El Arte y El Espacio

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1 A ARTE E O ESPAÇO Martin Heidegger (Die Kunst und der Raum - 1969) In Gesamtausgabe nº 013 – Aus der Erfahrung des Denkens (Sobre a Experiência do Pensar) Quando pensamos muito por nós mesmos, encontramos bastante sabedoria dentro da linguagem. Sem dúvida, não é provável que lá tenhamos tudo introduzido,mas realmente há bastante sabedoria na linguagem, como nos provérbios. G. CHR. LICHTENBERG Dokeí de mega ti eínai kai chalapon lephthenai ho topos Parece, pois algo grandioso e difícil de aprender, o topos, isto é, o espaço- lugar. Aristóteles, Física, IV As observações a respeito da arte, do espaço, de seu entrelaçamento recíproco permanecem questões mesmo quando falam em forma de afirmação. Limitam-se as artes plásticas e entre elas á escultura. As formas da escultura são corpos. Seu material, composto de diferentes matérias, estrutura-se variadamente. A formação ocorre num delimitar, movimento de incluir e excluir limites. Com isso entra em jogo o espaço. Ocupado pela forma escultural, o espaço é definido por um volume acabado, penetrado e vazio. Esse estado de coisas é bem conhecido e ainda assim rico em enigma. O espaço escultural in-corpora algo. In-corpora o espaço? Será então a escultura uma apropriação do espaço, uma dominação do espaço? Será que assim a escultura corresponderia á conquista técnica cientifica do espaço? Enquanto arte, a escultura é, sem dúvida, uma discussão 1 [1] com o espaço artisitco. A arte e a técnica cientifica consideram e trabalham o espaço em intenções e modos diversos. 1[1] Dis-cutir pretende recuperar a força da expressão alemã Auseinandersetzung: trata- se de uma composição de Setzen = por, colocar e Auseinander = um fora do outro num movimento diferenciador. O texto original recorre a esta composição para designar o entendimento comum do espaço como disposição de partes e integrantes numa exterioridade. Para traduzir este sentido, recorre-se aqui ao verbo discutere = bater e rebater até posicionar que, em sua história de derivação do latim para o português, também repete, de alguma maneira, o mesmo processo.

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A ARTE E O ESPAÇOMartin Heidegger

(Die Kunst und der Raum - 1969) In Gesamtausgabe nº 013 – Aus der Erfahrung des Denkens (Sobre a Experiência do Pensar)

  Quando pensamos muito por nós mesmos, encontramos bastante sabedoria dentro da linguagem. Sem dúvida, não é provável que lá tenhamos tudo introduzido,mas realmente há bastante sabedoria na linguagem, como nos provérbios.  G. CHR. LICHTENBERG Dokeí de mega ti eínai kai chalapon lephthenai ho toposParece, pois algo grandioso e difícil de aprender, o topos, isto é, o espaço-lugar.  Aristóteles, Física, IV

  As observações a respeito da arte, do espaço, de seu entrelaçamento recíproco

permanecem questões mesmo quando falam em forma de afirmação. Limitam-se as artes plásticas e entre elas á escultura. As formas da escultura são corpos. Seu material, composto de diferentes matérias, estrutura-se variadamente. A formação ocorre num delimitar, movimento de incluir e excluir limites. Com isso entra em jogo o espaço. Ocupado pela forma escultural, o espaço é definido por um volume acabado, penetrado e vazio. Esse estado de coisas é bem conhecido e ainda assim rico em enigma.  O espaço escultural in-corpora algo. In-corpora o espaço? Será então a escultura uma apropriação do espaço, uma dominação do espaço? Será que assim a escultura corresponderia á conquista técnica cientifica do espaço?  Enquanto arte, a escultura é, sem dúvida, uma discussão1[1] com o espaço artisitco. A arte e a técnica cientifica consideram e trabalham o espaço em intenções e modos diversos.  Mas e o espaço – permanece o mesmo? Não foi esse mesmo espaço que experimentou sua primeira determinação com Galileu e Newton? Espaço – essa discussão uniforme, onde nenhuma das possíveis posições é privilegiada, válida em qualquer direção, Mas imperceptível aos sentidos?  O espaço – que nesse meio tempo, provoca o homem moderno a domina-lo até as últimas conseqüências, de maneira crescente e teimosa? E as artes plásticas moderna também não seguem essa mesma provocação ao compreender-se como discussão com o espaço? Não será nisso que elas encontram confirmado o seu caráter de contemporâneas?  E o espaço dos projetos técnicos da física, ou qualquer que seja sua determinação ulterior, pode pretender-se o único espaço verdadeiro? Em comparação, todos os outros espaços diferentemente estruturados, o espaço artístico, o espaço das ações e deslocamentos cotidianos, serão apenas formas primitivas, do sujeito, derivações do único espaço cósmico objetivo?  No entanto, o que isso significaria se a objetividade do espaço objetivo do mundo permanecesse inevitavelmente o correlato da subjetividade de uma consciência, estranho aos séculos que precederam a modernidade européia?

1[1] Dis-cutir pretende recuperar a força da expressão alemã Auseinandersetzung: trata-se de uma composição de Setzen = por, colocar e Auseinander = um fora do outro num movimento diferenciador. O texto original recorre a esta composição para designar o entendimento comum do espaço como disposição de partes e integrantes numa exterioridade. Para traduzir este sentido, recorre-se aqui ao verbo discutere = bater e rebater até posicionar que, em sua história de derivação do latim para o português, também repete, de alguma maneira, o mesmo processo.

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  Mesmo se reconhecemos a diversidade da experiência de espaço nas épocas passadas, obteríamos já com isso uma visão penetrante do próprio do espaço, ainda não é questionada e muito menos respondida. Permanece indeciso de que modo o espaço “é” e se lhe pode corresponder um ser.  Portanto o espaço aos fenômenos originários (Urphänomenon) em cujo contato, segundo uma palavra de Goethe, sobrevêm ao homem uma espécie de timidez que chega até a angústia? Pois atrás do espaço , assim parece, já não existe nada a que pudesse ser reconduzido. Diante dele, não existe desvio possível para uma outra coisa. O próprio do espaço deve mostrar-se a partir dele mesmo, o que ele é, ainda se deixa dizer?  A necessidade de uma tal pergunta arranca de nós uma confissão inevitável: enquanto não experimentamos o próprio do espaço, o discurso sobre o espaço artístico permanecerá sempre obscuro. O modo, como o espaço permeia a obra de arte, fica em suspenso no indeterminado.  O espaço, onde a forma estrutural pode ser encontrada como um objeto simplesmente dado, o espaço, que encerra os volumes da figura, o espaço, que existe como o vazio entre os volumes – são estes três espaços, na unidade de seu entrelaçamento recíproco, meras derivações de um espaço técnico da física, mesmo se as medidas de cálculo não intervierem nas formas artísticas? Admitindo-se que a arte seja o tornar-se obra da verdade e que a verdade signifique o desvelamento do ser, não deve, então, na obra de arte plástica, tornar-se decisivo o espaço verdadeiro, isto é, aquele que desvela o seu próprio?  No entanto como podemos encontrar o próprio do espaço? Existe um atalho, embora estreito e hesitante. Tentemos escutar a linguagem. De que ela fala na palavra espaço? Fala o espaçar. Isso significa desbravar, liberar a selva.  O espaçar instala o livre, que se abre para o homem estabelece-se e habita. Pensado em sua propriedade, o espaçar é a livre doação de lugares, em que os destinos do homem em sua habitação voltam para a graça de um abrigo, para a desgraça do desabrigo ou até para a indiferença de ambos. Espaçar é a livre doação dos lugares em que surge um deus, dos lugares em que os deuses fugiram, dos lugares em que o aparecer do divino há muito de retrai. Espaçar instala a localidade que, cada vez, prepara um habitar. Espaços profanos são sempre a privação de espaços sagrados há muito abandonados. Espaçar é a livre doação de lugares. No espaçar fala vela, ao mesmo tempo, um acontecer. Esse caráter de espaçar é muito facilmente desconsiderado. E, quando visto, continua sempre difícil de ser determinado, sobretudo enquanto o espaço da física a técnica permanecer o único espaço valido, ao que toda caracterização do que é espacial deve se ater.  Como acontece o espaçar? Não é dar-espaço e no duplo modo de permitir e dispor? Pro um lado, dar-espaço concede algo. Deixa o vigor do que se abriu, faz aparecer as coisas presentes, de que o habitar humano depende.  Por outro, o dar-espaço prepara ás coisas a possibilidade de pertencerem cada um para seu lugar e a partir daí umas ás outras.  No duplo movimento deste dar-espaço acontece a propiciação de lugares. O caráter desse acontecimento é guardar e cuidar. Mas o que é o lugar se o que tem de próprio há de se determinar pelo espaço liberador de espaços? O lugar abre cada vez mais uma contréia2[2], na medida em que nela reúne as coisas para um mútuo-pretender.  No lugar se articula a reunião no sentido de abrigar livremente as coisas para sua contréa. E a contréa? A forma antiga da palavra diz “contrata” (Gegnet). Evoca a livre distância. Por ela o aberto é forçado a deixar cada coisa repousar em si mesma. Isto diz também, resguardar a reunião das coisas em seu mútuo pretender.

2[2] A palavra Gegend possui o sentido comum de região. Optamos por um neologismo (contréa) derivado do francês contrée ed o italiano contrata, para deixar aparecer a dimensão do confronto (contra) implícito a todo encontro. “Abrigar livremente as cosias para a sua contréa” diz não apenas a vigência de cada coisa em sua diferença como também a força de diferenciação que implica uma tensão de contraposição

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  A pergunta se impõe: os lugares são apenas resultado e conseqüência de um dar-espaço? Ou o dar-espaço recebe o que tem de próprio, da vigência dos lugares reunidos? Neste caso, deveríamos procurar o próprio doe espaçar na fundação (Grüdung) da localidade, deveríamos pensar a localidade como o jogo recíproco de lugares.  Deveríamos considerar o fato e modo, em que esse jogo recebe da distância livre da contréa as indicações para o mútuo pertencer das coisas. Deveríamos aprender a reconhecer que as coisas são em si mesmas lugares e não apenas pertencem a um lugar.  Nesse caso, seriamos forçados, ao longo do tempo, a aceitar um fato estranho: o lugar não se encontra em um espaço dado, à maneira do espaço da física e da técnica. Ao contrário, é este que se desdobra a partir da vigência de lugares numa contréa.  O entrelaçamento de arte e espaço deveria ser pensado como experiência de lugar e contréa. A arte como escultura: nenhuma apropriação e dominação do espaço. À estrutura não seria uma discussão com o espaço.  A escultura seria a in-corporação de lugares que, acolhendo e aguardando uma contréa, mantém consigo uma liberdade, garantindo a cada coisa o seu tempo e ao homem um habitar em meio ás coisas.  Assim o que seria do volume das esculturas, formas que cada vez in-corpora um lugar? Certamente, já não seria uma delimitação de espaços contrapostos, em cujas superfícies um interior opor-se-ia a um exterior.  O que se denomina com a palavra volume, deveria perder o nome, pois seu significado é tão antigo quanto as ciências naturais e técnicas modernas.  Os caracteres de in-corporação da plástica que buscam e formas lugares ficaram de inicio sem nome.  E o que seria do vazio do espaço? Com muita freqüência, aparece apenas como falta. O vazio corresponde, pois a uma deficiência no preencher de vãos e intervalos.  Certamente, no entanto, o vazio é parente do que o lugar tem de próprio e por isso não é uma falta,mais um transparecer. Mais uma vez a linguagem pode nos dar um sinal. No verbo “esvaziar” fala o colher no sentido originário de reunir que vige no lugar. Esvaziar o copo diz: recolhe-lo para a libertação de seu modo de ser. Esvaziar as frutas colhidas num cesto, diz: preparar-lhes esse lugar. O vazio não é um nada. Não é também uma falta. Na in-corporação da escultura, o vazio joga como modo de instaurar lugares em buscas e criações.  As observações precedentes não nos levam certamente longe o bastante, para mostrarmos de maneira clara e suficiente o próprio da escultura como um gênero das artes plásticas. À escultura: um tornar-se obra que in-corpora lugares e com ele abre contréas para uma possível habitação dos homens, uma possível permanência das coisas que os cercam e concernem.  À escultura: in-corporação da verdade do ser obra instauradora de lugares.  Já uma visão cuidadosa do próprio dessa arte nos permite presumir que a verdade enquanto desvelamento do ser não se dá apenas nem necessariamente na in-corporação.  Goethe diz: “não é sempre necessário que o verdadeiro adquira corpo, já basta que plane como espírito e provoque harmonia que, como o toque dos sinos, se espera nos ares, sorrindo em sua gravidade.”

1.Tradução não identificada, in www.geocities.ws/bcentaurus/livros/h/artespaco.doc

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A ARTE E O ESPAÇO Martin Heidegger

 Para Eduardo Chillida

 Quando pensamos muito por nós próprios, encontramos muita sabedoria inscrita na língua. É certamente pouco verosímil que lhe transportemos  tudo nós mesmos; porque efectivamente muita  sabedoria está lá – assim como nos provérbios.G. Chr. Lichtenberg Δοκει̃) δέ μὲγα τι̃ εί̃)ναι̃ καὶ χαλεπὸν ληφθη)ναι̃ ο; τόπος (“Parece ser qualquer coisa de grande importância, e difícil a apreender, o topos – i.é. o espaço-lugar.”)Aristóteles, Física IV   

 Estas notas a propósito da arte, a propósito do espaço, a propósito do entrelaçamento do seu jogo recíproco, são e continuam a ser questões, mesmo se são enunciadas sob o modo afirmativo. Elas limitam-se às artes plásticas, e mais precisamente à escultura. O que a escultura forma plasticamente são corpos. A sua massa, consistindo em diversos materiais, é formulada multiplamente. A formulação tem lugar numa delimitação, que é inclusão e exclusão em relação a um limite. Desta maneira, o espaço entra em jogo. Ele é ocupado pela forma plástica, recebe a sua marca como volume fechado, volume atravessado de aberturas e volume vazio. Estado de coisas bem conhecido, e contudo repleto de enigmas. O corpo plástico incorpora qualquer coisa. Incorporará o espaço? A escultura é um manuseamento sobre o espaço, uma dominação deste? A escultura responde assim à conquista científico-técnica do espaço? Certamente, como arte, a escultura está em debate <Auseinandersetzung> com o espaço da arte. A arte e a técnica científica consideram e adaptam o espaço a partir duma intenção diversa e de maneiras diferentes.  Mas e o espaço – continua o mesmo? Não é este espaço que recebeu a sua primeira determinação de Galileu e de Newton? O espaço – esta extensão uniforme, do qual nenhum sítio é privilegiado, equivalente em todas as direcções, mas não perceptível pelos seus sentidos? O espaço – que provoca entretanto, e numa medida crescente, sempre mais obstinadamente o homem moderno à sua dominação última e absoluta?As artes plásticas modernas não obedecem também a esta provocação, na justa medida em que se compreendem como debate com o espaço? Não se encontram assim confirmadas no seu carácter actual?  Portanto, será que o espaço do projecto físico-técnico, qualquer que seja a sua possível determinação, pode assumir-se como o único verdadeiro espaço? Comparados com ele, todos os outros espaços adjacentes – o espaço da arte, o espaço da vida corrente com as suas acções e deslocações – são somente formas primitivas e transformações subjectivamente condicionadas da objectividade de um único espaço cósmico? Que seria se a objectividade desse espaço cósmico fosse irresistivelmente o correlato da subjectividade de uma consciência perfeitamente estrangeira aos séculos que precederam a Modernidade europeia?

Mesmo reconhecendo a diversidade da experiência espacial nos séculos passados, adquirimos dessa maneira um primeiro olhar sobre a propriedade do espaço? A questão do que é o espaço como espaço não foi, por isso mesmo, ainda esboçada – e ainda menos solucionada. Continua confuso de que maneira o espaço é, e mesmo se, absolutamente, um ser lhe pode ser atribuído. 

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O espaço – faz parte dos Urphänomenen <fenómenos Originários> no contacto dos quais, segundo uma expressão de Goethe, quando os homens chegam a compreendê-los, uma espécie de temor que pode ir até à angústia os submerge? Dado que por trás do espaço, ao que parece, nada mais há ao que este possa ser ligado. Face a ele não há esquiva possível que leve a outra coisa. Aquilo que é próprio do espaço, é necessário que se mostre a partir dele mesmo. Deixar-se-á isto dizer em propriedade?  Em face da necessidade de tal questionamento, teremos que confessar: Enquanto não fizermos a experiência da propriedade do espaço, falar de um espaço da arte mantém-se obscuro. A maneira como o espaço comporta e atravessa a obra de arte fica, para começar, na ambiguidade.   O espaço, no interior do qual a construção plástica <plastiche Gebilde> pode ser encontrada como um objecto dado, o espaço que engloba os volumes da figura, o espaço que persiste entre os volumes – estes três espaços, na unidade do seu entrelaçamento recíproco, não são somente restos do único espaço físico-técnico, mesmo se cálculos aritméticos não intervenham no advir da obra de arte na figura? Uma vez aceite que a obra de arte é um pôr-se em obra da verdade, e que verdade designa o não-velamento do ser, não resulta então que na obra das artes plásticas seja o espaço igualmente verdadeiro, aquele que se abre naquilo que tem de mais próprio, que vem dar a medida? Contudo, como encontrar o próprio do espaço? Haverá um trilho, estreito e casual, com toda a certeza. Arrisquemos a escuta da língua.  De que fala ela na palavra espaço? Aí fala o espaçamento. Isto quer dizer: desbravar, abrir caminhos inóspitos <die Wildnis freimachen>. Espaçar comporta o livre, o aberto, para um estabelecer e um habitar do homem.  Espaçar é, literalmente, a libertação de lugares nos quais os destinos do homem que habita se cultivam, na ocasião de uma estadia, ou na infelicidade de um desterro, ou mesmo na indiferença a respeito dos dois.Espaçar, é a libertação do lugar onde um deus aparece, lugar donde os deuses se retiraram, lugar onde a aparição do divino tarda longamente. Espaçar, comporta assim a localidade <Ortschaft> que, a cada vez, prepara uma estadia. Os espaços profanos não serão mais que a privação de um longínquo pano de fundo de espaços consagrados.  Espaçamento é libertação de lugares.No “espaçar” fala e protege-se, de uma só vez, um ter-lugar. Esta premissa própria ao espaçamento facilmente nos escapa. E se disto nos apercebemos, continua difícil de defini-lo, na medida em que o espaço físico-técnico passa pelo espaço ao qual toda a determinação do espacial, desde logo, se atém.

Como se abre o espaço? Não resulta ele numa “localização”, e esta, por sua vez, através de um duplo modo de receber e de organizar? Assim, localizar possibilita qualquer coisa. Deixa-se surgir do aberto que, entre outras coisas, possibilita a aparição na presença de coisas às quais a habitação humana se encontra reenviada. De seguida, localizar prepara para as coisas a possibilidade de se pertencerem umas às outras, cada uma no seu lugar e a partir deste mesmo. 

No desdobramento dual deste localizar tem lugar aquilo que dá lugar. A característica deste ter-lugar é esse dar lugar. Portanto, o que é o lugar, se a sua propriedade deve ser determinada pelo fio condutor da localização que liberta?  O lugar abre de cada vez uma região, na qual agrupa as coisas a partir da sua co-pertença <Zusammengehören> no seio desta.

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 No lugar faz-se o agrupamento no sentido do proteger que libera as coisas na sua região. E a região? A mais antiga forma da palavra, em alemão, é «Gegnet». Esta nomeia a livre vastidão <die freie Weite>. Por ela, o aberto é remetido ao estado de deixar abrir e desabrochar cada coisa no seu próprio repouso. Isto quer dizer, ao mesmo tempo: tomar em atenção o (re)agrupamento das coisas na sua correlação <Zueinandergehören>. Assim, a questão perfura: os lugares são pura e simplesmente resultado e produto do espaçamento? Ou, pelo contrário, o espaçamento recebe a sua propriedade (o que lhe é próprio) a partir do vigor dos lugares reunidos? Se nos aproximamos do verdadeiro, então teremos que procurar o próprio do espaçar na fundação <Gründung> de localidade, e pensar a localidade como conjugação <Zusammenspiel> de lugares. Devemos prestar atenção ao facto e à maneira como este jogo recebe, a partir da vastidão liberta <der freien Weite> da região, o reenvio à co-pertença das coisas. Devemos aprender a reconhecer que as coisas são já de si os lugares – e não fazem senão estar situadas no seu lugar.

Neste caso, vemo-nos constrangidos à já antiga tarefa de focar um aspecto para lá da questão: o lugar não se encontra no interior de um espaço dado à partida, do tipo do espaço físico-técnico. Este último é que somente se desdobra a partir do vigorar dos lugares de uma região.  Torna-se necessário pensar a margem de reciprocidade <das Ineinanderspiel> entre a Arte e o Espaço, a partir da experiência do lugar e da região. A Arte como plasticidade: não como um manuseamento do espaço.A escultura não será um debate com o espaço.

A escultura seria então uma incorporação de lugares que, abrindo uma região e preservando-a, teriam reunidos à sua volta qualquer coisa de livre que permite a estadia a todas as coisas e habitação ao homem no meio destas.

Que devém, assim sendo, o volume das obras plásticas que a cada vez incorpora um lugar? Sem dúvida, não delimitará uns espaços em relação aos outros, nos quais as superfícies englobariam um interior fazendo aparecer, em contrapartida, um exterior. Aquilo que é nomeado “volume” deve perder o seu nome – já que a sua significação não é mais antiga que a moderna tecno-ciência da Natureza.

A procura de lugar e a modulação de lugar, características da incorporação plástica, continuariam, assim, sem nome. E que surgiria do vazio do espaço? Mormente, este aparece só como uma falta. O vazio passa, então, por defeito de preenchimento de espaços ocos <Hohlräumen> e intervalares <Zwischenräumen>.

No entanto, provavelmente, o vazio é o irmão da propriedade dos lugares, e, por essa razão, não um defeito, mas um pôr-a-descoberto. De novo, a língua pode dar-nos um sinal. No verbo «leeren» <esvaziar> fala o «Lesen» <Ler> no sentido original de “recolher”, o recolher que vigora no lugar. Esvaziar o copo quer dizer: recolhe-lo mostrando-se a devir livre no seu ser.Esvaziar de um cesto os frutos colhidos, quer dizer: preparar-lhe esse lugar.O vazio não é o nada. Também não é uma falta. Na incorporação plástica o vazio joga de modo a procurar o estabelecimento dos lugares pela sua abertura.

Os apontamentos precedentes não conduzem, certamente, muito longe, para mostrar, desde logo, o próprio da escultura como género das artes plásticas com clareza suficiente. A escultura: uma incorporação que põe-em-obra lugares, e com estes uma abertura de regiões

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para uma possível habitação dos homens e uma possível estadia das coisas que os circundam e concernem. 

A escultura: incorporação da verdade do ser na sua obra edificadora de lugares.

Um olhar cuidado sobre a propriedade da Arte deixa supor que a verdade enquanto desvelamento do ser não está necessariamente vinculada à incorporação.

Goethe diz: “Nem sempre é necessário que o verdadeiro se incorpore; basta que flutue pelos ares espiritualmente e se realize por uma electiva afinidade, que como o sincero soar uníssono preenche a atmosfera”.   Tradução José Carlos Cardoso

HEIDEGGER, Martin. Die Kunst und der Raum, Erker-Verlag, St. Gallen, 1969

Sobre a arte:Holzwege, 1950, “Der Ursprung des Kunstwerkes”, erweitert in Reclams-Universalbibliothek Nr. 8446/47 1960.Vorträge und Aufsätze, 1954, “Dichterisch wohnet der Mensch”.Sobre o espaço: Sein und Zeit, 1927, §§ 22-24, Die Räumlichkeit des Daseins.Vorträge und Aufsätze, 1954, “Bauen – Wohnen – Denken”.Gelassenheit, 1959, Aus dem Feldweggespräch über das Denken.

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EL ARTE Y EL ESPACIOMartin Heidegger

Revista Eco. Bogota, Colombia. Tomo 122, Junio 1970, pp. 113-120. Traducción De Tulia De Dross

 Cuando se piensa mucho en sí mismo, se encuentra la sabiduría inherente al lenguaje. Es improbable que uno la introduzca, ya está en él, como en los proverbios.G. CHR, LICHTENBERG

Parece, sin embargo, ser algo poderoso y difícil de captar, el Topos -es decir, el Sitio-Espacio.ARISTOTELES, Física, IV.

Las observaciones sobre el Arte, el Espacio, la intermundaneidad de ambas, son aún interrogantes, aunque se las exprese en forma de aseveraciones. Se limitan al arte plástico e intrínsecamente a la escultura. Los productos de la plástica son Cuerpos. Su masa, constituida por distintos materiales, se realiza bajo múltiples configuraciones.

La configuración acaece dentro de una delimitación, como un Dentro y Fuera limitados. De este modo entra el Espacio en juego.

Será habitado por una obra plástica, moldeado como un volumen cerrado, perforado, vacío. Hechos bien conocidos, y no obstante, enigmáticos.

El cuerpo plástico corporeíza algo. ¿Corporeíza el espacio? ¿Es la plástica una posesión del espacio, un contener el espacio? ¿Respondería a la conquista técnico-científica del espacio?

Verdad es que en cuanto Arte la plástica es una pugna con el espacio artístico. El Arte y la técnica científica consideran y trabajan el espacio con intención y modo diversos.

El espacio empero -¿permanece el mismo? ¿No es aquel espacio que desde Galileo y Newton recibió su determinación? El espacio -¿es aquella extensión uniforme, sin zonas privilegiadas, en cada dirección equivalente, e imperceptible a los sentidos?

El espacio -¿es aquel que, mientras tanto, sigue impulsando obstinadamente al hombre moderno a su dominio último y absoluto? ¿No sigue el arte plástico moderno este mismo imperativo, en lo que se comprende como un desafío al espacio? ¿No se halla así confirmado en su carácter de contemporáneo?

El espacio del proyecto físico-técnico -cual sea su determinación -¿puede tener la validez de único y verdadero espacio? Comparados con él los espacios adjuntos -el espacio del arte, el espacio de la vida cotidiana, con sus acciones y sus desplazamientos- ¿son tan sólo formas primigenias y transformaciones subjetivamente condicionadas a la objetividad de un solo espacio cósmico?

¿Qué sucedería si la objetividad de aquel espacio cósmico resultara ser el absoluto correlato de la subjetividad de una conciencia extraña a la antigüedad que precedió a los modernos tiempos europeos? Aun si reconociéramos la diversidad de la experiencia espacial entre los antiguos, ¿obtendríamos con ello la visión primaria sobre la mismidad del espacio?

La interrogante sobre lo que el espacio como espacio sea, no queda formulada, tampoco su respuesta.

Incierto también el ser del espacio y el poder atribuírsele un modo de ser.

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El espacio -¿hace parte de los fenómenos originarios, al contacto de los cuales, según Goethe, el hombre al percibirlos le sobreviene un temor angustioso, creciente? Detrás del espacio, aparentemente, no hay nada hacia lo cual abismarse. Delante, no existe coartada hacia otra cosa. La mismidad del espacio sólo se muestra a partir del espacio. ¿Se deja expresar su mismidad?

Ante lo inquisitivo de su mismidad, declaramos:

Mientras no experimentemos la mismidad del espacio, permanecerá en sombras el hablar sobre un espacio artístico. El modo como el espacio obra y atraviesa la obra de arte se nos anticipa con toda su incertidumbre.

El espacio -en donde se puede hallar la forma plástica como espacio dado; el espacio, que encierra los volúmenes de la figura; el espacio existente como vacío -¿no son siempre estos tres espacios, en la unidad de su interacción tan sólo derivación del espacio físico-técnico, así bien las dimensiones matemáticas no debieran intervenir en la configuración artística?

Aceptado que el arte sea la puesta en obra de la verdad, y que ésta signifique el no ocultamiento del ser, ¿no será preciso que en la obra de arte constructiva, sea el espacio verdadero, que al abrirse en lo que tiene de propio, nos da la medida?

¿Cómo encontrar la mismidad del espacio? Hay una senda, realmente estrecha, oscilante. Percibirla en la lengua nos es dado. ¿De qué nos habla en la palabra espacio? En ella habla el espaciar.

Significa: talar, liberar lo selvático. El espaciar conlleva lo libre, lo abierto, para un situarse y habitar del hombre.

Espaciar es, en sí, la liberación de sitios, donde los destinos del hombre existente se proyectan con el bien de una nación, o en la desdicha del exilio, o frente a la indiferencia de ambos.

Espaciar es dar curso a los sitios, en los que un dios aparece; sitios de donde los dioses han huído, sitios en donde se retarda la aparición de la divinidad.

El espaciar origina el situar que prepara a su vez el habitar.

Los espacios profanos son siempre la privación de antiguos espacios sagrados.

Espaciar es la liberación de sitios.

En el espaciar se manifiesta y se encierra un acontecer. Carácter éste del espaciar fácilmente desatendido. Y cuando es percibido, aún es difícil determinarlo, ante todo porque el espacio físico-técnico sigue siendo el espacio al cual toda denotación sobre lo espacial debe primeramente referirse.

¿Cómo acontece el espaciar? ¿No es acaso un situar en relación, considerado en su doble modo del conceder y disponer?

Una vez el situar admite algo acorde. Se deja actuar la apertura, que entre otras admite la aparición de las cosas a las cuales se ve dirigida el habitar humano.

Además, este situar de las cosas les permite la posibilidad de pertenecerse co-relativamente en su dirección y cada una desde dentro y a partir de sí.

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En el doble despliegue de este situar acaece el divisar de sitios. El carácter de este acontecer es el arrebatamiento. Pero, ¿qué es el sitio, si su mismidad debe determinarse en su dirección liberadora? El sitio abre cada vez un paraje, encontrándose en éste las cosas, en co-pertenencia.

En el sitio se juega el encuentro, en el sentido de esconder y dejar las cosas liberadas de su paraje.

¿Y el paraje-, La más antigua forma de la palabra es gegnet .

Denomina la libre vastedad. Por ella se capta lo abierto, cada cosa en su apertura y en su expandirse desde el estado de reposo que tan sólo a ella le pertenece.

Y significa al mismo tiempo: custodiar el encuentro de las cosas en su co-pertenencia.

Urge la pregunta: ¿serán los sitios primero y sólo el resultado, la consecuencia del situar? ¿O recibe el situar su mismidad a partir de la acción de los sitios encontrados? Si eso fuera exacto, tendríamos que buscar la mismidad del espaciar en la fundamentación de sitios, y considerar al sitio como la correlación de sitios.

Tendríamos que atender entonces en qué forma y cómo este juego de co-relación recibe a partir de la libre vastedad del paraje la remisión de la co-pertenencia de las cosas.

Tendríamos que aprender a reconocer que las cosas son ellas mismas los sitios y no pertenecientes a un solo sitio.

En este caso estaríamos obligados a aceptar por largo tiempo un insólito hecho: el sitio no se halla en el interior de un espacio ya dado, según el modo de espacio físico-técnico. Este sólo se despliega desde el encuentro de los sitios de un paraje.

El juego co-relacionado de arte y espacio habría que reflexionarlo a partir de la experiencia del sitio y del paraje.

El arte como plástica: la no posesión del espacio. La plástica no sería una pugna con el espacio.

La plástica sería la corporeización de sitios, que en la apertura de un paraje que lo encierra, condiciona una liberación en su encuentro, permitiendo la presencia de las cosas en ese instante, y el habitar del hombre en medio de las cosas.

Y si es así, ¿que será del volumen de las configuraciones plásticas que corporeízan un sitio? Probablemente ya

los espacios no se limitarán oponiéndose, allí donde se ciñe un Dentro opuesto a un Fuera. Lo significado por la palabra volumen debería perder su nombre -significado este tan antiguo como la moderna técnica de la ciencia natural.

Innominados por de pronto quedarían los caracteres de la corporeización plástica, que buscan y constituyen los sitios.

¿Qué devendría del vacío del espacio? El vacío aparece a menudo tan sólo como una carencia. El vacío sería entonces como la carencia por colmar espacios huecos e intra-mundanos. Sin duda el vacío está relacionado justamente con las peculiaridades del sitio y por eso no es una carencia sino una creación.

De nuevo la lengua puede ofrecérsenos en un guiño.

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En el verbo vaciar (leeren) se manifiesta el leer (lesen), en un sentido original del encontrar que obra en el sitio.

Llenar el vaso significa: encontrar al contenido en su libre devenir.

Volcar en un cesto las frutas recogidas significa: prepararles este sitio.

El vacío deja de ser nada. Tampoco es carencia. En la corporeización de la plástica se juega el vacío de un modo de conceder buscando y diseñando sitios.

Las observaciones precedentes no van ciertamente tan lejos como para mostrar con suficiente luminosidad la mismidad de la plástica como un modo del arte constructivista. La plástica: una corporeización de la puesta en obra de sitios; y en ellos una apertura de parajes que conceden el habitar humano y la permanencia de las cosas encontrándose, relacionándose.

La plástica: corporeización de la verdad del ser en su sitio determinando la obra.

Ya una mirada atenta sobre la mismidad de este arte permite presumir que la verdad como un no ocultamiento del ser no depende necesariamente de la corporeización.

Goethe dice: “No es siempre necesario que lo verdadero se corporeíce; suficiente es si se vislumbra espiritualmente la verdad y resulta en conformidad; si flota por los aires como el canto austero y amistoso de las campanadas.”