Entrevista com Carlos Byngton - Revista da ESPM (setembro/outubro 2011)

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Entrevista com o médico psiquiatra e analista junguiano, Carlos Byngton, para a Revista da ESPM (setembro/outubro 2011)

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En t r E v i s ta c o n c E d i da a Fr a n c i s c o Gr ac i o s o E J. ro b E rto Wh i ta k E r PE n t E a d o

Professores no divã

Aomo aumentar a profundidade do aprendizado e dificultar o seu esque-cimento? Em busca de respostas para

esse problema, Carlos Amadeu Botelho Byington colocou professores e alunos no divã, com um único objetivo: resgatar a vivência emocional e prazerosa no ensino. O segredo dessa fórmula inovadora, que leva emoção e imaginação para dentro da sala de aula, ele desvenda no livro A construção amorosa do saber.

Médico psiquiatra e analista junguiano, o pau-lista com alma carioca formou-se em medicina no Rio de Janeiro, virou especialista em Psi-

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Entrevista com

quiatria e Psicanálise, e, em 1965, graduou-se pelo Instituto Jung, em Zurique. Ao retornar para o Brasil, fundou, com outros colegas, a Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica, que já formou mais de noventa analistas. Há anos é supervisor e coordenador de seminários na SBPA. Além de ministrar inúmeros cursos e palestras no Brasil e no exterior, ensinando e divulgando a obra de Jung e conceitos pró-prios, que originaram a Psicologia Simbólica Junguiana. Nesta entrevista, Byington ensina como utilizar o videogame, a vivência e a me-ditação para construir a escola do século XXI.

Carlos Amadeu Botelho Byington

Entrevista

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GR ACIOSO – Recentemente, a revista Época publicou um estudo, cuja tese central é o pensamento de que, por um lado, a maioria reconhece que é preciso mudar a educação, incluindo critérios e valores parecidos com os que você defende no seu livro: intuição, imagi-nação, criatividade e ética. Entretanto, cada vez mais, os países são obrigados a competir entre si e não há mais pos-sibilidade de nos contentarmos com o pico no mundo, ou seja, temos sempre de pensar no que o vizinho do outro lado do Atlântico está fazendo. Mas, nos concursos que a ONU promove, os países que estão na vanguarda − como China, Taiwan e Finlândia – incentivam o ensino à moda antiga, tradicional, disciplinador e competitivo.

CARLOS – É preciso avaliar que competição é essa. A competição pode ser imediatista em função de ganhos rápidos ou voltada à criatividade, ao brilho de uma atividade profunda.

GRACIOSO – No caso, a competição seria medida em termos do conhecimento que você consegue pôr na cabeça do aluno.

J.ROBERTO – No seu livro tem um capítulo que fala sobre o conceito de competição e agressividade. Volta e meia lê-se que um estudante japonês se matou porque foi reprovado ou ainda que a menina ficou doente de tanto estudar. Há um sentimento de que só vale aquele que chegar em primeiro, no máximo, em

segundo lugar. O terceiro colocado já recebe vaias. Isso parece estar presen-te mesmo na nossa própria escola, nas faculdades e no ensino médio. Como você avalia esses ingredientes?

CARLOS – Depende muito dos valores apli-cados. É preciso avaliar se a proposta é de uma educação integral − focada nos quesi-tos de moral, emoção e bem-estar − para o ser humano, porque o conceito de felicidade é importante. Recentemente, assisti a um video-livro sobre o Butão, um país que le-galiza e exige nas escolas a busca da felici-dade. Há delegacias para receber as pessoas e instruí-las, e, até mesmo, para repreender os vizinhos que estão atrapalhando a fe-licidade ou dos pais que não professam a busca da felicidade. Para a autorrealização do ser humano é preciso incluir na edu-cação a busca por bem-estar, felicidade e plenitude. Muitas vezes, um aluno passa no vestibular, faz o curso universitário, a pós, o mestrado, o doutoramento e em momento algum estuda como ele vê o mal na sociedade, a felicidade e o bem-estar do outro, ou seja, se ele tem alguma empatia em perceber a felicidade do outro a quem ele vai dar o saber, a profissão. Existe uma alienação existencial muito grande entre os valores buscados, os diplomas, a erudi-ção e o humanismo. Como o humanismo vem desde o Renascimento, ele traz para o Ocidente valores importantes, que foram fixados para trás com essa competitiv i-dade enorme dentro do nível da erudição. Por isso no livro chamo a atenção para a emoção, para aquilo que a pessoa está

} Se estamos tratando de Educação do Futuro, é preciso falar da Imaginação Alucinatória Com-putadorizada, que é a grande fronteira. ~

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sentindo, é a teoria de Jung, do Processo de Individuação: a autorrealização emo-cional durante a vida. Nós, que buscamos análise e autoconhecimento, prestigiamos muito essa busca no trabalho dos símbolos, do conhecimento dos sonhos. Nas minhas aulas costumo perguntar aos alunos sobre os sonhos, contribuições riquíssimas que podemos aproveitar no ensino. No entanto, essa vida interior das emoções recebe pouca atenção na universidade.

GRACIOSO – Nossa vivência na área aca-dêmica confirma o que você diz. Como professor, sempre fui humanista e me dei muito bem. Hoje, há estudiosos no assunto, como o neurocientista Miguel Nicolelis, percebendo que o compu-tador provoca muitos benefícios, mas também alguns malefícios. Um deles seria reduzir a importância das emo-ções na percepção dos jovens de hoje, porque o computador é uma máquina burra, não tem emoções, apenas soma, soma e soma.

J.ROBERTO – E padroniza a comunicação também.

GRACIOSO – Os jovens se habituaram a confiar no computador, que hoje é a bí-blia deles. Vivem em função do Google como fonte de consulta. O computador, entretanto, não tem nada a dizer em termos de emoção, que ficou para trás, escondida. Nossos professores estão lutando com isto, pois esta é uma esco-la que precisa de emoção, criatividade, marketing e comunicação. Sentimos o efeito esterilizante desse novo mundo digital.

CARLOS – Os jovens mostram novos cami-nhos pelas coisas que aprendem. Estão fas-cinados pelos jogos. Mas o que tem o jogo unido a essa racionalidade do computador? A emoção. Só que falo sobre a emoção no nível da vivência computadorizada da alu-

cinação. Se estamos tratando de Educação do Futuro, é preciso falar da Imaginação Alucinatória Computadorizada, que é a grande fronteira. Nós, na psiquiatria, na psicologia e na educação, certamente temos um mundo normal e um mundo psicótico bem delimitado. Queremos o bem-estar das pessoas e a saúde mental. Do outro lado dessa fronteira temos o delírio psicó-tico, que é a imaginação completamente solta e desvairada, na qual o indiv íduo vivencia suas loucuras, principalmente, a esquizofrenia. No último capítulo do livro mostro que hoje a pessoa pode viver essas experiências no Epcot Center, na Disney, por exemplo, onde o indivíduo coloca uma aparelhagem de audição e visão para assis-tir e participar de um filme. Se a história é algo como uma viagem num oceano, ele vai pegar ondas, mergulhar, ver os peixes e sentir as emoções, ou seja, vai vivenciar alucinatoriamente a experiência. Nenhum professor consegue esse tipo de vivência nas técnicas de dramatização em sala de aula, de inter-relação emocional dentro da transferência pedagógica. Nessa nova vivência é possível incluir na história uma viagem à Pompeia, na qual você irá à Pom-peia, verá a erupção vulcânica, estará lá com as pessoas, verá o Vesúvio em erupção e sofrerá o soterramento. Essa pessoa nunca mais esquecerá porque terá uma vivência impactante. No caso dos alunos, eles saem da sala de aula tendo presenciado o acon-tecimento, como testemunhas da história. Então não é mais um ensino “falar de” e sim um ensino vivencial – não só por meio de símbolos, mas de alucinação computadori-zada. E vamos ter isso em qualquer aula de conhecimentos gerais, história e geografia. Até mesmo na área religiosa, no futuro, a pessoa poderá ter um encontro com Jesus, além de participar da Última Ceia. Graças à imaginação computadorizada, você vai poder falar com Jesus e Ele falará com você. Isso será o ensino moderno.

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Carlos Byington