EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA: ALGUMAS (RES)SIGNIFICAÇÕES SOBRE A FORMAÇÃO PROFISSIONAL
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UNIVERSIDADE SÃO JUDAS TADEU
FACULDADE DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE
CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA
“EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA: ALGUMAS (RES)SIGNIFICAÇÕES SOBRE A FORMAÇÃO
PROFISSIONAL”
ELIZABETE FERREIRA
RAPHAEL GREGORY BAZÍLIO LOPES
RAUL FERREIRA
Trabalho de Conclusão apresentado à
Disciplina TEPEFESP, como requisito parcial
para a obtenção do grau de Bacharel em
Educação Física, sob a orientação da Profa.
Dra. Vilma Leni Nista-Piccolo.
SÃO PAULO
2010
ii
Esse trabalho é dedicado a todos os colegas do curso de Educação Física que nos
acompanharam ao longo desse trajeto e contribuíram para nossa formação,
tanto quanto nossos mestres.
Esperamos que vocês reconheçam na diversidade das pessoas a oportunidade de
crescimento pessoal e de seus alunos, valorizando essas trocas de experiências como
fundamentais para o desenvolvimento do SER.
iii
Se fosse fácil, todo mundo era
Se fosse muito, todo mundo tinha
Se fosse raso, ninguém se afogava
Se fosse perto, todo mundo vinha
Se fosse graça, todo mundo ria
Se fosse frio, ninguém se queimava
Se fosse claro, todo mundo via
Se fosse limpo, ninguém se sujava
Se fosse farto, todos satisfeitos
Se fosse largo, tudo acomodava
Se fosse hoje, todo mundo ontem
Se fosse tudo, nada aqui restava
Se fosse homem junto com mulher
Se cada bicho fosse como vou
Se fosse tudo claro pensamento
Nesse momento, nada se criou.
(Zé Ramalho)
iv
SUMÁRIO
Página
RESUMO ....................................................................................................................................... x
1. INTRODUÇÃO .......................................................................................................................... 1
2. REVISÃO DE LITERATURA .................................................................................................... 3
2.1. Quem são as pessoas com deficiência? ............................................................................. 3
2.2. Quais são, atualmente, as concepções de deficiência utilizadas em nossa sociedade? ... 4
2.2.1. Pré-história e História Antiga ....................................................................................... 5
2.2.2. Idade Média ................................................................................................................. 6
2.2.3. Idade Moderna ............................................................................................................. 6
2.2.4. Idade Contemporânea ................................................................................................. 7
2.3. Qual é a relação dessas pessoas com a prática de atividade física? ................................. 9
2.4. Quais são as especificidades do trabalho com pessoas com deficiência que devem
subsidiar a formação do profissional nos cursos de graduação em Educação Física? .... 10
2.4.1. A formação profissional em Educação Física ............................................................ 10
2.4.2. Afinal, o que é uma Educação Física Adaptada? ...................................................... 12
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ............................................................................... 14
3.1. Caracterização da pesquisa .............................................................................................. 14
3.2. Universo da pesquisa ........................................................................................................ 14
3.3. Coleta de dados ................................................................................................................. 15
3.3.1. Primeira etapa: coleta de documentos ...................................................................... 15
3.3.2. Segunda etapa: entrevista semiestruturada .............................................................. 16
3.4. Procedimentos para a análise de dados ........................................................................... 16
4. ANÁLISES IDEOGRÁFICAS: UM OLHAR SOBRE AS IDEOLOGIAS EXPRESSADAS NOS
CURSOS DE EDUCAÇÃO FÍSICA ........................................................................................ 18
4.1. Curso 1 .............................................................................................................................. 18
4.2. Curso 2 .............................................................................................................................. 18
4.3. Curso 3 .............................................................................................................................. 19
4.4. Curso 4 .............................................................................................................................. 19
4.5. Curso 5 .............................................................................................................................. 20
4.6. Curso 6 .............................................................................................................................. 20
4.7. Curso 7 .............................................................................................................................. 20
4.8. Curso 8 .............................................................................................................................. 21
4.9. Curso 9 .............................................................................................................................. 21
4.10. Curso 10 ....................................................................................................................... 21
5. UM OLHAR SOBRE O NOMOS... .......................................................................................... 22
5.1. Os planos de curso ............................................................................................................ 22
5.1.1. Carga horária e atividades complementares ............................................................. 23
v
5.1.2. Ementários ................................................................................................................. 24
5.1.3. Objetivos da disciplina ............................................................................................... 24
5.1.4. Programa da disciplina ............................................................................................... 25
5.1.5. Estratégias de ensino ................................................................................................. 27
5.1.6. Avaliação .................................................................................................................... 28
5.1.7. Bibliografia.................................................................................................................. 28
5.2. Os professores ................................................................................................................... 30
5.2.1. Análise do Currículo Lattes ........................................................................................ 30
5.2.2. Entrevista ................................................................................................................... 31
6. CRUZANDO DADOS, DESVELANDO O FENÔMENO... ...................................................... 37
6.1. Docentes responsáveis pelas disciplinas .......................................................................... 37
6.2. A estrutura do curso ........................................................................................................... 38
6.3. Desenvolvimento das disciplinas específicas .................................................................... 40
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................... 42
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................ 44
APÊNDICES ................................................................................................................................ 47
APÊNDICE A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ........................... 47
APÊNDICE B – ROTEIRO DA ENTREVISTA ........................................................................... 49
vi
LISTA DE TABELAS
Página
Tabela 1. Carga horária nos cursos de graduação (indicação em horas) .................................. 23
vii
LISTA DE QUADROS
Página
Quadro 1. Dados obtidos para análise ....................................................................................... 15
viii
LISTA DE MATRIZES
Página
Matriz nomotética 1. Foco do curso ............................................................................................ 22
Matriz nomotética 2. Atividades complementares nos cursos de graduação ............................. 23
Matriz nomotética 3. Síntese das ementas ................................................................................. 24
Matriz nomotética 4. Objetivos das disciplinas ........................................................................... 25
Matriz nomotética 5. Conteúdos abordados nas disciplinas ....................................................... 26
Matriz nomotética 6. Terminologia empregada para designar a pessoa com diferentes e
peculiares condições ................................................................................................................... 27
Matriz nomotética 7. Estratégias adotadas para o desenvolvimento dos conteúdos ................. 27
Matriz nomotética 8. Instrumentos avaliativos adotados nas disciplinas ................................... 28
Matriz nomotética 9. Bibliografia comum a pelo menos 3 cursos............................................... 29
Matriz nomotética 10. Generalidades detectadas nos professores responsáveis pelas
disciplinas .................................................................................................................................... 30
Matriz nomotética 11. Trajetória dos professores responsáveis pela disciplina nos cursos
pesquisados ................................................................................................................................ 32
Matriz nomotética 12. Desenvolvimento da disciplina ministrada .............................................. 33
Matriz nomotética 13. Contribuições de sua disciplina para a formação dos alunos ................. 35
Matriz nomotética 14. Conteúdos e formatos essenciais para um modelo ideal de formação em
Educação Física Adaptada ......................................................................................................... 35
ix
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
a. C. – antes de Cristo.
CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior.
CIDID – Classificação Internacional de Deficiências, Incapacidades e Desvantagens:
um manual de classificação das consequências das doenças.
CIF – Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde.
GEPEFE – Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Física Escolar
IES – Instituições de Ensino Superior.
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira.
MEC – Ministério da Educação.
ONU – Organização das Nações Unidas.
x
RESUMO
“EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA: ALGUMAS (RES)SIGNIFICAÇÕES SOBRE A FORMAÇÃO
PROFISSIONAL”
Há décadas os profissionais de diferentes áreas da saúde têm discutido a adequação do
tratamento dedicado às pessoas com deficiência. Algumas dessas iniciativas culminaram na
publicação de manuais de classificação, organizados pela Organização Mundial da Saúde, que
descrevem e classificam as deficiências, visando adequar as intervenções dos profissionais
dessas áreas. Enquadrado nesse grupo está o profissional de Educação Física, cuja formação
deve contemplar os conhecimentos acerca das deficiências e as adaptações necessárias para
a intervenção profissional, conhecimentos que costumam ser discutidos em uma disciplina
específica. Partindo da necessidade de investigar como estão sendo tratadas as questões
referentes ao atendimento às pessoas com deficiência nos cursos de graduação em Educação
Física, este estudo objetiva verificar a formação dos profissionais graduados em Educação
Física no que tange ao conhecimento relacionado às questões sobre pessoas com deficiência,
ensinado nas instituições públicas do Ensino Superior (estaduais e federais) do estado de São
Paulo. Nessa pesquisa descritiva de perfil, o universo pesquisado foi composto por 10 cursos
de Educação Física. Os dados foram constituídos dos planos de ensino das disciplinas que
discutem a temática das pessoas com deficiência e de entrevistas com os professores dos
cursos. Esses dados foram analisados a partir da descrição, redução e interpretação,
constituindo análises ideográficas e matrizes nomotéticas que explicitam respectivamente as
ideologias dos sujeitos e os aspectos gerais observados. Os resultados indicam que todos os
cursos oferecem pelo menos uma disciplina dedicada à temática da pesquisa. A maioria
dessas disciplinas objetiva subsidiar o aluno para caracterizar, intervir e refletir sobre a atuação
profissional junto às pessoas com deficiência, desenvolvendo atitudes positivas dirigidas a elas.
Para atingir esses objetivos, as disciplinas desenvolvem conteúdos procedimentais e
conceituais. Os conteúdos são ensinados por meio de aulas expositivas, discussões de leituras
e de vídeos, práticas simuladas e visitações técnicas. A partir desses resultados, consideramos
que há coerência entre os objetivos, conteúdos e métodos adotados no desenvolvimento da
disciplina que trata desta temática. A oferta de atividades complementares em todos os cursos
contrapõe-se aos dados existentes na literatura, que indicam a escassez dessas atividades nas
Instituições de Ensino Superior. Consideramos que os cursos analisados buscam atender às
discussões travadas com relação à temática das pessoas com deficiência, oferecendo ao
futuro profissional uma possibilidade para superar a barreira do relacionamento com essas
pessoas. Pelas entrevistas foi possível verificar a importância do envolvimento e do interesse
do professor para com a aprendizagem de seus alunos.
Palavras-chave: Educação Física Adaptada, Formação Profissional, Pessoas com Deficiência.
1
1. INTRODUÇÃO
Pessoas inválidas, incapacitadas, defeituosas. Deficientes, portadores de deficiência,
pessoas com necessidades especiais, pessoas com deficiência, são os diferentes termos
adotados ao longo da história, para pessoas com diferentes e peculiares condições. Todas
essas formas de identificar essas pessoas estão permeadas de significados que representam
como a sociedade se relacionou com elas ao longo dos tempos.
Para buscar a adequação do tratamento dirigido a essas pessoas, em alguns
momentos os profissionais da saúde buscaram descrevê-las e classificá-las, resultando, em um
primeiro momento, em modelos que retratavam as suas restrições, como é o caso da
Classificação Internacional de Deficiências, Incapacidades e Desvantagens: um manual de
classificação das consequências das doenças – CIDID, publicado pela Organização Mundial da
Saúde em 1976 (AMIRALIAN et al., 2000; FERNANDES; VENDITTI JR., 2008). Após debates e
revisões sobre o papel desempenhado por esses indivíduos em nossa sociedade, em 2001, a
Organização Mundial da Saúde revisou esse documento, aprovando a Classificação
Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), que intentava olhar para a
pessoa a partir de suas potencialidades. Essa nova ótica tem como foco o indivíduo,
considerando a diversidade humana, tornando-se essencial para propiciar o reconhecimento e
o respeito pelas igualdades e diferenças existentes entre as pessoas, bem como para sua
inclusão no meio em que estão inseridas (SAMPAIO et al., 2005).
Nesse sentido, os profissionais da área de saúde, em especial, começaram a buscar
a superação do modelo médico em que a segregação tinha lugar, voltando-se para os modelos
inclusivos, em que a pessoa com deficiência estaria presente e atuando com as outras
pessoas.
Entre os agentes da inclusão está o profissional de Educação Física, cuja formação
deve ser contemplada ao menos com uma disciplina que aborde as questões da Educação
Física Adaptada. Nela, devem ser discutidos os conteúdos típicos da Educação Física no
universo das pessoas com diferentes e peculiares condições para a prática das atividades
físicas (PEDRINELLI; VERENGUER, 2008).
Reid (2000) aponta que a discussão desses conteúdos em todas as disciplinas do
currículo pode permitir que os graduandos ressignifiquem essas abordagens em atividade
física, permitindo maior compreensão acerca do assunto.
Virtuoso Jr. et al. (2003) destacam que o profissional de Educação Física deve olhar
para seu aluno como um ser holístico. Deve ser capaz, ainda, de enxergar a diversidade e a
complexidade humana, por meio de uma avaliação das condições motoras, psicológicas,
sociais, econômicas, entre outras, e a partir disso propor programas de intervenção de acordo
com os objetivos de cada pessoa (FREIRE; VERENGUER; REIS, 2002).
Vale ressaltar que a literatura traz grandes contribuições acerca da intervenção junto
a pessoas com deficiência, mas faltam estudos que apontem para as especificidades da
2
formação do profissional que vai atuar nessa área, bem como para os conteúdos relacionados
ao tema, a serem abordados pelos docentes na graduação, tanto numa disciplina específica
quanto nas demais disciplinas que compõem a formação. A partir do exposto, torna-se
necessário investigar como estão sendo tratadas as questões referentes ao atendimento às
pessoas com deficiência nos cursos de graduação em Educação Física.
Pesquisar esse aspecto permitirá subsidiar uma análise sobre as diferenças
existentes nos currículos dos cursos de Educação Física, assim como pode auxiliar na busca
de uma formação profissional mais adequada, a ser dada nas Universidades. E ainda,
possibilitar que essa formação seja repensada, caso não atenda às necessidades que
emergem da sociedade, para que os profissionais graduados possam responder de forma mais
adequada a essas novas demandas.
Desse modo, o objetivo desse estudo é verificar a formação dos profissionais
graduados em Educação Física no que tange ao conhecimento relacionado às questões sobre
pessoas com deficiência, ensinado nas instituições públicas do Ensino Superior (estaduais e
federais) do estado de São Paulo.
Assim, essa pesquisa começa com uma revisão literária sobre as questões que
permeiam esse tema, investigando como têm sido identificadas as pessoas com deficiência ao
longo do tempo, revelando aspectos importantes das atuações dos profissionais analisados em
sua formação.
Em seguida, no capítulo que aborda os Procedimentos Metodológicos, foram
descritos os pormenores adotados para a coleta e análise das respectivas grades curriculares
que compõem esses cursos, com os planos de curso das disciplinas dedicadas ao estudo
dessa temática, além de entrevistas com os professores responsáveis por essas disciplinas.
Nos capítulos “Análises ideográficas: um olhar sobre as ideologias expressadas nos
cursos de Educação Física” e “Um olhar sobre o nomos”, são apresentados os resultados da
pesquisa, na forma de análises ideográficas, que expressam as ideologias que permeiam cada
curso, elaboradas a partir dos dados levantados e, posteriormente, na forma de matrizes
nomotéticas, possibilitando a visualização no geral sobre o modo como essa temática tem sido
abordada na formação desses profissionais.
A discussão desses resultados tem lugar no capítulo “Cruzando dados, desvelando o
fenômeno...”, em que tecemos relações entre os resultados encontrados e a literatura sobre o
tema.
O último capítulo apresenta as nossas considerações finais acerca dos diversos
aspectos que permeiam esse estudo, desde os resultados obtidos até às lacunas que
inevitavelmente são percebidas pelos próprios autores desse estudo.
3
2. REVISÃO DE LITERATURA
Esse capítulo se propõe a oferecer alguns apontamentos visando contribuir com o
entendimento sobre as dificuldades que os professores de Educação Física possam ter ao
receberem alunos com deficiência em suas aulas, partindo das seguintes reflexões: quem são
as pessoas com deficiência? Quais são, atualmente, as concepções de deficiência utilizadas
em nossa sociedade? Qual é a relação dessas pessoas com a prática de atividade física?
Quais são as especificidades do trabalho com pessoas com deficiência que devem subsidiar a
formação do profissional nos cursos de graduação em Educação Física?
2.1. Quem são as pessoas com deficiência?
O último levantamento realizado pela Organização das Nações Unidas (ONU),
realizado em 1980, aponta que existem aproximadamente 500 milhões de pessoas com
deficiência no mundo, sendo que 80% delas estão em países em desenvolvimento. O Censo
Demográfico de 2000 assinala que 24,5 milhões dos brasileiros têm algum tipo de deficiência, o
que representa 14,5% da população apresentada no levantamento realizado no Censo 2000
(NERI; SOARES, 2003).
Entretanto, faz-se necessário compreender qual a concepção de deficiência adotada
nesses levantamentos, posto que isso pode alterar significativamente os índices encontrados.
De acordo com Ferreira (2009), o termo deficiência remete-se à ideia de insuficiência,
imperfeição, defeito, falta, carência, falha. Encontra-se na Convenção Interamericana para a
Eliminação de todas as Formas de Discriminação que deficiência é “uma restrição física,
mental ou sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer
uma ou mais atividades essenciais da vida diária, causada ou agravada pelo ambiente
econômico e social” (BRASIL, 2001, p. 3).
Essas concepções de deficiência são fundamentadas em discussões iniciadas na
década de 1970 pela Organização Mundial da Saúde, nas quais os profissionais da saúde
começaram a se preocupar em descrever e classificar as pessoas com deficiência, culminando
na divulgação de uma Classificação Internacional de Deficiências, Incapacidades e
Desvantagens: um manual de classificação das consequências das doenças (CIDID), de 1976.
Esse documento conceituou deficiência como uma perda, ou anomalia estrutural ou de funções
fisiológica, anatômica ou psicológica, podendo ser temporária ou permanente e relacionada a
disfunções orgânicas (AMIRALIAN et al., 2000).
Percebe-se que essa classificação atribuía à deficiência uma ênfase nas
consequências da doença (FERNANDES; VENDITTI JR., 2008). Apresenta, ainda, os termos
incapacidade e desvantagem, sendo que a incapacidade se refere às restrições de atividades
em função da deficiência e desvantagem representa as condições sociais enfrentadas pela
4
pessoa com deficiência para desempenhar as ações aspiradas por ela, na sociedade em que
está inserida.
Nessa perspectiva de deficiência, os termos incapacidade e desvantagem são
subordinados à doença, ou seja, eles só existem condicionados à presença do outro. Mas, para
Amiralian et al. (2000), a deficiência nem sempre é acompanhada de desvantagem ou
incapacidade, bem como uma pessoa pode ter desvantagens que não sejam decorrentes de
incapacidades ou deficiências.
Sampaio et al. (2005) explicam que em 2001 a Organização Mundial da Saúde fez
uma revisão na CIDID, aprovando um novo documento denominado Classificação Internacional
de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), retratando a alteração das abordagens
focadas nas consequências das doenças, para aquelas voltadas às funcionalidades, em que os
indivíduos são classificados conforme a sua capacidade de interagir com o meio social em que
estão inseridos, ou seja, a funcionalidade das estruturas corporais em relação ao desempenho
das atividades da vida diária e de atuação social.
Essa classificação reflete a interação entre os fatores pessoais (condições de saúde e
estruturas e funções do corpo) e ambientais (atividades e participação do indivíduo). Assim, a
deficiência passa a ser vista como o resultado da interação entre as dimensões físicas e
sociais, que determinam quem o indivíduo é e como ele se sente acerca disso.
Para Sampaio et al. (2005), a CIF tem a função de promover melhor entendimento
entre usuários e profissionais de saúde quanto ao tratamento dirigido às pessoas com
deficiência em diversos aspectos de sua vida, bem como levar à criação de estratégias para a
atuação junto a elas conforme suas possibilidades de ação. Essa classificação foi adotada no
mundo inteiro, facilitando a interpretação dos profissionais que atuam com essas pessoas.
Diniz (2007) é uma autora que vem contribuir com o debate sobre a deficiência ao
apresentar um olhar diferenciado sobre ela, confrontando os modelos biomédicos, nos quais a
deficiência é uma mera desvantagem biológica, quando narra a história de um escritor
argentino cego, indicando que “ser cego é apenas uma das muitas formas corporais de estar
no mundo...” (p. 7-8).
Nesse sentido, é aflorada a perspectiva de que a deficiência é um fenômeno
complexo por representar uma cadeia de interações que determinarão quem são os indivíduos
e como eles se situarão no mundo, quais as relações que se estabelecem para que eles sejam
diferentes. Assim, a deficiência não representa uma variação do que é normal, e sim outra
faceta da diversidade humana.
2.2. Quais são, atualmente, as concepções de deficiência utilizadas em nossa
sociedade?
Para a compreensão dessa questão é necessário verificar inicialmente quais os
diferentes paradigmas adotados para tratar as pessoas com deficiência ao longo da história.
5
Para tanto, traçou-se um paralelo com as características da sociedade no momento em que
foram adotadas diferentes visões acerca da deficiência.
2.2.1. Pré-história e História Antiga
Silva, Seabra Júnior e Araújo (2008) afirmam que pouco se sabe da vida das pessoas
com deficiência nos princípios da civilização humana, embora situações hipotéticas possam ser
elaboradas com base em alguns registros encontrados em cavernas por arqueólogos. Esses
registros retratam dedos amputados, pernas encurtadas etc., sugerindo que as pessoas com
deficiência chegavam à idade adulta, contrapondo-se às ideias generalizadas do extermínio e
abandono das pessoas com deficiência ao nascer (MIRANDA, 2004; ZAVAREZE, 2009).
Percebe-se, então, que houve tanto manifestações de tolerância e apoio, quanto de
menosprezo e extermínio.
A visão de abandono e extermínio está relacionada às sociedades primitivas, cujo
pensamento mítico era a base para explicar os acontecimentos da vida, de modo que a
deficiência pode ter sido encarada como consequência de malignidade e objeto de superstição,
causando uma diferenciação na forma do tratamento da pessoa com deficiência (MARQUES;
CASTRO; SILVA, 2001).
Além disso, Gaio (2006) esclarece que nesse período havia a necessidade de se
conviver em um regime comunitário, no qual cada indivíduo deveria dar sua contribuição para a
subsistência do grupo. Para tanto, era necessário mover-se com facilidade e ter os sentidos em
perfeito funcionamento, pois só assim seria possível contribuir plenamente com o grupo no qual
se estava inserido.
Há interessantes registros na Grécia Antiga que apontam para a aceitação da pessoa
com deficiência adquirida, mas não para o da pessoa com deficiência congênita, a qual deveria
ser sacrificada pelos pais (SILVA; SEABRA JÚNIOR; ARAÚJO 2008). Esse comportamento
pode ser explicado pelo pensamento disseminado por Platão, que indicava que o ser humano
era constituído de corpo e mente, sendo que os homens que tinham o poder dedicavam-se às
tarefas intelectuais, enquanto as pessoas consideradas menos dignas seriam as responsáveis
pelas tarefas que dependiam do esforço físico (GAIO, 2006). Assim mesmo, aqueles que eram
aceitos pela sociedade deveriam provar sua funcionalidade para serem reconhecidos como
membros ativos, visto que era requerido que o cidadão fosse forte e vigoroso para contribuir
com a agricultura e com a guerra (CARVALHO-FREITAS; MARQUES, 2007).
A partir desse pequeno retrato dessa situação na Grécia Antiga, é possível imaginar
quais eram as expectativas da sociedade sobre a pessoa com deficiência, geralmente
imputando-lhe características que não correspondiam às suas potencialidades, haja vista que
era necessário que a pessoa com deficiência provasse sua capacidade para diferentes
realizações. Sassaki (2003) aponta que termos como inválidos denotam essas características,
pois as pessoas com deficiência eram consideradas socialmente inúteis.
6
2.2.2. Idade Média
Na Idade Média, o pensamento da sociedade foi muito influenciado pelas ideias da
Igreja, de modo que os homens encaravam os acontecimentos como demonstrações dos
planos de Deus (CARVALHO-FREITAS; MARQUES, 2007). Em um período em que o homem
era visto como um ser submetido aos poderes invisíveis que o regiam para o bem ou para o
mal, a pessoa com deficiência assumia o aspecto de manifestação da maldade: a demonologia
causava a sua “anormalidade” (MARQUES; CASTRO; SILVA, 2001). Por representar o pecado,
essas pessoas eram castigadas ou mesmo entregues à fogueira da inquisição (MIRANDA,
2004; ZAVAREZE, 2009).
Percebe-se, ainda, que o pensamento mítico das sociedades primitivas ainda rege
esse período, demonstrado pela relação que a sociedade estabelecia com a pessoa que
apresentava diferentes e peculiares condições.
Com o passar do tempo, a relação de horror à deficiência foi dando espaço ao
sentimento da caridade, já que agraciar os menos favorecidos era uma das formas de se
credenciar ao céu. Nesse período, as pessoas com deficiência eram recolhidas para
instituições nas quais recebiam alimento e vestuário (CARVALHO-FREITAS; MARQUES, 2007;
MARQUES; CASTRO; SILVA, 2001).
Algumas dessas ideias ainda estão presentes em nossa sociedade, quando se refere
àqueles que auxiliam essas pessoas como seres santificados que se doam a causas divinas de
proteção e defesa dos menos afortunados.
2.2.3. Idade Moderna
A Idade Moderna é fecunda nos pontos de vista econômico, social e filosófico,
passando por eventos como o Renascimento, a Reforma Protestante, a Revolução Científica e
pela Revolução Francesa que marca o fim desse período. Surge o interesse de estudar o
homem, em uma transição da explicação da deficiência como fenômeno metafísico para uma
visão mais racional e científica (CARVALHO-FREITAS; MARQUES, 2007).
Começam a surgir as abordagens médicas sobre a deficiência, principalmente na
França e Alemanha, alertando para as necessidades e para os problemas da pessoa com
deficiência, com base nas características psicofisiológicas e etiopatogênicas. Nessa nova ótica,
cabia aos médicos o diagnóstico, prognóstico e tratamento da deficiência em instituições
criadas para esse fim (CARVALHO-FREITAS; MARQUES, 2007; MARQUES; CASTRO;
SILVA, 2001).
Silva (1987, p.221), apud Gaio (2006), destaca:
Na penosa história do homem portador de deficiência começava a findar uma
longa e muito obscura etapa. Iniciava a humanidade mais esclarecida os
tempos conhecidos como “Renascimento” – época dos primeiros direitos dos
7
homens postos à margem da sociedade, dos passos decisivos da medicina
na área de cirurgia ortopédica e outras, do estabelecimento de uma filosofia
humanista e mais voltada ao homem, e também da sedimentação de
atendimento mais científico ao ser humano em geral (p. 81).
Entretanto, é também nessa fase que pode ser notada a ênfase no olhar para o corpo
deficiente. O corpo humano começou a ser equiparado a uma máquina e, como tal, os
mecanismos que apresentavam “defeito” precisavam ser reparados. Termos como defeituoso
retratam essa concepção de deficiência, marcando o período em questão, em que a deficiência
já não era eliminada, mas continuava a ser combatida.
2.2.4. Idade Contemporânea
2.2.4.1. Século XIX – algumas tentativas de compreender as deficiências...
Em 1801 foi apresentada pela primeira vez a tentativa de educar uma pessoa com
deficiência (Victor, o selvagem de Aveyron) por Itard, que atribuiu as dificuldades desse menino
às insuficiências intelectuais e não biológicas, reconhecendo-o como uma tábula rasa
(MARQUES; CASTRO; SILVA, 2001). Esse fato foi marcante para o surgimento da Educação
Especial no início do século XIX, destacando a preocupação da sociedade em prestar apoio
para essas pessoas.
Surgem as primeiras tentativas de explicar e classificar as deficiências, os primeiros
estudos científicos na área (MARQUES; CASTRO; SILVA, 2001). As escolas especiais se
multiplicavam de acordo com os diversos tipos de deficiência, bem como as diferentes
denominações das crianças que dela precisavam. Essas escolas atendiam apenas crianças
com deficiências específicas, cujos recursos humanos eram especializados na deficiência
atendida na instituição, que funcionava fora do ensino regular (SEABRA JÚNIOR; ARAÚJO,
2008).
Sassaki (1997) aponta que muitas dessas instituições culminaram na
institucionalização da segregação, deixando de oportunizar a participação de todos em
programas educacionais, de lazer, turismo, esportes e outros. Foram criados serviços
exclusivos às pessoas com deficiência, garantindo a participação, mas não a inclusão. Ou seja,
embora diversos segmentos da sociedade estivessem preocupados em atender essas
pessoas, não os reconheciam como membros da sociedade, recaindo sobre eles o estigma da
doença, da incapacidade, gerando a necessidade de tratamentos e de se buscar a cura.
Surgem, nessa época, os defensores da integração das pessoas com problemas
educativos especiais, indicando a necessidade de preparar as escolas e os profissionais para
receberem as pessoas com deficiência, visando à integração escolar, familiar e social.
Progressivamente foram criados os semi-internatos e as classes especiais (salas inclusas em
8
prédios de ensino regular durante todo o período letivo) (CARVALHO-FREITAS; MARQUES,
2007; MARQUES; CASTRO; SILVA, 2001).
Ao ser defendida a integração da pessoa com deficiência, é costume pensar em “dar
direitos” para que ela participe das mais diversas manifestações socioculturais de seus
semelhantes, independente das limitações ou dificuldades manifestas.
2.2.4.2. Século XX – novos olhares...
O século XX foi fecundo nas discussões acerca da participação das pessoas com
deficiência em diferentes segmentos da sociedade. Com o retorno de soldados da I Guerra
Mundial, a imprensa começou a divulgar a ideia de que a guerra produzia “incapacitados”. Esse
novo olhar, embora ainda discriminatório, foi importante porque permitiu vislumbrar a
capacidade residual das pessoas (SASSAKI, 1997).
Já na metade do século, o foco se volta para a normalização da sociedade, com o
objetivo de criar os meios mais adequados possíveis para atender a todas as pessoas. A ideia
principal do conceito de normalização está subjacente desde 1948, na Declaração Universal
dos Direitos do Homem, quando se afirma o direito indistinto de todas as pessoas ao
casamento, à propriedade, a igual acesso aos serviços públicos, à segurança social e a
efetivação dos direitos econômicos, sociais e culturais (CARVALHO-FREITAS; MARQUES,
2007; MARQUES; CASTRO; SILVA, 2001).
A década de 80 foi um marco nas discussões acerca do atendimento adequado às
pessoas com deficiência, iniciadas após a declaração de 1981 como o Ano Internacional das
Pessoas Deficientes, cujos debates levaram a uma ressignificação da deficiência. Com o lema
“Participação Plena e Igualdade”, esse foi o ano em que se levantaram questões, em toda
sociedade, como a necessidade de se criar um Plano de Ação que buscasse igualar
oportunidades entre as pessoas, e principalmente que permitisse um novo olhar da sociedade
voltado para a pessoa, e não mais para a deficiência (SASSAKI, 1997).
O decênio 1983-1992 foi proclamado como a Década da Pessoa Deficiente, período
em que as discussões sobre o tema se aprofundaram e ganharam maior notoriedade. Em todo
o mundo surgiram associações, iniciativas oficiais e privadas, com o intuito de lutar pelos
direitos das pessoas com deficiência (SILVA; SEABRA JUNIOR; ARAÚJO, 2008).
Em 1994, representantes de 92 países e de 25 organizações se reuniram na
Espanha, para discutir os preceitos da educação inclusiva, culminando na elaboração da
Declaração de Salamanca, que assegura o atendimento e a inclusão de pessoas com
deficiência e o reconhecimento das necessidades de cada um (FILUS; MARTINS JR., 2004).
Esse corpo de ideias que dão ênfase aos direitos, à iniciativa individual e autonomia
vai ao encontro do que atualmente se apresenta como necessidade de inclusão. Carvalho-
Freitas e Marques (2007, p. 72) indicam:
9
Configura-se, então, um novo modelo de interpretação das deficiências, o
qual perde seu caráter de atributo individual e passa a ser um fenômeno
contingencial que remodela as ações sociais, procurando ajustar o ambiente
também à natureza das pessoas com deficiência. O pressuposto é de que a
pessoa com deficiência deva ser incluída na sociedade e no trabalho tendo
por parâmetro suas potencialidades, e que as organizações e a sociedade
precisam se ajustar para garantir a plena participação dessas pessoas.
Contudo, é necessário sublinhar que essa é uma matriz de interpretação
recente que precisará de tempo para ser incorporada.
Então, há a necessidade de se criar condições para que sejam atingidas as metas
que buscam a total participação e a igualdade de oportunidades para as pessoas com
deficiência. Somente com essa abertura essas pessoas poderão usufruir e compartilhar com a
comunidade das mesmas condições de vida de qualquer outro cidadão.
Muitas dessas oportunidades podem ocorrer nos espaços dedicados à Educação
Física e à prática de atividades físicas, portanto é importante saber até que ponto os
profissionais dessa área estão preparados e se preocupam com a questão da inclusão em
suas aulas.
2.3. Qual é a relação dessas pessoas com a prática de atividade física?
Pedrinelli e Verenguer (2008) indicam que na atualidade a pessoa com deficiência é
membro ativo da sociedade. Segundo as autoras, olhar para as pessoas e perceber suas
potencialidades pode auxiliar na efetivação de processos que garantam a igualdade de direitos
e a participação na sociedade por essas pessoas.
Fernandes e Venditti Jr. (2008), consideram que a inclusão está relacionada ao
respeito e ao reconhecimento da diversidade humana, na qual a ação dos envolvidos objetiva a
criação ou adaptação de situações que levem os sujeitos à aprendizagem e ao
desenvolvimento. Essa relação surge da cooperação e atuação de colegas, professores e
familiares.
Nesse ínterim, um dos agentes dessa inclusão é o profissional de Educação Física,
cuja área de estudo abarca os conhecimentos sobre o ser humano nas dimensões biológica,
psicológica, social e cultural, olhando para sua complexidade e individualidade.
Entretanto, a atividade física para pessoas com deficiência precisou ser ressignificada
para atender aos preceitos da inclusão. Esse apontamento fica evidente quando são
encontrados registros de que havia programas de ginástica médica na China (3000 a.C.), os
quais focavam nos aspectos clínicos da deficiência, como meio de prevenção e tratamento de
patologias que acometiam o ser humano (PEDRINELLI; VERENGUER, 2008). Silva, Seabra
Júnior e Araújo (2008) citam que em 480 a.C., na Grécia, Heródico escreveu sobre a ginástica
médica ressaltando seus benefícios para a “correção de fraquezas dos corpos dos seus
alunos” (p. 85).
10
Essa visão permaneceu inalterada por diversos séculos, influenciada sobremaneira
pelos modelos de destruição e segregação adotados pela sociedade até o início do século XX.
Nesse período, começaram a ser observados não apenas as pessoas que nasciam com
deficiência, mas também aquelas que traziam deficiências adquiridas durante o exercício de
suas funções da vida diária, no trabalho e na guerra.
Com o término da I Guerra Mundial, percebeu-se a necessidade de se criar
programas específicos para as pessoas com deficiência, haja vista que muitos dos veteranos
que voltavam da guerra apresentavam mutilações e exigiam o direito de continuar praticando
esportes (PEDRINELLI, VERENGUER, 2008).
Assim, as atividades físicas para pessoas com deficiência evoluíram de modelos
essencialmente médicos com finalidade corretiva, para outros focados na atividade física
especificamente voltada para essas pessoas (Programa de Educação Física Especial). A visão
contemporânea é de encorajamento e promoção de atividade física autodeterminada para
todos durante a vida (PEDRINELLI; VERENGUER, 2008).
Percebe-se, então, que a história determinou não apenas as terminologias para
designar as pessoas com deficiência, mas, consequentemente o tratamento que essas
pessoas recebiam em diferentes contextos. A aplicação de programas de atividade física
específicos para as pessoas com deficiência foi totalmente influenciada por essas diferentes
concepções de corpo deficiente e, assim como a sociedade discutiu e modificou sua visão
sobre o atendimento às pessoas com deficiência, também a Educação Física alterou sua forma
de olhar para essas pessoas.
2.4. Quais são as especificidades do trabalho com pessoas com deficiência
que devem subsidiar a formação do profissional nos cursos de
graduação em Educação Física?
2.4.1. A formação profissional em Educação Física
A formação profissional em Educação Física passou por mudanças curriculares
pautadas na necessidade de especificar os campos de atuação profissional, diferenciando a
formação do licenciado e do bacharel em Educação Física, colocando em discussão os
currículos com dimensões técnico-biológicos e desportivos em contrapartida às necessidades
do ser humano multidimensional atendido nas aulas de Educação Física. O atual currículo,
orientado pelas Diretrizes Curriculares Nacionais, deve englobar conhecimentos biológicos,
humanos e técnicos como jogos, danças, lutas, ginástica e esportes (ANDRADE FILHO, 2001;
AZEVEDO; MALINA, 2004; FERNANDES; VENDITTI JR., 2008; PORTO, 2001;).
Nos cursos de Bacharelado em Educação Física, o profissional é habilitado a atuar
em quaisquer locais onde atividades físicas e esportivas ocorram, exceto na Educação Básica,
local em que poderão atuar aqueles que frequentaram cursos de Licenciatura em Educação
11
Física. As duas graduações abrangem a relação do homem com a sociedade, as dimensões
culturais, biológicas, sociais, psicológicas do movimento, bem como a produção de
conhecimento (ANTUNES, 2007).
Fica, então, entendido que o profissional de Educação Física é responsável pela
prestação de serviços à sociedade, com uma atuação que articule os conhecimentos obtidos
na formação acadêmica com uma atuação reflexiva e capaz de transformar o ambiente no qual
irá intervir (FREIRE; VERENGUER; REIS, 2002). Lovisolo (1995), completa que o Profissional
de Educação Física é formado para relacionar conhecimentos, técnicas e tecnologias para
atingir objetivos sociais.
Assim, presume-se que esse profissional deva ter conhecimentos especializados para
lidar com a diversidade de pessoas atendidas nas aulas de Educação Física. Nesse sentido, os
cursos de graduação não podem deixar de abordar as questões relacionadas à inclusão de
pessoas com deficiência e adaptações de atividades físicas, já que essa clientela está
progressivamente buscando os locais onde as atividades físicas ocorrem, e o profissional
precisa estar pronto para atender esse público.
2.4.1.1. Inserção da disciplina Educação Física Adaptada nos cursos
graduação de Educação Física
Segundo Zavareze (2009), na década de 1980 os conteúdos discutidos durante os
cursos de graduação em Educação Física se distanciavam da realidade dos profissionais
atuantes em atividades aplicadas às pessoas com deficiências físicas, de modo que esses
cursos precisavam sofrer mudanças para atender às especificidades da diversidade do público
atendido.
As necessidades emergentes na sociedade brasileira geraram discussões na
comunidade acadêmica da área, visando uma reestruturação da formação profissional em
Educação Física. Iniciadas na década de 1970, essas discussões culminaram no Parecer
215/87 do Conselho Federal de Educação (BRASIL, 1987a), trazendo à tona a síntese de
encontros realizados durante quase uma década. Entre as mudanças curriculares apontadas
nesse parecer, está a sugestão da inclusão da disciplina Educação Física e Esporte Especial, a
ser inserida nos Conhecimentos Técnicos abordados na formação em Educação Física. O
indicado nesse parecer passou a vigorar com a publicação da Resolução 03/87 do Conselho
Federal de Educação (BRASIL, 1987b).
Kunz et al. (1998) apontam que as Instituições de Ensino Superior (IES) devem
propor uma organização curricular que inclua conhecimentos relacionados a pessoas com
diferentes e peculiares condições, de forma que o profissional se sinta apto a intervir junto a
esse público. Em geral, esses conhecimentos são relacionados às adaptações exigidas na
prática de atividades físicas e de esporte.
12
2.4.2. Afinal, o que é uma Educação Física Adaptada?
Atualmente, muitos dos cursos de formação em Educação Física oferecem pelo
menos uma disciplina para tratar das questões relacionadas ao atendimento às pessoas com
deficiência, cujo conhecimento contribui para que os futuros profissionais da área
compreendam que essas pessoas possuem necessidades muito diferentes, bem como
diferentes condições para a prática de atividade física. Por meio dessa disciplina eles podem
detectar, sobretudo, que pessoas com deficiência são encontradas não apenas em ambientes
segregados, mas podem estar presentes em quaisquer contextos atendidos por profissionais
de Educação Física.
Cidade, Freitas e Pedrinelli (2001) indicam que essa disciplina recebe diferentes
denominações, como Atividade Motora Adaptada, Educação Física Especial, Educação Física
Adaptada, entre outras. As autoras acrescentam que em algumas instituições há também
outras disciplinas que tratam em seus conteúdos, do atendimento às pessoas com deficiência,
como Basquetebol, Atividades Aquáticas, Crescimento e Desenvolvimento Humano, apontando
para o que Reid (2000) designou de “infusão de conhecimentos”. Isto é, quando a Educação
Física Adaptada é discutida nas diferentes disciplinas do currículo, através da associação de
termos, conceitos e especificidades de que cada área dispõe para contextualizar a intervenção
nessa subárea, facilitando a compreensão dos graduandos acerca do atendimento às pessoas
com deficiência.
Winnick (2004) explica que a Educação Física Adaptada é uma subárea da Educação
Física que engloba as suas intervenções típicas em programas individualizados voltados ao
atendimento das necessidades específicas das pessoas, em que adaptações são realizadas
para possibilitar a sua participação em atividades dessa natureza.
Entretanto, Pedrinelli e Verenguer (2008) ressaltam que as adaptações só devem
ocorrer em atividades que não possam ser executadas sem modificações, para que todos os
alunos se desenvolvam com os conteúdos propostos. Isso significa garantir não apenas a
participação em atividades físicas, mas que essa participação contribua com o
desenvolvimento de todas as pessoas que dela façam parte.
Não é nada fácil tratar de conceitos e definições, mas pode-se considerar que
a Educação Física Adaptada é uma parte da Educação Física cujos objetivos
são o estudo e a intervenção profissional no universo das pessoas que
apresentam diferentes e peculiares condições para a prática das atividades
físicas. Seu foco é o desenvolvimento da cultura corporal de movimento.
Atividades como ginástica, dança, jogos e esporte, conteúdos de qualquer
programa de atividade física, devem ser consideradas tendo em vista o
potencial de desenvolvimento pessoal (e não a deficiência em si)
(PEDRINELLI; VERENGUER, 2008, p. 4).
13
Reid (2000) indica que uma disciplina sobre as questões da Educação Física
Adaptada deve fornecer subsídios para que o futuro profissional conheça conceitos,
procedimentos e atitudes necessários à atuação com pessoas com deficiência, com as quais
provavelmente terá contato em algum momento de sua carreira.
É consenso que o conhecimento ensinado em Educação Física Adaptada deva
permitir que o graduando compreenda as características da pessoa com deficiência e como
isso influencia a sua prática de atividade física, levando o futuro professor de Educação Física
a ampliar suas possibilidades de atuação, contribuindo com a inclusão social dessa clientela.
Para Pedrinelli e Verenguer (2008), a disciplina Educação Física Adaptada não deve
apenas focar em classificações de deficiências, mas utilizar de leituras e discussões, vivências
motoras, utilizando-se de propostas pedagógicas diversificadas e de materiais adaptados.
Cabe ainda a visita a instituições especializadas a fim de permitir observações da realidade de
pessoas com deficiências durante a prática de atividade física.
Vale ressaltar que não basta apenas a formação de nível superior. Gonçalves (2002)
indica que os cursos de extensão, o aprofundamento de conhecimento científico específico do
assunto, abordado e atualizado pelos principais periódicos e anais de eventos, são essenciais
para que o profissional possa ser reflexivo e crítico, e assim, tenha condições de aplicar o
conhecimento adquirido, pelos diferentes meios, para discutir as possibilidades da prática de
atividades físicas por pessoas com deficiência.
Para completar nossa investigação acerca dos conhecimentos gerados por essas
disciplinas que acontecem durante a graduação em Educação Física, decidimos verificar os
objetivos, conteúdos e métodos disseminados nas disciplinas que se reportam às questões
sobre pessoas com deficiência, além de conhecer os responsáveis pelo desenvolvimento
delas.
14
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
3.1. Caracterização da pesquisa
De acordo com Laville e Dionne (1999, p. 139), “apesar da eficácia real dos
instrumentos matemáticos, grande parte dos fenômenos humanos não podem ser medidos de
maneira significativa e conservar sua riqueza”. Da mesma forma, nossa pesquisa precisa ir
além de dados quantitativos, apoiando-se numa abordagem qualitativa.
Esse pensamento corrobora com o trilhar metodológico escolhido, em que a pesquisa
descritiva de perfil, com abordagem qualitativa, subsidia a compreensão do fenômeno
formação profissional a partir da compreensão dos indicadores encontrados nos programas da
disciplina. Assim, exploramos o aporte documental com a utilização das fontes primárias de
dados (LAVILLE; DIONNE, 1999), articulado às entrevistas com os docentes responsáveis pela
mesma, favorecendo o estabelecimento de relações entre as diferentes posições adotadas
para a organização do conhecimento e condução da formação profissional em Educação Física
voltada ao atendimento da pessoa com deficiência.
3.2. Universo da pesquisa
De acordo com Richardson et.al. (1999), para constituir uma amostra, o pesquisador
deve buscar elementos que se relacionam intencionalmente com as características do estudo e
da questão levantada. A partir dessa ideia, levantamos, inicialmente, as IES públicas
(estaduais e federais) do estado de São Paulo, que oferecem cursos de formação em
Educação Física, com habilitação tanto em Licenciatura quanto em Bacharelado, buscando
identificar nesses cursos uma disciplina voltada à temática das pessoas com deficiência. A
seleção dessas instituições foi em função delas representarem a forma de pensamento
científico corrente nas mais diversas manifestações nessa área, além de algumas delas terem
sido pioneiras na implantação de disciplinas relacionadas ao tema desse estudo.
Embora tenhamos encontrado 8 IES que oferecem o curso de Educação Física, em
uma dessas instituições o curso foi implantado recentemente, de modo que as discussões
pertinentes a esse estudo ainda não são contempladas em sua grade horária. Das 7 IES que
atendiam a todas as características desse estudo, identificamos a oferta de 10 cursos, que
foram objeto de nossa análise. Optamos por constituir a amostra a partir dos cursos e não das
IES, levando em conta que as especificidades das Licenciaturas e dos Bacharelados, cujas
habilitações podem ser contempladas em uma mesma IES, poderiam constituir uma
divergência interna quando analisássemos os aspectos gerais da formação. Cabe considerar,
ainda, que alguns cursos oferecem mais de uma disciplina para discutir as questões
15
relacionadas às pessoas com diferentes e peculiares condições, de modo que as
características específicas dessas disciplinas foram agrupadas para compor um todo que
caracterizasse a visão do curso para essas especificidades.
A partir do exposto, nossa amostra foi constituída por 10 cursos em Educação Física,
oferecidos por IES públicas (estaduais e federais) do estado de São Paulo, sendo seis de
Licenciatura e quatro de Bacharelado, os quais foram identificados por algarismos arábicos.
Esses cursos foram analisados a partir de duas fontes de dados: dados documentais
e entrevistas semiestruturadas. Para efeito de identificação dos docentes que responderam à
pesquisa, serão utilizadas letras maiúsculas.
O quadro 1 apresenta um diagnóstico de todos os dados obtidos para a análise e
explicita quais docentes ministram aulas nos cursos que são objeto desse estudo. Nota-se que
alguns docentes ministram aulas em mais de um curso, e que nem todas as IES
disponibilizaram os planos das disciplinas.
Quadro 1. Dados obtidos para análise Dados
Cursos
Atividades complementares
Formação do
docente Ementa
Objetivos da
disciplina Conteúdos
Estratégias de ensino
Avaliação Bibliografia Entrevista (sujeito)
1 X X X X X X X X A
2 X X E
3 X X X X X X X X C
4 X X X X X X X X D
5 X X X F
6 X X X X X X X X C
7 X X X X X X X X B
8 X X X F
9 X X X X X X X X H1
10 X X X G
3.3. Coleta de dados
A coleta de dados foi dividida em duas etapas:
3.3.1. Primeira etapa: coleta de documentos
Essa etapa foi constituída de um levantamento das informações disponíveis no
website dos cursos, a fim de verificar a oferta de projetos de extensão, grupos de pesquisa,
docente responsável e matrizes curriculares dos cursos de Educação Física, nos quais fossem
identificadas disciplinas dedicadas à temática, com suas respectivas carga didática dedicadas
a esses estudos.
A partir desse levantamento inicial, buscamos os planos de curso das disciplinas nos
dados coletados pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Física Escolar (Gepefe) da
Universidade São Judas Tadeu, no desenvolvimento do Projeto de Pesquisa que investiga “A
1 O sujeito H não respondeu a entrevista. Os dados desse sujeito se referem apenas ao que pôde ser coletado em
seu currículo Lattes.
16
formação e a atuação do professor de Educação Física escolar: um estudo no estado de São
Paulo”, em atendimento ao Edital 2008 do Programa Observatório da Educação da parceria
CAPES / INEP / MEC.
Obtivemos os planos dos cursos 1, 3, 4, 6, 7 e 9, a partir dos quais elencamos
ementa, objetivos, conteúdos, estratégias, avaliação e bibliografia. Já dos cursos 5, 7 e 10 só
foi possível obter a ementa das disciplinas, e ainda, nenhuma informação relacionada ao plano
da disciplina ministrado no curso 2.
É imprescindível mencionar que alguns cursos apresentam mais de uma disciplina
referente à temática. Ressaltamos, porém, que ao optar pela análise do curso de forma
integrada, faremos apenas as distinções pertinentes no decorrer da análise do estudo.
Além disso, essa etapa contemplou a coleta de dados disponíveis dos professores
responsáveis por essas disciplinas, em seus currículos Lattes, visando melhor delineamento do
seu perfil.
3.3.2. Segunda etapa: entrevista semiestruturada
Os docentes foram contatados por telefone e e-mail para agendamento da entrevista,
em que foi explicitado o objetivo da pesquisa. Antes da realização da entrevista, o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecimento (Apêndice A) foi lido para os docentes, que o
assinaram, declarando sua ciência quanto aos objetivos do estudo, bem como sobre riscos e
benefícios advindos de sua participação no mesmo.
A entrevista semi-estruturada continha cinco perguntas geradoras (Apêndice B), cujas
respostas foram registradas em arquivo de áudio, devidamente autorizado por todos os
docentes participantes. Os arquivos resultantes dessas entrevistas foram descartados
imediatamente após a transcrição de seus conteúdos.
Cabe ressaltar que foram seguidos todos os procedimentos éticos para a realização
desse estudo, que foi devidamente autorizado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
Universidade São Judas Tadeu, protocolado sob o nº. 077/2010.
3.4. Procedimentos para a análise de dados
Visando ampliar a possibilidade de descoberta através da compreensão crítica do que
está explícito e implícito nos discursos analisados, buscando a compreensão do fenômeno
pesquisado, tanto para a análise documental quanto para a análise das entrevistas, foram
seguidas os momentos descritos por Martins e Bicudo (2003):
1. Buscar a descrição dos dados obtidos, com o objetivo de estabelecer o sentido
geral das concepções expostas, atentando para todos os detalhes dos discursos
encontrados.
17
2. O segundo momento se caracteriza como o de redução, no qual são selecionados
os trechos do discurso que mais chamam a atenção, os quais são transformados
em unidades de significado que representam as ideias dos sujeitos pesquisados.
3. Para Martins e Bicudo (2003), a interpretação é caracterizada pela análise de
duas variáveis finais na busca da compreensão do fenômeno estudado:
a. Análise ideográfica, representando as ideias individuais de cada elemento da
amostra;
b. Análise nomotética, que leva em conta a compreensão de diversos casos
individuais para a formulação dos pontos de convergências e divergências que
se apresentam.
18
4. ANÁLISES IDEOGRÁFICAS: UM OLHAR SOBRE AS
IDEOLOGIAS EXPRESSADAS NOS CURSOS DE EDUCAÇÃO
FÍSICA
Seguindo os procedimentos propostos por Martins e Bicudo (2003), analisamos os
documentos e as entrevistas dos professores responsáveis pelas disciplinas voltadas às
questões da Educação Física Adaptada. Desses discursos, buscamos os trechos que se
destacaram com a finalidade de obter os aspectos que poderiam compor um perfil da formação
profissional no que tange às questões da área estudada. Essas unidades elencadas se referem
às especificidades de cada curso analisado e, dentro de um todo, trazem indícios sobre as
ideologias que permeiam cada curso.
Nista-Piccolo (1993) esclarece que esse momento da análise fenomenológica implica
na atribuição dos significados às coisas a partir do olhar do pesquisador.
Isso posto, apresentamos a seguir as análises ideográficas dos cursos pesquisados.
4.1. Curso 1
É possível identificar a preocupação em discutir a Educação Física de acordo com as
novas demandas da sociedade, desse modo considerar as pessoas com diferentes e
peculiares condições é essencial para esse curso, tanto que discute essa temática em duas
disciplinas e promove a interligação desses conhecimentos com maior proximidade ao contexto
de atuação, posto a exigência de estágio e atividades complementares. Vislumbra-se então, a
interligação de ensino-pesquisa-extensão como agentes que poderão desencadear a formação
de um profissional crítico e que busque constante atualização, partindo do objetivo da disciplina
de consolidar essa formação pela inter-relação reflexão-ação e pela instrumentalização para a
busca de novos conhecimentos. Também são determinantes os aspectos atitudinais pela
valorização da diversidade e para reconhecê-la é necessário conhecer as características das
deficiências e adequar as propostas de intervenção. Dentro dessas perspectivas, nota-se boa
coerência interna entre os conteúdos, estratégias de ensino e formas de avaliação utilizadas,
exceto pela não utilização de aulas dialogadas (discussões, debates etc.) que poderiam revelar
um melhor processo reflexivo e um espaço de trocas de experiência.
4.2. Curso 2
O curso preconiza um profissional que saiba planejar, implantar e avaliar programas
de Educação Física escolar. A Educação Física Adaptada é discutida em uma disciplina, cuja
19
carga horária é pequena, na visão do professor dessa disciplina, principalmente no que tange
às vivências práticas. Nota-se que o objetivo de levar o recém-formado a perceber a
importância de suas intervenções para pessoas com deficiência pode não ser atingido se as
vivências práticas não forem oportunizadas. Há indícios de que mantenha os conhecimentos
alinhados ao contexto de atuação e que as vivências oferecidas possam ser dirimidas pela
participação em projetos de extensão oferecidos pela instituição. O curso busca amenizar essa
lacuna pela interação com as pessoas com deficiência durante as aulas, explicitando a
importância dada à promoção de atitudes positivas frente à diversidade humana, valorizando
as diferenças.
4.3. Curso 3
O curso de bacharelado oferece três disciplinas dedicadas ao estudo das atividades
físicas para pessoas com diferentes e peculiares condições. Percebe-se um grande
interessante em estudar a temática, refletindo a amplitude de possibilidades oriundas das
discussões sobre deficiência, distúrbios de saúde e esportes adaptados, que podem formar um
profissional com maiores habilidades e competências para intervir com essa população. Aliado
aos subsídios teóricos, o aluno deve cumprir horas de estágio na área, o que pode permitir
maior aproximação com o contexto de ação e ampliar a capacidade de resolver problemas
quando na atuação profissional. Além disso, há grupos de estudos e pesquisas e projetos de
extensão, que oferecem outras possibilidades de interação com essa área. Esses indicadores
revelam coerência com os objetivos propostos nas disciplinas, voltados ao desenvolvimento de
competências para implantar um programa de atividades físicas para pessoas com diferentes e
peculiares condições.
4.4. Curso 4
Articular os programas de Educação Física na esfera escolar frente aos dilemas da
realidade é instância fundamental da concepção do curso. O curso oferece duas disciplinas
voltadas às particularidades das pessoas com diferentes e peculiares condições. A primeira
subsidia para um aspecto mais geral da Educação Física Adaptada e a outra foca-se no estudo
da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), que se ocupam de discutir a inclusão das pessoas
com deficiência no ambiente escolar. É evidenciada a preocupação em articular ensino-
pesquisa-extensão como elementos essenciais para a formação de um profissional.
Considerando esses aspectos, o aluno pode, dentro da instituição, se aproximar aos contextos
de ação pela participação em grupo de estudos coordenado pelo próprio professor, que
sistematiza as práticas de pesquisa e intervenção com esse público. Revela-se, então, uma
coerência entre objetivos, conteúdos e métodos adotados nas disciplinas, que são alinhadas ao
20
objetivo do curso, ou seja, instrumentalizar o futuro professor para as práticas inclusivas no
contexto escolar.
4.5. Curso 5
O curso de bacharelado preconiza, como objetivo da disciplina Educação Física
Adaptada, instrumentalizar o graduando para o uso das ferramentas da Educação Física
visando a promoção do bem-estar das pessoas com deficiência. Partindo de pressupostos
biopsicológicos para a caracterização das deficiências, discute as possibilidades de
desenvolvimento e aprendizagem nas diferentes áreas da deficiência. A oferta de grupos de
estudos e pesquisas, bem como projetos de extensão na área, se mostra como possibilidade
de articulação e aprofundamento dos conhecimentos advindos da disciplina. Consideramos
que essa oferta pode possibilitar que o graduando venha ser um profissional mais reflexivo
sobre sua ação.
4.6. Curso 6
É um curso de licenciatura, que oferece duas disciplinas voltadas ao atendimento à
pessoa com deficiência. Nesse curso, notamos que é dada grande importância à Educação
Física Adaptada, aspecto evidenciado na existência de alta carga horária de estágio dedicada
às vivências na área.
Uma primeira disciplina aponta para um aspecto mais geral da Educação Física
Adaptada e outra mais específica quanto às especificidades de formação, estabelecendo um
vínculo com o contexto de ação. Em ambas, ocupam-se de apresentar os aspectos conceituais
da área para sensibilizar os graduandos acerca da importância de sua atuação junto a esse
público. Entretanto, fica evidente que a disciplina deixa as vivências práticas a cargo das
atividades complementares e do estágio obrigatório, que segundo a visão do professor
ampliam a capacidade de criatividade em resolver problemas quando na efetuação real da
profissão.
4.7. Curso 7
O curso foca nos aspectos da saúde, dando à Educação Física Adaptada esse olhar,
ou seja, instrumentaliza o profissional para o uso do exercício visando a prevenção, promoção,
proteção e reabilitação em saúde. Nessa perspectiva, a atuação do futuro profissional estará
voltada para a minimização das consequências das deficiências, aspecto reforçado pela
presença da palavra inadaptado no plano de curso. Notamos que o curso se posiciona
coerentemente na instituição, cujo perfil remete à área da saúde. Na disciplina, o professor faz
21
uso de uma diversidade de estratégias para o desenvolvimento dos conteúdos. Nota-se, ainda,
uma forte tendência à abordagem esportivista.
4.8. Curso 8
O curso é voltado para a atuação no contexto escolar, enfatizando a cultura corporal
de movimento aplicado ao fenômeno educativo. O graduando deverá conhecer o papel da
Educação Física nesse contexto, visando educar para a atividade física, ou seja, promover o
bem-estar com as ferramentas da área. O curso conta com uma disciplina voltada à temática
das pessoas com deficiência. Embora o documento analisado indique que a disciplina se ocupa
de discutir os aspectos conceituais e procedimentais da intervenção, oportunizando a
construção de propostas voltadas para as pessoas com deficiência, parece-nos que os
conteúdos elencados são demasiados para o tempo dedicado a esses estudos. Além disso,
não foi possível analisar as estratégias adotadas para desenvolvê-los, dificultando a
compreensão sobre o modo como os aspectos pedagógicos são abordados.
4.9. Curso 9
O curso oferece duas disciplinas para discutir as questões relacionadas às pessoas
com deficiência. Palavras como distúrbio e performance se destacam no plano de curso como
indicadoras dos objetivos dessas disciplinas. Nota-se que essas disciplinas são construídas
focando em questões conceituais da deficiência, coerentemente evidenciado nos objetivos,
conteúdos e métodos. Fica explícito que os conteúdos são voltados aos aspectos de controle
motor. Os grupos de pesquisa mantidos pela instituição reforçam essa percepção, posto que
são voltados para o condicionamento físico e o desempenho esportivo. Os dados analisados
sugerem que o curso não oportuniza situações de intervenção junto às pessoas com
deficiência.
4.10. Curso 10
O curso está voltado para a escola, olhando para ela como meio de promover as
vivências da cultura corporal do movimento, ou seja, o profissional deve estar apto para as
demandas sociais e interagir com elas. Nota-se que as duas disciplinas na área de adaptada
permitem que os alunos sejam expostos a amplas oportunidades de acompanharem
intervenções pedagógicas, fato evidenciado no plano de curso e no discurso do professor
responsável pelas disciplinas.
22
5. UM OLHAR SOBRE O NOMOS...
Em primeiro momento, olhamos para as individualidades expressadas em cada plano
de curso e nas entrevistas com os sujeitos dessa pesquisa, visando destacar os pontos que
identificaram as ideologias percebidas em cada curso.
Nesse segundo momento olhamos para o todo e buscamos os indicadores que
emergem desse olhar sobre o nomos2 (MARTINS; BICUDO, 2003), que podem desvelar os
indícios para a compreensão do fenômeno estudado. Nesse sentido, observamos os aspectos
convergentes e divergentes nos fenômenos analisados. Com essa perspectiva, apresentamos
as ideias gerais identificadas em cada etapa de nosso estudo, visando relacionar cada aspecto
de todos os cursos investigados.
5.1. Os planos de curso
Antes de iniciarmos a análise propriamente dita no que tange à organização e
distribuição curricular de todas as disciplinas relacionadas às questões da Educação Física
Adaptada, é importante ressaltar que cursos de graduação focam essa formação na
perspectiva de área de intervenção (matriz nomotética 1).
Matriz nomotética 1. Foco do curso
ASPECTOS VERIFICADOS CURSOS
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Planejamento, implantação e avaliação de programas de educação física escolar
X X X X X X
Planejamento, implantação e avaliação de programas para público geral
X X X X
Exercício físico para proteção, prevenção, promoção e reabilitação da saúde
X
Articulação com as demandas da sociedade X X X X X
Em suas propostas de habilitação (Licenciatura ou Bacharelado) é possível constatar
que o profissional formado deverá ser capaz de planejar, implementar e avaliar os programas
de Educação Física. Articulado a essas características os cursos 1, 4, 6, 9 e 10 apresentam
também que o profissional deve estar atento às novas demandas da sociedade. Notou-se
apenas uma divergência apontada pelo curso 7 indicando que o profissional deve compreender
e utilizar o exercício físico como instrumento de proteção, prevenção, promoção e reabilitação
da saúde.
2
Ao nos referimos ao Nomos, queremos explicitar que o olhar dos pesquisadores voltou-se para os aspectos gerais do fenômeno.
23
5.1.1. Carga horária e atividades complementares
Quanto a distribuição horária para o tratamento da temática, observamos, como
indicado na Tabela 1, divergências na maioria dos casos, lembrando que, como citado
anteriormente no método, alguns cursos dispõem de mais disciplinas para o tratamento da
temática (curso 1, 3, 4 e 9) que coerentemente apresentam as maiores cargas horárias.
Tabela 1. Carga horária nos cursos de graduação (indicação em horas)
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Disciplinas relacionadas à
Educação Física Adaptada 140 90 150 60 120* 120 80 60 180 90
Introdução a Língua Brasileira
de Sinais 0 0 0 30 0 0 0 0 0 0
Estágio curricular na temática 20 0 1003 0 0 100
4 0 0 0 0
Atividades acadêmicas-
científicas-culturais 20 0 0 0 0 0 0 0 0 0
TOTAL 180 90 250 90 120 220 80 60 180 90
Outro ponto de interesse é encontrado nos cursos 1, 3 e 6, por dedicarem uma carga
horária específica para a realização de estágios supervisionados, propiciando aos alunos as
vivências relacionadas à intervenção junto às pessoas com deficiência.
Ainda com olhar repousando sobre a Tabela 1, nota-se que o curso 4 como único a
oferecer a disciplina Libras, mesmo havendo legislação que determina a obrigatoriedade dessa
disciplina em todos os cursos de Licenciatura.
Destaca-se, também um asterisco na carga horária correspondente ao curso 5 para
destacar que esse responde à obtenção do grau de Bacharel e confere duas habilitações: uma
relacionadas a atividades física generalizadas e outra relacionada aos esportes., de modo que
existe uma disciplina comum a ambas as habilitações com carga horária igual a 60 horas e
outra específica a uma dessas habilitações com carga horária igual a 60 horas.
Também foi encontrado, em todos os cursos, o oferecimento de atividades
complementares, quer sejam em projetos de extensão ou em grupos de estudos, dados esses
revelados na matriz nomotética 2.
Matriz nomotética 2. Atividades complementares nos cursos de graduação
ASPECTOS VERIFICADOS CURSOS
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Grupos de pesquisa específicos sobre o tema X X X X X X X
Projetos de extensão à comunidade X X X X X X X
3 Essa informação se originou da entrevista com o professor da instituição, mas não foi explicitada nas
fontes documentais. 4 Essa informação se originou da entrevista com o professor da instituição, mas não foi explicitada nas
fontes documentais.
24
5.1.2. Ementários
Ao analisarmos o programa resumido das disciplinas, encontramos aproximações e
distanciamentos no que tange ao desenvolvimento dos conteúdos (matriz nomotética 3).
Matriz nomotética 3. Síntese das ementas
ASPECTOS ABORDADOS CURSOS
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Educação Física Adaptada: definição e características sócio-históricas.
X X X X
Caracterizações das pessoas com diferentes e peculiares condições nas esferas anatômicas, fisiológicas, neurológicas e psicológicas
X X X X X X X
Pessoas com deficiência: considerações sócio-históricas e legais
X X X X
Esportes Adaptados e Paraolímpicos X
Procedimentos Pedagógicos X X X X X X X X X
No campo das aproximações é possível observar que todos os cursos apresentam a
preocupação em desenvolver conteúdos que tangem aos procedimentos pedagógicos, cujas
unidades significativas descreviam basicamente as adaptações, a organização e administração
de atividades e formas de avaliação dos programas de atividades. O curso 2, não pode ser
considerado como uma divergência porque não disponibilizou informações para análise.
Ainda nesse campo, mas com frequência menor, os cursos 1, 3, 5, 6, 8 e 9 dão
relevância para a caracterização das pessoas com diferentes e peculiares condições nas
biológicas e psicológicas, nos quais as unidades de significado apontam para definição das
deficiências, dos distúrbios de saúde, da caracterização da deficiência física, mental, auditiva e
visual. Também foi verificado os conteúdos que apontam tanto para a Educação Física
Adaptada (cursos 1, 3, 6 e 9), quanto para a pessoa com deficiência, no que tange à sua
conceituação e desenvolvimento histórico e social (cursos 3, 5, 6 e 8).
Nos distanciamentos, encontramos apenas no curso 3 a apresentação dos Esportes
Adaptados e Paraolímpicos como conteúdos, cujo trato vai desde a história e evolução dos
esportes adaptados, a organização do esporte paraolímpico e a aprendizagem das pontuações
e regulamento das modalidades.
5.1.3. Objetivos da disciplina
Outro aspecto verificado nos documentos analisados é sobre quais “habilidades e
competências” o aluno deve deter para uma melhor atuação profissional (matriz nomotética 4).
25
Matriz nomotética 4. Objetivos das disciplinas
OBJETIVOS CURSOS
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Caracterizar as pessoas com diferentes e peculiares condições nas diversas esferas
X X X X
Planejar, implementar e avaliar programas de atividades físicas nas suas diversas manifestações
X X X X
Consolidar a atuação profissional pela inter-relação reflexão e contexto de atuação
X X X X
Reconhecer a importância da Educação Física Adaptada
X X X
Instrumentalizar para busca de novos conhecimentos
X
Não disponível X X X X
É possível perceber que não há uma eleição uniforme dos objetivos a serem
priorizados, quando comparamos os cursos. Mas percebe-se a preocupação de que ao final do
curso o aluno possua os subsídios adequados para caracterizar essa população (cursos 1, 3, 6
e 9) e que, aliado a isso, consiga intervir pela proposição das atividades físicas em suas
diversas manifestações (1, 3, 6 e 7).
Outro aspecto priorizado compete à consolidação da atuação profissional pela inter-
relação da reflexão e contexto de atuação (1, 3, 4 e 6) na medida em que participa das
discussões, planejamentos, intervenções e observações dentro dos contextos prováveis de
atuação. Outro aspecto elencado nos objetivos é o reconhecimento da Educação Física
Adaptada (cursos 1, 3 e 6), isso é, demonstrado tanto pela importância desses estudos para
essas pessoas, como por uma Educação Física orientada como processo de intervenção. O
curso 1 diverge dos demais ao colocar ainda como objetivo a meta de instrumentalizar o aluno
para a busca por fontes de informação.
5.1.4. Programa da disciplina
Apesar dos ementários suprirem a identificação dos conteúdos de base trabalhados
nas disciplinas, um programa completo permite compor melhor análise do desenvolvimento da
disciplina em questão. Vejamos a matriz nomotética 5:
26
Matriz nomotética 5. Conteúdos abordados nas disciplinas
CONTEÚDOS CURSOS
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Dimensões da Educação Física Adaptada: definições e características sociohistóricas
X X X X X
Pessoas com deficiência: considerações sócio-históricas e legais.
X X
Conceituações e caracterizações das pessoas com diferentes e peculiares condições
a) Deficiências Física, Mental, Auditiva e Visual
X X X X X X
b) Distúrbios de saúde X X X X
Esportes Adaptados e Paraolímpicos
a) Conceituação e Caracterizações sócio-históricas
X X X X
b) Modalidades esportivas X
c) Noções gerais sobre a organização de eventos esportivos
X
d) Procedimentos pedagógicos X
Aspectos desenvolvimentistas X X
Planejar, implementar e avaliar programas de atividades físicas nas suas diversas manifestações
X X X X X X
Modelos segregado e inclusivo de atendimento às pessoas com deficiência
X X X X
Corpo e imagem corporal X
Não disponível X X X X
Corroborando com a análise das ementas, é possível enxergar de forma
predominante que as conceituações e caracterizações das pessoas com diferentes e
peculiares condições (cursos 1, 3, 4, 6, 7 e 9), são os conteúdos mais desenvolvidos
abordando sobre as deficiências (física, mental, auditiva e visual), e posteriormente em alguns
desses cursos, pelo reconhecimento dos distúrbios de saúde (cursos 1, 3, 6 e 9).
Além disso, nota-se o foco na tematização dos aspectos procedimentais, haja vista
que os cursos 1, 3, 4, 6, 7 e 9 denotam que os graduandos devem dominar o planejamento, a
implementação e os procedimentos pedagógicos adequados no trato com essas pessoas.
Seguindo essas características o profissional deve reconhecer em qual momento as atividades
físicas devem ser organizadas de forma inclusiva ou segregadas (cursos 1, 6, 7 e 9).
Já os estudos das dimensões da Educação Física Adaptada, que buscam
compreender o fenômeno a partir de sua construção histórica e social, desvelando como se
deu o tratamento das temáticas em períodos longínquos até chegarmos aos dias atuais, foram
encontrados nos cursos 1, 3, 4, 6 e 9.
Nesse mesmo raciocínio, com olhar para o contexto das dimensões das pessoas com
deficiência, encontramos apenas nos cursos 4 e 7 a discussão dessa temática. Nessa
perspectiva analisamos a terminologia empregada nos documentos para designar as pessoas
com diferentes e peculiares condições (matriz nomotética 6) e constatamos que o termo
pessoa com deficiência é utilizado na maioria dos cursos (2, 4, 6, 7 e 10); pessoas portadoras
de necessidades especiais (1 e 9); termos como: grupos diferenciados, inaptos (identificados
como inadaptados nos planos de curso), indivíduos portadores de deficiência e alunos em
27
condições de deficiência foram citados apenas uma vez (respectivamente, nos cursos 3, 7, 9 e
6). Não foi possível identificar a nomenclatura utilizada nos cursos 5 e 8.
Matriz nomotética 6. Terminologia empregada para designar a pessoa com diferentes e peculiares condições
CONTEÚDOS CURSOS
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Pessoas com deficiência X X X X X
Pessoas portadoras de necessidades especiais X X
Grupos diferenciados X
Inadaptados X
Indivíduos portadores de deficiência X
Alunos em condições de deficiência X
Não disponível X X
Ainda no rol de conteúdos elencados, visualizamos o desenvolvimento dos Esportes
Adaptados e Paraolímpicos numa frequência um pouco maior do que na encontrada na análise
dos ementários, com sua discussão centrada na sua conceituação e evolução história (cursos
3, 4, 7 e 9). Já o curso 3, como justificado no ementário, é o único a desenvolver, dentro dessa
perspectiva, conteúdos que abordam as modalidades esportivas, os procedimentos
pedagógicos e as noções gerais sobre a organização de eventos esportivos.
Também foram elencados os aspectos desenvolvimentistas como conteúdos de
trabalho (cursos 1 e 9). E, por último, uma divergência, foi encontrado como temática o “o
corpo e imagem corporal” no curso 7, apenas citado no plano de curso, impossibilitando a
análise sobre o modo como esse conteúdo se relaciona aos estudos sobre a temática da
Educação Física Adaptada nesse curso.
5.1.5. Estratégias de ensino
Matriz nomotética 7. Estratégias adotadas para o desenvolvimento dos conteúdos
ESTRATÉGIAS CURSOS
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Aulas expositivas X X X X X
Aulas dialogadas X X X X X
Visitas técnicas X X
Práticas simuladas X X X X X
Seminários e apresentação de trabalhos X X X X
Estudos dirigidos X X X
Elaboração de tarefas X X X X
Não disponível X X X X
Como pode ser visualizado na matriz nomotética 7, as aulas expositivas (cursos 1, 3,
4, 6 e 9), as práticas simuladas (cursos 1, 3, 4, 6 e 7) e as aulas dialogadas (cursos 3, 4, 6, 7 e
9) que compreendem as discussões, debates, trocas de experiência e dinâmicas de grupo
foram as estratégias predominantes utilizadas para o desenvolvimento dos conteúdos do curso.
28
Em seguida aparecem a elaboração de tarefas – pesquisas bibliográficas, projetos,
relatórios etc. (cursos 1, 3, 6 e 7); seminários e apresentação de trabalhos (cursos 3, 6 ,7 e 9);
os estudos dirigidos – leituras, filmes etc. (cursos 1, 4, 7). E por fim as visitações técnicas
nocursos 4 e 7.
A diversidade das estratégias apresentadas nos planos de curso analisados denota a
preocupação dos cursos em buscar formas diferenciadas para o desenvolvimento dos
conteúdos relacionados à temática das pessoas com deficiência, fazendo uso de uma
variedade de recursos que podem levar os graduandos a uma maior apropriação desses
conteúdos.
5.1.6. Avaliação
Quanto à avaliação das atividades discentes (matriz nomotética 8), a predominância
se encontra na elaboração de tarefas (cursos 1, 3, 4, 6, 7 e 9), seguidos pela
participação/frequência as aulas (cursos 1, 3, 4, 6 e 7), leitura dos materiais indicados (cursos
1, 3, 4 e 6), avaliações (teóricas e orais) encontradas nos cursos (3, 6, 7 e 9) e pela
apresentação de seminários (cursos 3 e 7).
Nota-se que os cursos analisados adotam instrumentos de avaliação que contemplam
os conhecimentos conceituais e procedimentais, mas os planos de curso não esclarecem sobre
os meios utilizados para avaliar os conhecimentos atitudinais. Além disso, não fica claro o
objetivo dos professores que avaliam a participação do aluno.
Matriz nomotética 8. Instrumentos avaliativos adotados nas disciplinas
INSTRUMENTOS AVALIATIVOS CURSOS
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Participação, Frequência as aulas X X X X X
Elaboração de Tarefas (fichamentos, relatórios, resenhas, etc.)
X X X X X X
Leitura dos materiais indicados X X X X
Seminários X X
Avaliações (teóricas e orais) X X X X
Não disponível X X X X
5.1.7. Bibliografia
Buscou-se também identificar qual a bibliografia utilizada nos cursos de graduação
como forma de compreender qual literatura está sendo utilizada para subsidiar o conhecimento
sobre as temáticas referentes à Educação Física Adaptada. A bibliografia não foi separada em
complementar e básica; optou-se por criar uma única lista cujas obras foram citadas ao menos
em 3 cursos; tal lista é apresentada na matriz nomotética 9.
29
Matriz nomotética 9. Bibliografia comum a pelo menos 3 cursos
BIBLIOGRAFIAS CURSOS
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
SHERRIL, C. Adapted Physical Activity, Recreation and Sport: Crossdisciplinary and Lifespan, 5 ed. Dubuque: McGraw-Hill., 1998.
X X X X X
GORGATTI, M. G.; COSTA, R. F. (Orgs.). Atividade Física Adaptada: qualidade de vida para pessoas com necessidades especiais. Barueri: Manole, 2005.
X X X X
MAUERBERGDE-CASTRO, E. Atividade Física Adaptada. Ribeirão Preto: Tecmedd, 2005.
X X X X
WINNICK, J. P. (Org.) Educação Física e Esportes Adaptados. São Paulo: Manole, 2004.
X X X X
Não disponível X X X X
SEAMAN, J. A.; DEPAUW, K. The new Adapted Physical Education: a developmental approach. California: Mayfield Publishing Company, 1982.
X X X
SOUZA, P. A. O esporte na paraplegia e tetraplegia. Rio de Janeiro, Ed. Guanabara Koogan, 1994.
X X X
DUARTE, E.; LIMA, S. M. T. Atividade Física para Pessoas com Necessidades Especiais: experiências e intervenções pedagógicas. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2003.
X X X
WINNICK, J. P.; SHORT, F. X. Testes de Aptidão Física para Jovens com Necessidades Especiais. 3 ed., São Paulo, Manole, 2001.
X X X
Apesar do livro de SHERRIL, C. Adapted Physical Activity, Recreation and Sport:
Crossdisciplinary and Lifespan, 5 ed. Dubuque: McGraw-Hill., 1998, ter sido o mais citado entre
os cursos (1, 3, 6, 7 e 9), nota-se também uma grande convergência dos cursos 3, 4, 6 e 7 ao
se basearem nos livros em comum: GORGATTI, M. G.; COSTA, R. F. (Orgs.). Atividade
Física Adaptada: qualidade de vida para pessoas com necessidades especiais. Barueri:
Manole, 2005; MAUERBERGDE-CASTRO, E. Atividade Física Adaptada. Ribeirão Preto:
Tecmedd, 2005; WINNICK, J. P. (Org.) Educação Física e Esportes Adaptados. São Paulo:
Manole, 2004.
Outras referências citadas pelos cursos foram: SEAMAN, J. A.; DEPAUW, K. The
new Adapted Physical Education: a developmental approach. California: Mayfield Publishing
Company, 1982 (cursos 1, 4 e 9); SOUZA, P. A. O esporte na paraplegia e tetraplegia. Rio
de Janeiro, Ed. Guanabara Koogan, 1994 (cursos 1, 7 e 9); DUARTE, E.; LIMA, S. M. T.
Atividade Física para Pessoas com Necessidades Especiais: experiências e intervenções
pedagógicas. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2003 (cursos 3, 4 e 6); WINNICK, J. P.;
SHORT, F. X. Testes de Aptidão Física para Jovens com Necessidades Especiais. 3 ed.,
São Paulo, Manole, 2001 (cursos 3, 6 e 7).
Os quatro livros mais citados nos cursos analisados abordam conhecimentos gerais
sobre a Educação Física Adaptada, começando com a apresentação da área do conhecimento,
30
passando pela descrição das deficiências e distúrbios de saúde, finalizando com a descrição as
especificidades das intervenções junto a essas pessoas.
Nota-se que a publicação da maior parte dos livros citados foi posterior ao ano 2000,
embora haja 2 livros publicados na década de 1990 e um publicado na década de 1980.
Apenas os cursos 1 e 9 adotam as três bibliografias mais antigas.
5.2. Os professores
Os perfis dos professores das disciplinas relacionadas ao tema Educação Física
Adaptada foram analisados como parte das fontes documentais por meio de seus Currículos
Lattes, e complementados a partir das entrevistas, nas quais buscamos agrupar todos os
dados coletados com a finalidade de se obter um diagnóstico mais próximo da realidade sobre
esses professores.
5.2.1. Análise do Currículo Lattes
Além de caracterizar a área de formação pela análise dos documentos, achamos
interessante investigar a formação do docente visando identificar sua proximidade com a área
da Educação Física Adaptada, posto que isso pode contribuir de maneira significativa na
aprendizagem dos alunos (matriz nomotética 10). Declaramos que todos os dados
relacionados na matriz dizem respeito à profissão do docente enquanto responsável por
disciplinas específicas do tema em questão.
Matriz nomotética 10. Generalidades detectadas nos professores responsáveis pelas disciplinas
ASPECTOS VERIFICADOS SUJEITOS
A B C D E F G H*
Experiência na área
0-10 anos X
11 a 20 anos X
Mais de 20 anos X X X X X X
Produções bibliográficas
Artigos X X X X X X X X
Capítulos de livros X X X X X X X
Obras completas X X X X X X
Desse modo, investigamos sua experiência na área e constatamos que a maioria tem
mais de 20 anos de atuação com essa temática (sujeitos C, D, E, F, G, H), sendo que apenas
um tem de 0 a 10 anos de experiência (sujeito A) e outro com experiência entre 11 e 20 anos
(sujeito B). Verificamos também sua preocupação com a pesquisa e avanço da área por meio
de sua produção bibliográfica, assim constatamos que todos eles têm artigos publicados sobre
Educação Física Adaptada; e apenas um deles não publicou capítulos de livros, o sujeito A,
que não tem essa produção em seu currículo; quanto à publicação de obras completas, apenas
31
os sujeitos A e G não apresentam essa publicação. Isso vem demonstrar que os docentes
envolvidos com essa temática nos cursos de graduação em Educação Física têm produção
científica na área, permitindo maior domínio sobre o tema em questão.
5.2.2. Entrevista
A entrevista foi iniciada com a questão “Conte-me a sua trajetória na área da
Educação Física Adaptada”, objetivando a obtenção de informações sobre a experiência do
professor e as especificidades de sua atuação na área pesquisada. Dada a amplitude dos
temas que poderiam surgir a partir dessa pergunta geradora, optamos por separar as respostas
em cinco grandes categorias, expressadas na matriz nomotética 11:
1. Início do envolvimento com a área Educação Física Adaptada;
2. Início do envolvimento com a disciplina Educação Física Adaptada;
3. Presença de disciplina Educação Física Adaptada (ou similar) em sua graduação;
4. Estudos realizados na área;
5. Intervenções desenvolvidas na área.
Houve grande convergência com relação ao início do envolvimento com Educação
Física Adaptada, posto que a maioria dos professores se interessou pela área durante a sua
própria graduação, através dos estágios e projetos de extensão oferecidos pela instituição nas
quais se formaram. As divergências apresentadas na matriz ficaram por conta do sujeito A, que
se envolveu com a área já como professor, pela ausência de um profissional habilitado que
pudesse ministrar a disciplina. Já o sujeito C relata que seu interesse ocorreu como processo
natural, pois era voluntário em instituições especializadas no atendimento às pessoas com
deficiência, e foi convidado a integrar um grupo de intervenção na instituição em que era
professor.
Voltamos o olhar para o início do envolvimento desses professores com a respectiva
disciplina, buscando compreender quais as circunstâncias que levaram os professores a
começar a ministrá-la. Foi possível verificar uma convergência entre os sujeitos D, E e G, cujo
envolvimento foi parte de um processo natural desencadeado por suas pesquisas na área. Os
sujeitos C e F declaram que fizeram parte dos grupos que discutiram a inserção dessa
disciplina nos currículos dos cursos de Educação Física. O sujeito A diverge dos demais,
levando em conta que seu envolvimento teve início já como professor da disciplina.
Com relação à formação desses professores, verificamos se ela contemplou
disciplinas específicas sobre a temática das pessoas com deficiência. Entre os sujeitos que
explicitaram essa questão, o sujeito D declara que a instituição em que se graduou foi uma das
primeiras a inserir essa disciplina, ao passo que o sujeito F informa que sua formação não
contemplou essas questões. A grande divergência dessa questão fica por conta do sujeito C,
que afirma não ser graduado em Educação Física, e que por essa razão, sua formação não
contemplou esses conhecimentos.
32
Matriz nomotética 11. Trajetória dos professores responsáveis pela disciplina nos cursos pesquisados
ASPECTOS VERIFICADOS SUJEITOS
A B C D E F G
Início do envolvimento com a Educação Física Adaptada
Durante a graduação X X X X
Estágio X X
Projeto de extensão X X
Como professor da disciplina X
Trabalho voluntário X
Início do envolvimento com a disciplina Educação Física Adaptada
Envolvimento profundo com a criação da disciplina nas IES
X X
Envolvimento acidental com a disciplina X
Processo natural desencadeado por suas pesquisas na área
X X X
Presença de disciplina Educação Física Adaptada (ou similar) em sua graduação
Sim X X
Não X
Não é da área X
Estudos realizados na área
Orientação de trabalhos na área X
Curso técnico X X
Pós-graduação X X X X
Nunca desenvolveu estudos na área X
Intervenções desenvolvidas na área
Educação Física escolar X X
Esporte adaptado X X X
Dança X X
Reabilitação X
No aspecto relacionado aos estudos realizados na área, notamos convergência entre
os sujeitos B, E, F e G, que realizaram seus estudos de Pós-graduação em Educação Física
Adaptada. Há, também, convergência entre os sujeitos B e D, que participaram de cursos
técnicos na área. O sujeito C declara que sua contribuição com os estudos na área estão
relacionados aos trabalhos orientados por ele, dada a sua experiência com o público
pesquisado e a sua titulação na época em que começaram a surgir estudos nessa área. O
sujeito A diverge dos demais sujeitos por indicar explicitamente que não apenas não
desenvolve estudos na área como não é uma pessoa que costuma frequentar eventos
científicos de Educação Física Adaptada, corroborando seu apontamento inicial que revela que
o envolvimento com a Educação Física Adaptada foi acidental em função da falta de
professores.
Voltamos o olhar para os locais em que os professores realizaram intervenções em
Educação Física Adaptada, verificando que a maior convergência relacionada aos diferentes
contextos de atuação diz respeito aos esportes adaptados e paraolímpicos, destacados pelos
sujeitos B, C e D. A dança foi citada pelos sujeitos F e G, a Educação Física escolar pelos
33
sujeitos A e G e a reabilitação em locais especializados foi indicada pelo sujeito E. Nota-se,
então, que todos os professores já realizaram intervenções em Educação Física Adaptada,
embora o sujeito A indique que essa intervenção se deu nas escolas de aplicação da própria
IES em que atua, após o seu envolvimento com a disciplina.
A segunda e a terceira perguntas da entrevista “Em sua opinião, quais as
contribuições dos programas de Educação Física para as pessoas com deficiência?” e “Como
é desenvolvido o programa da disciplina Educação Física Adaptada ministrado por você?”
resultaram em respostas que apontavam para os conteúdos abordados e métodos adotados na
disciplina, de modo que as respostas foram agrupadas em cinco grandes categorias (matriz
nomotética 12), relacionadas à disciplina ministrada pelo professor entrevistado e por outras
disciplinas presentes no currículo do curso em que atua..
1. Objetivos;
2. Conteúdos;
3. Estratégias adotadas;
4. Vivências;
5. Percepções dos professores.
Matriz nomotética 12. Desenvolvimento da disciplina ministrada
ASPECTOS VERIFICADOS SUJEITOS
A B C D E F G
Objetivos
Aspectos atitudinais X X X X
Aspectos procedimentais X X
Conteúdos:
Perfil da disciplina EFA X
Características das pessoas com diferentes e peculiares condições
X X X X
Aspectos pedagógicos X X X X
Esportes X
Métodos
Leituras X X
Analise de propostas de intervenção X X
Discussão de vídeos X X X X
Utilização de blog X
Contato com pessoas com deficiência X
Aulas expositivas X X
Vivências X X X
No que tange aos objetivos, houve convergência entre os sujeitos A, C, D e E, que
destacaram objetivos relacionados a aspectos atitudinais, como despertar os sentimentos de
fraternidade e igualdade, sensibilizar o aluno para as questões relacionadas às pessoas com
deficiência. Os sujeitos A e F convergiram ao apontar para objetivos relacionados a aspectos
procedimentais, como construir propostas de intervenção para as pessoas com deficiência.
34
Quanto aos conteúdos, os sujeitos B, C, E e G discutem em suas aulas as
características das pessoas com diferentes e peculiares condições, englobando características
anatômicas, fisiológicas, emocionais, psicológicas e os aspectos etiológicas das patologias.
Outro aspecto bastante citado foram os aspectos pedagógicos, relacionados às intervenções e
estratégias de ensino adequadas a esse público. Esse conteúdo foi citado pelos sujeitos B, C,
F e G. Notamos que o sujeito F foi o único a citar as discussões relacionadas ao perfil da
disciplina Educação Física Adaptada, enquanto apenas o sujeito C indica adotar em suas aulas
o tema esportes adaptados.
Com relação às estratégias adotadas pelos professores, houve uma diversidade de
respostas, das quais a mais convergente foi a apresentação e discussão de vídeos que
reportassem às questões das pessoas com deficiência, os quais eram utilizados para gerar a
reflexão sobre o tema e a discussão de estratégias de intervenção. Essa estratégia é adotada
pelos professores B, C, E e G. Os sujeitos A e B adotam leituras, enquanto os sujeitos E e G
indicaram aulas expositivas para abordar os temas da aula. O professor B afirmou que seus
alunos utilizam blog, mas não esclareceu de que modo essa estratégia é utilizada. Os
professores A e G convergem ao sugerir que a análise de propostas de intervenção faz parte
de suas estratégias, como forma de aproximação aos contextos reais de atuação. Nesse
sentido, podemos considerar que o sujeito E também busca essa aproximação, haja vista que
afirma levar pessoas com deficiência para ter contato com seus alunos, visando quebrar
paradigmas relacionados a essa atuação.
As vivências práticas foram citadas pelos sujeitos A, C e E, incluindo estágio,
situações de prática simulada e oportunidades de vivenciar as dificuldades encontradas pelas
pessoas com deficiência, fazendo uso de implementos como vendas e cadeiras de rodas para
identificação dessas dificuldades.
A quarta questão da entrevista “Em sua opinião, quais as principais contribuições da
disciplina Educação Física Adaptada na formação dos seus alunos?” objetivava obter as
considerações do professor sobre as contribuições que suas aulas trazem ao conhecimento
específico dos egressos do curso de Educação Física. Os resultados estão expressos na
matriz nomotética 13.
Notamos que houve grande convergência relacionada aos aspectos atitudinais, posto
que apenas o sujeito F não citou nenhuma contribuição relacionada a esse aspecto. O principal
item citado foi a sensibilização para a mudança de atitudes com relação às pessoas, levando à
compreensão da individualidade e diversidade, bem como para a ruptura da barreira de
relacionamento. No que se refere aos aspectos procedimentais, os sujeitos B, C e F indicam
que seus alunos passam a conhecer os aspectos pedagógicos que irão auxiliá-los em
intervenções com diferentes grupos. A grande divergência encontrada nessa questão está
relacionada aos aspectos conceituais, citado apenas pelo sujeito B, que destaca que seus
alunos passam a conhecer os aspectos etiológicos das doenças.
35
Matriz nomotética 13. Contribuições de sua disciplina para a formação dos alunos
ASPECTOS VERIFICADOS SUJEITOS
A B C D E F G
Aspectos atitudinais X X X X X X
Atitudes positivas frente à deficiência X X X
Ruptura com a dificuldade de relacionamento
X
Instrumentalização para a busca de novos conhecimentos
X X X
Compreensão da individualidade e diversidade
X
Aspectos conceituais X
Conhecimento de aspectos etiológicos X
Aspectos procedimentais X X X
Conhecimento de aspectos pedagógicos X X
Auxílio em todo tipo de intervenções X
A última questão da entrevista “Para você, qual seria o modelo ideal de formação
para que o profissional esteja apto a atuar no universo das pessoas com deficiência?”,
objetivava traçar um perfil de uma disciplina que contemplasse adequadamente as questões da
Educação Física Adaptada, a partir das considerações do professor. As respostas estão
representadas na matriz nomotética 14.
Matriz nomotética 14. Conteúdos e formatos essenciais para um modelo ideal de formação em Educação Física Adaptada
ASPECTOS VERIFICADOS SUJEITOS
A B C D E F G
Infusão de conhecimentos X X X X
Conteúdos X X X
Conceitos e conteúdos típicos da EFA X X X
Modalidades esportivas adaptadas X
Conteúdos típicos da Educação Física X
Conhecimentos sobre diferentes faixas etárias X
Pesquisa X
Discussão de aspectos atitudinais X
Estágio e residência X X
Estratégias de intervenção X X X
Nesse sentido, houve convergência entre os sujeitos B, D, E e G, que citaram a
infusão de conhecimentos como modelo ideal, no qual os conhecimentos gerais sobre a área
deveriam estar integrados nas diferentes disciplinas do currículo, cabendo à disciplina
específica discutir os aspectos pedagógicos. O sujeito D destaca, ainda, que se espera que o
processo de discussão dessa área seja tão profundo que não seja mais necessário separar
uma disciplina pra discutir as questões relacionadas às pessoas com deficiência.
Os sujeitos A, B e C convergiram ao reportarem-se aos conteúdos que deveriam ser
adotados nessas aulas, os quais são típicos da Educação Física Adaptada, englobando a
pessoa com deficiência, as nomenclaturas adequadas para se referir a elas, os esportes
adaptados e paraolímpicos. O sujeito C destaca, ainda, que a formação deveria contemplar os
36
conteúdos típicos da Educação Física de uma forma profunda, assim como os conhecimentos
sobre as diferentes faixas etárias, visando subsidiar o futuro profissional que deseje adequar
uma atividade às especificidades do público atendido.
No que tange às vivências práticas, notamos que os sujeitos B, D e G concordam que
a formação deve contemplar as práticas simuladas, para que o aluno tenha segurança em
escolher aquelas que se adequem às situações que encontrará em sua prática profissional. Já
os sujeitos A e E concordam que os alunos precisam realizar algumas vivências em programas
de estágios que aprofundem a compreensão da realidade de intervenção junto a esse público.
Apenas o sujeito C citou que a formação ideal deve contemplar pesquisas na área para o
aprofundamento dos conhecimentos do graduando, embora tenha sido possível observar que a
maioria deles se preocupa com a evolução do conhecimento científico, publicando estudos
sobre esse tema.
37
6. CRUZANDO DADOS, DESVELANDO O FENÔMENO...
Na tentativa de desvelar o que ficou implícito ao olhar para o fenômeno a partir de
duas diferentes fontes de dados, optamos por cruzá-los para que fosse possível complementar
o que foi dito pelos professores e não foi contemplado nos planos de curso analisados, bem
como analisar se aquilo que foi dito se contrapõe ao que foi encontrado nos planos de curso.
Cabe ressaltar que não é objetivo desse estudo indicar um curso melhor ou pior,
apenas diagnosticar o modo como esses cursos podem contribuir com a capacitação de
profissionais que venham a intervir junto às pessoas com diferentes e peculiares condições.
Isso posto, discutimos a seguir os aspectos gerais sobre os docentes responsáveis
pelas disciplinas, os aspectos gerais dos cursos para, por fim, discutir as disciplinas específicas
que abordam as questões relacionadas à Educação Física Adaptada.
6.1. Docentes responsáveis pelas disciplinas
Partindo das convergências encontradas no que tange à experiência dos professores
que ministram as disciplinas de Educação Física Adaptada nos cursos pesquisados, percebe-
se que lidamos com pessoas com uma vasta experiência nessa área de atuação. De acordo
com Tardif (2002), quanto mais experiente for o professor, mais consolidados estão os seus
conhecimentos, não apenas no que se refere aos conhecimentos específicos, mas também
com relação às suas estratégias de intervenção. Podemos considerar, então, que a extensa
experiência dos docentes pode refletir em uma melhor apropriação dos saberes pelos
graduandos.
Além disso, todos os professores da disciplina realizaram intervenções junto às
pessoas com diferentes e peculiares condições, sugerindo que o docente poderá ter maior
facilidade para demonstrar aos alunos a aplicação dos saberes disseminados em sua aula.
Essa posição também é apoiada por Tardif (2002), quando aponta que a integração dos
saberes teóricos e práticos validam os saberes técnicos. Assim, quando esses conteúdos são
discutidos com os alunos da graduação, os professores poderão, junto aos seus alunos,
estabelecer as relações necessárias entre as questões teóricas demonstradas e suas
problemáticas concretas.
As convergências encontradas apontam, ainda, que essas experiências práticas na
área refletiram em suas contribuições literárias para a disseminação do conhecimento, fato
encontrado na maior parte dos professores. Entretanto, um dos professores revela uma
realidade diferente, dada a sua inserção acidental na área já como docente. Há que se
considerar, porém, que isso acabou levando o professor a estudar a Educação Física
Adaptada, culminando na publicação de um artigo, ou seja, esse envolvimento propiciou um
aprofundamento dos conhecimentos não só dos seus alunos, como de si próprio.
38
6.2. A estrutura do curso
De uma forma geral, os cursos estão voltados à formação de profissionais capazes
de elaborar, implantar e avaliar programas de intervenção em atividade física, nos contextos
específicos de atuação, de acordo com a habilitação oferecida. A maior divergência encontrada
revela-se quando analisamos o curso 7, que dá ênfase às questões relacionadas ao modelo
médico. Trazendo essa questão para o objeto desse estudo, encontramos em Mauerberg-
deCastro (2005) um indicador de que a perspectiva da deficiência como algo a ser curado pode
se agravar quando o modelo médico é adotado. Nessa perspectiva, é ampliada a
estigmatização dessas pessoas, posto que evoca, principalmente, a minimização das
consequências das doenças e não as oportunidades de crescimento coletivo que essa
diversidade pode gerar.
Um diferencial encontrado nos cursos 1, 3 e 6, é a obrigatoriedade de estágio
supervisionado em Educação Física Adaptada. Consideramos que isso pode favorecer a
relação entre os conteúdos abordados nas disciplinas específicas e os contextos de atuação.
Essa posição é endossada por Palla e Mauerberg-deCastro (2004), que afirmam que a
implantação de estágio obrigatório em Educação Física Adaptada é um meio de combater a
falta de qualificação profissional para atuação com pessoas com deficiência, assim como
reforçar os conteúdos tratados durante as aulas da disciplina.
Outra característica marcante encontrada nos cursos é a alta convergência quanto à
oferta de atividades complementares, que se configuram como grupos de estudo e pesquisa e
projetos de extensão. Nesse sentido, entendemos que as IES públicas do estado de São Paulo
se distanciam dos dados apresentados por Fernandes e Venditti Jr. (2008), que sugerem
precariedade desse tipo de atividade na área de Educação Física Adaptada quando se referem
às IES em geral.
Há que se considerar, ainda, que apesar da convergência total no quesito da
existência de projetos que contemplem o aprofundamento dos conhecimentos do graduando,
apenas o professor C citou que a formação ideal deve contemplar pesquisas na área.
Entretanto, por si só esse indício não revela que os demais professores não dêem importância
à existência dessas iniciativas, principalmente se considerarmos que a maioria deles tem um
forte histórico pessoal relacionado a grupos de pesquisa e projetos de extensão.
A importância desse dado está relacionada ao papel das atividades complementares
como um diferencial para a formação dos professores dessa disciplina nos cursos
pesquisados. Vieira, Vieira e Fernandes (2006) corroboram o entendimento da importância
dessas práticas, ao apontarem que são desencadeadoras de relações entre teoria e prática,
permitindo que os conhecimentos e as ações sejam integrados, além de oferecerem na
formação de um sujeito oportunidades de reflexão sobre essa ação.
É possível compreender que o aumento de vivências práticas junto às pessoas com
deficiência pode sanar algumas das dificuldades encontradas pelos profissionais recém-
formados que se deparam em suas aulas com uma diversidade biológica, social, psicológica e
39
cultural. Consideramos, ainda, que a existência dessas atividades de extensão e de pesquisa
contribuiu para que os professores se constituíssem como disseminadores do conhecimento da
área. Assim, a oferta dessas atividades poderá instigar o interesse dos graduandos nessa área
em especial.
Gonçalves (2002) esclarece que as atividades de pesquisa e extensão são
mediadoras da formação, contribuindo para que o aluno reflita sobre a atuação e reduza as
barreiras existentes entre a teoria e a prática. Desse modo, consideramos que as atividades de
extensão e pesquisa são inerentes à formação profissional, e por essa razão, podem não ter
sido citadas pelos professores pesquisados.
No que tange aos componentes presentes na matriz curricular dos cursos analisados,
encontramos dados reveladores sobre as horas dedicadas, especificamente, ao estudo das
questões voltadas às pessoas com diferentes e peculiares condições.
É possível verificar que os cursos dedicam entre 60 e 250 horas ao estudo das
questões relacionadas à Educação Física Adaptada, ou seja, há diferenças significativas entre
as IES. No estudo de Gonçalves (2002), que analisa os cursos de Educação Física das IES do
estado de Goiás, verifica-se que a carga didática dedicada a essas questões é de 60 a 128
horas/aula, de modo que percebemos que a carga horária mínima é a mesma, mas os cursos
paulistas que foram objeto desse estudo estão dedicando maior tempo de estudos a essas
questões, principalmente os cursos (3 e 6), nos quais a temática da pessoa com deficiência é
abordada em mais de 200 horas de carga de estudos. Isso pode representar um avanço para a
compreensão dessa área como componente indispensável para a formação dos alunos.
Com relação à existência de disciplina dedicada ao estudo da Linguagem Brasileira
de Sinais, verificamos que apenas um curso contempla essas questões em disciplinas
obrigatórias, o que leva ao entendimento de que esse curso está preocupado com a relevância
da ampliação das formas de comunicação e tratamento didático junto às pessoas com
deficiência auditiva. Tendo em vista que seis cursos de Licenciatura fizeram parte desse
estudo, notamos que apenas o curso 4 já se adequou com o disposto no Decreto nº 5.626, de
22 de dezembro de 2005 (BRASIL, 2005), que prevê em seu capítulo II que a disciplina Libras
deveria ser obrigatória em todos os cursos de Licenciatura, sendo optativa nos demais cursos
de nível superior.
Assim, consideramos que as IES que não contemplam essa disciplina precisam
adequar-se para atender a esses pressupostos legais, haja vista que até 2009 deveriam ter
sido feitas as alterações no currículo dos cursos de Licenciatura para a inserção dessa
disciplina. Isso posto, verificamos que um dos cursos de Licenciatura analisados está em
consonância com esses pressupostos.
Dando continuidade à análise dos resultados, discutimos a seguir os aspectos gerais
relacionados ao desenvolvimento das disciplinas supracitadas.
40
6.3. Desenvolvimento das disciplinas específicas
De uma forma geral, os planos de curso das disciplinas apresentam objetivos que
apontam principalmente para aspectos procedimentais, embora também sejam citados os
aspectos conceituais e atitudinais. Os cursos 1, 3 e 6 citam as três dimensões do
conhecimento, enquanto o curso 4 e 7 referem-se apenas aos conhecimentos procedimentais e
o curso 9 só aos conceituais. Entretanto, quando analisamos o discurso dos docentes, são
citados apenas os objetivos que se reportam a aspectos atitudinais e aspectos procedimentais,
sendo que os atitudinais são prevalentes.
Essa incoerência é reforçada quando verificamos os itens classificados como
aspectos atitudinais. Nos planos de curso, essa dimensão é representada pelo reconhecimento
da importância da área. Nas entrevistas, os docentes citaram principalmente a sensibilização
para as questões relacionadas às pessoas com deficiência.
Desse modo, há indícios de falta de clareza dos planos de curso no que tange aos
objetivos, porque podem não expressar aquilo que os professores declaram ser elemento
constituinte de suas aulas.
Pensando que esses objetivos norteiam os conteúdos das disciplinas analisadas,
verificamos na análise dos discursos se a prevalência dos aspectos atitudinais se reflete nos
conteúdos elencados. Contudo, as convergências identificadas nos planos de curso indicam a
prevalência da dimensão procedimental, e nas entrevistas, identificamos a prevalência dos
conteúdos conceituais. A dimensão procedimental refere-se à caracterização e análise de
procedimentos pedagógicos, a dimensão conceitual refere-se aos aspectos históricos,
características da Educação Física Adaptada, dos esportes e das pessoas com diferentes e
peculiares condições.
Entendemos que os resultados encontrados quanto aos conteúdos vão ao encontro
do que Gonçalves (2002) identificou em seu estudo, posto que os mesmos conteúdos aqui
elencados se fizeram presentes nos programas analisados pela autora. Nesse sentido, há
convergência na seleção de conteúdos entre as IES paulistas e as goianas.
Entretanto, antes de considerar que haja incoerência na seleção dos conteúdos, de
modo que estes não atendam a todos os objetivos elencados, uma visão pormenorizada
permite inferir que o conhecimento das características das pessoas com deficiência, além de
permitir a adequação das intervenções, pode ser permeada por discussões acerca das atitudes
adequadas a serem dirigidas a essas pessoas, de acordo com as peculiaridades de cada um.
Além disso, a discussão acerca da deficiência e sua construção histórica e social, poderá
remeter às relações estabelecidas entre o tratamento dirigido à pessoa com deficiência em
contextos de atividade física. Dessa maneira, embora as questões atitudinais não tenham sido
explicitadas nos discursos, há indícios de que os professores buscam estratégias para que
essa sensibilização emerja das discussões realizadas em aula, conforme o trecho abaixo:
41
Sujeito A: “Aí a gente lia livros, livros mesmo, romances que tratavam da questão da
inclusão e cinema também. Vários filmes que discutiam em cima dessa questão da inclusão. A
tentativa é despertar aquela palavra lá, fraternidade (...). A intenção era emocioná-los, fazer
chorar, fazer ficar triste, fazer ficar revoltado, fazer ficar encucado, assim ‘poxa eu sou assim
também’, se reconhecer: a gente também faz isso, quem discrimina não é um monstro isolado,
de outro planeta, quem discrimina é o monstrinho que tá na gente também (...)”.
Na sequência dessa análise, notamos que as estratégias adotadas para o
desenvolvimento dos conteúdos revela a diversidade de respostas, das quais as mais
convergentes foram as aulas expositivas. É possível estabelecer um diálogo com Pedrinelli e
Verenguer (2008), quando indicam a importância da diversidade de estratégias de ensino para
o desenvolvimento dos conteúdos selecionados. As autoras mencionam a importância da
formação contemplar leituras, discussões, vivências motoras e outras estratégias, ou seja, as
mesmas estratégias encontradas nesse estudo. Esse dado sugere que os cursos abordam os
conteúdos de forma diversificada para atingir os objetivos propostos.
Ressaltamos apenas que a maioria das disciplinas analisadas não oportunizam o
contato com a realidade de atuação, estratégia que poderia ser mais exploradas como forma
de aproximação dos alunos com os contextos de atuação, visando o estabelecimento das
relações mais profundas entre teoria e prática.
No que tange à avaliação, os resultados sugerem que ela não contempla os aspectos
atitudinais, estando voltada apenas para os conceituais e procedimentos. Nesse sentido,
percebemos que os resultados sugerem que os instrumentos avaliativos adotados não estão
de acordo com os objetivos das aulas.
Por fim, encontramos nas bibliografias utilizadas o alinhamento com os conteúdos
propostos, não havendo discrepâncias nesse aspecto dos cursos. Entretanto, percebemos que
nossos achados divergem totalmente do que foi encontrado por Gonçalves (2002), posto que
nenhuma das bibliografias citadas no estado de Goiás figurou entre as predominantes nos
cursos paulistas. Esse aspecto sugere a diversidade no desenvolvimento das disciplinas, haja
vista que os pressupostos teóricos que embasam as disciplinas pode ser um indicador das
ideologias que o permeiam, de modo que bibliografias diferentes podem indicar ideologias
diferentes.
Isso posto, a análise dos discursos revela uma coerência interna no que tange à
elaboração das disciplinas, haja vista que os conteúdos propostos atendem aos objetivos de
subsidiar os futuros profissionais no reconhecimento das pessoas com diferentes e peculiares
condições, bem como na elaboração de estratégias que possam favorecer o desenvolvimento
dessas pessoas. A diversidade de estratégias de intervenção pode, também, contribuir para
que esses conteúdos sejam desenvolvidos de forma significativa para os alunos. Entretanto, a
avaliação não se alinha aos objetivos, uma incoerência sugerida pelos discursos analisados.
42
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
As indagações que direcionaram o nosso olhar durante essa investigação estão
relacionadas à constituição de um diagnóstico da formação dos profissionais graduados nas
IES públicas (estaduais e federais) do estado de São Paulo no que concerne às questões da
Educação Física Adaptada.
Diante disso, encontramos alguns indícios que colaboram com o mapeamento dos
saberes privilegiados nessa formação, revelando muitas semelhanças entre os diferentes
cursos analisando, tanto com relação aos objetivos, quanto aos conteúdos e estratégias
adotadas para a abordagem desses conteúdos.
Os discursos evidenciam o privilégio aos conteúdos conceituais e procedimentais no
desenvolvimento das disciplinas, de modo a instrumentalizar o graduando para o
reconhecimento das pessoas com deficiência e suas características para traçar estratégias de
intervenção que se adequem a essas especificidades. Além disso, há indicadores de que os
docentes esperam que seus alunos tenham uma atitude positiva frente às pessoas com
deficiência, quebrando a barreira do relacionamento com essas pessoas.
A articulação entre esses componentes teóricos e as vivências práticas podem ter
sido pelas atividades extracurriculares oferecidas, colaborando com a conexão teoria e prática.
Isso posto, consideramos que as atividades complementares oferecidas nos cursos analisados
constituem um diferencial que poderá contribuir com a formação de profissionais mais
preparados para atuarem na área, levando-se em conta que essas atividades estiveram
presentes na formação de alguns dos próprios professores responsáveis pelas disciplinas e
representaram para muitos deles o motivo da inserção na área.
Apesar das semelhanças entre os cursos analisados no que tange aos objetivos,
conteúdos e métodos, as ideologias que permeiam cada curso podem conferir diferentes
abordagens desses conteúdos, levando a diferentes perspectivas de atividade física para as
pessoas com deficiência, fato que precisa ser considerado, tendo-se em vista que atitudes
positivas podem representar ações diferentes, dependendo da concepção de ser humano
discutida em cada curso.
Notamos também que o modelo médico não foi superado pelos cursos analisados,
mas as descrições das deficiências, suas causas e consequências foram apresentadas como
necessárias para a contextualização das intervenções, ou seja, se constituem como uma forma
de identificação do público a ser atendido. Levando-se em conta que a formação contempla
outros aspectos que acabam se sobrepondo a essas discussões, o levantamento das
temáticas relacionadas à constituição sócio-histórica desses indivíduos pode contribuir para
que o entendimento da deficiência não se apegue às questões biodinâmicas, mas sim à
diversidade do público atendido e às suas possibilidades de ação.
Apoiando-nos nas percepções dos professores sobre a contribuição da disciplina para
a formação de seus alunos, consideramos que estes acreditam que a principal delas é a
43
mudança nas atitudes dirigidas às pessoas com diferentes e peculiares condições, permitindo
que as intervenções se dêem considerando-se a diversidade que é inerente a qualquer
atividade que se estabeleça com seres humanos, e que a deficiência é apenas uma das
facetas dessa diversidade.
Assim, percebemos que a discussão acerca das pessoas com deficiência está
presente nas IES públicas do estado de São Paulo e que se fortalece na medida em que são
possibilitadas as oportunidades de discutir, vivenciar, interagir com essas pessoas. Nos cursos
analisados isso ficou evidente.
Contudo, ficam aqui algumas indagações, fruto de nossas reflexões no
desenvolvimento desse estudo. Quando perguntamos aos docentes sobre modelos ideais de
formação, antes nos perguntamos se esse ideal seria tangível. Ao fazer essa distinção,
incorremos no risco de não pensar no que seria mais adequado e aceitável. Apesar de
discutirmos a carga horária do curso, não é possível saber se isso basta, porque não estamos
discutindo o quanto seria mais adequado.
Pensamos que a esse estudo seria importante o aprofundamento sobre quais seriam
os componentes de uma formação ideal para o atendimento às pessoas com deficiência. Quais
são as competências e as habilidades que deveriam permear a formação desse profissional?
Essas questões não são contempladas nessa pesquisa, mas ela traz alguns indícios
do que se encontra, atualmente, nos cursos de graduação em Educação Física das IES
públicas (estaduais e federais) do estado de São Paulo.
44
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47
APÊNDICES
APÊNDICE A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA:
ALGUMAS (RES)SIGNIFICAÇÕES SOBRE A FORMAÇÃO PROFISSIONAL
Eu, _________________________________________________________________ ,
portador do RG __________________, endereço ____________________________________
____________________________________________________________________________
Email ________________________________________________________ , abaixo assinado,
dou meu consentimento livre e esclarecido para participar como voluntário do projeto de
pesquisa “Educação Física Adaptada: algumas (res)significações sobre a formação
profissional”, desenvolvido por Elizabete Ferreira, Raphael Gregory Bazílio Lopes e Raul
Ferreira, alunos do curso de graduação em Educação Física, sob a orientação da Profa. Dra.
Vílma Lení Nista-Piccolo, responsável pela pesquisa.
Ao assinar o presente Termo de Consentimento, estou ciente de que:
1. O objetivo da pesquisa é analisar as convergências e divergências existentes nos
conteúdos que pautam a formação profissional quanto à temática da Educação Física
Adaptada, que acontece nos cursos de graduação em Educação Física, nas Instituições do
Ensino Superior públicas (estaduais e federais), localizadas no estado de São Paulo.
2. A pesquisa contempla a análise documental das ementas e bibliografias das disciplinas
relacionadas às questões da Educação Física Adaptada.
3. Os docentes das disciplinas relacionadas às questões da Educação Física Adaptada que
aceitarem participar desse projeto responderão uma entrevista semi-estruturada, a qual será
gravada pelos pesquisadores. Serão destruídas todas as fitas utilizadas na gravação logo
após a transcrição do conteúdo das entrevistas.
4. Fui informado de todos os aspectos da pesquisa que possibilitaram decidir conscientemente
sobre a minha participação na mesma.
5. A qualquer momento que desejar, estarei livre para deixar de participar da pesquisa.
6. Serão mantidos em sigilo tanto as minhas informações pessoais quanto da Instituição em
que leciono, sendo que os resultados obtidos através da pesquisa serão utilizados
unicamente para atingir os objetivos do trabalho, conforme o primeiro item desse termo.
7. Os resultados obtidos nessa pesquisa serão publicados na literatura científica
especializada.
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8. Estou ciente de que a minha contribuição, ao participar desta pesquisa, beneficiará a classe
de profissionais de Educação Física, contribuindo com discussões e reflexões sobre a
formação profissional e sua equivalência com as necessidades da sociedade.
9. Tenho convicção da improbabilidade de riscos na participação desta pesquisa, do ponto de
vista físico, psicológico e material, pois minha colaboração se dará apenas em conceder
uma entrevista sobre a minha atuação profissional, a qual será gravada apenas com meu
consentimento e cuja gravação será descartada logo após sua transcrição. Nem meu nome
e nem da Instituição de Ensino Superior em que atuo serão divulgados.
10. Sempre que julgar necessário, poderei entrar em contato com os pesquisadores Elizabete
Ferreira, Raphael Gregory Bazílio Lopes e Raul Ferreira, pelo telefone (11) 7192-0627 / (11)
8724-7085 / (11) 7464-3737.
11. Para apresentar recursos ou reclamações em relação à pesquisa, poderei contatar o Comitê
de Ética em Pesquisa da Universidade São Judas Tadeu, pelo telefone (11) 2799-1944.
12. Este Termo de Consentimento é feito em duas vias. Uma permanecerá em meu poder e
outra com os pesquisadores responsáveis.
São Paulo, ____ de ________________ de 2010.
_______________________________________________
Nome e assinatura do voluntário
Elizabete Ferreira Raphael Gregory Bazílio Lopes
Raul Ferreira
_____________________________________________
Profª Drª Vilma Lení Nista-Piccolo
Orientadora e responsável pelo Projeto
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APÊNDICE B – ROTEIRO DA ENTREVISTA
1. Conte-me a sua trajetória na área da Educação Física Adaptada.
OBJETIVO: obter informações sobre a experiência do professor e as especificidades
de sua atuação na área pesquisada.
2. Em sua opinião, quais as contribuições dos programas de Educação Física para as
pessoas com deficiência?
OBJETIVO: obter informações sobre o que o professor considera significativo na
intervenção profissional na área pesquisada.
3. Como é desenvolvido o programa da disciplina Educação Física Adaptada ministrado
por você?
OBJETIVO: obter informações sobre os conteúdos abordados e métodos adotados na
disciplina pesquisada.
4. Em sua opinião, quais as principais contribuições da disciplina Educação Física
Adaptada na formação dos seus alunos?
OBJETIVO: obter as considerações do professor sobre as contribuições que suas aulas
trazem aos egressos do curso de Educação Física.
5. Para você qual seria o modelo ideal de formação para que o profissional esteja apto a
atuar no universo das pessoas com deficiência?
OBJETIVO: a partir das considerações do professor, traçar um perfil de uma disciplina
que contemplasse adequadamente as questões da Educação Física Adaptada.