ELEMENTOS DA TEORIA DOS NÚMEROS … · e investigado os motivos pelos quais a teoria de...

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TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO ELEMENTOS DA TEORIA DOS NÚ- MEROS ALGÉBRICOS TAMARA DA SILVEIRA JOINVILLE, 2013

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TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

ELEMENTOS DA TEORIA DOS NÚ-MEROS ALGÉBRICOS

TAMARA DA SILVEIRA

JOINVILLE, 2013

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TAMARA DA SILVEIRA

ELEMENTOS DA TEORIA DOS NÚMEROS ALGÉBRICOS

Trabalho de Graduação apresentado ao

Curso de Licenciatura em Matemática

do Centro de Ciências Tecnológicas,

da Universidade do Estado de Santa

Catarina, como requisito parcial para

a obtenção do grau de Licenciatura em

Matemática.

Orientador(a): Prof. Ms. Viviane

Maria Beuter

JOINVILLE, SC

2013

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TAMARA DA SILVEIRA

ELEMENTOS DA TEORIA DOS NÚMEROS ALGÉBRICOS

Trabalho de Graduação apresentado ao Curso de Licenciatura em Mate-mática do Centro de Ciências Tecnológicas, da Universidade do Estadode Santa Catarina, como requisito parcial para a obtenção do grau deLicenciatura em Matemática.

Banca Examinadora

Orientadora:Prof. Ms. Viviane Maria BeuterUniversidade do Estado de Santa Catarina

Coorientadora:Prof. Dr. Elisandra Bar de FigueiredoUniversidade do Estado de Santa Catarina

Membro:Prof. Ms. Rodrigo de LimaUniversidade do Estado de Santa Catarina

Membro:Prof. Dr. Rogério de AguiarUniversidade do Estado de Santa Catarina

Joinville, 06/12/2013.

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A minha família.

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Agradecimentos

Primeiramente, gostaria de agradecer a minha família pelo apoio

constante a minhas escolhas, pela compreensão nos momentos difíceis.

Agradeço a meus pais, Trajano e Isolete, por serem minha base, minha

referência. Agraço a meu irmão, Júnior, pelo companheirismo e pelos

conselhos. Não poderia deixar de agradecer a meus avós, Eudócio e

Rosa, que acreditaram em mim e, apesar de não poderem ver minha

conclusão da graduação, estariam orgulhosos por essa conquista.

Assim, como minha família, meus amigos também me apoiaram

e suportam meus momentos de estresse. Alguns desses amigos estiveram

boa parte da graduação comigo, enfrentando momentos bons e ruins e

por isso lhes sou grata. Eu não poderia ter companheiros melhores do

que vocês, Fran, Luis e Alessandra.

Porém, acredito que, de todas as pessoas que me ajudaram a

concretizar esse projeto, meus professores foram a parte mais signifi-

cativa, todos eles, desde o começo de minha formação. São poucas as

pessoas que podem afirmar que tiveram tantos mestres bons quanto

tive. Cada um deu sua contribuição, não apenas acadêmica ou profis-

sional. E a todos eles sou grata.

Contudo, gostaria de dirigir um agradecimento especial à pro-

fessora Elisandra, que acompanhou minha formação acadêmica desde

o início, e esteve presente de alguma forma na maior parte dela, não

apenas como professora, mas também como amiga. Muito obrigada.

Apesar de ter escolhido a professora Elisandra como orienta-

dora há bastante tempo, uma surpresa maravilhosa tornou necessária a

escolha de uma segunda pessoa nessa tarefa. Uma surpresa que também

mostrou-se maravilhosa. Por isso, quero agradecer também à professora

Viviane, que mesmo não tendo me encontrado em sala de aula, aceitou

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me orientar e certamente é em grande parte, grande mesmo, respon-

sável pela concretização deste trabalho. Muio obrigada, especialmente

pela compreensão e dedicação.

E por último, e de forma alguma menos importante, agradeço

à professora Tatiana pela grande amizade, pois eu não poderia des-

crever de outra forma o carinho que lhe sinto. Obrigada por tornar

mais agradável minha caminhada, por dividir comigo a carga, espe-

cialmente emocional, pelos conselhos e pela fé em minha capacidade.

Enfim, agradeço aos empecilhos, desafios e erros que trouxeram cres-

cimento, amadurecimento e tornaram mais significativo o alcance dos

meus objetivos.

Obrigada.

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“Somewhere, something incredible is

waiting to be known.”

Carl Sagan

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Resumo

SILVEIRA, Tamara. Elementos da Teoria dos Números Al-

gébricos. 2013. 131 p. Trabalho de Conclusão de Curso (Gradu-ação em Licenciatura em Matemática) - Universidade do Estadode Santa Catarina, Joinville, 2013.

Esta monografia tem por objetivo iniciar o estudo na Teoria dosNúmeros Algébricos. Possui o intuito de investigar e estudar deque forma as propriedades aritméticas dos números inteiros sãoestendidas para estruturas algébricas mais gerais, tais como: cor-pos de números algébricos e seus anéis de inteiros. Assim, estetrabalho tem por finalidade explorar e compreender as noçõesde fatoração única e domínios de Dedekind. Como para isso,serão necessários alguns resultados e conceitos algébricos já co-nhecidos, bem como as noções de anéis de polinômios, extensõesalgébricas e módulos, este trabalho aborda de forma sucinta es-ses temas. Os conceitos foram organizados e sintetizados com opropósito de criar uma base teórica consistente, que possibiliteum futuro aprofundamento na teoria.

Palavras-chave: Álgebra. Números Algébricos. Norma. Traço.Anéis de Dedekind.

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Abstract

SILVEIRA, Tamara. Elements of the Algebraic Number The-ory.. 2013. 131 p. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciaturaem Matemática) - Universidade do Estado de Santa Catarina,Joinville, 2013.

This monograph aims to initiate the study in Algebraic Num-ber Theory. Have the intention to investigate and study howthe arithmetic properties of the integers are extended to moregeneral algebraic structures, such as bodies of algebraic num-bers and their rings of integers. Thus, this study aims to exploreand understand the notions of unique factorization domains andDedekind. As for this, and some results already known algebraicconcepts as well as the notions of polynomial rings, Algebraicextensions and modules will be needed this work addresses theseissues succinctly. The concepts were organized and synthesizedin order to create a consistent theoretical basis, which allows afurther development in theory.

Key-words: Algebra. Algebraic Numbers. Norm. Trace. Dedekindrings.

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Lista de símbolos

N Conjunto dos números naturais

Z Conjunto dos números inteiros

Q Conjunto dos números racionais

R Conjunto dos números reais

C Conjunto dos números complexos

U(A) Conjunto dos elementos inversíveis de A

a | b O elemento a divide o elemento b

a ∼ b O elemento a está relacionado ao elemento b

mdc(a, b) Máximo diviso comum entre os elementos a e b

〈a〉 Conjunto gerado pelo elemento a

∂p Grau do polinômio p

A[x] Conjunto dos polinômios sobre A

A

IConjunto quociente de A por I

Im(f) Conjunto das imagens do homomorfismo f

Ker(f) Núcleo do homomorfismo f

A[α] Conjunto obtido pela adjunção de α a A

IB(A) Conjunto dos elementos de B que são inteiros sobre

A

[L : K] Grau da extensão L sobre K

Q[√d] Corpo quadrático

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Tr(α) Traço do elemento α

N(α) Norma do elemento α

D(α, β) Discriminante dos elementos α e β

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Sumário

INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

1 A ÁLGEBRA NA HISTÓRIA . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

1.1 NASCIMENTO DA ÁLGEBRA . . . . . . . . . . . . . 21

1.2 OS NÚMEROS ALGÉBRICOS NA HISTÓRIA . . . . . 23

2 CONCEITOS PRELIMINARES . . . . . . . . . . . . . . . . 29

2.1 ANÉIS FATORIAIS E PRINCIPAIS . . . . . . . . . . . 29

2.1.1 Divisibilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

2.1.2 Anéis fatoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

2.2 ANÉIS DE POLINÔMIOS . . . . . . . . . . . . . . . . 41

2.3 MÓDULOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58

2.3.1 Módulos Noetherianos . . . . . . . . . . . . . . . 71

3 ELEMENTOS INTEIROS EALGÉBRICOS . . . . . . . . . . 77

3.1 ELEMENTOS INTEIROS SOBRE UM ANEL . . . . . 77

3.1.1 Anéis Integralmente Fechados . . . . . . . . . . . 84

3.2 ELEMENTOS ALGÉBRICOS SOBRE UM CORPO . . 85

3.2.1 Extensões Algébricas . . . . . . . . . . . . . . . . 92

3.3 NÚMEROS ALGÉBRICOS . . . . . . . . . . . . . . . . 97

3.4 CORPOS QUADRÁTICOS . . . . . . . . . . . . . . . . 98

4 NORMA, TRAÇO EDISCRIMINANTE . . . . . . . . . . . . 103

4.1 NORMA E TRAÇO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 103

4.2 DISCRIMINANTE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117

5 ANÉIS DE DEDEKIND . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119

CONCLUSÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129

REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131

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19

INTRODUÇÃO

A Álgebra é uma importante área de conhecimento da Mate-

mática, que trata, dentre outros conteúdos, do estudo de estruturas

algébricas. As estruturas algébricas mais básicas foram estudadas na

disciplina de Álgebra Moderna do curso de Licenciatura em Matemá-

tica. Porém, o conteúdo abordado em tal disciplina ainda é insuficiente

para responder a questões mais elaboradas da Álgebra.

A Teoria dos Números Algébricos é um dos conceitos da área

de álgebra de grande aplicabilidade, mas sua origem se deve em grande

parte aos estudos da Teoria dos Números nos séculos XVII, XVIII e

XIX, principalmente, como explicam Stewart e Tall (2002). A prin-

cípio, a Teoria dos Números é, na verdade, uma teoria dos números

racionais e inteiros, que está principalmente relacionada à resolução de

equações diofantinas, segundo Endler (2006), e os números algébricos

são a ferramenta para resolver tal problema.

Porém, ao partir dos estudos realizados na disciplina de Ál-

gebra Moderna visando o entendimento da Teoria dos Números Al-

gébricos, surgem alguns questionamentos, tais como: de que modo a

Teoria dos Números Algébricos estende as propriedades dos números

inteiros para uma estrutura de números mais gerais, tais como: corpos

de números algébricos, e seus anéis de inteiros algébricos? Neste cená-

rio, algumas características familiares dos anéis de inteiros comuns, tais

como a fatoração única e o comportamento dos ideais, nem sempre são

generalizadas para os anéis de inteiros algébricos. Como a Teoria dos

Números Algébricos permite lidar com esses novos fenômenos e ainda

como recuperar parcialmente o comportamento dos inteiros habituais?

Para responder a esses questões, pretendendo-se o alcance dos

objetivos desse estudo e tendo como base os principais conteúdos de

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20 Introdução

álgebra estudados durante o curso de Licenciatura em Matemática,

serão estudados os conteúdos de anéis fatoriais e principais, anéis de

polinômios, extensões algébricas e módulos a fim de introduzir o estudo

de números algébricos. Também será estudada a estrutura do anel de

inteiros, bem como as propriedades aritméticas de seus elementos. Será

explorado o conceito de fatoração única dentro desses anéis de inteiros

e investigado os motivos pelos quais a teoria de fatoração de ideais em

um anel de inteiros algébricos é mais satisfatória do que a fatoração de

seus elementos.

Sendo assim, os capítulos desta monografia estão estruturados

da seguinte maneira: o Capitulo 1 traz de forma breve a história dos

números algébricos, a fim de entender seu surgimento; no Capítulo 2

serão apresentados os conceitos preliminares que incluem anéis fatoriais

e principais, anéis de polinômios, e módulos; no Capitulo 3, serão apre-

sentados os elementos inteiros e algébricos, particularmente, as noções

de extensões, números algébricos e corpos quadráticos; no Capitulo 4

estuda-se de forma sucinta os conceitos de norma, traço e discriminante

de um elemento; no capitulo 4 apresenta-se a estrutura dita anel de De-

deking e, finalmente, no Capitulo 5 serão apresentadas às conclusões

deste trabalho e sugestões para trabalhos futuros.

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21

1 A ÁLGEBRA NA HISTÓRIA

Num estudo científico, a importância do conhecimento do con-

texto histórico do objeto estudado é relevante para melhor compreensão

do próprio tema em si. Acompanhar o desenvolvimento do tema através

da história, a motivação por trás do estudo e as ferramentas utilizadas

para tanto são úteis no entendimento presente do tema, e ajudam a

nortear seu aprofundamento.

Visando a relevância exposta acima, desenvolveu-se este ca-

pítulo inicial para esclarecer como a Teoria dos Números Algébricos

surgiu e aperfeiçoou-se gradualmente. Para garantir a veracidade e a

integridade histórica deste capítulo foram utilizados como referencial

teórico os textos de Boyer (1996), Contador (2008), Endler (2006), Eves

(2004) e Stewart e Tall (2002).

1.1 NASCIMENTO DA ÁLGEBRA

A álgebra, no início do século XIX, era vista basicamente como

a aritmética simbólica. Trabalhava-se com letras da mesma forma que

se faz com os números na aritmética, de modo que qualquer uma das

cinco propriedades:

• comutatividade da adição;

• comutatividade da multiplicação;

• associatividade da adição;

• associatividade da multiplicação;

• distributividade da multiplicação em relação à adição;

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22 Capítulo 1. A ÁLGEBRA NA HISTÓRIA

que fossem válidas para os símbolos escolhidos se estendesse aos intei-

ros positivos. A estrutura algébrica formada pelas cinco propriedades

e suas consequências é aplicável a muitos sistemas diferentes. Assim,

pode-se considerar as cinco propriedades básicas como postulados de

determinada estrutura algébrica e possíveis teoremas formalmente de-

correntes delas aplicáveis a outras interpretações que se ajustem àque-

las propriedades. Dessa forma, a Álgebra torna-se uma área puramente

hipotético-dedutiva formal.

Essa visão mais moderna da Álgebra surgiu aproximadamente

em 1830, atribuída ao inglês George Peacock (1791 – 1858), estudioso

dos princípios fundamentais da álgebra. Alguns britânicos, contempo-

râneos a Peacock, deram continuidade aos estudos dele, e aproximaram

ainda mais a Álgebra da sua noção mais moderna. As leis comutativa e

distributiva foram “nitidamente trazidas à luz” por Duncan Farquhar-

son Gregory (1813 – 1844), e Augustus De Morgan (1806 – 1871) trouxe

contribuições adicionais acerca dos fundamentos da álgebra.

As ideias britânicas se espalharam pela Europa de tal forma que

o irlandês William Rowan Hamilton (1805 – 1865) e o alemão Hermann

Günther Grassmann (1809 – 1877) publicaram resultados importantes

que levaram à libertação da Álgebra. Hamilton, motivado por consi-

derações físicas, viu-se obrigado a abandonar a comutatividade, uma

ideia até então inconcebida. Primeiramente, ocorreu a Hamilton repre-

sentar um número complexo a + bi, com a e b números reais, por um

par ordenado (a, b), um grande feito aliás, pois acabou por eliminar a

“aura mística” acerca dos números complexos. Posteriormente, ao per-

ceber que o sistema complexo é conveniente para o estudo de vetores e

das rotações no plano, Hamilton tentou imaginar um sistema análogo

num espaço tridimensional. E assim, Hamilton apresentou a ideia dos

números quatérnios (reais) em que a lei comutativa da multiplicação

não é válida.

Já Grassmann, desenvolveu classes de Álgebra de maior genera-

lidade que Hamilton, pois, em vez de considerar quádruplos ordenados

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1.2. OS NÚMEROS ALGÉBRICOS NA HISTÓRIA 23

de números reais, os quatérnios de Hamilton, Grassmann considerou

conjuntos ordenados de n reais, chamados hipercomplexos. Por fim,

o britânico Arthur Cayley (1821 – 1895) descobriu mais uma álgebra

não-comutativa, a álgebra das matrizes, e desta forma Hamilton, Gras-

smann e Cayley abriram as portas da álgebra abstrata desenvolvendo

álgebras com leis estruturais diferentes das usuais.

1.2 OS NÚMEROS ALGÉBRICOS NA HISTÓRIA

A fascinação do homem civilizado pelos números é milenar. Os

pitagóricos estudaram os números naturais e suas propriedades, e até

mesmo o teorema de Pitágoras, apesar de ter origem geométrica, tem

relevância na Teoria dos Números. Na Babilônia, notaram os chamados

ternos pitagóricos, que consistem em três números naturais a, b e c que

respeitam a relação a2 + b2 = c2.

Apesar dos antigos gregos terem se interessado mais pela Geo-

metria, também tinham interesse nos números em si, tanto que Diofanto

(250 a.C. – 298 a.C.) escreveu um importante tratado sobre equações

polinomiais cujas soluções eram números fracionários. Particularmente,

chamamos de equações diofantinas as que possuem como soluções nú-

meros naturais.

Aos poucos, o estudo da Álgebra foi evoluindo. Matemáticos

hindus se estabeleceram na área desenvolvendo trabalhos com números

negativos e com o zero. Já os muçulmanos, ao conquistarem Alexan-

dria, bem como norte da África e a Espanha no século VII, trouxeram

enriquecimento matemático, tanto que a palavra Álgebra tem origem

árabe. No século XVI, o italiano Girolamo Cardano (1501 – 1576) usou

em seu livro Ars Magna, do latim “A Grande Arte”, soluções negativas

e imaginárias, de forma que posteriormente os números complexos têm

sido usados com grande entendimento e flexibilidade.

Já no século XVII, volta-se a Teoria dos Números naturais

com o matemático francês Pierre de Fermat (1601? – 1665). A maior

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24 Capítulo 1. A ÁLGEBRA NA HISTÓRIA

contribuição de Fermat constitui na fundamentação da moderna Teoria

dos Números, este que possuía uma notável intuição e talento neste

campo. Provavelmente seu interesse nessa área se deu pela tradução

latina de Aritmética, de Diofanto, feita por Bachet de Méziriac em

1621. Muitas das contribuições de Fermat na Teoria dos Números tem

origem em enunciados e notas escritos nas margens de seu exemplar

desse livro.

Dos teoremas enunciados por Fermat, muitos se mostraram

verdadeiros posteriormente, e provavelmente o item de maior desta-

que em seus estudos seja o chamado Último Teorema de Fermat, que

afirma a não existência de inteiros positivos x, y, z e n, onde n > 2,

tais que xn + yn = zn. Fermat, ao escrever o enunciado na margem

do referido livro, afirma ter encontrado uma demonstração admirável

para esse fato, mas a pequenez da margem impossibilita explicitá-la ali.

Durante os anos seguintes ao conhecimento público desse teorema, mui-

tos matemáticos tentaram demonstrá-lo. O interesse pela demonstração

se tornou ainda maior depois de Paul Wolfskehl, em 1908, ter legado

uma quantia significativa para a Academia de Ciências de Göttingen

para que fosse dado como prêmio para a primeira pessoa a demonstrar

completamente o Último Teorema de Fermat. Foi assim que a fama e o

dinheiro impulsionaram o surgimento de diversas supostas provas, o que

levou o Último Teorema de Fermat a se destacar na história matemá-

tica como o problema matemático com maior número de demonstrações

incorretas publicadas, até hoje.

A repercussão da busca pela demonstração do Último Teorema

de Fermat impulsionou outros estudos matemáticos, e a prova da con-

jectura avançou de sua área de origem, a Teoria dos Números Naturais,

para uma diferente área de estudo, A Teoria dos Números Algébricos.

No século XIX o desenvolvimento da Teoria da Álgebra amadureceu de

forma que se tornou aplicável à Teoria dos Números. Por isso, naquela

época, os estudiosos da Teoria dos Números não priorizaram comple-

tamente o Último Teorema de Fermat. Ernst Eduard Kummer (1810

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1.2. OS NÚMEROS ALGÉBRICOS NA HISTÓRIA 25

– 1893), por exemplo, trabalhava em um tópico chamado de “as mai-

ores leis de reciprocidade”. Neste ponto foi que os números algébricos

entraram na Teoria dos Números, num trabalho de Gauss.

Em 1796, Karl Friedrich Gauss (1777 – 1855), matemático, as-

trônomo e físico alemão, prova um fato marcante observado na prática

por Euler em 1783. O suíço Leonhard Euler (1707 – 1783) interessou-se

pela congruência p, x2 ≡ p(mod q), quando q é um número inteiro e p

um número primo. Nesse caso, q é dito resíduo quadrático de p. Euler

estudava o caso em que p e q são números primos ímpares distintos e

observou que, se pelo menos um desses primos for da forma 4R + 1,

então q é resíduo quadrático de p se, e somente se, p for um resíduo

quadrático de q. Por outro lado, se p e q forem da forma 4R + 3, en-

tão um é resíduo quadrático do outro. E a reciprocidade da relação

entre p e q tornou conhecido esse resultado como a lei da reciprocidade

quadrática. Adrien-Marie Legendre (1752 – 1833), matemático francês,

tentou provar m 1785 a lei da reciprocidade, assumindo para isso que

certas progressões aritméticas têm um número infinito de primos, um

teorema cuja prova se mostrou ainda mais profunda que a própria lei

da reciprocidade quadrática.

Quando em 1796, Gauss provou pela primeira vez a lei da re-

ciprocidade quadrática ele estava insatisfeito, pois seu método não pa-

recia um caminho natural para resolver um teorema aparentemente

tão simples. Entre 1808 e 1832, Gauss estava interessado em leis seme-

lhantes, mas com potências superiores ao quadrado. Ele encontrou leis

de reciprocidade superiores, mas com isso descobriu que seus cálculos

tornavam-se mais fáceis quando trabalhava com os inteiros de Gauss

a + bi, onde a e b são números inteiros e i é a unidade imaginária,

do que apenas com números inteiros. Ele desenvolveu uma teoria de

fatoração para esses números, provou que a decomposição em fatores

primos era única e desenvolveu a lei da reciprocidade biquadrada, para

a congruência x4 ≡ p(mod q). Igualmente, ele considerou a reciproci-

dade cúbica usando números da forma a+ bw, com w = e2πi

3 , ou seja,

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26 Capítulo 1. A ÁLGEBRA NA HISTÓRIA

para a congruência x3 ≡ p(mod q). O uso desses novos tipos de núme-

ros por Gauss é de fundamental importância no Último Teorema de

Fermat, e o estudo das suas propriedades de fatoração é uma profunda

é frutífera fonte de métodos e problemas.

Os números descritos no parágrafo anterior são casos parti-

culares de números complexos, isto é, são raízes de um polinômio de

coeficientes inteiros. Tal número é dito algébrico, e se o polinômio tem

coeficiente dominante igual a 1 é dito inteiro algébrico. Numa configura-

ção mais ampla dos inteiros algébricos, é possível fatorar uma solução

da equação de Fermat xn + yn = zn, se ela existir, escrevendo-a na

forma

(x+ y)(x+ ζy) . . . (x+ ζn−1y) = zn,

usando uma raiz n-ésima da unidade onde ζ = e2πi

n . Se Z[ζ] é um

conjunto de inteiros algébricos da forma a0 +a1ζ+ . . .+arζr onde cada

ar é um inteiro comum, então essa fatoração ocorre no anel Z[ζ].

Em 1847, o francês Gabriel Lamé (1795 – 1870) anunciou uma

“prova” para o Último Teorema de Fermat. Sua proposta, de maneira

geral, era mostrar que bastava considerar o caso em que x e y não têm

fatores comuns, e deduziu que neste caso x+ y, x+ ζy, . . ., x+ ζn−1y

não têm fatores em comum, ou seja, são primos entre si. Então Lamé

argumentou que o produto de primos entre si pode ser igual a uma

potência n se cada um dos fatores do produto for também uma potência

de n. Assim

x+ y = un1

x+ ζy = un2

· · ·

x+ ζn−1y = unn

e com isso, Lamé chega a uma contradição.

Então, Joseph Liouville (1809-1882) lhe apontou que sua dedu-

ção assumiu sutilmente a fatoração única. Liouville teve sua suposição

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1.2. OS NÚMEROS ALGÉBRICOS NA HISTÓRIA 27

confirmada quando, mais tarde, recebeu uma carta de Kummer expli-

cando que a fatoração única poderia falhar em alguns casos, o primeiro

deles em n = 23. No verão de 1847, Kummer passou a elaborar sua

própria demonstração para o Último Teorema de Fermat para certos

expoentes n, superando as dificuldades encontradas pela descoberta da

não-unicidade da fatoração ao introduzir a teoria de número complexo

ideal. Essa teoria pode ser vista como a introdução de números que não

pertencem a Z[ζ] para serem usados como fatores quando os elementos

da fatoração pertencem a Z[ζ].

Posteriormente, a teoria assumiu uma forma diferente do que

Kummer havia posto, mas o conceito essencial de “ideal” impulsionou

a teoria. Usando sua teoria, Kummer demonstrou o Último Teorema

de Fermat para uma ampla gama de potências com expoente primo.

Kummer desenvolveu uma poderosa ferramenta com aplicações para

muitos outros problemas. Na realidade, grande parte da Teoria dos

Números clássica pode ser expressa em termos dos números algébricos.

Essa ideia foi introduzida mais fortemente pelo alemão David Hilbert

(1862 – 1943) em seu Zahlbericht (Relatório sobre os números) de 1897,

que teve grande influência no desenvolvimento da Teoria dos Números.

Como resultado, a Teoria dos Números Algébricos é hoje um ramo da

matemática próspero e importante, com métodos elaborados e intuiti-

vos, e, mais significativamente, aplicações não somente na Teoria dos

Números, mas também na Teoria dos Grupos, na Geometria Algébrica,

Topologia e Análise. Foram essas relações importantes que levaram à

prova final do Último Teorema de Fermat, estabelecendo-o definitiva-

mente como um teorema, e não apenas uma conjectura, como era posto

anteriormente. A prova do Último Teorema de Fermat foi possível pela

utilização de vários conceitos desenvolvidos através dos tempos, muitos

desses posteriores a Fermat, o que leva a crença de que, na realidade,

quando ele pensou ter vislumbrado a demonstração ele provavelmente

cometera algum equívoco em seu raciocínio, ou, caso contrário, ele ha-

via realmente tido um insight impressionante que não foi concebido por

nenhum matemático nos 350 anos seguintes. Ainda assim, ter intuído

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28 Capítulo 1. A ÁLGEBRA NA HISTÓRIA

tal teorema mostra a inteligência ímpar de Fermat.

Enfim, o surgimento dos números algébricos é bastante natural,

pois, por exemplo, é a ferramenta para atacar o problema da resolu-

ção das equações diofantinas. E como foi posto anteriormente, o anel

Z[ζ] tem grande importância nos estudos dos números algébricos. Mais

geralmente, para qualquer número algébrico α, pode-se considerar um

subanel IL do corpo L = Q(α), sendo IL o “anel dos inteiros algébricos

de L”, que nem sempre é da forma Z[α]. A relação entre o anel IL e L

é análoga a de Z = IQ e Q, e o estudo desse anel IL pode ser conside-

rado o foco principal da Teoria dos Números Algébricos, que apesar de

ter surgido como ferramenta, como visto anteriormente, tem ganhado

impulso como teoria independente.

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29

2 CONCEITOS PRELIMINARES

O objetivo principal deste capítulo é apresentar os conceitos

necessários para o entendimento da Teoria dos Números Algébricos,

além dos que já foram estudados na disciplina de Álgebra Moderna do

curso de Licenciatura em Matemática.

O capítulo apresentará noções básicas de Anéis de Polinômios,

Extensões Algébricas e Módulos. Tais conteúdos servem de embasa-

mento teórico para estudos posteriores, e são essenciais para entendi-

mento mais profundo de Álgebra. Nesse capítulo, foram utilizados os

conceitos descritos por Dean (1974), Domingues e Iezzi (2011) e Gon-

çalves (1999) como embasamento teórico.

2.1 ANÉIS FATORIAIS E PRINCIPAIS

Este Capítulo está baseado em Domingues e Iezzi (2011). Aqui

A será considerado um anel de integridade, ou seja, um anel comuta-

tivo com unidade e sem divisores próprios de zero. Além disso, 0 é o

zero (elemento neutro da adição) e 1 é a unidade (elemento neutro da

multiplicação).

2.1.1 Divisibilidade

Nesta Seção serão apresentados alguns conceitos referentes a

divisibilidade em um Anel de Integridade, que são necessários para o

estudo dos Anéis Fatoriais e Principais.

Definição 2.1. Um elemento a ∈ A é dito inversível se existir um

elemento b ∈ A tal que ab = ba = 1, onde 1 é a unidade de A.

O conjunto de todos os elementos inversíveis de A é denotado

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30 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

por U(A), ou seja,

U(A) = {a ∈ A : ∃b ∈ A, com ab = ba = 1}.

Definição 2.2. Sejam a, b ∈ A − {0}. Então, a divide b se existir

c ∈ A tal que b = ac, e denota-se essa relação por a | b.

Definição 2.3. Sejam a, b ∈ A. O elemento a é associado a b se a | be b | a, e indica-se esta relação em A por a ∼ b.

Exemplo 2.1. Dois elementos não nulos quaisquer de um corpo são

sempre associados. De fato, tomando 0 6= a, b ∈ K, onde K é corpo,

existem a−1, b−1 ∈ K tais que aa−1 = 1 e b−1b = 1. Então, a = b−1ba,

donde b | a. Analogamente a | b e, portanto, a e b são associados em K.

Exemplo 2.2. Dois números inteiros são associados se, e somente se,

forem iguais em módulo. A afirmação é verdadeira pois no anel Z,

apenas 1 e −1 são inversíveis. Então, tomando a, b ∈ Z tais que a | b e

b | a, tem-se que existem c, d ∈ Z, com b = ac e a = bd. Assim, a = acd

e cd = 1 então, c = d = 1 ou c = d = −1. Portanto, a = b ou a = −b.A recíproca é imediata.

Proposição 2.1. Sejam a, b ∈ A dois elementos quaisquer. Então,

a ∼ b se, e somente se, existe um elemento inversível u ∈ A tal que

b = au.

Demonstração: Se a ∼ b, existem x, y ∈ A tais que b = ax e a = by.

Então b = byx, donde yx = 1. Desta forma, x e y são inversíveis, com

x = y−1.

Reciprocamente, como b = au e u−1 ∈ A, tem-se que a = bu−1. Assim

a | b e b | a, donde a ∼ b.

Definição 2.4. Um elemento d ∈ A é máximo divisor comum de

a1, · · · , an ∈ A, denotado por mdc(a1, · · · , an) = d, se:

1. d | ai, para todo 1 ≤ i ≤ n,

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2.1. ANÉIS FATORIAIS E PRINCIPAIS 31

2. se d1 ∈ A e d1 | ai, para todo i ∈ {1, · · · , n}, então d1 | d. Isto é,

todo divisor de a1, · · · , an, é divisor de d.

Definição 2.5. Quando o máximo divisor comum de elementos quais-

quer de A é a unidade do anel esses elementos são ditos primos entre

si.

Proposição 2.2. Seja d um mdc de a1, · · · , an ∈ A. Temos que d′ é

mdc de a1, · · · , an se, e somente se, d ∼ d′.

Demonstração: Suponha que d e d′ sejam máximos divisores comuns

de a1, · · · , an. Pelo item (i) da Definição (2.4), d e d′ dividem a1, · · · , an,

e pelo item (ii) da Definição (2.4), d | d′ e também d′ | d. Portanto,

d ∼ d′.

Reciprocamente, sejam d, d′ ∈ A tais que, d é máximo divisor comum

de a1, · · · , an, d | d′ e d′ | d. Como d | ai, para todo 1 ≤ i ≤ n e d′ | d,

então, pela propriedade transitiva da divisibilidade, d′ | ai, para todo

1 ≤ i ≤ n. Supondo que exista c ∈ A, tal que c é um divisor comum

de a1, · · · , an ∈ A, pelo item (ii) da Definição (2.4), c | d. Mas d | d′,

donde c | d′. Portanto, d′ é mdc de a1, · · · , an ∈ A.

Nota-se, então, que o máximo divisor comum de elementos de

A, se existir, não é, em geral, único.

Exemplo 2.3. No anel dos inteiros, Z , aplicando a definição, têm-se

dois mdc, um o oposto do outro, como é possível observar do Exemplo

(2.2) e na Proposição (2.2). Porém, comumente, usa-se apenas o mdc

positivo.

Definição 2.6. Seja p ∈ A. Então, p é dito primo se:

1. p 6= 0;

2. p não é inversível;

3. dados a, b ∈ A, quaisquer, se p | ab, então p | a ou p | b.

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32 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

Mostra-se por indução que sendo p primo e p | a1 · · ·an, então

p divide um dos fatores.

Exemplo 2.4. Lembre-se de que se p ∈ Z é um número primo se

p 6= ±1 e os únicos divisores de p são ±1 e ±p. Seja p ∈ Z um número

primo, então p 6= 0 e não inversível. Sejam a, b ∈ Z tais que p | ab.Suponha que p não divide a, então mdc(a, p) = 1, pois 1 e p são os

únicos divisores de p. Pela Identidade de Bezout, existem x, y ∈ Z tais

que 1 = ax + py. Multiplicando por b, obtém-se b = abx + pby. Como

p | abx, pois p | ab, e p | pby segue que p | b. Portanto p é um elemento

primo.

Agora, seja p ∈ Z um elemento primo. Seja a ∈ Z, supondo que a | p,existe t ∈ Z tal que p = at e assim p | at. Por hipótese, p | a ou p | t.Se p | a, e como a | p, segue que a e p são associados e assim, a = ±p.Se p | t, existe u tal que t = pu. Substituindo em p = at, obtem-se

p = aup. Daí 1 = au e a = ±1. Portanto p é primo.

Definição 2.7. Seja p ∈ A. Então, p é dito irredutível se:

1. p 6= 0;

2. p não é inversível;

3. dados a, b ∈ A, quaisquer, se p = ab, então a é inversível ou b é

inversível.

Prova-se por indução que, dado p ∈ A irredutível e p = a1 · · · an,

n ≥ 1, então p é associado a algum ai, com 1 ≤ i ≤ n e o produto dos

demais fatores é inversível.

Observação 2.1. Um elemento p ∈ A tal que p 6= 0, p não é inversível

e p não é irredutível é chamado redutível.

É notável que no anel de inteiros os elementos primos são ir-

redutíveis. Isso ocorre pois Z é um anel de integridade, como mostra o

próximo resultado.

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2.1. ANÉIS FATORIAIS E PRINCIPAIS 33

Proposição 2.3. Todo elemento primo de um anel de integridade A é

irredutível.

Demonstração: Seja p um elemento primo de A. Como p é primo,

segue que p 6= 0 e p não é inversível, então, basta demonstrar o item

(3) da Definição (2.7). Assim, sejam a, b ∈ A tais que p = ab, então

p | ab. Assim, pela Definição (2.6), p | a ou p | b. Supondo que p | a,

existe c ∈ A tal que a = pc. Desta forma, p = ab = pcb, donde cb = 1

e c = b−1, onde b é inversível em A. De forma análoga, supondo p | bprova-se a inversibilidade de a no anel de integridade A.

2.1.2 Anéis fatoriais

Nesta seção, serão definidos, dentre outros conceitos, anel fa-

torial, anel principal e anel euclidiano, e será mostrado como que todo

anel euclidiano é principal, e todo anel principal é fatorial.

Sabe-se, pelo Teorema Fundamental da Aritmética, que todo

número inteiro pode ser escrito como produto de números primos e

essa fatoração é única a menos da ordem dos fatores. Nesta seção esse

conceito será ampliado para um anel de integridade.

Definição 2.8. Seja A um anel de integridade. A é dito anel fatorial

se são válidas as seguintes condições:

1. se a é elemento qualquer de A, não nulo e não inversível, então

existem p1, p2, · · · , ps ∈ A irredutíveis, tais que

a = p1p2 · · · ps;

2. sejam {pi}si=1 e {qj}t

j=1 famílias de irredutíveis de A. Se a =

p1p2 · · · ps = q1q2 · · · qt, então s = t e existe uma permutação σ

de {1, 2, · · · , s} tal que

pi ∼ qσ(i), para i = 1, 2, · · · , s.

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34 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

Ao definir anel fatorial, a condição (2) exprime a unicidade da

decomposição de a, a menos da ordem dos fatores irredutíveis e de

elementos inversíveis, cuja existência é assegurada pela condição (1).

Ou seja, qualquer elemento não nulo e não inversível num anel fatorial

pode ser decomposto em um produto de fatores irredutíveis. Ainda,

duas decomposições em fatores irredutíveis dum mesmo elemento do

anel, sob as mesmas condições, têm o mesmo número de fatores e as

duas decomposições são associadas fator a fator, através de uma relação

de permutação.

Exemplo 2.5. Todo corpo é um anel fatorial, pois, como apenas o zero

dentre seus elementos não é inversível, não há elementos dum corpo que

não satisfaçam a definição.

Teorema 2.1. Seja A um anel de integridade. Então, A é um anel

fatorial se, e somente se, A satisfaz a condição (1) da Definição (2.8)

e todo elemento irredutível em A é também elemento primo.

Demonstração: Seja A um anel fatorial. Por definição, A satisfaz a

condição (1). Então, sejam p ∈ A um elemento irredutível e a, b ∈ A

tal que p | ab. De acordo com o item (1) da Definição (2.8), existem

elementos irredutíveis p1, p2 · · · , ps, q1, q2 · · · , qt tais que

a = p1p2 · · · ps e b = q1q2 · · · qt.

Por outro lado, como p | ab, existe c ∈ A tal que ab = pc, assim

pc = p1p2 · · · psq1q2 · · · qt. (2.1)

Como por hipótese A é fatorial e p é irredutível, pelo item (2) da

Definição (2.8), p está associado a um dos fatores irredutíveis do se-

gundo membro da Equação (2.1). Então, p ∼ pi ou p ∼ qj , para algum

1 ≤ i ≤ s ou 1 ≤ j ≤ t. Ou seja, p | pi ou p | qj . Portanto, p | a ou p | b.

Reciprocamente, seja A um anel de integridade em que, se a é elemento

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2.1. ANÉIS FATORIAIS E PRINCIPAIS 35

qualquer de A, não nulo e não inversível, então existem p1, p2, · · · , ps ∈A irredutíveis, tais que

a = p1p2 · · · ps

e em que todo elemento irredutível em A é também elemento primo. As-

sim, sejam p1, p2 · · · , ps, q1, q2 · · · , qt ∈ A elementos irredutíveis, supõe-

se que

p1p2 · · · ps = q1q2 · · · qt. (2.2)

Como a condição do item (1) da Definição (2.8) já está satisfeita, basta

mostrar que s = t e que pi ∼ qσ(i), para i = 1, 2, · · · , s. Esta demons-

tração se dará por indução finita sobre o número natural s.

(i) Para s = 1, tem-se que

p1 = q1q2 · · · qt, supondo t > 1. (2.3)

Como p1 é primo, então p1 | qj , para algum 1 ≤ j ≤ t. Por outro

lado, qj | p1. Assim p1 ∼ qj e então, existe u inversível tal que

qj = p1u (2.4)

Substituindo (2.4) em (2.3) tem-se que

p1 = q1...qj−1p1uqj+1...qt.

Como A é anel de integridade e p1 6= 0, por hipótese, então

1 = q1...qj−1uqj+1...qt.

Desta forma, qi é inversível, para todo 1 ≤ i ≤ n, o que é uma

contradição, pois todos os qi são irredutíveis. Donde, t = 1.

(ii) Supõe-se, então, que a condição (2) da definição de anel fatorial

esteja satisfeita para s− 1, sendo s > 1.

(iii) Agora, precisa-se provar que a condição (2) seja satisfeita para s.

Da equação (2.2), p1 | (q1q2 · · · qt), mas como p1 é elemento primo,

então p1 | qi, para algum qi, com 1 ≤ i ≤ t. Supondo, sem

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36 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

perda de generalidade, que i = 1, então p1 | q1 e, para algum

u é inversível em A, q1 = up1, donde

p1p2 · · · ps = up1q2 · · · qt. (2.5)

Agora, definindo p2′ = u−1p2 e dividindo a Equação (2.5) por p1,

obtém-se

p2′p3 · · · ps = q2q3 · · · qt, (2.6)

com p2′ , p3, · · · , ps, q2, q3, · · · , qt irredutíveis. Pela hipótese de in-

dução expressa no item (ii) desta demonstração, temos s−1 = t−1. Denotação convenientemente, tem-se que p2′ ∼ q2′ , · · · , ps ∼ qs

e, portanto, s = t e pi ∼ qi para 1 ≤ i ≤ s.

Desta forma, com o resultado demonstrado acima, conclui-se

que num anel fatorial, um elemento p é irredutível se, e somente se, p

é primo.

Agora, será definido anel principal, que é um caso particular

de anel fatorial, como se verifica posteriormente.

Definição 2.9. Seja A um anel de integridade. A é dito principal se

todos os seus ideais são principais.

Desse modo, um anel de integridade A é principal se dado qual-

quer ideal I de A, existe a ∈ A tal que I = 〈a〉.

Exemplo 2.6. O anel dos números inteiros Z é um anel principal, pois

cada ideal pode ser gerado por apenas um número, ou seja, todos os

seus ideais são principais, satisfazendo a condição dada na definição.

Proposição 2.4. Seja I um ideal de um anel de integridade A. Se I

contém algum elemento inversível de A, então I = A

Demonstração: Como I é ideal de A, basta mostrar a inclusão A ⊂ I.

Assim, sejam a ∈ A um elemento qualquer e u ∈ I inversível. Então,

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2.1. ANÉIS FATORIAIS E PRINCIPAIS 37

existe v ∈ A tal que uv = 1. E, assim,

a = a · 1 = a(uv) = (av)u.

Como av ∈ A e u ∈ I, então a = (av)u ∈ I. Assim, A ⊂ I e, portanto,

A = I

Proposição 2.5. Seja A um anel principal. Então, todo elemento ir-

redutível é primo.

Demonstração: Seja p um elemento irredutível de A. Então, p é

não nulo e não é inversível, satisfazendo as duas primeiras condições

de elemento primo, então, suponha-se que p | ab. Seja I = 〈a, p〉 ⊂ A.

Como A é anel principal, existe d ∈ A tal que I = 〈d〉. Como p ∈ I,

existe c ∈ A tal que p = dc. Pela irredutibilidade de p, segue que d ou

c é inversível.

1. Se d é inversível:

Pela Proposição (2.4) tem-se que 〈d〉 = A, ou seja, 〈a, p〉 = I =

〈d〉 = A. Como 1 ∈ A, existem x, y ∈ A tais que 1 = ax + py.

Logo, b = abx + pby. Por hipótese, p | ab e é claro que p | pby,

assim p | b.

2. Se c é inversível:

Como p = dc, então d = pc−1. Mas a ∈ I, então pode ser escrito

como a = dq, para algum q ∈ A. Então, tem-se que a = qpc−1 e,

logo, p | a.

Portanto, p é primo.

Exemplo 2.7. Pelo Exemplo (2.6), Z é um anel principal, logo, pela

proposição que acima demonstrada, todo elemento irredutível em Z é

um número primo e reciprocamente. Desse modo, um elemento p ∈ Z

é irredutível se, e somente se, os únicos divisores de p são ±1 e ±p.

Proposição 2.6. Seja A um anel principal. Então, p ∈ A − {0} é

irredutível se, e somente se, 〈p〉 é maximal.

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38 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

Demonstração: Seja p ∈ A− {0} irredutível. Pela Definição (2.7), p

é não nulo e não é inversível. Então, seja a ∈ A tal que 〈p〉 ⊂ 〈a〉, donde

p ∈ 〈a〉. Assim, existe q ∈ A tal que p = aq. Mas p é irredutível, logo

a ou q é inversível. Se a é inversível, então 〈a〉 = A, pela Proposição

(2.4). Por outro lado, se q é inversível, então q−1 ∈ A e a = pq−1.

Logo, a ∈ 〈p〉 e assim 〈a〉 ⊂ 〈p〉. Como também 〈p〉 ⊂ 〈a〉, tem-se que

〈a〉 = 〈p〉. Portanto, 〈p〉 é maximal.

Reciprocamente, seja 〈p〉 um ideal maximal de A, entao 〈p〉 6= A. Pela

contrapositiva da Proposição (2.4), p não é inversível. Agora, sejam

a, b ∈ A tais que p = ab. Assim p ∈ 〈a〉, de forma que, 〈p〉 ⊆ 〈a〉 ⊆ A.

Como 〈p〉 é maximal segue que 〈p〉 = 〈a〉, ou 〈a〉 = A. Se 〈p〉 = 〈a〉então, a ∈ 〈a〉 = 〈p〉 e a = pt, para algum t ∈ A. Tem-se que p | a e a | p,logo, a ∼ p. Portanto, existe u ∈ U(A) tal que a = up. Assim, p = upb

e ub = 1, donde b é inversível. Se 〈a〉 = A, tem-se que 1 ∈ A = 〈a〉 e

existe x ∈ A tal que 1 = ax, consequentemente a é inversível. Portanto,

p é irredutível.

Lema 2.1. Seja I1 ⊆ I2 ⊆ I3 · · · uma sequência de ideais de A, onde

A é anel principal. Então, para algum t ≥ 1, It = It+1 = · · · , em outras

palavras, a sequência I1 ⊆ I2 ⊆ I3 · · · é estacionária.

Demonstração: Primeiramente é preciso mostrar que

I =⋃

j≥1

Ij (2.7)

é um ideal de A. De fato, se x, y ∈ I, existem m,n ∈ N tais que x ∈ Im

e y ∈ In. Tomando s = max{m,n}, tem-se que x, y ∈ Is e, assim,

x − y ∈ Is ⊂ I. Seja x ∈ I e a ∈ A, então existe um r ∈ N tal que

x ∈ Ir , donde ax ∈ Ir ⊂ I.

Como A é anel principal, existe d ∈ A tal que

I = 〈d〉.

Por outro lado, como d ∈ I tem-se que d ∈ It, para algum t ∈ N.

Portanto, I = 〈d〉 ⊆ It. Da Equação (2.7), It ⊆ I, de forma que I = It.

Portanto, It = It+1 = · · · .

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2.1. ANÉIS FATORIAIS E PRINCIPAIS 39

Lema 2.2. Seja A um anel principal. Então, todo elemento não inver-

sível a ∈ A tem um divisor irredutível nesse anel.

Demonstração: Se a = 0, a demonstração é imediata. Agora, supõe-

se que a é não nulo e não inversível. Considerando o ideal I0 = 〈a〉,tem-se que se esse ideal for maximal, então, pela Proposição (2.6), a é

irredutível, e toma-se a como sendo seu divisor irredutível. Mas, se I0

não for maximal, então existe um ideal I1 = 〈a1〉 ( A, tal que I0 ( 〈a1〉.Como anteriormente, se I1 = 〈a1〉 for maximal, a1 é irredutível. Dado

que 〈a〉 ⊂ 〈a1〉, então a1, neste caso, é um divisor de a. Mas, se I1 não

for maximal, usa-se o mesmo argumento, concluindo-se que existe um

ideal I2 = 〈a2〉 ( A, tal que 〈a1〉 ( 〈a2〉, ou seja

I0 ( I1 ( I2 ( A.

Considerando novamente as duas possibilidades referentes a I2 ser ma-

ximal ou não, tem-se que se I2 é maximal, a2 é um elemento irredutível

tal que a2 | a1 | a, e se I2 não for maximal, encontrar-se-á outro ideal

o contendo, e assim sucessivamente.

Mas, pelo Lema (2.1), não há sequência I0 ⊂ I1 ⊂ I2 ⊂ · · · de ideais em

A estritamente crescente. Logo, para algum r+ 1 o ideal Ir+1 = 〈ar+1〉será maximal e o elemento ar+1 desta forma obtido é irredutível e di-

visor de ar, ar−1, ..., a1 e, portanto, divisor a

Proposição 2.7. Todo anel principal é fatorial.

Demonstração: Considere A um anel principal. Pela Proposição

(2.5), temos a condição de que todo elemento irredutível em A é tam-

bém elemento primo, que é a segunda condição do Teorema (2.1), para

que um anel de integridade seja anel fatorial. Logo, basta apenas mos-

trar a segunda condição da definição de anel fatorial, ou seja, mostrar

a existência da decomposição em fatores irredutíveis dos elementos de

um anel principal.

Se a ∈ A é irredutível, a condição está satisfeita. Então, seja a ∈ A re-

dutível, ou seja, a é um elemento não irredutível e não nulo. Do Lema

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40 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

(2.2), a tem um divisor irredutível p1 ∈ A, o que garante a existência

de a1 ∈ A tal que

a = p1a1.

Analogamente, se a1 for irredutível, a demonstração se dá por encer-

rada. No caso contrário, usa-se o raciocínio anterior para a com a1,

chegando, assim, a uma igualdade a1 = p2a2, com a2, p2 ∈ A e p2 é

irredutível. Até o momento

a = p1p2a2.

Caso a2 seja irredutível, a demonstração está encerrada. Mas se a2 é re-

dutivo, repete-se o raciocínio de a e a1 com a2, e assim sucessivamente.

Pode-se assim obter a cadeia de ideias: 〈a1〉 ⊂ 〈a2〉 ⊂ 〈a3〉 ⊂ · · · . Pelo

Lema (2.1), esta cadeia deve ser estacionário, logo os ai, com i ∈ N não

podem ser irredutíveis indefinidamente, ou seja, em algum momento

as = ps será irredutível, de forma que

a = p1p2 · · · ps

com todos os fatores são irredutíveis.

Durante esta seção, concluiu-se que Z além de fatorial é prin-

cipal. Agora, estudar-se-á certos anéis que admitem um algoritmo de

divisão análogo à divisão do anel Z dos números inteiros. Estes anéis

são um caso particular de anel fatorial, como verifica-se posteriormente.

Definição 2.10. Seja A um anel de integridade A. A é dito anel φ-

euclidiano se existir uma função φ : A− {0} → N tal que:

(i) Dados a e b ∈ A− {0}, φ(ab) ≥ φ(a);

(ii) Se a e b ∈ A e b 6= 0, então existem q e r em A, tais que a = bq+r,

com r = 0 ou φ(r) < φ(a).

Caso a função φ esteja subentendida não é necessário explicitá-

la, basta denominar A anel euclidiano.

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2.2. ANÉIS DE POLINÔMIOS 41

Exemplo 2.8. Seja A = Z o conjunto dos números inteiros e tome

φ(x) = |x|, para x ∈ Z. Então, tem-se que

• |xy| = |x||y| ≥ |x|, para todo x, y ∈ Z − {0}.

• Sejam x, y ∈ Z, com y 6= 0. Pelo algoritmo da divisão, existem

q, r ∈ Z tais que x = by + r, com r = 0 ou |r| < |x|.

Portanto, Z é anel euclidiano com a função módulo.

Proposição 2.8. Todo anel φ-euclidiano é principal.

Demonstração: Sejam A um anel φ-euclidiano e I 6= {0} um ideal de

A. O conjunto {φ(a) ∈ N ; a ∈ I e a 6= 0} é não vazio, pois I 6= {0},

logo, este conjunto tem mínimo φ(b), com 0 6= b ∈ I. Ainda, tem-se

que 〈b〉 ⊆ I. Seja x ∈ I um elemento qualquer, então, como A é φ-

euclidiano, existem q, r ∈ A tais que x = qb + r, onde φ(r) < φ(b)

se r 6= 0. Assim, r = x − qb ∈ I, pois x, b ∈ I, de forma que r ∈ I.

Como, dada a escolha de b ser tal que φ(b) é o mínimo de I, segue que

φ(r) < φ(b) não ocorre, logo x − bq = r = 0, donde x = bq e, assim,

x ∈ 〈b〉. Portanto, 〈b〉 = I e A é anel principal.

Como foi provado anteriormente, todo anel principal é fatorial,

então, consequentemente, todo anel φ-euclidiano é fatorial.

2.2 ANÉIS DE POLINÔMIOS

Nesta seção estão alguns dos principais conceitos de Anéis de

Polinômios conforme o necessário ao que é proposto neste trabalho.

Inicialmente, o Anel de Polinômios será definido conforme define Dean

(), para que o conceito seja posto de forma mais precisa e significativa.

Definição 2.11. Seja A um anel. Um polinômio p sobre A é uma

sequência (a0, a1, a2, ...) de elementos de A na qual apenas um número

finito de termos é diferente do elemento nulo de A, denotado por 0A,

ou apenas 0, quando não houver ambiguidade.

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42 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

Observação 2.2. É comum dizer que p é uma sequência “quase nula”.

Como em um polinômio apenas um número finito de termos

da sequência é diferente do elemento nulo de A, certamente haverá um

último termo não nulo do polinômio.

Definição 2.12. Seja p um polinômio sobre um anel A dado por

p = (a0, a1, a2, ..., an, 0, 0, ...).

Define-se grau do polinômio p o número natural n, tal que para todo

i > n, tem-se ai = 0.

O grau do polinômio p é denotado por ∂p.

Definindo uma variável x e denotando o polinômio (0, ..., 0, a, 0, ...)

por axm quando a é o (m+ 1)-ésimo termo da sequência, tem-se

ax1 = (a, 0, 0, 0, ...)

ax2 = (0, a, 0, 0, ...)

ax3 = (0, 0, a, 0, ...)

...

Portanto, um polinômio p = (a0, a1, a2, ..., an, 0, 0, ...) é descrito

da forma

p(x) = a0 + a1x+ a2x2 + ...+ anx

n.

Os termos a0, a1, a2, ... da sequência p são os coeficientes na expressão

a0 + a1x+ a2x2 + ...+ anx

n. Quando o coeficiente de algum termo aixi

do polinômino for nulo, usualmente fica oculto na expressão polinomial.

O grau de um termo aixi é i, ou seja, o expoente de x. Num

polinômio p(x) = a0 + a1x + a2x2 + ...+ anx

n seu grau é o mesmo do

termo de maior grau com coeficiente não nulo. Nota-se, então, que o

polinômio nulo (0, 0, 0, ...), ou 0 + 0x+ 0x2 + ..., não possui grau.

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2.2. ANÉIS DE POLINÔMIOS 43

Para cada a ∈ A, o polinômio p = (a, 0, 0, ...), ou p(x) = a +

0x+0x2+..., é dito polinômio escalar a, e tem grau 0 se a 6= 0. Apesar

do polinômio nulo (0, 0, 0, ...), ou 0 + 0x+ 0x2 + ..., não possuir grau,

ele é definido, por conveniência, como um polinômio escalar.

Num polinômio p sobre o anel A, o coefiente do termo de maior

grau é dito coeficiente principal de p, assim, se ∂p = d, ad é o coe-

ficiente principal de p. Caso o coeficiente principal de p seja a unidade

do anel A (se existir), p é chamado de polinômio mônico.

Definição 2.13. Sejam p e q polinômios sobre o anel A, dados por

p(x) = a0 + a1x+ a2x2 + ...+ amx

m

q(x) = b0 + b1x+ b2x2 + ...+ anx

n.

Então, p(x) é igual a q(x), se m = n e ai = bi, para cada i ∈ N.

Em outras palavras, dois polinômios são iguais se possuem o

mesmo grau e são iguais termo a termo.

Definição 2.14. Sejam p e q polinômios sobre o anel A, dados por

p(x) = a0 + a1x+ a2x2 + ...+ amx

m

q(x) = b0 + b1x+ b2x2 + ...+ anx

n.

Definimos a adição de dois polinômios sobre A da seguinte forma

p(x) + q(x) = (a0 + b0) + (a1 + b1)x+ (a2 + b2)x2 + ... (2.8)

e a multiplicação por

p(x)q(x) = c0 + c1x+ c2x2 + ..., (2.9)

onde

ck =k∑

i=0

aibk−i =∑

i+j=k

aibj .

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44 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

É fácil ver que a adição e multiplicação de polinômios sobre A

irá resultar em um polinômio cujos coeficientes estão em A, pois tais

coeficientes resultaram da adição e da multiplição de elementos de A,

que é anel, e portanto, fechado para a adição e para a multiplicação.

Observação 2.3. SejaA um anel. Denota-se o conjunto dos polinômios

p na variável x sobre A da forma

A[x] = {a0 + a1x+ a2x2 + ...+ anx

n : n ∈ N, ai ∈ A, ∀i ∈ {1, ..., n}}.

Observação 2.4. Seja A um anel. É possível identificar cada elemento

a ∈ A como um polinômio constante da forma p(x) = a. Como p(x) ∈A[x], observa-se que A ⊆ A[x].

Proposição 2.9.

1. Se A é um anel, então A[x] é um anel.

2. Se A é um anel comutativo, então A[x] é um anel comutativo.

3. Se A é um anel com unidade, então A[x] é um anel com unidade.

4. Se A é um anel de integridade, então A[x] é um anel de integri-

dade.

Demonstração: Para demonstrar essa proposição, serão definidos

p(x) = a0 + a1x+ a2x2 + ...

q(x) = b0 + b1x+ b2x2 + ...

r(x) = c0 + c1x+ c2x2 + ...

polinômios não nulos de A[x].

1. É preciso verificar os 6 axiomas de anel. Lembrando que as pro-

priedades de anel valem para os coeficientes de p, q e r, uma vez

que esses pertencem ao anel A .

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2.2. ANÉIS DE POLINÔMIOS 45

i) Comutatividade da adição:

p(x) + q(x) = (a0 + b0) + (a1 + b1)x+ (a2 + b2)x2 + ...

= (b0 + a0) + (b1 + a1)x+ (b2 + a2)x2 + ...

= q(x) + p(x)

ii) Associatividade da adição:

p(x) + [q(x) + r(x)] = a0 + a1x+ ...+ (b0 + c0) + (b1 + c1)x+ ...

= [a0 + (b0 + c0)] + [a1 + (b1 + c1)]x+ ...

= [(a0 + b0) + c0] + [(a1 + b1) + c1]x+ ...

= (a0 + b0) + (a1 + b1)x+ ...c0 + c1x+ ...

= [p(x) + q(x)] + r(x)

iii) Existência do elemento neutro da adição (0A[x]):

Tome o polinômio nulo 0 = 0 + 0x+ 0x2 + ... ∈ A[x]

p(x) + 0 = (a0 + 0) + (a1 + 0)x+ ...

= a0 + a1x+ ...

= p(x)

Como vale a comutatividade da adição, o polinômio nulo é o ele-

mento neutro da adição em A[x].

iv) Existência do elemento simétrico da adição (oposto):

Para p(x) = a0 +a1x+a2x2 + ..., tome −p(x) = (−a0)+(−a1)x+

(−a2)x2 + ..., onde −an é simétrico de an em A, para todo n ∈ N..

Assim,

p(x) + [−p(x)] = [a0 + (−a0)] + [a1 + (−a1)]x+ ...

= 0 + 0x+ ...

= 0

Como vale a comutatividade da adição, −p(x) assim definido é o

elemento simétrico de p(x) em A[x].

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46 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

v) Associatividade da multiplicação

É preciso mostrar que

p(x) · [q(x) · r(x)] = [p(x) · q(x)] · r(x)

Definindo as multiplicações:

q(x) · r(x) = d0 + d1x+ ..., onde dk =∑

i+j=k

bicj

p(x) · q(x) = l0 + l1x+ ..., onde lk =∑

i+j=k

aibj

p(x) · [q(x) · r(x)] = e0 + e1x+ ..., onde ek =∑

i+j=k

aidj

[p(x) · q(x)] · r(x) = m0 +m1x+ ..., onde mk =∑

i+j=k

licj

pode-se escrever:

ek =∑

i+j=k

aidj

=∑

i+j=k

(ai

α+β=j

bαcβ)

=∑

i+α+β=k

aibαcβ

=∑

n+β=k

(∑

i+α=n

aibα)cβ

=∑

n+β=k

lncβ

= mk

Portanto,

p(x)·[q(x)·r(x)] = e0+e1x+... = m0+m1x+... = [p(x)·q(x)]·r(x)

e vale a associatividade da multiplicaçao em A[x].

vi) Distributividade

É preciso mostrar que p(x) · [q(x)+r(x)] = p(x) ·q(x)+p(x) ·r(x).

Definindo as multiplicações:

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2.2. ANÉIS DE POLINÔMIOS 47

p(x) · [q(x) + r(x)] = d0 + d1x+ ..., onde dk =∑

i+j=k

ai(bj + cj)

p(x) · q(x) = e0 + e1x+ ..., onde ek =∑

i+j=k

aibj

p(x) · r(x) = l0 + l1x+ ..., onde lk =∑

i+j=k

aicj

pode-se escrever:

dk =∑

i+j=k

ai(bj + cj)

=∑

i+j=k

aibj + aicj

=∑

i+j=k

aibj +∑

i+j=k

aicj

= ek + lk

De modo análogo, verifica-se

[p(x) + q(x)] · r(x) = p(x) · r(x) + q(x) · r(x)

e, então, vale a propriedade distributiva em A[x].

Portanto, A[x] é anel se A for anel.

2. Definindo

p(x) · q(x) = d0 + d1x+ d2x2 + ..., onde dk =

i+j=k

aibj

q(x) · p(x) = e0 + e1x+ e2x2 + ..., onde ek =

i+j=k

bjai.

Desde que A[x] é anel comutativo, tem-se

dk =∑

i+j=k

aibj

=∑

i+j=k

bjai

= ek.

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48 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

Desta forma,

p(x)·q(x) = d0+d1x+d2x2+... = e0+e1x+e2x

2+... = q(x)·p(x).

Portanto, A[x] é anel comutativo se A também o for.

3. Seja A seja anel com unidade 1. Definindo

u(x) = 1 = 1 + 0x+ 0x2 + ...

tem-se que

p(x) · u(x) = c0 + c1x+ c2x2 + ...

com

ck =∑

i+j=k

aiej ,

onde e0 = 1 e ej = 0 para todo j ≥ 0. Segue que

ck =∑

i+j=k

aiej

= 1ak

= 1ak

= ak.

Assim,

p(x) · u(x) = c0 + c1x+ c2x2 + ... = a0 + a1x+ a2x

2 + ... = p(x).

De modo análogo, pode-se verificar que

u(x) · p(x) = p(x)

e, então, o polinômio escalar u(x) = 1 é a unidade de A[x]

Portanto, A[x] é anel com unidade se A também o for.

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2.2. ANÉIS DE POLINÔMIOS 49

4. Basta mostrar que A[x] não possui divisores de zero, pois a co-

mutatividade e a existência da unidade já foram verificados no

itens 2. e 3., respectivamente.

Supondo que A[x] tenha divisores de zero, então, existem p(x), q(x) ∈A[x], ambos não nulos, tais que p(x) · q(x) = 0. Sendo p(x) 6= 0

e q(x) 6= 0, existem m,n ∈ N, tais que ∂p = m e ∂q = n. Tem-se

que

p(x) · q(x) = c0 + c1x+ c2x2 + ... = 0,

onde

ck =∑

i+j=k

aibj = 0, ∀ k ∈ N

Particularmente,

0 = cm+n

=∑

i+j=m+n

aibj

= a0bm+n + a1bm+n−1 + ...+ am−1bn+1 + ambn+

+ am+1bn−1 + ...+ am+nb0

= ambn

pois bk = 0, para todo k > n e ak = 0, para todo k > m. Desta

forma, ambn = 0, mas am 6= 0 e bn 6= 0, o que contradiz a hipótese

de que A é anel de integridade. Logo, A[x] não têm divisores de

zero e A[x] é anel de integridade se A também o for.

Observação 2.5. Pela Proposição (2.9), verifica-se que

• Z[x] é anel, pois Z também o é.

• (nZ)[x] é anel comutativo, pois nZ é anel comutativo;

• (M2×2(R))[x] é anel com unidade, pois M2×2(R) também o é.

unidade.

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50 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

• Q[x], R[x] e C[x] são anéis de integridade, pois Q, R e C também

o são.

• Zp[x] é anel de integridade, pois Zp também o é se p for primo

positivo.

Antes de enunciar a proposição abaixo é interessante notar que

o grau do polinômio define uma função

∂ : A[x]∗ −→ N

p(x) 7−→ ∂p

Proposição 2.10. Sejam p e q polinômios não nulos sobre o anel A.

1. Se p(x) + q(x) 6= 0, então ∂(p+ q) ≤ max {∂p, ∂q}.

2. Se ∂p 6= ∂q, então p(x) + q(x) 6= 0 e ∂(p+ q) ≤ max {∂p, ∂q}.

3. Se p(x)q(x) 6= 0, então ∂(pq) ≤ ∂p+ ∂q.

4. Se A é um anel de integridade, então p(x)q(x) 6= 0 e ∂(pq) =

∂p+ ∂q.

Demonstração: Primeiramente, serão definidos os polinômios p(x) e

q(x) utilizados na demonstração desta proposição. Considera-se

p(x) = a0 + a1x+ a2x2 + ...+ anx

n,

q(x) = b0 + b1x+ b2x2 + ...+ amx

m,

com ∂p = n e ∂q = m.

1. Supõe-se que n ≥ m (para o outro caso é análogo). Assim

p(x) + q(x) = (a0 + b0) + (a1 + b1)x+ ...+ (am + bm)xm +

(am+1 + bm+1)xm+1 + ...+ (an + bn)xn,

onde bm+1 = bm+2 = ... = 0. Então, ∂(p+q) ≤ n = max {∂p, ∂q}.

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2.2. ANÉIS DE POLINÔMIOS 51

2. Supõe-se que n > m (é análogo para m > n). Então,

p(x)+q(x) = (a0+b0)+...+(am+bm)xm +am+1xm+1 +...+anx

n,

como an 6= 0, tem-se que

p(x) + q(x) 6= 0

e ainda

∂(p+ q) ≤ n = max {∂p, ∂q} .

3. Sejam p(x) · q(x) = c0 + c1x+ c2x2 + ... 6= 0, onde

ck =∑

i+j=k

aibj , ∀ k ∈ N,

onde ar = 0, para todo r > m e bs = 0, para todo s > n. Será

demonstrado que cm+n+k = 0, para todo k > 0. Sabe-se que

cm+n+k =∑

i+j=m+n+k

aibj.

Se i > m ou j > n, é imediato que cm+n+k = 0.

Supondo que i ≤ m, então

i ≤ m ⇒ i+ j ≤ m+ j

⇒ m+ n+ k ≤ m+ j

⇒ n+ k ≤ j

⇒ j > n

⇒ bj = 0

⇒ cn+m+k = 0.

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52 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

Analogamente, supondo que j ≤ n, então

j ≤ n ⇒ i+ j ≤ n+ i

⇒ m+ n+ k ≤ n+ i

⇒ m+ k ≤ i

⇒ i > m

⇒ ai = 0

⇒ cn+m+k = 0.

E assim, ∂(pq) ≤ m+ n = ∂p+ ∂q.

4. Do item (4) da Proposiçao (2.9) segue que, se p(x) 6= 0 e q(x) 6= 0,

então p(x) · q(x) 6= 0, e ainda, se

p(x) · q(x) = c0 + c1x+ c2x2 + ...,

então cn+m = anbm 6= 0, pois an 6= 0, bm 6= 0 e an e bm pertencem

a um anel de integridade. Como visto anteriormente, cn+m =

anbm é o último termo não nulo e, portanto, ∂(pq) = m + n =

∂p+ ∂q.

Observação 2.6. A seguir, será provado que, dado um anel A, os

elementos inversíveis do anel de polinômios sobre A são os próprios ele-

mentos inversíveis desse anel. Assim, fica claro que que os elementos de

A são polinômios escalares em A[x] e que esses são os únicos elementos

inversíveis de A[x].

Observação 2.7. Dado um anel qualquer A, o conjunto dos números

inversíveis em A é denotado por U(A).

Corolário 2.1. Se A é anel de integridade, então U(A) = U(A[x]).

Demonstração:

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2.2. ANÉIS DE POLINÔMIOS 53

• U(A) ⊂ U(A[x]) :

Seja a ∈ U(A). Então, existe b ∈ A tal que a · b = b · a = 1. Como

A ⊂ A[x], então a ∈ A[x] e b ∈ A[x]. Portanto, a ∈ U(A[x]).

• U(A[x]) ⊂ U(A) :

Seja p(x) ∈ U(A[x]). Então, existe q(x) ∈ A[x] tal que p(x)·q(x) =

q(x) · p(x) = 1. Tem-se que p(x) 6= 0 e q(x) 6= 0. Como A[x] é um

anel de integridade, segue da Proposição (2.10) que

∂p+ ∂q = ∂(p · q) = ∂(1) = 0.

Concluí-se, assim, que ∂p = 0 e ∂q = 0, ou seja, p(x) = a ∈ A.

Além disso, a deve ser inversível, e portanto, p(x) = a ∈ U(A).

Observação 2.8. Se A é corpo, não necessariamente A[x] é também

um corpo. Basta tomar como exemplos os conjuntos Q, R e C, os quais

são corpos, mas os conjuntos Q[x], R[x] e C[x] são apenas anéis de

integridade. De fato, o polinômio p(x) = x ∈ C[x], mas não é inversível.

Para verificar essa afirmação, basta supor que exista q(x) ∈ C[x] tal que

p(x) · q(x) = 1. Então,

0 = ∂(1) = ∂p+ ∂q = 1 + ∂q ≥ 1,

que é uma contradição. Logo, p(x) = x não é inversível.

Teorema 2.2. Algoritmo de Euclides: Sejam K um corpo e f(x), g(x) ∈K[x], com g(x) 6= 0. Então, existem q(x), r(x) ∈ K[x] tais que

f(x) = g(x) · q(x) + r(x)

com r(x) = 0 ou ∂(r(x)) < ∂(g(x)).

Demonstração: Se f(x) = 0, basta assumir q(x) = r(x) = 0.

Suponnhamos que f(x), g(x) 6= 0, com

f(x) = a0 + ...+ amxm

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54 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

g(x) = b0 + ...+ bnxn,

ou seja, ∂f = m e ∂g = n. Assim, temos que ∂f < ∂g ou ∂f ≥ ∂g.

1o Caso: ∂f < ∂g: Tomamos q(x) = 0 e r(x) = f(x).

2o Caso: ∂f ≥ ∂g:

Vamos usar o segundo princípio de indução sobre ∂f = m.

• Para m = 0, f(x) = a0, com a0 ∈ K. Como 0 = ∂f ≥ ∂g, segue

que ∂g = 0, ou seja, g(x) = b0, com 0 6= b0 ∈ K. Assim, b−10 ∈ K,

pois K é corpo. Tomamos q(x) = b−10 a0 e r(x) = 0, daí

g(x) · q(x) + r(x) = b0(b−10 a0) + 0 = a0 = f(x).

• Agora, para m ≥ 1 temos a seguinte hipótese de indução: Se

h(x) ∈ K[x], h(x) 6= 0 e ∂h < m, então existem q1, r1 ∈ K[x]

tais que

h(x) = g(x) · q1(x) + r1(x),

com r1 = 0 ou ∂r1 < ∂g.

Consideramos

h(x) = f(x) − (amb−1n xm−n) · g(x).

Se h(x) = 0, então f(x) = g(x) · q(x) + r(x), com r(x) = 0 e

q(x) = amb−1n xm−n.

Se h(x) 6= 0, vamos calcular o grau de h(x). Temos que

h(x) = f(x) − (amb−1n xm−n) · g(x)

= (a0 + ...+ amxm) − (amb

−1n xm−n)(b0 + ...+ bnx

n)

= (a0 + ...+ amxm) − (amb

−1n b0x

m−n + amb−1n b1x

m−n+1+

...+ amb−1n bn−1x

m−1 + amxm)

= a0 + a1x1 + ...+ am−n−1x

m−n−1 + (am−n − amb−1n b0)xm−n+

+ (am−n+1 − amb−1n b1)xm−n+1 + ...+ (am−1 − amb

−1n bn−1)xm−1.

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2.2. ANÉIS DE POLINÔMIOS 55

Desta forma, ∂h < m, e pela hipótese de indução, existem q1(x), r1(x) ∈K[x], com r1(x) = 0 ou ∂r1 < ∂g tais que h(x) = g(x) · q1(x) +

r1(x). Então,

g(x) · q1(x) + r1(x) = f(x) − (amb−1n xm−n) · g(x)

f(x) = g(x) · [q1(x) + amb−1n xm−n] + r1(x).

Então, definimos q(x) = q1(x) + amb−1n xm−n e r(x) = r1(x), e

portanto, r(x) = 0 ou ∂r < ∂g.

Foi provada a existência de q e r, agora, é preciso provar sua

unicidade. Suponhamos que q, q̃, r, r̃ ∈ K[x] tais que

f(x) = g(x) · q(x) + r(x)

f(x) = g(x) · q̃(x) + r̃(x)

com r(x) = 0 ou ∂r < ∂g e r̃(x) = 0 ou ∂r̃ < ∂g. Então

g(x) · q(x) + r(x) = g(x) · q̃(x) + r̃(x)

g(x) · [q(x) − q̃(x)] = r̃(x) − r(x).

Assim, se q(x) 6= q̃(x) então r(x) 6= r̃(x) e

∂g ≤ ∂[(q − q̃)g] = ∂(r̃ − r) < ∂g.

Isso é uma contradição. Logo, q = q̃ e r = r̃ são únicos.

Lema 2.3. Sejam K um corpo e f(x) ∈ K[x]. Então, α é raiz de f(x)

se, e somente se, (x− α) | f(x).

Demonstração: Seja α raiz de f(x) ∈ K[x]. Usando o algoritmo de

Euclides, existem q(x) e r(x) tais que

f(x) = (x− α)q(x) + r(x),

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56 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

com r(x) = 0 ou ∂r < 1, ou seja, existe b0 ∈ K, tal que r(x) = b0.

Assim,

0 = f(α) = (α− α)q(x) + b0,

donde b0 = 0, ou seja, r(x) = 0 e (x − α) | f(x).

Reciprocamente, se (x − α) | f(x), então, por hipótese, existe q(x) ∈K[x] tal que f(x) = (x − α)q(x). Assim, f(α) = (α − α)q(α) = 0, ou

seja, α é raiz de f(x).

Proposição 2.11. Sejam K um corpo e f(x) = a0 + · · · + anxn um

polinômio não nulo de grau n em K[x]. Então, o número de raízes de

f(x) em K é no máximo igual a ∂f = n.

Demonstração: Se f(x) não possui raízes em K, a proposição está

provada. Supondo que α ∈ K seja uma raiz de f(x), como g(x) =

x− α ∈ K[x], podemos escrever f(x) = q(x)(x − α), pelo Lema (2.3).

Agora, se β ∈ K é uma raiz qualquer de f , então, f(β) = (β−α)q(β) =

0, donde α = β, ou seja, β é também uma raiz de q(x) ∈ K[x]. Assim,

as raízes de f são α e mais as raizes de q(x).

Usando a indução sobre ∂f = n, tem-se que, se n = 0, então f não

possui raízes em K e nesse caso nada há a demonstrar.

Agora, por indução, ∂q < ∂f = n, q(x) possui no máximo ∂q = n − 1

raízes em K e, portanto, f(x) possui no máximo n raízes em K.

Seja K um corpo. Se L ⊃ K é um corpo, dizendo que L é uma

extensão de K.

Corolário 2.2. Seja f(x) = a0 + ...+ anxn um polinômio não nulo de

grau n em K[x]. Então., f(x) possui no máximo n raízes em qualquer

extensão L de K.

Demonstração: Basta observar que se f(x) ∈ K[x] e K ⊂ L, então

f(x) ∈ L[x] e agora é só aplicar a Proposição (2.11) para o corpo L.

Na primeira seção deste Capítulo definiu-se elemento irredutí-

vel de um anel de integridade. Trazendo esse conceito de elemento irre-

dutível para um anel de polinômios, obtem-se que p(x) é um polinômio

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2.2. ANÉIS DE POLINÔMIOS 57

irredutível em K[x], se ∂p ≥ 1 e para quaisquer f(x), g(x) ∈ A[x], se

p(x) = f(x) · g(x), então f(x) é inversível ou g(x) é inversível, ou seja,

f(x) ou g(x) é um polinômio escalar não nulo.

Da mesma forma, um polinômio p(x) ∈ K[x] é primo se ∂p ≥ 1

e para quaisquer f(x), g(x) ∈ K[x], se p(x) | f(x) · g(x), então p(x) |f(x) ou p(x) | g(x).

A partir do Algoritmo de Euclides em K[x], tem-se o seguintes

resultados sobre o anel de integridade K[x].

Corolário 2.3. Seja K é um corpo, então:

1. K[x] é um anel euclidiano;

2. K[x] é um anel principal;

3. K[x] é um anel fatorial;

4. Todo polinômio irredutível sobre K é primo em K[x].

Demonstração:

1. Tem-se que o grau de um polinômio define uma aplicação deK[x]∗

sobre N e essa aplicação grau, ∂, satisfaz os itens (i) e (ii) da

Definição (2.10). De fato, se f(x), g(x) ∈ K[x], então ∂(fg) =

∂f +∂g ≥ ∂g, satisfazendo o primeiro item. Agora, pelo Teorema

do Algoritmo de Euclides (2.2), se f, g ∈ K[x] e g 6= 0, então

existem q(x), r(x) ∈ K[x] tais que f(x) = g(x)q(x) + r(x), com

r(x) = 0 ou ∂r < ∂f e o segundo item é satisfeito. Portanto, K[x]

é um anel euclidiano.

2. Segue imediato do item (1) e da Proposição (2.8).

3. Pelo item (2) e pela Proposição (2.7) tem-se que K[x] é um anel

fatorial.

4. Segue do item (2) e da Proposição (2.5).

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58 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

Teorema 2.3. Sejam K um corpo e p(x) ∈ K[x] um polinômio irre-

dutível, entãoK[x]

〈p(x)〉 é corpo.

Demonstração: Há uma proposição segundo Domingues e Iezzi (2013

, pg. 266) que afirma que, dados A um anel comutativo com unidade e

I um ideal em A,A

Ié corpo se, e somente se, I é ideal maximal. Então,

basta mostrar que I = 〈p(x)〉 é maximal.

Sejam o polinômio irredutível p(x) ∈ K[x] e J = 〈p(x)〉 = {g(x)p(x) :

g(x) ∈ K[x]}. Como ∂p ≥ 1, por p(x) ser irredutível, segue que os

polinômios escalares não pertencem a J , assim J $ K[x], ou seja, J é

ideal próprio de K[x].

Seja I um ideal de K[x] de forma que J ⊂ I. Provar-se-á que I = J

ou I = K[x]. Pelo item (2.) do Corolário (2.3), existe h(x) ∈ K[x] tal

que 〈h(x)〉 = I. Como J ⊂ I tem-se que p(x) = g(x) ·h(x), para algum

g(x) ∈ K[x]. Mas p(x) é irredutível, logo g(x) é inversível ou h(x) é

inversível.

Caso g(x) seja inversível, pelo Corolário (2.1), existe a ∈ K∗ tal que

g(x) = a 6= 0. Assim, h(x) = a−1p(x) e I = 〈h(x)〉 ⊂ 〈p(x)〉 = J , ou

seja, I = J.

Agora, se h(x) é inversível, então existe t(x) ∈ K[x] tal que t(x)h(x) =

1. Tome q(x) um elemento arbitrário de K[x]. Tem-se que

q(x) = q(x) · 1 = q(x)t(x)h(x) ∈ 〈h(x)〉 = I,

logo, K[x] ⊂ I e I = K[x]. Portanto J = 〈p(x)〉 é ideal maximal, eK[x]

〈p(x)〉 é corpo.

2.3 MÓDULOS

Estão apresentados nesta seção alguns dos principais conceitos

de Módulos conforme o necessário ao que é proposto neste trabalho.

Para elaboração desta seção, foram usados como base, Ellen, Marcelo

e Samuel.

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2.3. MÓDULOS 59

Definição 2.15. Sejam A um anel com unidade e M um grupo abeli-

ano. Diz-se que M é um A-módulo quando houver uma operação

· : A×M −→ M

(a,m) 7−→ am

tal que, dados a, b ∈ A e m,n ∈ M , tem-se:

(i) a(bm) = (ab)m

(ii) a(m+ n) = am+ an

(iii) (a+ b)m = am+ bm

(iv) 1m = m

Desta forma definido, diz-se que M é um A-módulo à esquerda,

usando-se, também, a notação AM . A definição de A-módulo M à

direita é análoga.

Exemplo 2.9. Todo anel A é um A-módulo, tanto à esquerda quanto

à direita. O grupo abeliano é dado por (A,+), onde + é a operação da

adição do anel A e ·, a operação do produto da definição de Módulo, é

a mesma que · do anel A.

Exemplo 2.10. O grupo trivial {0} é um A-módulo, onde A é anel.

Exemplo 2.11. Todo espaço vetorial V sobre um corpo K é um K-

módulo.

Exemplo 2.12. Vale a pena ressaltar que, dado I um ideal à esquerda

em um anel A, tem-se que I é um A-módulo à esquerda, onde a soma

é induzida pela soma em A e a multiplicação é a mesma que a de A.

Têm-se um resultado análogo para ideal à direita.

Definição 2.16. Sejam A um anel com unidade e M um A-módulo.

Um subconjunto N ⊆ M não vazio é um A-submódulo de M se

também for um A-módulo com as operações herdadas de M , ou seja, se

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60 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

(i) N é um subgrupo aditivo de M ,

(ii) N é fechado em relação a ·.

Exemplo 2.13. Os conjuntos M e {0} são A-módulos, estes denomi-

nados triviais.

Proposição 2.12. Sejam M um A-módulo e N ⊂ M um subconjunto

não vazio. N é um A-submódulo de M se, e somente se, satisfaz as

condições:

(i) ∀m,n ∈ N,m+ n ∈ N ,

(ii) ∀r ∈ R, n ∈ N, rn ∈ N .

Demonstração: Se N for A-submódulo de M , então os itens (i) e

(ii) da Definição (2.16) implicam nos itens (i) e (ii) desta proposição

respectivamente.

Reciprocamente, por hipótese N não é vazio então, existe n ∈ N . Pelo

item (ii) desta proposição 0 = 0n ∈ N . Ainda, como −1 ∈ A (pois é

o oposto da unidade 1 do anel A), tem-se que −n = −1n ∈ N , pelo

item (ii). Por outro lado, + é associativa e comutativa é herdado de M ,

donde N é subgrupo aditivo de M . Por fim, o item (ii) desta proposição

implica diretamente no item (ii) da Definição (2.16). Portanto, N é um

A-submódulo de M .

Exemplo 2.14. Dados I um ideal à esquerda do anel A e m ∈ M , M

um A-módulo, então

Im = {am : a ∈ I}

é um A-submódulo de M .

Proposição 2.13. Seja M um A-módulo. Então, a interseção arbitrá-

ria de submódulos de M é um submódulo de M .

Demonstração: Seja {Mi}i∈I uma família de submódulos de M,

deseja-se mostrar que⋂

i∈I

Mi é um submódulo de M , onde I é um

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2.3. MÓDULOS 61

conjunto qualquer. Tomando x, y ∈⋂

i∈I

Mi, x, y ∈ Mi, para todo i ∈ I.

Então, x+ y ∈ Mi, para todo i ∈ I, donde x+ y ∈⋂

i∈I

Mi.

Por outro lado, tomando a ∈ A e x ∈⋂

i∈I

Mi, tem-se que x ∈ Mi donde

ax ∈ Mi, para todo i ∈ I. Logo, ax ∈⋂

i∈I

Mi. Portanto,⋂

i∈I

Mi é um

submódulo de M .

Observação 2.9. Se N e P são A-submódulos de M , pode-se definir

N + P = {n+ p : n ∈ N ; p ∈ P},

um A-submódulo de M . Para verificar esta afirmação, basta tomar

x, y ∈ N + P , tais que x = n+ p e y = n′ + p′, e a ∈ A, donde

x+ y = (n+ p) + (n′ + p′) = (n+ n′) + (p+ p′) ∈ N + P e

ax = a(n+ p) = an+ ap ∈ N + P.

Então, pela Proposição (2.13), N é um A-submódulo M .

Definição 2.17. Sejam M um A-módulo e N um A-submódulo de M .

Tomando m1,m2 ∈ M , defini-se a relação m1 ≡ m2(modN) quando

m1 − m2 ∈ N , sendo ≡ (modN) é uma relação de equivalência, facil-

mente verificável.

Tem-se que a classe de equivalência, para cada m ∈ M é o

conjunto dos elementos x ∈ M tais que

x ≡ m(modN).

Assim,

{x ∈ M : x ≡ m(modN)} = {x ∈ M : x−m ∈ N}= {x ∈ M : x−m = n;n ∈ N}= {x ∈ M : x = m+ n;n ∈ N}= {m+ n : n ∈ N}= m+N.

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62 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

Ainda, uma vez que M é grupo abeliano, N+m = m+N , para

todo m ∈ M , ou seja, todo submódulo N de M é um subgrupo normal

em N e, portanto, as classes laterais à esquerda e à direita coincidem,

podendo desprezar as classes laterais à direita.

Proposição 2.14. Sejam m1,m2 ∈ M . Então, m1 +N = m2 +N se,

e somente se, m1 ≡ m2(modN), ou seja, m1 −m1 ∈ N .

Demonstração: Tem-se m1,m2 ∈ M e m1 + N = m2 + N , então

m1 ∈ m2+N , ou seja, m1 = m2+n, com n ∈ N . Logo,m1+(−m2) ∈ N

e, portanto m1 ≡ m2(modN).

Reciprocamente, dados m1,m2 ∈ M e m1 ≡ m2(modN), então n =

m1 −m2 ∈ N , para algum n. Assim, m1 = m2 +n donde m1 ∈ m2 +N .

Analogamente, chega-se na relação m2 ∈ m1 +N . Portanto, m1 +N =

m2 +N .

Definição 2.18. Define-se o conjunto quocienteM

N= {m + N :

m ∈ M}, o conjunto de todas as classes de equivalência de N em M .

Proposição 2.15. SejaM

Nconjunto quociente. Então,

M

Né grupo

abeliano com a operação

+ :M

N× M

N−→ M

N

(m1 +N,m2 +N) 7−→ (m1 +N) + (m2 +N) = (m1 +m2) +N.

Demonstração: Primeiramente, é preciso mostrar que + é bem defi-

nida. Assim, tomando m1,m2,m3,m4 ∈ M tais que

(m1 +N,m2 +N) = (m3 +N,m4 +N).

Então, m1 +N = m3 +N e m2 +N = m4 +N , donde m1 −m3 ∈ N e

m2 −m4 ∈ N . Assim, (m1 −m3) + (m2 −m4) ∈ N então, (m1 +m2) −(m3 + m4) ∈ N . Portanto, pela Proposição (2.14) (m1 + m2) + N =

(m3 +m4) +N .

Agora, para verificar seM

Né grupo abeliano é preciso provar que +

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2.3. MÓDULOS 63

satisfaz a propriedade associativa, a existência do elemento neutro e

do elemento oposto e a propriedade comutativa emM

N. Assim, sejam

m1,m2,m3 ∈ M , valem as propriedades

(i) Associativa:

Como vale a associatividade em M , tem-se

(m1 +N) + [(m2 +N) + (m3 +N)] =

= (m1 +N) + [(m2 +m3 +N)]

= [m1 + (m2 +m3)] +N

= [(m1 +m2) +m3) +N

= [(m1 +m2) +N ] + (m3 +N)

= [(m1 +N) + (m2 +N)] + (m3 +N).

(ii) Existência do elemento neutro:

Seja 0 o elemento neutro de M , assim

(0 +N) + (m1 +N) = (0 +m1) +N

= m1 +N

= (m1 +N) + (0 +N)

então, 0 +N = N é o elemento neutro deM

N.

(iii) Elemento oposto:

Seja −m1 é o oposto de m1 em M , o oposto de m1 +N é (−m1)+

N , tem-se

(m1 +N) + [(−m1) +N ] = (m1 −m1) +N

= 0 +N

= N

= [(−m1) +N ] + (m1 +N),

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64 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

(iv) Comutativa:

Como, M é grupo abeliano

(m1 +N) + (m2 +N) = (m1 +m2) +N

= (m2 +m1) +N

= (m2 +N) + (m1 +N).

Portanto,M

Né grupo abeliano.

Proposição 2.16. SejaM

Num conjunto quociente então

M

Né um A-

módulo com a operação de adição + definida na proposição anterior e

com a operação · definida por

· : A× M

N−→ M

N

(a,m+N) 7−→ a · (m+N) = am+N.

Demonstração: Pela Proposição (2.15),M

Né grupo abelino.

Primeiro, verifica-se que · é bem definida. Então, dados m1,m2 ∈ M e

a ∈ A tais que (a,m1+N) = (a,m2+N), tem-se que m1+N = m2+N ,

donde m1 −m2 ∈ N . Assim, a(m1 −m2) = am1 −am2 ∈ N e, portanto,

am1 +N = am2 +N .

Por fim, tomando a1, a2 ∈ A e m1 + N,m2 + N ∈ M

N, tem-se

que são satisfeitos

(i)

(a1a2)(m1 +N) = [(a1a2)m1] + N

= a1(a2m1) +N = a1(a2m1 +N).

(ii)

(a1 + a2)(m1 +N) = (a1 + a2)m1 +N

= (a1m1 + a2m1) +N

= (a1m1 +N) + (a2m1 +N).

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2.3. MÓDULOS 65

(iii)

a1[(m1 +m2) +N ] = [a1(m1 +m2)] +N

= (a1m1 + a1m2) +N

= (a1m1 +N) + (a1m2 +N)

(iv)

1(m1 +N) = 1m1 +N

= m1 +N

Assim,M

Né um A-módulo dito Módulo Quociente.

Exemplo 2.15. Sendo I um ideal de um anel A,A

Item estrutura de

A-módulo, e os submódulos deA

Isão os ideais de

A

I.

Neste momento, é importante definir e conhecer algumas pro-

priedades importantes dos Homomorfismos de Módulos. Assim, segue

que

Definição 2.19. Sejam M e N A-módulos. Uma aplicação

f : M −→ N

diz-se um homomorfismo de A-módulos se, dados m1,m2 ∈ M e a ∈ A

quaisquer, são válidas as condições

(i) f(m1 +m2) = f(m1) + f(m2) e

(ii) f(rm1) = rf(m1)

Observação 2.10. 1. Um homomorfismo de um A-módulo nele mesmo

é dito endomorfismo,

2. um homomorfismo injetor é dito monomorfismo,

3. um homomorfismo sobrejetor é dito epimorfismo e

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66 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

4. um homomorfismo bijetor é dito isomorfismo.

Proposição 2.17. Sejam M e N A-módulos, e f : M −→ N um

homo- morfismo. Então, são satisfeitas as propriedades:

1. f(0) = 0N , com 0N elemento neutro de N ,

2. f(−m) = −f(m), para todo m ∈ M ,

Demonstração:

1. Seja 0 ∈ M o elemento neutro. Então,

f(0) = f(0 + 0) = f(0) + f(0),

donde f(0) = 0N .

2. Como 0N = f(0), então, seja m ∈ M ,

0N = f(0)

= f(m+ (−m))

= f(m) + f(−m).

Portanto, como 0N é o elemento neutro de N , f(−m) deve ser o

simétrico de f(m) e, assim, f(−m) = −f(m).

Observação 2.11. Seja f : M −→ N um homomorfismo deA-módulos.

Então, Im(f) e Ker(f) são ditos imagem e núcleo de f , onde

Im(f) = {f(m) : m ∈ M} e

Ker(f) = {m ∈ M : f(m) = 0}.

Proposição 2.18. Seja f : M −→ N um homomorfismo de A-módulos.

Então, Im(f) e Ker(f) são A-submódulos de N e M , respectivamente.

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2.3. MÓDULOS 67

Demonstração: Primeiramente, será demonstrado que Im(f) é sub-

módulo de N . É imediato que Im(f) é não vazio, uma vez que f(0) =

0N . Então, sejam x, y ∈ Im(f), ou seja x = f(m1) e y = f(m2), com

m1,m2 ∈ M . Assim, x+y = f(m1)+f(m2) = f(m1+m2) ∈ Im(f). Por

outro lado, para todo a ∈ A, ax = af(m1) = f(am1) ∈ Im(f). Logo,

da Proposição (2.12), Im(f) é submódulo de N . Agora, será provado

que Ker(f) é um A-submódulo de M . Como f(0) = 0N , 0 ∈ Ker(f)

donde Ker(f) é não vazio. Então, dados m1,m2 ∈ Ker(f), tem-se que

f(m1) = 0N e f(m2) = 0N , então 0N = f(m1) + f(m2) = f(m1 +m2).

Assim, m1 + m2 ∈ Ker(f). Ainda, dados a ∈ A, verifica-se que 0N =

a0 = af(m1) = f(am1), ou seja, am1 ∈ Ker(f). Portanto, Ker(f) é

um A-submódulo de M .

A partir deste momento, dado um homomorfismo f : M −→ N

de A-módulos, tanto os elemento neutro de M quanto o de N serão

denotados apenas como 0.

Proposição 2.19. Seja f : M −→ N um homomorfismo de A-módulos.

Então, f é um monomorfismo se, e somente se, Ker(f) = {0}.

Demonstração: Primeiramente, é suposto que f é um monomor-

fismo. Tomando m ∈ Ker(f), obtém-se f(m) = 0, mas f(0) = 0, pela

Proposição (2.17). Como f é injetiva, m = 0.

Reciprocamente, supondo que Ker(f) = {0} e tomando m1,m2 ∈ M

tais que f(m1) = f(m2), deseja-se mostrar que m1 = m2, a fim de que

f seja injetiva. Assim, f(m1 −m2) = 0 donde m1 −m2 ∈ Ker(f) = {0}.

Assim, necessariamente m1 = m2. Portanto, f é um monomorfismo.

Proposição 2.20. Sejam f : M −→ N e g : N −→ P homomorfismos

de A-módulos. Então, a aplicação composta

g ◦ f : M −→ P

m 7−→ (g ◦ f)(m) = g(f(m))

é um homomorfismo.

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68 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

Demonstração: Sejam m1,m2 ∈ M . Assim,

(g ◦ f)(m1 +m2) = g(f(m1 +m2))

= g(f(m1) + f(m2))

= g(f(m1)) + g(f(m2))

= (g ◦ f)(m1) + (g ◦ f)(m2).

Por outro lado, seja a ∈ A e m ∈ M , então,

(g ◦ f)(am) = g(f(am))

= g(af(m))

= ag(f(m))

= a(g ◦ f)(m).

Portanto, g◦f satisfaz as propriedades de homomorfismo de A-módulos.

O seguinte teorema chama-se Teorema do Homomorfismo

para Módulos, e possui relevância neste estudo, visto que será bas-

tante usado em demonstrações posteriores. Este teorema é análogo ao

Teorema do Homomorfismos em anéis.

Teorema 2.4. Sejam f : M −→ N um homomorfismo de A-módulos e

Ker(f) seu núcleo. Então, os módulosM

Ker(f)e Im(f) são isomorfos.

Demonstração: Primeiramente, define-se

φ :M

Ker(f)−→ Im(f)

m+Ker(f) 7−→ φ(m+K) = f(m),

e então, prova-se que φ desta forma posta está bem definida. Assim,

sejam m1 + Ker(f),m2 + Ker(f) ∈ M

Ker(f)tais que m1 + Ker(f) =

m2 + Ker(f). Logo, m1 − m2 ∈ Ker(f), donde 0 = f(m1 − m2) =

f(m1) − f(m2). Desta forma, f(m1) = f(m2) e φ está bem definida.

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2.3. MÓDULOS 69

É preciso mostrar que φ é um homomorfismo de A-módulos. Então,

sejam m1 +Ker(f),m2 +Ker(f) ∈ M

Ker(f), donde

φ((m1 +Ker(f)) + (m2 +Ker(f))) = φ((m1 +m2) +Ker(f))

= f(m1 +m2)

= f(m1) + f(m2)

= φ(m1 +Ker(f)) + φ(m2 +Ker(f))

e, dados m+Ker(f) ∈ M

Ker(f)e a ∈ A, tem-se que

φ(a(m+Ker(f))) = f(am)

= af(m)

= aφ(m+K).

Portanto, φ é homomorfismo. Agora, supondo que φ(m1 + Ker(f)) =

φ(m2 + Ker(f)), com m1,m2 ∈ M . Aplicando φ, tem-se que f(m1) =

f(m2), donde f(m1 − m2) = 0 e m1 − m2 ∈ Ker(f). Assim, m1 +

Ker(f) = m2 +Ker(f) e, portanto, φ é injetor.

Ainda, tem-se que Im(φ) = {φ(m+Ker(f)) : m ∈ M} = {f(m) : m ∈M} = Im(f), donde φ é sobrejetor. Portanto,

M

Ker(f)e Im(f) são

isomorfos, e denota-se porM

Ker(f)≃ Im(f)

Observação 2.12. Os homomorfismos de K-módulos, onde K é um

corpo, são as transformações lineares, uma vez que, como exposto no

Exemplo (2.11), espaços vetoriais são exemplos de módulos.

Exemplo 2.16. Seja N um A-submódulo de M . Chama-se de projeção

canônica a aplicação

π : M −→ M

N

m 7−→ m+N.

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70 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

Assim, π é um epimorfismo, pois dados m1,m2 ∈ M

π(m1 +m2) = (m1 +m2) +N

= (m1 +N) + (m2 +N)

= π(m1) + π(m2)

e dados m ∈ M e a ∈ A

π(am) = (am+N)

= a(m+N)

= aπ(m).

e, ainda, a sobrejetividade é imediata.

Por fim, segue abaixo algumas definições necessárias posterior-

mente.

Definição 2.20. Sejam A um anel com unidade e M um A-módulo.

1. Se existem x1, ..., xn ∈ M tais que M = Ax1 + ...+Axn, então, o

A-módulo M é dito finitamente gerado e, neste caso, x1, ..., xn

formam um sistema de geradores de M .

2. Os elementos x1, ..., xn ∈ M são linearmente independentes

(sobre A) sen∑

i=1

aixi = 0 com ai ∈ A

implicar que a1 = ... = an = 0.

3. Se x1, ..., xn ∈ M forem linearmente independentes e geradores

de M , então {x1, ..., xn} é uma base de M .

Porém, nem todo módulo finitamente gerado possui uma base.

Assim, segue a definição que discrimina os módulos pela existência

ou não de uma base nele. Além disso, uma base pode conter infinitos

elementos.

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2.3. MÓDULOS 71

Definição 2.21. Um A-módulo M é dito A-módulo livre se possuir

uma base, e o número de elementos da base é chamado de posto de A.

Observação 2.13. Convencionalmente, diz-se que o grupo {0} é um

A-módulo livre para qualquer anel A, tal que sua base é dada por

B = ∅.

Exemplo 2.17. A[x] é um A-módulo livre com base {1, x, ..., xn, ...}.

Exemplo 2.18. Tem-se {1, i} é linearmente independente sobre R,

então será também linearmente independente sobre Z. Por isso e como

{1, i} gera Z + iZ, o anel dos inteiros de Gauss Z + iZ é um Z-módulo

livre, com a base {1, i}.

2.3.1 Módulos Noetherianos

Para definir o que é um módulo noetheriano é preciso primei-

ramente entender o que é uma sequência estacionária.

Definição 2.22. Sejam M um A-módulo e I1 ⊆ I2 ⊆ · · · ⊆ In ⊆ · · ·uma sequência crescente de A-submódulos de M . Esta é uma sequên-

cia estacionária se existir n0 ∈ N tal que

In0= In ∀n ≥ n0.

A definição é análoga para sequência decrescente estacionária.

Assim, segue a definição de módulo noetheriano.

Definição 2.23. Seja M um A-módulo. M é dito A-módulo noethe-

riano se satisfizer uma das condições

(i) Toda família não vazia de A-submódulos de M tem um elemento

maximal.

(ii) Toda sequência crescente de A-submódulos de M é estacionária.

(iii) Todo A-submódulo de M é finitamente gerado.

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72 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

Observação 2.14. As três propriedades acima são equivalentes. ????

(Demonstrar)

Definição 2.24. Diz-se que A é um anel noetheriano se A, visto

como um A-módulo, for noetheriano.

Proposição 2.21. Todo anel principal é noetheriano.

Demonstração: Seja A um A-módulo e considere a sequência cres-

cente de A-submódulos

I1 ⊆ I2 ⊆ · · · ⊆ In ⊆ · · · ,

deseja-se mostrar que A é noetheriano dado que é principal, para isso,

será provada a condição (ii) da Definição (2.23).

Por hipótese, A é anel principal, ou seja, todos os seus ideais são prin-

cipais. Mas, os submódulos de A são os próprios ideais de A, como

pode-se verificar pelas definições de submódulo e ideal. Assim, todos os

submódulos de A são principais. Por outro lado, observa-se que

I =⋃

n∈N

In

é um ideal de A. Desta forma, tem-se que In ⊂ I = 〈a〉, para todo n

natural e a ∈ In0, para algum n0 ∈ N, pois

a ∈ 〈a〉 = I =⋃

n∈N

In

Dado que a ∈ In0e a ∈ 〈a〉, segue que 〈a〉 ⊂ In0

. Assim, I = In0,

para algum n0 ∈ N. Portanto, existe n0 ∈ N tal que para todo n ≥ n0

tem-se In = In0.

Observação 2.15. Em Álgebra Linear, define-se forma bilinear uma

função

f : V × V −→ K

onde V é um espaço vetorial sobre o corpo K, de forma que, dados

a ∈ K e u, v, w ∈ V

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2.3. MÓDULOS 73

1. f(u+ v, w) = f(u,w) + f(v, w),

2. f(u, v + w) = f(u, v) + f(u,w) e

3. f(au, v) = f(u, au) + af(u, v).

Analogamente, define-se uma forma bilinear sobre M um A- módulo.

Proposição 2.22. Sejam A um anel, M um A-módulo e N ⊂ M um

A-submódulo. Então, M é noetheriano se, e somente se,M

Ne N são

noetherianos.

Demonstração: Sejam M um A-módulo noetheriano e (Mn)n≥0

uma sequência crescente de A-submódulos de N . Consequentemente,

(Mn)n≥0 é uma sequência crescente de A-submódulos de M . Dado que

M é noetheriano, pela Proposição (2.21), (Mn)n≥0 é estacionária. Logo,

N é noetheriano.

Por outro lado, para mostrar queM

Né noetheriano, sejam

S = {submódulos de M que contém N} e T ={

submódulos deM

N

}

.

Definindo a aplicação

ϕ : S −→ T

L 7−→ L

N

é uma bijeção de S em T , como é facilmente observável. Desta forma,

se (Mn)n≥0 é uma sequência crescente de A-submódulos deM

N, então

(

ϕ−1(Mn))

n≥0é também uma sequência crescente de A-submódulos

de M . Dado que M é noetheriano, segue que(

ϕ−1(Mn))

n≥0é estacio-

nária, donde (Mn)n≥0 é também estacionária. Logo,M

Né noetheriano.

Reciprocamente, sejamM

Ne N noetherianos e (Mn)n≥0 uma sequência

crescente de A-submódulos de M . Assim, (N ∩ Mn)n ≥ 0 é também

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74 Capítulo 2. CONCEITOS PRELIMINARES

uma sequência crescente de A-submódulos N . Mas, como N é noethe-

riano, (N ∩Mn)n≥0 é estacionária, de forma que existe k ∈ N tal que

Mn ∩N = Mn+1 ∩N eMn

N=Mm+1

N, ∀n ≥ k.

Tem-se que Mn ⊆ Mn+1, para todo n ≥ k. Dado um x ∈ Mn+1, então

existe y ∈ Mn tal que x+M1 = y+N . Segue que, x−y ∈ N ∩Mn+1 =

N ∩ Mn. Logo, x − y ∈ Mn e, uma vez que y ∈ Mn conclui-se que

x ∈ Mn. Assim, Mn = Mn+1, para todo n ≥ k e, portanto, M é

noetheriano.

Corolário 2.4. Se M1, ...,Mn são A-módulos noetherianos, então o

produto M1 × · · · ×Mn é um A-módulo noetheriano.

Demonstração: O teorema será demonstrado através de indução

sobre n.

(i) Para n = 2:

Verifica-se que M1 é isomorfo a M1 × {0}, denotando por M1 ≃M1 ×{0}, e ainda M1 ×{0} ⊂ M1 ×M2. Assim, define-se a função

ϕ : M1 ×M2 −→ M2

(0, y) 7−→ y.

Assim, ϕ é um homomorfismo sobrejetor, e então, pelo Teorema

do Homomorfismo,M1 ×M2

kerϕ≃ M2

onde kerϕ = M1 × {0}. Dado que M2 é noetheriano,

M1 ×M2

M1 × 0≃ M2

é noetheriano e, pela Proposição (2.22), M1 ×M2 é noetheriano.

(ii) Supondo que M = M1 × · · · ×Mn−1 é noetheriano, sendo esta a

hipótese de indução.

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2.3. MÓDULOS 75

(iii) Sendo Mn noetheriano, analogamente ao item (i) M = M1 ×· · ·×Mn é um A-módulo noetheriano.

Denota-se o produto cartesiano de A por A n vezes por An.

Corolário 2.5. Sejam A um anel noetheriano e M um A-módulo fi-

nitamente gerado. Então, M é um A-módulo noetheriano.

Demonstração: Seja {e1, ..., en} um conjunto de geradores de M

(como um A-módulo). Assim, a aplicação

ϕ : An −→ M

(a1, ..., an) 7−→ a1e1 + · · · + anen

é um homomorfismo sobrejetor. Pelo Teorema do Homomorfismo,

An

kerϕ≃ M.

Por A ser noetheriano e pelo Corolário (2.4), segue que An é noetheri-

ano. E, portanto, pela Proposição (2.22) M é um A-módulo noetheri-

ano.

Lema 2.4. Sejam A1, A2 ⊆ A ideais e A1 + A2 = A então A1A2 =

A1 ∩A2.

Demonstração: Temos que A1A2 ⊂ A1 e A1A2 ⊂ A2, logo A1A2 ⊂A1 ∩ A2. Supondo que x ∈ A1 ∩ A2. Tem-se, por hipótese, que A1 +

A2 = A, então existem a1 ∈ A1 e a2 ∈ A2 tais que 1 = a1 + a2.

Assim, x = a1x + a2x é a soma de dois elementos de A1A2, donde

A1 ∩A2 ⊂ A1A2. Portanto, A1A2 = A1 ∩A2.

Assim, conclui-se os conceitos preliminares para o estudo dos

elementos inteiros e algébricos, estudados no próximo capítulo.

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77

3 ELEMENTOS INTEIROS E

ALGÉBRICOS

Com base em Samuel, Ellen, Gonçalves, e Stewart este capí-

tulo apresenta o conceito de elemento inteiro sobre um anel. Estuda-se

ainda, os casos particulares deste objeto: elemento e número algébricos.

As definições e proposições estudadas no capítulo anterior servirão de

apoio para o desenvolvimento dos conceitos estudados neste capitulo.

3.1 ELEMENTOS INTEIROS SOBRE UM ANEL

Aqui, em toda seção, considera-se A um anel comutativo com

unidade.

Definição 3.1. Sejam A e B anéis, A subanel de B e α ∈ B. Define-se

o conjunto A adjunção α, denotado por A[α], por

A[α] = {f(α) : f(x) ∈ A[x]}.

Definição 3.2. Sejam B um anel, A um subanel de B e α um elemento

de B. Diz-se que α é inteiro sobre A se existem a0, · · · , an−1 ∈ A, não

todos nulos, tais que

αn + an−1αn−1 + · · · + a1α+ a0 = 0, (3.1)

isto é, α é raiz de um polinômio mônico com coeficientes em A.

Observação 3.1. A Equação (3.1) é chamada de equação de de-

pendência integral de α.

Exemplo 3.1. Sejam os anéis Z e R tais que Z ⊂ R. Tem-se que 2√

3 é

inteiro sobre Z, pois é raiz do polinômio x5 +x4−12x3−9x2−36 ∈ Z[x].

Teorema 3.1. Sejam B um anel, A um subanel de B e α um elemento

de B. As seguintes afirmações são equivalentes:

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78

Capítulo 3. ELEMENTOS INTEIROS E

ALGÉBRICOS

(i) α é inteiro sobre A;

(ii) O anel A[α] é um A-módulo finitamente gerado;

(iii) Existe um subanel R do anel B que contém A e α e é um A-

módulo finitamente gerado.

Demonstração: (i) ⇒ (ii) Seja o anel

A[α] =

{

i

aiαi : ai ∈ A

}

.

Como α é inteiro sobre A, existem a0, · · · , an−1 ∈ A, não todos nulos,

tais que

αn + an−1αn−1 + · · · + a1α+ a0 = 0.

ConsiderandoM um A-módulo finitamente gerado por {1, α, · · · , αn−1},

ou seja, M = 〈1, α, · · · , αn−1〉, deve-se provar que M = A[α]. Para ve-

rificar a inclusão A[α] ⊆ M , observa-se que αn = −(an−1αn−1 + · · · +

a1α + a0), donde αj ∈ M , para todo j ≤ n. A prova de que aj ∈ M ,

para todo j > n, será feita por indução sobre j. Assim, supondo que

existam b0, · · · , bn−1 ∈ A tais que αj = bn−1αn−1 + . . . + b1α + b0,

tem-se que

αj+1 = αjα

= (bn−1αn−1 + · · · + b1α+ b0)α

= bn−1αn + · · · + b1α

2 + b0α

= bn−1(−an−1αn−1 − · · · − a1α− a0) + · · · + b1α

2 + b0α

= −bn−1an−1αn−1 − · · · − bn−1a1α− bn−1a0 + · · · + b1α

2 + b0α

= −a0bn−1 + (−bn−1a1 + b0)α+ · · · + (bn−2 − bn−1an−1)αn−1,

logo α ∈ M , para todo j ∈ N e, logo, A[α] ⊆ M . Por outro lado, é fácil

ver que M =⟨

1, α, · · · , αn−1⟩

⊂ {∑i aiαi : ai ∈ A} = A[α]. Portanto,

A[α] = M e A[α] é finitamente gerado por {1, α, · · · , αn−1}.

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3.1. ELEMENTOS INTEIROS SOBRE UM ANEL 79

(ii) ⇒ (iii) Basta tomar R = A[α] ⊂ B que é um A- módulo fini-

tamente que contém α e A.

(iii) ⇒ (i) Seja R = 〈y1, . . . , y2〉 um A-módulo finitamente gerado,

com A ⊆ R ⊆ B e α ∈ R, donde R = Ay1 + . . . + Ayn e, como R é

subanel de B, αyi ∈ R para 1 ≤ i ≤ n. Ou seja, existem aij ∈ A, com

1 ≤ i, j ≤ n tais que

αy1 = a11y1 + . . .+ a1nyn

αy2 = a21y1 + . . .+ a2nyn

...

αyn = an1y1 + . . .+ annyn

.

Assim,

(α− a11)y1 − a12y2 − . . .− a1nyn = 0

−a21y1 + (α− a22)y2 − . . .− a2nyn = 0...

−an1y1 − an2y2 − . . .+ (α− ann)yn = 0

.

Matricialmente, tem-se

(α− a11 −a12 · · · −a1n

−a21 (α− a22) · · · −a2n

......

. . ....

−an1 −an2 · · · (α− ann)

y1

y2

...

y2

=

0

0...

0

.

Definindo M = [aij ] a matriz dos coeficientes do sistema linear e D =

det(M) seu determinante, tem-se pela regra de Cramer que Dyj = 0,

para j = 1, . . . , n. Tem-se que 1 ∈ R, donde

1 =n∑

j=1

cjyj ,

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80

Capítulo 3. ELEMENTOS INTEIROS E

ALGÉBRICOS

onde cj ∈ A, e, desta forma,

D = D · 1

= D

n∑

j=1

cjyj

=n∑

j=1

cjDyj

= 0

Assim, D é uma equação de dependência integral de α, uma vez que

D = αn + bn−1αn−1 + . . . + b1α + b0, donde os bi, com i = 0, . . . , n,

resultam das somas e multiplicações dos elementos da matriz M na

operação do determinante na matriz. Como tais coeficientes pertencem

a A, bi ∈ A, para i = 0, . . . , n. Ou seja, D = αn + bn−1αn−1 + . . . +

b1α+ b0 = 0 Portanto, α é inteiro sobre A.

Corolário 3.1. Sejam A e B anéis, A ⊂ B e α1, · · · , αn ∈ B. Se α1 é

inteiro sobre A, α2 é inteiro sobre A[α1], α3 é inteiro sobre A[α1, α2] e

αn é inteiro sobre A[α1, . . . , αn−1], então A[α1, . . . , αn] é um A-módulo

finitamente gerado.

Demonstração: Pelo Teorema (3.1), se α1 é inteiro sobre A, então

A[α1] é um A-módulo finitamente gerado. Supondo que

R = A[α1, · · · , αn−1]

é um A-módulo finitamente gerado por {x1, x2, · · · , xn} e que αn é

inteiro sobre R, tem-se, novamente pelo Teorema (3.1), que R[αn] é um

R-módulo finitamente gerado. Então, existem {y1, y2, · · · , ym} ⊂ R[αn]

de forma que

R[αn] = A[α1, α2, · · · , αn]

= y1R + y2R · · · + ymR

= y1(x1A+ x2A+ · · · + xnA) + · · · + ym(x1A+ x2A+ · · · + xnA)

= y1x1A+ y1x2A+ · · · + ymxn−1A+ ymxnA.

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3.1. ELEMENTOS INTEIROS SOBRE UM ANEL 81

Assim, {yixj}, com 1 ≤ i ≤ m e 1 ≤ j ≤ n, gera o A-módulo R[αn].

Como R[αn] = A[α1, . . . , αn], este é um A-módulo finitamente gerado.

Corolário 3.2. Sejam A e B anéis com A ⊂ B. Se α1, . . . , αn ∈ B

são inteiros sobre A, então A [α1, · · · , αn] é um A-módulo finitamente

gerado.

Demonstração: Se αi inteiro sobreA é também inteiro sobreA [α1, . . . , αi−1],

com 1 ≤ i ≤ n, donde, do Corolário (3.1), segue que A[α1, . . . , αn] é

um A-módulo finitamente gerado.

Corolário 3.3. Sejam B um anel e A um subanel de B. Se α, β ∈ B

são inteiros sobre A, então α+β,α−β e αβ são também inteiros sobre

A.

Demonstração: Naturalmente, como α, β ∈ A[α, β] e A[α, β] é um

subanel de B, α+β, α−β e αβ também são elementos de A[α, β]. Pelo

Corolário (3.2), sendo α e β inteiros sobre A, A[α, β] é um A-módulo

finitamente gerado. Assim, pelo Teorema (3.1), como A ⊂ A[α, β] ⊂ B

e A[α, β] contém α+ β, α− β e αβ estes são inteiros sobre A.

Corolário 3.4. Sejam B um anel e A um subanel de B. O conjunto

IB(A) do elementos de B que são inteiros sobre A é um subanel de B

que contém A.

Demonstração: O Corolário (3.3) implica que IB(A) é um subanel de

B. Temos que A ⊂ IB(A), uma vez que, se a ∈ A, a é raiz do polinômio

mônico p(x) = x−a, com coeficientes em A. Portanto, A ⊂ IB(A) ⊂ B.

Definição 3.3. Sejam B um anel e A um subanel de B.

(i) O conjunto

IB(A) = {α ∈ B : α é inteiro sobre A}

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82

Capítulo 3. ELEMENTOS INTEIROS E

ALGÉBRICOS

é dito anel de inteiros de B sobre A.

(ii) Se todo elemento de B é inteiro sobre A, ou seja, IB(A) = B,

então o conjunto B é dito inteiro sobre A.

Corolário 3.5. Sejam A e B anéis e A ⊂ B. Então, todo subanel de

B que é um A-módulo finitamente gerado contém IB(A).

Demonstração: Seja R ⊂ B um anel, tal que R é um A-módulo

finitamente gerado e {α1, . . . , αn} um conjunto de geradores de R. Su-

pondo que α ∈ R, tem-se que A[α] é um A-módulo finitamente gerado,

uma vez que α = a1α1 + . . .+ anαn, com ai ∈ A, para 1 ≤ i ≤ n. Pelo

Teorema (3.1) α é inteiro sobreA, donde α ∈ IB(A). Assim, IB(A) ⊂ R.

Proposição 3.1. Sejam C um anel, B um subanel de C e A um subanel

de B. Então, C é inteiro sobre A se, e somente se, B é inteiro sobre

A e C é inteiro sobre B.

Demonstração: Se C é inteiro sobre A, então para cada α ∈ C

existem a0, . . . , an−1 ∈ A, não todos nulos, tais que

αn + an−1αn−1 + . . .+ a0 = 0.

Como ai ∈ A ⊆ B, segue que α é inteiro sobre B e, portanto, C é

inteiro sobre B. Agora, se β ∈ B e B ⊂ C segue que β ∈ C e por

hipótese, β é inteiro sobre A, logo B é inteiro sobre A.

Reciprocamente, considere que C é inteiro sobreB e B é inteiro sobreA.

Seja α ∈ C, então α é inteiro sobre B, ou seja, existem b0, . . . , bn−1 ∈ B

tais que

αn + bn−1αn−1 + . . .+ b0 = 0.

Segue que α é inteiro sobre A[b0, . . . , bn−1]. Como B é inteiro sobre A,

b0, . . . , bn−1 são inteiros sobre A. Pelo Corolário (3.1), A[b0, . . . , bn−1, α]

é um A-módulo finitamente gerado, donde, pelo Teorema (3.1), α é

inteiro sobre A. Portanto, C é inteiro sobre A.

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3.1. ELEMENTOS INTEIROS SOBRE UM ANEL 83

Proposição 3.2. Sejam A ⊆ B anéis, tais que B é um domínio e B

inteiro sobre A. Então, A é um corpo se, e somente se, B é um corpo.

Demonstração: Sejam A um corpo e 0 6= α ∈ B. Como B é inteiro

sobre A, α é inteiro sobre A, assim, pelo Teorema (3.1), A[α] é um A-

módulo finitamente gerado, mas como A é corpo segue que, tendo em

vista a Observação (2.11), A[α] é um espaço vetorial finitamente gerado

sobre A. Definindo a aplicação ϕ, por

ϕ : A[α] −→ A[α]

b 7−→ bα,

temos que ϕ é A− linear (uma transformação linear de espaços linea-

res sobre A), pois dados a, b,∈ A[α] e β ∈ A, tem-se que ϕ(a + b) =

(a + b)α = aα + bα = ϕ(a) + ϕ(b) e ϕ(βa) = αβa = βαa = βϕ(a).

Nota-se que ϕ(b) = 0 se, e somente se, b = 0, pois B é domínio de

integridade. Desta forma, Ker(φ){0} e ϕ é injetora. Pelos espaços ve-

toriais considerados como domínio e contradomínio serem de mesma

dimensão e finitos, ϕ é sobrejetora, donde ϕ é bijetora. Por outro lado,

1 ∈ A[α] e a bijetividade de ϕ garante a existência de b ∈ A[α] tal que

ϕ(b) = bα = 1, de forma que, b = α−1, ou seja, α é inversível em B e,

portanto, B é corpo.

Reciprocamente, sejam B um corpo e 0 6= α ∈ A, tem-se que α ∈ B,

pois B contém A e α−1 ∈ B. É necessário provar que α−1 ∈ A. Por

hipótese, B é inteiro sobre A, então existem a0, . . . , an−1 ∈ A tais que

(α−1)n + an−1(α−1)n−1 + . . .+ a1(α−1) + a0 = 0.

Multiplicando a equação por αn−1 e isolando o termo α−1, tem-se

α−1 = −(an−1 + . . .+ a1αn−2 + a0α

n−1),

e, assim, α−1 é uma combinação linear de elementos de A e α−1 ∈ A.

Portanto, A é corpo.

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84

Capítulo 3. ELEMENTOS INTEIROS E

ALGÉBRICOS

3.1.1 Anéis Integralmente Fechados

É importante lembrar que se A é um domínio de integridade,

então existe um corpo K que contém A e que A é um subanel de K. O

menor corpo K que satisfaz essa propriedade é dito o corpo de frações

de A. Por exemplo, Q é o corpo de frações de Z.

Definição 3.4. Sejam A um domínio de integridade e K seu corpo de

frações. Quando IK(A) = A o anel A é dito integralmente fechado.

Exemplo 3.2. ?? Seja A é um domínio de integridade e K seu corpo

de frações, então IK(A) é um anel integralmente fechado, ou seja,

IK(IK(A)) = IK(A. Visto que A ⊂ IK(A) ⊂ K e K é o menor corpo

que contém A, logo K também é o menor corpo que contém IK(A).

Além disso, IK(A) é um subanel de K, assim, K é o corpo de frações

de IK(A). Seja α ∈ K inteiro sobre IK(A). Sendo IK(A) inteiro sobre A,

então, pela Proposição (3.1), α é inteiro sobre A, e α ∈ IK(A). Assim,

A é integralmente fechado.

Proposição 3.3. Seja A um domínio de integridade fatorial. Então,

A é integralmente fechado.

Demonstração: É preciso mostrar que IK(A) = A. A inclusão A ⊂IK(A) é sempre válida. Assim, sejam K o corpo de frações de A e

α ∈ IK(A). Assim, pode-se escrever α =b

c, com b, c ∈ A emdc(b, c) = 1.

Além disso, existem a0, . . . , an−1 ∈ A, não todos nulos, tais que

αn + an−1αn−1 + . . .+ a0 = 0.

Como α =b

c, tem-se que

(

b

c

)n

+ an−1

(

b

c

)n−1

+ . . .+ a0 = 0.

Multiplicando a equação acima por cn, obtem-se

bn + an−1bn−1c+ . . .+ a0c

n = 0,

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3.2. ELEMENTOS ALGÉBRICOS SOBRE UM CORPO 85

ou seja,

bn = −c(an−1bn−1 + . . .+ a0c

n−1).

Desta forma, c | bn. Suponha-se que c não é inversível. Assim, seja p um

elemento irredutível que divide c, segue que p divide bn e isso implica

que p divide b. Mas isso contradiz que mdc(b, c) = 1 e portanto c é

inversível em A. Tem-se que α = bc−1 ∈ A, donde IK(A) ⊂ A. Assim

IK(A) = A e A é integralmente fechado.

Observação 3.2. O anel Z é integralmente fechado, uma vez que é

um domínio de integridade fatorial. Isto é, IQ(Z) = Z.

3.2 ELEMENTOS ALGÉBRICOS SOBRE UM CORPO

Aqui, nesta seção, considera-se que K e L corpos e se L ⊃ K

diz-se que L é uma extensão de K.

Definição 3.5. Seja L uma extensão de um corpo K. Diz-se que α ∈ L

é algébrico sobre K se existe um polinômio não nulo f(x) ∈ K[x] tal

que f(α) = 0, ou seja, existem a0, a1, · · · , an ∈ K, não todos nulos,

tais que

anαn + an−1α

n−1 + · · ·a1α+ a0 = 0. (3.2)

Na Equação (3.2) podemos assumir que an 6= 0. Neste caso

a−1n ∈ K, multiplicando ambos os lados por a−1

n , obtemos a equação de

dependência integral (3.1) da definição de elemento inteiro. Portanto, α

é um elemento inteiro sobre um corpo K se, e somente se, α é algébrico

sobre esse mesmo corpo K.

Nem sempre todos os elementos de um corpo L ⊃ K são raízes

de um polinômio f(x) ∈ K[x]. Um elemento que não é algébrico é

dito transcendente. Por exemplo, R é uma extensão de Q e π ∈ R,

mas não existe nenhum polinômio f(x) ∈ Q[x]∗ tal que π é raiz de

f(x). O teorema que prova que π é transcendente chama-se Teorema

de Ferdinand Lindemann, cuja demonstração encontra-se no livro do

Ian Stewart (1973) p. 74.

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86

Capítulo 3. ELEMENTOS INTEIROS E

ALGÉBRICOS

Definição 3.6. Seja L uma extensão do corpo K. Diz-se que L é uma

extensão algébrica de K se todo elemento de L é algébrico sobre K.

Lema 3.1. Sejam L e K corpos, L uma extensão de K e α ∈ L. Então,

α é algébrico sobre K se, e somente se, existe um único polinômio

mônico irredutível p(x) ∈ K[x] tal que p(α) = 0.

Demonstração: Seja α ∈ L um elemento algébrico sobre K e tome

I = {p(x) ∈ K[x] : p(α) = 0}. Agora, considere a função grau ∂

definida em I∗ e ∂(I∗) = {∂(p(x)) : p(x) ∈ I∗}, segue que ∂(I∗) ⊂ N

e, por hipótese, ∂(I∗) 6= {0}. Pelo Princípio da Boa Ordenação, existe

um mínimo para o conjunto ∂(I∗). Desta forma, existe um polinômio

p(x) ∈ I∗ tal que o grau de p(x) é mínimo para ∂(I∗). Sabe-se, então,

que p(x) ∈ K[x], p(x) 6= 0, p(α) = 0 e p(x) tem o menor grau possível

dentre os polinômios deK[x] que tem α como raiz. Obviamente, pode-se

tomar p(x) mônico, pois em um corpo pode-se multiplicar pelo inverso

do coeficiente principal (a−1n ) a igualdade p(α) = 0.

Afirma-se que p(x) é irredutível sobreK[x]. De fato, suponha-se

que p(x) = f(x)g(x), com ∂f, ∂g > 1. Claro que ∂g, ∂f < ∂p. Tem-se

que 0 = p(α) = f(α)g(α) e desde que K é um domínio integridade,

tem-se f(α) = 0 ou g(α) = 0, contradizendo a minimalidade do grau

de p(x). Portanto, p(x) é irredutível.

É preciso provar a unicidade e, para tanto, observe que I é ideal

próprio de K. De fato,

• I 6= ∅, pois o polinômio nulo pertence a I;

• se f, g ∈ I, então (f − g)(α) = f(α) − g(α) = 0 e (f − g) ∈ I;

• se f ∈ K[x] e g ∈ I, então (fg)(α) = f(α)g(α) = f(α)0 = 0 e

fg ∈ I;

• como h(x) = 1K ∈ K[x] e h(x) /∈ I vem que I $ K[x].

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3.2. ELEMENTOS ALGÉBRICOS SOBRE UM CORPO 87

Sendo p(x) um polinômio irredutível, tem-se que 〈p(x)〉 é um ideal ma-

ximal, e como 〈p(x)〉 ⊂ I $ K[x], segue que I = 〈p(x)〉. Agora, seja

q(x) ∈ K[x] um polinômio mônico irredutível tal que q(α) = 0, o que

implica que, q(x) ∈ I, logo, q(x) = p(x)t(x), com t(x) ∈ K[x]. Nota-se

que t(x) é inversível em K[x], pois p(x) e q(x) são irredutíveis em K[x].

Assim, t(x) = t ∈ Q e q(x) = t.p(x). Mas p(x) e q(x) são mônicos,

então, t = 1 e q(x) = p(x).

A recíproca é imediata pois se existe um único polinômio mônico irre-

dutível p(x) ∈ K[x] tal que p(α) = 0, isso já satisfaz a Definição (3.6).

Observação 3.3. O polinômio mônico irredutível p(x) ∈ K[x]∗ tal

que p(α) = 0 denomina-se polinômio minimal de α sobre K. Neste

caso, p(x) é o polinômio de menor grau que tem α como raiz.

Definição 3.7. Analogamente a Definição (3.1), define-se K adjunção

α por

K[α] = {f(α) : f(x) ∈ K[x]},

onde L e K corpos, com L uma extensão de K e α ∈ L.

Exemplo 3.3. Seja

R[i] = {f(i) : f(x) ∈ R[x]} ∈ C

e a+ bi ∈ C. Tome f(x)a+ bx então, f(i) = a+ bi, o que implica que

a+ bi ∈ R[i] e R[i] = C.

Os elementos de K[α] são somas e produtos de elementos de

L, desta forma, K[α] é subconjunto de L.

Proposição 3.4. Sejam L uma extensão de K e α ∈ L. Então, a

aplicação ψα : K[x] −→ L, definida por ψα(f(x)) = f(α), é um homo-

morfismo tal que:

1. Im(ψα) = K[α];

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88

Capítulo 3. ELEMENTOS INTEIROS E

ALGÉBRICOS

2. se α é algébrico sobre K e se p(x) é o polinômio minimal de α

sobre K, então Ker(ψα) = 〈p(x)〉 é ideal maximal de K[x];

3.K[x]

Ker(ψα)≃ K[α],

onde Im(ψα) é o conjunto imagem de ψα e Ker(ψα) = {f(x) ∈ K[x] :

ψα(f(x)) = 0} é o núcleo de ψα.

Demonstração: Primeiro, prova-se que ψα é um homomorfismo de

anéis. Sejam f(x), g(x) ∈ K[x]. Considerando h(x) = f(x)g(x) e t(x) =

f(x) + g(x), obtem-se:

• ψα(f(x)g(x)) = ψα(h(x)) = h(α) = f(α)g(α) = ψα(f(x))ψα(g(x));

• ψα(f(x) + g(x)) = ψα(t(x)) = t(α) = f(α) + g(α) = ψα(f(x)) +

ψα(g(x)).

Portanto, ψα é um homomorfismo dos anéis de K[x] em L.

1. Im(ψα) = {ψα(f(x)) : f(x) ∈ K[x]} = {f(α) : f(x) ∈ K[x]} =

K[α].

2. Como p(x) é irredutível então, pela Proposição (2.6), 〈p(x)〉 é

ideal maximal de K[x]. Tem-se que 0 = p(α) = ψα(p(x)), ou

seja, p(x) ∈ Ker(ψα), que é um ideal de K[x] e assim 〈p(x)〉 ⊂Ker(ψα). Nota-se que 〈p(x)〉 $ K[x], pois 1K ∈ K[x], mas 1K /∈Ker(ψα). Uma vez que 〈p(x)〉 é maximal, vem que Ker(ψα) =

〈p(x)〉 .

3. No item (1) foi visto que Im(ψα) = K[α]. Daí, o Teorema dos

Isomorfismos assegura queK[x]

Ker(ψα)≃ K[α].

Observação 3.4. Sendo ψα um homomorfismo tem-se que Im(ψα) =

K[α] é um subanel de L. Notando que 1K ∈ K[α] e que as propriedades

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3.2. ELEMENTOS ALGÉBRICOS SOBRE UM CORPO 89

de comutatividade e sem divisores de zero são hereditárias de L, pode-se

garantir queK[α] é um domínio de integridade. Porém, a inversibilidade

de todos os elementos não nulos não é assegurada.

Corolário 3.6. Sejam L e K corpos, L uma extensão de K e α ∈ L.

Então, α algébrico sobre K se, e somente se, K[α] é corpo.

Demonstração: Supondo que α é algébrico sobre K, vem do item

(2) da Proposição (3.4) que Ker(ψα) é um ideal maximal de K[x], o

item (3) da mesma proposição afirma que K[α] ≃ K[x]Ker(ψα)

, que é

corpo, pelo Teorema dos Isomorfismos. Via isomorfismo, K[α] também

é corpo.

Reciprocamente, supondo que α não é algébrico sobre K, então o único

polinômio de K[x] que α é raiz é o polinômio nulo, assim Ker(φα) =

{0}. Pelo item (3) da Proposição (3.4), conclui-se que K[α] ≃ K[x], que

é apenas um domínio de integridade, contradizendo a hipótese, logo, α

é algébrico sobre K.

Corolário 3.7. Se α, β ∈ L ⊇ K são raízes do mesmo polinômio

irredutível sobre K, então K[α] e K[β] são isomorfos como corpos.

Demonstração: Seja p(x) ∈ K[x], tal que p(x) é irredutível sobre K e

p(α) = p(β) = 0. Pode-se tomar p(x) mônico, assim, p(x) é o polinômio

minimal de α e β sobre K. Considerando os homomorfismos

ψα : K[x] −→ K[α] e ψβ : K[x] −→ K[β]

f(x) 7−→ f(α) f(x) 7−→ f(β),

tem-se, pelos itens (2.) e (3.) da Proposição (3.4), que

K[α] ≃ K[x]〈p(x)〉 ≃ K[β].

Logo, K[α] ≃ K[β] como corpos.

Proposição 3.5. Sejam α ∈ L ⊇ K algébrico sobre K e n o grau do

polinômio minimal de α sobre K.

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90

Capítulo 3. ELEMENTOS INTEIROS E

ALGÉBRICOS

1. Se f(x) ∈ K[x], então f(α) pode ser expresso de forma única

como f(α) = a0 + a1α + . . . + an−2αn−2 + an−1α

n−1, tal que

ai ∈ K, para i = 1, 2, · · · , n− 1.

2. K[α] = {a0+a1α+· · ·+an−1αn−1 : ai ∈ K para i = 1, 2, · · · , n−

1}.

Demonstração:

1. Sejam p(x) o polinômio minimal de α sobre K e n o grau de p(x).

Dado f(x) ∈ K[x] e usando o algoritmo de Euclides obtem-se que

n−1 é o maior grau possível do resto da divisão de f(x) por p(x).

Sendo f(x) = q(x)p(x) + a0 + a1α + · · · + an−1αn−1 e p(α) = 0,

implica que, f(α) = q(α)p(α) + a0 + a1α + · · · + an−1αn−1 =

a0 + a1α+ · · · + an−1αn−1.

Precisa-se provar a unicidade de f(α). Suponha que a0 + a1α +

· · · + an−1αn−1 = f(α) = b0 + b1α+ · · · + bn−1α

n−1, com ai, bi ∈K[x], para i = 1, 2, · · · , n− 1 e considere h(x) = (a0 − b0) + (a1 −a2)α + · · · + (an−1 − bn−1)αn−1. Então, h(α) = 0, logo h(x) = 0

ou ∂h < ∂p. Pela minimalidade do grau de p(x), tem-se h(x) = 0,

portanto ai − bi = 0, ou seja, ai = bi, para todo i = 1, · · · , n− 1.

2. É claro que a0 + a1α + · · · + an−1αn−1 ∈ K[α], para ai ∈ K.

Agora, seja u um elemento de K[α], então existe um polinômio

f(x) ∈ K[x] tal que u = f(α). Pelo item (1.), segue que u =

f(α) = a0 + a1α+ · · · + an−1αn−1 e assim u ∈ {a0 + a1α+ · · · +

an−1αn−1 : ai ∈ K para i = 1, 2, · · · , n− 1}.

Definição 3.8. Um corpo K é chamado algebricamente fechado

se todo polinômio p(x) ∈ K[x] pode ser expresso com um produto de

fatores lineares, todos em K[x]. Isto é, todas as raízes de p(x) pertencem

a K.

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3.2. ELEMENTOS ALGÉBRICOS SOBRE UM CORPO 91

Exemplo 3.4. O corpo C dos números complexos é um corpo alge-

bricamente fechado, fato esse conhecido como o "Teorema Fundamen-

tal da Álgebra"(todas as raízes de p(x) ∈ C[x] estão contidas em C).

Já os corpos Q e R não são algebricamente fechados, por exemplo,

f(x) = x2 + 1 ∈ Q[x] ⊂ R[x], mas as raízes ±i = ±√

−1 de f(x) não

pertencem a R e muito menos a Q.

Proposição 3.6. Seja f(x) ∈ K[x] com ∂f = n > 1 e α ∈ L raiz de

f(x), com L uma extensão de K.

1. α é raiz simples se, e somente se, f(α) = 0 e f ′(α) 6= 0.

2. f(x) é irredutível sobre K se, e somente se, as raízes de f(x) são

simples.

Demonstração:

1. Seja alpha uma raiz simples de f(x) então, pode-se escrever f(x) =

(x − α)g(x) com g(α) 6= 0. Derivando obtém-se f ′(x) = g(x) +

(x − α)g′(x) e f ′(α) = g(α) 6= 0. Por outro lado, α é raiz de

f(x), pois f(α) = 0. Seja m a multiplicidade de α como raiz de

f(x). Supõe-se m > 1, então f(x) = (x− α)mq(x) com q(α) 6= 0.

Derivando tem-se f ′(x) = m(x−α)m−1q(x)+(x−α)mq′(x), logo

f ′(α) = 0. Isso contradiz a hipótese, portanto m = 1.

2. Tomando α ∈ L ⊇ K tal que f(α) = 0 e f(x) ∈ K[x]. Tem-se que

α é algébrico sobre K. Seja a o inverso do coeficiente dominante

de f(x), assim g(x) = af(x) é o polinômio minimal de α. Supondo

que α tenha multiplicidade m > 1 pelo item (1), f ′(α) = 0. Assim

g′(α) = 0, o que é uma contradição, pois ∂g′ < ∂g e g(x) é o

polinômio minimal de α.

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92

Capítulo 3. ELEMENTOS INTEIROS E

ALGÉBRICOS

3.2.1 Extensões Algébricas

Considere A um anel com unidade e K um corpo tal que K ⊂A. Como A é um anel, segue que para quaisquer a, b ∈ A implica que

a + b ∈ A, ou seja, a operação de adição é fechada em A, que satisfaz

as seguintes propriedades: Para quaiquer a, b, c ∈ A:

(i) (a+ b) + c = a+ (b+ c);

(ii) a+ b = b+ a;

(iii) Existe 0 ∈ A tal que a+ 0 = a = 0 + a;

(vi) Dado a ∈ A, existe −a ∈ A tal que a+ (−a) + 0 = (−a) + a.

Agora, para qualquer a ∈ A e para qualquer k ∈ K ⊂ A implica que

ka ∈ A, pois a operação de multiplicação é fechado em A. E ainda, são

satisfeitas as propriedades abaixo: Para quaisquer a, b, c ∈ A, k, λ ∈ K

(v) (ab)c = a(bc);

(vi) (a+ b)k = ak + bk e k(a+ b) = ka+ kb;

(vii) (k + λ)a = ka+ λb e a(k + λ) = ak + aλ;

(viii) Existe 1 ∈ K tal que 1a = a = a1.

Então, pode-se ver A como um K-espaço vetorial.

Sabe-se da Álgebra Linear que todo K−espaço vetorial V tem

base, ou seja, um conjunto de geradores linearmente independentes. E

se V possui uma base com n vetores, então qualquer base para V terá

também n vetores. Lembrando que a dimensão do espaço vetorial V

sobre K é o número de elementos de uma base V .

Definição 3.9. Sejam L e K corpos e L uma extensão de K. Então,

como visto anteriormente, pode-se dizer que L é um K−espaço veto-

rial. Neste caso, define-se o grau da extensão L de K como sendo a

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3.2. ELEMENTOS ALGÉBRICOS SOBRE UM CORPO 93

dimensão do K−espaço vetorial L e o grau da extensão denota-se por

[L : K].

Se o grau da extensão L de K for finito, diz-se que L é extensão finita

de K. Caso contrário, L é uma extensão infinita de K.

Proposição 3.7. Sejam L uma extensão de K e α ∈ L.

1. L é extensão finita se, e somente se, L é extensão algébrica.

2. Se α é algébrico sobre K e o grau do polinômio minimal de α

sobre K é n, então [K[α] : K] = n e γ = {1, α, α2, · · · , αn−1} é

uma base de K[α] sobre K.

Demonstração:

1. Considere [L : K] = m < ∞ e seja α ∈ L ⊃ K. Sendo K[α] um

subespaço de L segue, imediatamente, que [K[α] : K] 6 [L : K] =

m < ∞. Se [K[α] : K] = n, então 1, α, · · · , αn são linearmente

dependentes, pois n é o número máximo de elementos linearmente

independentes, e portanto, existem escalares a0 + a1 + · · · + an,

não todos nulos, tais que

a0 + a1α+ · · · + anαn = 0,

e isso mostra que α é algébrico sobre K.

2. Pela Proposição (3.5), todo elemento de K[α] se escreve de forma

única como a0 + a1α + · · · + an−1αn−1, com ai ∈ K. Claro que

γ = {1, α, · · · , αn−1} gera K[α]. Precisa-se verificar que γ é um

conjunto linearmente independente, suponha-se que

b0 · 1 + b1α1 + · · · + bn−1α

n−1 = 0. (3.3)

Por outro lado,

0 = 0 · 1 + 0α1 + · · · + 0αn−1. (3.4)

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94

Capítulo 3. ELEMENTOS INTEIROS E

ALGÉBRICOS

Pela unicidade comentada anteriormente, tem-se que bi = 0 para

todo i = 1, · · · , n − 1. Portanto, γ é um conjunto de geradores

linearmente independentes deK[α], isto é, γ é uma base do espaço

vetorial K[α] sobre K.

Corolário 3.8. Sejam L uma extensão de K e α ∈ L. As seguintes

afirmações são equivalentes:

1. α é algébrico sobre K;

2. [K[α] : K] é finito;

3. K[α] é a extensão algébrica de K.

Demonstração: O Corolário é consequência direta da Proposição

(3.7).

Observação 3.5. Seja K é um corpo. Se α é algébrico sobreK pode-se

concluir queK[α] é umK-módulo finitamente gerado por {1, α, · · · , αn−1}.

Além disso, a recíproca também é verdadeira. Na realidade, esse resul-

tado pode ser obtido pelo Teorema 3.1.

Proposição 3.8. Sejam M um domínio e L uma extensão de K tais

que K ⊆ L ⊆ M , [M : L] e [L : K] são finitas. Então, [M : K] é finita

e [M : K] = [M : L][L : K]

Demonstração: Seja {v1, · · · , vr} uma base de M sobre L e seja

{u1, · · · , us} uma base de L sobre K. Basta provar que γ = {viui :

i = 1, · · · , r e j = 1, · · · , s} é uma base de M sobre K.

Primeiro vamos mostrar que o conjunto γ é linearmente independente.

Considere que∑

i,j

aijviuj = 0, (3.5)

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3.2. ELEMENTOS ALGÉBRICOS SOBRE UM CORPO 95

com aij ∈ K , 1 ≤ i ≤ r e 1 ≤ j ≤ s. Pode-se reescrever a Equação

(3.5) do seguinte modo:

(a11u1 + a12u2 + · · · + a1sus)v1 + · · · + (ar1u1 + · · · + arsus)vr = 0.

Observa-se que aijuj ∈ L, para 1 ≤ i ≤ r e 1 ≤ j ≤ s, pois L é

um espaço vetorial sobre K, e então,r∑

i,j

aijuj ∈ L. Como {v1, · · · , vr}

é linearmente independente sobre L, tem-se ques∑

j=1

aijuj = 0, para

1 ≤ i ≤ r. Como {u1, · · · , us} é linearmente independente sobre K,

obtém-se que aij = 0, para todos 1 ≤ i ≤ r e 1 ≤ j ≤ s.

Agora vamos mostrar que γ gera M . Seja y ∈ M , então y = λ1v1 +

· · · + λrvr, onde λi ∈ L. Por sua vez, λi =s∑

j=1

aijuj, onde aij ∈ K.

Assim

y =r∑

i=1

λivi =r∑

i=1

s∑

j=1

aijujvi =∑

i,j

aijviuj .

Portanto, [M : K] é finita e [M : K] = [M : L][L : K].

Como consequência imediata da Proposição (3.8) [M : L] e

[L : K] dividem [M : K].

Definição 3.10. Seja K um corpo. Diz-se que K tem característica

m se mα = 0, para todo α ∈ K, e m é o menor inteiro positivo com

esta propriedade. Se mα 6= 0 para todo α 6= 0 e todo m inteiro positivo

então, diz-se que K tem característica zero.

Observação 3.6. Note que todo corpo infinito possui característica

zero.

Proposição 3.9. Seja K um corpo de característica zero. Se f(x) ∈

K[x] é um polinômio mônico irredutível, e seja f(x) =n∏

i=1

(x− αi) sua

decomposição em fatores lineares em uma extensão L de K, então as

n raízes α1, . . . , αm de f(x) são distintas.

Demonstração: Supõe-se que nem todas as raízes α1, . . . , αm de f(x)

sejam distintas. Pela Proposição (3.6),tem-se que f(x) possui alguma

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96

Capítulo 3. ELEMENTOS INTEIROS E

ALGÉBRICOS

raiz em comum com sua derivada f ′(x). Assim, f(x) | f ′(x). Uma

vez que ∂f ′(x) < ∂f , isto significa que f ′(x) é um polinômio nulo.

Entretanto

f(x) = xn + an−1xn−1 + · · · + a0, ai ∈ K

e

f ′(x) = n · 1 · xn−1 + (n− 1)an−1xn−2 + · · · + a1.

Então n · 1 = 0, jaj = 0, para 1 ≤ j ≤ n− 1, o que é impossível em um

corpo de característica zero. Portanto, as raízes de f(x) são distintas.

Teorema 3.2. Sejam K um corpo de característica zero, L um ex-

tensão finita de grau n de K e C um corpo algebricamente fechado

contendo K. Então, existe n distintos K-isomorfismos de L em C.

Demonstração: A afirmação deste teorema é verdadeira para qual-

quer extensão L de K da forma L = K[α] com α ∈ L. De fato, o

polinômio minimal f(x) de α sobre K é de grau n. E tem n raízes

α1, . . . , αn em C, todas distintas, de acordo com a Proposição (3.9).

Para cada i = 1, 2, . . . , n, tem-se um K-isomorfismo σi : L −→ C, tal

que σi(α) = αi e σi(a) = a, para todo a ∈ K.

A continuação da demonstração será feita por indução sobre o grau n da

extensão L sobre K. Seja α ∈ L, considera-se os corpos K ⊆ K[α] ⊆ L

e toma-se q = [K[α],K]. Podemos assumir q > 1. Anteriormente,

mostrou-se que existem q distintos K-isomorfismos σ1, . . . , σq de K[α]

em C. Como, pelo Corolário (3.7), K[σi(α)] = K[αi] e K[α] são iso-

morfos, é possível construir uma extensão Li de K[σi(α)] = K[αi] e

um isomorfismo τi : L −→ Li que estende σi (1 ≤ i ≤ q). Tem-se

que K[σi(α)] é um corpo de característica zero. Uma vez que, [Li :

K[σi(α)]] = [L : K[α]] =n

q< n, a hipótese de indução implica que

existemn

qdistintos K[σi(α)]-isomorfismos θij de Li em C (1 ≤ j ≤ n

q ).

Portanto, as aplicações compostas θij ◦ τi fornecem q · nq

= n K-

isomorfismos de Li em C. Os K-isomorfismos são distintos pois para

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3.3. NÚMEROS ALGÉBRICOS 97

i 6= k, θij ◦ τi|K[αi] = σi 6= σk = θkj ◦ τk|K[αk], enquanto para i = k e

j 6= t, θij |Lj6= θit|Lt

.

Teorema 3.3. (Teorema do Elemento Primitivo) Sejam K um corpo

de característica zero, L uma extensão de K de grau finito n. Então,

existe um elemento θ de L (chamado de elemento primitivo), tal que

L = K[θ].

Demonstração: Ver Samuel (2002), pg 34.

3.3 NÚMEROS ALGÉBRICOS

Nesta seção considera-se que L e K são corpos tais que Q ⊂K ⊂ L ⊂ C.

Definição 3.11. Seja L uma extensão K e α ∈ L ⊆ C. Se existe um

polinômio mônico f(x) ∈ Q[x], f(x) 6= 0 tal que f(α) = 0, então diz-se

que α um é número algébrico. No caso em f(x) ∈ Z[x], então α é

dito um inteiro algébrico.

Definição 3.12. Diz-se que L ⊃ Q é um corpo de números se todo

elemento de L é um número algébrico. Isto é, L uma extensão finita de

Q. Se [Ł : Q] = n dizemos que L é um corpo de números de grau n.

Definição 3.13. Define-se o anel dos inteiros algébricos do corpo de

números Ł como

IL = {α ∈ L : ∃f(x) ∈ Z[x]∗ tal que f(α) = 0}= {α ∈ L : α é inteiro algébrico}.

Exemplo 3.5. O anel de inteiros algébricos de Q é igual a Z.

Definição 3.14. Sejam K um corpo de números de grau n e IK o anel

de inteiros algébricos de K. Chama-se de base integral de K, ou de

IK , uma Z-base para o grupo aditivo IK .

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98

Capítulo 3. ELEMENTOS INTEIROS E

ALGÉBRICOS

Observação 3.7. Sejam {α1, . . . , αn} uma base integral de IK . Todo

elemento α ∈ IK pode ser escrito de modo único, da forma

α =n∑

i=1

aiαi,

com ai ∈ Z para 1 ≤ i ≤ n.

Proposição 3.10. Seja K = Q[θ] um corpo de números sobre Q de

grau n. Então existe exatamente n monomorfismos distintos σi : K −→C (i = 1, · · · , n). Os elementos σi(θ) = θi são as raízes distintas em C

do polinômio minimal de θ sobbre Q.

Demonstração: Segue do Teorema (3.2) uma vez que Q[θ] é

um corpo de característica zero.

A seção a seguir é um exemplo de corpo de números e seu anel

de inteiros algébricos.

3.4 CORPOS QUADRÁTICOS

Anteriormente, foi visto que um corpo de números é uma ex-

tensão finita de Q. Nesta seção, serão introduzidos o conceito de corpos

quadráticos e suas principais propriedades.

Definição 3.15. Um corpo quadrático é uma extensão finita de Q

de grau 2.

Proposição 3.11. Todo corpo quadrático é da forma Q(√d), onde d é

um inteiro livre de quadrados, ou seja, d não é divisível pelo quadrado

de um número primo.

Demonstração: Se K é um corpo quadrático, então todo elemento

α ∈ K tal que α /∈ Q tem polinômio minimal sobre K de grau 2 sobre

Q. Pelo Teorema (3.3), tem-se que K = Q[α], para algum α ∈ K. Seja

p(x) = x2 + bx + c o polinômio minimal de α. Resolvendo a equação

quadrática

α2 + bα+ c = 0,

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3.4. CORPOS QUADRÁTICOS 99

tem-se que 2α = −b ±√b2 − 4c. Assim, K = Q[α] = Q[

√b2 − 4c] e

observando que b2 − 4c é um número racional da formau

v=uv

v2, com

u, v ∈ Z primos entre si, tem-se que Q[√b2 − 4c] = Q(

√uv). Como

uv ∈ Z, podemos representar uv = dm2, onde d,m ∈ Z, com m > 1,

d 6= 1 e d livre de quadrados. Assim, Q(√uv) = Q(

√d), com d livre de

quadrados.

Observação 3.8.

1. Um elemento α é da forma a + b√d com a, b ∈ Q. O conjunto

{1,√d} é uma base da extensão Q[

√d] sobre Q.

2. O elemento√d é uma raiz do polinômio irredutível x2 − d. O

conjugado de√d é −

√d, ou seja, existe um automorfismo σ :

Q(√d) −→ Q(

√d), tal que σ(a+ b

√d) = a− b

√d.

3. Se d > 0, a extensão Q(√d) é dita real e se d < 0, a extensão

Q(√d) é dita imaginária.

Lema 3.2. Seja IK o anel de inteiros de K = Q(√d), com d livre de

quadrados, sobre Z. Se α = a+ b√d ∈ IK , então 2a ∈ Z e 2b ∈ Z.

Demonstração: Pela Observação (3.8), existe um automorfismo

σ : K −→ K

a+ b√d 7−→ a− b

√d.

Como σ(α) também é raiz da mesma equação de dependência integral

de α, então σ(α) ∈ IK . Como α, σ(α) ∈ IK , pelo Corolário (3.3), tem-se

que α+ σ(α) ∈ IK e ασ(α) ∈ IK . Ainda, α+ σ(α) = (a+ b√d) + (a−

b√d) = 2a ∈ Q e ασ(α) = (a + b

√d)(a − b

√d) = a2 − db2 ∈ Q. Pela

Proposição (3.3), segue que Z é integralmente fechado e, portanto,

2a ∈ Z e a2 − db2 ∈ Z. (3.6)

Por (3.6), tem-se que (2a)2 − d(2b)2 = 4(a2 − db2) ∈ Z. Mas, 2a ∈ Z,

então d(2b)2 ∈ Z. Se 2b /∈ Z, o seu denominador tem um fator primo p,

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100

Capítulo 3. ELEMENTOS INTEIROS E

ALGÉBRICOS

tal que em d(2b)2 este fator aparece como p2 no denominador. Como d

é livre de quadrados, então d(2b)2 /∈ Z, o que é um absurdo. Portanto,

2b ∈ Z.

Observação 3.9. Se d é livre de quadrados, então d 6≡ 0(mod 4).

O teorema a seguir tem por finalidade determinar o anel dos

inteiros algébricos de um corpo quadrático K = Q(√d), com d livre de

quadrados.

Teorema 3.4. Seja K = Q(√d) um corpo quadrático, com d ∈ Z livre

de quadrados.

(i) Se d ≡ 2(mod 4) ou d ≡ 3(mod 4), então o anel de inteiros IK

de K, é consistido de todos os elementos da forma a+ b√d, com

a, b ∈ Z, ou seja, IK = Z[√d].

(ii) Se d ≡ 1(mod 4), então o anel de inteiros IK de K, é consistido

de todos os elementos da forma12

(a + b√d), com a, b ∈ Z, e de

mesma paridade, ou seja, IK = Z

[

1 +√d

2

]

.

Demonstração: Seja α = a+ b√d ∈ IK . Pelo Lema (3.2), segue que

a =u

2e b =

v

2, com u, v ∈ Z.

Da equação (3.6), tem-se que

u2 − dv2 ∈ 4Z.

Assim

(i) Se d ≡ 2(mod 4) ou d ≡ 3(mod 4), então u e v são pares, pois se v

fosse ímpar, então v2 ≡ 1(mod 4). Como u2−dv2 ∈ 4Z, tem-se que

u2 −d(4k+1) ∈ 4Z, para algum K ∈ Z, donde u2 −d ∈ 4Z. Desta

forma, u2 ≡ d(mod 4). Logo, d ≡ 1(mod 4) ou d ≡ 0(mod 4), o que

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3.4. CORPOS QUADRÁTICOS 101

é uma contradição à hipótese. Já que v é par, então v2 ≡ 0(mod 4)

e, portanto, u2 ∈ 4Z. Assim, u também é par. Logo, a, b ∈ Z e

α = a+ b√d ∈ Z[

√d] e, assim, IK ⊂ Z[

√d]. Agora, tomando α ∈

Z[√d], segue que α é raiz do polinômio x2 −2ax+a2 −db2 ∈ Z[x].

Logo, Z[√d] ⊂ IK . Portanto, Z[

√d =]IK .

(ii) Se d ≡ 1(mod 4), então u e v tem a mesma paridade. Se u e

v são pares então, a, b ∈ Z e, logo, α = a + b√d ∈ Z[

√d].

Se u e v são ímpares, então α =u

2+v√d

2∈ Z

[

1 +√d

2

]

e,

assim, IK ⊂ Z

[

1 +√d

2

]

. Agora, se α = a + b

(

1 +√d

2

)

Z

[

1 +√d

2

]

, com a, b ∈ Z, então α é raiz do polinômio x2 − (2a+

b)x +(

a2 + ab− (1 − d)b2

4

)

∈ Z[x], pois d ≡ 1(mod 4). Logo,

Z

[

1 +√d

2

]

⊂ IK . Portanto, Z

[

1 +√d

2

]

= IK .

Exemplo 3.6.

• Seja K = Q(√

6). Como 6 ≡ 2(mod 4) então, IK = Z[√

6]

.

• SejaK = Q(√

−3). Como −3 ≡ 1(mod 4) então, IK = Z[

1 +√

−32

]

.

• Seja K = Q[i], sendo i =√

−1. Como −1 ≡ 3(mod 4) então

IK = Z[i], o anel dos inteiros de Gauss.

Observação 3.10. Seja Q[√d] um corpo quadrático.

1. Se m 6≡ 1(mod 4), então β = {1,√d} é uma base integral de

Q[√d].

2. Se m ≡ 1(mod 4), então β =

{

1,1 +

√d

2

}

é uma base integral

de Q[√d].

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103

4 NORMA, TRAÇO E

DISCRIMINANTE

Seja K um corpo. Na Álgebra Linear tem-se que se T é um ope-

rador linear de um K−espaço vetorial V de dimensão finita (dimKV

igual a n), então existe uma matriz quadrada (ordem n × n) associ-

ada a essa transformação, e a partir dessa matriz define-se o traço, a

norma, o determinante e o polinômio característico do operador linear

T. Agora, sejam A um anel, E um A−módulo livre de posto finito e σ

um endomorfismo de E. Do mesmo modo que é feito em Álgebra Linear,

defini-se o traço, a norma e o polinômio característico do endomorfismo

σ.

4.1 NORMA E TRAÇO

Sejam A e B anéis, A ⊂ B, tais que B é um A-módulo livre de

posto n e {e1, e2, ..., en} uma base de B sobre A. Para definir as aplica-

ções norma e traço, bem como polinômio característico e discriminante

é preciso primeiro analisar os endomorfismos de B. Seja σ : B −→ B

um endomorfismo de A−módulos. Desta forma,

σ(e1) = a11e1 + a12e2 + ...+ a1nen

σ(e2) = a21e1 + a22e2 + ...+ a2nen

...

σ(en) = an1e1 + an2e2 + ...+ annen,

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104

Capítulo 4. NORMA, TRAÇO E

DISCRIMINANTE

com aij ∈ A, para 1 ≤ i, j ≤ n. Matricialmente tem-se

σ(e1)

σ(e2)...

σ(en)

=

a11 a12 · · · a1n

a21 a22 · · · a2n

......

an1 an2 · · · ann

e1

e2

...

en

.

Definição 4.1. Define-se

(i) o traço de σ por

TrB|A(σ) =n∑

i=1

aii;

(ii) a norma de σ por

NB|A(σ) = det(aij);

(iii) o polinômio característico de σ por

χB|A(x) = det(xIn − [aij ]),

sendo In a matriz identidade de ordem n.

Observação 4.1. Sejam X e Y duas matrizes quadradas de mesma

ordem, sabe-se que traço(X+Y ) = traço(X) + traço(Y ) e que det(XY )

= det(X)det(Y ). Devido essas propriedades e do fato que σ e ϕ são

homomorfismos, tem-se que:

• TrB|A(σ + ϕ) = TrB|A(σ) + TrB|A(ϕ)

• NB|A(σϕ) = NB|A(σ)NB|A(ϕ)

• χB|A(x) = det(xIn−[aij ]) = xn−TrB|A(σ)xn−1+...+(−1)nNB|A(σ).

Definição 4.2. Sejam A e B anéis, A ⊆ B, tais que B é um A-módulo

livre de posto n e {e1, e2, ..., en} uma base de B sobre A. Seja α ∈ B

e considere o endomorfismo (de A−módulos) σα : B −→ B dado por

σα(x) = αx. Assim, define-se

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4.1. NORMA E TRAÇO 105

(i) o traço de α ∈ B por TrB|A(α) = TrB|A(σα);

(ii) a norma de α ∈ B por NB|A(α) = NB|A(σα);

(iii) o polinômio característico de α ∈ B por χB|A(x) = det(xI −σα).

Observação 4.2. Pode-se usar simplesmente Tr para traço, N para

norma e χ(x) para o polinômio característico se estiver claro quais os

anéis com que se está trabalhando.

Observação 4.3. Seja A ⊆ B anéis tais que B é um A-módulo livre

de posto finito. Se α, β ∈ B e a ∈ A, então, para qualquer x ∈ B

• (σα + σβ)(x) = αx+ βx = (α+ β)(x) = σα+β(x);

• σα ◦ σβ(x) = σα(βx) = αβx = σαβ(x);

• σaα(x) = (aα)x = a(αx) = aσα(x).

Além disso, a matriz de σa em relação a uma base {e1, · · · , en}de B sobre A é a matriz diagonal onde a é a entrada de todas as

diagonais. De fato,

σa(e1) = ae1 = ae1 + 0e2 + · · · + 0en

σa(e2) = ae2 = 0e1 + ae2 + · · · + 0en

...

σa(en) = aen = 0e1 + 0e2 + · · · + aen.

Matricialmente, obtém-se

σa(e1)

σa(e2)...

σa(en)

=

a 0 · · · 0

0 a · · · 0...

...

0 0 · · · a

e1

e2

...

en

.

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106

Capítulo 4. NORMA, TRAÇO E

DISCRIMINANTE

Proposição 4.1. Considerando ainda que A e B são anéis, A ⊂ B,

B um A−módulo livre de posto n. Se α, β ∈ B e a ∈ A então,

1. Tr(α+ β) = Tr(α) + Tr(β);

2. Tr(aα) = aTr(α);

3. Tr(a) = na

4. N(αβ) = N(α)N(β)

5. N(a) = an

6. N(aα) = anN(α)

Demonstração:

1. Tr(α + β) = Tr(σα+β) = Tr(σα + σβ) = Tr(σα) + Tr(σβ) =

Tr(α) + Tr(β);

2. Tr(aα) = Tr(σaα) = Tr(aσα) = aTr(α);

3. Tr(a) = Tr(σa) = na

4. N(αβ) = N(σαβ) = N(σα ◦ σβ) = N(σα)N(σβ) = N(α)N(β)

5. N(a) = N(σa) = an

6. N(aα) = N(σaα) = N(aσα) = anN(α)

Proposição 4.2. Sejam K um corpo de característica zero, L uma

extensão de K de grau n, α ∈ L e α1, α2, ..., αn as raízes do polinômio

minimal de α sobre K. Então, Tr(α) = α1+, α2 + ... + αn, N(α) =

α1α2...αn e χ(x) = (x− α1)(x − α2)...(x − αn).

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4.1. NORMA E TRAÇO 107

Demonstração: Inicialmente será demonstrado para o caso em que

α é elemento primitivo de L sobre K, e, portanto, L = K[α]. Seja

p(x) = xn + an−1xn−1 + ... + a1x + a0 onde ai ∈ K para 0 ≤ i ≤ n, o

polinômio minimal de α sobre K. Então,

αn + an−1 + · · · + a1α+ a0 = 0,

e, logo,

αn = −an−1 − · · · − a1α− a0.

Tem-se que L éK-isomorfo aK[x]

〈f(x)〉 , pela Proposição (3.4), e {1, α, ..., αn−1}é uma base de L sobre K. Para determinar a matriz do endomorfismo

σα, pela base dada acima, faz-se

σα(1) = α = 0 · 1 + 1α+ 0α2 + · · · + 0αn−1

σα(α) = α2 = 0 · 1 + 0α+ 1α2 + · · · + 0αn−1

...

σα(αn−2) = αn−1 = 0 · 1 + 0α+ 0α2 + · · · + 1αn−2 + 0αn−1

σα(αn−1) = αn = −a01 − a1α+ · · · + an−1αn−1.

Assim,

M =

0 1 0 · · · 0 0

0 0 1 · · · 0 0...

......

. . ....

0 0 0 · · · 0 1

a0 −a1 −a2 · · · −an−2 −an−1

é a matriz associada ao endomorfismo σα. Desta forma

xIn −M =

x −1 0 · · · 0 0

0 x −1 · · · 0 0...

.... . .

...

0 0 0 · · · x −1

a0 a1 a2 · · · an−1 x+ an−1

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108

Capítulo 4. NORMA, TRAÇO E

DISCRIMINANTE

e calculando o determinante por cofatores, tem-se det(xIn −M) = f(x),

ou seja, o polinômio característico em α é igual ao polinômio minimal

de α. Por definição

χ(x) = det(xIn −M)

= xn − Tr(σα)xn−1 + ...+ (−1)ndet(σα)

Tem-se que α é elemento primitivo, então

χ(x) = (x− α1)(x − α2)...(x − αn)

= xn − (n∑

i=1

αi)xx−1 + ...+ (−1)n(n∏

i−=1

αi).

Assim,

Tr(σα) = Tr(α) =n∑

i=1

αi

e

N(σα) = N(α) =n∏

i=1

αi.

É preciso mostrar, agora, para o caso geral, isto é, considera-se

α ∈ L qualquer é um elemento algébrico sobre K. Assim K ⊆ K[α] ⊆ L

e pela Proposição (3.8) tem-se que

[L : K] = [L : K[α]][K[α] : K].

Assim, dadas {y1, ..., yq} uma base de K[α] sobre K e seja {z1, ..., zr}uma base de L sobre K[x], então {yizi} é uma base de L sobre K e

n = qr. Agora, é preciso mostrar que o polinômio característico χ(x)

de α, em relação a L sobre K, é igual a r-ésima potência do polinômio

minimal de α sobre K. Seja M = (aih) a matriz do endomorfismo de

K[α] sobre K em relação à base {y1, ..., yq}. Então,

σα(yi) = 2αyi =∑

h

(aih)yh

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4.1. NORMA E TRAÇO 109

e

α(yizj) =

(

h

aihyh

)

zj

=∑

h

aih(yhzj).

Assim,

αy1z1 = a11y1z1 + a12y1z1 + · · · + a1qyqz1

αy2z1 = a21y1z1 + a22y1z1 + · · · + a2qyqz1

...

αyqz1 = aq1y1z1 + aq2y1z1 + · · · + aqqyqz1.

Então, ordena-se a base yizj de L sobre K, tal que a matriz do endo-

morfismo seja

M1 =

M 0 · · · 0 0

0 M · · · 0 0...

.... . .

......

0 0 · · · 0 M

ou seja, M repete-se r-vezes na diagonal como blocos na matriz M1.

Assim, a matriz xIn −M1, é formada por r-blocos diagonais da forma

xIq − M , donde det(xIn − M1) = det(xIq − M)r. Então, χ(x) =

(det(xIn −M1)) e (det(xIq −M)) é o polinômio minimal de α sobre K,

como é possível concluir pela primeira parte da demonstração.

Observação 4.4. Pela Proposição (4.2) tem-se que

Tr(L|K(α)) = rT rK[α]|K(α),

NL|K(α) = (NK[α]|K(α))r e

χL|K(α) = (χK[α]|K(α))r ,

com r = [L : K[α]].

Exemplo 4.1. Seja o corpo quadrático Q[i].

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110

Capítulo 4. NORMA, TRAÇO E

DISCRIMINANTE

1. Seja i ∈ Q[i]. O polinômio minimal de i é p(x) = x2 + 1, cujas

raízes são ±i. Assim,

Tr(i) = i− i = 0,

N(i) = i(−i) = 1 e

χ(x) = p(x).

2. Seja = 1 − i ∈ Q[i]. O polinômio minimal de 1 − i é q(x) =

x2 − 2x+ 2, cujas raízes são 1 ± i. Assim,

Tr(i) = (1 + i) + (1 − i) = 2,

N(i) = (1 + i)(1 − i) = 2 e

χ(x) = q(x).

Exemplo 4.2. Sejam o corpo quadrático Q[√d], com d livre de qua-

drados e α = a+ b√d ∈ Q[

√d]. Então,

1. Se b = 0 então, a ∈ Q e p(x) = x − a é o polinômio minimal de

α. Assim, Tr(α) = a e N(a) = a.

2. Se b 6= 0 então, o polinômio minimal de α é q(x) = x2 − 2ax +

a2 − db2 e suas raízes são a+ b√d e a− b

√d. Assim, Tr(α) = 2a

e N(α) = a2 − db2.

Exemplo 4.3. Seja K = Q(√d), então tem-se duas possibilidades para

o seu anel de integridade IK :

1. se d ≡ 1(mod 4), então IK = Z[√d];

2. se d ≡ 2(mod 4) ou d ≡ 3(mod 4), então IK = Z

[

1 +√d

2

]

.

Para o caso (1) tem-se a base β1 = {1,√d} Os monomorfismos de K

em C são σ1(a + b√

−1) = a + b√

−1 e σ2(a + b√

−1) = a − b√

−1.

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4.1. NORMA E TRAÇO 111

Logo, Tr(a + b√

−1) =2∑

i=1

σi(a + b√

−1) = 2a e N(a + b√

−1) =

2∏

i=1

σ(a+ b√

−1) = a2 + b2.

Proposição 4.3. Se A é um domínio, K seu corpo de frações, L ⊇ K

uma extensão finita e α ∈ L um elemento inteiro sobre A, então os

coeficientes do polinômio característico de α são inteiros sobre A. Em

particular, Tr(α) e N(α) são inteiros sobre A.

Demonstração: Pela Proposição (4.2), tem-se que χ(x) = (x −α1)(x − α2) · · · (x − αn). Os coeficientes de χ(x) são somas e produ-

tos dos αi, com 1 ≤ i ≤ n, basta mostrar que estes αi são inteiros

sobre A. Pela Proposição (3.10) existe um K-homomorfismo definido

da seguinte forma

σi : K[α] −→ K[αi]

α 7−→ αi,

com 1 ≤ i ≤ n. Uma vez que α é inteiro sobre A, tem-se que

αn + an−1αn−1 + · · · + a0 = 0,

onde ai ∈ A, e 1 ≤ i ≤ n. Aplicando σi, obtemos

σi(α)n + an−1σi(α)n−1 + · · · + a0 = 0,

donde

αni + an−1α

n−1i + · · · + a0 = 0.

Portanto, αi é inteiro sobre A.

Corolário 4.1. Se A é um anel integralmente fechado, então os coefi-

cientes do polinômio característico de α, Tr(α) e N(α) são elementos

de A.

Demonstração: Tem-se que os coeficientes de χ(x), o polinômio ca-

racterístico de α, são elementos de K e são inteiros sobre A. Mas A

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112

Capítulo 4. NORMA, TRAÇO E

DISCRIMINANTE

é integralmente fechado, donde os coeficientes estão em A. Portanto,

Tr(α) e N(α) são elementos de A.

Observação 4.5. Seja α ∈ Q[√d] um inteiro algébrico sobre Z, com

d livre de quadrados e α um inteiro algébrico. Como Z é integramente

fechado, segue que pelo Corolário (4.1), Tr(α) e N(α) são números

inteiros. Por outro lado, se Tr(α) e N(α) são número inteiros, tem-se

que α é raiz do polinômio p(x) = x2 − Tr(α)x + N(α). E, assim, α é

um inteiro algébrico. Disto concluí-se que um elemento de um corpo

quadrático é inteiro algébrico se, e somente se, seu traço e sua norma

são números inteiros.

Exemplo 4.4. Sejam K = Q[√

−5] um corpo quadrático e µ um ele-

mento do anel de inteiros quadráticos, IK . Então µ é inversível se, e

somente se, |Nµ|= 1. De fato, se µ é inversível, então existe um ν ∈ Ik

tal que µν = 1, de onde vem que, 1 = N1 = Nµν = NµNν e como

Nµ e Nν são inteiros, concluímos que, Nµ = ±1, portanto |Nµ| = 1.

Reciprocamente se |Nµ| = 1, temos Nµ = µµ = ±1 ou µ(±µ) = 1,

logo µ é inversível.

Proposição 4.4. Sejam A um anel integralmente fechado, K seu corpo

de frações, L uma extensão finita de K de grau n e IL(A) o anel dos

inteiros de A em L. Sejam {α1, ..., αn} uma base de L sobre K, onde

det(Tr(αiαj)) 6= 0 e α ∈ L. Se Tr(αβ) = 0 para todo β ∈ L, então

α = 0.

Demonstração: Tem-se que α = a1α1 + a2α2 + · · · + anαn, com

ai ∈ K, para 1 ≤ i ≤ n, é suficiente mostrar que Tr(ααj) = 0, com

1 ≤ j ≤ n, então α = 0. Logo, para j = 1, ..., n,

0 = Tr(ααj) = a1Tr(α1αj) + a2Tr(α2αj) + · · · + anTr(αnαj).

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4.1. NORMA E TRAÇO 113

Matricialmente, tem-se

Tr(α1α1) Tr(α2α1) Tr(α3α1) Tr(αnα1)

Tr(α1α2) Tr(α2α2) Tr(α3α2) Tr(αnα2)...

.... . .

...

Tr(α1αn) Tr(α2αn) Tr(α3αn) Tr(αnαn)

a1

a2

...

an

=

0

0...

0

Mas, det(Tr(αiαj)) 6= 0, donde a1 = a2 = · · · = an = 0. Portanto,

α = 0.

Sejam L e K corpos, L uma extensão finita de grau n de K.

Considera-se a aplicação

Sα : L −→ Kβ 7−→ Tr(αβ),

segue que Sα é um K-homomorfismo. De fato, sejam β, γ ∈ L e λ ∈ K.

Então

Sα(β + γ) = Tr(α(β + γ))

= Tr(αβ + αγ))

= Tr(αβ) + Tr(αγ)

= Sα(β) + Sα(γ)

e

Sα(λβ) = Tr(αλβ)

= Tr(λαβ)

= λTr(αβ)

= λSα(β).

E, define-se

HomK(L : K) = {f : L −→ K : f é K-homomorfismo}.

Corolário 4.2. Sejam A um anel integralmente fechado, K seu corpo

de frações, L uma extensão finita de K de grau n e IL(A) o anel dos

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114

Capítulo 4. NORMA, TRAÇO E

DISCRIMINANTE

inteiros de A em L. Sejam {α1, ..., αn} uma base de L sobre K, onde

det(Tr(αiαj)) 6= 0 e αinL. Se Tr(α, β) = 0 para todo β ∈ L, então a

aplicação

ρ : L −→ HomK(L,K)

α 7−→ Sα,

com Sα(β) = Tr(αβ), é um isomorfismo

Demonstração: É fácil ver que ρ é um homomorfismo, visto que se

α1, α2 ∈ L e a ∈ K, então

ρ(α1 + α2)(β) = Sα1+α2(β)

= Tr((α1 + α2)β)

= Tr(α1β) + Tr(α2β)

= Sα1(β) + Sα2(β)

= ρ(α1)(β) + ρ(α2)(β)

e

ρ(aα1)(β) = Saα1(β)

= Tr(aα1β)

= aTr(α1β)

= aSα1(β)

= aρ(α)(β),

para todo β ∈ L. Então, seja α ∈ L tal que ρ(α) = 0. Assim,

ρ(α)(β) = Sα(β) = Tr(αβ) = 0, ∀β ∈ L,

donde ρ(α) = 0. Pela Proposição 4.4, α = 0, donde ρ é injetora. E, por

fim, ρ é sobrejetora, pois dimKL = dimK(HomK(L,K)). Portanto, ρ

é um isomorfismo.

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4.1. NORMA E TRAÇO 115

Teorema 4.1. Seja A um anel integralmente fechado, K seu corpo

de frações, L ⊃ K uma extensão finita de grau n e IL(A) o anel dos

inteiros de A em L. Então IL(A) é um A-submódulo de um A-módulo

livre.

Demonstração: Seja {α1, ..., αn} uma base de L sobre K. Então,

uma vez que toda extensão finita é algébrica, tem-se que αi é algébrico

sobre K, com 1 ≤ i ≤ n. Ou seja, existem ai ∈ A, com i = 0, 1, ..., n,

tais que

anαni + an−1α

n−1i + · · · + a0 = 0.

Supondo que an 6= 0 e multiplicando a equação acima por an−1n , então

0 = an−1n (anα

ni + an−1α

n−1i + · · · + a0)

= (anαi)n + an−1(anαi)n−1 + · · · + an−1n a0

e, assim anαi é inteiro sobre A. Seja, anαi = zi ∈ IL(A), com 1 ≤ i ≤ n.

É preciso mostrar que {z1, ..., zn} é um base de L sobre K. Sejam

b1, ..., bn ∈ A tais que b1z1 + b2z2 + · · · + bnzn = 0. Então,

b1anα1 + b2anα2 + · · · + bnanαn = 0.

Mas, {α1, ..., αn} -é uma base de L sobre K, donde bian = 0 e, assim,

bi = 0 para 1 ≤ i ≤ n. Logo, {z1, ..., zn} é linearmente independente e

como possui n elementos,sendo, assim, uma base de L sobre K. Pelo

Corolário 4.2, existe uma base dual {y1, ..., yn} tal que

ρ(zi)(yj) = Szi(yj) = Tr(ziyj) = δij , para i, j = 1, ..., n.

Por outro lado, se α ∈ IL(A) então αzi ∈ IL(A), para 1 ≤ i ≤ n, pelo

Corolário 4.1, TrL|K(αzi) ∈ A, para 1 ≤ i ≤ n. Mas α = c1y1 + · · · +

cnyn, com c1, ..., cn ∈ K, então Tr(αzi) = ci ∈ A, para 1 ≤ i ≤ n.

Portanto, IL(A) é um submódulo de um A-módulo livre gerado por

{z1, ..., zn}.

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116

Capítulo 4. NORMA, TRAÇO E

DISCRIMINANTE

Corolário 4.3. Seja A um anel integralmente fechado, K seu corpo

de frações, L ⊃ K uma extensão finita de grau n e IL(A) o anel dos

inteiros de A em L, se A é um domínio principal, então IL(A) é um

A-módulo livre de posto n.

Demonstração: Pelo Teorema ??, um submódulo de um A-módulo

livre é também livre e possui posto menor ou igual a n. Pelo Teorema

4.1, IL(A) possui uma base de n elementos de L sobre K. Portanto,

IL(A) tem posto n.

Corolário 4.4. Seja A um anel integralmente fechado, K seu corpo

de frações, L ⊃ K uma extensão finita de grau n e IL(A) o anel dos

inteiros de A em L, se A é um domínio principal e A ⊆ IL(A) é um

ideal, então A é um A-módulo livre de posto n.

Demonstração: Sejam {e1, ..., en} uma base de IL(A) e 0 6= α ∈ A.

Então, αe1, ..., αen ∈ A e são linearmente independentes sobre A, poi

se α1αe1 + · · · + α1αen = 0, onde α1, ...αn ∈ A, então α1α = 0, para

1 ≤ i ≤ n. Assim, como A é um domínio principal, αi = 0, com

1 ≤ i ≤ n.

Proposição 4.5. Sejam A um anel noetheriano e integralmente fe-

chado, K seu corpo de frações, L ⊇ K uma extensão finita de grau

n e IL(A) o fecho inteiro de A em L. Então IL(A) é um A-módulo

finitamente gerado e IL(A) é um anel noetheriano.

Demonstração: Pelo Teorema 4.1, IL(A) é submódulo de um A-

módulo livre de posto n. Pelo Corolário ??, IL(A) é um A-módulo no-

etheriano finitamente gerado. Mas, ideais de IL(A) são A- submódulos

de IL(A), donde satisfazem a condição de maximalidade da Definição

??. Portanto, IL(A) é anel noetheriano.

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4.2. DISCRIMINANTE 117

4.2 DISCRIMINANTE

Definição 4.3. Sejam A ⊆ B anéis tais que B é um A-módulo livre

de posto finito n. Dados (α1, ..., αn) ∈ Bn = B×B× ...×B (n vezes),

define-se seu discriminante por

DB/A(α1, ..., αn) = det(Tr(αiαj)).

Caso não haja ambiguidade, o discriminante de (α1, ..., αn) será

denotado apenas por D(α1, ..., αn).

Exemplo 4.5. Sejam o corpo quadrático Q[√d], com d livre de qua-

drados e {1,√d} uma base de Q[

√d] sobre Q. Então,

D(1,√d) =

Tr(1) Tr(√d)

tr(√d) Tr(

√d

2)

=

2 0

0 2d

= 4d.

Proposição 4.6. Sejam A ⊆ B anéis tais que B é um A-módulo livre

de posto finito n. Dados (α1, ..., αn) ∈ Bn. Se (β1, ..., βn) ∈ Bn tais que

βi =n∑

j=1

aijαj com aij ∈ A,

então

D(β1, ..., βn) = (det(aij))2D(α1, ..., αn).

Demonstração: Sejam βp, βq ∈ B tais que

βp =n∑

i=1

apiαi e βq =n∑

j=1

aqjαj ,

com api, aqi ∈ A. Então,

βpβq =n∑

i=1

apiαi

n∑

j=1

aqjαj =n∑

i,j=1

apiaqjαiαj .

Logo,

Tr(βpβq) = Tr

n∑

i,j=1

apiaqjαiαj

=n∑

i,j=1

apiaqjTr (αiαj) .

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118

Capítulo 4. NORMA, TRAÇO E

DISCRIMINANTE

Transcrevendo a equação acima na forma matricial, verifica-se que

(Tr(βpβq)) = (api)(Tr(αiαj))(aqj)t,

onde (aqj)t é a matriz transposta da matriz (aqj). Pela Definição (4.3),

D(β1, ..., βn) = det(Tr(βpβq))

= det((api)(Tr(αiαj))(aqj)t)

= det(api)det(Tr(αiαj)det(aqj)t

= det(aij)2D(α1, ..., αn).

Observação 4.6. Pela Proposição 4.6 conclui-se que o discriminante

de quaisquer bases de B sobre A são associados. Ou seja, a matriz (aij)

que expressa uma base em termos da outra, possui matriz inversa (bij),

com bij ∈ A. Assim, tanto det(aij) quanto det(bij) = det(aij)−1 são

inversíveis em A?.

Definição 4.4. Sejam A ⊆ B anéis tais que B é um A-módulo livre de

posto finito n. O discriminante de B sobre A é um ideal em A, definido

da forma

DB/A = 〈D(α1, ..., αn)〉,

onde {α1, ..., αn} é uma base de B sobre A.

Observação 4.7. É possível mostrar que, dados um corpo K, L uma

extensão finita de K de grau n e σ1, . . . , σn os n K-isomorfismos dis-

tintos de L em um corpo algebricamente fechado F contendo K, se

{α1, . . . , αn} é uma base de L sobre K, então

D(α1, . . . , αn) = det(σi(αj))2 6= 0.

Esta proposição encontra-se demonstrada em Samuel (2002).

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119

5 ANÉIS DE DEDEKIND

Em um anel, a fatoração de seus elementos geralmente não é

única. Para observar este fato, basta considerar Z[√

−5], encontramos

as seguintes fatorações para o número 9:

9 = 3 · 3

9 = (2 +√

−5)(2 −√

−5).

Os fatores 3, 2 +√

−5 e 2 −√

−5 são irredutíveis em Z[√

−5]. De

fato, ambos têm norma 9. Se 2 −√

−5 fosse redutível, ou seja, existem

α, β ∈ Z[√

−5] tais que 2 −√

−5 = αβ, e então, teríamos N(αβ) =

N(α)N(β) = 9. Pela Observação (4.5) e o Exemplo (4.4), segueN(α) =

{3,−3}. Porém, isso não é possível, pois N(a + b√

−5) = a2 + 5b2 ∈{3,−3}, quaisquer que sejam a, b ∈ Z. Para provar que 3 e 2 +

√−5 é

análogo. Desta forma, o número 9 foi escrito como produto de fatores

irredutíveis de duas formas diferentes e assim Z[√

−5] não é fatorial.

Como já foi visto, a fatoração única dos elementos é válida

apenas anéis fatoriais. Neste capitulo será a estudada a fatoração dos

ideais não nulos, definindo uma estrutura chamada anel de Dedekind,

em que todo ideal não nulo possui uma fatoração única em potências

de ideais primos.

Definição 5.1. Seja A um anel. Então um ideal P de A é primo se

(i) P 6= A e

(ii) se a, b ∈ A e ab ∈ P então, a ∈ P ou b ∈ P .

Exemplo 5.1. Seja A um anel. O ideal nulo de A é um ideal primo de

A.

Lema 5.1. Seja p um elemento primo de um anel de integridade A.

Então, 〈p〉 é um ideal primo próprio de A,

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120 Capítulo 5. ANÉIS DE DEDEKIND

Demonstração: Como p é elemento primo e, assim, não inversível,

tem-se que 〈p〉 é um ideal próprio. Se x, y ∈ 〈p〉 então, existe um ele-

mento t ∈ A tal que xy = pt. Daí, p | xy. Como p é elemento primo,

então p | x ou p | y. Se p | x então, x = ps, para algum s ∈ A, e x ∈ 〈p〉.Se p | y é análogo.

Observação 5.1. Há uma proposição segundo Domingues e Iezzi (2013,

pg. 266) que afirma que, dados A um anel comutativo com unidade e

I um ideal em A, tem-se que

• I é um ideal primo se, e somente se,A

Ié anel de integridade

• A

Ié corpo se, e somente se, I é ideal maximal.

Proposição 5.1. Todo ideal maximal de um anel A é um ideal primo

de A.

Demonstração: Da Observação (5.1) tem-se que, dado I um

ideal maximal de A, entãoA

Ié corpo, em particular,

A

Ié anel de

integridade, e assim, I é um ideal primo de A.

A recíproca nem sempre é verdadeira, por exemplo, sejam A =

Z12 = {0, 1, · · · , 11} e o ideal maximal I = {0, 6}. Nota-se que 2 · 3 =

6 ∈ I, mas 2 /∈ I e 3 /∈ I. Portanto I não é um ideal primo de Z12.

Lema 5.2. Sejam A um anel e P um ideal de A. O ideal P é primo se,

e somente se, contiver um produto de ideais J1, ..., Jn de A, implicar

que P contém pelo menos um dos ideais Ji.

Demonstração: Supõe-se que Jj * P , para todo j = 1, ..., n. En-

tão, para cada j existe αj ∈ Jj , com αj /∈ P . Dado que P é primo,

α1 · · ·αn /∈ P . Por outro lado, α1 · · ·αn ∈ J1 · · ·Jn ⊂ P , o que é uma

contradição. Portanto, P contém Jj , para algum 1 ≤ j ≤ n.

Reciprocamente, seja a, b ∈ A tais que ab ∈ P . Então 〈a〉〈b〉 = 〈ab〉 ⊆ P .

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121

Logo 〈a〉 ⊆ P ou 〈b〉 ⊆ P , donde a ∈ P ou b ∈ P . Assim, a ∈ P ou

b ∈ P . Portanto, P é ideal primo.

Proposição 5.2. Se A ⊆ B são anéis e P ⊆ B é um ideal primo,

então P ∩A é um ideal primo de A.

Demonstração: Seja a aplicação ρ = π ◦ i de A emB

P, onde i : A −→

B é a inclusão (i(x) = x) e π : B −→ B

Pa projeção (π(x) = x̄ = x+P ).

A aplicação ρ desta forma definida é um homomorfismo, pois π e i são

homomorfismos. Tem-se que

Ker(ρ) = {x ∈ A : p(x) = 0̄ = P}.

Assim,

x ∈ Ker(ρ) ⇔ ρ(x) = 0̄

⇔ π ◦ i(x) = 0̄

⇔ π(x) = 0̄

⇔ x̄ = 0̄

⇔ x+ P = P

⇔ x ∈ P.

Portanto, Ker(ρ) = A∩P . Pelo Teorema dos Isomorfismos, tem-se queA

A ∩ P≃ Im(ρ) ⊂ B

P. Como

B

Pé um domínio de integridade, então

A

P ∩Aé também um domínio. Portanto, P ∩A é um ideal primo de A.

Definição 5.2. Um anel A um domínio de integridade é dito anel de

Dedekind se satisfaz as seguintes condições

1. A é integralmente fechado;

2. A é noetheriano;

3. Todo ideal primo não nulo de A é maximal.

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122 Capítulo 5. ANÉIS DE DEDEKIND

Proposição 5.3. Em um anel de Dedekind A todo ideal contém um

produto de ideais primos.

Demonstração: Sejam A um anel de Dedekind então, por definição,A

é um anel noetheriano. Considera-se F o conjuntos dos ideais de A que

não contém um produto de ideais primos. Supondo que F 6= ∅. Dado

que A é noetheriano, então F tem um elemento maximal M . Tem-se que

M não é um ideal maximal pois, caso contrário, M seria ideal primo,

logo M /∈ F. Desta forma, existem x, y ∈ A−M tal que xy ∈ M . Visto

que M ( 〈x〉 +M e M ( 〈y〉 +M , assim 〈x〉 +M, 〈y〉 +M /∈ F Assim,

P1P2...Pn ⊆ 〈x〉 +M e Q1Q2...Qn ⊆ 〈y〉 +M,

onde Pi, Qj são ideais primos de A, e

(P1P2...Pn)(Q1Q2...Qn) ⊆ (〈x〉 +M)(〈y〉 +M) ⊆ M,

o que é uma contradição. Portanto, F = ∅.

Da Proposição 5.3 conclui-se facilmente que num anel de De-

dekind, todo ideal não nulo contém um produto de ideais primos não

nulos.

Teorema 5.1. Sejam A um anel de Dedekind, K seu corpo de frações,

L uma extensão finita de K de grau n e IL(A) o anel dos inteiros de

L sobre A. Então IL(A) é um anel de Dedekind.

Demonstração: Pelo Exemplo (??) e pela Proposição (4.5), IL(A)

é integralmente fechado e noetheriano, respectivamente. Resta mostrar

que todo ideal primo não nulo de IL(A) é maximal. Seja P ⊂ IL(A) um

ideal primo não nulo. Como A ⊂ IL(A), pela Proposição (5.2), tem-se

que P ∩A é um ideal primo de A. Primeiro, é preciso provar que P ∩Aé não nulo. Seja α ∈ P com α 6= 0, então α ∈ IL(A) . Assim, existem

a1, ..., an ∈ A, não todos nulos, tais que,

αn + an−1αn−1 + · · · + a0 = 0

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123

e que n seja o menor expoente possível. Logo, a0 6= 0. Caso contrário,

a equação seria de grau menor do que n. Assim,

a0 = α(−αn−1 − an−1αn−2 − · · · − a1) ∈ αIL(A) ∩A ⊂ P ∩A.

Logo, P ∩A 6= {0}. Uma vez que P ∩A é ideal primo de A e A é anel de

Dedekind, então P ∩A é um ideal maximal de A e, portanto,A

P ∩Aé

corpo. Agora, considera-se a aplicação ρ = π ◦ i tal que i : A −→ IL(A)

é a inclusão e π : IL(A) −→ IL(A)P

a projeção. Então, pelo Teorema

dos Isomorfismos,A

P ∩A≃ Im(ρ) ⊂ IL(A)

P

Mas IL(A) é inteiro sobre A, entãoIL(A)P

é inteiro sobreA

P ∩Ae, pela

Proposição (3.2),IL(A)P

é um corpo. Portanto, p é ideal maximal.

Definição 5.3. Sejam A um domínio de integridade e K seu corpo

de frações. Um ideal fracionário de A é um conjunto F ⊆ K que

satisfaz as seguintes propriedades:

(i) se x, y ∈ F , então x+ y ∈ F ;

(ii) se x ∈ F e a ∈ A, então ax ∈ F ;

(iii) existe d ∈ A− {0} tal que dF ⊂ A.

Isto é, um ideal fracionário F é um A-submódulo de K, tal que existe

d ∈ A− {0} e dF ⊂ A.

Observação 5.2. Os ideais usuais de A são ideais fracionários, considerando-

se d = 1.

Exemplo 5.2. Os ideais fracionários de Z são da forma rZ, onde r ∈ Q.

Definição 5.4. Sejam A um domínio, K seu corpo de frações, e Q,R ⊆A são ideais fracionários. Diz-se que Q divide R se existe um ideal

inteiro H de A tal que R = QH.

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124 Capítulo 5. ANÉIS DE DEDEKIND

Proposição 5.4. Se A é um anel de Dedekind, então todo ideal fraci-

onário de A é um A-módulo finitamente gerado.

Demonstração: Seja F um ideal fracionário de A. Então, existe d ∈A−{0} tal que dF ⊆ A. Se x ∈ dF , então existe t ∈ F tal que x = dt e,

assim, t = d−1x ∈ d−1A e, portanto, F ⊆ d−1A. Considere a aplicação

ρ : A −→ d−1A

x 7−→ d−1x.

A aplicação ρ é um isomorfismo, pois para quaisquer x, y ∈ A, têm-se

que

ρ(x+ y) = d−1(x + y) = d−1x+ d−1y = ρ(x) + ρ(y) e

ρ(xy) = d−1xy = xd−1y = xρ(y),

uma vez que, pelo Exemplo (2.14), d−1A é A-submódulo, e para todo

elemento y ∈ d−1A existe um x ∈ A tal que y = d−1x. Então, A é

isomorfo a d−1A. Como A é anel de Dedekind e, assim, noetheriano,

então d−1A é noetheriano, donde d−1A é finitamente gerado. Portanto,

I ⊆ d−1A é um A-módulo finitamente gerado.

Lema 5.3. Sejam A um anel de Dedekind que não é corpo, K seu

corpo de frações e J um ideal maximal de A. Então o conjunto

N = {x ∈ K : xJ ⊂ A}

é um ideal fracionário de A.

Demonstração: Primeiramente, como A não é corpo, então J 6= {0},

ou seja, existe d ∈ J , com d 6= 0. Agora, sejam y, z ∈ N = {x ∈ K :

xJ ⊂ A} e a ∈ A, então, ys, zt ∈ A, para todo s, t ∈ J . Desse modo, se

r ∈ J , tem-se que

• (y + z)r = yr + zr ∈ A, donde y + z ∈ N ;

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125

• (ay)r = y(ar) ∈ A, pois J é ideal e, assim, ar ∈ J . Logo, ay ∈ N

e

• se x ∈ A, então xJ = J ⊂ A e, assim, A ⊂ N . Pela definição de

N , tem-se que dN ⊆ A, para todo d ∈ J ⊆ A.

Portanto, N é um ideal fracionário de A.

Proposição 5.5. Sejam A um anel de Dedekind que não é corpo e K

seu corpo de frações. Então, todo ideal maximal M de A é inversível.

Demonstração: Considere o ideal fracionário N = {x ∈ K : xM ⊂A}. Deseja-se mostrar que NM = A. A inclusão NM ⊂ A já tem-se,

pela própria definição de N . Por outro lado, A ⊂ N , pois M é ideal de

A. Logo, M = MA ⊂ MN ⊂ A. Mas, M é maximal, então M = NM

ou NM = A. Supondo, primeiramente que M = NM e considerando

α ∈ N , tem-se que αM ⊂ M , α2M ⊂ αM ⊂ M , donde αnM ⊂ M ,

para todo n ∈ N. Assim, seja d ∈ M , com d 6= 0, então dαn ∈ αM ⊆ A,

para todo n ∈ N. Logo, A[α] ={

aiαi : ai ∈ A

}

é ideal fracionário

de A. Então, como A é noetheriano, segue pela Proposição (5.4) que

A[α] é um A-módulo finitamente gerado. Pelo Teorema (3.1), α é inteiro

sobre A. Como A é integralmente fechado, α ∈ A. Logo, N ⊂ A e como

A ⊂ N , então N = A. Agora, seja a ∈ M . Pela Proposição (5.3),

〈a〉 = 〈a〉 ⊃ P1P2...Pn,

onde os P1, ..., Pn são ideais primos não nulos de A, e n é o menor valor

possível. Assim, M ⊃ 〈a〉 ⊃ P1P2...Pn. Pelo Lema (5.2), M contém um

dos Pi, para algum 1 ≤ i ≤ n. Sem perda de generalidade, afirma-se que

i = 1, ou seja, M ⊃ P1. Uma vez que A é anel de Dedekind, M = P1,

pois P1 é ideal maximal. Então, considerando agora P = P2...Pn, tem-

se que 〈a〉 ⊃ MP , onde P não está contido em 〈a〉, pela minimalidade

de n. Logo, existe b ∈ P e b /∈ 〈a〉 tal que Mb ⊂ 〈a〉. Assim,b

aM ⊆ A,

de forma queb

a∈ N . Uma vez que b /∈ 〈a〉 tem-se que

b

a/∈ A, ou seja,

N 6= A. Portanto, MN = A.

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126 Capítulo 5. ANÉIS DE DEDEKIND

Conclui-se que todo ideal M maximal de A de um anel de

Dedekind é inversível e seu inverso é o ideal fracionário M−1 = {x ∈K : xM ⊂ A}. Isto é, MM−1 = A.

Lema 5.4. Sejam A um anel de Dedekind, K seu corpo de frações e

L uma extensão de K. Sejam Q,R ideais maximais de IL(A). Então

R ⊆ Q se, e somente se, Q divide R.

Demonstração: Se Q divide R, então existe um ideal H ⊆ IL(A) tal

que R = QH ⊆ Q. Seja x ∈ R = QH daí, existem q ∈ Q e h ∈ H , tais

que x = qh ∈ Q. Como Q é um ideal, segue que x ∈ Q e R ⊂ Q.

Reciprocamente, se R ⊆ Q, então RQ−1 ⊆ QQ−1 = A. Assim, RQ−1

é ideal inteiro tal que (RQ−1)Q = R. Portanto, Q divide R.

Teorema 5.2. Sejam A um anel de Dedekind. Então todo ideal I não

nulo de A é um produto de ideais primos de A, ou seja,

I =n∏

i=1

P ei

i ,

onde P1, ..., Pn são ideais primos de A e e1, ..., en são inteiros positivos.

Demonstração: Seja F a família dos ideais de A, não nulos, e que não

resultam dum produto de ideais primos de A. Supondo que F 6= ∅. Por

A ser noetheriano, F possui elemento maximal M , com M 6= A, pois A

é o produto da coleção vazia de ideais primos. Logo, M ⊆ P , com P

é ideal maximal de A. Pelo Lema (5.3), T = {x ∈ K : xP ⊂ A} é tal

que PT = A. Dado que M ⊆ P , então MT ⊆ PT = A. Por outro lado,

M = MA ⊂ MT ⊂ A, pois A ⊂ T . Assim M ( MT , uma vez que se

M = MA e se α ∈ T , tem-se que αM ⊂ M , α2M ⊂ αM ⊂ M e, assim,

αnM ⊂ M , para todo n ∈ N . Logo, se d ∈ M − {0}, então dαn ∈ M ⊆A. Assim, A[α] é ideal fracionário de A. A é noetheriano, então, pela

Proposição (5.4), A[α] é A-módulo finitamente gerado. Pelo Teorema

(3.1), tem-se que α é inteiro sobre A, que é integralmente fechado,

donde α ∈ A. Assim, T ⊂ A e T = A. Mas isso é uma contradição,

porque se T = A, então P = PA = PT = A, e P é um ideal primo.

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127

Pela maximalidade de M e pela relação M ⊆ MT , MT /∈ T, ou seja,

MT = P1...Pn, onde P1, ..., Pn são ideais primos de A. Multiplicando

por P em ambos os lados da equação, tem-se que M = P1...PnP , e isto

é uma contradição, visto que M ∈ F. Portanto, F = ∅.

Proposição 5.6. Seja I um ideal não nulo de A, então I é expresso

como o produto de ideais primos não nulos de forma única.

Demonstração: Seja I um ideal não nulo de IK(A). Suponha-se que

existam P1, . . . , Pm, Q1, . . . , Qn ideais primos de IK(A) tais que

P1 · · ·Pm = Q1 · · ·Qn. (5.1)

A demonstração será por indução finita sobre o número natural não

nulo m. É importante lembrar que em u anel de Dedekind um ideal

não nulo J é primo se, e somente se, é maximal.

Para m = 1 tem-se

P1 = Q1 · · ·Qn.

Então, pelo Lema(5.1), para algum i, Qi ⊂ P1. Como Qi é maximal,

segue que P1 = Qj , para algum 1 ≤ j ≤ n. Pode-se supor, sem perda de

generalidade, que j = 1. Então, Q1 = Q1 · · ·Qn, portanto, n = 1 = m.

Agora, considera-se como hipótese de indução que para algum m > 1

tem-se

P1, · · ·Pm−1 = Q1 · · ·Qm−1

e Pi = Qi, para 1 ≤ i ≤ m − 1. Da equação (5.1), resulta que

P1, . . . , Pm · · ·Q1, logo, de acordo com o Lema (5.1), Pi ⊆ Qi, pois

Pi é maximal. Sem perda de generalidade, suponha que i = 1 e, então

P1 · · ·Pm = P1Q2 · · ·Qn

P−11 P1 · · ·Pm = P−1

1 Q1 · · ·Qn

P2 · · ·Pm = Q2 · · ·Qn.

Portanto, pela hipótese de indução, tem-se n−1 = m−1 e Pi = Qi, para

1 ≤ i ≤ n. Em resumo, tem-se que m− n e Pi = Qi, para 1 ≤ i ≤ n.

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128 Capítulo 5. ANÉIS DE DEDEKIND

Corolário 5.1. Sejam A um anel de Dedekind, então todo ideal fraci-

onário F não nulo de A é um produto de ideais primos de A, de modo

único.

Demonstração: Seja F um ideal fracionário de A, então existe d ∈A − {0} tal que dF ⊆ A. Tem-se que F = (dF )(d−1A) é produto de

ideais de A, então pelo Teorema (5.2) F é, de forma única, o produto

de ideais primos de A.

Teorema 5.3. Seja A um anel de Dedekind. Então, A é fatorial se, e

somente se, A é principal

Demonstração: Na proposição (2.7) provou-se que todo anel prin-

cipal é fatorial. Agora, Considera-se que A é um anel fatorial. Sejam

P um ideal primo de A e α ∈ A, com α 6= 0 então, existem elementos

irredutíveis p1,≤, pn ∈ A tais que α = p1 · · · pn. Como P é ideal primo,

então

p1 · · · pn ∈ P,

segue que pi ∈ P , para algum i. Além disso, 〈pi〉 ⊆ P . Como pi é

irredutível e, portanto, primo, tem-se pelo Lema (5.1) que 〈pi〉 é um

ideal maximal, e assim, 〈pi〉 = r, ou seja, P é um ideal principal. Se

J é um ideal próprio de IK(A), pelo Teorema (5.6), existem ideais

primos P1, . . . , Pm tais que I = P1, · · · , Pm. Como cada Pi é principal,

conclui-se que I é também principal.

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129

CONCLUSÃO

Ao cursar uma graduação, é iniciada a aprendizagem em uma

área de estudo. Essa iniciação, contudo, dá apenas uma noção geral

das muitas ramificações da área de conhecimento. Muitos dos gradua-

dos, ao formarem-se, engajam-se em uma carreira, uma profissão para

por em prática sua formação. Outros, porém, preferem aprofundar seus

conhecimentos em um dos ramos da área escolhida para cursar. A Ma-

temática, possui vários ramos em que se pode especializar-se, sendo a

Álgebra um deles.

Assim, a fim de aprofundar os conhecimentos em Álgebra realizou-

se esse trabalho. Durante a concretização deste, foi possível entender

como se dá a construção de algumas das estruturas algébricas conhe-

cidas hoje. O conhecimento histórico, inclusive, de como se deu esta

construção é bastante relevante, uma vez que tal entendimento possibi-

lita novos questionamentos, e por consequência, a construção de mais

estruturas.

A partir da problemática que surgiu na história da Matemá-

tica, buscou-se as respostas, mas estas necessitavam de pré-requisitos.

Assim, apresentam-se os conceitos preliminares. Porém, apesar desses

terem surgido inicialmente com o objetivo de entender os conceitos mais

elaborados que deles necessitam, foi um capítulo de complexa estrutu-

ração. Nem todas as propriedades dos conceitos vistos no Capitulo 2

foram exploradas, pois estas são muitas, mas o breve vislumbre das es-

truturas encontradas no referido capítulo, mostra como pode-se de uma

estrutura, ir para casos particulares, como acontece em anéis fatoriais.

Ou ainda, como é possível expandir um anel qualquer a uma estrutura

de polinômios.

Da mesma forma que acontece com os anéis de polinômios,

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130 Conclusão

outras estruturas como módulo, extensões algébricas, anel de inteiros,

corpos quadráticos e muitas outras que não foram exploradas neste

trabalho, utilizam de estruturas mais simples para sua construção. São

características que fazem da Álgebra um campo de estudos ainda mais

interessante, pois suas possibilidades são inúmeras.

Assim concluí-se, como dito anteriormente, que a graduação

dá apenas uma base para sua área de estudo e, portanto, conhecer

Álgebra em sua amplitude atual requer o conhecimento de conceitos

além dos estudados durante a graduação e além dos expostos aqui.

Sendo a Álgebra uma área que, ao que tudo indica, tende sempre a

crescer, a ter mais a se saber, novas estruturas a se construir, o estudo

realizado abre portas para um aprofundamento futuro, como norma

de ideais, anel de frações, corpos ciclotômicos, ramificações de ideais,

reticulados, e muitos outros.

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131

REFERÊNCIAS

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2003. GONÇALVES, Adilson. Introdução à álgebra. Rio de Janeiro:

Instituto de Matematica Pura e Aplicada, 1999.

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(Mestrado) - UNESP, São José do Rio Preto, 2006.

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Módulos Projetivos e Injetivos. 2007. Monografia (Graduação) - UFSC,

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2006.

SAMUEL, Pierre. Algebraic Theory of Numbers. 1a. ed. Paris: Do-

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132 Conclusão

ver Publications, 1967.

STEWART, Ian; Tall, David. Algebraic Number Theory and Fer-

mat’s Last Theorem. 3a. ed. Massachussets: A K Peters, 2002.