Entrevista Interface Vidigal Cio

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Entrevista da Revista Interface a Luís Vidigal sobre o papel do CIO no Estado 1. Qual deve ser o papel de um CIO (Chief Information Officer) na Administração Pública (AP)? Poderá ele ser equiparado a um responsável máximo de informática? Existe uma enorme confusão entre o conceito de CIO (Chief Information Officer) e de CTO (Chief Technology Officer), pois o que encontramos na maioria das organizações são CTO, enquanto responsáveis máximos de informática, mais concentrados na gestão das tecnologias do que na gestão dos recursos informacionais, incluindo a infraestrutura tecnológica de suporte. O próprio conceito de Informática, enquanto tratamento automático da informação foi, ao longo dos últimos 20 anos, perdendo importância e dando lugar ao binómio sistemas e tecnologias da informação (SI/TI), procurando-se valorizar cada vez mais o recurso informação e não apenas as tecnologias que lhe dão suporte. Deste modo, o papel do CIO na AP, como em qualquer organização, vai muito para além de ser um responsável máximo da informática e deverá constituir um gestor de topo dos recursos informacionais, com capacidade de influenciar estrategicamente a evolução do negócio numa perspectiva verdadeiramente inovadora, transformadora e de incorporação de valor com recurso a tecnologias adequadas. 2. Que importância atribui à existência de um CIO na AP? A administração pública não escapou à chamada “espiral das commodities ”de Nicholas Carr, em que 70 a 90% dos gastos em TI são feitos em infra-estrutura indiferenciada e pouco estratégica. O fascínio pela tecnologia tem-nos feito esquecer o propósito chave da informação e a sua relação com as pessoas e os processos. O CIO na AP deverá ser capaz de se concentrar na informação enquanto recurso e ter uma nova perspectiva tecnológica, pois o que conta nos dias de hoje não é tanto a escolha de tecnologias de informação mas a gestão da integração da sua enorme diversidade e a sua capacidade de alinhamento com as necessidades dos cidadãos e agentes económicos. Por isso, as práticas e os procedimentos actuais para gerir informação e tecnologia têm que ser profundamente alterados.

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Entrevista da Revista Interface a Luís Vidigal

sobre o papel do CIO no Estado

1. Qual deve ser o papel de um CIO (Chief Information Officer) na

Administração Pública (AP)? Poderá ele ser equiparado a um responsável

máximo de informática?

Existe uma enorme confusão entre o conceito de CIO (Chief Information Officer) e

de CTO (Chief Technology Officer), pois o que encontramos na maioria das

organizações são CTO, enquanto responsáveis máximos de informática, mais

concentrados na gestão das tecnologias do que na gestão dos recursos

informacionais, incluindo a infraestrutura tecnológica de suporte.

O próprio conceito de Informática, enquanto tratamento automático da informação

foi, ao longo dos últimos 20 anos, perdendo importância e dando lugar ao binómio

sistemas e tecnologias da informação (SI/TI), procurando-se valorizar cada vez

mais o recurso informação e não apenas as tecnologias que lhe dão suporte.

Deste modo, o papel do CIO na AP, como em qualquer organização, vai muito

para além de ser um responsável máximo da informática e deverá constituir um

gestor de topo dos recursos informacionais, com capacidade de influenciar

estrategicamente a evolução do negócio numa perspectiva verdadeiramente

inovadora, transformadora e de incorporação de valor com recurso a tecnologias

adequadas.

2. Que importância atribui à existência de um CIO na AP?

A administração pública não escapou à chamada “espiral das commodities ”de

Nicholas Carr, em que 70 a 90% dos gastos em TI são feitos em infra-estrutura

indiferenciada e pouco estratégica.

O fascínio pela tecnologia tem-nos feito esquecer o propósito chave da informação

e a sua relação com as pessoas e os processos. O CIO na AP deverá ser capaz

de se concentrar na informação enquanto recurso e ter uma nova perspectiva

tecnológica, pois o que conta nos dias de hoje não é tanto a escolha de

tecnologias de informação mas a gestão da integração da sua enorme diversidade

e a sua capacidade de alinhamento com as necessidades dos cidadãos e agentes

económicos.

Por isso, as práticas e os procedimentos actuais para gerir informação e tecnologia

têm que ser profundamente alterados.

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Infelizmente ainda são apenas as decisões relacionadas com as grandes obras do

betão que merecem o alargamento do tempo e do espaço, comprometendo deste

modo alguns governos futuros. Ainda não se percebeu a importância de tomar

decisões estratégicas de médio e longo prazo e de âmbito interministerial no

domínio dos SI/TI. Ainda não se reconhece o papel estruturante dos SI/TI,

enquanto obra pública que também deverá perdurar no tempo para além de uma

legislatura.

A importância do CIO na AP é decisiva, sobretudo quando as prateleiras dos

membros dos últimos governos estão cheias de estudos concebidos por task

forces, consultores e vendedores de sonhos. Por isso o papel independente e

equidistante dos impulsos políticos apenas poderá ser assegurado por um

verdadeiro CIO.

3. O CIO existe na actual AP? (Se sim, estará a cumprir o seu papel? / Se

não, porque ainda não existe?)

Em meu entender não existe actualmente ninguém a desempenhar

adequadamente o papel de um CIO, por duas razões principais:

Nos últimos anos assistiu-se a uma grande contracção e devastação das

estruturas da Administração Directa do Estado (Direcções Gerais) e à sua

migração para a Administração Indirecta do Estado (Empresas, Fundações,

Agências, Institutos, etc.), como forma de iludir a contracção do défice e fugir ao

controlo orçamental.

Consequentemente, diminuiu-se a capacidade de gestão estratégica e criaram-se

psudo-empresas mais preocupadas em cumprir calendários políticos do que em

assegurar uma arquitectura de SI/TI coerente e integradora de todo o sistema de

informação do Estado. Em vez de um comportamento estratégico estas entidades

preferem desenvolver competências executórias e sobrepor-se desta forma ao

mercado privado ou nalguns casos deixar-se capturar por ele.

A segunda razão foi a desvalorização e, nalguns casos, a eliminação do estatuto

de funcionário público independente e comprometido acima de tudo com o serviço

ao cidadão. Perante o desfilar de governos sedentos de reinventar tudo de novo

em cada período de quatro anos e perante um sistema de avaliação que privilegia

sobretudo os resultados de curto prazo, a obediência cega à cadeia de comando e

a competição individual, os actuais trabalhadores contratados em funções públicas

são incapazes de ter uma atitude independente e comprometida acima de tudo

com o serviço público.

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Não é fácil exercer o papel de CIO no Estado. Trata-se de um papel

verdadeiramente paradoxal, uma vez que, ao mesmo tempo que deverá ser capaz

de participar e influenciar as estruturas políticas em cada momento, terá de ser

capaz de ultrapassar as barreiras do tempo (sobreviver às mudanças de

legislatura) e ultrapassar as barreiras do espaço, ou seja da tutela em que se

encontra integrado, mantendo uma visão holística do sistema de informação do

Estado.

As funções de governação (Governance) dos SI/TI não são iguais em todas as

organizações, pois dependem da fase de maturidade em que se encontram os

gestores dos recursos informacionais e tecnológicos. As funções de governação

tanto podem ser asseguradas por solucionadores reactivos de problemas

centrados nas tecnologias, do tipo CTO, como por autênticos CIO que são

capazes de agir proactivamente e influenciar a transformação do negócio através

da utilização adequada dos SI/TI, de forma co-optada com os seus pares nos

níveis mais elevados da gestão e da governação.

Pode dizer-se que actualmente existem na AP alguns CTO mas ninguém

desempenha o papel de CIO. Mesmo em sectores como as Finanças, a Justiça a

Saúde ou a Segurança Social, o que existem são CTO mais preocupados na

prestação de serviços do que no pensamento estratégico e arquitectural.

Por tudo isto, precisamos de um CIO do Estado que seja capaz de exercer funções

de soberania, com força, credibilidade e independência suficientes, para

ultrapassar as barreiras de cada legislatura (Tempo) e as barreiras ministeriais

(Espaço) e capaz de se libertar das obsessões estritamente tecnológicas e dos

autismos tecnocráticos, em favor de uma gestão do sistema de informação do

Estado.

4. Utiliza o termo “Arquitecturas de SI/TI do Estado”, como “um instrumento

de coordenação e um testemunho de maturidade no desempenho do CIO,

que deixa de corresponder simplesmente ao paradigma de prestção de

serviços tecnológicos, para passar a uma relação de parceria e

envolvimento conjunto e cooptado na transformação do aparelho do

Estado e na incorporação de valor através das tecnologias de

informação”. Acredita que esta relação de parceria e envolvimento

conjunto na transformação do aparelho do Estado existe, de facto, na

actual AP? Em que aspectos?

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Utilizo a palavra parceria principalmente na transformação das relações no interior

do aparelho do Estado e tenho muitas reticências na banalização deste conceito

aplicado aos relacionamentos com o mercado.

A concertação e cooptação de princípios e valores para o desenvolvimento de uma

estratégia comum é uma condição essencial para a transformação do aparelho do

Estado e para a incorporação de valor através das tecnologias de informação.

A Arquitectura de SI/TI consiste num referencial indispensável a todos os agentes

envolvidos na modernização da administração pública. Concerta iniciativas, define

caminhos comuns, normaliza conceitos, identifica repositórios partilhados,

disciplina e orienta as opções do mercado, etc.

O esforço de transformação das estruturas actuais de SI/TI na Administração

Pública deve ser dirigido ao planeamento, às arquitecturas e à gestão, num quadro

de competências inovadoras, orientadas à mudança dos processos através do uso

intensivo dos SI/TI pelos organismos públicos e pela sociedade em geral.

Não se trata apenas de arrumar e integrar os sistemas dentro de casa, mas tornar

claro e transparente, para todos os cidadãos e para o mercado das tecnologias em

particular, o âmbito, as prioridades e os requisitos a que deverá obedecer a

modernização da Administração Pública, através da introdução das tecnologias da

informação e comunicação.

Tal como no meio físico, um engenheiro ou um construtor civil deverão reconhecer

a importância de um arquitecto para conceber e mapear o espaço, assim também

no espaço simbólico, que constituem os sistemas de informação, deverão ser

obrigatórias as respectivas arquitecturas prévias, para que não se continue a

“construir clandestinamente” e para que se construam e reaproveitem recursos

estruturantes e serviços comuns.

Os CIO podem percorrer cinco estágios de maturidade ou de credibilidade

segundo o grau de confiança e aceitação que as respectivas estruturas e funções

merecem perante os mais altos níveis de governação. A gestão dos SI/TI inicia-se

quase sempre em fases segregadas de incerteza e cepticismo, aspirando a

conquistar progressivamente fases mais maduras de aceitação e confiança, para

finalmente atingir o respeito por parte de todos os seus pares e em particular por

parte da direcção de topo, que, no caso das administrações públicas, é o próprio

Governo.

Associadas a cada um destes estágios, podemos encontrar percepções e formas

de gestão diferenciadas, progressivamente mais comprometidas com a

organização como um todo. Há medida que se vai progredindo na maturidade da

gestão dos SI/TI estes passam a ser capazes de acrescentar cada vez mais valor

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ao negócio e em contrapartida merecer a aceitação e o reconhecimento de todos

os parceiros envolvidos.

5. Defende que deverá existir uma arquitectura de dados/informação

comum, gerida de forma centralizada por um órgão equidistante de todos

os sectores e dotado de competências reguladoras. Em que aspectos

esta arquitectura é essencial para o bom funcionamento da AP?

Confesso que cada vez mais tenho uma obsessão pela qualidade dos dados na

AP. Nos anos 90 lancei em várias línguas e países um manifesto contra a

“Burocracia Electrónica” e contra os silos verticais, chamando à atenção para a

necessidade reengenharia, orientação para processos horizontais e reutilização da

informação, mas nos últimos anos tenho denunciado a redundância de informação

que resulta dos silos horizontais entretanto criados na desmaterialização de alguns

processos.

Não basta ter uma orientação para processos, mesmo tratando-se de automatizar

cadeias de valor interdepartamentais orientadas às necessidades dos cidadãos e

agentes económicos. Torna-se cada vez mais necessário criar uma arquitectura de

dados/informação comum, capaz de servir de referência a todas as iniciativas de

informatização da administração pública.

Com a falência da administração reguladora e a multiplicação da administração

“empresarial” paralela, ouvem-se alguns “rolos compressores” dizer que, se

ninguém normaliza e regula, estabelecendo referenciais e boas práticas, inventam-

se dados e arquitecturas apressadamente para cada circunstância, porque o

espectáculo tem que continuar - “The show must go on”.

Se a informação não existe recolhe-se de novo, se o organismo não respeita

normas nem possui dicionários de dados inventam-se tabelas para a circunstância,

evitando-se o incómodo e o risco de ir à procura de dados e semânticas comuns e

partilháveis noutras entidades nacionais e internacionais.

É urgente efectuar um diagrama CRUD (Create, Retrieve, Update, Delete),

identificando todos os processos básicos e a sua relação com as macro-entidades

informacionais do Estado. A criação de repositórios únicos de dados reutilizáveis

deverá ser um desígnio nacional, para todos quantos se preocupam pela qualidade

e disponibilidade de dados e consequente viabilização de uma administração

pública em tempo real.

6. Qual a relação dessa Arquitectura com o CIO?

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A Arquitectura é a ponte entre a estratégia e a implementação e é indispensável à

gestão da mudança e modernização do aparelho do Estado. A chamada

Arquitectura de Empresa inclui, de acordo com os vários níveis de Spewak, não

apenas a Arquitectura de Dados/Informação, mas também as arquitecturas de

Negócio, Aplicacional e Tecnológica.

O conceito de Arquitectura de Empresa é de difícil percepção na Administração

Pública dado o elevado número de entidades que giram em torno de si próprias e

que têm dificuldade em partilhar com outros parceiros a globalidade de uma

arquitectura global do Estado orientada a serviços destinados aos cidadãos e às

empresas. Trata-se de um desafio para o alargamento do espaço

interdepartamental, que raramente é percebido pelos próprios membros do

Governo intervenientes, mais preocupados que estão em protagonizar-se a si

próprios e à sua área de intervenção política.

Esta é a tónica de maturidade proposta inicialmente pelo Gartner e por governos

como o do Canadá e só mais recentemente adoptada pela União Europeia.

O sucesso e a fluidez dos processos dependem do domínio que se conseguir ter

da totalidade do espaço envolvido na sua prestação e não é fácil aos organismos

envolvidos, aceitar a externalização, mesmo no interior do sistema, do

planeamento, arquitectura e gestão de um processo global e integrado.

Paradoxalmente os fornecedores externos, ao tentarem reduzir o risco e definir o

âmbito da sua actuação no seu contrato com o cliente, também contribuem para

esta fragmentação da Arquitectura de SI/TI do Estado.

Por tudo isto, a Arquitectura é sem dúvida um instrumento privilegiado na actuação

e credibilização do CIO e para a integração do sistema Estado.

7. Na sua opinião, de que padece a actual AP no que a SI/TI diz respeito? O

que podia ser melhorado, que lacunas há por preencher?

A administração Pública está mais informatizada do que a generalidade do país, o

problema não está na quantidade de tecnologia, mas no seu mau aproveitamento.

A Administração Pública está dividida e fechada em múltiplos casulos

tecnológicos, autoprotegidos e virados de costas uns para os outros.

Existe uma carência estrutural de competências de gestão, planeamento e

concepção de arquitecturas de sistemas e tecnologias da informação. O Estado

tem muito pouca consciência do que é e do que precisa e ainda não é capaz de

alargar o espaço e o tempo da sua transformação através do uso intensivo e

partilhado das tecnologias.

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A estratégia ainda está centrada no aprovisionamento tecnológico e menos na

concepção de um espaço arquitectónico ordenado e regulado para todo o sector

público.

Não excluo a necessidade de técnicos altamente qualificados do ponto de vista

tecnológico como forma de manter a credibilidade na relação com fornecedores

externos, trata-se de preservar um escol de peritos em áreas de ponta diferente do

que se passa actualmente, em que se entrega a inovação e os desafios

tecnológicos ao exterior e mantém-se a tecnologia ultrapassada nas mãos dos

técnicos que ainda restam nos organismos do Estado. Actualmente o mercado

“come o lombo” enquanto o Estado “rói os ossos”, quando deveria ser o contrário.

Ainda se está longe de uma clarificação das missões e competências no âmbito

dos sistemas e tecnologias da informação, que deveremos proteger de forma

soberana e aquelas que se devem externalizar de forma mais eficiente e

económica.

Temos vindo a lutar com alguma veemência nos últimos dez anos pela criação de

competências e departamentos orientados às arquitecturas de sistemas e

tecnologias de informação, capazes de dar corpo às novas funções de soberania

de um Estado que passe a ser mais um regulador equitativo e transparente, um

bom gestor e um comprador competente de SI/TI e cada vez menos um medíocre

implementador e um crónico reinventor da roda incapaz de competir em qualidade

com um mercado mais globalizado e auto-regulado por critérios sempre mais

exigentes do ponto de vista normativo e metodológico à escala mundial.

Se o Estado, no domínio da prestação estrita de serviços de concepção,

desenvolvimento e exploração de aplicações informáticas, tende a ser cada vez

menos competitivo, tanto na eficácia e prontidão dos resultados, como na

eficiência da utilização interna dos seus recursos técnicos, humanos e financeiros,

deverá fazer convergir quanto antes os seus esforços e os seus cada vez mais

limitados recursos para outras competências e prioridades progressivamente mais

centradas na protecção da sua soberania exclusiva.

8. Qual acredita que deverá ser a principal componente no desenvolvimento

de uma Arquitectura de Sistema de Informação?

Antes de mais nada, a Arquitectura deverá ter uma preocupação pela

racionalização e alinhamento dos processos com a estratégia de médio e longo

prazo de uma modernização administrativa sem constrangimentos de qualquer

legislatura política e transversal a todo o aparelho do Estado.

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Por outro lado deverá existir uma preocupação constante pela consistência e

qualidade de dados através de estruturas adequadas de gestão da informação.

A interoperabilidade semântica, tecnológica e aplicacional deverá ser também uma

prioridade na Arquitectura de Sistema de Informação do Estado.

Destacamos os seguintes benefícios espectáveis da Arquitectura de Sistemas de

Informação:

Flexibilidade na mudança e adequação aos novos desafios, com redução

de tempo de implementação de novas funções;

Sistemas e tecnologias de informação alinhados com a estratégia dos

vários governos, o que facilita e racionaliza as decisões de investimentos

em SI/TI;

Permite controlar a redundância e inconsistência da informação;

Permite eliminar / reduzir a proliferação de sistemas de informação

departamentais desintegrados que obrigam ao desenvolvimento de

inúmeros interfaces difíceis e caros de manter;

Facilita a integração e a interoperabilidade entre sistemas de informação,

garantido a maior fluidez dos processos que conduzem à prestação de

serviços à sociedade;

Permite gerir a diversidade e complexidade dos sistemas de informação em

toda a administração pública;

Fornece um guia para a estrutura e localização da informação dentro do

sistema Estado.

Tem-se falado e investido muito em plataformas de serviços comuns como forma

de integrar sistemas e aplicações, mas tem-se feito muito pouco na criação de uma

arquitectura e desígnio comum, onde a generalidade dos organismos se reveja e

acredite.

As plataformas são muitas vezes “soluções à procura de problemas” em que os

organismos ainda não se revêem nem apostam estrategicamente. A Arquitectura

de Sistemas de Informação é sem dúvida um instrumento vivo e agregador para a

implementação da estratégia de modernização administrativa com recurso às TIC.

9. Quais deverão ser as principais características de um CIO para a actual

AP?

Como em qualquer organização pública ou privada um CIO deverá ser, não

apenas um entusiasta por tecnologias inovadoras, mas sobretudo um estratega

conhecedor da administração pública, um agente de mudança, um líder de

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pessoas, um comunicador nato, um integrador de sistemas, um empreendedor

corajoso, um cidadão responsável e alguém capaz de dinamizar redes e

comunidades humanas.

É fundamental saber criar, manter e desenvolver uma complexa rede de parceiros

e intervenientes no sistema de informação aos vários níveis do aparelho do

Estado, através de atitudes de negociação e concertação, bem como

competências interpessoais, informacionais e decisórias muito acima da média.

Um bom CIO deverá ser capaz de navegar na complexidade organizacional,

possuir pensamento estratégico e táctico, garantindo um balanceamento adequado

entre planeamento e execução e um grande aproveitamento de recursos e

competências.

No caso da administração pública o CIO deverá ser capaz de quebrar

constrangimentos temporais e espaciais característicos do sistema Estado, pois

não se pode deixar aprisionar por euforias legislativas nem tão pouco por vaidades

departamentais.

Um político ou um membro de qualquer governo poderá ser um bom patrono

(sponsor) nas várias intervenções no âmbito do sistema de informação do Estado,

mas dificilmente será um bom CIO capaz de ter uma visão estratégica para além

da legislatura para que está comprometido.

Quando falamos de governação dos SI/TI na Administração Pública temos de

avaliar as áreas de competência requeridas para prosseguir as missões nucleares

do Estado, deixando de intervir em áreas de baixa soberania, as quais podem ser

melhor asseguradas pelo mercado em livre e sã concorrência. As tecnologias da

informação e comunicação não serão garantidamente funções nucleares do

Estado e o seu exercício mais ou menos profissional por parte de múltiplos

organismos públicos merece uma avaliação cada vez mais cuidada.

À partida existem dois grandes grupos de competências e de actividades que não

devemos misturar em termos orgânicos e funcionais – As áreas de Coordenação

(mais perto da estratégia de negócio) e as áreas de Prestação de Serviços (mais

perto das tecnologias). Trata-se de intervenções em planos que convém manter

segregados e que se traduzem em relacionamentos e subordinações totalmente

diferentes em relação ao ambiente operacional onde actuam: relações de parceria

e relações de cliente-fornecedor, particularmente difíceis de conciliar num sistema

fortemente hierarquizado como é a Administração Pública.

De acordo com a Lei nº 4/2004, neste momento a chamada administração directa

do Estado (direcções gerais) integra os únicos órgãos capazes de exercer

legalmente “poderes de soberania, autoridade e representação política do Estado”.

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São também os únicos órgãos capazes de garantir “o estudo e concepção,

coordenação, apoio e controlo ou fiscalização de outros serviços administrativos”.

No entanto, cada vez é menos possível exercer a soberania quando o dinheiro e a

competência técnica estão a fugir para a administração indirecta do Estado

(agências, institutos e fundos autónomos), tentando deste modo garantir

“flexibilidade de gestão” através da fuga do direito público para o direito privado.

Apesar dos últimos governos terem destruído sistematicamente grande parte das

estruturas de coordenação e regulação específicas da administração directa do

Estado e ter retirado a independência e a neutralidade que distinguiam os

funcionários públicos dos restantes trabalhadores, acredito que o tempo irá

demonstrar a importância e a especificidade do papel do CIO no ordenamento do

sistema de informação do Estado e na adequada utilização dos seus recursos

humanos e tecnológicos. Caso contrário é o próprio país que irá pagar caro a

actual displicência da gestão dos recursos informacionais da administração pública

portuguesa.

Publicado em Fevereiro de 2010