Ecumenismo, Adrião Bernardes

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ADRIÃO BERNARDES ECUMENISMO

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ADRIÃO BERNARDES

ECUMENISMO

1967

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EXPLICAÇÃO E DEDICATÓRIA

Em 17 de agosto de 1966, quando pronunciava um discurso, na Câmara dos Deputados, mereci a honra de um aparte do meu eminente amigo, o nobre Deputado Carvalho Sobrinho, convocando-me para a tese integral do meu discurso, ou seja, aderir ao ecumenismo, “numa visão ampla e fecunda que só pode existir através da tese ecumênica, que preconiza todos os rebanhos e um só pastor”, dada a tese sociológica e filosófica que eu estava defendendo. No momento só me coube esboçar um sorriso de satisfação pela sua oportuna intervenção e afirmar-lhe que em momento mais oportuno dar-lhe- -ia as razoes de consciência e foro íntimo para divergir de S. Exa.

Não fui reeleito e valho-me agora deste panfleto para dizer-lhe que não me atrevo a colocar a religião no mesmo plano da sociologia e da filosofia. Creio na Revelação Divina. Se Deus nos deu a Revelação, não a posso melhorar e menos ainda mutilá-la. Noutras palavras, a religião revelada não pode ser modificada, alterada e mutilada pelos homens. Pertence à jurisdição divina. Só Deus poderá modificá-la e,

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dado o seu caráter, não creio que queira fazê-lo, para adaptá-la ao século presente, tão desviado da verdade e da virtude.

Por exemplo, segundo a Religião Revelada, o Pas-tor único é Cristo. É o nosso Pastor. Não temos nem queremos outro, pois só Ele nos satisfaz plenamente. Toda união verdadeira terá de ser feita sob sua direção. Não tem nem pode ter substituto. Discutindo fatos e planos sociológicos e filosóficos, desço ao terreno humano e apresento meus pontos de vista. Não os tenho, porém, para modificar a Religião Revelada, no sentido de dar-lhe rumo puramente humano. A Religião é um terreno sagrado e inviolável e só me cabe obede-cer e não traçar-lhe rumo e adaptá-la ao gosto de cada época. Isto não significa que a religião seja estática. Absolutamente, não; é dinâmica por excelência, mas todo seu desenvolvimento é no âmbito moral e espiritual, dentro dos princípios e planos já traçados por Deus na sua Palavra Revelada. Só não faz esta distinção, quem descrê na Revelação Divina, ou então já se julga capaz de corrigi-la e adaptá-la ao século. Será, então, revelação sui generis, sujeita à vaidade e à falha compreensão dos homens. Deus ficará dependente do que os homens quiserem que Ele seja. Bem

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gostaria de ver a humanidade toda dentro do Cristianismo, tendo Cristo como Pastor Único. Como consegui-lo, a troco de acomodações, barganhas e compromissos? Dentro dos princípios divinos, exarados nas Escrituras, será possível firmar-se o verdadeiro ecumenismo, fora deles tudo será fictício e só servirá para enfraquecer os laços religiosos e morais. Este, prezado amigo Dr. Carvalho Sobrinho, é o ponto de vista do seu aparteado de ontem, sempre seu amigo e admirador de sua cultura.

Dedico, pois, as despretensiosas considerações aqui apresentadas ao meu ilustre amigo Dr. Carvalho Sobrinho, que me proporcionou não só a honra do seu aparte, mas a oportunidade para esclarecer o público sobre o que entendo ser a posição correta de um cristão evangélico batista.

Brasília, 28 de abril de 1967

Adrião Bernardes

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E C U M E N I S M O

Apoc. 2:1-7

Preliminarmente, desejo fazer rápido bosquejo na história dos batistas, a fim de, mais convenientemente, dirigir o meu apelo aos de minha grei.Quanto à origem dos batistas, só podemos afirmar que o Fundador é Cristo, o Filho de Deus. Os batistas nasceram dos seus ensinamentos e não reconhecem qualquer autoridade além de Jesus e do seu Evangelho. Antes que houvesse Papa, os batistas já existiam; antes de Lutero nascer, já os batistas viviam. Os nomes registrados na História constituem assunto secundário, pois os batistas dão mais valor e ênfase aos princípios e não aos apelidos que lhes queiram dar. Se confundem hoje batistas com “protestantes”, aceitamos o título com muita honra, mas continuamos batistas no tocante aos princípios. Havia democratas no mundo, mas, historicamente, Thomas Jefferson foi o Fundador do Partido Democrático. No sentido de Denominação Batista, talvez tenhamos começado com John Smith, em 1608. Os batistas

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não estão interessados em apresentar sucessão ininterrupta, a não ser a de princípios. Estes são tão velhos quanto a pregação de João, o Batista, Jesus e os Apóstolos. O batismo só de pessoas crentes, lealdade às Escrituras como autoridade final em matéria de Religião; a independência da igreja local; a absoluta separação entre a Igreja e o Estado; o batismo por imersão são princípios mantidos pelos batistas desde o nascimento do Cristianismo, posto que nem sempre fossem chamados pelo nome atual. O fato é que sempre se distinguem por estes princípios e, por isto mesmo, jamais se fizeram instrumentos de perseguição, mas foram sempre perseguidos. Suas igrejas locais e autônomas não podem apresentar a sucessão histórica das organizações humanas.

Os batistas, hoje, são sucessores credenciados dos anabatistas e dos valdenses pela união de princípios e não pelo nome. Pedro Waldo, de Lyon, e seus companheiros, por terem dado as Escrituras ao povo em sua própria língua, foram tachados de heréticos, banidos de Roma e perseguidos barbaramente. Alguns dos seus evangelistas fugiram para a Suíça e para a Alemanha, onde foram influenciados pelos anabatistas (rebatiza- dores). Rejeitavam o

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batismo infantil e sofreram por isto as perseguições mais atrozes. O próprio Lutero os condenou na Alemanha (1525), ordenando que fossem massacrados sem misericórdia. Posto que Lutero houvesse deixado a igreja romana, sentia-se ainda atrelado à carruagem do Estado. Os anabatistas não admitiam tal união. Princípio batista. Cremos mesmo que o amor que despreza o princípio e ameaça substituí-lo por falsa liberdade é ineficaz e indigno.

Na Suíça, os anabatistas traduziram o Velho Testamento na língua alemã, antes que Lutero o fizesse. Devido às perseguições, da Suíça foram para Morávia e Polônia.Menno Simons, sacerdote romano que abandonou a igreja, ensinava que somente as Escrituras eram a regra de fé e prática em matéria de religião, que o batismo era privilégio de pessoas crentes, que a religião deve estar separada do Estado, que a disciplina eclesiástica devia ser rigorosamente obedecida no negócio, na família e em toda a conduta pessoal. Se não atendia ao nome de batista, sabemos que ensinava os mesmos princípios que os batistas têm sempre defendido.

Por sustentar estes princípios, sofreram as mais terríveis perseguições. João Boucher foi queimado vivo, em 1550, durante o reinado de

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James. Wrightman teve a mesma sorte em 1611. Com e por meio do seu testemunho, plantaram na Inglaterra o amor à liberdade. É dívida que os ingleses jamais pagarão aos batistas.Dado o seu amor à liberdade, os batistas logo se uniram a Cromwell, e já antes haviam favorecido a Revolta dos Camponeses. Na guarnição irlandesa do Protetor, em 1655, havia doze governadores batistas, dez coronéis, dez majores e 43 oficiais. Uma filha de Cromwell casou-se com o Cel. Fleetwoodf, batista. Mais tarde, opuseram-se a Cromwell, quando ele chegou ao poder e mostrou-se apático diante da perseguição movida pelos presbiterianos. Foi nessa época que o grande poeta batista, Milton, foi encarcerado. Isto indica que os batistas sempre lutaram por princípios e não por homens. Esta sua lealdade aos princípios enriqueceu a Inglaterra com grandes homens. Os batistas deram-lhe ainda bons soldados para sua Revolução, além de vultos extraordinários do porte de Milton (Paraíso Perdido); Bunyan, o prisioneiro de Bedford (Peregrino); Daniel Defoe com o seu “Robínson Cruso”; Alexandre Maclaren, João Clifford, Robert Hall e o incomparável pregador Spurgeon. Temos ainda Andrew Fuller, líder da formação da Sociedade Missionária dos Batistas Ingleses, Willliam Carey,

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o fundador das missões modernas e Roger Williams que fez mais pelos Estados Unidos do que uma dúzia de Presidentes. Apesar de tudo isto, mesmo nos Estados Unidos, os batistas sofre-ram terríveis perseguições, posto que tanto tivessem contribuído na formação de sua Constituição liberal e democrática.

A crise doutrinária e a frouxidão moral predita para os últimos tempos batem à porta dos batistas, hoje, no mundo inteiro. Provar-nos-emos dignos dos nossos antepassados, de modo a enfrentar a onda criada pela apostasia, com a mesma coragem e convicção que nossos companheiros demonstraram no passado, ou vamos descer na enxurrada desse liberalismo canhestro que busca insinuar-se nas nossas hostes? Com os batistas brasileiros fica a resposta.

Vivemos num mundo envolto em confusão e desordem moral e espiritual. É confusão que ameaça todas as fases da vida humana, no mundo inteiro. Assunto tão sério e grave como o da salvação das almas é tratado com leviandade, firmada em concepção vazia e superficial. Para muitos, basta ligar-se à congregação. O sangue de Cristo nada vale. É símbolo apenas para os tais. Os milagres da Bíblia são meras ficções para os renomados liberais. Mitos apenas. Confundem

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logo igreja com Reino. Daí as manipulações desassisadas com a verdade bíblica. As igrejas são meros agentes do Reino aqui na terra. Não são o Reino que homem algum poderá fundar e dirigir. O Reino é um só; as igrejas são muitas. Firmados no erro, então, tentam unir as igrejas num só corpo para simular o Reino. É rumo certo da perversão das Escrituras para dar largas à imaginação e pôr em evidência a sabedoria, a eru-dição e a inspiração de homens inchados de saber. Querem ser rei.

Imaginam que, se há só um Reino, deve haver uma só igreja. Não compreendem porque não querem compreender a singularidade do Reino e a pluralidade de igrejas. Basta ler I Cor. 1:2; Gal. 1:2. Como colocar aí a palavra reino? É eclesiastiquíssimo que pretende destruir as igrejas descritas no Novo Testamento, tirando lhes a autonomia local. Semelhante manipulação dos ensinamentos cristãos não pode ser aceita pelos batistas que sempre se bateram pela autoridade da igreja local e pela fidelidade aos ensinamentos das Escrituras Sagradas. É inútil apresentar a isca que as igrejas não perderão a autonomia. O batista é peixe grande que não se deixa fisgar tão facilmente. Se fosse verdade, para que a mudança pretendida?

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O que vemos é a tentativa para destruir a identidade das igrejas do Novo Testamento. É o esforço para tirar o prestígio da igreja local e acender a vaidade de ser membro da chamada “igreja universal”, ao lado de grandes homens, embora longe de Cristo. Quem vai ser a cabeça dessa geringonça, Cristo ou o papa? Para nós, Cristo estará ausente dessa mixórdia, mesmo porque já foram criados outros cristos pelos liberais.

Ora, através dos séculos, a diferença entre a igreja romana e os batistas é substancial, no que diz respeito a Igreja e Reino. No Catecismo da Doutrina Cristã, lemos: “A igreja é a congregação de pessoas batizadas, unidas pela mesma fé verdadeira, pelo mesmo sacrifício, pelos mesmos sacramentos e sob a mesma autoridade do Soberano Pontífice e dos bispos em comunhão com ele”. Pode um batista subscrever ou aceitar semelhante definição?Não há apoio bíblico para tal disparate de uma federação de igrejas sob a direção de um ser humano falível, em que pese a decretação de sua própria infalibilidade. Se se tratar de “igreja universal invisível” deve ser fruto de “forças ocultas”, tão em voga nos nossos dias. É concepção estrambótica que não cabe no cérebro de um batista por ferir em cheio as Escrituras

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Sagradas. É um subterfúgio para fugir ao dever de prestigiar as igrejas locais. É um desvio que levará a tornar as doutrinas do Novo Testamento igualmente “invisíveis”.Na Confissão de Fé de New Hampshire, art. XIII, assim está definida a igreja: “Cremos que a igreja visível de Cristo é uma congregação de membros batizados, ligados por um Pacto de Fé e Comunhão no Evangelho, observando as ordenanças de Cristo, (não sacramentos), governados por suas leis e aí exercendo os dons, direitos e privilégios que lhes dá a Palavra de Deus” Que diferença nas duas definições! Como harmonizá-las, a não ser dentro dos Evangelhos, em obediência absoluta a Cristo? O Reino é invisível e dele ainda não somos oficiais. Está ainda em formação e as igrejas aqui na terra são agentes para a formação do Reino. É só. Atos 14:23-27. Muitos súditos do Reino já morreram, outros ainda não nasceram, porque então ter a pretensão de querer organizá-lo já? Além disto, só Cristo é Rei e só a ele compete estabelecer seu reino entre os homens. Tudo mais é embófia à caminho do ridículo.

O meu Seminário e os meus estudos particulares não me ensinaram a pregar à “Igreja Invisível”. Nem mesmo me incentivaram a cultivar dons

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mediúnicos. Não tenho jeito de viver, falar e agir entre “invisíveis”. Deixaram-me neste mundo mesmo, cuidando da igreja local, na expectativa de que, quando Cristo voltar (ainda creio nesta verdade), o Reino seja estabelecido. Ê desse Reino que espero fazer parte, na companhia de Jesus. O outro reino, criado por intelectuais em loucos devaneios, não me interessa. Antes de Cristo voltar (e Ele voltará, creiam ou não creiam), o mundo verá só apostasia, conforme as Escrituras anunciam e o próprio Jesus, conhecedor absoluto desta verdade chega a indagar: “Porventura, quando o Filho do Homem vierencontrará fé na terra?”. Na marcha em que muitos vão, a pergunta logo terá resposta. A fé vai-se evaporando dia a dia e os efeitos daninhos aí estão aos olhos de quem quiser ver. Não se zomba de Deus e dos seus ensinamentos impunemente.

A palavra EKKLESIA indica que seus membros foram chamados do mundo, por Deus mesmo, é claro, para atenderem ao trabalho da agência do Reino — a igreja local. Tem lugar para reuniões:

Logo, local.Nada tem de invisível e não se confunde jamais com o Reino. Cremos até que muitos farão parte do Reino sem terem filiação com qualquer igreja visível. Por outro lado, outros poderão ser

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batizados, seguir as praxes e ritos das agências visíveis e não pertencerem ao Reino. Não é a filiação com esta ou aquela igreja que dá entrada no Reino, mas Jesus que é a Porta Única (João 10:9; I Cor. 3:11). A salvação precede à filiação. A igreja não se identifica com o Reino, no dizer de Mullins e outros, ou seja com qualquer denominação, mesmo a propalada igreja invisível, pois é exercido diretamente nos corações humanos, no plano espiritual, de modo a se revelar na vida dos crentes sem considerar as linhas denominacionais.O grave erro da regeneração batismal é fruto desse modo de encarar o Reino identificado com a igreja, pois o batismo vai colocar a criança no Reino. É um recurso grosseiro para roubar a glória de Cristo e ainda lançar mau reflexo sobre a atuação do Espírito Santo na regeneração dos pecadores. Daí o batismo infantil. Se a igreja é o Reino, então, mesmo a criança deve ser batizada é a conclusão a que certamente chegam. Cristo e o Espírito Santo ficam, de certo modo, sem função. Ora o Reino será uma Teocracia, as igrejas são uma Democracia, segundo os ensinos bíblicos. Se, porém já não cremos na obra expiatória de Cristo e na ação regeneradora do Espírito Santo, estamos

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livres, para seguir as inovações “inteligentes” dos liberais.

Examinando Mat. 16:18, parece que ouvimos Jesus expor: “Os Hebreus têm suas assembleias (gahal) Deut. 31:30; os grupos gregos também (Atos 19:39). Agora vou edificar também a minha assembleia, ou congregação, cuja missão é a extensão do Reino nos corações, para cujo trabalho a igreja terá a chave do Reino para penetrar nos corações. A Porta única, já dissemos e aqui repetimos, é Jesus. Não há outra entrada. Quem não entrar por esta Porta é ladrão e salteador. À assembleia, ou igreja, cabe a gloriosa missão de anunciar o Evangelho e guiar as almas à Porta e ao Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo.Eis porque insistimos em liberdade ampla, verda-deira, sem castas, sem divisões de campo, sem imposições humanas. O Evangelho deve ser anunciado a todos, sem quaisquer distinção. Os batistas, são, inegavelmente, os maiores arautos da liberdade através dos séculos. Muito se tem feito para detê-los na sua marcha vitoriosa, mas quem se planta na Verdade jamais será derrotado. A história dos batistas será melhor compreendida seguindo as pegadas dos seus maiores do que a pena dos historiadores. Não cortejam honras,

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glória e poder; semeiam princípios que vivem e vivificam.

Não há dúvida, vivemos dias perigosos. A apos-tasia lança assustadora mente seus tentáculos ameaçando a quantos se deixarem embair pelas palavras melífluas dos seus hábeis protagonistas. O que afirmam é bonito, mas o que visam fica oculto atrás dessas palavras eloquentes. A agitação borbulha em cada canto do mundo. O dispêndio feito com sua propaganda seria suficiente para evangelizar, realmente evangeliza, a maior parte do mundo. E o que vemos? A moral declina em toda parte. Os valores espirituais são renegados. A Bíblia é criticada insolentemente. Jesus é diminuído na sua missão. As verdades mais preciosas e consoladoras do Evangelho são apresentadas como mitos. As doutrinas são alvo de motejo. Os erros são arrastados para fazerem companhia à Verdade. A enxurrada de negações varre o mundo, carregando a todos para a pior forma de materialismo que o mundo já conheceu. Até Cristo está despersonalizado na oficina dos liberais. Para onde iremos com semelhantes conceitos da Verdade? Poderão os batistas andar em veredas tão tortuosas e ingratas? O fato é que não podemos servir à nossa geração desprezando

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e diminuindo o Salvador e seus ensinamentos, apenas para termos o prazer e a glória de gozar a companhia de homens doutos, cujo valor está acima de Jesus e dos Evangelhos. Se queremos ler por essa cartilha, devemos desde já abandonar as igrejas que são verdadeiramente Batistas. Carecemos da transfusão da vida de Cristo em nós, da direção real do Espírito Santo para impedir a onda avassaladora de erros que ameaça a vida das igrejas verdadeiramente cristãs. Na minha velhice honrada, marcharei com os batistas fiéis para o patíbulo, para a fogueira ou mesmo para as bocas dos leões, na defesa dos princípios que o povo batista tem defendido em todos os tempos.

O valor do credo está no caráter que plasma. A condição atual do mundo exige exemplo de vidas puras, nobres e úteis e não de confissões labiais e de mero serviço social. Tais vidas só podem ser alicerçadas em princípios sólidos. O Evangelho é eterno como o Deus que o criou. Não pode ser alterado ao talante do homem, não importa o grau de sua erudição. Seria acalentar o superlativo da empáfia de alguns vaidosos intelectuais,Não se pode negar que o liberalismo hodierno é o grande semeador de ideias que estão solapando as bases da moral e da religião, nessa panela de

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fusão que planeja. Será o suicídio das igrejas, de todas elas, a desmoralização do Cristianismo, o estabelecimento da anarquia, com a ausência de Cristo e do Espírito Santo. É óbvio que aqueles que já não creem em Cristo e no Espírito Santo jamais compreenderão estas verdades. Cegaram-se para a revelação divina. A importância da Verdade no tocante ao combate pela fé entregue aos santos é de suma gravidade. Recebemos a fé. Foi-nos entregue por Deus e não nos compete reformá-la. Sabemos, entretanto, que é bem mais fácil ser liberal, hoje em dia, do que ser cristão fiel. O erro é sempre mais popular. A Verdade de Deus, realmente é estreita, como toda verdade. A verdade não tem idade. É eterna.

Devo prevenir que o velho espírito de perseguição não morreu, apenas tomou novas formas. Os modernistas só reconhecem a própria consciência. As demais&*•

estão erradas. É o dogmatismo mais feroz que se tem apresentado no mundo. E, no exercício do poder que cobiçam, serão perseguidores tenazes. Chegam ao desplante de ver no cristão sincero e fiel apenas “mentalidade atrasada". Isto para salientar, certamente, a mentalidade superior de seus mentores. Estão acima de Cristo e dos

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Evangelhos. Vão corrigi-los. É o auge da presunção. Será fruto do amor que tanto exaltam? Pobre amor!

A versão de que o liberalismo cuida mais da conduta do que de doutrina é pura falácia. É mais um engodo evidente. Sustentam doutrinas materialistas com mais ardor, frequentemente, do que muitos cristãos na defesa das doutrinas espirituais. Além disto, a ortodoxia segue a mesma trilha, apenas se firma mais em princípios e doutrinas que inspiram e fortalecem a conduta. Não há conduta sã sem princípios sãos. Ademais, não vivemos apenas para mostrar aos homens o que somos e como vivemos. Eles poderão afirmar que somos os tais. E Deus, que dirá? Será que criticando-o e a sua Palavra ganharei bom conceito por parte de Deus? Não há vidas puras sem princípios e conduta é fato indiscutível. Todo caráter digno deve ter por base a Verdade e esta é indivisível. Não é possível que homens criem e ensinem verdade acima da Verdade que Deus criou e ensinou. Não é admissível que quem nivela Cristo a Buda, Confúcio, Gandhi e outros, tenha a mesma influência moral e espiritual que aquele que crê em Cristo como Ele realmente é, segundo a versão dos Evangelhos.As igrejas não podem ser transformadas em cal-deirão onde se misturam verdade e erro, conduta e

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falta de conduta, mundanismo e virtude, apenas para se apresentarem falsamente como mensageiros do amor. Será amor espúrio e imoral. Princípios contraditórios não se mesclam, mormente com a facilidade exposta pelos corifeus do liberalismo andante dos nossos dias. Dois não podem andar juntos se não acertam os passos. Fora dos Evangelhos, os batistas não podem andar. A união verdadeira e eterna será feita em Cristo. Fora dele não existirá. Será fictícia, efêmera. Como é possível unir quem crê e quem não crê, quem tem doutrinas e quem não as tem? Cristianismo camuflado não é cristianismo, poderá enganar muitos, mas não salvará ninguém. Foi a fidelidade às verdades eternas que deu a vitória ao Cristianismo contra o Império Romano, a Igreja de Roma e o Secularismo. Caso contrário, o Cristianismo teria sido esmagado pelo Império Romano, paganizado pelo romanismo e inteiramente corrompido pelo Secularismo. A virtude e a fidelidade são tão sublimes que provocam a admiração até dos próprios inimigos. Por isto mesmo, ouvi até de sacerdotes romanistas que, “entre os protestantes, os batistas eram os que estavam mais certos”. Vale a pena ser fiel, sincero, leal, convicto e obediente. Deus guarde

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os batistas, para que jamais desmintam o seu passado glorioso.

A luta está travada. Os batistas brasileiros não podem ficar à margem dela. São os campeões da Liberdade, de disciplina e da ortodoxia e seu testemunho não pode faltar em momento tão angustioso e oportuno.

A Bíblia e o cristo dos liberais não são os que eu creio. Aparentemente, dizem que são os mesmos, mas é puro engodo. A Bíblia é revista a seu modo, mutilada, para satisfazer às “mentes privilegiadas” que só aceitam as partes que convenham a seu apetite literário. Muitas das narrativas bíblicas são tidas por eles como fantasia e mitos que devem ser compreendidos como só eles entendem. Nada de sobrenatural para os liberais modernistas. Nascimento virginal de Jesus, visitação dos anjos, morte expiatória de Cristo, sua ressurreição e sua Segunda Vinda são ficções que não devem ser tomadas literalmente, mas do modo que só eles podem explicar. Pergunto: posso viver nessa amálgama tão díspar emnome do Amor? Que espécie de amor? Sursum corda!Estamos com o apóstolo quando afirma: “porque Cristo enviou-me. . . não em sabedoria de palavras, para que a cruz de Cristo se não faça vã”. Vê-se

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por aí que desde os tempos primitivos havia os que com sabedoria de palavras tentavam tornar vã a cruz de Cristo. Até nisto os modernistas e liberais dos nossos dias não levam vantagem. A heresia nasceu com o Cristianismo e só terminará com a Vinda do Filho de Deus.Se o apóstolo estivesse aqui, hoje, repetiria a mes-ma frase para orientação e governo de muitas igreja e ministros. Não há dúvida que a excelência, a elegância e a eloquência de linguagem podem velar e até desfazer as riquezas e glórias do Evangelho, mormente para aqueles que têm comichão nos ouvidos. Cremos, porém, que não é a linguagem simples e até caçanje que prejudica o Evangelho, mas a sabedoria de palavras que o apóstolo confirma. É o saber que envaidece e conduz as criaturas à crítica ferina que sobe até aos planos de Deus, quando não ao próprio Deus. É a vaidade das vaidades.

Ninguém poderá negar o poder explosivo e destrutivo da sabedoria de palavras. É o fato comprovado pela experiência cristã. Enfeita-se tão bem que, se possível fora, enganaria até os escolhidos. Tal é o efeito poderoso da sabedoria de palavras que, na expressão candente do apóstolo Paulo, torna vã a cruz de Cristo. É, realmente, o que testemunhamos nos nossos dias. Expressões

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elegantes, atraentes, linguagem formosa, sen-tenças eivadas de saber profundo enlevam muitas criaturas e a cruz de Cristo fica anulada. Tudo é mito e fantasia na história de Cristo. Abaixo tudo que é sobrenatural nela. Só eles, modernistas e liberais podem dar a interpretação exata dos fatos e doutrinas. Eles falam a linguagem do século e possuem a verdade, pois só eles têm a linguagem do céu e da terra. Por isto mesmo, usam circunlóquios, figuras impressionantes, imagens frases bem estudadas, tão bem burilados que revelem a sabedoria de palavras capaz de desfazer o que o próprio Deus fez. As almas poderão continuar famintas e vazias, o essencial é reconhecer a sabedoria de palavras.

A cruz de Cristo ofende essas mentes privilegiadas, tal qual o sol faz ao olho enfermo. Daí a tentativa para refinar e burilar a verdade, adaptando-a ao século presente, de modo a tornar vã a cruz de Cristo. Isto é feito com tal distinção e elegância, ou seja, com sabedoria de palavras, de modo a alcançar o alvo: tornar vã a cruz de Cristo. É triunfo efêmero do engodo da vaidade. Seu domínio é passageiro.Querem os modernistas e liberais uma, teologia progressiva que se acomode a cada época, quando o natural e justo seria levar a época ao reinado da

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Verdade em Cristo Jesus. Não é a religião Revelada por Deus que deve adaptar-se à época, mas esta é que deve ser levada a enquadrar-se na Religião. O Cristianismo de Cristo não pode viver sujeito às mudanças climáticas do tempo. É operação divina que não necessita de remendo humano. O homem é pequeno demais para tão imensa tarefa, em que pese a presunção e a vaidade de alguns.Para nós, a maior glória do Evangelho é a sua simplicidade. Não necessitamos de cristianismo novo, mas de fé viva e ativa em Jesus que só ele pode satisfazer as nossas necessidades. As belas flores pintadas pela sabedoria de palavras não têm o viço e a naturalidade das verdades evangélicas e os verdadeiros cristãos saberão distinguir muito bem o falso do verdadeiro.

Não há, no mundo, declaração mais sublime e rica de conforto e esperança que esta: “Deus estava emCristo reconciliando consigo o mundo, não lhes imputando os seus pecados”. Não é fantasia, é realidade. Não é linguagem figurada ou simbólica. É realidade. Cristo veio e morreu para nos salvar. Sentimos na alma os efeitos de sua vinda. É inútil tentar perverter esta Verdade, apenas firmados na sabedoria de palavras, mera cúpula da vaidade humana que deixa as almas vazias, pois distantes do Cristo de Deus.

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O Bispo Ken já afirmava que o liberalismo era o semeador de todas as heresias imagináveis. Em 1950, o Arcebispo de Londres declarava que o liberalismo era um mar sem praia, sem estrela polar que guiasse aqueles que nele embarcavam, pois eram guiados apenas pela luz incerta da razão.De fato, como desprezar os princípios bíblicos e ameaçar destruí-los por falsa liberdade espúria e ineficaz? Porventura o conhecimento religioso poderá serproduto da razão humana? Como criar e manter ordem e disciplina, quando as igrejas se transformam em receptáculos de ensinos contraditórios, de especulações ficas e diletantismo literário que só produzem desordem? Na teoria, poderá parecer bonito, mas na prática será um desastre. A experiência já não deu certo na vida política brasileira. Reduziram 14 partidos a dois apenas. Resultado: não se entendem e ficaram sem a mínima ligação com o povo. É o que se dará com o ecumenismo, sem ligação com Deus, nem com o povo.

Desde que são pilotados pela razão, rejeitam a re-ligião sobrenatural. Pessoalmente, não tenho interesse em religião que não seja sobrenatural. Por exemplo, a profecia e o milagre são dois

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fortes argumentos em favor da Religião Cristã. A profecia apresenta o sobrenatural e o milagre exibe a ação. Necessitamos de ambos. Os liberais os negam. Como poderia filiar-me seu grupo, ou meter-me na sua panela de fusão?“Mente avançada”, para mim, não é aquele que ignora os fatos no domínio do espírito, mas aquele que considera todos os fatos em conjunto, sem desprezar qualquer deles. Só assim terá visão alargada, será forte na fé, rico na esperança e útil à humanidade.Os fatos que se prendem ao caráter são os mais importantes nesta vida. Os idólatras da razão não terão meios para formar e manter o caráter, pois falta-lhes padrão e forças para tanto, a não ser que já se julguem deuses.Estejam certos, porém, que ninguém resiste ao po-der da verdade em Cristo Jesus. Cortem-na em pedacinhos e ela logo se reunirá num todo, em Cristo Jesus.Não é possível que o testemunho dos séculos e de milhões de criaturas de valor indiscutível seja anulado pelo “saber” dos racionalistas-liberais dos nossos dias. As igrejas e a Bíblia são dons de Deus para conduzirem os homens à salvação em Cristo. Nelas nos firmamos, pois só assim serviremos a Deus e à humanidade.

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Cremos na unidade dos cristãos e ela virá. Será alcançada, não por sabedoria de palavras, com elementos heterogêneos, à moda liberal-modernista, mas sob a ação direta do Espírito Santo. Será firmada em Cristo e não em homens, segundo as Escrituras. A sabedoria do homem é sempre enganosa. Fora de Cristo e do seu Evangelho jamais se processará a verdadeira unidade. Será unidade espiritual e não orgânica, porque nesta não cremos. Fora de Cristo, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo, não há ponto de apoio legítimo que garanta e sustente a unidade. A união orgânica é superficial e, ou mais cedo ou mais tarde, ruirá, por faltar-lhe conteúdo espiritual e poder divino. Quando pensarem que tudo está bem, em paz e segurança, virá repentina destruição.Unamo-nos para salvar o mundo numa cruzada valorosa de evangelização, cada um ao lado do outro, em verdadeiro amor fraternal que não seja forçado, combatamos o pecado e anunciemos a salvação em Cristo Jesus, sem prejuízo das igrejas locais que devem gozar a autonomia que Deus lhes concedeu. Acabemos com as perseguições, com o ódio e a mania de saber e de mando, mas deixemos os princípios sagrados em plena ação.

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Meditem os batistas brasileiros na situação moral e religiosa do mundo, despertem para a realidade à luz da Palavra de Deus, revistam-se de coragem e de sábia disposição e provem ao mundo o valor de suas convicções que em nada desmentem o seu passado histórico. Sejam, hoje, o que sempre foram — vanguardeiros da Liberdade e da autenticidade evangélica.

Brasília, 20/3/67