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ENGENHARIA DO PRODUTO: UM ESTUDO
SOBRE O CICLO DE VIDA DOS PRODUTOS
SHEILA APARECIDA GONCALVES (UNA )
Roberto Nilton Machado de Oliveira (UNA )
LARISSA FRANCO SILVA (UNA )
Com as pressões ambientais e leis regulando o descarte de resíduos sólidos, o
acompanhamento e registro do ciclo de vida dos produtos assume um papel
importante na sustentabilidade da empresa. É nesse cenário, que surge a
denominada Análise do Ciclo de Vida dos Produtos, na qual consiste em
balanços materiais e energéticos, desde a extração da matéria-prima até a
destinação final. Assim, nesse artigo será descrito um pouco da ACV -
Avaliação do Ciclo de Vida do Produto considerada uma técnica relacionada
à engenharia de produto ao se aplicar ao desenvolvimento de novos produtos
bem como na melhoria de produtos já existentes e à gestão ambiental ao se
relacionar a melhoria das condições ambientais e ao desenvolvimento
sustentável.
Palavras-chaves: Avaliação do Ciclo de Vida do Produto, Sustentabilidade,
Meio ambiente.
XXXIV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
Engenharia de Produção, Infraestrutura e Desenvolvimento Sustentável: a Agenda Brasil+10
Curitiba, PR, Brasil, 07 a 10 de outubro de 2014.
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1. Introdução
No mercado globalizado a inovação e a sustentabilidade são consideradas tendências iminentes para a
competividade das empresas. Os indícios sociais, econômicos e ambientais mostram que as atuais
abordagens utilizadas não atendem aos requisitos estabelecidos para o futuro. Para isso é necessária a
adoção de uma abordagem para gerenciar todo o ciclo de vida de um produto, de modo a acompanhar
os novos produtos desde a geração da ideia até retirada do mercado e destino final. (ROZENFELD,
2004)
Além disso, com as pressões ambientais e leis regulando o descarte de resíduos sólidos, o
acompanhamento e registro do ciclo de vida dos produtos assume um papel importante na
sustentabilidade da empresa. Cada vez mais, conhecer e gerenciar todo o ciclo de vida dos produtos
representa ganhos ambientais e econômicos e consequentemente representa melhoria da
competitividade.
Esta abordagem é denominada Análise do Ciclo de Vida dos Produtos consiste em balanços materiais
e energéticos, desde a extração da matéria-prima até a destinação final, com o intuito de se conhecer
melhor o produto e sua influência sobre o meio ambiente. A análise do ciclo de vida de um produto é
considerada um dos passos da busca do desenvolvimento sustentável nas empresas.
Neste sentido, este artigo tem como objetivo descrever um pouco da ACV – Avaliação do Ciclo de
Vida do Produto considerada uma técnica relacionada à engenharia de produto ao se aplicar ao
desenvolvimento de novos produtos bem como na melhoria de produtos já existentes e à gestão
ambiental ao se relacionar a melhoria das condições ambientais e ao desenvolvimento sustentável.
2. Fundamentação Teórica
2.1 Ciclo de Vida – Definição
O termo “ciclo de vida” refere-se à maioria das atividades no decurso da vida do produto desde a sua
fabricação, utilização, manutenção, e deposição final; incluindo aquisição de matéria-prima necessária
para a fabricação do produto até a disposição final do produto quando se encerra a sua vida útil.
(FERREIRA, 2004).
A Figura 1 exemplifica um ciclo de vida genérico de um produto, onde é possível notar que o ciclo
começa com a exploração do meio ambiente como fonte de matérias-primas, energia, água e uso do
solo, e termina com o uso do meio ambiente para a disposição final de resíduos não reaproveitados.
(Barbieri et al 2009).
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Figura 1 – Ciclo de Vida dos Produtos Fonte: Blog Sustentabilismo, 2013.
Assim, o ciclo de vida de um bem ou serviço contempla a totalidade da sua cadeia produtiva, que é um
conjunto de etapas consecutivas pelas quais passam e vão sendo transformados os diversos insumos,
sendo considerado que em cada etapa do ciclo novos recursos são utilizados e novos resíduos são
produzidos.
Para reduzir a necessidade de recursos naturais cada uma das etapas e os lançamentos dos resíduos não
aproveitados é necessário conhecer os impactos ambientais específicos de cada etapa da cadeia
produtiva. Desta forma, a visão do ciclo de vida permite atuar com mais eficácia tanto sobre os
problemas ambientais dos produtos e serviços quanto sobre a concepção e implementação de
inovações de produtos e processos, com vistas a reduzir os resíduos antes de gerados, e, assim, facilitar
a recuperação de materiais pós-consumo. (Barbieri et al 2009).
2.1.1 Análise do Ciclo de Vida – ACV
Segundo FERREIRA (2004) a Análise do Ciclo de Vida do Produto - ACV consiste em analisar de
forma sistemática os impactos ambientais dos produtos em todas as fases do seu ciclo de vida. A ACV
estuda a complexa interação entre um produto e o ambiente, utilizando para tanto a avaliação dos
aspectos ambientais e dos impactos potenciais associados ao ciclo de vida do produto (VALT, 2004).
A ACV deve ser vista como instrumento de gestão ambiental que permite às organizações
compreender as incidências ambientais dos materiais, dos processos e dos produtos, podendo a
informação obtida conduzir ao desenvolvimento de novos produtos e à detecção de áreas de
investigação e desenvolvimento. Esta abordagem permite às empresas determinar como melhorar os
seus produtos, desenvolver outros e formar estratégias comerciais específicas e desenvolver melhorias
nos aspectos ambientais diminuindo o consumo de recursos naturais e geração de resíduos
(FERREIRA, 2004).
A ACV também fornece motivação para o atendimento da legislação ambiental, atendendo às
exigências de contínuo aprimoramento nos sistemas de gestão ambiental que demandam as séries da
International Organization for Standardization (ISO), British Standard (BS) e European Eco-
Management & Audit Scheme (EMAS), além de ser útil como ferramenta de marketing para a obtenção
de declarações e rótulos ambientais.
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2.2 Histórico
Segundo FERREIRA (2004) o primeiro estudo que se tem referência foi conduzido pelo "Midwest
Research Institute" (MRI) para a Companhia Coca Cola em 1969, que realizou uma comparação com
os diferentes tipos de embalagens de refrigerante e para selecionar qual delas se apresentava a mais
adequada do ponto de vista ambiental e de melhor desempenho com relação à preservação dos
recursos naturais. Este estudo buscou quantificar as necessidades de recursos, emissões e resíduos
originados por diferentes embalagens de bebidas e ficou passou a ser conhecido como “Resource and
Environmental Profile Analysis” – REPA. (SANTIAGO, 2005).
No final do ano de 1972 o mesmo instituto MRI iniciou um estudo nas embalagens de cervejas e
sumos, encomendado pela "U.S. Environmental Protection Agency" (USEPA), que objetivou examinar
as implicações ambientais da utilização da embalagem de vidro reutilizável em vez de latas e garrafas
não reutilizáveis, este estudo marcou o início do desenvolvimento da “Avaliação do Ciclo de Vida do
Produto – ACV”. De acordo com FERREIRA (2004) após este se assumiu que uma garrafa
reutilizável seria claramente superior.
Em 1984 Laboratório Federal Suiço para Teste e Investigação de Materiais (EMPA) publicou um
importante relatório com base no estudo "Balanço Ecológico de Materiais de Embalagem" iniciado
pelo governo, que tinha como objetivo estabelecer uma base de dados para os materiais de embalagem
mais importantes: alumínio, vidro, plásticos, papel e cartão, chapas de lata. O estudo também
introduziu um método para normalizar e agregar emissões para o ar e para a água utilizando as normas
(legislação) para aquelas emissões e agregando-as, respectivamente nos chamados "volume crítico de
ar" e "volume crítico de água". (FERREIRA, 2004).
A partir de 1990 houve um notável crescimento das atividades ACV na Europa e nos EUA, o qual é
refletido no número de "workshops" e outros "fóruns" organizados principalmente pela "Society of
Environmental Toxicology and Chemistry" - SETAC. (FERREIRA, 2004).
Em 1992 a SETAC iniciou os primeiros trabalhos de sistematização e padronização dos termos e
critérios da ACV. Em 1993, a International Organization for Standardization (ISO) criou o Comitê
Técnico TC 207 tendo em vista a normalização de um número de abordagens de gestão ambiental e
suas ferramentas, incluindo ACV. Este Comitê foi o responsável pela série ISO 14000, que inclui as
normas de Avaliação de Ciclo de Vida. (SANTIAGO, 2005).
2.3 Normatização da ACV – ISO 14000
O surgimento da série 14000 estabeleceu-se a padronização de processos produtivos que utilizassem
recursos extraídos do meio ambiente ou que proporcionassem algum dano ambiental. O propósito
dessas normas é fornecer às empresas ferramentas para a tomada de decisão bem como a avaliação de
alternativas sobre métodos de manufatura. Também podem ser usadas para dar apoio às declarações de
rótulos ambientais ou para selecionar indicadores ambientais (NIGRI, 2012). A seguir são citadas
normas ISO relacionadas à ACV:
ISO 14040 – Environmental management – Life cycle assessment –Principles and framework
(ISO, 1997);
ISO 14041 – Environmental management – Life cycle assessment – Goal and scope definition
and inventory analysis (ISO, 1998);
ISO 14042 – Environmental management – Life cycle assessment – Life cycle impact
assessment
(ISO, 2000);
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ISO 14043 – Environmental management – Life cycle assessment – Life cycle interpretation
(ISO, 2000).
Ainda, segundo NIGRI (2012) a ISO também fornece relatórios definindo formatos de documentação
especificações técnicas e exemplos de aplicações, são eles:
ISO/TR 14047 – Environmental management - Life cycle impact assessment – Examples of
application of ISO 14042 - (ISO, 2003);
ISO/TS 14048 – Environmental management - Life cycle assessment – Data documentation
format (ISO, 2002);
ISO/TR 14049 – Environmental management - Life cycle assessment – Examples of
application of ISO14041 to goal and scope definition and inventory analysis (ISO, 2000).
2.3 Aplicações no Brasil
No Brasil os trabalhos sobre ACV são recentes, e segundo NIGRI (2012) tiveram início com a criação
do Grupo de Apoio à Normalização (GANA) junto à Associação Brasileira de Normas Técnicas
(ABNT), tendo como resultado o lançamento do primeiro livro relacionado ao tema, em 1998:
“Análise de ciclo de vida de produtos: ferramenta gerencial da ISO 14000”, de José Ribamar Chehebe,
que explica e comenta as normas da série ISO relativas à ACV. Pouco tempo depois do GANA foi
substituído pelo Comitê Brasileiro de Gestão Ambiental (CB-38) da ABNT.
Ainda, de acordo com o autor somente 2001 empresas e instituições brasileiras tiveram interesse pela
ACV para avaliação dos processos produtivos com ênfase ambiental, com o lançamento da primeira
norma ISO da série 14040 (NORMAS BRASILEIRAS - NBR ISO 14040, Ano 2001) traduzida pela
ABNT.
A partir daí, em 2002 partindo da necessidade de divulgação e do desenvolvimento e do uso da
ferramenta ACV no Brasil e também para a criação de um inventário nacional, foi criada a Associação
Brasileira do Ciclo Vida (ABCV). Segundo o site a ABCV é uma sociedade civil, de âmbito nacional
e sem fins lucrativos que tem por finalidade viabilizar a difusão e a consolidação da Gestão do Ciclo
de Vida junto às empresas e instituições acadêmicas de ensino e pesquisa, órgãos governamentais e
sociedade organizada.
Em 2004 a ABNT lançou as normas traduzidas NBR ISO 14041 e NBR ISSO 14042 e foi definida a
criação do projeto brasileiro de ACV, o qual está centrado em dois programas: formação de
competências em ACV e construção do banco de dados brasileiro para auxílio a estudos de ACV
realizados no e para o país.
A norma NBR ISO 14043 foi publicada em 2005 pela ABNT e a Associação Brasileira das
Instituições de Pesquisa Tecnológica (ABIPTI) publicou o livro “Avaliação do ciclo de vida: a ISO
14040 na América Latina”, que traz informações e abordagens metodológicas de ACV inseridas no
contexto de países latinos (RIBEIRO, 2009 apud VALT, 2004).
2.4 Fases da Análise do Ciclo de Vida de Produto - ACV
A ACV é uma metodologia que permite avaliar os aspectos ambientais e os impactos potenciais
existentes durante todo o ciclo de vida de um produto ou de um serviço, desde a sua fabricação,
utilização, manutenção e disposição final. A avaliação dá-se por meio do levantamento e da
compilação de entradas e saídas significativas de um sistema, da avaliação dos impactos potenciais
associados a essas entradas e saídas e de interpretação dos resultados das fases de levantamento e
avaliação, em relação aos objetivos traçados em um estudo (ABNT, 2009 apud Piekarski et al. 2012).
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O processo ACV é uma sistemática abordagem baseada composta por quatro componentes: definição
de objetivos e âmbito; análise de inventário; análise dos impactos; e, interpretação dos resultados,
como se ilustra na Figura 2.2 (ISO 14040: 2009).
Figura 2.2: Fases de uma ACV.
Fonte: ISO 14040: 2009
Definição de Objetivos e Âmbito – Define e descreve o produto, processo ou atividade.
Análise de Inventário – Identifica e quantifica a energia, água e materiais utilizados e
descargas ambientais (exemplo: emissões para o ar, disposição de resíduos sólidos, descargas
de efluentes líquidos).
Análise dos Impactos – Analisa os efeitos humanos e ecológicos da utilização de energia,
água, e materiais e das descargas ambientais identificadas na análise de inventário.
Interpretação – Avalia os resultados da análise de inventário e analisa os impactos para
selecionar o produto preferido, processo ou serviço com uma compreensão clara das incertezas
e suposições utilizadas para gerar os resultados. (FERREIRA, 2004).
Cabe citar, que devido à natureza iterativa da ACV, o escopo do estudo pode ser modificado à medida
que informações adicionais forem sendo coletadas e quando o sistema a ser estudado foi melhor
conhecido. (VALT, 2004)
Ainda, segundo FERREIRA (2004) a metodologia ACV tem numerosas aplicações, desde o
desenvolvimento de produtos, passando pela rotulagem ecológica e regulação, até à definição de
cenários de prioridade e de política ambiental.
2.4.1 Definição de Objetivo e Escopo
Segundo a (NBR ISO 14041) esta fase é crucial para o sucesso da condução do estudo e para a sua
relevância e utilidade. Deve partir da clara definição do sistema de produto ou serviço para que a
aplicação da metodologia seja viável.
Além disso, segundo NIGRI (2012) as razões para condução do estudo e o público-alvo também
devem estar claros. O objetivo pode ser a obtenção de uma visão mais clara de um sistema já
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estabelecido, identificando-se os pontos críticos do processo ou produto estudado, fornecendo a
possibilidade de melhorá-lo. E ainda permite a comparação com outros sistemas e seus impactos
potenciais. O escopo indica o sistema do processo ou produto que será analisado, delimitando suas
fronteiras e demais características funcionais do estudo.
Segundo a norma ISO 14041, na definição do escopo de um estudo da ACV devem ser considerados e
claramente descritos os seguintes itens:
a descrição das funções do sistema de produto, ou seja, a finalidade para a qual o produto
estudado se destina ou característica de desempenho do produto;
a unidade funcional tem como objetivo estabelecer uma referência com a qual as entradas e
saídas do sistema são relacionadas
o sistema de produto a ser estudado, ou seja, a finalidade para a qual o produto estudado se
destina ou, ainda, a característica de desempenho do produto;
as fronteiras do sistema de produto, que definem quais processos elementares ou subdivisões
dos sistemas de produto dentro do fluxo produtivo serão incluídos no sistema a ser modelado.
É ideal que as entradas e saídas sejam fluxos elementares;
procedimentos de alocação, que são necessários quando se lida com sistemas que envolvem
produtos múltiplos. Os fluxos de materiais e de energia, assim como as liberações ao ambiente
associadas, devem ser alocados aos diferentes produtos, de acordo com procedimentos
claramente estabelecidos;
tipos de impacto e metodologia de avaliação de impacto e interpretação subsequente a ser
usada;
requisitos dos dados, que especificam em termos gerais as características dos dados
necessários ao estudo;
limitações da análise, que envolvem qualidade dos dados, fronteiras do sistema, métodos
aplicados, etc.;
análise crítica, que é uma técnica para verificar se um estudo da ACV satisfez os requisitos
dessa norma quanto à metodologia, aos dados e ao relatório;
tipo e formato do relatório requerido para o estudo. Os resultados da ACV devem ser
relatados ao público-alvo de forma fiel, completa e exata. Devem ser definidos o tipo e o
formato do relatório na fase de escopo do estudo.
Ainda, segundo a ABNT (2009) a Avaliação do Ciclo de Vida (ACV) é uma técnica interativa.
Durante o decorrer do estudo, em função de uma série de fatores, pode ser necessária a modificação do
escopo do estudo.
2.4.2 Análise de Inventário
A “Análise do Inventário” (NBR ISO 14041) refere-se à coleta de dados e ao estabelecimento dos
procedimentos de cálculo para que se possa facilitar o agrupamento destes dados em categorias
ambientais normalmente utilizáveis e comparáveis, de modo semelhante a um balanço contábil.
Considera-se nessa fase que tudo que entra deve ser igual ao que sai do sistema em estudo, em termos
de energia ou massa, desde a extração das matérias-primas até o descarte final do produto (ABNT,
2009).
Os dados coletados nesta etapa são provenientes do monitoramento de um determinado processo de
produção ou de estimativas realizados por meio de modelos divulgados em literatura especializada
(VALT, 2004).
Para a coleta adequada de dados, é necessário desenvolver fluxogramas representando todas as etapas
de processo e suas inter-relações. Cada etapa deve ser descrita listando todos os aspectos ambientais
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existentes e definindo as unidades de medidas. Além disso, todos os procedimentos de coleta de dados
devem ser documentados através de confecção de formulários, para se evitar a não inclusão de dados
importantes (VALT, 2004).
Ainda, segundo a ABNT (2009) esta fase da Análise do Ciclo de Vida pode se tornar uma das mais
difíceis e trabalhosas em função da não-disponibilidade de dados, da qualidade dos dados disponíveis
ou da necessidade de estimá-los.
2.4.3 Avaliação dos Impactos
A Avaliação do Impacto (NBR ISO 14042) refere-se à identificação e avaliação em termos de
impactos potenciais ao meio ambiente que podem ser associados aos dados levantados no inventário.
De acordo com NIGRI (2012) nesta etapa é calculado o impacto ambiental gerado durante o ciclo de
vida do produto ou processo em questão. Para isso, são selecionadas categorias de impacto em que se
utilizam indicadores para quantificar emissões, uso de recursos e demais impactos de acordo com as
categorias escolhidas. Os indicadores fornecem os potenciais impactos ambientais.
Algumas avaliações mais simples podem ser realizadas apenas com os dados obtidos na fase do
inventário. Entretanto quando forem detectadas grandes diferenças nos vários parâmetros de impacto
ou quando houver necessidade de se relacionar os dados do inventário aos problemas ambientais, o
uso de uma metodologia específica, como a estabelecida na norma NBR ISO 14042 será de grande
utilidade (ABNT, 2009).
A norma ISO 14042 propõe uma estrutura para o processo de avaliação incluindo basicamente três
etapas:
Seleção e definição das categorias: as categorias devem ser estabelecidas com base no
conhecimento cientifico;
Classificação: os dados são classificados e apurados nas diversas categorias selecionadas;
Caracterização: os dados são modelados por categoria de forma que cada um possa ter o seu
indicador numérico.
Alguns técnicos poderão atribuir pesos aos resultados da avaliação de impacto. Como a ponderação é
um processo baseado em valores e pode envolver critérios subjetivos, essa etapa é considerada como
não científica e sujeita a distorções (ABNT, 2009).
2.4.4 Interpretação
A interpretação dos resultados de ACV (ISO 14043) é uma das etapas mais sensíveis, pois as
hipóteses estabelecidas durante as fases anteriores, assim como as adaptações que podem ter
ocorrido em função de ajustes necessários, podem afetar o resultado final do estudo.
Essa é a fase da ACV, em que os resultados obtidos nas fases anteriores são analisados de
acordo com o objetivo e o escopo previamente definidos para o estudo. As conclusões obtidas
após a análise dos resultados possibilitam a identificação de pontos críticos do ciclo de vida
do produto que necessitam de melhorias, permitindo a implementação de estratégias de
produção, como a substituição e recuperação de materiais e a reformulação ou substituição de
processos, visando à preservação ambiental (VALT, 2004).
Na fase de interpretação devem-se identificar os pontos significativos baseados nos resultados
do estudo tais como emissões, energia e outros. Além disso, deve-se assegurar que toda a
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informação relevante para a interpretação esteja completa, verificando se os resultados são
afetados pela incerteza durante a aplicação de métodos ou cálculos. Por fim, verificar se as
conclusões estão consistentes com os requisitos do objetivo e âmbito do estudo, incluindo, em
particular, requisitos de qualidade dos dados, suposições e valores pré-definidos (NIGRI,
2012).
Uma vez que já se tenha considerado o estudo terminado, seus resultados devem ser relatados
ao público-alvo de forma fiel, completa e exata, conforme definido na etapa de definições do
estudo (RIBEIRO, 2009).
2.5 Benefícios da ACV
Os resultados de um estudo ACV em conjunto com outras informações podem auxiliar na
tomada de decisões na seleção de produtos ou processo que resultem em menor impacto para o meio
ambiente. Além disso, esta metodologia permite identificar a transferência de impactos ambientais de
um meio para outro ou de um estágio de ciclo de vida para o outro, evitando o deslocamento de
problemas ambientais de um setor para outro quando se foca em apenas determinadas etapas do
sistema (FERREIRA, 2004).
Segundo SAIC apud FERREIRA (2006), ao realizar uma ACV podem ser feitos:
Análise sistêmica dos impactos ambientais de um produto;
Opção entre as opções existentes na escolha de produtos ou processos para apoio à decisão de
governos, entidades e sociedade;
fornecer análises quantitativas de lançamentos de descargas ambientais por etapa ou total do
ciclo de vida de um produto ou processo;
determinar os danos ambientais gerados localmente e/ou globalmente pela extração e consumo
de recursos naturais;
analisar comparativamente diferentes produtos que atendam a uma mesma demanda,
identificando seus benefícios e impactos ambientais para suporte à escolha;
identificar agentes geradores de impacto ambiental em áreas específicas de interesse
governamental.
E ainda, conforme informações da NIGRI (2012) acrescentam-se como benefícios a indicação
de pontos fortes e fracos do produto na busca de sua melhoria; o projeto de produtos; a
formulação da política da companhia; o atendimento à legislação e as informações do produto
para questões de marketing e a possibilidade de sua utilização para rotulagem ambiental;
subsídios e taxações em favor da produção mais limpa e em políticas gerais como na
determinação de combustíveis para a geração de eletricidade e meios de transporte.
2.6 Limitações da ACV
A realização de uma ACV pode ser dispendiosa. Dependendo das características do processo
ou produto analisado, a coleta de dados pode ser problemática e a disponibilidade dos mesmos
pode ter forte impacto na precisão dos resultados finais. Portanto, é importante ponderar a
disponibilidade de dados, o tempo necessário para realizar o estudo, os recursos financeiros
necessários e os benefícios previstos da ACV (NIGRI, 2012).
Torna-se importante, portanto, uma avaliação criteriosa da relação custo-benefício para se
atingir a qualidade desejada para o estudo, levando-se em consideração que tipo de dado
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deverá ser pesquisado, o custo e o tempo para sua coleta e os recursos disponíveis para a
condução do estudo. (SANTIAGO, 2007).
O ACV, por sua vez, não é uma ferramenta capaz de medir qual produto ou processo é o mais
eficiente em relação aos custos ou em relação a outros fatores, já que não se mede, por
exemplo, impactos reais ambientais, e sim impactos potenciais.
Ainda, de acordo com SANTIAGO (2007) a ACV é uma ferramenta técnica ainda em
evolução, e em virtude de sua complexidade, podem existir ainda incertezas na qualidade dos
dados e nos seus resultados, além de haver um certo grau de subjetividade decorrente da
necessidade de julgamento e discernimento por parte dos especialistas encarregados da
condução do estudo, como também limitações de conhecimento científico disponível.
3 Considerações Finais
A ACV é uma ferramenta importante no aprimoramento do processo produtivo e dos produtos
de uma empresa, pois auxilia o processo de tomada de decisão ao identificar os impactos
ambientais e impactos na saúde humana que tradicionalmente não são considerados quando se
analisa um produto ou processo. Além disso, a abordagem realizada em todo ciclo de vida do
produto permite a identificação e avaliação das fases críticas do produto, sendo a ACV
considerada uma ferramenta constitui-se em uma técnica e gerenciamento ambiental e
desenvolvimento sustentável.
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