que geralmente

representam mulheres como donas de casa, realizando trabalhos domésticos ou cuidando

de crianças, velhos e enfermos. Já as representações masculinas estão ligadas ao esporte,

à aventura, à liderança. As cenas são sempre as mulheres de avental servindo à família e

o marido de paletó e gravata ou outra roupa de trabalho ou saindo de casa para trabalhar.

As mulheres são representadas sempre como esposas e mães, esquecendo-se do fato de

que muitas mulheres são solteiras, jamais terão filhos e principalmente que também são

trabalhadoras, podem ser prefeitas, delegadas, juizes, professoras, vendedoras e principalmente,

como aqui na região do Rio Gavião, as mulheres são produtoras e trabalhadoras rurais.

Foram as mulheres as primeiras a perceber o sexismo existente nos livros didáticos e nas

práticas pedagógicas existentes na escola. Essa identificação aconteceu exatamente por serem

as mulheres a maior parte do professorado primário e secundário na maioria dos países.

Nos últimos anos, a partir da reivindicação do movimento de mulheres, o governotem procurado controlar melhor a qualidade dos livros didáticos distribuídos nas escolasno sentido de eliminar as imagens estereotipadas, introduzindo imagens mais positivas evalorizadas para as mulheres.

18 POR UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA.

A divisão dos papéis também na sala de aula é fundamental. Se a professora pede

ajuda para as meninas na hora de arrumar, enfeitar a sala e quando tem que carregar peso,

ou mandar recados solicita aos meninos, ela está reproduzindo modelos e estereótipos

sexistas. Nos momentos de brincadeira, a professora manda os meninos jogar bola, brincar

de correr, subir em árvores e as meninas bordar, arrumar a sala, brincar de roda,

reproduzindo assim os papéis de gênero. Quando elogia uma menina porque está com um

belo vestido e elogia o menino porque tirou uma boa nota, esta reforçando a idéia de que

as mulheres têm que estar sempre bem (aparência) para agradar os outros, enquanto o

menino está sendo direcionado ao sucesso pessoal a partir da valorização do seu esforço.

Dentre outros caminhos possíveis para essa modificação, seria importante que os

papéis sociais fossem apresentados dentro de uma flexibilidade, onde as emoções e as

tendências de ambos os sexos fossem respeitadas e não disciplinadas de modo a forçar as

mulheres a serem afetivas e os homens a evitá-las, entre outras. A educação precisaria

deixar de identificar as ocupações dificultosas e pouco atrativas, como "vocação" feminina,

levando as mulheres a cumprí-las como um chamamento ao qual não podem recusar.

Eliminar os estereótipos nas praticas escolares é o primeiro passo para combater

o sexismo.

Eliminar do material educativo todos os estereótipos sexistas e os preconceitos relativos

a mulher, promovendo uma imagem positiva das mulheres, que valorize a mulher é a

perspectiva de uma educação não discriminadora. A educação precisa colocar-se como

agente de mudança, onde homens e mulheres sejam vistos como iguais, com os mesmos

direitos e as mesmas condições, desfazendo a divisão de ocupações e estimulando a

criatividade e não a ordem , a disciplina e a hierarquia.

Uma educação não discriminadora se constrói a partir, principalmente , da preocupação

da professora ou professor na sala de aula. Para tanto, deve-se:

Proporcionar uma divisão igualitária de tarefas na sala de aula (meninos e meninas

fazem as mesmas atividades);

v Valorizar, através de exemplo , as atividades femininas no mundo doméstico ressaltando

sua importância para a família e a sociedade;

v Utilizar exemplos de mulheres e homens em atividades não tradicionais (homens

professores , empregados domésticos , costureiros , cozinheiros etc.; mulheres

engenheiras , prefeitas , tratoristas etc,);

v Promover jogos e brincadeira em que meninos e meninas desenvolvam as mesmas

atividades;

POR UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA 19

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v Evitar o sexismo no vocabulário, usando por exemplo a palavra "humanidade" emlugar de homem, falar "direitos humanos" e não direitos do homem, quando referir-seàs profissões (que sempre são apresentadas no masculino) dizê-las também no feminino;

v Estar atento para o conteúdo sexista do material didático, evitando utilizá-lo quando

sentir que reproduz estereótipos;

v Comunicar a secretária de Educação do município ou do estado quando um materialescolar recebido conter estereótipos sexistas;

v Apresentar sempre aos alunos os artigos da Constituição Federal que estabelecem aigualdade entre homens e mulheres em todas as instâncias da vida social;

E, principalmente,

ACREDITAR QUE MULHERES E HOMENS SÃO IGUAIS

E MERECEM TRATAMENTOS IGUAIS

20 POR UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA

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EXERCÍCIO DE AUTO -AVALIAÇÃO3

A lista de perguntas apresentadas abaixo é um instrumento de avaliação que tem por

objetivo chamar a atenção dos professores sobre as implicações do seu comportamento

na reprodução dos papéis de gênero e de valores sexistas. Leia com atenção e escolha

uma das respostas. Faça este exercício com honestidade, ele será fundamental para a

análise de suas práticas pedagógicas.

LISTA DE PERGUNTAS SIM ÀS

VEZES

NÃO

Encorajo as meninas a não esconder suas capacidades?Tenho a expectativa de que todos/as os/as alunos/as exploremas várias opções de engajamento profissional?Encorajo todos/as os/as alunas, inclusive as meninasgrávidas, a não abandonar os estudos?Acho que as meninas, assim como os meninos, podemdesenvolver habilidades de liderança?Oriento meninas e meninos a desenvolver habilidades, tantopara escutar, como para falar?Incentivo meninas e meninos a praticar esportes, mas respeito

os/as que não gostam de práticas esportivas?Estou atento/a ao fato de que muitas/os meninas/os têm umaimagem negativa do próprio corpo?Compreendo que o preconceito de gênero é um problema dasociedade, e não do indivíduo?Aceito críticas construtivas a respeito do meu comportamentoem relação ao gênero?

•^• Quando os/as alunos/as fazem piadas sexistas ou racistas,explico por que não são corretas?

'^• Incentivo tanto meninos como meninas a desenvolver asociabilidade e a aprender a cuidar das outras pessoas?

•^' Encorajo tanto os meninos quanto as meninas a desenvolverhabilidades para falar em público e agir como líderes naescola?

'^• Peço aos meninos e às meninas para realizar tarefas em salade aula, tais como abrir janelas, decorar as paredes ou operarum equipamento?

Intervenho quando as meninas, ao trabalhar em grupo com osmeninos, são relegadas a cargos estereotipados (comosecretárias, por exemplo)?

Reforço nos meninos e nas meninas os sistemas de valores ede justiça?

' Esta lista foi elaborada por WHELLER, Kathryn. How Schools Can Stop Shortchanging Gril (and Boyes): Gender-QuityStrategies, Centre for Reserch on Women, 1993. Citado por NENGE, Ensino e Educação com a igualdade de genêro naInfância e na de adolescente. São Paulo, 1990.

POR UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA 21

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'•' Tento reverter os estereótipos de gênero?Chamo atenção para o fato de que meninos e meninas nãoformam grupos em separado?Desencorajo toda e qualquer violência praticada contramulheres e homens?Intervenho contra qualquer comportamento de perseguição

sexual?

Procuro não fazer comentários racistas e sexistas?A decoração da minha sala de aula reflete as contribuiçõesfeitas à sociedade por homens e por mulheres?Convido mulheres e homens a dar palestras aos/às alunos/as?O trabalho dos/as alunos/as em sala de aula é cooperativo?Faço as mesmas perguntas aos meninos e às meninas?

'•' Uso o mesmo tom de voz com as meninas e com os meninos?Desencorajo a competição, nos grupos, entre as meninas e os

meninos?'^• Destaco os sucessos de mulheres e meninas, assim como de

homens e meninos?Reflito sobre o fato de que metade da população do mundo éfeminina?Propicio oportunidades de práticas esportivas para meninos e

para meninas, em igualdade de condições?Incentivo igualmente o envolvimento de meninas e meninosem atividades de ciências e matemática?Tento elevar a consciência de meus/minhas colegas sobre opreconceito de gênero?

Realizada esta auto-avaliação, verifique a possibilidade de mudar seu comportamento em

sala de aula. Volte sempre a esta lista de perguntas e verifique o quanto você esta

colaborando, através do ensino, para a igualdade entre homens e mulheres.

22 POR UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA

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PEDAGOGIA DE GÊNERONão só no Brasil, mas por toda a América Latina, novas pedagogias vêm sendo

desenvolvidas e/ou apropriadas para o trabalho com mulheres das camadas menos

favorecidas, seja das zonas rurais, seja urbanas. Dentre elas, inclui-se aquela que vem se

convencionando denominar de `pedagogia de gênero'.

No seu sentido restrito, pedagogia define-se como "ciência da educação".

PEDAGOGIA:

conjunto de princípios., tradições, métodos e práticas

voltadas para a " arte de ensinai"

PEDAGOGOGIA DE GÊNERO

conjunto de princípios e práticas que objetivaniconscientizar indivíduos, tanto homens

quanto mulheres, sobre a ordem e as relações de gênero vigentes em nossa sociedade,

capacitando-os e instrumentalizando-os para atuarem no sentido de superá-las e,assim, construir a equidade entre os sexos

Seu princípio básico, portanto, é o de libertar homens e mulheres das amarras das

idéias pre-concebidas e hierarquias de gênero, ou seja, da construção social das diferenças/

desigualdades entre os sexos, princípio esse que se aplica a todas as metodologias

desenvolvidas para o trabalho com mulheres.

Em tese, o objetivo da pedagogia é a transformação integral do indivíduo, o que não

implica dizer que toda pedagogia seja libertadora. Ao contrário, como bem observou

Paulo Freire , em nossa sociedade imperam ainda as práticas educativas que se baseiam nanoção de que educar

é um ato de depositar, no qual os educandos são os depositários e o educador

o depositante... 0 saber é uma doação dos que se julgam sábios, aos que julgam

nada saber. Doação que se fundamenta nas manifestações instrumentais da

ideologia da opressão - da absolutização da ignorância, que constitui-se no

que chamamos de alienação da ignorância, segundo a qual esta se encontra

no outro.'

' FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro : Paz e Terra, 1987. 184 p.

PEDAGOGIA DE GÊNERO 23

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Por certo, esse método pedagógico nada tem de transformador. Ao contrário, sua

eficácia reside em reforçar condicionamentos, em reproduzir as condições de opressão ao

• nível da estrutura da consciência do indivíduo.'

Em contrapartida, as "pedagogias libertadoras", dentre as quais se inclui a pedagogia

de gênero, partem do pressuposto de que o processo pedagógico é um tecido de percepções,

expectativas e influências recíprocas, que deve se desenrolar no sentido de uma apropriação

criadora e criativa do saber.' Assumem, também, que o processo educativo não é neutro:

pode-se educar tanto para a submissão quanto para a libertação. Por outro lado, entendem

que

"toda proposta educativa supõe uma relação fluída e sistemática entre a teoria

e a prática e este princípio geral é ainda mais imperativo naquelas áreas nas

quais o conhecimento ainda é insuficiente e incerto.'

De fato , segundo Graciela Messina, no contexto dos programas voltados para mulheres

de setores populares, a pedagogia de gênero tem-se caracterizado como

uma busca educativa que transita pela educação popular, que confronta o saber

local com o saber externo, que assume a fl exibilidade dos processos , reconheceo particular dos processos, valoriza o trabalho coletivo e de grupo como umespaço de aprendizagem que vincula as histórias individuais à vida social.

Esta busca educativa implica em criar metodologias e materiais pensados para

o trabalho com mulheres e ao mesmo tempo abrir-se para um diálogo com os

outros.'

No particular, essa "busca educativa" baseia-se no reconhecimento de que romper

com as amarras dos condicionamentos de gênero e, em especial, com a subordinação, não

é um conhecimento que se transmite. Trata-se, ao invés, de um processo que se constrói,

tanto como um crescimento pessoal quanto coletivo, que não é linear nem homogêneo, esim cheio de incertezas e contradições.

2 ZUNIGA, Miryan E. Apuntes para una pedagogia de los programas educativos com mujeres de sectores populares. In :BUTTNER, T., JUNG, I., KING, L. ( eds), Hacia una pedagogia de género . Exxperiencias y conceptos innovativos, Bonn

Fundación Alemana para el Desarrollo Internacional, 1997.

ZUNIGA, op. cit., p. 39-40.

CELIBERTI, Lillian. Reflexiones acerca de Ia perspectiva de gênero en Ias experiencias de educación no formal commujeres . In : BUTTNER, T., JUNG , L, KING, L, (eds), op . cit., p.73.

` MESSINA, Graciela. Género e innovación . In : BUTTNER, T., JUNG,1., KING, L. (eds), op. cit., p. 13.

24 PEDAGOGIA DE GÊNERO

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A LINGUAGEM, A SOCIEDADE

E OS LIVROS DIDÁTICOS'

INTRODUÇÃO

Ai Que Saudades da Amélia (Ataulfo Alves/Mário Lago)

Nunca vi fazer tanta exigência

Nem fazer o que você me faz

Você não sabe o que é consciência

Nem vê que eu sou um pobre rapaz

Você só pensa em luxo e riqueza

Tudo o que você vê, você quer

Ai, meu Deus, que saudade da Amélia

Aquilo sim é que era mulher

Às vezes passava fome ao meu ladoE achava bonito não ter o que comer

Quando me via contrariado

Dizia: "Meu filho , o que se há de fazer!"

Amélia não tinha a menor vaidade

Amé1ia é que era mulher de verdade

' Texto elaborado por Ivia Alves (NEIMIUFBa)

A LINGUAGEM, A SOCIEDADE E OS LIVROS DIDÁTICOS 25

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As pessoas, para viver em comunidade, comunicam-se. Falam, conversam, dão ordens,

recebem ordens. Assim, a linguagem é o meio (ao lado do gesto e da entonação da frase)

que as pessoas utilizam para se comunicar. No entanto, elas não têm idéia de que a

linguagem contém preconceitos, regras de comportamento e muitas outras coisas. A

linguagem mantém, regula (controla) a pessoa dentro da sua comunidade, dentro da região

maior, dentro do estado e do país.

Vamos colocar o problema, usando exemplos familiares a todos uma vez que tais

ditados circulam pela comunidade:

"Mulher sem homem é igual a cachorro sem dono"

"A mulher em casa e o homem na praça"

"Moça, chita e fita não há feia nem bonita""Mulher que não perde festa para pouco presta".

Examinemos outro conjunto de frases:

Consultando no dicionário da língua portuguesa as palavras homem e mulher percebe-

Se uma diferença de valores e desqualificação moral que incide sobre a palavra mulher.

Homem de bem

Homem de ação

Homem de letras

Homem da rua

Homem público

Fulano é profissional

Xxxxxxxxxx

Xxxxxxxxxx

Xxxxxxxxxxx

Mulher de bem

Mulher da rua

Mulher pública

Fulana é profissional

Mulher da vida

Mulher perdida

Mulher à-toa

Nas frases acima, as palavras não são sinônimas nem semelhantes quando se referem

a homem e quando se referem a mulher. Pois se "homem de bem" corresponde a um

indivíduo íntegro, cumpridor de seus deveres, no caso de "Mulher de bem" diz respeito à

sua sexualidade. Em outras palavras, quer dizer uma mulher íntegra, mas também se refere

à sua virgindade ou seu comportamento monogâmico, de ter só um homem, seu marido.

Observe que frases como "mulher à toa" e outras indicam uma situação de falta,

alguma coisa a menos. Todos as frases acima referem-se à sexualidade da mulher. Se

ainda não estamos convencidas, vejamos essas falas corriqueiras. Em uma conversa sobrepessoas que não se conhece, em geral comenta-se da mulher se ela é bonita, se é linda, se

é bem tratada, referindo-se sempre aos atributos físicos (de beleza), quando muito se é

26 A LINGUAGEM, A SOCIEDADE E OS LIVROS DIDÁTICOS

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delicada e meiga; enquanto com relação ao homem é mais comum falar de sua inteligência,coragem, de seu corpo (viril, másculo), portanto atributos relacionados a suas atitudesativas diante da vida.

Portanto, pelos exemplos acima, podemos deduzir que a linguagem não é inocente, a

oposição de pares na língua não significa apenas oposição, principalmente quando se

refere ao campo que envolve o homem e que envolve a mulher A linguagem ancora-se

em um conjunto de símbolos que por sua vez regula, regulamenta, aprisiona as atuações

e atividades do homem e da mulher, bem como da natureza e da cultura. Daí vem a idéia

(que já está na linguagem) de que o homem é superior, ativo, racional, inteligente, tendo

capacidade para dominar as profissões e as ameaças da rua (do público), enquanto a

mulher voltada para a passividade, para a intuição e para a explicitação dos sentimentos -

amor, ternura, deve ser protegida de si e dos outros (seu domínio é a casa, os filhos afamília).

Os livros didáticos - permanência de atitudes e comportamento

Essa divisão da sociedade em ambiente público ("lugar de homem é na praça") e

ambiente doméstico ("lugar de mulher é na cozinha") vai se refletir e se repetir na escola,

desde as brincadeiras até os livros didáticos, que ensinam a ler e escrever. Portanto, ensinam

a língua e a divisão do mundo.

Sabemos que na atualidade, a professora, pela pouca remuneração, é obrigada a ter

mais de uma turma, sendo levada a tomar o livro didático como seu auxiliar na atuação

em classe. Sabemos que nem sempre esses livros se preocupam em mostrar outros

caminhos, além dos tradicionais, para a jovem, para a futura mulher.

Sendo assim, um exame apurado do que eles estão informando se faz necessário.

Muitos livros iniciais inauguram a primeira lição mostrando a família e a casa. Em

primeiro plano a mãe e o pai e os filhos; em segundo plano, os empregados (seja chofer,jardineiro, empregada ou cozinheira); os do primeiro plano, em geral, são brancos e os do

segundo, sempre negros.

Muito já se tem denunciado a reprodução da família nuclear (sempre com brancos

nos papéis de pai e mãe) e empregados negros nos livros didáticos. Uma criança negra ao

ler e querer se identificar dentro da sociedade, provavelmente, não se reconhecerá naquelagravura.

A figura da mãe sempre aparece nas "lições". Mas observe como ela é tratada. 0 texto

abaixo, evidencia o desrespeito para com a mãe, porém tratando-a como um único modelo.

A LINGUAGEM, A SOCIEDADE E OS LIVROS DIDÁTICOS 27

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A maneira como o papel de mãe é tratado, um papel homogêneo' e de pouco valor, fica

claro através desses trechos:

A mãe da gente é sempre muito alta. Conforme a

gente cresce ela vai diminuindo de tamanho. (...)

(...) de vez em quando faz regime e fica comendo

fora de hora o dia inteiro. (...)

Há mães de todas as cores e em todos os lugares

do mundo. Podem viver em qualquer clima, tanto

nas regiões geladas como [quanto] onde faz

muito calor. É como na cozinha, onde mexe na

geladeira e no forno do fogão.

No temperamento também são assim, passam de

um extremo a outro e mudam muito de opinião.

(...) Quando está em casa, a gente pode sempre

dispor dela, apesar de uma vez ou outra ela darum chega-pra-lá.

No livro de Ciências, tratando dos órgãos do sentido, a gravura inscreve oscompartimentos de uma casa. Observando os detalhes, percebe-se que a representação, tantoda mulher/menina quanto do homem/menino, perpetua papéis já delineados na sociedade.

A Mulher (papel de mãe) na cozinha, tirando o

bolo do forno. (seu papel de nutrir) A menina

sendo modelada para cuidar de uma criança,

apesar de estar brincando com um ursinho.

0 Homem (pai) cuidando do jardim e o

menino vendo televisão (exercitando seu

raciocínio. Note-se que na cama do menino está

um livro aberto!).

Os estereótipos estão tão bem regulados pela

linguagem que a maioria das pessoas falando, se

expressando nem percebe. Assim, as pessoas

(professores, pais, mães, diretores) reiteram certas

representações estereotipadas. Frases como as

que se seguem aparecem em livros do cursofundamental induzindo os estereótipos:

2 Zélia Almeida. 0 Jogo das Palavras. 2 ° ano. 5. ed. Belo Horizonte : Dimensão, 1992.

28 A LINGUAGEM, A SOCIEDADE E OS LIVROS DIDÁTICOS

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA...............................................................

* Meninas não entendem bem matemática nem ciências.

* Meninas são fracas, meninos são fortes.* Meninas são sensíveis, meninos são práticos.

* Meninas são dependentes e meninos independentes ou livres.

A linguagem que modela na infância estes estereótipos na sociedade, vai mais tarde

se refletir, também, na escolha das profissões. Um diagnóstico elaborado pela UNICEF/

FENAME sobre a desigualdade de profissões, conclui:

No mercado de trabalho, ao logo desses anos, a pressão da força de trabalho feminino

criou novos espaços. As mulheres ingressam em massa em atividades administrativas -

secretárias, telefonistas, recepcionistas - e no comércio. Na indústria, a trabalhadora

ingressa em ramos tradicionais, a exemplo do vestuário, alimentação. Nos últimos anos

tem ingressado em setores tais corno o elétrico e eletrônico, diversificando a sua

participação, embora sua presença seja mais intensa na do vestuário.

Nos últimos anos, apesar de trabalharem principalmente no setor informal da economia,

as mulheres também intensificaram sua presença no chamado setor formal do mercado de

trabalho, sobretudo na administração pública: metade dos empregos nesse setor, sãoocupados, atualmente, por elas [ mulheres] .

Portanto, o modelo permanece, criando uma desigualdade na distribuição de empregos

entre homens e mulheres no mercado de trabalho, consagrando certas profissões como

femininas e outras como masculinas. Será que a professora não está tendo um

comportamento que reforça as relações de poder entre os sexos?

Nem sempre a futura escolha profissional é feita de acordo com os gostos e as aptidões,

mas em relação ao sexo a que pertencem.

Para concluir, basta o estudo dos livros didáticos realizado por Zuleika Alambert:

"As discriminações aparecem das formas mais variadas: nas ilustrações, por exemplo,mulheres e meninas são minoria em relação a homens e meninos; os papéis atribuídos ao

sexo feminino são mais reduzidos e menos variados; os assuntos escolhidos geralmente

favorecem os meninos, as personagens principais são sempre masculinas, sejam elas seres

humanos ou animais; os meninos são mais ativos e as meninas mais contemplativas; as

meninas sempre aparecem em casa, ajudando a mãe nos serviços domésticos, enquanto os

meninos são mostrados fora de casa, ligados ao mundo do trabalho, fazendo consertos e

andando de moto, etc." (Alambert, 1990, p.26)

Esmeralda NEGRÃO, ao estudar outro tipo de linguagem, a visual, encontra a imagem

da mulher no livro escolar colada ao mesmo tipo de discurso:

A LINGUAGEM, A SOCIEDADE E OS LIVROS DIDÁTICOS 29

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"Os homens aparecem exercendo 136 profissões diferentes, enquanto as mulheres

exercem apenas 26, concentrando-se em ocupações manuais não-especializadas e não-

manuais de rotina e, sobretudo, em ocupações mais mal-remuneradas. Praticamente, apenas

a personagem masculina desempenha atividades como estudar, pensar, refletir, explorar.

O trabalho estabelece fronteiras entre os mundos masculino e feminino (...) quanto aos

papéis na família, o pai é apresentado nos livros didáticos como sendo o provedor material

por excelência, organizador do universo familiar, autoridade, com privilégios. A imagem

da mãe aparece predominantemente idealizada como abnegada e mártir, como `um misto

de fada, santa e rainha', arcando sozinha com todas as tarefas domésticas... O lazer infantil

também é segregado por sexo. O lazer infantil feminino se resume praticamente a auxiliar

em tarefas domésticas, é predominantemente passivo e interior. O lazer artístico e intelectual

é privilégio masculino." (Negrão, 1990, p.62-63)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, Zé]ia. 0 jogo das palavras. 2 ano. 5. ed. Belo Horizonte .Dimensão,

1992.

30 A LINGUAGEM, A SOCIEDADE E OS LIVROS DIDÁTICOS

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA

COMO IDENTIFICAR O SEXISMO

NOS LIVROS DE TEXTOS

COMO IDENTIFICAR 0 SEXISMO NOS LIVROS DE TEXTO 31

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA.......................................

Andrée Michel, com base em um estudo realizado em sete países (China, França,

Kauit, Noruega, Peru, República Socialista Soviética, Ucrânia e Zâmbia) referente a

imagem dos homens e das mulheres apresentadas nos livros escolares, nos diz:

O sexismo existe quando os textos e as ilustrações dos manuais

escolares e dos livros para crianças descrevem homens e mulheres,

meninos e meninas, em funções estereotipadas, que não refletem a

diversidade de papéis. A primeira manifestação do sexismo está no

fato de se negar a realidade social e a diversidade de situações, o

que chega até a dar uma apresentação caricatural das imagens e

dos papéis masculinos e femininos. Relativamente a este aspecto, há

unanimidade.

Pode-se igualmente falar em sexismo quando os manuais escolares

limitam-se a expor uma situação existente, sem criticá-la ou

apresentar alternativas. (...) isso eqüivale, de fato, a aceitar

implicitamente as desigualdades e as discriminações contra as

meninas e mulheres na maioria das sociedade atuais, havendo umatendência, inclusive, a reforça-Ias". '

Com base nesse trabalho de Michel2 propomos, a seguir, um quadro de análise que pode

ser utilizado por qualquer pessoa desejosa de identificar o sexismo em um livro.

Análise quantitativa do conteúdo:Comparar o número de personagens masculinas e femininas contidas nos títulos,

textos e ilustrações das obras para crianças e manuais escolares.

Essa análise pode ser aperfeiçoada distinguindo-se as personagens principais e as

secundárias.

Análise qualitativa do conteúdo:

Consiste em comparar de modo estatístico as características próprias das personagens

masculinas e femininas contidas nos títulos, textos e ilustrações das obras para

crianças e manuais escolares.

Para proceder essa análise deve-se levar em conta:

•3 Geralmente, a presença de uma característica estereotipada pode não ser

sinônimo de sexismo. Para que haja sexismo é necessário que ocorra repetição

de estereótipos;

' MICHEL Andrée. Não aos estereótipos . Vencer o sexismo nos livros para crianças e nos manuais escolares. São Paulo

UNESCO e Conselho Estadual da Condição Feminina, 1989.

2 Baseado no livro de Andrée Michel (op. cit.).

32 COMO IDENTIFICAR 0 SEXISMO NOS LIVROS DE TEXTO

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v A unidade de análise do sexismo está na personagem masculina ou feminina,

representada na forma humana ou animal do gênero masculino ou feminino.

• Análise do sexismo nas referências sociais das personagens masculinas e

femininas, tanto nos textos como nas ilustrações:

• Mulheres e homens aparecem diferentemente do ponto de vista do seu estatuto

matrimonial (por exemplo: mulheres casadas e homens solteiros pode levar à

idéia de que a mulher se identifica com o casamento e a identidade do homem

independe do estado civil);

• Identifica as personagens femininas apenas por seu estatuto familiar - mãe

- não acontecendo o mesmo com os personagens masculinos;

• As mulheres não aparecem no exercício de uma atividade profissional - Isso

significa uma tendência a fazer as crianças pensarem que o lugar da mulher é na

família;

• Quando as mulheres aparecem como profissionais são sempre em atividades

tradicionalmente , femininas (professoras, enfermeiras, costureiras, cabeleireiras) e

não em profissões de maior prestigio e autoridade;

• Análise do Sexismo nas atividades das personagens masculinas e femininas:

• Atividades domésticas - são sempre desempenhadas por mulheres;

• Atividades educativas para crianças - quando os homens aparecem são

sempre em ações que impliquem autoridade, orientação. Já as mulheres aparecem

cuidando da alimentação e higiene das crianças, mimando-as, consolando-as.

Isso leva a atribuir às mulheres o monopólio das relações afetivas com as

crianças;

• Atividades políticas e sociais - Só os homens aparecem como dirigentes,

políticos; isso reproduz a idéia de que as mulheres não exercem funções que

imp liquem autoridade e responsabilidade;• Atividades de lazer - Se as mulheres aparecem realizando atividades passivas

e de pouca criatividade e os homens em atividades ativas e criativas, esse é um

sintoma de sexismo;

• Análise do Sexismo no comportamento sócio-emotivo das personagensmasculinas e femininas:

• Afetividade positiva ou negativa - São sexistas os textos que descrevem

meninas e mulheres como afetuosas ou exprimindo uma afetividade excessiva

e os meninos e os homens como agressivos, briguentos, violentos, insensíveis;

COMO IDENTIFICAR 0 SEXISMO NOS LIVROS DE TEXTO 33

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• Resistir à pressão social - o sexismo se apresenta quando a independência e

a resistência em relação à pressão social caracterizam apenas um sexo;

• Fraqueza e força de caráter - essas categorias apresentadas através dos

comportamentos de medo, de angústia, de dependência, de impotência, de fuga,

enquanto a força de caráter significa bravura, sangue frio, aptidão para comandar

ou senso de responsabilidade. A distribuição da força ou da fraqueza de caráter

entre ambos os sexos pode ser determinante na identificação de sexismo;

Análise do sexismo gramatical:

Consiste em identificar a utilização do vocabulário e das regras gramaticaisaparentemente inofensivas:• Vocabulário - utilização abusiva do gênero masculino para designar homens e

mulheres que compõem a humanidade, tem como resultado a desvalorização e a

invisibilidade do sexo feminino, bem como profissões, funções;

• Gramática - a gramática muitas vezes determina palavras masculinas para definir

os dois sexos.

34 COMO IDENTIFICAR 0 SEXISMO NOS LIVROS DE TEXTO

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A HISTÓRIA DO BRASIL NO FEMININO

Para nós, mulheres, os livros de História do Brasil que lemos na escola deixam sempre

muito a desejar. Embora registrem eventos importantes do passado, prestem homenagem

aos heróis da pátria e descrevam as lutas que marcaram a história do nosso povo nesses

quase 500 anos de Brasil, contam-nos uma história pela metade. É que, na sua maioria,

esses livros nada falam sobre as mulheres brasileiras. Escrevem, assim, uma história apenas

no masculino, roubando-nos o nosso passado, nossas lutas, nossas conquistas.

Neste capítulo, portanto, vamos falar da História do Brasil no Feminino. Vamos

registrar, em especial, a importante participação das mulheres - indígenas, negras e brancas

- na formação do povo brasileiro, procurando mostrar que, se por um lado a situação da

mulher na nossa sociedade foi em grande parte a de sexo subordinado, por outro, não

foram poucos nossos momentos de rebeldia. De fato, veremos que nós mulheres temos

marcado presença nos vários movimentos populares travados ao longo da história do

país, tanto no campo como na cidade, e não só como meras espectadoras. Ao contrário,

atuamos ao lado dos homens, muitas vezes assumindo posições de liderança. Mais que

isto, veremos que nós, mulheres brasileiras, temos também uma longa história que é só

nossa - a história de nossas mobilizações enquanto mulheres na conquista de nossos direitos.

A Liberdade Perdida das Mulheres Indígenas

No ano de 1500, quando os descobridoresportugueses chegaram ao que mais tarde chamariam

de Brasil, aqui encontraram povos indígenas que

há muito já habitavam estas terras. Esses povos

viviam da caça e da coleta de frutos e raízes, não

sendo poucos os que já cultivavam a mandioca,

faziam beiju e farinha, teciam redes. Entre nossos

índios, homens e mulheres trabalhavam nas roças

lado a lado, cabendo às mulheres, então como aindahoje, o feitio da farinha, alimento básico dessa

população. Era um trabalho compartilhado por todas

as mulheres de um grupo familiar, tão valorizado quanto o desempenhado pelos homens.

A terra era de todos e trabalhada igualmente por todos, apenas para dar sustento às

famílias. E, o que é mais importante: entre os povos indígenas, as mulheres não eram

seres submissos nem subordinados. Ao contrário, elas compartilhavam junto com os

A HISTÓRIA DO BRASIL NO FEMININO 35

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homens das decisões do grupo, não estando à mercê dos mandos, desmandos e caprichos

de seus pais, irmãos e maridos.

Com a chegada dos colonizadores portugueses, porém, tudo isso iria mudar. A terra

que antes era de todos, foi dividida em grandes propriedades chamadas `sesmarias', doadas

pelo Rei de Portugal a nobres do reino, que seriam denominados de `donatários'. Como

esse nome indicava, eles se tornariam os primeiros `donos da terra' no Brasil. E logo

começariam a expulsar os índios de suas propriedades ou, o que era pior, tentariam

'domesticá-los' à força, obrigando-os a trabalhar para eles.

A situação das mulheres indígenas também mudaria para pior. Muitas foram estupradas

e abandonadas a sua sorte, outras arrancadas das suas comunidades para serem prostituídas,

ou para servirem de `esposas obedientes e submissas' aos colonizadores, perdendo assim

sua liberdade. Até mesmo nos aldeamentos, onde os índios da costa eram colocados sob

a proteção dos padres jesuítas, as mulheres não estavam a salvo. Seguindo os costumes de

Portugal na época, esperava-se que elas se tornassem obedientes a seus irmãos e maridos,

e que não tomassem parte nas decisões da comunidade. Não era, pois, à toa que muitas

tentavam escapar dessa situação fugindo para o mato, Também não foram poucas as que

acabaram participando, junto com seus companheiros, de ataques aos povoados decolonizadores.

De um modo geral, entretanto, índios e índias não conseguiram resistir à força de

ferro da colonização. Acostumados à liberdade, centenas deles não sobreviveram ao

trabalho forçado. Outras centenas (ou mesmo milhares) morreram vitimados por doenças

trazidas pelos colonizadores. Os que conseguiram escapar, embrenharam-se mata a dentro.

Hoje, restam poucos povos indígenas no Brasil. A maioria vive na pobreza, e muitas de

suas mulheres e filhas continuam a ser prostituídas nas mãos de homens brancos.

Nos últimos anos, porém, as mulheres indígenas começaram

a se mobilizar. No ano passado (1998), houve um Encontro de

Mulheres Indígenas, do qual participaram mulheres das

comunidade indígenas de muitas partes do Brasil.

Escravidão e Rebeldia das Mulheres Negras

As dificuldades encontradas em `domesticar' nossos índios

levaram os colonizadores a buscarem outro tipo de mão-de-

obra para trabalhar nas lavouras e engenhos de cana-de-açúcar.Começaram assim a trazer grandes levas de escravos negros da

África - homens, mulheres e crianças - muitos deles roubados

36 A HISTÓRIA DO BRASIL NO FEMININO

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• PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA.... . .

de suas comunidades natais, onde antes eram "livres". Estes negros eram acorrentados

e trazidos para o Brasil em grandes navios, chamados de "navios negreiros", numa

longa viagem que levava mais de um mês. Apinhados nos porões desses navios junto

a ratos, sem a menor condição de higiene e sofrendo com o calor intenso e com o

balanço do navio, muitos não resistiam à travessia. Morriam ali mesmo e seus corpos

eram atirados ao mar.

Aqueles que sobreviviam à viagem da África para o Brasil não tinham sorte muito

melhor. Eram levados para as praças públicas e ali vendidos a senhores diferentes. As

mulheres eram assim separadas de seus filhos e companheiros, algumas sendo levadas

para trabalhar na lavoura e nos engenhos, vivendo em grandes barracões (as

"senzalas"), e trabalhando de sol a sol sob a força de chicotes. Outras, eram compradas

para trabalhar nas "casas-grandes" como domésticas, sendo obrigadas a servir aos

senhores e suas famílias em todos seus caprichos. Nenhuma delas, aliás, estava livre

dos maus tratos e violência de seus senhores. Como escravas, elas eram propriedade

desses senhores, que freqüentemente as estupravam e espancavam, podendo até mesmo

mandá-las para a morte.

Por certo, negros e negras escravizados se rebelavam contra tal situação. Muitos fugiam

para o mato, onde eram perseguidos e trazidos de volta a seus senhores para serem punidos.

Mas vários grupos de escravos foragidos conseguiram permanecer escondidos, vivendo

em comunidades por eles formadas conhecidas por "quilombos". No mais famoso desses

quilombos, o Quilombo de Palmares em Pernambuco, os escravos conseguiram resistir

aos constante ataques de brancos contra eles por mais de 100 anos. Dentre eles, havia

muitas mulheres que não hesitavam em pegar em armas na defesa de Palmares.

Houve, também, casos nos quais as mulheres se tornaram líderes de quilombos. Este foi o

caso do Quilombo de Quariterê, no Estado do Mato Grosso, onde viveram 79 negros por mais

de vinte anos produzindo algodão e tecidos, liderados pela negra Tereza, africana de Angola.

As mulheres negras atuaram também nas muitas revoltas e levantes de escravos que

aconteceram tanto no campo quanto nas cidades. Dentre elas, é importante destacar as

escravas Felicidade, Germana, Ludovica e Tereza, que participaram ativamente da Revolta

das Armações de Pesca em Tapoan, na Bahia, em 1814. Ao lado delas, lutou também a

negra alforriada Francisca, que acabou sendo presa e mandada de volta para a África.

Em 1826, aconteceu o Levante do Quilombo de Urubu, localizado perto de Salvador,

revolta esta que foi comandada pela escrava Zeferina. E, em 1835, deu-se a famosa Revolta

dos Males em Salvador, que contou com a participação de muitas mulheres negras, escravas

e libertas, dentre as quais destacou-se Gêge Luísa Mahim.

A HISTÓRIA DO BRASIL NO FEMININO 37

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Não podemos esquecer, também , que muitas mulheres

dentre a população livre participaram na luta contra a

escravidão. A mais conhecida delas é a compositora carioca,

Chiquinha Gonzaga. Mas havia muitas outras que atuaram

nessa luta por todo o país, tais como as santistas Francisca

Amália de Assis Faria e Anna Benvinda Ribeiro de Andrada,

a cearense Maria Thomásia , e a escritora Narcisa Amália.

Sabemos, porém, que embora a escravidão no Brasil tenha sido abolida em 13 de

maio de 1888, isto é, há mais de 100 anos, a situação dos negros na nossa sociedade ainda

é a de um povo oprimido. Mas esta situação é ainda pior no caso das mulheres negras: são

elas que têm os piores empregos e representam o maior número de mulheres desempregadas,ganhando os menores salários, tendo pouco acesso à educação e estando à frente da grande

maioria das famílias brasileiras chefiadas por mulheres. Elas são as mais pobres entre

pobres. Por isso mesmo, as mulheres negras não só têm participado ativamente dos

Movimentos Negros que vêm surgindo em diferentes partes do país, mas também têm-se

mobilizado em Grupos e Movimentos específicos de Mulheres Negras.

A Subordinação da Mulher na Família

Embora não se possa negar que as mulheres brancas sempre tiveram uma situaçãomelhor do que as índias e negras, de um modo geral, a condição feminina no Brasil por

quase toda a nossa história, foi de inferioridade em relação aos homens. Na verdade, atépouco tempo atrás, todo o poder na família esteve na mão dos homens, cabendo às mulheres

um papel de dependência e subordinação, mesmo entre as classes mais privilegiadas.

Durante toda a era colonial, nem mesmo as mulheres das elites tiveram direito à

educação. Além disso, elas não podiam sair às ruas sozinhas, nem aparecer em público

com a cabeça descoberta. Ficavam confinadas dentro de casa, tendo como função principal

dar filhos a seus maridos e administrar as atividades domésticas. Filhas eram obrigadas a

casar com quem fosse da escolha do pai, a quem deviam total obediência. Casando-se,

ficavam sob a autoridade dos maridos. E, caso "manchassem a honra da família", o pai ou

o marido tinham autorização legal para puni-Ias, deserdando-as ou até mesmo tirando-

lhes a vida, em nome da "legítima defesa da honra". Aquelas que se rebelavam, ou para as

quais não eram encontrados maridos adequados, eram mandadas para os conventos. Para

muitas, aliás, entrar no convento era uma forma de libertação do poder de pais e maridos.

Na verdade, as mulheres das camadas pobres, seja no campo como na cidade, tinhammais liberdade do que as mais ricas. No entanto, muitas eram abandonadas por seus

companheiros, sendo obrigadas a criar seus filhos sozinhas. Isso as obrigava a buscar

38 A HISTÓRIA DO BRASIL NO FEMININO

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formas de sustento próprio, não sendo poucas as mulheres que cultivavam hortas e tinham

criatórios de porcos e galinhas, vendendo os produtos nas feiras. Em cidades como São

Paulo, Rio de Janeiro e Salvador, muitas mulheres estiveram no comando de padarias. Era,

portanto, de esperar que elas se fizessem presentes em levantes contra o custo da farinha e

contra o custo de vida em geral. Como responsáveis por suas famílias, as mulheres tinham

que sair às ruas levando o seu protesto, lutando para garantir melhores condições de vida.

Sabe-se, também, que em Salvador, não foram poucas as manifestações de protestos

de mulheres lavadeiras e aguadeiras, pelo direito ao acesso às bicas d' águas, quando estas

eram a única fonte de abastecimento de água da cidade.

As Mulheres nos Movimentos Sociais

Pelo o que vimos até agora, os 500 anos de Brasil que estamos prestes a comemorar

foram marcados por muitas lutas e movimentos. Em quase todos eles, as mulheres estiveram

presentes. Participaram, inclusive, de movimentos de libertação nacional, como a

Confederação do Equador, em 1817, movimento pela independência do Brasil, no qual se

destacaram Barbara de Alencar e Ana Lins. Na Bahia, tem-se a figura de Maria Quitéria,

que se vestiu de homem para lutar pela independência, e antes dela, a religiosa Joana

Angélica, que se destacou pela defesa de Salvador contra a invasão dos holandeses.

Não podemos esquecer, também, as lutas que, no passado, foram travadas no campo.

Em particular, devemos registrar a grande presença de mulheres em Canudos, no interior da

Bahia, que lutaram ao lado de Antonio Conselheiro defendendo seu povo contra os ataques

brutais do exército contra a comunidade livre que criaram. Centenas dessas mulheres

morreram massacradas junto a seus companheiros na batalha final do exército contra Canudos.

Igualmente importante foi, e tem sido, a participação de mulheres nas lutas trabalhistas,e com muita razão. Sabemos que por volta de 1860, quando começaram a surgir as primeiras

fábricas no país, a mão-de-obra preferida era a de mulheres e crianças. Elas trabalhavam

uma longa jornada de trabalho em locais abafados, sofriam com o barulho das máquinas

e com maus tratos, eram abusadas sexualmente pelos chefes e, em troca, recebiam salários

bem inferiores aos dos homens. Além do mais, não tinham garantias trabalhistas, não

tinham férias nem aposentadoria, e podiam ser despedidas a qualquer momento.

Para conseguir melhores condições de trabalho, as mulheres fizeram muitas greves.

Tem-se notícia de que em 1901, por exemplo, setecentas trabalhadoras de uma fábrica de

tecidos em São Paulo pararam suas máquinas e fizerem piquetes contra o rebaixamento

de salários e as violências sexuais de que eram vítimas. No ano seguinte (1902) outras

trezentas operárias, também em São Paulo, organizaram uma greve de protesto contra os

A HISTÓRIA DO BRASIL NO FEMININO 39

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maus tratos sofridos na fábrica em que trabalhavam. Desde

então, seguiram-se muitas outras greves das quais as

operárias participaram, até que direitos trabalhistas, tais

como jornada de trabalho de 8 horas, direito a

aposentadoria e férias, dentre outros, fossem garantidos.

Mulheres trabalhadoras em diferentes ocupações têm-

se organizado também para lutar por direitos no trabalho

específico às mulheres: salário igual para trabalho igual,

licença maternidade, creches, tempo para amamentação dos

filhos, etc. Desde os anos 50, diferentes categorias de

mulheres trabalhadoras têm-se reunido em encontros

estaduais, regionais e nacionais. A partir dos anos 80,

aconteceram muitos desses encontros, dentre eles, o Primeiro Congresso Nacional da Mulher

Trabalhadora, realizado em São Paulo, em 1986, quando trabalhadoras de todo o Brasil se reuniram.No mesmo ano, em Brasília, aconteceu também o Primeiro Congresso Nacional de Mulheres

Rurais, que contou com a presença de mulheres atuantes em sindicatos rurais de todo o país.

É importante lembrar aqui que as trabalhadores rurais têm-se destacado por um alto

nível de mobilização. Elas estão presentes e muitas vezes à frente das mobilizações na

demanda pela terra, trabalho e incentivos agrícolas.

Mulheres trabalhadoras, ao lado de donas-de-casa, têm participado, também, dos

muitos movimentos contra a carestia por toda a nossa história. A alta do custo de vida nos

anos 50, por exemplo, levou muitas mulheres às ruas contra a fome e a carestia. 0 mesmo

aconteceu nos anos 60, 70 e 80, estando as mulheres presentes também em outros

movimentos sociais que pipocaram no país nesse período. Dignos de nota, são os

movimentos de bairros na luta por melhores condições de moradia, nos quais as mulheres

têm sempre estado no comando.

Mulheres Organizadas por Seus Direitos

Porque vivemos numa sociedade dominada pelos homens, nada nos foi dado de mão

beijada. Ao contrário, para conquistar nossos direitos, nós mulheres sempre tivemos que

nos organizar e lutar pelo que nos é devido. Essas mobilizações têm sido lideradas pelos

Movimentos Feministas, e não só no Brasil. No mundo todo, os movimentos feministas

têm lutado pela igualdade de direitos entre homens e mulheres, para acabar com a violência

contra mulheres, por creches, pelo nosso direito sobre nossos corpos. Ser feminista éacreditar que as mulheres devem ter os mesmos direitos que os homens, lutar para isso, e

para melhorar a condição feminina.

40 A HISTÓRIA DO BRASIL NO FEMININO

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No Brasil, o movimento feminista tem um longa história, de mais de 150 anos.

Começou no século passado, com a luta pelo direito das mulheres à educação. No passado,

entretanto, nem sempre pudemos sair às ruas para expressar essas demandas. Assim foi

no caso da luta pelo nosso Direito à Educação. Ela aconteceu através de cartas e artigos

escritos por mulheres em jornais e revistas. Antes, as mulheres brasileiras só tinham direito

ao curso primário, só conseguindo, muito mais tarde, o direito de fazer o que chamamos

de "magistério". Mas foi só neste século que conseguimos chegar aos cursos superiores,

isto é, cursar as universidades.

A conquista ao Direito ao Voto foi também uma longa

luta das feministas. Ela foi iniciada na segunda metade do

século passado, através dos vários jornais femininos existentes

na época, e estendeu-se até 1932, quando as mulheres

finalmente puderam exercer o direito de votar e ser eleita.

Nessa luta, teve papel importante a Federação Brasileira para

o Progresso Feminino (a FBPF), criada em 1922 e liderada

por Bertha Lutz.

Embora o sentimento feminista não tenha nunca morrido, foi só nos anos 70 que que

ele começou a surgir outra vez no Brasil com maior força. Uma das principais questões

que trouxe as mulheres às ruas foi a luta contra a violência sofrida pelas mulheres,

principalmente nas mãos de seus companheiros, a chamada violência doméstica. Desse

protesto, surgiram as Delegacias Especiais de Proteção à Mulher, onde são hoje registrados,

diariamente, casos de estupros, espancamentos, maus tratos, e outros tipos de violência

contra as mulheres. É preciso denunciar casos de violência contra a mulher ou criança,

pois isso é crime, que deve ser punido.

Na Bahia, vários municípios já tem uma Delegacia Especial de Proteção à Mulher.

Nossa Constituição Estadual, promulgada em 1989, estabelece no Capítulo Especial que

trata dos direitos das mulheres, que todo município com população superior a 50 mil

habitantes têm direito a criar uma Delegacia da Mulher.

Outra reivindicação importante levada a frente pelas feministas é a demanda por creches,

pois é preciso dar às mulheres trabalhadoras condições de trabalhar, assegurando um lugar

decente para poderem deixar seus filhos durante o horário de trabalho. As mulheres, através

dos Movimentos Feministas, lutaram e conquistaram, também, a licença maternidade de

120 dias, a garantia do emprego para a mulher grávida, melhores condições de trabalho para

a mulher-mãe. Ao mesmo tempo, lutaram e seguem lutando pelo direito das mulheres de

decidirem se querem ou não ter filhos, e terem acesso a meios de evitar a gravidez.

A HISTÓRIA DO BRASIL NO FEMININO 41

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PROGRAMA DE SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES PARA UMA EDUCAÇÃO NÃO DISCRIMINADORA.............................................................

Em 1986 e 87, quando se estava fazendo uma Nova Constituição para o país, mulheres

de todo o Brasil se mobilizaram para fazer valer nossos direitos. Conseguiu-se, assim,

garantir na Constituição Federal de 1988, uma série de direitos importantes para as

mulheres:

• Licença maternidade, sem prejuízo do emprego e salário, com duração de 120 dias;

• Licença paternidade de uma semana;

• Direito de amamentação dos filhos para as presidiárias;• Proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos;

• Assistência gratuita aos filhos e dependentes até os seis anos de idade em creches e

pré-escolas;

• Direitos trabalhistas para os trabalhadores domésticos (salário mínimo, décimo terceiro

salário, repouso semanal, férias anuais, licença à gestante, aviso prévio, etc);• Reconhecimento da união estável entre homem e mulher como entidade familiar;

• Planejamento familiar como livre decisão do casal;

• Direitos e deveres iguais para homens e mulheres no casamento e na família;

• Igualdade de direitos e obrigações para homens e mulheres como cidadãos;

• Proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão

por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;

• Título de domínio e de uso da propriedade da terra para homens e mulheres,

independentemente do estado civil.

Hoje, pelo menos no papel, homens e mulheres brasileiras têm direitos iguais. Mas

tudo isso foi conquista nossa; é do nosso interesse garantir que esses direitos sejam

cumpridos, mantendo-nos mobilizadas e atentas para fazer valer a lei.

Na Bahia, as mulheres organizadas através do Forum de Mulheres de Salvador, entidade

que articula os mais variados grupos e associações de mulheres do Município, conseguiramgarantir importantes direitos para nós mulheres na Constituição Estadual de 1989 em um

Capítulo Especial que só trata dos direitos das mulheres.

42 A HISTÓRIA DO BRASIL NO FEMININO

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TÉCNICAS DE DINÂMICA DE GRUPO NA

PERSPECTIVA DE GÊNERO '

' Organização e seleção de Patrícia Vergasta e Lucimeire Passos

TÉCNICA DE DINÂMICA DE GRUPO NA PERSPECTIVA DE GÊNERO 43

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Como suporte de apoio na tarefa de repasse do conteúdo do curso sobre gênero para

sua turma, separamos algumas Técnicas de Dinâmica de Grupo que poderão auxiliar neste

trabalho.

Vale lembrar que vocês estão trabalhando com conceitos novos e com mudança de

mentalidade e isto é um processo "lento e gradual" de internalização. Para trabalhar com esse

novo tema, é preciso ser cauteloso e utilizar muito da criatividade e espontaneidade.

1. Bazar de Trocas

Objetivos:

• Trabalhar os papéis de gênero.

Material necessário:

• Pedaços de papel;

• Caneta;

• Hidrocor;

• Cartolina ou quadro-negro.

Condução:1. Divide-se o grupo em dois subgrupos - um de meninas e outro de meninos - e pede a cada

um que escreva o maior número de coisas que pertencem ao mundo do outro.

2. 0 grupo de meninas vai vender tudo que se refere ao mundo dos meninos e vice-versa.

Nota: Deve-se montar dois cartazes com as fichas de coisas vendidas, uma de homem

e outra de mulher, e um terceiro cartaz com o que não vendeu.

3. Refletir com o grupo o conteúdo vivenciado.

Sugestões Para Reflexão:

• Refletir sobre os cartazes;

• Refletir sobre as coisas vendidas;

• Refletir sobre o porquê da diferenciação das coisas pertencentes ao mundo do outro;

2. Vivenciando Mundo

Objetivo:

• Trabalhar os papéis de gênero.

Material Necessário:• Cartolina;• Tarjetas com frases, previamente escritas;

• Pincel atômico.

44 TÉCNICA DE DINÂMICA DE GRUPO NA PERSPECTIVA DE GÊNERO

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Condução:

1. Forma-se subgrupos com, aproximadamente, 4 crianças;

2. Coloca-se no chão cartazes com os temas:

• Lavar pratos;

• Consertar cerca;

• Cozinhar comida;

• Cuidar dos filhos;

• Trazer dinheiro para casa;• Matricular filhos nas escolas;

• Passar roupa, etc.3. Coloca-se uma cartolina em branco para que o grupo possa sugerir outros temas.

4. Instruir o grupo para que a partir destas palavras do dia-a-dia, subgrupos construam

algo criativo para apresentar à turma. As crianças devem se basear em experiências

vivenciadas em casa.

3. O Que é Ser Mulher?

Objetivo:• Possibilitar a reflexão sobre o papel da mulher na sociedade.

Material Necessário:• Papel metro ou cartolina;

• Tesouras;

• Cola;

• Revistas;

Condução:1. Divide-se o grupo em subgrupos com, aproximadamente, 5 pessoas;

2. Faz-se o seguinte questionamento: Como a mulher é vista na sociedade brasileira?

3. Quando o grupo chegar a uma conclusão, deve expressá-la através de uma colagem;

4. Em seguida, o grupo expõe o conteúdo discutido;

5. 0 facilitador encerra o exercício fazendo uma reflexão sobre o conteúdo vivenciado.

4. A Minha Heroína

Objetivos:• Sensibilizar o grupo para a importância da referência feminina na sociedade;

• Aquecer o grupo para iniciar um trabalho com enfoque de gênero.

Material Necessário:• Quadro-negro e giz ou papel metro e pincel atômico.

TÉCNICA DE DINÂMICA DE GRUPO NA PERSPECTIVA DE GÊNERO 45

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Condução:

1. A facilitadora solicita que cada pessoa do grupo pense no nome de uma mulher muito

importante ou que tenha uma história que sirva como exemplo em sua vida;

2. Em seguida , pede - se que cada componente fale sobre esta mulher, citando suas

características ; o facilitador deve listar todas as características;

3. Abre -se a discussão, destacando que as qualidades citadas sirvam de exemplo para as

atividades do cotidiano de cada um.

5 O Que Isso Significa Para Mim

Objetivos:• Propiciar ao grupo a oportunidade de seus membros falarem um pouco sobre a sua

visão de mundo;• Avaliar a compreensão que os alunos têm sobre a importância do homem e da mulher

na sociedade.• Sensibilizar o grupo para importância da equidade entre homens e mulheres.

Material Necessário:• Tarjetas de papel, previamente preparadas com as seguintes palavras: cozinha, futebol,

brincadeiras, bonecas, carinho, música, festa, etc.

Condução:1. Divide-se o grupo em subgrupos com, aproximadamente, 4 pessoas;2. Solicita-se que um representante por grupo pegue uma tarjeta, cuja palavra deve estar

para baixo;3. Pede-se que cada grupo discuta sobre a palavra sorteada, destacando se a mesma está

relacionada ao homem ou à mulher;

4. Cada subgrupo deve apresentar suas conclusões;

5. 0 facilitador encerra a discussão tecendo comentários sobre a importância doreconhecimento das atividades masculinas e femininas e a necessidade de unir forças

para a construção de um mundo melhor.

6. A Minha Família

Objetivos:• Propiciar uma reflexão sobre as qualidade de cada membro da família;

• Sensibilizar o grupo para a importância da representação do masculino e do feminino;

Material Necessário:• Massa de modelar ou massa de farinha de trigo

• Quadro-negro e giz ou papel metro e pincel atômico.

46 TÉCNICA DE DINÂMICA DE GRUPO NA PERSPECTIVA DE GÊNERO

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Condução:

1. Com a massa de modelar cada aluno deverá fazer sua família;

2. Sugere-se que, em seguida, sejam explicitadas qualidades de cada membro da família;

o facilitador deve listar as qualidades, identificando o sexo masculino e feminino;3. Após as apresentações, o facilitador deve identificar para o grupo as características

semelhantes entre homens e mulheres, destacando que as características citadas não

possuem sexo, que são universais e que o dever de cada cidadão é divulgar que os

seres humanos são importantes, independentes da sua posição social, da sua cor, do

seu sexo, etc.

TÉCNICA DE DINÂMICA DE GRUPO NA PERSPECTIVA DE GÊNERO 47

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